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SUMÁRIO
I – Para efeitos do Código do Imposto do Selo e da Tabela Geral do Imposto do Selo, na redação em vigor em 2021, a tributação recai sobre a utilização do crédito e não sobre a celebração do respetivo negócio jurídico de concessão do crédito.
II – A sujeição a Imposto do Selo do crédito utilizado no atual Código do Imposto do Selo, encontra-se subordinada à conexão determinada pelo local onde se verifica a utilização do crédito, pelo que, por força do princípio da territorialidade, quando esteja em causa a concessão de crédito no quadro de uma relação de cash pooling, apenas será tributada a utilização de fundos consumada em território nacional.
III – A recusa em aplicar a isenção prevista no artigo 7.º, n.º 1, alínea h), do Código do Imposto do Selo, conjugada com o n.º 2 do mesmo artigo (na redação em vigor em 2021), nos casos em que o devedor tem sede ou direção efetiva num Estado-Membro da União Europeia, constitui uma restrição injustificada à liberdade de movimento de capital garantida pelo artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Rita Correia da Cunha, Nuno Pombo e Susana Cristina Nascimento das Mercês de Carvalho, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o presente Tribunal Arbitral Coletivo, constituído a 19.09.2023, decidem o seguinte:
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RELATÓRIO
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A…, LDA., NIPC …, com sede na Rua …, São João da Madeira (doravante “a Requerente”), veio, em 10.07.2023, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (doravante “RJAT”), requerer a constituição do Tribunal Arbitral e apresentar pedido de pronúncia arbitral (“PPA”), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “AT” ou “Requerida”), com vista (1) à declaração de ilegalidade e anulação dos atos tributários de autoliquidação de Imposto do Selo (doravante “IS”), n.ºs …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, respeitantes ao período de janeiro a dezembro de 2021, no valor total de € 67.503,38 (sessenta e sete mil, quinhentos e três euros, e trinta e oito cêntimos), bem como da decisão expressa de indeferimento da reclamação graciosa n.º …, que teve como objeto os ditos atos, e (2) à restituição do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.
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Subsidiariamente, a Requerente peticiona o reenvio prejudicial dos presentes autos ao Tribunal de Justiça da União Europeia (doravante “TJUE”), ao abrigo do artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (doravante “TFUE”), caso o Tribunal Arbitral entenda subsistirem dúvidas interpretativas sobre a compatibilidade da norma prevista no artigo 7.º, n.º 2, do Código do Imposto do Selo (doravante “CIS”) e o Direito da União Europeia.
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A Requerente junta 41 (quarenta e um) documentos e arrola uma testemunha.
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O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite a 12.07.2023 pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerida.
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A Requerente não exerceu o direito à designação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea a), e do artigo 11.º, n.º 1, alínea a), ambos do RJAT, o Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os ora signatários como árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do cargo no prazo aplicável.
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A 31.08.2023 as partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º, do Código Deontológico do CAAD.
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Em conformidade com o preceituado no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído a 19.09.2023.
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Por despacho proferido pelo Tribunal Arbitral a 19.09.2023 foi a Requerida notificada para, no prazo de 30 (trinta) dias, apresentar resposta, juntar cópia do processo administrativo (doravante “PA”) e, querendo, requerer a produção de prova adicional. A Requerente foi notificada para, no referido prazo, indicar sobre que factos incidiria a inquirição da testemunha por si arrolada.
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Em 03.10.2023, a Requerente apresentou requerimento, no qual indicou os factos sobre os quais incidiria a inquirição da testemunha por si arrolada e juntou o PPA em formato Word.
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No dia 23.10.2023, a Requerida apresentou a sua resposta, na qual se defendeu por impugnação, e juntou aos autos o processo administrativo.
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Por despacho de 19.11.2023, o Tribunal Arbitral: (i) indeferiu o pedido de reenvio prejudicial para o TJUE; (ii) notificou a Requerente para, querendo, no prazo de 10 (dez) dias, produzir prova documental de que o crédito obtido pela B…, sedeada em França, é, efetivamente, e em todas as situações, utilizado fora de Portugal; (iii) notificou a Requerida para, querendo, se pronunciar sobre os documentos juntos pela Requerente nos termos do ponto anterior, devendo fazê-lo no prazo de 10 (dez) dias a contar da respetiva junção aos autos; (iv) notificou as partes da data e hora agendadas para a reunião do Tribunal Arbitral prevista no artigo 18.º, n.º 1, do RJAT; (v) notificou a Requerente para, no prazo de 10 (dez) dias, informar o CAAD sobre se a testemunha arrolada seria apresentada nas instalações do CAAD no Porto ou em Lisboa, e (vi) notificou as partes, para no mesmo prazo, informarem o CAAD sobre a sua vontade em se deslocarem às instalações do CAAD, no Porto ou em Lisboa, ou, em alternativa, participarem na diligência on-line, via WEBEX.
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O Tribunal Arbitral indeferiu o pedido de reenvio prejudicial para o TJUE, com base nos seguintes fundamentos:
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Nos artigos 19.º, n.º 3, alínea b), e 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) prevê-se o reenvio prejudicial para o TJUE, que é obrigatório quando uma questão sobre a interpretação dos atos adotados pelas instituições, órgãos ou organismos da União Europeia seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial previsto no direito interno.
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Todavia, conforme resulta do Acórdão do TJUE de 06-10-1982, caso Cilfit, processo n.º 283/81, não é necessário proceder a essa consulta quando existe um precedente na jurisprudência europeia, ou quando, não obstante as questões em apreço não serem estritamente idênticas a um precedente na jurisprudência europeia, a correta aplicação do Direito da União Europeia seja tão óbvia que não deixe campo para qualquer dúvida razoável no que toca à forma de resolver a questão de Direito da União Europeia suscitada (doutrina do ato claro).
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Acresce que, tal como referido pelo TJUE, “compete exclusivamente ao juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal de Justiça” (Acórdãos de 10-07-2018, processo C-25/17, e de 02-10-2018, processo C-207/16).
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Afigura-se a este Tribunal Arbitral que a interpretação das normas de Direito da União Europeia que é necessária para a apreciação da legalidade dos atos tributários objeto do PPA apresentado pela Requerente é clara em função da jurisprudência do TJUE e dos Tribunais Arbitrais, não havendo necessidade de efetuar o reenvio prejudicial para o TJUE.
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No dia 05.12.2023, a Requerente informou o Tribunal Arbitral que a testemunha por si arrolada seria apresentada nas instalações do CAAD no Porto e juntou aos autos 5 (cinco) documentos que, no seu entender, comprovam que o crédito obtido pela B…, sedeada em França, é utilizado, em todas as situações, fora de Portugal.
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Em 22.12.2023, a Requerida pronunciou-se sobre os documentos juntos pela Requerente.
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No dia 23.01.2024, teve lugar a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, na qual: (i) foi ouvida a testemunha arrolada pela Requerente, (ii) foram as partes notificadas para, de modo simultâneo, apresentarem, querendo, alegações escritas, no prazo de 15 (quinze dias); (iii) foi deliberado pelo Tribunal Arbitral que a decisão final seria proferida até ao fim do prazo fixado no artigo 21.º, n.º 1, do RJAT; (iv) foi solicitado às partes o envio das peças processuais em formato Word; e (v) foi a Requerente notificada para proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente e juntar aos autos o respetivo comprovativo.
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Em 08.02.2024, a Requerente juntou aos autos o comprovativo do pagamento da taxa arbitral subsequente e apresentou as suas alegações finais.
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A Requerida apresentou as suas alegações finais em 14.02.2024.
II. POSIÇÃO DAS PARTES
REQUERENTE
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A fundamentar o PPA, com vista à declaração de ilegalidade e consequente anulação dos atos de autoliquidação de IS aqui em crise, invocou a Requerente, de entre o mais, o seguinte:
Do Facto Tributário previsto na Verba 17.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo
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No que concerne à incidência em sede de IS, em particular do facto tributário previsto na verba 17 da Tabela Geral do Imposto do Selo (doravante, “TGIS”), conforme referem Silvério Mateus e Curvelo de Freitas:[1] “a concessão de crédito está sujeita a imposto do selo, qualquer que seja a natureza e forma, relevando, contudo, para o efeito a efetiva utilização do crédito concedido e não o contrato que lhe é subjacente. Pode, assim, ser celebrado um contrato de concessão de crédito sem que tal traduza facto tributário deste imposto, o que ocorrerá sempre que a utilização do crédito não seja imediata ou se não houver utilização efetiva desse contrato. É o caso, por exemplo, do contrato de abertura de crédito (…), em que, colocado o crédito à disposição de alguém, a tributação só ocorre no momento em que o creditado o utiliza. No limite, poderá inclusivamente não haver tributação do contrato de abertura de crédito se o creditado nunca utilizar o crédito que lhe foi disponibilizado (…)”.
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O contrato de concessão de crédito só ganha relevância no campo da fiscalidade, designadamente em sede de IS, quando se traduz numa (imediata) entrega de fundos, e não quando reflete apenas uma assunção de um compromisso de entrega de fundos num momento futuro a determinar, caso em que consubstancia, quando muito, uma mera promessa de mútuo ou uma abertura de crédito.
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Ou seja, nas operações de crédito, a obrigação tributária (i.e., o facto tributário) só nasce quando elas são realizadas. E elas só são realizadas quando o crédito é utilizado, não quando o contrato é assinado.
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Assim sendo, é a utilização do crédito, e não a sua contratualização, que relevam enquanto facto tributário no Código do IS, pois é nessa utilização, e não na contratualização da operação que a possibilita, que se encontra uma possível manifestação de capacidade contributiva. Na verdade, é indispensável a disponibilização de liquidez para suportar a incidência do IS.
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Em suma, o facto tributário relevante é a utilização de crédito (e não a mera concessão), por esta ser a efetiva manifestação de capacidade contributiva.
Do Princípio da Territorialidade nas Operações Financeiras
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A regra geral de incidência territorial, constante do artigo 4.º, n.º 1, do CIS, dispõe o seguinte: “Sem prejuízo das disposições do presente Código e da Tabela Geral em sentido diferente, o imposto do selo incide sobre todos os factos referidos no artigo 1.º ocorridos em território nacional”.
