Sumário:
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O artigo 173.º, n.º 2, alínea c) da Diretiva IVA foi transposto pelo artigo 23.º, n.ºs 2 e 3 do Código do IVA, permitindo à AT a imposição do método de afetação real previsto no ponto 9 do Ofício-circulado n.º 30108, de 30 de janeiro de 2009 (coeficiente de imputação específico), no caso de instituições de crédito que desenvolvam simultaneamente as atividades de Leasing ou de ALD.
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O coeficiente de imputação específico é um critério objetivo passível de fundar a aplicação do método da afetação real, de acordo com o disposto no artigo 23.º, n.ºs 2 e 3 do Código do IVA, pois representa um método de dedução mais preciso do que o pro rata geral, conquanto a utilização dos bens ou serviços mistos seja sobretudo determinada pela gestão e financiamento dos contratos, condição que a Requerente, sobre quem recaía o ónus, não logrou afastar.
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O coeficiente de imputação específico tem suporte legal, pelo que não resulta violado o princípio da legalidade e conforma-se ao princípio da igualdade e neutralidade fiscal atendendo a que propicia uma dedução mais aproximada do nível de consumo efetivo dos recursos de utilização mista por parte da atividade gerada pelos contratos de locação.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros designados para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 30 de agosto de 2023, Alexandra Coelho Martins (presidente), Tomás Castro Tavares e António de Barros Lima Guerreiro, acordam no seguinte:
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Relatório
A..., S.A. – Sucursal em Portugal, representação permanente em Portugal de sociedade de direito espanhol, com escritório na ..., n.º ..., ...-... Lisboa, titular do número único de matrícula e de pessoa coletiva ..., adiante “Requerente”, apresentou pedido de constituição de Tribunal Arbitral e de pronúncia arbitral, ao abrigo dos artigos 95.º, n.ºs 1 e 2, alínea d) da Lei Geral Tributária (“LGT”), 99.º, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a), 10.º, n.ºs 1, alínea a) e 2 do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, na redação vigente.
É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira, de seguida identificada por “AT” ou Requerida.
A Requerente pretende a anulação parcial, por ilegalidade, no valor de € 97.474,96, da autoliquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”), respeitante ao último período de 2020, bem como a anulação da decisão de indeferimento expresso da reclamação graciosa deduzida contra aquela autoliquidação, e consequente condenação da Requerida, quer no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT, quer nas custas do processo.
Em 26 de junho de 2023, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e, de seguida, notificado à AT.
De acordo com o preceituado nos artigos 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT, o Exmo. Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável. As Partes, notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar.
O Tribunal Arbitral Coletivo ficou constituído em 30 de agosto de 2023.
Em 3 de outubro de 2023, a Requerida apresentou a sua Resposta, com defesa por impugnação, e juntou o processo administrativo (“PA”).
Em 26 de outubro de 2023, teve lugar a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, na qual foi inquirida a testemunha indicada pela Requerente. As Partes foram notificadas para apresentarem alegações escritas e o Tribunal indicou o dia 29 de fevereiro de 2024 como data-limite de prolação da decisão arbitral (v. ata que se dá por reproduzida e gravação áudio disponível no SGP do CAAD).
Ambas as Partes apresentaram alegações em 10 de novembro de 2023, tendo reafirmado, no essencial, as posições assumidas nos respetivos articulados.
Posição da Requerente
A Requerente pugna pela aplicação do método do pro rata geral estabelecido no artigo 23.º, n.º 4 do Código do IVA aos gastos indiferenciados em que incorre e não concorda com a posição da AT, que defende o afastamento desse método por alegadamente ocasionar distorções significativas na tributação, substituindo-o pelo coeficiente de imputação específico, previsto no ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108, de 30 de janeiro de 2009, da Área de Gestão Tributária do IVA.
Em relação ao IVA incorrido nos recursos de utilização mista, a Requerente entende ser de incluir no numerador e denominador da fração de cálculo de apuramento da percentagem de dedução, não apenas os juros e encargos similares, mas também a componente de capital (i.e., da amortização financeira) da atividade de locação financeira, como decorre do método geral do pro rata, opondo-se ao disposto no referido ponto 9 do Ofício-Circulado, segundo o qual a componente de capital não deve influenciar o apuramento da percentagem de dedução.
Segundo a Requerente, o método preconizado pela AT não se coaduna com o princípio da neutralidade fiscal, pois apesar de ter de liquidar o IVA sobre a totalidade do valor das rendas, não pode deduzir o imposto incorrido nos inputs relacionados com essa atividade, ainda que apurado numa base proporcional, pois tal proporção, nos moldes em que a AT a entende, apenas deve ter em conta a componente do juro daquelas rendas.
Suscita ainda a Requerente a inconstitucionalidade do artigo 23.º, n.ºs 2 e 3 do Código do IVA:
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Por violação do princípio da legalidade e dos artigos 103.º, n.º 2 [tipicidade/reserva de lei material e extensão da reserva de lei formal], 112.º, n.º 5 e 165.º, n.º 1, alínea i) da Constituição (“CRP”) [reserva de lei formal], na medida em que aquela norma do Código do IVA seja interpretada como permitindo à AT impor um método de determinação da matéria tributável (no caso, da dedução do IVA) por via de Circular; e
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Por violação do princípio da igualdade e do artigo 13.º, n.º 1 da CRP, na interpretação de que permite a imposição de um método de dedução específico em função do setor de atividade, por configurar uma diferenciação arbitrária sem fundamento material, assente apenas na atividade principal desenvolvida pelo sujeito passivo e na sua forma jurídica de instituição de crédito. Considera que este regime de exceção coloca as instituições de crédito que exercem a atividade de leasing numa posição de desvantagem em relação a outros sujeitos passivos que desenvolvem a mesma atividade e suportam custos semelhantes.
Por outro lado, e a título subsidiário, a Requerente enfatiza que a imposição do método da afetação real pela Requerida pressupunha que o método por si aplicado conduzisse a distorções significativas na tributação, o que não só a AT não demonstrou, sendo seu ónus (v. artigo 74.º, n.º 1 da LGT), como não sucede no caso em apreço. Acrescenta que a ocorrência de distorções não pode efetuar-se por via do Ofício-Circulado n.º 30.108, uma vez que tem de verificar-se no caso concreto, como resulta do artigo 173.º, n.º 2 da Diretiva IVA e do artigo 23.º, n.º 3 do Código do IVA.
Refere que o Ofício-Circulado é uma orientação administrativa dotada de mera eficácia interna que não pode servir de parâmetro de validade do ato tributário.
De acordo com a Requerente, ainda que se demonstrasse a ocorrência de distorção, impunha-se que a AT demonstrasse que o método alternativo escolhido (o coeficiente de imputação específico) era o mais adequado a suprir essas mesmas distorções, o que igualmente não sucedeu, com violação do princípio da proporcionalidade.
A título subsidiário, a Requerente invoca que no seu caso concreto o consumo de recursos indiferenciados foi sobretudo determinado, no ano 2020, no âmbito da atividade de locação financeira, pelas tarefas inerentes à utilização dos bens locados e não ao financiamento propriamente dito, distinguindo-se, portanto, da situação do Acórdão Banco Mais, de 18 de outubro de 2018, processo C-183/13.
Assim, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça (Acórdão Banco Mais supra citado e Acórdão Volkwagen Financial Services, de 18 de outubro de 2018, processo 153/17) e dos tribunais nacionais a componente de amortização do capital ínsita nas rendas deve relevar na determinação do imposto dedutível relativo aos recursos indiferenciados consumidos.
Posição da Requerida
Em posição oposta, a Requerida defende que o apuramento da percentagem de dedução efetuado em linha com o Ofício-Circulado n.º 30108 está em perfeita concordância com as normas de direito da União Europeia e interno e não enferma de erro.
Argui que é no âmbito dos poderes conferidos à AT pela alínea b) do n.º 3 do artigo 23.º do Código do IVA que se enquadra o Ofício-Circulado n.º 30108. Este consagra uma solução para afastar as distorções geradas pela aplicação do pro rata, em linha com o disposto nos artigos 173.º e 174.º da Diretiva IVA e 23.º do Código do IVA, salvaguardando o princípio da neutralidade e da igualdade de tratamento de todos os sujeitos passivos, sem prejuízo de as instituições financeiras poderem recorrer a critérios de afetação real distintos do coeficiente de imputação específico, desde que se mostrem idóneos ao fim pretendido.
