DECISÃO ARBITRAL
I. RELATÓRIO
Os árbitros, Juiz José Poças Falcão (árbitro-presidente), Doutora Maria Celeste Cardona e Doutor João Maricoto Monteiro (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 25-08-2014, acordam no seguinte:
A Imobiliária, Ldª, contribuinte nº …, com sede na …, da freguesia de …, do concelho de Guimarães, (doravante Requerente), formulou pedido de pronúncia arbitral, nos termos do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”) solicitando as anulação do imposto liquidado através da liquidação adicional nº 2012…, de 12-11-2012, no montante de €810.650,86, sendo €738.684,85 de imposto e €71.966,11, de juros compensatórios, relativa ao IRC de 2009.
Alegou, no essencial:
Era proprietária do prédio inscrito na matriz rústica de …, do concelho de Guimarães, sob o artº … e descrito na Conservatória do Registo Comercial de Guimarães sob o nº ….
Por contrato promessa de compra e venda de 3 de Novembro de 2009 a Requerente prometeu vender à empresa B Imobiliária, Ldª, contribuinte nº …, pelo valor de € 3 689 071,09, ¾ do imóvel referido no nº 1(Doc. 3).
Conforme consta da cláusula segunda de tal contrato a Requerente recebeu €.875. 033,97 com a celebração do contrato promessa de compra e venda e os restantes €.2814037,12 seriam pagos na data da outorga da escritura pública.
Consta ainda da referida cláusula segunda que a escritura pública de venda do referido imóvel seria a favor da C - Gestão Imobiliária, SA, “uma vez que o prédio não pode ser dividido e se destina a ser revendido os ¾ pela Segunda Outorgante à referida C e os restantes ¼ à mesma C pela Primeira Outorgante, sendo o presente contrato realizado pela Segunda Outorgante a favor de terceiro, ou seja, a favor da C Gestão Imobiliária, SA, pelo que apenas poderá ser formalizado por escritura pública a favor da mesma”.
Conforme cláusula terceira “a escritura pública deverá ser efectuada em cartório notarial em dia, hora e local a designar pela Segunda Outorgante que, para o efeito, notificará a Primeira Outorgante.
Verifica-se da cláusula quarta que foi atribuído ao contrato a eficácia prevista no artº 830 do Código Civil, ou seja, o segundo outorgante podia obter sentença que produzisse os efeitos da declaração negocial do faltoso, sempre que a isso não se opuser a natureza da obrigação assumida.
Em 19 de Novembro de 2009 a Requerente (quinta outorgante) celebrou com a D (1ª outorgante), C – Gestão Imobiliária, SA (2ª outorgante), B Imobiliária, Ldª (3ª outorgante) e E, Ldª (4ª outorgante) um contrato promessa de compra e venda, pagamento e execução de infraestruturas de loteamento (Doc. 4).
Conforme se verifica da cláusula sétima de tal contrato a Requerente prometeu vender sem quaisquer ónus a não ser os que já estavam inscritos a favor da D, os imóveis constantes de folhas 16 de tal contrato, entre os quais o prédio inscrito na matriz rústica de … sob o artº …, este pelo valor de € 4 400 000,00.
Com o recebimento, da C, da quantia referida na cláusula oitava (cláusula nona), no valor de € 5 577 500,00, a D considerava integralmente pagos os créditos que detinha sobre a Requerente e, o remanescente do preço, seria aplicado pela D segundo a forma e prioridades seguintes:
1 – No pagamento integral do crédito referido na alínea F (€ 13 121,02, a que acresciam juros vencidos e vincendos), de B, Ldª;
2 – No pagamento do crédito descrito na alínea A ( € 224 901,00, a que acresciam juros vencidos e vincendos), de B, Ldª;
3 – No pagamento do crédito referido na alínea D (€ 2 211 809,00, a que acresciam juros vencidos e vincendos), de B, Ldª.
4 - O remanescente seria aplicado no pagamento parcial dos créditos referidos na alínea c) de que era devedora a Requerente, “mas apenas na data em que fossem outorgadas as escrituras de compra e venda previstas nas cláusulas Segunda e Quinta podendo a D, em caso de incumprimento deste contrato promessa e não realização das referidas escrituras de compra e venda, aplicar esta valor no reembolso à C dos montantes por esta adiantados a título de sinal, referidos nas cláusulas Terceira e Sexta”.
Ou seja, com a celebração da escritura de compra e venda, a B, Ldª receberia € 2 449 831,02 da C, mais os juros vencidos e vincendos, ou seja a totalidade da dívida que esta tinha perante a D.
Verifica-se da alínea O) do último contrato referido que “a terceira, quarta e quinta outorgantes (e respectivos garantes) encontram-se já em mora no cumprimento das suas obrigações para com a D, emergentes da celebração daqueles contratos e não conseguem reunir meios financeiros para, pontualmente, solverem os seus compromissos vencidos e vincendos.
Por isso, é intenção das terceira, quarta e quinta outorgantes cederem à D ou a terceiro com autorização desta, a propriedade de alguns dos seus imóveis e fracções autónomas que se encontram onerados com hipotecas a favor desta, para, desse modo, através do produto da respectiva alienação, extinguirem aquele passivo”.
Em 19 de Novembro de 2009 a Requerente outorgou, com a C – Gestão Imobiliária, SA, contribuinte nº … a escritura de compra e venda da qual consta a venda do prédio inscrito na matriz rústica de …, do concelho de Guimarães, sob o artº …, pelo valor de € 4 400 000.00 (Doc. 6).
Em 2009, posteriormente a esta última data, a Requerente intentou, no Tribunal Judicial de Guimarães, acção declarativa em que pedia ao Tribunal que condenasse a B – Imobiliária, Ldª, no pagamento à Autora da importância de € 2.814 037,12.
Em 31/12/2009 a Requerente constituiu uma provisão para riscos e encargos – Dívida em processo judicial em curso – B- Imobiliária, Ldª, no valor de € 2 814 037,12.
Tal acção veio a dar origem ao processo nº ….
Citada na acção a Ré não contestou, motivo pelo qual o Tribunal, com base no disposto no nº 1 do artº 484 do Código Civil, deu como provados os factos articulados pela Autora e, por sentença de 22 de março de 2010, condenou a Ré a pagar à Requerente a quantia peticionada, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento.
Posteriormente, a Requerente foi alvo de uma inspecção pelos serviços da Direcção de Finanças de Braga, cujo relatório final deu origem à liquidação reclamada e agora objecto de impugnação.
Segundo o relatório da inspecção “o sujeito passivo e o cliente eram devedores à D de diversos montantes relativos a contratos de abertura de crédito, descobertos bancários, garantias bancárias e outras formas de financiamento”.
Ainda segundo o mesmo relatório “o SP era proprietário de diversos imóveis que utilizou para liquidar as dívidas (ou pelo menos parte delas) acima referidas junto da D; é de frisar que se tratava de dívidas do SP e do cliente”.