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Estando em causa, no presente caso, operações de crédito, quatro poderiam ser os critérios determinantes da localização da operação em território nacional:
(i) o domicílio do mutuante;
(ii) o domicílio do mutuário;
(iii) o local da celebração do contrato; e
(iv) o local da utilização do crédito.
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Contudo, o que se sujeita a IS, ao abrigo da Verba 17.1 da TGIS, é a utilização de crédito, ou seja, o facto tributário considera-se ocorrido/verificado no momento em que o mutuário levanta (utiliza) os fundos colocados à sua disposição através do contrato de mútuo – momento exato em que se devem verificar os demais requisitos de que depende a incidência tributária (desde logo, no que diz respeito à incidência territorial).
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Será então este facto – a utilização dos fundos monetários – que terá de ocorrer em território nacional.
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A utilização de fundos ocorre no local onde o seu utilizador recebe o capital mutuado, i.e., no local em que a obrigação do mutuante de entregar o capital ao mutuário é cumprida.[2]
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Como tal, quando a lei define o facto tributário como a “utilização de crédito” estamos a falar da obrigação do mutuante de entregar ao mutuário – geralmente mediante um pedido de utilização – uma determinada quantia em dinheiro, pelo que o credor dessa prestação é o mutuário e o devedor dela é o mutuante.
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Assim, não se pode considerar que o domicílio do mutuante (a aqui Requerente) é o critério relevante para efeitos de localização territorial do facto tributário (i.e., a utilização de crédito).
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Na verdade, e exceto quando as partes convencionem em sentido contrário, o crédito é utilizado no domicílio do mutuário, pois é ele que é credor do direito a receber os fundos mutuados – e é ele quem beneficia do acréscimo de liquidez relevante que permite “sustentar” o ímpeto tributário do Estado em sede de IS.
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É, pois, necessário que a utilização de fundos se verifique em território nacional, isto é, que a receção do capital se realize numa conta bancária, ou noutro local convencionado pelas partes, em território português, para que se possa considerar que o facto tributário ocorreu em território nacional.
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Contudo, o legislador veio estender o âmbito de incidência do IS em função do domicílio do mutuário, pretendendo, assim, prevenir as situações em que, sendo os fundos disponibilizados no estrangeiro a entidades residentes em Portugal, se evitasse o pagamento do imposto pela facilidade de manipular a regra de incidência.
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Daí que as regras de incidência do CIS, como de resto se verifica nos impostos sobre o rendimento, sejam completadas por regras de extensão da territorialidade, que, no caso do CIS, constam das várias alíneas do n.º 2 do artigo 4.º.
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É justamente o caso da alínea b) do n.º 2 do artigo 4.º que dispõe que são ainda sujeitos a imposto: “As operações de crédito realizadas e as garantias prestadas por instituições de crédito, por sociedades financeiras ou por quaisquer outras entidades, independentemente da sua natureza, sediadas no estrangeiro, por filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito, de sociedades financeiras, ou quaisquer outras entidades, sediadas em território nacional, a quaisquer entidades, independentemente da sua natureza, domiciliadas neste território, considerando-se domicílio a sede, filial, sucursal ou estabelecimento estável”.
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A referida norma vem determinar a incidência do IS sobre todas as operações de crédito em que o mutuário – e não o mutuante – é entidade domiciliada em território nacional, independentemente do local da utilização dos fundos, referindo-se a lei expressamente “a quaisquer entidades (…) domiciliadas neste território” (e não “por quaisquer entidades (…) domiciliadas neste território”).
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O preceito em questão veio garantir a incidência de IS sobre todas as operações de crédito em que, em termos normais, o mutuário utilizaria o crédito em território nacional por ter aqui a sua atividade – i.e., existindo uma conexão com o território nacional por parte da entidade sobre a qual recai o encargo fiscal, justificar-se-ia o poder tributário exercido, ainda quando essa entidade fosse não residente.
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Só isto pode justificar o sentido da alteração da alínea b) do n.º 2 do artigo 4.º do CIS, efetuada pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de dezembro (que aprovou o Orçamento do Estado para 2002).
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Assim, não se nega que a lei permite a tributação da utilização de crédito por entidades não residentes em território nacional desde que ocorrida em território nacional. Mas já se nega que permita a tributação da utilização de crédito por entidades não residentes, quando essa utilização ocorra fora do território nacional.
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E, no caso sub judice, é inequívoco que a utilização dos fundos se consumou em França e não em Portugal.
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Tal resultou comprovado, em primeiro lugar, pela prova documental junta com o requerimento submetido em 04.12.2023 (a qual demonstra o circuito de fundos, i.e., que os mesmos são remetidos diariamente da Requerente para a conta, em França, da B… e que esta entidade, por sua vez, remete, também, numa base diária estes montantes para a conta, em França, da holding do Grupo – C… SE) e, em segundo lugar, pela explicação prestada pela testemunha inquirida nos autos (a qual salientou que todos os valores do cash pooling são remetidos pela Requerente para a B… (França), a qual, por sua vez, remete para a C… SE.
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Note-se, neste contexto, que não se pode aplicar ao cash pooling uma lógica de mútuo tradicional, i.e., uma lógica de financiamento para a aquisição de um bem e/ou de um serviço específico e identificável. Dado que aqui trata-se de concentrar saldos, que podem ter sentido positivo ou negativo.
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Por outras palavras, e atenta a lógica do cash pooling, os saldos remetidos pela Requerente para a B… não são utilizados por esta para comprar diretamente bens ou serviços, sendo antes usados para “zerar” as posições do Grupo, mas tal não impede a conclusão de que a utilização ocorre em França, dado que é neste país que os valores são recebidos.
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Com efeito, o que releva para aferir a utilização não é o concreto fim a que os fundos são alocados, mas antes saber onde é que estes fundos entram na posse e livre disposição da entidade mutuária mediante a receção na respetiva conta bancária e, consequentemente, saber se tal facto ocorre ou não em Portugal.
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Mas ainda que assim não se entendesse – e se exigisse que os valores fossem “utilizados” (aqui não no sentido legal de utilização consagrado nas regras do IS, mas sim no sentido de gastos) fora de Portugal, sempre importaria recordar que todos estes valores remetidos da Requerente para a B… são imediatamente transferidos desta para a C… SE.
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Em suma, a utilização dos fundos não ocorre em Portugal, dado que os fundos são recebidos em França e são depois utilizados pela B… quando esta decide remeter os mesmos para a C… SE, também esta localizada em França, pelo que não se pode considerar que a operação de crédito aqui em causa está sujeita a IS.
Do alcance das isenções das alíneas g), h) e i) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 7.º da TGIS e da violação do Direito da União Europeia
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Mesmo que se considerasse que o simples facto de o concedente do crédito ser entidade domiciliada em Portugal chegaria para localizar o facto tributário em Portugal, ainda assim haveria que concluir que estas operações de crédito estariam isentas de tributação.
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Isto porque, nos termos do disposto nas alíneas g) e h) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS, conjugadas com o n.º 2 do mesmo artigo, há uma restrição injustificada à liberdade de movimentos de capitais garantida pelo artigo 63.º do TFUE.
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Com efeito, e da conjugação das disposições referidas no ponto anterior resulta que sempre que o mutuário se encontre na União Europeia e o mutuante em Portugal, os mutuários residentes naquele Estado-Membro são privados da possibilidade de beneficiarem de uma isenção de tributação por força do disposto no artigo 7.º, n.º 2, do CIS.
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Por oposição, quando um devedor residente em Portugal (mutuário) contrata um mútuo junto de uma entidade residente na União Europeia (mutuante) ou junto de uma entidade residente em Portugal, há lugar à aplicação da isenção (cfr. artigo 7.º, n.º 1, alínea g), e n.º 2 do CIS).
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Ou seja, uma entidade residente na União Europeia que contrate um mútuo com uma entidade portuguesa (figurando como devedor) vê-se privada da possibilidade de beneficiar de uma isenção, sendo onerada com o encargo de um imposto, imposto esse que não é exigido a um devedor residente em Portugal que contrate um mútuo junto de uma entidade residente na União Europeia ou junto de uma entidade residente em Portugal, sendo claro o tratamento diferenciado, com possível violação da liberdade de estabelecimento e restrição aos movimentos de capitais.
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E tal restrição não é uma restrição admitida nos termos do artigo 65.º do TFUE na medida em que tem de se concluir pela comparabilidade das situações, não existindo aqui qualquer razão de interesse geral, nem qualquer outra razão de interesse público, que possa justificar a referida discriminação.
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E, ainda que exista a possibilidade de deduzir o IS como gasto fiscal, ao abrigo das leis fiscais francesas, esta dedução não se traduz numa recuperação total deste imposto, não sendo o efeito discriminatório eliminado, nem sequer mitigado, mesmo que a Requerente tivesse provado que o IS devido em Portugal pela obtenção do crédito não pudesse ser neutralizado pela B…, à luz da lei francesa, dado que, alterando apenas a localização da operação para Portugal, a solução seria diferente.
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O entendimento de que a exclusão de aplicação da isenção a entidades devedoras residentes na União Europeia constitui uma restrição injustificada à liberdade de circulação de capitais e um tratamento discriminatório dos não residentes, foi expressamente reconhecido pelo próprio legislador que, através da Lei n.º 12/2022, de 27 de janeiro (que aprovou o Orçamento do Estado para 2022), alterou a redação do artigo 7.º, n.º 2, do CIS, a qual passou a fazer referência ao credor e devedor, assim estendendo a isenção aos devedores não residentes.
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Tal alteração legislativa é, por si só, demonstrativa da desconformidade da redação anterior com o Direito da União Europeia.
Da inexistência de financiamento externo alocado ao Cashpooling
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A exclusão constante do artigo 7.º, n.º 2, do CIS significa que a isenção não se aplica se “o credor tiver previamente realizado os financiamentos previstos nas alíneas g) e h), do n.º 1 através de operações realizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrageiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no território nacional”.