Segundo a Requerida, a atividade da Requerente é, em substância, a concessão de financiamento, cuja contrapartida remuneratória compreende, essencialmente, juros e outros encargos incluídos nas rendas. O facto de o valor integral da renda, pago pelo locatário ao locador, constituir o valor tributável sobre o qual incide o IVA não significa que a parte da renda correspondente à amortização financeira tenha de ser incluída no cômputo do apuramento da percentagem de dedução, conjuntamente com a parte correspondente aos juros e outros encargos.
Desde logo, porque a renda constitui o pagamento do serviço de concessão de financiamento ao locador, sendo composta por duas partes: capital ou amortização financeira, que mais não é que o reembolso da quantia “emprestada” e juros, acrescidos de eventuais encargos, que constituem a remuneração do locado.
Tendo a Requerente exercido o direito à dedução integral do IVA, no momento de aquisição do bem objeto da locação, por via do método da imputação direta, deve ser expurgada do cálculo da percentagem de dedução a parte da renda que corresponde ao valor da amortização financeira, pois esta consubstancia a restituição do capital financiado/investido para a aquisição do bem locado.
É apenas o diferencial (genericamente juros) que se encontra conexo com a aquisição de recursos de utilização mista, i.e., os consumidos indistintamente em operações com e sem direito à dedução, pelo que o coeficiente de imputação específico não origina qualquer restrição do direito legítimo à dedução.
O entendimento distinto preconizado pela Requerente é que permitiria um aumento artificial da percentagem de dedução do IVA incorrido nos inputs de utilização mista.
O Tribunal de Justiça no processo Banco Mais, C-183/13, de 10 de julho de 2014, vem corroborar a conformidade do procedimento preconizado pela AT, considerando que pode ser aplicado um critério diferente do volume de negócios, se este método for o mais preciso (mais aproximado da realidade), o que se verifica se a utilização dos bens e serviços de utilização mista for sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos de locação financeira (e não pela disponibilização dos bens dados em locação), interpretação que foi igualmente acolhida pelos tribunais nacionais.
Na perspetiva da Requerida, a Requerente tinha o ónus de provar que a utilização de bens ou serviços de utilização mista foi sobretudo determinada pela disponibilização dos bens locados, o que não fez. Nomeadamente que, no âmbito dos contratos de locação financeira, os atos de disponibilização tinham absorvido uma carga administrativa predominante face aos atos de gestão e de financiamento.
Aliás, o facto confessado pela Requerente – de que é inviável a aplicação de uma contabilidade analítica que permita quantificar com detalhe, rigor e fidedignidade os recursos indiferenciados afetos à sua atividade – obsta à conclusão que aquela pretende alcançar, de que os inputs em que incorre com a disponibilização dos bens nos contratos de locação financeira são predominantes em relação aos inputs gastos com o financiamento e gestão desses contratos.
A Requerida aduz que a Requerente tenta qualificar atos de gestão e de financiamento de um contrato de locação, de molde a serem apelidados de atos de disponibilização de bens. No entanto, estes últimos reportam-se à pré-venda e ao momento de entrega do bem ao cliente, no início do contrato, não se confundindo com o conceito de cedência temporária do gozo dos bens locados que perdura durante a execução do contrato.
Para a Requerida, os demais custos respeitam ao financiamento concedido e à gestão do contrato. Com efeito, considera que todos os atos efetuados pela Requerente como receção de multas, coimas, IUC, reboques, parqueamentos, contencioso, entre outros, inerentes à vida do contrato celebrado com o cliente, são decorrência da necessidade de controlar e gerir as suas responsabilidades contratuais e de preservar o financiamento efetuado, que se concretiza com o bom pagamento das rendas pelo locatário.
Estes gastos, que a Requerente discrimina ao longo do seu pedido arbitral, são suportados pelos clientes locatários, seja por via contratual, através de comissões que lhes são diretamente debitadas, ou por via da componente de renda ligada aos encargos e à taxa de risco.
Por outro lado, afirma que a Requerente não provou que a percentagem de dedução que alega (de 9%) era aquela efetivamente consumida na atividade de locação financeira e, dentro desta, consumida predominantemente nos atos de disponibilização dos bens dados em locação. Além de que o método do pro rata (v. artigo 23.º, n.º 4 do Código do IVA) não tem mérito para medir o grau de utilização que as duas categorias de operações – com e sem direito à dedução – fazem dos bens e serviços que lhes são indistintamente alocados.
No que respeita à violação de princípios e normas constitucionais, a Requerida preconiza não se constatar a violação do princípio da legalidade, contribuindo as orientações constantes no ponto 9. do Ofício-Circulado 30.108 para a praticabilidade dos desígnios constitucionais previstos nos artigos 103.º e 104.º da CRP, nem da igualdade, tendo em conta que é o nível de dedução adequado que salvaguarda a justiça fiscal em relação a todos os sujeitos passivos.
Quanto ao entendimento plasmado no processo C-153/17 do Tribunal de Justiça (Volkswagen Financial Services), a Requerida considera-o inaplicável ao caso, pois versa sobre situação de facto e de direito distinta.
Conclui pela absolvição de todos os pedidos.
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Saneamento
O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, relativa a um ato de autoliquidação de IVA, atenta a conformação do objeto do processo (v. artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 5.º do RJAT).
O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, conjugado com o artigo 102.º, n.º 1, alínea e) do Código de Processo e Procedimento Tributário (“CPPT”), tendo em conta que o indeferimento da reclamação graciosa foi notificado por ofício datado de 22 de março de 2023 e que a presente ação deduzida em 22 de junho de 2023.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (v. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
Não foram identificadas questões prévias a apreciar, nem nulidades.
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Fundamentação de Facto
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Factos Provados
Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos:
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A..., S.A. – Sucursal em Portugal, aqui Requerente, é uma instituição financeira abrangida pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (“RGICSF”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro – cf. Documentos 4 e 6 e PA.
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A Requerente, no âmbito da sua atividade, realiza, simultaneamente, operações abrangidas por regimes diferenciados de IVA, em concreto:
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Operações financeiras isentas de acordo com o disposto no artigo 9.º, n.º 27 do Código do IVA, nomeadamente operações de financiamento e concessão de crédito e operações associadas a pagamentos, as quais não conferem o direito à dedução do imposto incorrido;
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Operações que conferem o direito à dedução, nos termos do artigo 20.º, n.º 1, alínea b) do Código do IVA, como a locação financeira mobiliária, locação de cofres e custódia de títulos – cf. Documento 6 e PA.
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Nas situações em que identificou uma conexão direta e exclusiva entre determinadas aquisições de bens e serviços (inputs) e as operações ativas (outputs) realizadas, a Requerente aplicou o método da imputação direta, ao abrigo do disposto artigo 20.º, n.º 1 do Código do IVA, o que sucedeu, desde logo:
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Quanto à aquisição das viaturas objeto dos contratos de locação financeira que, por estarem diretamente ligadas a operações tributadas a jusante, beneficiaram da dedução integral deste imposto;
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Em relação às aquisições de bens e serviços utilizados somente em operações que não conferem o direito à dedução, nas quais não foi deduzido qualquer IVA – cf. Documento 6 e PA.
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Nos casos em que a Requerente identificou uma conexão direta, mas não exclusiva, entre as aquisições de bens e serviços e as operações ativas realizadas com direito à dedução, aplicou o método de dedução parcial previsto no artigo 23.º, n.º 2 do Código do IVA, de duas formas:
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Através da determinação de critérios objetivos do nível de utilização efetiva dos recursos adquiridos nas distintas tipologias de operações (com e sem direito à dedução), o que sucedeu com os encargos especificamente associados à aquisição de terminais de pagamento automático;
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Nas situações em que não logrou identificar esses critérios objetivos, por via da aplicação do coeficiente de imputação específico dedução plasmado no ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108, de 30 de janeiro de 2009, da Área de Gestão Tributária do IVA – cf. Documento 6 e PA.
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Quanto aos recursos indiferenciados afetos à sua atividade [ponto D que imediatamente antecede], a Requerente não dispõe de uma contabilidade analítica que lhe permita quantificar a parte afeta à atividade de locação financeira e às suas diversas operações – cf. facto confessado, corroborado pelo depoimento da testemunha inquirida.
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O Ofício-Circulado n.º 30108, de 30 de janeiro de 2009, regulamenta as regras do direito à dedução do IVA incorrido pelas instituições de crédito na aquisição de bens e serviços de utilização mista (indistintamente utilizados para a realização de operações que conferem e que não conferem o direito à dedução), quando aquelas instituições desenvolvem simultaneamente atividades de leasing ou de ALD e de financiamento, como sucede com a Requerente – disponível para consulta em https://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/legislacao/instrucoes_administrativas/Documents/OficCirc_30108.pdf.