A forma de liquidação das dívidas consistiu, segundo o relatório, na dação em pagamento, por parte da Requerente, desses imóveis à C, ou seja, na venda dos imóveis das suas existências, a esta última.
Desta forma, ainda segundo o relatório, o sujeito passivo ao liquidar dívidas que o cliente tinha junto da D, constitui-se como credor deste no montante liquidado de € 2.814.037,12.
E, conclui o relatório da Inspecção:
“(...)28.1 – O SP vendeu os imóveis à C;
28.2 – O SP não vendeu qualquer imóvel ou activo das suas existências ao cliente;
28.3 – Na realidade não fez mais do que utilizar activos próprios das suas existências para liquidar dívidas do Cliente, no que constitui uma mera operação de financiamento ao Cliente e que nada tem a ver com a sua actividade normal(...)”.
O relatório da inspecção, não obstante ter tido conhecimento do contrato promessa de compra e venda mencionado nos nºs 2, 3, 4, 5 e 6 (doc. 1) da presente petição em ponto algum do relatório lhe faz referência.
Designadamente que, conforme se verifica da cláusula segunda, os ¾ que a B – Imobiliária, Ldª, a Cliente para a ATA, prometeu adquirir seriam vendidos à C, a favor de quem o contrato definitivo seria celebrado, “pelo que o mesmo apenas poderá ser formalizado por escritura pública outorgada a favor da mesma”.
Porque, conforme consta de tal cláusula segunda, “tal imóvel não pode ser dividido”.
Divisão essa impossível face ao disposto no nº 1 do artº 54º da Lei 91/95, de 2/9 (Processo de reconversão das áreas urbanas de génese ilegal), com a redacção da Lei 64/2003, de 23/8, que passou a estipular que “a celebração de quaisquer actos ou negócios jurídicos entre vivos de que resulte ou possa vir a resultar a constituição ou ampliação do número de compartes de prédios rústicos carece de parecer favorável da câmara municipal da localização dos prédios”.
Sendo nulos, segundo a mesma lei, “os actos ou negócios jurídicos celebrados em violação do disposto no nº 1 do presente artigo, tendo também a câmara municipal legitimidade para promover a respectiva declaração judicial”, conforme nº 4 do mesmo normativo legal.
Embora possa parecer dos factos atrás apontados e da leitura da escritura de compra e venda, a existência de um negócio jurídico livre entre todas as partes envolvidas, a verdade é que nada disto sucedeu.
De facto, tanto a Requerente como a B – Imobiliária, Ldª, eram devedoras à D, SA, de verbas que ambas solveram através da dação em pagamento.
Mas os termos em que tal negócio foi realizado foram completamente impostos à Requerente e à B – Imobiliária, Ldª pela entidade credora, bem como os valores, as entidades em nome das quais o contrato deveria ser outorgado e ainda os restantes elementos integrantes do contrato.
A Requerente, constrangida desde o início a agir segundo exigência explícita do credor, nunca esteve em condições de se poder furtar à entrega dos ¾ do imóvel que tinha prometido vender à B, Ldª, sem o recebimento por parte desta da totalidade do preço acordado.
Mesmo tendo reservas sobre se esta última poderia solver imediatamente o seu crédito.
Uma vez que a credora (D) nunca lhe permitiria que desse ao negócio formal conteúdo e modo diverso do que veio a ocorrer de facto.
Tendo imposto todas as cláusulas constantes do contrato que constitui o doc. 4.
Tendo inclusive imposto a aquisição, por parte da Requerente, da maioria do capital social da B, Ldª, a qual consta da alínea Q do doc. 4.
Sendo a consequência da não aceitação das condições impostas pela D a insolvência da Requerente e da B Imobiliária, Ldª, de que a Requerente detinha o domínio.
Com a consequente venda, no âmbito da insolvência, do prédio por valor que poderia nem chegar a metade do valor constante do negócio jurídico, que foi de €4.000.000,00.
Face à crise que, já desde essa data, se verificava no âmbito da construção civil e na compra e venda de imóveis.
Sob o negócio simulado (o que foi realizado entre a Requerente e a C) existiu um outro que as partes quiseram realizar, que foi a venda da Requerente à B – Imobiliária, Ldª e desta à C.
Negócio esse que não podia ser realizado pelos motivos constantes dos nºs 25, 26, 27 e 28 da presente petição[1].
Simulação que visou tornear as normas legais atrás indicadas.
Assim sendo, no exercício de 2009, por força do disposto no nº 1 do artº 18º do CIRC, com a redacção à data, a requerente estava obrigada a considerar como réditos a totalidade da venda dos ¾ do imóvel, tal como considerou, independentemente do seu recebimento ou pagamento, do qual apenas recebeu € 875 033,97.
Sendo portanto legal a constituição da provisão no montante de € 2 814 037,12 face à interposição de acção judicial contra a devedora.
Por seu turno a B – Imobiliária, Ldª, deveria ter considerado como réditos e como gastos o valor de € 3 689 071,09, valor de compra e de venda dos ¾ do imóvel, ou seja, a operação, em termos de IRC nesta empresa, seria neutra
A ATA atribuiu força probatória plena à escritura de compra e venda lavrada em 19 de Novembro de 2009, na D, sita à …, no …, pelo Notário Licenciado F.
O que significa que essa escritura apenas faz prova plena (até prova em contrário, feita através do incidente de falsidade) de que os outorgantes declararam perante o notário que queriam transferir a propriedade dos imóveis na mesma indicados da Requerente para a C – Gestão Imobiliária, SA, com sede na …, em …, pois só relativamente a eles alcançaram as percepções do notário.
Mas já não fica provado que, por trás de tal escritura de compra e venda, não houvesse já um negócio em que a Requerente tinha vendido ¾ de um dos imóveis alienados e que, face à impossibilidade de constituição da compropriedade, esta tenha sido celebrada sem a intervenção da B Imobiliária, Ldª, tendo no entanto o valor correspondente a tal venda entrado no património da referida sociedade.
Na verdade, sendo indiscutível que tal escritura de compra e venda é um documento autêntico (cfr. artigo 369.º do CC), esta escritura apenas faz prova plena dos factos que se referem como praticados pela autoridade ou oficial público, assim como dos factos que nela tenham sido atestados com base nas percepções da entidade documentadora (artigo 371.º, n.º 1, do mesmo diploma).
A essa zona de factos do foro interno dos outorgantes ou de factos exteriores, não ocorridos no acto da escritura e fora até do cartório notarial, não chegam as percepções do funcionário documentador.
O documento autêntico faz prova plena em relação à materialidade das afirmações atestadas; mas não quanto à sinceridade, à veracidade ou à validade das declarações emitidas pelas partes." (Antunes Varela, J Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2.ª edição, pág. 520-522). Vd., no mesmo sentido, por todos, o acórdão do STA de 14/2/2 002, recurso n.º 48 038, o acórdão de 1-2-2005 no processo nº 66/04 e o acórdão do STJ de 25/3/04, recurso n.º 4 B 370.
Um dos princípios do direito fiscal é o da prevalência da substância sob a forma dos negócios jurídicos.