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Os únicos financiamentos que a Requerente obteve fora do contexto do cash pooling reportam-se a financiamentos concedidos (i) pelo IAPMEI para a implementação de um projeto de investimento e (ii) pelo D… no âmbito da Linha de Apoio à Economia Covid-19. Para além destes, a Requerente recorre também ao factoring, o qual é meramente operacional e visa apenas adiantar recebimentos de clientes, não relevando para este caso dado que se tratam de contratos de locação para edifícios, equipamentos e viaturas usados na atividade da Requerente.
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Quanto ao financiamento concedido pelo IAPMEI, o mesmo não revela para este caso dado que a norma (artigo 7.º, n.º 2, do CIS), apenas alude “a operações realizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no território nacional” e o IAPMEI não possui natureza de entidade financeira. E, caso assim não se entenda, esclareça-se que o financiamento concedido por tal entidade é um incentivo que se destina a ser utilizado na execução de um projeto de investimento devidamente aprovado pelo IAPMEI.
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No que se refere ao financiamento obtido junto do Banco D…, o mesmo foi obtido ao abrigo da Linha de Apoio à Economia Covid – 19 – Empresas Exportadores da Indústria e Turismo. Este financiamento que é absolutamente excecional e único – tanto assim é que é gerido pelo Banco E… – e em nada se confunde com os excedentes remetidos ao abrigo do contrato de cashpooling, o qual tem uma natureza e funcionamento totalmente distintos.
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Para além de que o valor daqueles financiamentos é, manifestamente, residual face aos valores do cashpooling, não servindo, de forma alguma, para financiar este.
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Mais se refira que a citada norma não impede a Requerente de recorrer a financiamento bancário para a sua atividade ou para um determinado projeto, mas apenas de se financiar para, ato subsequente, financiar o grupo com os mesmos montantes, o que não aconteceu no caso em análise.
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Resulta provado, através dos documentos juntos aos autos e da prova testemunhal produzida, que os valores mutuados no contexto do cash pooling não foram realizados através de operações realizadas com instituições de crédito ou sociedades financiadas sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no território nacional.
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Não obstante, sempre se dirá que a parte final do artigo 7.º, n.º 2, do CIS apenas se aplica quando o credor do empréstimo é residente na União Europeia e o devedor do crédito é residente em Portugal – o que não é aqui o caso.
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Por outro lado, a referida prova apenas deve ser efetuada quanto à própria Requerente, dado que as autoliquidações ora contestadas apenas se reportam a situações em que a Requerente figura como credora por remeter excedentes para a B…. No entanto, e caso assim não se entenda, também ficou provado, mediante a documentação junta aos autos, que as entidades que centralizam os saldos na aqui Requerente (A… Lda; F… –Unipessoal, Lda.; G… Lda. e H… –Unipessoal Lda.), ou não possuem financiamento bancário (mas apenas financiamento no contexto de certos projetos de investimento) ou possuem apenas um financiamento extraordinário, de caráter único concedido no âmbito da linha de apoio à economia Covid-19.
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Por sua vez, a AT defendeu-se por impugnação, em síntese, nos seguintes termos:
Da alegada sujeição ao Imposto do Selo das transferências efetuadas pela Requerente no âmbito da execução do contrato de cash pooling a favor da B… (sedeada em França)
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Atendendo à factualidade assente, não suscita quaisquer dúvidas que os “empréstimos” em causa foram concedidos em Portugal apesar do destinatário dos mesmos ter residência fora deste território, pelo que, competia à Requerente, enquanto entidade concedente do crédito e sujeito passivo do imposto, liquidar, cobrar e entregar nos cofres do Estado o imposto repercutido à B…, sedeada em França, conforme decorre da alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º, da alínea f) do n.º 3 do artigo 3.º, da alínea g) do artigo 5.º, do n.º 1 do artigo 9.º, do n.º 1 do artigo 22.º, do n.º 1 do artigo 23.º, dos artigos 41.° e 43.°, e do n.º 1 do artigo 44.º, todos do CIS.
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Não é de acolher a argumentação desenvolvida pela Requerente no sentido de que não estão abrangidas pelo campo de incidência do IS as utilizações de crédito concedido que ocorram fora de Portugal por um mutuário que não seja aqui residente, como no caso sob apreço; ou por outras palavras, para a Requerente só há incidência de Imposto do Selo quando a utilização do crédito concedido ocorra em território nacional.
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Não se retira da conjugação das regras de incidência objetiva, previstas na verba 17.1 da TGIS, nem da territorial, prevista no artigo 4.º do CIS, em especial do seu n.º 1, ou até da alínea b) do seu n.º 2, que o legislador tenha alguma vez desejado que os empréstimos concedidos por uma sociedade residente em território nacional em favor da sua sociedade-mãe não residente, constituíssem operações financeiras não sujeitas a IS pelo simples facto de esta ter o seu domicílio fiscal no estrangeiro.
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Se acolhêssemos o entendimento da Requerente distinguindo, para efeitos de sujeição, os fluxos financeiros (concessão/utilização de crédito) realizados exclusivamente entre sociedades com sede ou direção efetiva em território nacional e entre estas e sociedades com sede ou direção efetiva no estrangeiro estaríamos a discriminar fiscalmente umas em favor de outras, ofendendo o princípio da igualdade de tratamento, da capacidade contributiva e a provocar, por essa via, uma distorção da concorrência, desconsiderando o princípio da neutralidade fiscal.
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Efetivamente, perante fluxos financeiros materialmente idênticos aos aqui contestados, as sociedades residentes beneficiárias de crédito estariam sempre sujeitas ao pagamento de IS, ao passo que as não residentes beneficiárias de crédito, como no presente caso, não estariam sequer sujeitas, independentemente do local de utilização efetiva desses fundos que poderia até ocorrer em território nacional.
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Com efeito, no que respeita ao modo de determinação da matéria coletável e taxa aplicável às operações financeiras, o CIS equipara-as, não estabelecendo qualquer diferença de tratamento entre elas, garantindo as mesmas condições fiscais entre fluxos financeiros realizados entre sociedade residentes, entre sociedades não residentes e residentes e entre estas e sociedades não residentes, como sucede no presente caso.
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Nesta medida, para efeitos de sujeição, não se discrimina nenhuma entidade, uma vez que estas normas de incidência relativas ao IS são aplicadas indistintamente a todas as operações financeiras legalmente previstas, sem discriminação em função da nacionalidade, território ou tipo societário das entidades nelas envolvidas.
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Acresce que, em parte nenhuma do CIS o legislador releva o local da prestação pecuniária. O legislador relevou, expressamente, e apenas, o local onde as operações – neste caso, de concessão de crédito – foram efetuadas (cfr. n.º 1 do artigo 4.º do CIS).
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Repare-se que, se seguíssemos o entendimento da Requerente, qualquer emigrante que recorresse a um financiamento junto de um banco português para adquirir um imóvel em Portugal nunca estaria sujeito a IS pelo crédito concedido porque a sua residência é no estrangeiro, independentemente do mútuo obtido ter sido efetivamente cá utilizado. Ou bastaria que uma empresa nacional constituísse uma empresa veículo no estrangeiro para passar a estar fora da incidência do imposto devido pela verba 17.1 da TGIS.
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Ora, tal entendimento não pode proceder, por carecer de total apoio literal, sistemático, teleológico e estar totalmente contra o espírito da Lei, a que se soma a circunstância de poder configurar, inclusive, uma descarada violação do artigo 110.º do TFUE.
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De onde, somos a concluir que a pretensão da Requerente – isto é, que não há sujeição a IS quando a sociedade devedora do crédito concedido em Portugal está sedeada em França e esses mesmos créditos são (alegadamente) utilizados fora de território nacional – não pode proceder.
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Ao que vem dito acresce que, em sítio nenhum, a Requerente prova que o crédito obtido pela B…, sedeada em França, é, efetivamente, e em todas as situações, utilizado fora de Portugal. Aliás, diga-se de passagem, que essa situação, num contrato de cash pooling, afigura-se bastante improvável de acontecer, na medida em que os fluxos ascendentes e descendentes, isto é, de e para a Requerente, acorrem numa base diária.
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À luz do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 28-11-2018, no âmbito do processo n.º 06/11.4BESNT 0436/16, dever-se-á considerar que, embora para efeitos do CIS, o titular do interesse económico, sobre quem recai o encargo do Imposto do Selo, seja o utilizador do crédito, nos termos da alínea f) do n.º 3 do artigo 3.º do CIS, o facto tributário é a concessão de crédito, o que decorre do próprio texto daquela alínea ao referir que se considera titular do interesse económico “na concessão do crédito, o utilizador do crédito”, e não “na utilização do crédito, o utilizador do crédito”, como seria adequado se o facto tributário fosse a utilização.
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No mesmo sentido de o facto tributário ser a concessão do crédito aponta a globalidade do regime legal, ao considerar sujeito passivo quem concede o crédito, de harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 2.º do CIS, incumbindo-o da liquidação do IS devido por operações de crédito (nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do CIS) e impondo-lhe a obrigação de efetuar o seu pagamento (cf. artigo 41.º do CIS).
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O facto de apenas haver lugar a tributação quando o crédito concedido for utilizado, que resulta da verba 17.1 da TGIS, não obsta ao entendimento do legislador, e que está também presente no citado acórdão do STA, de que as “operações financeiras” que se pretendem tributar são as de concessão de crédito, mas que apenas se consideram concretizadas no momento em que o crédito concedido é utilizado.
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Isto é, o facto tributário a que se referem as verbas que compõem a verba 17.1 da TGIS é constituído pela “utilização de crédito (...) em virtude da concessão de crédito”. Ou seja, imposto incide sobre a utilização do crédito em resultado de uma operação de concessão de crédito, sendo esta operação financeira que é objeto de incidência no âmbito de todas as situações previstas na verba 17. da TGIS.
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Em suma, a conexão relevante para aferir a incidência territorial do IS, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 4.º do CIS, é o local da concessão do crédito, independentemente da residência do seu utilizador, local esse que determinava à Requerente o dever de liquidar o imposto devido pelas transferências de fundos que realizou para a B…, entidade gestora/mutuária com sede em França, no âmbito da execução do contrato de cash pooling em causa.