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Dispõe este Ofício-Circulado, no que aos presentes autos releva, o seguinte:
“[…]
5. No caso específico das entidades financeiras que desenvolvem igualmente actividades de Leasing ou de ALD, a prática conjunta de operações de concessão de crédito e de locação tributada, incluindo a locação financeira, implica, quando houver bens e serviços adquiridos que sejam conjuntamente utilizados em ambas, a necessidade de recorrer às disposições do artigo 23.º do CIVA para apuramento da parcela do imposto suportado, que é passível de direito a dedução.
[…]
7. Face à actual redacção do artigo 23.º, a afectação real é o método que, tendo por base critérios objectivos de imputação, mais se ajusta ao apuramento do IVA dedutível nos bens e serviços de utilização mista.
8. Nesse sentido, considerando que o apuramento do IVA dedutível segundo a aplicação do prorata geral estabelecido no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA é susceptível de provocar vantagens ou prejuízos injustificados pela falta de coerência das variáveis nele utilizadas, ou seja, pode conduzir a “distorções significativas na tributação”, os sujeitos passivos que no âmbito de actividades financeiras pratiquem operações de Leasing ou de ALD, devem utilizar, nos termos do nº.2 do artigo 23º do CIVA, a afectação real com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços, de modo a determinar o montante de IVA a deduzir relativamente ao conjunto das actividades.
9. Na aplicação do método da afectação real, nos termos do número anterior e sempre que não seja possível a aplicação de critérios objectivos de imputação dos custos comuns, deve ser utilizado um coeficiente de imputação específico, tendo em conta os valores envolvidos, devendo ser considerado no cálculo da percentagem de dedução apenas o montante anual correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de Leasing ou de ALD. Neste caso, a percentagem atrás referida não resulta da aplicação do nº. 4 do artigo 23º do CIVA.”
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A Requerente desenvolve a atividade de locação financeira. Porém, desde o final do ano 2017, deixou de celebrar novos contratos. Estes passaram a ser celebrados por outra entidade do Grupo B... . Assim, à data dos factos (ano 2020), em relação às operações de locação financeira mobiliária, a Requerente apenas era responsável pela execução dos contratos celebrados antes de 2018 e ainda vigentes – cf. Documento 4 e depoimento da testemunha inquirida.
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Os contratos de locação financeira mobiliária celebrados pela Requerente duram, em média, 5 anos, podendo variar entre 3 e 7 anos – cf. depoimento da testemunha inquirida.
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Em 2020, a carteira da Requerente compreendia 90 contratos de locação financeira mobiliária, dos quais 28 referentes a automóveis (€ 599 159,59 de capital) e 62 relativos a equipamentos (€ 1 927 104,48 de capital) – cf. Documento 6, PA e depoimento da testemunha inquirida.
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Os contratos de locação financeira mobiliária da Requerente pressupõem um maior número de diligências/tarefas, resultantes do facto de ser proprietária do bem locado, por comparação com os contratos de concessão de financiamento, em concreto:
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A verificação de que o cliente celebrou contrato de seguro em que a Requerente figure como beneficiária e com as coberturas pretendidas;
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Contacto com o fornecedor quando da entrega do bem e monitorização desse processo;
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Receção do auto de receção do bem e da fatura, com o subsequente pagamento ao fornecedor;
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Trâmites de registo do bem, quando for o caso (v.g. viaturas automóveis);
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Recebimento de notificações por infrações ao Código da Estrada ou por falta de pagamento do IUC, exercício de defesa, contactos com o locatário e eventual pagamento seguido de redébito ao cliente;
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Em caso de sinistro, contactos com as seguradoras para reparação do bem ou com sucateiros se forem “salvados”;
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Seleção e controlo das entidades responsáveis pela reparação dos veículos e equipamentos;
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Havendo incumprimento definitivo, realização de diligências de recuperação dos bens e tendentes à sua venda;
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Contactos com os locatários para exercício da opção de compra, ou, se esta não for exercida, recuperação do bem, cancelamento do ónus de locação financeira e diligências para a venda do bem
– cf. Documento 6 e depoimento da testemunha inquirida.
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As tarefas referidas no ponto anterior apenas ocorrem nos contratos de locação financeira e as referidas nas alíneas a) a d) reportam-se à disponibilização do bem no início do contrato, pelo que não tiveram lugar em 2020 – cf. Documento 6, PA e depoimento da testemunha inquirida.
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A Requerente tem um manual de procedimentos para a atividade de locação financeira mobiliária – cf. Documento 3.
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A Requerente tem 1 colaborador afeto em exclusivo à atividade de locação financeira, na área das operações – cf. depoimento da testemunha inquirida.
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Em regime de não exclusividade, a Requerente afeta, ainda, entre 10 a 15 colaboradores à atividade de locação financeira mobiliária, dispondo, no total, de mais de 300 colaboradores, para a sua atividade global – cf. depoimento da testemunha inquirida.
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O gestor do cliente é o ponto de contacto preferencial dos clientes com a Requerente. É este que trata, quer das questões que se suscitam referentes aos contratos de locação financeira, quer daquelas que respeitam a contratos de mútuo/financiamento – cf. depoimento da testemunha inquirida.
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É feita uma visita anual pelo gestor de conta a cada cliente empresarial, mas esta visita engloba a relação geral com o cliente e não visa especificamente o acompanhamento do contrato de locação financeira mobiliária – cf. depoimento da testemunha inquirida.
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Na Requerente, as tarefas de gestão de cash-flows estão automatizadas/informatizadas. As operações associadas à utilização dos bens locados, no decurso da execução do contrato de locação financeira, quando ocorrem, pressupõem maior intervenção humana – cf. depoimento da testemunha inquirida.
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O preçário da Requerente prevê a cobrança de diversas comissões aos clientes. Além da comissão de abertura de dossier, que no caso não foi aplicada por inexistirem contratos novos desde 2018, são contempladas, entre outras, comissões no âmbito da execução do contrato, como as de tratamento, de reembolso antecipado, de recuperação de valores em dívida e de gestão anual – cf. depoimento da testemunha inquirida.
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A comissão de tratamento visa remunerar a Requerente pelo acompanhamento de situações de coimas por infrações ao Código da Estrada, portagens e IUC relativos aos bens locados, quando se trata de viaturas. Podem existir casos em que os gastos incorridos pela Requerentes são superiores ao valor cobrado aos clientes, via comissão, o que sucede designadamente quando há pedidos de pareceres a entidades externas, como advogados – cf. depoimento da testemunha inquirida.
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As situações que suscitam a mencionada comissão de tratamento são pouco frequentes, porque a expressiva maioria dos contratos locação financeira mobiliária tem por objeto equipamentos e não viaturas automóveis. Mesmo no âmbito do universo mais restrito dos contratos de leasing automóvel tais casos são de ocorrência rara e residual – cf. depoimento da testemunha inquirida.
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O incumprimento contratual é, de igual modo, passível de suscitar um acréscimo no consumo de recursos por parte da Requerente, quer respeite a contratos de locação, quer de financiamento. Para este efeito, está prevista uma comissão de “recuperação de valores em dívida”. Relativamente à locação financeira mobiliária, no ano 2020, apenas foram identificados 2 casos de incumprimento, num total de 90 contratos ativos – cf. depoimento da testemunha inquirida e preçário disponível online https://www...
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A comissão de gestão anual não chegou a ser efetivamente cobrada pela Requerente, em virtude de os novos contratos terem passado a ser celebrados, desde 2018, por outra entidade do grupo – cf. depoimento da testemunha inquirida e preçário disponível online https://www...pdf.
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Em regra, na locação financeira de automóveis o cliente exerce a opção de compra, pelo que, na prática, não se verificam encargos com a venda dos bens. Na locação de equipamentos é mais comum o não exercício da opção de compra, circunstância em que estes são, normalmente, vendidos para sucata – cf. depoimento da testemunha inquirida.
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Na determinação do tipo de comissões cobradas e respetivo valor, a Requerente toma em consideração as condições praticadas no mercado por instituições de crédito concorrentes, existindo um alinhamento das comissões da Requerente com o padrão das comissões divulgadas por outras instituições de crédito de referência – cf. depoimento da testemunha inquirida.