O qual se encontra plasmado em diversos normativos, de que se cita o artº 13. Do Dec. Regulamentar nº 25/2009, de 14/9, relativo às depreciações ou amortizações dos bens objecto de locação financeira.
Mas também ao nível das regras de incidência, conforme se verifica do nº 1 do artº 1º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, ao prever a tributação dos rendimentos provenientes de actos ilícitos.
Bem como dos mecanismos previstos nos artºs 38 e 39º da Lei Geral Tributária em que, no caso do artº 38º, se prevê a ineficácia, no âmbito tributário, dos “actos ou negócios jurídicos essencial ou principalmente dirigidos, por meios artificiosos ou fraudulentos, e com abuso das formas jurídicas, à redução, eliminação ou deferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem a utilização desses meios, efectuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas”.
E do nº 1 do artº 39º do mesmo diploma que estipula que “em caso de simulação, a tributação recai sobre o negócio jurídico real e não sobre o negócio jurídico simulado”.
Ora o negócio jurídico celebrado directamente entre a Requerente e a Cnão teve por fim reduzir ou eliminar a carga fiscal, mas antes tornear a impossibilidade de ser celebrado o negócio jurídico entre a Requerente e a B, Ldª, relativamente aos ¾ do prédio inscrito na matriz rústica de …, do concelho de Guimarães, sob o nº …, face ao disposto no artº 54º da Lei 91/95, de 2/9, com a nova redacção que lhe foi dada pela Lei 64/2003, de 23/8.
Daí que o mesmo seja um negócio simulado, sem a intervenção de um dos vendedores, a B, Ldª, o que implica que, conforme determina o nº 1 do artº 39º, da Lei Geral Tributária, a tributação deva recair sob o negócio jurídico real e não sobre o negócio jurídico simulado.
Até porque a B, Ldª viu enriquecido o seu património em €.2.814 37,12 e a Requerente viu empobrecido tal património em igual montante.
Daí que, com base no artº 39º da Lei Geral Tributária, seja ilegal a correcção efectuada pela ATA.
Acresce ainda que – continua a requerente - :
A ATA indeferiu a reclamação graciosa contra a liquidação impugnada com o argumento de que o crédito reclamado e de que foi constituída a provisão não resultar da actividade normal da empresa.
Considerando esta a constante do objecto social que é “actividades de promoção imobiliária por conta própria”.
Sem ter em conta que, nos termos do disposto no artº 6º do Código das Sociedades Comerciais, a capacidade da sociedade compreende os direitos e as obrigações necessárias ou convenientes à prossecução do seu fim, exceptuados aqueles que lhe sejam vedados por lei ou sejam inseparáveis da personalidade singular.
Ou seja, entram na capacidade jurídica das sociedades todos os direitos e obrigações que se revelem, à partida, indispensáveis ou úteis à consecução do seu fim, fim esse que, segundo Coutinho de Abreu, a pag. 184 do Curso de Direito Comercial´- Volume II, Edição de 2001, é o escopo lucrativo, o intuito de obter lucros para atribuí-los aos sócios.
E, segundo o mesmo Autor e obra, a página 195, vem dizer que a norma da primeira parte do nº 3 do artº 6º do Código das Sociedades Comerciais, admite duas excepções à regra da incapacidade da sociedade para prestar garantias gratuitas a dívidas de terceiras entidades: “haver justificado interesse próprio da sociedade garante” ou encontrar-se a sociedade garante “em relação de domínio ou de grupo. São excepções também em consonância com o disposto no nº 1 do artº 6º - nesses casos a prestação de garantias mostrar-se-á (à partida, atendendo ao momento da prática do acto) necessária ou conveniente à prossecução do escopo lucrativo da sociedade”.
A prestação da garantia, seguindo o mesmo autor, é justificada pelo interesse da sociedade garante quando ela se mostre objectivamente apta para satisfazer o desejo de todo o sócio enquanto tal de obter lucros através dessa mesma sociedade.
Ora se é certo que a Requerente não estava numa relação de grupo com a B – Imobiliária, Ldª, o certo é que estava numa relação de domínio com a mesma.
Pois, conforme se verifica da certidão de registo comercial, com o código de acesso nº …, à data dos factos a requerente detinha duas quotas de € 12 719,34 na B – Imobiliária, Ldª, num capital social de € 49 879,78, ou seja, era detentora de 52% do capital social.
A B Imobiliária, Ldª era, por isso, dependente da Requerente porquanto se verificavam todos os pressupostos das alíneas a), b) e c) do nº 2 do artº 486º do Código das Sociedades Comerciais.
Daí que, quaisquer garantias que tivessem sido prestadas pela Requerente à B – Imobiliária, Ldª, se inserissem na actividade normal da empresa, entendida esta como o escopo da mesma, ou seja, a realização de lucros e a sua distribuição pelos sócios.
No despacho de indeferimento da reclamação graciosa a ATA defende que as provisões constituídas não resultaram da actividade normal da Requerente.
E que, “administrativamente, se assumiu que, para efeitos de constituição das provisões, apenas relevam os créditos decorrente das operações de natureza comercial relacionadas com a venda de bens ou serviços respeitantes à actividade da empresa, ou seja, operações que envolvam transacções correntes (Manual de IRC do ano de 2008)”.
A ATA esquece que, conforme nº 4 do artº 68-A da LGT, deve rever as orientações genéricas referidas no n.º 1 do mesmo artigo atendendo, nomeadamente, à jurisprudência dos tribunais superiores.
Jurisprudência que tem entendido que a indispensabilidade entre custos e proveitos deve ser aferida a partir de um juízo positivo de subsunção na actividade societária: os custos indispensáveis equivalerão aos gastos contraídos no interesse da empresa (cf., entre outros, acórdão do STA de 30/11/2011, Processo 107/11).
Assim como o Acórdão nº 164/12, de 4-9-2013, do STA, no qual é dito que “podemos hoje considerar aceite pela doutrina e pela jurisprudência um conceito de indispensabilidade que, afastando-se definitivamente da ideia de causalidade entre os gastos e rendimentos, põe a tónica na relação dos gastos com a actividade prosseguida pelo sujeito passivo, ou seja, considerando que o referido conceito de indispensabilidade se verifica sempre que os gastos sejam incorridos no interesse da empresa, na prossecução das respectivas actividades”.
Indispensabilidade essa que se encontra bem explicitado nos seguintes excertos do Acórdão do TCA Norte, de 14/3/2013 em que é dito “como refere António Moura Portugal - a solução acolhida entre nós (pelo menos na doutrina), na esteira dos entendimentos propugnados pela doutrina italiana, tem sido a de interpretar a indispensabilidade em função do objecto societário», que esta exigência da indispensabilidade dos custos para a realização dos proveitos ou manutenção da fonte produtora se encontrava «inicialmente associada a uma condição de “razoabilidade” (artigo 26° do CCI)» e que se é certo «que a “razoabilidade” está presente em algumas disposições do CIRC, de forma expressa (23º), … deixou de ser tolerável a sua utilização como fundamento para limitar quantitativamente os encargos incorridos pelos sujeitos passivos. (…) A indispensabilidade deve assim ser aferida a partir de um juízo positivo da subsunção na actividade societária, o qual, por natureza, não deve ser sindicado pelo Direito Fiscal, que se não deve imiscuir, muito menos valorar as decisões empresariais do contribuinte. Só esta concepção está de acordo com os princípios de liberdade de gestão empresarial e, ao mesmo tempo, respeita interesses específicos do direito fiscal (que estão na base da limitação expressa que é feita à dedutibilidade de certos encargos).