Da alegada violação do Direito da União Europeia
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No presente caso estamos perante o IS, um imposto cuja competência é exclusiva dos Estados-Membros no âmbito da sua soberania fiscal e para o qual não existem regras harmonizadas ao nível da União Europeia. Ou seja, nas palavras da doutrina, “os Estados podem excluí-la ou limitá-la quando os pagamentos ou movimentos de capitais visem domínios em que a União Europeia não dispõe de competência para intervir.”
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Tendo isto presente importa então perceber em que medida a invocada diferença de tratamento no acesso à isenção, estabelecida no n.º 2 do artigo 7.º do CIS, atinge a beneficiária francesa do crédito concedido pela Requerente, constituindo assim uma restrição da liberdade de circulação de capitais e uma discriminação arbitrária entre residentes e não residentes.
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Quanto a nós essa diferença não constitui uma restrição nem uma discriminação no acesso à isenção, porquanto a limitação estabelecida n.º 2 do artigo 7.º do CIS só se aplica ao IS incidente sobre empréstimos realizados entre sociedades. É o que decorre da sua conjugação com as alíneas g) e h) do n.º 1 e com o n.º 8 do mesmo preceito legal.
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Significa isto que uma liquidação de IS efetuada sobre um crédito concedido, como o do caso sub judice, pode ser neutralizada pela devedora/mutuária ao abrigo de uma norma equivalente ao n.º 1 do artigo 23.º do nosso CIRC.
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Embora não conhecendo em concreto o sistema fiscal francês, nomeadamente o método de dedução de todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos ao “l’impôt sur les sociétés”, quer-nos parecer que o mesmo não andará longe do que vigora em Portugal, na medida que estamos perante um país que, para além de fazer parte da União-Europeia, pertence também à OCDE.
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Assim sendo, consideramos que só se estaria perante uma situação suscetível de constituir uma violação da livre circulação de capitais se o IS devido em Portugal pela obtenção do crédito junto da Requerente não pudesse ser neutralizado pela B…, entidade gestora/mutuária com sede em França, ao abrigo das leis francesas.
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No caso concreto, impendia sobre a Requerente, de acordo com as regras do ónus da prova previsto no n.º 1 do artigo 74.º da LGT, demonstrar que o IS repercutido à B… pela utilização de crédito concedido em Portugal, não era dedutível ao abrigo das leis fiscais francesas, nomeadamente as que regulam o imposto sobre as sociedades (l’impôt sur les sociétés), imposto equivalente ao nosso IRC.
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Sucede que, a Requerente não faz prova de que o IS em causa não se qualifica para efeitos de dedutibilidade, não permitindo por isso a sua eliminação ou atenuação.
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Pelo contrário, percorrida a petição, na parte referente a esta temática, a Requerente limita-se a afirmar que “é, então forçoso concluir que a presente medida constitui uma restrição da liberdade de circulação de capitais e uma discriminação arbitrária entre residentes e não residentes”, não concretizando em momento algum de que forma essa restrição e discriminação arbitrária se reflete no sistema francês, isto é, demonstrando a impossibilidade da B… poder neutralizar o imposto pago em Portugal, devido nos termos do CIS pela obtenção de crédito neste território.
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Ou seja, não chega afirmar em abstrato que o n.º 2 do artigo 7.º do CIS constitui uma restrição à livre circulação de capitais, consubstanciada na tributação da entidade devedora/ beneficiária do crédito não residente.
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Por outras palavras, para que se possa concluir no sentido da existência de uma eventual restrição à livre circulação de capitais e do carácter potencialmente discriminatório do n.º 2 do artigo 7.º do CIS, que sujeita a tributação as transferências financeiras realizadas entre sociedades residentes e não residentes, afastando estas últimas da isenção, teria de ficar demonstrado que o IS suportado em Portugal pelas operações de financiamento em causa, tributadas ao abrigo da verba 17.1.(4) da TGIS, originou uma tributação cuja dedução ao lucro tributável é impossível de concretizar pelas sociedades não residentes beneficiárias dos empréstimos concedidos por sociedades residentes.
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Em face disto, consideramos que o n.º 2 do artigo 7.º do CIS, ao impor uma limitação ao benefício das isenções previstas na alínea g) e h) do n.º 1 do mesmo preceito legal para sociedades não residentes, não constitui uma restrição da liberdade de circulação de capitais e uma discriminação arbitrária entre residentes e não residentes, porquanto, tratando-se de uma isenção exclusivamente aplicada a empresas, os gastos e custos suportados a título de IS devido pela concessão de crédito poderiam, em condições normais e análogas ao nosso IRC, ser dedutíveis pela B… ao imposto sobre as sociedades (l’impôt sur les sociétés) vigente em França.
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Assim, inexistia à data dos factos tributários sob apreço qualquer desconformidade entre o n.º 2 do artigo 7.º do CIS com o regime da liberdade de circulação de capitais consagrado no TFUE, soçobrando assim qualquer pretensão em torno de uma alegada ilegalidade decorrente da violação do primado do direito europeu deste preceito legal do CIS, quando interpretado no sentido de excluir do beneficio da isenção as sociedades não residentes beneficiárias de empréstimos concedidos por sociedades residentes no âmbito da execução de um acordo de gestão centralizada de tesouraria.
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SANEAMENTO
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O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.
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As partes gozam de personalidade, capacidade judiciária, legitimidade processual e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
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Não foram suscitadas exceções de que deva conhecer-se. O processo não enferma de nulidades. Inexiste, deste modo, quaisquer obstáculos à apreciação do mérito da causa.
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MATÉRIA DE FACTO
FACTOS PROVADOS
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Com relevo para a apreciação e decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
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A Requerente é uma sociedade comercial que se dedica à atividade de produção e comercialização de capas, espumas, estofos e estruturas metálicas para assentos de automóveis (C.A.E. 29320 – R3) (Cfr. Processo administrativo, doravante “PA”).
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No ano de 2021, o capital social da Requerente era detido por sociedades do mesmo Grupo de empresas (Grupo C…): B… S.A. (99,99%) e I…, S.A. (0,01%), ambas sediadas em França (Cfr. PA).
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Em 23.02.2000, foi celebrada a “Convention d’Omnium”, entre a sociedade I… e as entidades aderentes do grupo, a qual se destinava a pôr em prática um acordo de cash pooling destinado a assegurar a gestão de tesouraria das diferentes entidades do Grupo C… localizadas em diferentes jurisdições (Cfr. Documento n.º 14 junto ao PPA).
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Em 08.06.2009, a sociedade I… sentiu necessidade de otimizar o acordo de cash pooling que se encontrava em vigor, tendo, para o efeito, celebrado com a instituição financeira J… S.A., o “K…” (Cfr. Documento n.º 15 junto ao PPA).
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Tal acordo, referido em D., visou contratualizar a prestação, pelo J…, de um serviço de centralização da gestão de tesouraria do Grupo que procurava nivelar os saldos das diferentes contas (classificadas como principal, secundárias ou intermediárias) (Cfr. Documento n.º 15 junto ao PPA).
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A Requerente aderiu a este acordo de cash pooling do grupo em 20.07.2010 através do “Bulletin d’Adhèsion” (Cfr. Documento n.º 16 junto ao PPA).
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Em 30.12.2010, a Requerente, a I… e a B… celebraram um contrato de cessão de posição contratual/cedência de crédito (Cfr. Documento n.º 17 junto ao PPA), nos termos do qual:
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A B… e a Requerente assinaram um novo contrato de empréstimo com efeitos a 01.01.2011, no qual a Requerente figurava como mutuante e a B… como mutuária;
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A I… transferiu para a B… os direitos e obrigações resultantes da “Convention d’Omnium”.
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Nos termos do contrato de crédito, celebrado em 01.01.2011, entre a aqui Requerente e a B…, a primeira concedeu um empréstimo à segunda na modalidade de crédito rotativo de um ano, no montante máximo de € 65.000.000,00, tendo, ademais, sido acordado o pagamento de juros, à taxa média da Euribor a 1 mês, arredondada para 1/16 de 1% adicionada de uma margem de 0,5% ao ano, calculados no fim de cada mês com base na utilização mensal de crédito (Cfr. Documento n.º 18 junto ao PPA).
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Tal contrato, referido em H., foi objeto de várias alterações posteriores, em particular:
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Em 01.01.2013, a “Amendment 2 to the loan agreement dated as of January 1st 2011” (Cfr. Documento n.º 19 junto ao PPA), que visou alargar o período do contrato de 01.01.2013 para 01.01.2015;
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Em 03.12.2013, a “Amendment 3 to the loan agreement dated as of January 1st 2011” (Cfr. Documento n.º 20 junto ao PPA), que alterou o montante máximo do empréstimo de € 65.000.000,00 para € 100.000.000,00;
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Em 01.10.2014, a “Amendment 4 to the loan agreement dated as of January 1st 2011” (Cfr. Documento n.º 21 junto ao PPA), que alterou o montante máximo do empréstimo de € 100.000.000,00 para € 200.000.000,00; e
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Em 31.12.2014, a “Amendment 5 to the loan agreement dated as of January 1st 2011” (Cfr. Documento n.º 22 junto ao PPA), que alargou o período do contrato de 01.01.2015 para 01.01.2017.
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De forma a concretizar a adesão da Requerente ao contrato de cash pooling do Grupo, foi ainda necessário introduzir alterações ao “K…”, através dos seguintes documentos:
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“Appendix 2 – Participation form to the K…”, celebrado em 15.05.2012 (Cfr. Documento n.º 23 junto ao PPA), segundo o qual a Requerente foi incluída no acordo celebrado com o J…;
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“Appendix 1 – Automated Centralization of Cash Management per hierarchy”, celebrado em 23.05.2012 (Cfr. Documento n.º 24 junto ao PPA);
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Mais tarde, em 12.09.2014, o “Appendix 1.1. – Description of the Hierarchy”, no qual é identificada a Master Account no contrato de cash pooling (localizada em França), bem como as Intermediate Accounts, entre elas a da aqui Requerente (localizada em Portugal).