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No apuramento definitivo do IVA dedutível do ano 2020, a Requerente adotou o procedimento previsto no acima citado Ofício-Circulado, do que resultou uma percentagem de dedução definitiva de 7%, aplicável ao imposto incorrido nos recursos indiferenciados, não tendo sido considerada na fração de cálculo subjacente (quer no numerador, quer no denominador), a componente do capital associado à atividade de locação financeira (i.e. da amortização financeira). Esta dedução cifrou-se no valor de IVA deduzido de € 341 162,34 – cf. Documento 1.
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Porém, a Requerente não concorda com esta posição e defende que também devia ser incluída no numerador e denominador da fração de cálculo a componente do capital, pelo que a percentagem definitiva de dedução é de 9% e não de 7%, correspondendo o IVA dedutível a € 438 637,30 e não a € 341 162,34 – cf. Documento 1.
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Inconformada com a autoliquidação de IVA efetuada com referência ao período de dezembro de 2020, na parte referente à determinação do imposto dedutível nos moldes do Ofício-Circulado n.º 30108, a Requerente apresentou reclamação graciosa solicitando a respetiva correção no montante de € 97 474,96 a título de imposto indevidamente não deduzido – cf. Documento 5.
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A Requerente foi notificada, em 11 de fevereiro de 2023, do projeto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa, com fundamento na validade da metodologia constante do ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108 – cf. Documento 6.
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A 24 de março de 2023, a Requerente foi notificada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa que converteu em definitivo o entendimento constante do projeto – cf. Documento 6.
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Em discordância da decisão de indeferimento da reclamação graciosa que manteve a autoliquidação de IVA do período de dezembro de 2020, a Requerente apresentou junto do CAAD, em 22 de junho de 2023, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral que deu origem ao presente processo – cf. registo de entrada do pedido de pronúncia arbitral (“ppa”) no SGP do CAAD.
2. Motivação da Decisão da Matéria de Facto e Factos não Provados
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica e das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, não tendo o Tribunal que se pronunciar sobre todas as alegações das Partes, mas apenas sobre as questões de facto necessárias para a decisão.
No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se essencialmente na análise crítica da prova documental junta aos autos pelas Partes e nas posições por estas assumidas em relação aos factos, complementadas com o depoimento da testemunha inquirida, funcionário da Requerente, C..., que era, à data dos factos, gestor de produto na área do leasing.
A testemunha demonstrou conhecimento direto dos procedimentos da Requerente, na respetiva função e área de intervenção, começando por salientar que, desde 2018, os contratos novos eram encaminhados para outra entidade do mesmo grupo, mantendo a Requerente somente a gestão dos contratos ativos celebrados antes de 2018. De onde se conclui que, em 2020, todos os factos alegados em relação à fase inicial de celebração dos (novos) contratos de locação financeira e à disponibilização dos bens não têm qualquer aplicabilidade à Requerente.
Quanto aos contratos em execução, a testemunha expressou a existência de diversos gastos relevantes associados à propriedade dos bens dados em locação e à gestão dos mesmos que não se constatam no âmbito dos contratos de financiamento, como os referentes: (i) à contratação de seguros, respetivas cobertura e validade; (ii) a coimas por infrações ao Código da Estrada; (iii) ao não pagamento de portagens e de IUC ; (iv) à gestão de sinistros [implicando contacto com seguradoras e sucateiras]; e (v) a tarefas de venda dos bens no final do contrato, se não for exercida a opção de compra. Assinalou que o incumprimento contratual era pouco frequente.
Contudo, a testemunha não revelou conhecimento sobre a quantidade de coimas, multas, IUC, sinistros, opções de compra não exercidas, invocados como geradores de maior dispêndio de recursos indiferenciados, referindo, em alguns casos, estarmos perante situações pouco frequentes. Também não soube dizer em relação a quantos contratos de locação no ano 2020 foram pedidos pareceres.
Convém notar que alguns dos gastos acrescidos indicados pela testemunha (como os gastos com pareceres) são essencialmente gastos específicos e exclusivos da atividade (e dos contratos) de locação, não revestindo a característica de recursos de utilização mista simultaneamente afetos à realização das operações de financiamento/crédito, ou seja, estão fora do contexto da questão de direito que se suscita nos presentes autos, que se situa no quadro do artigo 23.º do Código do IVA[1].
Por outro lado, não ficou provada alegação de que a locação financeira requer maior dispêndio de recursos indiferenciados[2] [e é só desses que aqui se trata], ou, dito de outro modo, que os gastos comuns sejam de forma muito mais significativa consumidos pela atividade de locação financeira mobiliária, por oposição à atividade de financiamento/concessão de crédito. Seja porque os gastos alegados são específicos da atividade de locação (vg. os pareceres) e não são gastos comuns cujo IVA tenha de ser repartido por um método de dedução mista previsto no artigo 23.º do Código do IVA; seja porque, em relação aos gastos que não são específicos (os gastos indiferenciados, também ditos de utilização mista), a testemunha referiu que, na sua maioria, não ocorreram, ou só ocorreram de forma pontual (v.g. duas situações de incumprimento contratual em 2020) e que não consegue dar nota da dimensão do respetivo impacto (frequência e número de ocorrências), não tendo sido junta qualquer prova documental nesse sentido.
De salientar que, de acordo com a prova documental e testemunhal, além das rendas periódicas de locação, o preçário da Requerente prevê o débito de comissões autónomas que remuneram os serviços de tratamento das coimas, portagens, IUC’s, ou os serviços adicionais de contencioso (comissão de “recuperação de valores em dívida”). Estas comissões são contempladas no numerador e no denominador da fração de cálculo da percentagem de dedução, incrementando proporcionalmente a dedução do IVA da Requerente.
A Requerente afirma que estas comissões não visam compensar diretamente o consumo de recursos indiferenciados, constituindo uma forma de remuneração cujo valor não varia em função do aumento de tais custos (artigo 53.º do ppa), tendo a testemunha referido a este respeito que as comissões são cobradas[3], mas que não se referem aos gastos efetivos que, em seu entender, são superiores, não sendo ressarcidos na totalidade.
Afigura-se que a Requerente e a testemunha confundem o tema dos gastos comuns à locação e ao financiamento a crédito, com outro plano, que se prende com a repercussão destes [gastos] em valor inferior ao suportado. A questão de saber se um gasto é exclusivo ou comum não depende do redébito ou imputação do mesmo aos clientes ou do valor dessa imputação, se aplicável.
Um gasto é exclusivo se a utilização/consumo do bem ou serviço adquirido pertencer a uma das áreas (locação ou crédito) e for perfeitamente identificável (vg. os aludidos pareceres). Um gasto pode ser exclusivo da área de locação e não ser redebitado (configurando eventualmente uma prestação de serviços gratuita), ou sê-lo por um valor inferior ao de aquisição (com “prejuízo”). O facto de os gastos não serem imputados ou serem-no por um valor reduzido não significa que sejam comuns. A caraterística de serem comuns/gerais, que é aquela que está em discussão nestes autos, como pressuposto de aplicação do regime do artigo 23.º do Código do IVA (métodos de dedução parcial) respeita a outra propriedade: a de respeitarem a recursos que são consumidos por ambas as áreas de atividade.
Em síntese, da prova produzida não se demonstrou a alegação da Requerente de que os recursos indiferenciados foram consumidos sobretudo pela atividade de locação. Por fim, importa assinalar que a grande maioria das situações invocadas respeita à fase de execução ou termo dos contratos (pagamento do IUC, multas, portagens, sinistros, incumprimento ou não exercício de opção de compra) e não ao momento inicial de disponibilização das viaturas aos locatários.
Com relevo para a decisão não existem outros factos alegados que devam considerar-se não provados.
Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas Partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.