Os custos indispensáveis equivalem, assim, aos gastos contraídos no interesse da empresa. A dedutibilidade fiscal do custo deve depender apenas de uma relação justificada com a actividade produtiva da empresa e esta indispensabilidade verifica-se “sempre que - por funcionamento da teoria da especialidade das pessoas colectivas - as operações societárias se insiram na sua capacidade, por subsunção ao respectivo escopo societário e, em especial, desde que se conectem com a obtenção de lucro ainda que de forma indirecta ou mediata” (in A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, pág. 113 e ss)”.
Também Rui Duarte Morais, embora sustentando que o requisito da “indispensabilidade”, enquanto condição da aceitação do custo fiscal não pode ser referido à natureza do encargo, mas sim às circunstâncias em que o mesmo ocorreu, entende que “Se a assunção do encargo que origina o custo presidiu uma genuína motivação empresarial - o entendimento dos sócios e/ou gestores da sociedade, os únicos a quem cabe decidir do interesse social -, o custo é indispensável. Quando se deva concluir que o encargo foi determinado por outras motivações (interesse pessoal dos sócios, administradores, credores, outras sociedades do mesmo grupo, parceiros comercias, etc.), então tal custo não deve ser havido por indispensável” (in Apontamentos IRC, Almedina, Coimbra, 2007, pág.87)
Ora não restam dúvidas que as provisões constituídas em 2009 estiveram relacionadas com a actividade normal da empresa uma vez que tiveram subjacente a venda que a Requerente efectuou à B – Imobiliária, Ldª, de ¾ de um prédio rústico, de que esta apenas pagou parte do preço, que posteriormente vendeu à C, tendo recebido a totalidade do preço.
Sem que tenha pago à Requerente a parte restante do preço contratado.
O custo desconsiderado pela ATA foi originado por uma genuína motivação empresarial, que foi o evitar a insolvência da Requerente e da B – Imobiliária, Lª, sociedade de que a Requerente detinha a maioria do capital social, e não pelo interesse pessoal dos sócios, daí que, conforme ensinamentos de Rui Duarte Morais, se deva concluir que o mesmo é indispensável.
Os Requerentes não procederam à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT, os signatários foram designados pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD para integrar o presente Tribunal Arbitral colectivo, tendo aceitado nos termos legalmente previstos.
Em 07-08-2014 as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 25-08-2014.
Em 01-10-2014, a Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, defendendo que o pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente.
Alegou, designadamente:
A ora requerente peticionava na ação judicial que refere, a satisfação de um crédito de 2.814.037,12€ que alegava ter sobre a sociedade B Imobiliária Lda.
A provisão foi, pois, constituída com base no facto de o crédito ter sido reclamado judicialmente, havendo, então, risco de incobrabilidade do mesmo (visto que, nessa altura, ainda não lhe havia sido reconhecido pelo Tribunal direito ao mesmo[2]).
Ou seja, a provisão foi constituída nos termos da alínea b), do nº1 do então artigo 35º do Código do IRC, norma que regia a “provisão para créditos de cobrança duvidosa”.
E não como veio, depois, a contribuinte arguir “provisão para processos judiciais em curso”[3] ou, nos termos da alínea c) do então artigo 34º do CIRC, provisões que se destinam “a ocorrer a obrigações ou encargos derivados de processos judiciais em curso por factos que determinariam a inclusão daqueles entre os custos do exercício”.
Face à provisão deduzida, a inspecção tributária procedeu à análise do referido crédito reclamado em tribunal, de 2.814.037,12€.
Isso, pois que, nos termos da alínea a) do nº1 do então artigo 34º do CIRC, podiam ser deduzidas para efeitos fiscais as provisões que tivessem “por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal que no fim do exercício possam ser considerados de cobrança duvidosa”.
Verificou-se que o crédito sub judice decorre de dação em pagamento que a ora requerente fez de determinados imóveis seus (das suas existências) em ordem a liquidar dívidas que a B Lda tinha para com a D (de ora em diante D).
A ora Requerente vendeu esses imóveis à C Gestão Imobiliária, S.A. (doravante designada por “C”)e “parte dessa venda” foi utilizada para saldar dívidas que a B tinha para com a D.
Sendo que a outra parte serviu para saldar dívidas da própria requerente à D[4], tal como decorre da contabilidade da ora requerente. (Cfr o documento junto à resposta com o nº 7 – cópia de documento suporte de venda “3/2009”, onde se refere a dação em pagamento sub judice e se explicita que, por esse meio, se «Liquida a totalidade da dívida que tínhamos com a D e parte da dívida da B Imob. Lda.»).
A ora requerente constituiu-se, então, em credor da B Imobiliária Lda pelos valores, por essa forma, por si pagos.
Aí se integram as responsabilidades da B Imobiliária, Lda., que a ora Requerente satisfez e que veio, depois, reclamar no tribunal cível, de 2.814.037,12€
Ou seja, o crédito que provisionou e cuja aceitação como custo fiscal está em causa nos presentes autos.
Pelo que o crédito sobre a “B” não resultou da actividade normal da ora requerente.
Os citados “Contrato promessa de compra e venda, pagamento e empreitada de execução de infra-estruturas de loteamento” e contrato de compra e venda escriturado que o concretizou[5]–, a ora requerente, na sequência dos mesmos, registou contabilisticamente essa venda na sua conta “71 – vendas”.
Tendo, em 31-12-2009, creditado essa conta “71-vendas”[6] pelos valores, acima mencionados, de 1.177.500,00€ e de 4.400.000,00€.(Cf. documento junto a esta resposta com o nº8- extracto conta 71 vendas).
Ou seja, o ora requerente contabilizou a referida venda dos imóveis à C.
Decorre assim confirmado que a ora requerente se limitou a substituir-se à B, Lda., no pagamento das dívidas que esta tinha para com a D.