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No âmbito da execução dos diferentes contratos acima enunciados, os excedentes de tesouraria gerados pelas diferentes entidades do Grupo C… eram transferidos para a conta da Requerente, a qual os transferia para a conta, em França, da B…, a qual, por sua vez, os transferia, para a conta, em França, da holding do Grupo – a C… SE) (Cfr. Documentos juntos ao requerimento apresentado em 04.12.2023 pela Requerente, e depoimento da testemunha inquirida na reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, realizada a 23.01.2024).
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A Requerente adotou, em todo o ano de 2021, uma posição credora no âmbito do contrato de cash pooling, tendo os juros calculados mensalmente no âmbito do referido acordo (em 01-01-2021, 01-02-2021, 01-03-2021, 01-04-2021, 30-04-2021, 31-07-2021, 01-08-2021, 30-10-2021, 30-11-2021 e 31-12-2021) sido pagos à Requerente (sediada em Portugal) pela B… (sediada em França) (Cfr. Documentos juntos ao requerimento apresentado em 04.12.2023 pela Requerente, e depoimento da testemunha inquirida na reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, realizada a 23.01.2024).
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Os valores mutuados no contexto do sistema cash pooling não foram realizados através de operações concretizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financiadas sediadas no território nacional (Cfr. Documentos n.ºs 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34 juntos ao PPA e depoimento da testemunha inquirida na reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, realizada a 23.01.2024).
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A Requerente foi objeto de quatro ações inspetivas de âmbito geral, desencadeada pelas Ordens de Serviço N.º OI2016…, de 18.04.2016, N.º OI2017…, de 11.09.2017, N.º OI2018…, de 02.03.2018, e N.º OI2019…, de 31.01.2019, que incidiram sobre os exercícios de 2014, 2015, 2016 e 2017, as quais originaram correções em sede de IS, na medida em que a AT considerou que as operações realizadas entre a Requerente e a B… (sedeada em França), no âmbito do contrato de cash pooling do Grupo C…, consubstanciam operações financeiras sujeitas e não isentas de IS (Cfr. PA).
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A Requerente, por não concordar com as correções efetuadas pela AT acima referidas e, não obstante ter pago, dentro do prazo concedido para o efeito, o imposto e os juros apurados, contestou os referidos atos tributários, com fundamento na sua ilegalidade (Cfr. PA).
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De modo a evitar futuras ações inspetivas, a Requerente procedeu às autoliquidações de IS ora em apreço, referentes ao período de janeiro a dezembro de 2021, relativas às operações financeiras aqui em análise (Cfr. Documentos n.ºs 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11 e 12 juntos ao PPA).
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A Requerente apresentou, em 26.01.2023, reclamação graciosa das autoliquidações aqui contestadas, nos termos do artigo 132.º, do CPPT (Cfr. Documento n.º 13 junto ao PPA).
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A Requerente foi notificada, através do ofício n.º …-DJT, de 08.03.2023, do projeto de indeferimento da reclamação graciosa, que foi autuada com o n.º …, tendo exercido, em 30.03.2023, o seu direito de audição prévia, nos termos do artigo 60.º da LGT (Cfr. Páginas n.ºs 251 a 271 e 275 a 287 do PA junto aos autos).
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Em 10.04.2023, foi a Requerente notificada, através do Ofício n.º …-DJT/2023, de 04.04.2023, da decisão final de indeferimento da reclamação graciosa, assente nos fundamentos contidos no projeto de indeferimento, a saber:
(Cfr. Documento n.º 13 junto ao PPA).
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A Requerente apresentou o PPA que deu origem ao presente processo arbitral em 10.07.2023 (Cfr. Sistema informático do CAAD).
FACTOS NÃO PROVADOS
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Os factos dados como provados são aqueles que o Tribunal Arbitral considera relevantes, não se considerando factualidade dada como não provada que tenha interesse para a decisão.
FUNDAMENTAÇÃO DA FIXAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
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Ao Tribunal incumbe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão, discriminar a matéria que julga provada e declarar, se for o caso, a que considera não provada, não tendo de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre dos termos conjugados do artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e do artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.
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Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram assim selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é definida tendo em conta as várias soluções plausíveis das questões de direito para o objeto do litígio, tal como resulta do artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
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Segundo o princípio da livre apreciação dos factos, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação aos factos alegados pelas partes, na sua íntima e prudente convicção, formada a partir do exame e avaliação dos meios de prova trazidos ao processo, e de acordo com as regras da experiência (cf. artigo 16.º, alínea e), do RJAT, e artigo 607.º, n.º 4, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
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Somente relativamente a factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, a factos que só possam ser provados por documentos, a factos que estejam plenamente provados por documentos, acordo ou confissão, ou quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g., força probatória plena dos documentos autênticos, cfr. artigo 371.º do Código Civil), é que não domina, na apreciação das provas produzidas, o referido princípio da livre apreciação (cf. artigo 607.º, n.º 5, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
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O Tribunal arbitral considera provados, com relevo para a decisão da causa, os factos acima elencados e dados como assentes, tendo por base a análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, da prova testemunhal produzida, dos factos alegados pelas partes que não foram impugnados e a adequada ponderação dos mesmos à luz das regras da racionalidade, da lógica e da experiência comum, e segundo juízos de normalidade e razoabilidade.
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Na reunião do artigo 18.º do RJAT que teve lugar no dia 23.01.2024, Tribunal Arbitral ouviu o testemunho de L…, responsável da tesouraria da Requerente, que descreveu os movimentos de tesouraria operados em virtude do acordo de cash pooling, confirmando que a Requerente remete todos os saldos para a sociedade-mãe em França (B…), que, por sua vez, remete os ditos saldos para outra sociedade em França, a C… SE, e que, no final de cada mês, tendo em conta os saldos apurados, são calculados os juros devidos. A testemunha explicou os movimentos contabilísticos operados e os movimentos registados nos extratos bancários da Requerente, demonstrando ter conhecimento direto dos factos. O Tribunal Arbitral considera que a testemunha prestou o seu depoimento com isenção e não vê motivo para questionar a veracidade do mesmo.
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Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.
V. MATÉRIA DE DIREITO
§1. Questões a decidir
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O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado na sequência do indeferimento expresso da reclamação graciosa autuada com o n.º … deduzida contra as autoliquidações de IS (Verba 17.1.4 da TGIS – operações financeiras), n.ºs …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, respeitantes ao período de janeiro a dezembro de 2021, no valor total de € 67.503,38 (sessenta e sete mil quinhentos e três euros e trinta e oito cêntimos).
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Considerando a factualidade exposta, bem como os fundamentos aduzidos na decisão final de indeferimento da reclamação graciosa e, ainda, as pretensões e posições da Requerente e da Requerida constantes das suas peças processuais, cumpre ao Tribunal Arbitral apreciar as seguintes questões:
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Se a utilização de crédito, no âmbito de um contrato de centralização de tesouraria (contrato de cash pooling), concedido pela Requerente (entidade residente em território Português) à B… (entidade residente em França) se encontra sujeito a IS em Portugal, ao abrigo do disposto na Verba 17.1.4 da TGIS;
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Se, em caso de aplicação do IS à aludida utilização de crédito, o empréstimo concedido pela Requerente à B… beneficia de isenção (Cfr. alíneas h) e g) do n.º 1 e no n.º 2, do artigo 7.º do CIS), em conformidade com o Direito da União Europeia;
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Se a Requerente tinha o ónus de provar que a linha de crédito que disponibilizou à B… não tinha origem em fluxos financeiros exteriores ao grupo, nos termos do n.º 2 do artigo 7.º, do CIS;
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Dos juros indemnizatórios.
§2. Do Princípio da Territorialidade (artigo 4.º do CIS)
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As operações financeiras realizadas entre a Requerente (sediada em Portugal), na qualidade de concedente do crédito, e a B… (sediada em França), na qualidade de devedora, assentam num contrato de gestão centralizada de tesouraria entre um grupo de empresas (Grupo C…), internacionalmente designado por contrato de cash pooling.
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O sistema de cash pooling traduz-se “num serviço financeiro que poderá ser utilizado entre contas bancárias de uma só empresa, ou entre contas bancárias de várias empresas do mesmo grupo, tratando-se da gestão conjunta desses capitais na vertente da rendibilidade do capital. Ou seja, mediante excedentes de tesouraria que existam de forma dispersa em várias contas, e/ou carências de tesouraria noutras contas, ou outras necessidades de financiamento, poderá proceder-se à sua gestão conjunta e possibilitar a concessão de créditos entre empresas do grupo” (cfr. Decisão Arbitral datada em 04.11.2021, proferida no processo n.º 280/2020).
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Como esclarece o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 03.12.2015, proferido no processo 06974/13: “Uma convenção de gestão de tesouraria é normalmente firmada entre empresas do mesmo grupo económico, locais (residentes) e no estrangeiro (não residentes), e a partir do qual a gestão da tesouraria é efetuada de maneira lógica centralizada. Assim, tal convenção é caracterizada, entre outros, pelos seguintes aspetos:
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Definição de uma entidade centralizadora e dos participantes (aderentes);
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Definição de regras e procedimentos de gestão de tesouraria a acordar com as instituições financeiras, segundo os quais os excedentes de tesouraria (a) são mantidos nas contas de cada empresa, ainda que com fusão para cálculos dos juros (notional cash pooling) ou (b) transferidos para a entidade centralizadora (zero balancing);
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Pelo mecanismo inverso, e em contrapartida, as necessidades financeiras de cada participante serão cobertas pela transferência de fundos da entidade centralizadora;
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Por princípio, será da responsabilidade da entidade centralizadora, a negociação de recursos globais e das aplicações dos excedentes globais;
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Os saldos dos fluxos são suscetíveis de gerar juros (a favor ou contra) para cada participante.
(...)