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Do Direito
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Nota introdutória
Discute-se na presente ação a validade do critério de imputação específica, previsto no ponto 9 do citado Ofício-Circulado n.º 30108, ao qual a Requerente aponta as seguintes ilegalidades, de seguida conhecidas pela ordem indicada (v. artigo 124.º, n.º 2 do CPPT):
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Violação do princípio da legalidade, por entender que se trata de matéria de incidência sob reserva de lei formal, que não pode ser objeto de regulação por Ofício-Circulado, pelo que o artigo 23.º, n.º 2, do Código do IVA padece de inconstitucionalidade material, quando permite à AT impor um método de dedução por via de Circular (v. artigos 103.º, n.º 2, 112.º, n.º 5 e 165.º, n.º 1, alínea i) da CRP);
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Violação do princípio da igualdade, em virtude de, na sua perspetiva, ser imposto um tratamento diferenciado às instituições de crédito face a outros sujeitos passivos que não revistam essa forma [de instituição de crédito], para a realização de uma atividade idêntica, a locação financeira. Considera que tal diferenciação é arbitrária, porque desprovida de fundamento material bastante, devendo a ponderação das operações que conferem direito à dedução vs. operações que não conferem esse direito ser efetuada no estrito âmbito da atividade de locação financeira, sem que relevem as demais atividades prosseguidas pela Requerente;
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Violação do disposto no artigo 23.º, n.º 3 do Código do IVA, por ausência de distorções significativas na tributação que constituem pressuposto sine qua non da aplicação imperativa do método da afetação real. A este respeito, a Requerente considera que essas distorções têm de ser demonstradas pela AT de forma casuística, não podendo ser inferidas em abstrato da prossecução de uma dada atividade e, ainda, que um Ofício-Circulado não pode constituir o parâmetro de validade do ato. Acrescenta que a AT não demonstrou que o método do coeficiente de imputação específico era o mais adequado, com a inerente violação do princípio da proporcionalidade;
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Violação da jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre o direito à dedução, nomeadamente a relativa aos casos Banco Mais (C-183/13) e Volkswagen Financial Services (C-153/17), uma vez que considera ter demonstrado que, no ano em causa [2020], o consumo de recursos indiferenciados foi sobretudo determinado, no âmbito da atividade de locação financeira, pelas tarefas inerentes à utilização dos bens locados (ao invés de às tarefas inerentes ao financiamento), circunstância em que o Tribunal de Justiça, secundado pelo Supremo Tribunal Administrativo, julga não ser admissível a exclusão da componente de capital das rendas.
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Sobre a violação do princípio da legalidade
Não vem questionada nesta ação a conformidade do Ofício-Circulado n.º 30 108 ao direito da União Europeia, em concreto, à Diretiva IVA (Diretiva 2006/112/CE, de 28 de novembro de 2006), ponto que foi apreciado em sentido afirmativo pelo Tribunal de Justiça no processo de reenvio prejudicial C-183/13, Banco Mais, com acórdão datado de 10 de julho de 2014.
O caso Banco Mais versa sobre uma situação similar à da Requerente, reportada a uma instituição de crédito que desenvolvia a atividade de locação financeira em simultâneo com a atividade de concessão de crédito. Chamado a pronunciar-se, o Tribunal de Justiça concluiu que o artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c) da Sexta Diretiva (correspondente ao atual artigo 173.º, n.º 2, alínea c) da Diretiva IVA que a substituiu) permite que um Estado-Membro obrigue um banco que exerce atividades de locação financeira a incluir no “numerador e no denominador da fração que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução para todos os seus bens e serviços de utilização mista, apenas a parte das rendas pagas pelos clientes, no âmbito dos seus contratos de locação financeira, que corresponde aos juros, quando a utilização desses bens e serviços seja sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão desses contratos”.
Sublinha ainda o Tribunal de Justiça neste aresto que cabe aos Estados-Membros estabelecer as regras que concretizem o método da afetação real tendo em conta “a finalidade e a sistemática da referida diretiva e os princípios em que assenta o sistema comum do IVA”, nomeadamente o da “neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas” (pontos 23 a 27 do Acórdão Banco Mais).
Para este efeito, importa ter em conta as características específicas próprias das atividades dos sujeitos passivos, a fim de se obterem resultados mais precisos na determinação do alcance do direito à dedução, pois o princípio da neutralidade fiscal, inerente ao sistema comum do IVA, exige que as modalidades do cálculo da dedução reflitam objetivamente a parte real das despesas efetuadas com a aquisição de bens e serviços de utilização mista que pode ser imputada a operações que conferem direito à dedução (pontos 29 a 31 do Acórdão Banco Mais).
Sobre saber se o método previsto no ponto 9 do Ofício-Circulado é um verdadeiro método de afetação real que, nas palavras de Xavier de Basto e Maria Odete Oliveira[4], permita medir a “intensidade efetiva e real da utilização dos bens ou serviços em cada um dos tipos de operações em causa”, assente em critérios objetivos, o Tribunal de Justiça confirma-o, desde que a utilização dos recursos seja, como acima referido, “sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos de locação financeira celebrados com os seus clientes, e não pela disponibilização dos veículos” (ponto 33 do Acórdão Banco Mais), o que constitui questão de facto que adiante se analisa, tendo em conta a prova adquirida nestes autos.
Este entendimento do Tribunal de Justiça tem vindo a ser sucessivamente reiterado pelo Supremo Tribunal Administrativo, referindo-se, a título ilustrativo, os acórdãos de 29 de outubro de 2014, processo n.º 1075/13; de 4 de março de 2015, processo n.º 1017/12; de 3 de junho de 2015, processo n.º 0970/13; de 17 de junho de 2015, processo n.º 0956/13; de 15 de novembro de 2017, processo n.º 0485/17; de 20 de janeiro de 2021, processo n.º 0101/19.1BALSB; e de 24 de fevereiro de 2021, processo n.º 084/19.8BALSB[5].
Neste contexto, o Supremo Tribunal Administrativo, por Acórdão do Pleno, de 20 de janeiro de 2021, proferido no processo 0101/19.1BALSB, que aqui se acompanha, reforça que o método de imputação específica, constitui uma expressão do método da afetação real, legalmente suportado no artigo 23.º, n.ºs 2 e 3 do Código do IVA, norma que transpõe para o direito interno o artigo 173.º, n.º 2, alínea c) da Diretiva IVA. Sendo que não existe apenas uma forma de proceder à afetação de bens e serviços, conforme se retira do seguinte excerto ilustrativo:
“A confirmar que o sistema de afetação real comporta diferentes modalidades e apresenta, por isso, uma certa plasticidade que permita ajustar o sistema de dedução às especificidades da atividade prosseguida pelo sujeito passivo vem a segunda parte do preceito [artigo 23.º, n.º 2 do Código do IVA], segundo a qual a Administração Tributária pode impor «condições especiais». Isto é, condições que permitam o «afinamento» (a expressão é do artigo que acima citamos, pág. 62) do método de dedução.
Pelo que a Recorrente tem razão nesta parte: o método a que alude o ponto 9 do ofício-circulado supra aludido não tem apenas cabimento na lei comunitária; também tem cabimento na lei interna.
Pelo que as referências ao princípio da legalidade e da reserva de lei também não se nos afiguram pertinentes, ao menos por aqui.”[6]
A argumentação expendida, que parte da jurisprudência do Tribunal de Justiça no Acórdão Banco Mais, acaba por ter repercussões na análise da violação do princípio da legalidade suscitada na presente ação.
Convém notar que a Requerente tenta abordar esta questão de outro ângulo, para alcançar a conclusão de que o princípio da legalidade resulta violado, embora, adiante-se, sem razão.
A Requerente não contesta que o Ofício-Circulado n.º 30108 tenha suporte legal no artigo 23.º, n.ºs 2 e 3 do Código do IVA, daí não derivando desvio (formal) ao princípio da legalidade. Contudo, considera que a matéria em causa (o método de dedução parcial do IVA) respeita à incidência do imposto, pelo que não pode ser objeto de regulação que não seja por via legal, imputando inconstitucionalidade material ao n.º 2 do citado artigo do Código do IVA, ao permitir à AT a imposição de um método de dedução sem ser por via legislativa.
Todavia, quer o método do imposto (i.e., a afetação real), quer as circunstâncias da sua aplicação – voluntária ou impositiva –, estão contidos, com suficiente grau de detalhe e densificação, na previsão legal do artigo 23.º, n.ºs 2 e 3 do Código do IVA. Estamos, pois, perante um método previsto e regulado por via legislativa, ao invés do que a Requerente defende.
Interessa não perder de vista a teleologia expressa por esta disciplina [do artigo 23.º, n.ºs 2 e 3 do Código do IVA], cuja finalidade consiste em determinar, da melhor forma possível e com maior grau de aproximação, a utilização/consumo efetivo dos recursos adquiridos pelas distintas áreas de atividade e operações do sujeito passivo (as que conferem e as que não conferem o direito à dedução) e, em consequência, superar as limitações do método do pro rata, que, por ser apenas presuntivo, nem sempre reflete de forma adequada a devida proporção da dedução do IVA.
O que significa que a afetação real tem sempre subjacente o desígnio, meritório, de máxima aproximação à realidade económica, ao consumo efetivo dos recursos[7], a benefício do princípio da neutralidade, que constitui expressão do princípio da igualdade.
Acresce que o princípio da legalidade não se opõe à aplicação tipificante de conceitos que têm recorte e base legal, por via de regulamento administrativo[8].