Em 20-10-2014, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, em que, ouvidas as Partes e com concordância destas se prescindiu da diligência de inquirição de testemunhas arroladas pela Requerente, tendo sido marcado prazo para alegações escritas sucessivas
As Partes apresentaram alegações escritas que nada de essencial acrescentaram às posições assumidas nos respetivos articulados.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas questões que possam obstar à apreciação do mérito da causa
II FUNDAMENTAÇÃO
Factos provados
Com base nos elementos que constam do processo e do processo administrativo junto aos autos, consideram-se provados os seguintes factos essenciais, com relevância para apreciar as questões suscitadas:
a) A Requerente foi constituída em 1998 tendo por objecto social (desde 2006) a promoção imobiliária e a compra e venda de bens imobiliários e como sócios e gerentes os Senhores G, H, I e J.
b) Em 5-9-2009, a Requerente adquiriu ao referido H uma quota de €12.719,34 da sociedade B Imobiliária Lda., contribuinte nº … e adquiriu a J uma outra quota de 12.719,34€ da mesma sociedade, ficando com cerca de 51% do capital daquela [conforme se verifica da certidão de registo comercial, com o código de acesso nº …, à data dos factos a requerente detinha duas quotas de € 12 719,34 na B – Imobiliária, Ldª, num capital social de € 49 879,78], ou seja, era detentora de 52% do capital social]
c) Por contrato promessa de compra e venda de 3 de Novembro de 2009 a Requerente prometeu vender à empresa B Imobiliária, Lda., pelo valor de € 3 689 071,09, ¾ do imóvel inscrito na matriz rústica de …, do concelho de Guimarães, sob o artº … e descrito na Conservatória do Registo Comercial de Guimarães sob o nº ….
d) O referido contrato promessa previa o pagamento de € 875.033,97 com a celebração do contrato promessa de compra e venda e os restantes € 2.814.037,12 na data da outorga da escritura pública.
e) Tal escritura seria celebrada com a C Gestão Imobiliária, S.A., (pelo que se tratava de um contrato a favor de terceiro), devendo a escritura ser marcada pela sociedade B Imobiliária Lda.,
f) Em 19 de Novembro de 2009 a Requerente celebrou com a D, C – Gestão Imobiliária, S.A., B Imobiliária, Lda. e E, Lda. um contrato promessa de compra e venda, pagamento e execução de infraestruturas de loteamento.
g) Tal contrato previa, também, a regularização do passivo daquelas sociedades para com a D, S.A., por meio de dação em pagamento de imóveis de sua propriedade à C – Gestão Imobiliária, S.A., que depois solveria as dívidas junto da D.
h) A sociedade B Imobiliária, Lda. devia à D quantia de €5.869.083,011 e a sociedade A Lda., ora Requerente, devia à D €1.888.428,90.
i) Assim e no âmbito de tal contrato,
i. a sociedade B Imobiliária Lda. prometia vender à C treze fracções de um prédio urbano e dezoito fracções de outro prédio urbano pelo preço de € 2.251.200,00; e
ii. a ora Requerente, A Imobiliária Lda, prometia vender à C oito imóveis (entre os quais o imóvel identificado na alínea c) supra, a que foi atribuído um valor de € 4.400.000,00 ) pelo preço total de € 5.577.500,00;
j) O Considerando “O” de tal contrato refere especificamente que: “A Quinta Outorgante A Imobiliária S.A. é detentora de duas quotas no valor unitário de 12.719,34€ no capital social da terceira outorgante B Imobiliária, Lda., correspondentes a 51% desse capital e, como tal, interessa-lhe suportar, a expensas suas, parte do passivo da B Imobiliária, Lda., perante a D”
k) Com o recebimento, da C, da referida quantia € 5 577 500,00, a de D considerava integralmente pagos os créditos que detinha sobre a Requerente e, o remanescente do preço, seria aplicado pela D segundo a forma e prioridades seguintes:
i. No pagamento integral do crédito de €13 121,02 (a que acresciam juros vencidos e vincendos), de B, Lda.;
ii. No pagamento do crédito de €224 901,00 (a que acresciam juros vencidos e vincendos), de B, Lda.;
iii. No pagamento do crédito de €2 211 809,00 (a que acresciam juros vencidos e vincendos), de B, Lda..
iv. Sendo o remanescente aplicado no pagamento parcial dos créditos de que era devedora a Requerente, mas “apenas na data em que fossem outorgadas as escrituras de compra e venda previstas nas cláusulas Segunda e Quinta podendo a D, em caso de incumprimento deste contrato promessa e não realização das referidas escrituras de compra e venda, aplicar esta valor no reembolso à C dos montantes por esta adiantados a título de sinal, referidos nas cláusulas Terceira e Sexta”.
l) Em 19 de Novembro de 2009 a Requerente outorgou, com a C – Gestão Imobiliária, SA, contribuinte nº … a escritura de compra e venda da qual consta a venda do prédio identificado na alínea c) supra, pelo valor de € 4 400 000.00.
m) Ainda nesse ano de 2009, a Requerente intentou, no Tribunal Judicial de Guimarães, acção declarativa em que pedia ao Tribunal que condenasse a B – Imobiliária, Lda., no pagamento à Autora da importância de € 2.814 037,12.
n) A sociedade B, Lda. não apresentou contestação a tal acção declarativa, pelo que foi condenada no pedido.
o) Em 31/12/2009 a Requerente constituiu uma provisão para riscos e encargos – Dívida em processo judicial em curso – B - Imobiliária, Ldª, no valor de € 2 814 037,12 ( registo como custo na contabilidade da requerente - Conta 6723 – Provisões do exercício – Processos judiciais em curso - € 2.814.037,12).
p) A ora requerente foi objecto de acção inspectiva, aberta pela ordem de serviço n.º OI…, de 2012-04-19, e tendo por objecto o IRC do exercício de 2009
q) Da acção inspectiva resultaram correcções ao Lucro Tributável da Requerente, decorrentes da não aceitação como custo fiscal de provisão para créditos de cobrança duvidosa – créditos em contencioso, no montante de € 2.814.037,12.
r) Dessa correcção resultou a liquidação adicional nº 2012…, de 12-11-2012, no montante de €810.650,86, sendo €738.684,85 de imposto e €71.966,11 de juros compensatórios
s) A ora requerente apresentou, em 13-03-2013, reclamação graciosa dessa liquidação (reclamação n.º …).
t) A reclamação foi indeferida por despacho do Director de Finanças Adjunto de17-03-2014.
u) Dessa decisão, a Requerente apresentou a presente impugnação arbitral, solicitando a anulação do imposto impugnado, isto é, a anulação da mencionada liquidação adicional nº 2012….
v) A requerente está registada para o exercício da atividade de promoção imobiliária (desenvolvimento projetos edifícios), tendo iniciado a sua actividade em 2-4-1998
Factos não provados
Não quaisquer outros factos, provados e/ou não provados, alegados ou de conhecimento oficioso, essenciais para apreciação do mérito do pedido.
Fundamentação da fixação da matéria de facto
Os factos provados baseiam-se na prova documental junta aos autos, quer pela Requerente, quer pela Requerida, nomeadamente os juntos pelo pedido de pronúncia arbitral e resposta com junção do processo administrativo, respectivamente, tudo analisado de forma crítica e em conjugação com a inexistência de controvérsia das partes quanto á realidade dos factos essenciais alegados e documentados.
O Direito
Deve assinalar-se preliminarmente que a matéria de facto sobre a qual o Tribunal tem o dever de pronúncia não é toda a que foi alegada e provada, mas tão só e apenas a considerada relevante ou com interesse ou relevância para a decisão (Cfr artigos 591º, 592º, 596º e 607º, do CPC e 123º-2, do CPPT, aplicáveis por força do artigo 29º, do RJAT).