Na modalidade de Cash concentration, a centralização de tesouraria é operada em conta da entidade centralizadora constituída junto do Banco, sendo titular uma das sociedades do grupo (a entidade centralizadora). Tendo por base o enquadramento do contrato de centralização de tesouraria, realizam-se efetivas transferências de capital para a conta global, ou seja, os fundos são fisicamente direcionados para uma única conta bancária agregada. Nesta modalidade a denominada opção “zero balancing” é a mais comum, pois todas as contas bancárias são colocadas a zero no movimento de transferência para a conta global, consequentemente os saldos devedores são cobertos por um movimento de transferência inverso da conta global a favor da conta bancária devedora (cfr. José Fernando Abreu Rebouta, Contextualização fiscal da gestão centralizada de tesouraria – cash pooling – em ambiente internacional, Pós-Graduação em Direito Fiscal, Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Outubro de 2005, pág. 3 e seg.).”
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Não existindo dúvidas de que se realizaram várias operações de transferência de saldos da conta da Requerente (com residência em Portugal) para a conta da B… (com residência em França), no âmbito de um sistema de cash pooling, e de que ambas se encontram numa relação de domínio ou de grupo, importa saber se estas transações se encontram sujeitas a IS em Portugal.
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Na verdade, o thema decidendum, já foi objeto de algumas decisões de tribunais arbitrais, constituídos sobre a égide do CAAD, inclusive respeitantes às mesmas partes do presente processo arbitral, e em sentido divergente.
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Enquanto que nos processos n.ºs 61/2019-T, 280/2020-T, 277/2020-T e 57/2021-T, conclui-se pela procedência total do pedido (embora, com fundamentação distinta),[3] no processo n.º 279/2020-T decidiu-se, justamente, em sentido oposto.
Vejamos.
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Dispõe o artigo 1.º, n.º 1, do IS (“Incidência Objetiva”), que “O imposto do selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, livros, papéis, e outros factos previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens.”
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De harmonia com as Verbas 17.1 e 17.1.4, da Tabela Geral do Imposto do Selo, o imposto incide sobre a utilização do crédito, incluindo as operações de tesouraria que envolvam qualquer tipo de financiamento, sendo aplicável a taxa de 0,04% ao “Crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30”.
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Assim, as operações financeiras, nas quais se integram a concessão e utilização de crédito, a qualquer título, estão, por princípio, sujeitas a IS.
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Contudo, nos termos do n.º 1 do artigo 4.º do CIS (“Territorialidade”), pode ler-se que “Sem prejuízo das disposições do presente Código e da Tabela Geral em sentido diferente, o imposto do selo incide sobre todos os factos referidos no artigo 1.º ocorridos em território nacional.” Acrescenta a alínea b) do n.º 2 do mesmo artigo que são ainda sujeitas a imposto as “operações de crédito realizadas (...) por quaisquer entidades, independentemente da sua natureza, sediadas no estrangeiro, ou quaisquer (...) entidades, sediadas em território nacional, a quaisquer entidades, independentemente da sua natureza, domiciliadas neste território, considerando-se domicílio a sede, filial, sucursal ou estabelecimento estável.”
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Neste sentido, sustenta a Requerente que o facto tributário que predetermina a incidência do IS, mais exatamente da Verba 17.1.4 da TGIS (a efetiva utilização do crédito), só ocorre em território português se a utilização do crédito ocorrer, justamente, em território português.
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Mais precisamente, e nos dizeres da Requerente, “É, (...), necessário que a utilização de fundos se verifique em território nacional, isto é, que a receção do capital se realize numa conta bancária, ou noutro local convencionado pelas partes, em território português, para que se possa considerar que o facto tributário ocorreu em território nacional.”
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Ou seja, o entendimento defendido pela Requerente (que sufragamos) vai no sentido de que a sujeição a IS do crédito utilizado, no atual CIS, encontra-se subordinada à conexão que a situação apresente com o território nacional, sendo tal conexão determinada pelo local onde se verifica a utilização do crédito, por força do princípio da territorialidade.
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Logo, quando esteja em causa a concessão de crédito no quadro de uma relação de cash pooling, apenas será tributada a utilização de fundos consumada em território nacional.
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É este, aliás, o entendimento preconizado no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 25.03.2021, proferido no processo n.º 675/03.9BTLRS, que em parte transcrevemos:
“Nos termos do artigo 1.º do CIS, para determinar a relevância da tributação, em sede de imposto do selo, em sede das operações financeiras é relevante a “utilização de crédito”, ou seja, o momento em que se utilizam os fundos colocados à disposição de acordo com o contratado, o qual ocorre no local onde o seu utilizador recebe o capital.
(...)
No caso em análise, as utilizadoras dos créditos (sociedades brasileiras) são residentes fora do território de Portugal, pelo que, entendemos que nas operações em apreço, em que a utilização do crédito foi efetuada fora do território nacional, por entidades não residentes, não é devido imposto de selo, ao abrigo da regra da territorialidade.”
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E, mesmo que se chame à colação as regras de extensão da territorialidade, nomeadamente, a vertida na alínea b), do n.º 2, do artigo 4.º, do CIS, sempre se dirá que tal norma vem determinar a incidência do IS (sobre todas as operações de crédito), mas apenas nas situações em que o mutuário – e não o mutuante – é entidade domiciliada em território nacional.
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Neste sentido, veja-se a Decisão Arbitral datada de 17.01.2022, proferido no processo n.º 530/2020-T, no qual se pode ler:
“(...) atentas as regras de territorialidade previstas nas alíneas b) do n.º 2 do artigo 4.º do Código do Imposto, será tributada a utilização de crédito de empresa portuguesa proveniente de cedente/entidade não residente, por aplicação da verba 17.1.4 da TGIS. Esta verba tem por finalidade tributar operações de financiamento, cujo crédito seja utilizado sob a forma de conta corrente.
48. In casu, a entidade financiadora (mutante) é a Requerente e a entidade financiada é uma entidade com sede em França e utilizadora dos excedentes de tesouraria disponibilizados pela Requerente, que, sendo estrangeira, não está obrigada a imposto do selo à luz do direito português. Nesta medida, não se verificam os pressupostos de incidência subjetiva e geográfica do imposto do selo, em ordem a justificar a manutenção na ordem jurídica dos atos de autoliquidação impugnados.
49. Deste modo, ainda que a tributação em sede de imposto do selo se faça em função do contrato de concessão do crédito, o facto tributário não se formará se não se verificar a efetiva utilização do crédito atenta a regra da territorialidade previsto no artigo 4.º do CIS, a utilização do crédito ter-se-á que verificar em território nacional, independentemente da entidade cedente do crédito (credora) ser residente ou não residente em território nacional. Ora, in casu, a entidade utilizadora do crédito (devedora) não é residente em território nacional, pelo que não se encontram preenchidos os pressupostos da incidência do imposto do selo (...).”
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Também no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 14.03.2018, proferido no processo 0800/17, afirmou-se que:
“I- A concessão de crédito está sujeita a imposto do selo, qualquer que seja a natureza e forma, relevando, contudo, para o efeito a efetiva utilização do crédito concedido.
II- O facto tributário eleito para tributação em imposto de selo é, sempre, a concessão de crédito – prestação de valores monetários de uma parte a outra obrigando-se esta última a restituir aquele montante (em singelo ou acrescido de valor convencionado), no futuro –.
III- A mera celebração do contrato de concessão de crédito nem sempre gera facto tributário do imposto. Quando a utilização do crédito for imediata, o facto tributário emerge na data de utilização que coincide com a data de celebração do contrato de concessão de crédito.
IV- Quando a utilização do crédito não for imediata, o facto tributário emerge na data de utilização que não coincide com a data de celebração do contrato concessão de crédito.”
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Assim, por tudo quanto foi dito, é de concluir que a concessão de crédito (pela Requerente à B…), no quadro do sistema cashpooling, não será tributada em sede de IS, se a utilização de fundos tiver sido consumada fora do território português, o que, a nosso ver, resulta provado nos autos (Cfr. factos provados K e L), ao contrário do que entende a Requerida.
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De facto, temos para nós, que, em face dos elementos constantes do processo arbitral, não existem dúvidas que a utilização dos fundos se consuma em França e não em Portugal.
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A Requerente, no requerimento submetido em 04.12.2023, juntou aos autos cinco documentos: Documento n.º 1 – correspondente ao extrato da contabilidade da conta corrente entre a Requerente e a B… (França); Documento n.º 2 – correspondente ao extrato de controlo dos movimentos do cash pooling entre a Requerente e a B…; Documento n.º 3 – correspondente ao extrato de contabilidade da conta corrente da B…; Documento n.º 4 – correspondente aos extratos bancários da Requerente junto do J…, D… e M…; Documento n.º 5 – correspondente ao extratos bancários da B… junto do J… e M….
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Estes documentos foram analisados pela testemunha na reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, tendo a testemunha apresentado (sobre cada um) um exemplo de uma remessa de fundos entre as referidas entidades, nos seguintes termos:
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No Documento n.º 1, relativo ao extrato da contabilidade da conta corrente entre a Requerente e a B…, é possível identificar todos os movimentos entre estas entidades, sendo que, por exemplo, no dia 06.01.2021 ocorreu uma remessa para a B… de € 1.455.774,07. A referida operação tem um saldo devedor (da conta 26 – Acionistas), o que significa que se trata de valores que saíram da Requerente para aquela entidade:
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No Documento n.º 2, referente ao extrato de controlo dos movimentos do cash pooling, é possível também identificar essa mesma transferência para a B…sobre o descritivo “FR17PT01 cc FAA Port chez F. Invest” (conta corrente A… – abreviada como … – para a B… – abreviada como …):
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O Documento n.º 3, correspondente ao extrato de contabilidade da conta corrente da B… (França) com a C… SE (holding final do grupo localizada em França), demonstra a remessa, pela B…, daquele montante de € 1.455.774,07 para a C… SE:
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Os referidos movimentos contabilísticos encontram-se também comprovados pelos correspondentes movimentos bancários. Com efeito, decorre do Documento n.º 4, que corresponde aos extratos bancários da Requerente junto do J… que o referido montante saiu da conta da Requerente para a conta …[4] do J…, que pertence à B… (vd. página 63/221):
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Por sua vez, este valor foi recebido na conta da B… e posteriormente transferido para a C… SE, conforme decorre do Documento n.º 5 que é o extrato bancário da B… (França) junto do J…. Note-se que o referido documento claramente identifica uma entrada vinda da Requerente e uma saída subsequente para a C… SE:
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Ora, tais elementos levados ao probatório demonstram qual o circuito dos fundos no ano de 2021 (cujo iter pode ser replicado para quase todos os movimentos realizados durante esse mesmo ano), ou seja, é possível extrair da referida documentação, que a maioria dos fundos são remetidos diariamente pela Requerente para a conta, em França, da B…, e que esta entidade, por sua vez, remete, também numa base diária, estes mesmos valores para a conta, em França, da holding do grupo (C… SE).