Dito isto, a incidência objetiva do IVA na vertente da dedução parcial é materialmente definida pela lei – in casu, pelo artigo 23.º, n.ºs 2 e 3 do Código do IVA (em transposição da Diretiva IVA) – e não, como defende a Requerente, por mera instrução administrativa. O Ofício-Circulado n.º 30108 limita-se a concretizar a previsão legal[9] e é desprovido de caráter inovatório.
São, aliás, inúmeros os exemplos em que o regime fiscal é definido por lei nos seus contornos essenciais e certos aspetos particulares, incluindo quantitativos e metodológicos, são regulados por instrumento que não reveste tal forma, como os regulamentos administrativos (seja, por portaria, Ofícios-Circulados, entre outros).
A título de exemplo, veja-se o regime de tributação do subsídio de refeição atribuído aos colaboradores, para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”). O artigo 2.º, n.º 3, alínea b), ponto 2) do respetivo Código estipula que a tributação incide somente na parte em que o subsídio exceda o limite legal, ou o exceda em 60%, se for atribuído através de vales de refeição. Ora, este limite foi fixado por Portaria (v. Portaria n.º 280/2022, de 18 de novembro) e respeita ao apuramento do imposto a pagar, ao quantum (incidência). Também os valores-limite da compensação devida ao trabalhador pelas despesas adicionais com a prestação de trabalho em regime de teletrabalho, que não constitui rendimento para efeitos fiscais ou base de incidência contributiva para a segurança social, foram fixados por Portaria (Portaria n.º 292-A/2023, de 29 de setembro). Não há qualquer ilegalidade a apontar nestes casos, porquanto a lei “habilitante” contém os pressupostos essenciais da incidência, tal como no caso da afetação real que nos ocupa.
Portaria n.º 292-A/2023, de 29 de setembro
À face do exposto, improcede a apontada violação do princípio da legalidade, questão de direito que foi também apreciada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo no sentido preconizado[10], pois não existe um novo método que tenha sido criado pelo Ofício-Circulado n.º 30108. Este limita-se a aplicar a lei, que é seu fundamento, dentro dos limites por aquela estabelecidos, nomeadamente no que se refere à desadequação do método do pro rata geral, por conduzir a distorções significativas na tributação, e à necessária objetividade na determinação do grau de utilização dos bens e serviços (v. Acórdão proferido no processo n.º 0101/19.1BALSB, de 20 de janeiro de 2021).
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Sobre a violação do princípio da igualdade
Assente o pressuposto de que o coeficiente de imputação específica é enquadrável no método da afetação real e tem base legal[11], interessa aferir se esse método constitui um critério objetivo e ajustado para medir o grau de afetação/utilização dos bens e serviços comuns às diversas atividades (com e sem direito à dedução). Ou, dito de outro modo, se estamos perante “uma modalidade do cálculo de dedução que reflita objetivamente a parte real das despesas efetuadas com bens ou serviços de utilização mista que é imputada a operações que conferem o direito à dedução.” – v. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 0101/19.1BALSB, de 20 de janeiro de 2021. Este aspeto é essencial para, entre outros, apreciar e decidir a invocada violação do princípio da igualdade.
A este respeito, compulsa-se de novo o acórdão do Tribunal de Justiça no processo Banco Mais, que estabelece um parâmetro aproximativo e não uma exigência de rigor milimétrico, que, na prática, impediria a aplicação de soluções viáveis a coberto de posições impregnadas de formalismo, paradoxalmente condutoras a maiores distorções e desigualdade.
O que interessa, segundo aquele Tribunal europeu, é que o critério adotado seja mais preciso do que o resultante do método supletivo do pro rata (geral), considerando as especificidades do sujeito passivo[12], o que acontece se a utilização dos bens e serviços for sobretudo determinada pelo financiamento e gestão dos contratos, interpretação que o Supremo Tribunal Administrativo entende também dever ser extraída das disposições nacionais que procedem à transposição da norma da Diretiva IVA, nos termos da jurisprudência antes citada.
Desta forma, o próprio Tribunal de Justiça, secundado pelo Supremo Tribunal Administrativo, reconhecem que a solução do coeficiente de imputação específico se conforma aos princípios da neutralidade fiscal e da proporcionalidade, pois representa um método de dedução mais preciso, conquanto a utilização dos bens ou serviços mistos seja sobretudo determinada pela gestão e financiamento dos contratos (pontos 30, 31 e 34 do acórdão Banco Mais), sendo esta última questão atinente aos pressupostos de facto, adiante analisada.
É incontornável que a tendencial maior aproximação à realidade do consumo dos recursos trazida pela afetação real permite alcançar de forma otimizada o princípio da igualdade, em oposição à tese apresentada pela Requerente.
Não colhe o argumento da Requerente de que o critério da atividade (principal) dos sujeitos passivos que sejam instituições de crédito os sujeita a um tratamento diferenciado (o do coeficiente de imputação específico), desprovido de fundamento material e que seja, por essa razão, um critério arbitrário. Desde logo, porque é a especificidade da atividade financeira (de concessão de crédito) das instituições de crédito[13] que suscita a distorção na tributação do IVA, pelo que essa atividade não pode deixar de ser a chave da distinção.
Independentemente disso, não se vislumbra que o tratamento “diferenciado” conduza a uma situação desfavorável, seja porque uma sociedade de locação financeira que se dedique apenas a essa atividade deduz o IVA na totalidade, a menos que também realize locação financeira imobiliária, caso em que deve a aplicar igualmente o método da afetação real (v. Decreto-Lei n.º 21/2007, de 29 de janeiro, e Ofício n.º..., de 18 de julho de 1989, da DSIVA); seja porque permitindo o método da imputação específica uma melhor aproximação da realidade (na condição de o consumo dos recursos indiferenciados ser sobretudo determinado pelo financiamento e gestão dos contratos de locação financeira), o seu resultado há-se ser mais fidedigno do que o do pro rata geral, pelo que as instituições de crédito não ficam prejudicadas, quando muito não serão beneficiadas, evitando-se vantagens indevidas face aos demais operadores, essas, sim, violadoras da igualdade de tratamento.
Em relação à afirmação da Requerente de que a ponderação das operações que conferem direito à dedução vs. operações que não conferem esse direito deve ser efetuada no estrito âmbito da atividade de locação financeira, sem que relevem as demais atividades prosseguidas pela Requerente, a mesma é de rejeitar liminarmente. Com efeito, no domínio dos recursos de utilização mista, a determinação do nível do seu consumo por parte das atividades/operações com regimes de IVA distintos (com e sem direito à dedução) exige precisamente que se comparem essas atividades. É um exercício relacional, sendo essencial à repartição que o método de dedução parcial opere a comparação das realidades que se estão a repartir.
À face do exposto, soçobra igualmente a alegada violação do princípio da igualdade.
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Da violação do artigo 23.º, n.º 3 do Código do IVA por ausência de distorções significativas na tributação
A aplicação impositiva do método da afetação real depende da constatação de que o método do pro rata conduz a distorções significativas na tributação, o que, de acordo com a Requerente, não foi demonstrado pela Requerida, devendo sê-lo de forma casuística, nem se verifica na realidade.
Neste contexto, compulsado o Ofício-Circulado n.º 30108, não subsistem dúvidas de que este contém, no seu ponto 8, a justificação para o afastamento do método do pro rata: este é suscetível de provocar vantagens ou prejuízos injustificados pela falta de coerência das variáveis nele utilizadas, podendo conduzir a distorções significativas na tributação.
Asserção que é inteiramente válida do ponto de vista material, porquanto, derivado do conceito de volume de negócios, a comparação das operações, tributadas e isentas, efetuada pela fração de cálculo do artigo 23.º, n.º 4 do Código do IVA, no caso de atividades financeiras (em sentido lato) que incluam a locação e a concessão de crédito, é feita entre realidades economicamente não equiparáveis, o que representa, a priori, de facto, uma distorção.
Do ponto de vista económico, quer a locação financeira, quer a concessão de crédito, implicam que o locador/mutuante, ceda uma quantia para adquirir o bem (no caso da locação) ou para emprestar (no caso de financiamento), sendo essa cedência remunerada (do ponto de vista económico, reitera-se) por uma taxa de juro em ambas as situações.
Na primeira [locação], esse juro está incluído na renda debitada (em regra com periodicidade mensal), que contém também uma outra parte que representa a amortização (devolução) do capital despendido para a aquisição do bem dado em locação[14]. Na segunda situação [financiamento], o juro é debitado de forma separada do reembolso da componente do capital mutuado. Porém, apesar dos distintos procedimentos de redébito (em conjunto ou separado), do ponto de vista económico estamos, em ambos os casos, perante cedências de fundos remuneradas por juros[15].