Para além disso, também não está o Tribunal obrigado a analisar todos os argumentos jurídicos invocados pelas partes nos seus articulados e/ou alegações mas tão só e apenas deve analisar e decidir as questões propostas na causa de pedir e nos pedidos.
A questão essencial objeto dos autos centra-se em saber se tem ou não fundamento a liquidação adicional de IRC decorrente de correcções ao lucro tributável da requerente, em resultado da não aceitação como custo fiscal de “provisão para créditos de cobrança duvidosa – créditos em contencioso”, no montante de €2.814.037,12.
A substância ou realidade do negócio que importa para efeitos tributários e que resulta demonstrada e confessada pela requerente, é que esta quis e efetivou uma dação em pagamento à D, mediante a entrega de bens imóveis, de dívidas que havia contraído no âmbito da sua atividade, bem como de dívidas de terceiras entidades, detidas e administradas pelos mesmas pessoas físicas.
A sociedade terceira que beneficiou parcialmente da dação em pagamento porquanto assim viu extinta dívida à D (B, Lda.) e que à data era detida em cerca de 52%[7] pela requerente, não pagou a esta a dívida assim contraída e que foi a real causa da acção judicial instaurada e não contestada, com a consequente sentença condenatória.
Decorrente dessa ação é que foi constituída uma provisão, relevada como custo para efeitos fiscais.
No entender da AT, os custos decorrentes da provisão que foi constituída em função da falta de pagamento da entidade terceira não foram efetuados no âmbito da respectiva actividade, não podendo, por isso, ser aceites como custo para efeitos fiscais.
Na verdade, a questão da admissibilidade ou não da constituição de provisões dedutíveis ao lucro tributável, prende-se óbvia e intimamente com a questão da indispensabilidade dos custos para efeitos do disposto no artigo 23º, do CIRC e com a íntima conexão com a atividade normal do sujeito passivo do imposto.
Para facilidade expositiva transcreve-se o disposto no nº 1 daquele normativo [redação à data (2009)]:
Artigo 23.º
Custos ou perdas
1 - Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes:
a) Encargos relativos à produção ou aquisição de quaisquer bens ou serviços, tais como matérias utilizadas, mão-de-obra, energia e outros gastos gerais de fabricação, conservação e reparação;
b) Encargos de distribuição e venda, abrangendo os de transportes, publicidade e colocação de mercadorias;
c) Encargos de natureza financeira, como juros de capitais alheios aplicados na exploração, descontos, ágios, transferências, diferenças de câmbio, gastos com operações de crédito, cobrança de dívidas e emissão de acções, obrigações e outros títulos e prémios de reembolso;
d) Encargos de natureza administrativa, tais como remunerações, ajudas de custo, pensões ou complementos de reforma, material de consumo corrente, transportes e comunicações, rendas, contencioso, seguros, incluindo os de vida e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de poupança-reforma, contribuições para fundos de pensões e para quaisquer regimes complementares da segurança social;
e) Encargos com análises, racionalização, investigação e consulta;
f) Encargos fiscais e parafiscais;
g) Reintegrações e amortizações;
h) Provisões;
i) Menos-valias realizadas;
j) Indemnizações resultantes de eventos cujo risco não seja segurável.
(...)
Daqui resulta que, para que um determinado gasto de uma pessoa colectiva, possa ser deduzido em sede de IRC, terão de verificar-se dois pressupostos:
a) A comprovação desse gasto;
b) A indispensabilidade do mesmo para o exercício da actividade da pessoa colectiva em questão.
Ora sendo o crédito da requerente resultante do pagamento de dívida de terceiros – fora, por conseguinte, do âmbito da sua atividade normal – a indispensabilidade desse custo ou gasto fica irremediavelmente afectada, sendo certo não estarem alegados e/ou demonstrados factos que possam levar a um eventual juízo de indispensabilidade.
Na verdade, e conforme se tem vindo a decidir em outros processos que correram seus trâmites no CAAD, o requisito da indispensabilidade dos gastos para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, estabelecido pelo artigo 23.º do Código do IRC, tem sido objeto de devido tratamento jurídico pela jurisprudência[8].
Assim é que o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a declarar, no que diz respeito ao sentido e funcionamento do requisito da indispensabilidade dos custos para efeitos fiscais, que o requisito de indispensabilidade de um custo tem de ser interpretado como um conceito indeterminado de necessário preenchimento casuístico, em resultado de uma análise de perspetiva económica empresarial, na perceção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um custo e a sua realização no interesse da empresa, atento o objeto societário do ente comercial em causa (Cfr Acórdãos do STA de 15 de Junho de 2011 e de 29 de Março de 2006, bem como do acórdão do TCA Sul de 16 de Outubro de 2014).
«Os custos indispensáveis equivalem aos gastos contraídos no interesse da empresa ou, por outras palavras, em todos os actos abstractamente subsumíveis num perfil lucrativo. [...] O gasto imprescindível equivale a todo o custo realizado em ordem à obtenção dos ingressos e que represente um decaimento económico para a empresa. Em regra, portanto, a dedutibilidade fiscal depende, apenas, de uma relação causal e justificada com a actividade produtiva da empresa» (Tomás Tavares, “Da relação de dependência parcial entre a contabilidade e o direito fiscal na determinação do rendimento tributável das pessoas colectivas: algumas reflexões ao nível dos custos”, Ciência e Técnica Fiscal, 396, pp. 136 ss.).
Dito de outro modo: só não serão indispensáveis os custos que não tenham relação causal e justificada com a actividade produtiva da empresa. É este o entendimento que vem sendo seguido pela Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo [Entre muitos outros, fazendo um exaustivo tratamento do tema, vide o acórdão de 30 de Novembro de 2011, proferido no processo n.º 107/11, publicado no Apêndice ao Diário da República de 16 de Julho de 2012 (http://dre.pt/pdfgratisac/2011/32240.pdf), págs. 2185 a 2189, também disponível em http://www.dgsi.pt/].
Assim, “(…)o controlo a efectuar pela AT sobre a verificação deste requisito da indispensabilidade tem de ser pela negativa, ou seja, a AT só deverá desconsiderar como custos fiscais os que claramente não tenham potencialidade para gerar incremento dos ganhos, não podendo «o agente administrativo competente para determinar a matéria colectável arvorar-se a gestor e qualificar a indispensabilidade ao nível da boa e da má gestão, segundo o seu sentimento ou sentido pessoal; basta que se trate de operação realizada como acto de gestão, sem se entrar na apreciação dos seus efeitos, positivos ou negativos, do gasto ou encargo assumido para os resultados da realização de proveitos ou para a manutenção da fonte produtora (…)” (Vítor Faveiro, Noções Fundamentais de Direito Fiscal Português, volume II, página 601.).