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O que veio a ser reforçado pela testemunha inquirida na reunião de 23.01.2024, que, quando confrontada com os aludidos documentos, explicitou o sistema de cash pooling plasmado naqueles.
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Resultou, ainda, do depoimento da testemunha que os juros devidos em virtude da concessão de crédito no âmbito do acordo de cash pooling são calculados mensalmente, dependendo da posição credora / devedora das partes, sendo que, no ano de 2021, sempre que foram apurados juros (em 01-01-2021, 01-02-2021, 01-03-2021, 01-04-2021, 30-04-2021, 31-07-2021, 01-08-2021, 30-10-2021, 30-11-2021 e 31-12-2021), estes foram pagos à Requerente (sediada em Portugal) pela B… (sediada em França). Daqui se retira que, para efeitos de apuramento dos juros, a Requerente adotou, em todo o ano de 2021, uma posição de credora, o que permite concluir que as operações de cash pooling em apreço resultaram na posição credora da Requerente e na utilização de crédito fora da Portugal.
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Aqui chegados, e como foi bom de ver, decorre da prova produzida que o crédito concedido pela Requerente foi encaminhado para uma conta bancária, em França, e utilizado nesse mesmo País, pelo que tal operação financeira não estará sujeita a IS em Portugal, por não cair no âmbito territorial do imposto em causa (Cfr. artigo 4.º do CIS).
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Nestes termos, e com os fundamentos supra expostos, o Tribunal Arbitral julga ilegais e anula os atos de autoliquidação de IS impugnados, referentes ao período de janeiro a dezembro de 2021, no valor total de € 67.503,38 (sessenta e sete mil quinhentos e três euros e trinta e oito cêntimos), bem como a decisão expressa de indeferimento da reclamação graciosa autuada com o n.º …, por vício de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito.
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No entanto, e mesmo que se considerasse que a conexão relevante para apurar a incidência territorial do IS é o local da concessão do crédito e que a Requerente não havia logrado provar que a utilização dos ditos fundos ocorreu fora do território nacional, sempre os atos de autoliquidação aqui sindicados seriam ilegais.
§3. Das isenções constantes das alíneas g) e h) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 7.º do CIS e da violação do Direito da União Europeia
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Nas alíneas g) e h) do artigo 7.º do CIS, nas redações em vigor à data dos factos (ano de 2021), estabelecem-se isenções de IS:
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Os empréstimos, incluindo os respetivos juros, por prazo não superior a um ano, desde que exclusivamente destinados à cobertura de carência de tesouraria, e efetuados por sociedades de capital de risco (SCR) a favor de sociedades em que detenham participações, bem como os efetuados por outras sociedades a favor de sociedades por elas dominadas ou a sociedades em que detenham uma participação de, pelo menos, 10 % do capital com direito de voto ou cujo valor de aquisição não seja inferior a 5 000 000 €, de acordo com o último balanço acordado e, bem assim, os efetuados em benefício de sociedade com a qual se encontre em relação de domínio ou de grupo;
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Os empréstimos, incluindo os respetivos juros, por prazo não superior a um ano, quando concedidos por sociedades, no âmbito de um contrato de gestão centralizada de tesouraria, a favor de sociedades com a qual estejam em relação de domínio ou de grupo;
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O n.º 2 do artigo 7.º do CIS (na redação vigente em 2021) restringe o âmbito de aplicação daquelas isenções – alíneas g) e h) –, estipulando a regra de que o disposto em tais alíneas “não se aplica quando qualquer dos intervenientes não tenha sede ou direção efetiva no território nacional”.
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Esta regra de afastamento da isenção tem, contudo, uma exceção para as “situações em que o credor tenha sede ou direção efetiva noutro Estado-Membro da União Europeia ou num Estado em relação ao qual vigore uma convenção para evitar a dupla tributação sobre o rendimento e o capital acordada com Portugal, caso em que subsiste o direito à isenção (...)”, e não tiver previamente realizado os financiamentos através de operações realizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no território nacional.
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Ora, no caso dos autos, um dos intervenientes na operação de cash pooling não tinha sede ou direção efetiva no território português (B…), pelo que, nos termos do n.º 2 do artigo 7.º estará, em princípio, afastada a aplicação da isenção.
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De igual modo, não se verifica a exceção a este afastamento da isenção, porquanto, tal norma só prevê que o direito à isenção subsista quando o credor (que, neste caso, é a Requerente, com sede em Portugal), tenha sede ou direção efetiva noutro Estado membro da União Europeia ou num Estado em relação ao qual vigore uma convenção para evitar a dupla tributação sobre o rendimento e o capital acordada com Portugal.
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Ou seja, da aplicação textual da alínea h) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 7.º do CIS, ao caso sub judice, apenas os empréstimos concedidos, no quadro de um contrato de gestão de tesouraria, pela B… (sedeada em França) à Requerente (sedeada em Portugal) estariam isentos de IS.
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É, precisamente, contra este regime legal, que se insurge a Requerente, por considerar que o mesmo constitui uma restrição injustificada à liberdade de movimentos de capitais garantida pelo artigo 63.º do TFUE, a qual não é admitida, nos termos do artigo 65.º, do mesmo diploma.
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Em suma, defende a Requerente que o afastamento da aplicação das ditas isenções nas situações em que o devedor tem sede ou direção efetiva num Estado-Membro da União Europeia não pode ser aplicado, por ser incompatível com os artigos 63.º e 65.º, do TFUE e por ser discriminatório.
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Na verdade, a jurisprudência arbitral dominante, que acompanhamos, tem vindo a concluir, precisamente, que a recusa em aplicar as isenções previstas no artigo 7.º, n.º 1, alínea g) e h), do CIS, conjugadas com o n.º 2 do mesmo artigo, nos casos em que o devedor tem sede ou direção efetiva num Estado-Membro da União Europeia, constitui uma restrição injustificada à liberdade de movimentos de capitais e de estabelecimento, garantida pelo artigo 63.º, do TFUE (Cfr. Decisões arbitrais de 30.10.2022, processo n.º 59/2022-T; de 07.03.2023, processo n.º 308/2022-T; de 06.10.2021, processo n.º 57/2021-T, de 06.10.2020, processo n.º 277/2020-T, de 17.07.2023, processo n.º 315/2022-T).
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No Acórdão Arbitral, datado de 06.10.2021, processo n.º 57/2021-T, em que figuravam como partes as mesmas que na presente ação arbitral e, que será aqui aplicável, pode ler-se o seguinte:
“No caso em apreço, está-se perante um imposto de obrigação única, devido relativamente a cada ato de concessão de crédito, e os intervenientes num contrato de cash pooling encontram-se em situações idênticas, independentemente do local da sua residência ou do local onde o capital é investido, havendo mesmo possibilidade de frequentes inversões das posições de credor e devedor no âmbito do mesmo contrato, em função das disponibilidades e necessidades de tesouraria de cada um dos intervenientes.
Assim, tem de se concluir pela comparabilidade das situações entre residentes e não residentes, para efeitos da isenção em causa, em contratos do tipo do dos autos.
Neste contexto, a atribuição de uma vantagem fiscal aos devedores residentes em Portugal que é recusada aos devedores não residentes constitui, como defende a Requerente, uma diferença de tratamento entre estas duas categorias de contribuintes, que é de qualificar como discriminação, na aceção do Tratado, por não existir qualquer diferença objetiva de situação suscetível de justificar tratamento diferenciado.
Assim, a alínea a) do n.º 1 e o n.º 3 do artigo 65.º do TFUE não permitem o regime consubstanciado nas referidas normas do CIS, pois a diferença de tratamento não é justificada por uma diferença de situação objetiva.
(...)
Como se vê pelo artigo 46.º do citado acórdão proferido no processo n.º C-575/17, o TJUE entende que, relativamente a situações comparáveis, a diferença de tratamento só pode ser justificada “por uma razão imperativa de interesse geral”.
No caso em apreço, afigura-se ser manifesto que não existe qualquer razão de interesse geral que possa justificar a referida discriminação, (...).
Na verdade, está-se perante uma situação que não há dificuldades de eficaz controlo fiscal, pois há possibilidade de a Administração Tributária fazer uso das trocas de informação previstas na generalidade das Convenções para evitar Dupla Tributação.
Por outro lado, não se vislumbra qualquer outra razão de interesse público que possa justificar o tratamento discriminatório referido, designadamente uma hipotética intenção legislativa de evitar fraudes e abusos no âmbito das operações de tesouraria de curto prazo entre empresas do mesmo grupo, pois a intenção geral que está ínsita na atribuição dos benefícios fiscais previstos nas alíneas g) a i) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS, não pode ser a de “impedir comportamentos que consistam em criar expedientes puramente artificias, desprovidos de realidade económica, cujo objetivo é beneficiar indevidamente de uma vantagem fiscal ”, que podem justificar restrições à livre circulação de capitais (Acórdãos do TJUE de 05-07-2012, SIAT, processo C-318/16, EU:C:2017:415, n.º 40; de 07-09-2017, Eqiom e Enka, processo C-6/16, EU:C:2017:641, n.º 30; e de 20-09-2018, EV, processo C-685/16, n.º 95), mas, será, pelo contrário, de admitir ou mesmo incentivar esses comportamentos, concedendo benefícios fiscais.”