Tanto assim é que o tratamento contabilístico conferido às locações, nos termos da IFRS 16[16], é equiparado ao das operações de financiamento ou concessão de crédito, não sendo refletidos, nas contas de rendimentos/ganhos do locador, os valores do capital cedido ou usado para a compra dos bens locados, mas tão-só o montante da remuneração daquele capital (juros auferidos). Em consequência também o é o tratamento fiscal para efeitos de IRC.
Deste modo, para se comparar a remuneração dos dois tipos de operações, as variáveis de referência (ou termos de comparação) apenas serão congruentes na perspetiva económica se, de duas uma:
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Compararmos os “juros” da locação com os “juros” das operações de financiamento, como resulta do coeficiente de imputação específico; ou
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Compararmos a totalidade das operações, incluindo capital e juros.
Dada a conformação da locação financeira para efeitos de IVA, que suscita a incidência do imposto sobre a totalidade da renda (contraprestação), se aplicarmos a fórmula do método supletivo do pro rata, acabamos por comparar a renda [que tem duas componentes: capital e juros] apenas com a componente de juro isenta (contraprestação) das operações de financiamento.
De facto, a componente de capital no caso de operações de financiamento, não cai no âmbito de sujeição a IVA, sendo, por razões técnicas de definição do valor tributável das operações, excluída da referida fórmula de cálculo. Por esta razão, resulta desvirtuada a usual presunção (subjacente ao pro rata) de que a comparação dos valores de contraprestação das operações traduz, em princípio, uma aproximação razoável do consumo de recursos mistos pelas diversas tipologias de operações.
Com efeito, na situação sub iudicio, pelos motivos descritos, na fórmula de cálculo do pro rata geral prevista na lei (artigo 23.º, n.º 4 do Código do IVA) deparamo-nos com termos de comparação não equivalentes, nem equiparáveis do ponto de vista económico, suscitando o incremento da percentagem de dedução para níveis presumivelmente superiores aos do consumo efetivo dos recursos mistos, por parte da atividade de locação.
Por outro lado, importa reforçar que o valor da renda tributada em IVA relativo à parte do reembolso do capital usado para a aquisição dos bens dados em locação (ou amortização financeira) não é ignorado, uma vez que contribui diretamente para a dedução integral do IVA incorrido na aquisição desses bens (que são recursos específicos e exclusivos da locação).
Com efeito, ao IVA liquidado na renda pelo locador, aqui Requerente, é totalmente subtraído o IVA incorrido com a aquisição dos bens, pelo que, sendo o contrato de locação executado até ao seu termo, o IVA liquidado na componente da amortização financeira da renda é totalmente absorvido e compensado pelo IVA deduzido com a aquisição dos bens locados.
A parte sobrante [juros e outros encargos] da renda é aquela que visa remunerar os gastos gerais da atividade de locação. Pelo que é a componente da renda remanescente ao capital (este exclusivamente afeto ao input do bem adquirido para locação) que há-de refletir a ponderação por parte do sujeito passivo dos gastos (inputs) que este estima incorrer na operação e da sua margem financeira. É esta componente dos juros e outros encargos que representa a (única) remuneração económica dos gastos da atividade de leasing, como aliás é patenteado pelas normas contabilísticas e de tributação do imposto sobre o rendimento.
Em síntese, do ponto de vista da adequação, em abstrato, do método de determinação da dedutibilidade dos gastos mistos, a comparação entre as diversas contraprestações da atividade da Requerente apenas é proporcional e equilibrada se tiver em conta a componente de juros e outros encargos e já não a do capital, que, à partida, não apresenta conexão com esses gastos mistos e apenas com o input de aquisição dos bens dados em locação, cujo IVA é deduzido integralmente pelo método da imputação direta[17].
Neste termos, não pode deixar de concluir-se que o Ofício-Circulado em análise indica as razões do método preconizado, referindo expressamente a falta de coerência das variáveis de cálculo do pro rata (geral), e aponta a suscetibilidade de vantagens ou prejuízos injustificados daí derivados, com distorções significativas na tributação.
Pelo que se conclui que, no plano abstrato ou “para-regulamentar”, a AT defendeu e justificou, ainda que de forma sucinta, que a aplicação do método de imputação específica assenta num critério mais objetivo e adequado, por ser mais aproximativo da realidade, do que a aplicação do pro rata geral, dadas as variáveis tidas em conta no cálculo deste último, provenientes da fórmula imperativa do artigo 23.º, n.º 4 do Código do IVA.
Conclusão que está em sintonia com o acórdão do Tribunal de Justiça no processo Banco Mais ao sancionar o entendimento de que o método do coeficiente de imputação específica é “conforme com os princípios da neutralidade fiscal e da proporcionalidade”. Nestes moldes, “a validade do método da Administração Tributária não depende do facto de ser ajustável totalmente à atividade do sujeito passivo (o que, de qualquer modo, teria que ser analisado em concreto); depende, tão só, do facto de ser o mais ajustado. O que acontece neste tipo de atividade se a utilização de bens ou serviços de utilização mista, como edifícios, consumo de eletricidade ou certos serviços transversais, for sobretudo determinada pelo financiamento e gestão dos contratos.” – v. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 0101/19.1BALSB, de 20 de janeiro de 2021.
De referir que o Ofício-Circulado não constitui o parâmetro de validade da autoliquidação, cujo suporte é o artigo 23.º, n.ºs 2 e 3 do Código do IVA.
Relativamente à indispensabilidade de uma demonstração casuística, por parte da AT, dos pressupostos factuais que subjazem à aplicação do coeficiente de imputação específico, coloca-se a questão de saber se, à luz das regras que estabelecem o ónus de alegação e prova dos factos constitutivos dos direitos que as partes se arrogam (v. artigo 74.º da LGT), aquela teria que “invocar e demonstrar no procedimento ou nos autos a factualidade que permitisse formular um juízo (de facto) sobre se a utilização dos bens ou serviços é sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos” – v. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 0101/19.1BALSB, de 20 de janeiro de 2021.
Relembra-se que, quando o ato de liquidação adicional de IVA se fundamente no não reconhecimento das deduções declaradas pelo sujeito passivo, cabe a este a prova dos factos constitutivos do direito à dedução. Pelo que, em oposição à tese da Requerente, é sobre esta que recai tal ónus, e não sobre a Requerida. É ao sujeito passivo que compete alegar e demonstrar que, no seu caso concreto, a utilização dos bens ou serviços mistos não foi sobretudo determinada pela gestão e financiamento dos contratos. Neste sentido se pronuncia, de igual modo, o Supremo Tribunal Administrativo, que reputa tal solução adequada “também porque o sujeito passivo, dada a sua proximidade com a fonte produtora, está mais bem posicionado para expor as especificidades do seu negócio.” – v., por todos, o Acórdão proferido no processo n.º 0101/19.1BALSB, de 20 de janeiro de 2021.
Conclui-se neste segmento que não procede o argumento da invalidade da autoliquidação por falta de comprovação concreta da AT.
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Dos Pressupostos de facto – utilização dos recursos indiferenciados determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos
Como acabou de se referir, é sobre o sujeito passivo que impende o ónus de demonstração que, sendo uma instituição de crédito que realiza operações de locação financeira mobiliária, no seu caso, o consumo de bens e serviços de utilização mista não é sobretudo determinado pelo financiamento e pela gestão dos contratos, antes pela disponibilização dos bens locados.
A Requerente propugna o seu enquadramento nesta última hipótese e equipara à disponibilização dos bens locados a “utilização” dos mesmos. Porém, afigura-se de antemão que as tarefas associadas à utilização dos bens locados – designadamente, coimas, pagamento de IUC, portagens – se situam no âmbito da gestão e execução dos contratos de locação, não se reportando à fase da disponibilização desses bens. Logo, disponibilização e utilização são conceitos distintos e não sinónimos, inexistindo qualquer referência a este último no dispositivo do Acórdão Banco Mais.
Por outro lado, não ressalta da matéria de facto provada que tenha ocorrido um consumo mais expressivo de recursos mistos por parte da área de locação financeira da Requerente e que a utilização destes não tenha sido sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos, antes pela disponibilização dos bens locados.