Ou seja: sendo a regra a liberdade de iniciativa económica e devendo a tributação das empresas incidir fundamentalmente sobre o seu rendimento real (cfr. art. 104.º, n.º 2, da CRP), a norma do n.º 1 do art. 23.º do CIRC, ao limitar a relevância dos custos aos «que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora» tem de ser entendida como permitindo a relevância fiscal de todas as despesas efectivamente concretizadas que sejam potencialmente adequadas a proporcionar proveitos ou ganhos, independentemente do resultado (êxito ou inêxito) que em concreto proporcionaram.
A própria letra daquele n.º 1 do art. 23.º aponta decisivamente nesse sentido com a utilização do tempo verbal futuro «forem», em vez do tempo passado «foram»: a perspectiva adequada para apreciar a indispensabilidade das despesas para a obtenção dos proveitos é do agente económico no momento em que agiu, quando apenas há a possibilidade de as opções empresariais a tomar virem a produzir proveitos e não a da fiscalização tributária, agindo na presença dos resultados obtidos, apreciando a relevância que as despesas tiveram efectivamente para eles serem atingidos.
A esta luz, é de concluir que são de considerar indispensáveis para a realização dos proveitos as despesas que, no momento em que são realizadas, se afigurem como potencialmente geradoras de proveitos, o que tem como corolário só poder ser eliminada a relevância fiscal de um custo quando for de concluir, à face das regras da experiência comum, que não tinha potencialidade para gerar proveitos, isto é, quando se demonstrar que o acto que gera os custos não pode ser considerado como um acto de gestão, por não poder esperar-se, com probabilidade aceitável, que da despesa efectuada possa resultar um proveito (Cfr. acórdão de 15 de Junho de 2012 do CAAD, proferido no processo n.º 29/2012-T, disponível em http://www.caad.org.pt/.
No caso sub juditio, importa sublinhar, para o juízo de indispensabilidade dos custos, que teria de existir uma relação de causalidade económica entre a assunção de um custo e a sua realização no interesse da empresa requerente.
Na relação de causalidade económica do custo com o interesse da empresa, o interesse empresarial que se afere é o da própria empresa que deduz fiscalmente o custo (Cfr acórdão de 10 de Julho de 2002, do STA).
E os custos previstos no artigo 23.º, do CIRC, têm de respeitar à própria sociedade, pelo que para que determinada verba seja considerada custo daquela é necessário que a atividade respetiva seja por ela própria desenvolvida, que não por outras sociedades ainda que em relação de domínio.
A respeito de provisões para cobertura de créditos que não oferecem dúvida ou risco de cobrança, leia-se a alínea d) do n.º 3 do 34.º do Código do IRC (redação vigente à data):
“Não são considerados de cobrança duvidosa os créditos sobre empresas participadas em mais de 10% do capital, salvo nos casos previstos nas alíneas a) e b) do nº 1 (…)”.
A alínea a) do n.º 1 deste artigo 34.º do Código do IRC preceitua interessantemente do modo seguinte.
“São créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade se considere devidamente justificado, o que se verifica no [caso em que] o devedor tenha pendente processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou processo de execução, falência ou insolvência (…)”.
E a alínea b) do n.º 1 do mesmo artigo 34.º acrescenta que, para efeitos de constituição de provisão, são créditos de cobrança duvidosa «os créditos [que] tenham sido reclamados judicialmente».
Quer dizer: não se tratando de créditos em relação aos quais «o devedor tenha pendente processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou processo de execução, falência ou insolvência», nem sucedendo que «os créditos tenham sido reclamados judicialmente», deve concluir-se, em face dos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do citado artigo 34.º do Código do IRC, que a situação não se apresenta como uma daquelas em que «o risco de incobrabilidade se considere devidamente justificado».
Porém, a hipótese central prevista na alínea d) do n.º 3 do 34.º do Código do IRC é a de que «Não são considerados de cobrança duvidosa os créditos sobre empresas participadas em mais de 10% do capital (…)».
E o que sejam empresas ou sociedades participadas ou coligadas, sob a inscrição “Sociedades coligadas”, diz o artigo 482.º do Código das Sociedades Comerciais que se consideram sociedades coligadas: a)- As sociedades em relação de simples participação; b)- As sociedades em relação de participações recíprocas; c)- As sociedades em relação de domínio; d)- As sociedades em relação de grupo.
Por sua vez, o artigo 486.º do Código das Sociedades Comerciais, sob o título “Sociedades em relação de domínio”, reza, no seu n.º 1, do seguinte modo.
“Considera-se que duas sociedades estão em relação de domínio quando uma delas, dita dominante, pode exercer, directamente ou por sociedades ou pessoas que preencham os requisitos indicados no artigo 483.º, n.º 2, sobre a outra, dita dependente, uma influência dominante”.
Sob a epígrafe “Sociedade em relação de simples participação”, o artigo 483.º do Código das Sociedades Comerciais, no seu n.º 2, dispõe como segue.
“À titularidade de quotas ou acções por uma sociedade equipara-se, para efeitos do n.º anterior, a titularidade de quotas ou acções por uma sociedade que dela seja dependente, directa ou indirectamente, ou com ela esteja em relação de grupo, e de acções de que uma pessoa seja titular por conta de qualquer dessas sociedades”.
Podemos assim dizer que, do ponto de vista legal, uma sociedade (a principal ou dominante) está em relação de participação ou domínio com outra (a dependente), quando puder exercer sobre esta uma influência dominante, de modo directo ou indirecto através de sociedades que daquela sejam dependentes, directa ou indirectamente, ou que com ela estejam em relação de grupo, ou igualmente através de pessoas que sejam titulares de acções por conta de qualquer dessas sociedades.
E, então, devemos razoavelmente concluir que as “empresas participadas” em mais de 10% do capital – e em relação às quais, diz a alínea d) do n.º 3 do citado artigo 34.º do Código do IRC os créditos detidos sobre elas não são considerados de cobrança duvidosa –, são as “empresas participadas” por qualquer modo legítimo de sobre elas conseguir exercer uma influência dominante: de modo directo ou de modo indirecto, através de outras sociedades ou mesmo através de pessoas singulares.
Esta é, segundo julgamos, a interpretação imposta pela razão de ser da lei: inaceitabilidade como custo fiscal de provisões relativas a créditos que não ofereçam risco de incobrabilidade, como acontece evidentemente com os créditos que as sociedades dominantes tenham sobre as sociedades de si dependentes em mais de 10% do seu capital social.
Assinale-se ainda que as “provisões” podem ser definidas como custos estimados e actuais (do exercício) correspondentes a despesas cujo montante ainda não é certo ou que são de eventual ocorrência futura.
É, no entanto, essencial ainda, para uma válida e legal constituição de provisões, que o risco (se e quando exista, obviamente) de incobrabilidade de créditos subjacentes às mesmas (provisões), resulte de actividade normal da empresa credora (sujeito passivo).
Concretizando melhor: o legislador fiscal, perante a sobredita realidade empresarial (o risco de incobrabilidade) aceita como custos dedutíveis a constituição de provisões, estabelecendo critérios específicos para o seu reconhecimento, sendo um deles – relevante para o caso sub juditio – que o crédito provisionado resulte da atividade normal do sujeito passivo.