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Por outro lado, cremos, tal como a Requerente, que o entendimento proferido nos acórdãos supra citados foi expressamente acolhido pelo legislador português, que, através da Lei n.º 12/2022, de 27 de junho (que aprovou o Orçamento de Estado para 2022), ajustou a redação da norma, em vigor à data dos factos, mais precisamente, a vertida no n.º 2, do artigo 7.º, do CIS, de modo a “harmonizá-la” com o Direito Europeu, a qual passou a ter a seguinte redação:
“O disposto nas alíneas g) e h) do n.º 1 não se aplica quando qualquer dos intervenientes não tenha sede ou direção efetiva no território nacional, com exceção das situações em que o credor ou o devedor tenha sede ou direção efetiva noutro Estado-Membro da União Europeia ou num Estado em relação ao qual vigore uma convenção para evitar a dupla tributação sobre o rendimento e o capital acordada com Portugal, caso em que subsiste o direito à isenção, salvo se o credor tiver previamente realizado os financiamentos previstos nas alíneas g) e h) do n.º 1 através de operações realizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no território nacional.”
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Desta feita, e sufragando o entendimento proferido pela esmagadora maioria da jurisprudência arbitral, é de concluir que a restrição do âmbito de aplicação das isenções consignadas nas alíneas g) e h) do n.º 1, do artigo 7.º, do CIS, que se previa no n.º 2 do citado artigo, na redação em vigor no ano de 2021, nas situações em que o devedor do crédito é residente em França e o credor é residente em território nacional, constitui uma restrição injustificada à livre circulação de capitais e estabelecimento, assegurada pelo artigo 63.º do TFUE, pelo que tal restrição não pode ser aplicada no ordenamento jurídico português.
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Por fim, rejeitamos, tal como na Decisão Arbitral, datada de 17.07.2023, processo n.º 315/2022-T, o argumento da Requerida “de que, para que se possa concluir no sentido da existência de uma eventual restrição à livre circulação de capitais e do carácter potencialmente discriminatório do n.º 2 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo, que sujeita a tributação as transferências financeiras realizadas entre sociedades residentes e não residentes, afastando estas últimas da isenção, teria de ficar demonstrado que o Imposto do Selo suportado em Portugal pelas operações de financiamento em causa originou uma tributação cuja dedução ao lucro tributável seria impossível de concretizar pelas sociedades não residentes beneficiárias dos empréstimos concedidos por sociedades residentes. Isto porque o valor de uma isenção fiscal não é necessariamente equivalente ao valor de uma dedução ao lucro tributável, sendo aquele tendencialmente mais benéfica do que esta.”
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Ou seja, ainda que exista a possibilidade de deduzir, ao abrigo das leis fiscais francesas, o IS como gasto fiscal, esta dedução não se traduz numa recuperação total deste imposto, numa isenção.
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Face a todo o exposto, não podem os atos de autoliquidação de IS contestadas, referentes ao período de janeiro a dezembro de 2021, no valor total de € 67.503,38 (sessenta e sete mil quinhentos e três euros e trinta e oito cêntimos), nem a decisão expressa de indeferimento da reclamação graciosa autuada com o n.º …, persistir na ordem jurídica, por incompatíveis com o Direito da União Europeia, justificando-se, assim, a sua anulação.
§4. Da exigência da prova da origem dos fundos ao abrigo do n.º 2 do artigo 7.º do CIS
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A Requerida invocou, ainda, na decisão final de indeferimento da reclamação graciosa, o facto da Requerente, no seu entender, não ter (como lhe competia, nos termos do artigo 74.º, n.º 1, da LGT), provado que os fluxos financeiros entre as sociedades do Grupo C… tinham origem, unicamente, em excedentes de liquidez gerados pelo próprio Grupo, ou seja, que não resultavam de financiamentos externos, para efeitos do n.º 2 do artigo 7.º do CIS.
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Por sua vez, a Requerente, não obstante, considera que logrou provar a inexistência de financiamentos externos alocados ao cash pooling, quer através da documentação junta aos autos (Cfr. Documentos n.ºs 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34 juntos ao PPA), quer através da prova testemunhal produzida, alegou, ainda, que a prova imposta pela AT (apenas em sede de reclamação graciosa, pois, na resposta ao PPA, nada disse sobre esta questão), respeitante à origem dos fundos apenas se aplica quando o credor do empréstimo é residente na União Europeia e o devedor do crédito é residente em Portugal.
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O n.º 2 do artigo 7.º do CIS, na redação à data dos factos (ano de 2021), dispunha o seguinte:
“O disposto nas alíneas g) e h) do n.º 1 não se aplica quando qualquer dos intervenientes não tenha sede ou direcção efectiva no território nacional, com excepção das situações em que o credor tenha sede ou direcção efectiva noutro Estado membro da União Europeia ou num Estado em relação ao qual vigore uma convenção para evitar a dupla tributação sobre o rendimento e o capital acordada com Portugal, caso em que subsiste o direito à isenção, salvo se o credor tiver previamente realizado os financiamentos previstos nas alíneas g) e h) do n.º 1 através de operações realizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no território nacional.”
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Parece-nos que a resposta a esta questão decorre expressamente da letra da lei, não deixando margem para dúvidas de que a Requerente, figurando como credora do empréstimo e encontrando-se sediada em Portugal, nunca teria o ónus de provar que os fundos objeto do contrato de cash pooling não foram obtidos com recurso a financiamento junto de instituições de crédito ou sociedades financeiras.
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Porém, sempre se dirá que a Requerente, mesmo não lhe sendo imposto tal ónus, fez prova nos autos de que os valores mutuados no contexto do sistema cash pooling não foram realizados através de operações concretizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no território nacional (Cfr. facto provado L).
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Desta feita, o Tribunal Arbitral declara ilegais e anula os atos tributários de autoliquidação de IS já melhor identificados, referentes ao período de janeiro a dezembro de 2021, no valor total de € 67.503,38 (sessenta e sete mil quinhentos e três euros e trinta e oito cêntimos), objeto do presente processo arbitral também com este fundamento, e condena a AT na restituição do referido montante.
§5. Dos Juros indemnizatórios
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Peticiona, ainda, a Requerente que lhe seja reconhecido o direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do disposto no artigo 43.º, da Lei Geral Tributária.
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Estatui o citado artigo que serão devidos juros indemnizatórios “quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”. Saliente-se que tais juros são também reconhecidos no processo arbitral à luz do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT.
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Ora, in casu, e conforme concluiu a Decisão Arbitral, datada de 17.07.2023, processo n.º 315/2022-T, aplicável mutatis mutandis ao nosso PPA:
“os atos de autoliquidação do Imposto do Selo foram da iniciativa do sujeito passivo, a ora Requerente, pelo que, neste caso, não é possível imputar qualquer tipo de erro aos serviços da AT na efetivação dos atos de autoliquidação do Imposto do Selo alvo do presente pedido arbitral. Porém, na sequência da dedução da reclamação graciosa contra os atos de autoliquidação de Imposto do Selo em apreço, em face das alegações produzidas pela Requerente no procedimento de reclamação graciosa, a AT teve a oportunidade de proceder à análise e avaliação da matéria controvertida e podia ter efetuado o correto enquadramento jurídico-tributário dos factos e, consequentemente, ter efetuado a plena reconstituição da legalidade dos atos ou da situação objeto do litígio. Não tendo feito, os serviços da AT cometeram um erro que lhes é imputável, do qual resultou a manutenção de um imposto por montante superior ao devido (...), havendo consequentemente direito a juros indemnizatórios ao abrigo do artigo 43.º, n.º 1, da LGT.”
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Face ao exposto, reconhece-se à Requerente o direito a juros indemnizatórios, a contar do dia 11.04.2023 (dia seguinte à data em que a Requerente foi notificada da decisão final de indeferimento da reclamação graciosa) até à data do processamento do reembolso (Cfr. artigo 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º, n.º 5, do CPPT).
VI. DECISÃO
Termos em que, de harmonia com o exposto, decide-se neste Tribunal Arbitral julgar integralmente procedente o pedido de pronúncia arbitral e, consequentemente:
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Declarar ilegais e anular os atos de autoliquidação de Imposto do Selo n.ºs …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, respeitantes ao período de janeiro a dezembro de 2021, no valor total de € 67.503,38 (sessenta e sete mil, quinhentos e três euros, e trinta e oito cêntimos);
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Declarar ilegal e anular a decisão expressa de indeferimento da reclamação graciosa autuada com o n.º …;
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Condenar a AT a reembolsar à Requerente o montante € 67.503,38 (sessenta e sete mil, quinhentos e três euros, e trinta e oito cêntimos) e no pagamento de juros indemnizatórios sobre esse valor, contados desde o dia 11.04.2023 até à data do processamento do reembolso (nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT e do artigo 61.º, n.º 5, do CPPT).
VII. VALOR DA CAUSA
Fixa-se ao processo o valor de € 67.503,38 (sessenta e sete mil, quinhentos e três euros, e trinta e oito cêntimos), nos termos do artigo 97.º-A do CPPT, aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).
VIII. CUSTAS
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.448,00 (dois mil, quatrocentos e quarenta e oito euros), nos termos da tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida em razão do decaimento.
[Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.]
Notifique-se.
Lisboa, 19 de março de 2024
O Tribunal Arbitral Coletivo,
Rita Correia da Cunha
(Presidente)
Nuno Pombo
(Árbitro Adjunto)
Susana Cristina Nascimento das Mercês de Carvalho
(Árbitra Adjunta)
[1] Cfr. “Os Impostos sobre o Património Imobiliário. O Imposto do Selo. Anotados e Comentados”, Engifisco, 2005, pg.733.
[2] Daí a indispensabilidade da disponibilização de liquidez.
[3] Enquanto os primeiros consideraram não ser, sequer, necessário aplicar as normas relativas à isenção, dado que a situação sub judice cairia fora do âmbito da territorialidade do imposto em causa, os últimos dois entenderam que as liquidações impugnadas eram ilegais, por enfermarem de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, ao basearem-se numa norma (artigo 7.º, n.º 2, do CIS) que é ilegal, por ser incompatível com o Direito da União Europeia.
[4] O número de conta da B… pode ser verificado no extrato junto como Documento n.º 5.
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