Foi, no caso, entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) que, relativamente ao exercício de 2009 da requerente, a provisão de €2.814.037,12 não podia ser aceite como custo fiscal à luz do disposto nos artigos 34º-1/a) e 35º-1/b), do CIRC (na redação então vigente).
Na verdade, tal como foi alegado pela requerente e transparecia da sua contabilidade, tratava-se de provisão para créditos de cobrança duvidosa, sendo que tal crédito havia sido objeto duma ação judicial, não contestada, instaurada pela requerente contra B - Imobiliária, Lda., sociedade em que a requerente participava em mais de 50% do seu capital.
Ou seja: a provisão foi constituída com base na alínea a) do nº 1 do artigo 34º [“(...) podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes provisões: a) As que tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da atividade normal que no fim do exercício possam ser consideradas de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade (...)” (sublinhado e grifado nosso) e na alínea b) do nº 1 do artigo 35º, do CIRC [“(...)1 - Para efeitos da constituição da provisão prevista na alínea a) do nº 1 do artigo anterior, são créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade se considere devidamente justificado, o que se verifica nos seguintes casos:
a) (…)
b) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente (…)” (CIRC - redacção de 2009).
Pois bem: tal como vem alegado pela requerente e resulta documentado, o crédito provisionado, desconsiderado pela AT para efeitos de apuramento do lucro tributável, é resultante duma efetiva, real e inquestionável dação em pagamento de dívida de terceiro (a sociedade comercial B– Imobiliária, Lda., empresa que se encontrava numa relação de domínio com a requerente e denominada “cliente” no relatório da Inspeção Tributária), que assim se constituiu devedora á requerente.
A causa da dívida de B– Imobiliária, Lda. à requerente A – Imobiliária, Lda., não é resultante da atividade normal desta empresa porquanto não se insere no seu objeto social [promoção imobiliária (desenvolvimento projectos edifícios – CAE …)].
Acentue-se ainda que o registo contabilístico formal da provisão na conta “6723 – Provisões para riscos e encargos – Processos Judiciais em curso” não poderia também ser considerado, porquanto, à luz do então vigente POC (Plano Oficial de Contabilidade), esse registo visava acolher as provisões “(...) pelo montante dos custos esperados, sempre que existam processos judiciais pendentes de resolução e quando se espera que venhamos a perder as causas (grifado nosso) (...)” (Cfr Carlos Santiago, POC Comentado – 14ª Ed./2008, Texto Editora).
Concluindo: quer porque a provisão foi constituída fora do âmbito da atividade normal da requerente quer porque foi efetivada com base em reclamação judicial sem preenchimento dos necessários pressupostos ou requisitos legais, o valor provisionado e contabilizado como custo, no montante de €2.814.037,12 terá efetivamente de ser acrescido ao lucro tributável e, em consequência, é válida a liquidação adicional de IRC e a liquidação de juros compensatórios.
Daí que o pedido de pronúncia arbitral tenha de improceder totalmente.
III DECISÃO
Em face do exposto, acordam os árbitros que constituem este Tribunal Arbitral em:
– julgar totalmente improcedente o pedido de declaração da ilegalidade e consequente anulação da liquidação adicional n.º 2013 … e da liquidação de juros compensatórios n.º 2013 … e do acerto de contas n.º 2013 …, relativos ao exercício de 2009, absolvendo em consequência a Autoridade Tributária e Aduaneira e
– condenar a Requerente nas custas do processo.
Valor do processo
De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º- A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 810.650,86
Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 11.628,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, totalmente a cargo da requerente.
Lisboa e CAAD, 23 de fevereiro de 2015
Os Árbitros
(José Poças Falcão)
(Maria Celeste Cardona)
(João Maricoto Monteiro)
[1] 25º
Designadamente que, conforme se verifica da cláusula segunda, os ¾ que a B – Imobiliária, Ldª, a Cliente para a ATA, prometeu adquirir seriam vendidos à C, a favor de quem o contrato definitivo seria celebrado, “pelo que o mesmo apenas poderá ser formalizado por escritura pública outorgada a favor da mesma”.
26º
Porque, conforme consta de tal cláusula segunda, “tal imóvel não pode ser dividido”.
27º
Divisão essa impossível face ao disposto no nº 1 do artº 54º da Lei 91/95, de 2/9 (Processo de reconversão das áreas urbanas de génese ilegal), com a redacção da Lei 64/2003, de 23/8, que passou a estipular que “a celebração de quaisquer actos ou negócios jurídicos entre vivos de que resulte ou possa vir a resultar a constituição ou ampliação do número de compartes de prédios rústicos carece de parecer favorável da câmara municipal da localização dos prédios”.
28º
Sendo nulos, segundo a mesma lei, “os actos ou negócios jurídicos celebrados em violação do disposto no nº 1 do presente artigo, tendo também a câmara municipal legitimidade para promover a respectiva declaração judicial”, conforme nº 4 do mesmo normativo legal.
[2] Não tendo a B Imobiliária, Lda contestado, por sentença de 22-3-2010 os factos articulados na petição foram considerados confessados e a acção foi julgada procedente, tendo a referida B Imobiliária, Lda., sido condenada a pagar à A Imobiliária, Lda, ora requerente arbitral, a quantia reclamada de 2.814.037,12€, bem como juros de mora (que também haviam sido peticionados).
[3]Disse-o, nomeadamente, em sede do direito de audição que veio exercer no âmbito do procedimento inspectivo (junto ao PA).
[4] Em razão do pagamento dessas dívidas, a D viabilizava o cancelamento das hipotecas que oneravam os imóveis em causa.
[5] Relativamente à ora requerente.
[6] Ou, mais especificamente, “conta 71223 Vendas”.
[7] À data dos factos a requerente detinha duas quotas de € 12 719,34 na B – Imobiliária, Ldª, num capital social de € 49 879,78],
[8] A questão da indispensabilidade dos custos para efeitos do artigo 23º do CIRC tem sido objeto de análise doutrinária e da jurisprudência.
Assim e como acentua António Moura Portugal (“A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa”, maxime, pgs. 171/172), “A dedutibilidade ou aceitação de custos contidos no balanço deixou de ser uma questão de facto e passa a ser uma questão de direito, com reflexos ao nível do ónus da prova, que deixa de caber ao contribuinte” (sublinhado nosso).
Mais adiante o mesmo Autor acentua:
“A solução legal de aceitação da contabilidade do sujeito passivo dota os registos do contribuinte de uma presunção de veracidade, no sentido de que se aceita que esta informação traduz uma situação fiel e verdadeira da situação patrimonial da empresa, transladando o ónus de prova da incongruência ou falsidade dessa informação como representação fiel para o Fisco”.
Aliás este princípio encontra-se espelhado também no âmbito da LGT, nos artigos 74º e 75º que se referem, respetivamente ao ónus da prova e à declaração e outros elementos do contribuinte.