Os exemplos que a Requerente identifica como representativos de gastos comuns implicados essencialmente pela atividade de locação financeira mobiliária não têm a virtualidade de lograr essa demonstração, porquanto:
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Alguns não consubstanciam recursos de utilização mista, mas recursos específicos e exclusivos dos contratos de locação, claramente identificados, como sejam os pareceres (alheios ao objeto da presente ação, referente a recursos indiferenciados). Aliás, é a própria Requerente que assinala que os gastos inerentes à propriedade dos bens não seriam incorridos se se dedicasse apenas à atividade de financiamento (concessão de crédito); e
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Outros, ou são inexistentes no período em causa, ou pouco frequentes/raros, não tendo sido facultados dados quantitativos que permitam inferir a respetiva relevância. De novo, é a própria Requerente que, em termos incompatíveis e contraditórios à sua pretensão, afirma não dispor de contabilidade analítica que permita quantificar com detalhe, rigor e fidedignidade os recursos indiferenciados afetos à sua atividade.
Em relação ao argumento da posição do Tribunal de Justiça no acórdão proferido em 18 de outubro de 2018, no processo C-153/17, Volkswagen FS, que determina que os Estados-Membros não podem aplicar um critério de repartição do IVA dedutível nos recursos mistos que não tenha em conta o valor inicial do bem em causa no momento da sua entrega, do mesmo não se retira a desconformidade do método previsto no ponto 9 do Ofício-Circulado, sendo incorreta a interpretação que dele faz a Requerente.
No caso Volkswagen FS, a situação fática apreciada é distinta da aqui em causa, pois “o direito do Reino Unido obriga à desagregação do leasing em duas operações: a disponibilização do veículo e o seu financiamento. […] Para efeitos de IVA, as duas operações são tratadas de forma distinta também. A disponibilização do veículo constitui uma operação tributada; ao passo que o financiamento é tido como uma operação de concessão de crédito isenta.” – v. Sérgio Vasques, “IVA, Pro rata e Locação Financeira”, Cadernos IVA 2020, p. 523.
Acresce que as conclusões do Tribunal de Justiça nesse processo C-153/17 foram ditadas pelo facto de o tribunal nacional de reenvio ter previamente determinado que, no caso concreto, os custos gerais tinham uma relação direta e imediata com a totalidade das atividades do sujeito passivo e, assim, também com a disponibilização dos veículos, aí tratada como operação autónoma. Na situação vertente, para tal, a Requerente teria de demonstrar que os recursos de utilização mista foram sobretudo determinados pela disponibilização dos veículos locados, o que, como se viu, não se verificou.
No mesmo sentido veja-se ainda a posição do Supremo Tribunal Administrativo acerca da mesma questão:
“Como decorre do seu parágrafo 56, o Tribunal de Justiça da União Europeia não pretendeu ali reformular o entendimento firmado no acórdão “Banco-Mais”, mas sublinhar que aquela jurisprudência não podia ser aplicada de maneira geral, abrangendo todos os tipos de operações de locação financeira para o setor automóvel.
Incluindo aquelas em que a aplicação de um método de repartição que não tenha em conta o valor do veículo aquando na sua entrega não seja adequada a garantir uma repartição mais precisa do que a baseada no volume de negócios.
O que sucedia naquele caso específico porque havia uma afetação real e significativa dos custos gerais a operações que conferiam o direito à dedução (§ 57). Porque esses custos eram efetuados tendo em vista a disponibilização de veículos (§ 44) e eram, apesar disso, imputados aos próprios custos de financiamento, em vez de serem imputados ao valor inicial do veículo aquando da sua entrega (§ 13).
Em lado algum se conclui que, no caso dos autos, também havia uma afetação significativa dos custos gerais à disponibilização dos veículos […].
Pelo que a invocação da jurisprudência firmada no acórdão C-153/17 não se nos afigura pertinente nem acrescenta nada ao juízo ali fornecido sobre a legalidade da liquidação.” – v. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 0101/19.1BALSB, de 20 de janeiro de 2021.
À face do exposto, também nesta matéria é improcedente a argumentação da Requerente.
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Juros Indemnizatórios
A Requerente pede a condenação da entidade requerida no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT. Contudo, a autoliquidação de IVA parcialmente impugnada não padece dos vícios invalidantes que lhe foram imputados pela Requerente e mantém-se válida. Improcede, deste modo, por falta de preenchimento dos respetivos pressupostos constitutivos, o pedido de juros indemnizatórios.
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Desnecessidade de Reenvio Prejudicial
As questões discutidas nos autos estão clarificadas pelo Tribunal de Justiça, conforme a jurisprudência que foi atrás referenciada.
Neste contexto, de acordo com o entendimento do Tribunal de Justiça, a partir do acórdão Cilfit[18], a obrigação de suscitar a questão prejudicial de interpretação pode ser dispensada quando:
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A questão não for necessária, nem pertinente para o julgamento do litígio principal; ou
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O Tribunal de Justiça já se tiver pronunciado de forma firme sobre a questão a reenviar, ou quando já exista jurisprudência sua consolidada sobre a mesma; ou
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O juiz nacional não tenha dúvidas razoáveis quanto à solução a dar à questão de Direito da União, por o sentido da norma em causa ser claro e evidente.
No caso sub judice, verifica-se o preenchimento dos requisitos previstos nas alíneas b) e c), podendo afirmar-se que o “ato” em questão está devidamente aclarado pela jurisprudência consolidada do Tribunal de Justiça que se pronunciou sobre a matéria, pelo que não há fundamento para suscitar o reenvio prejudicial.
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Por fim, importa referir que foram conhecidas e apreciadas as questões relevantes submetidas à apreciação deste Tribunal, não o tendo sido aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras, nos termos do disposto nos artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
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Decisão
Atento o exposto, acordam os árbitros deste Tribunal Arbitral em julgar improcedente a ação arbitral, incluindo o pedido de juros indemnizatórios, com a consequente manutenção da autoliquidação de IVA, referente ao período de dezembro de 2020, e da decisão da reclamação graciosa que sobre a mesma recaiu.
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Valor do Processo
Fixa-se ao processo o valor de € 97.474,96, indicado pela Requerente, respeitante ao montante de IVA autoliquidado cuja anulação pretende, não impugnado pela Requerida, de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, este último ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
VII. Custas
Custas no montante de € 2.754,00, a cargo da Requerente, em razão do decaimento, de acordo com a Tabela I anexa ao RCPAT e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT, 4.º, n.º 5 do RCPAT e 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
Notifique-se.
Lisboa, 19 de dezembro de 2023
Os árbitros,
Alexandra Coelho Martins, relatora
Tomás Castro Tavares
António de Barros Lima Guerreiro
[1] Os recursos exclusivos são deduzidos, ou não, nos termos do artigo 20.º do Código do IVA, enquadramento que não está em discussão no caso dos autos.
[2] V. artigo 42.º do ppa.
[3] Com exceção da comissão de gestão, que nunca chegou a ser debitada pela Requerente, dada a “transferência” da atividade nova para outra entidade do grupo.
[4] V. “Desfazendo mal-entendidos em matéria do direito à dedução”, Revista das Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 1, número 1, p. 50.
[5] Doravante segue-se, por todos, o acórdão proferido no processo n.º 0101/19.1BALSB.
[6] Sérgio Vasques vai mais além e conclui mesmo que “aquilo que, no contexto do sistema IVA, consubstancia o método da afetação real, é questão que não está na disponibilidade dos tribunais nacionais determinar.” – v. “IVA, Pro rata e Locação Financeira”, Cadernos IVA 2020, p. 523.
[7] Ainda que suscite dificuldades práticas de aplicação, desde logo na identificação dos ditos critérios objetivos, mas também na sua aplicação pelo que reveste maior complexidade do que o método do pro rata geral.
[8] V. sobre esta questão Ana Paula Dourado, O Princípio da Legalidade Fiscal: Tipicidade, Conceitos Jurídicos Indeterminados e Margem de Livre Apreciação, Almedina Teses, 2015.
[9] Configura um regulamento de execução.
[10] Apesar de a Requerente pretender que o Supremo Tribunal Administrativo não se pronunciou sobre a inconstitucionalidade por violação do princípio da legalidade nos moldes formulados nesta ação, na verdade, essa pronúncia (de não desconformidade ao standard constitucional) está contida na fundamentação expressa do judiciado, que versa especificamente sobre o artigo 23.º, n.ºs 2 e 3 do Código do IVA e sobre a concretização, por via de Ofício-Circulado, da metodologia a aplicar ao setor de atividade em que se insere a Requerente.
[11] Neste sentido, v. a título ilustrativo as decisões nos processos arbitrais, no âmbito do CAAD, sob os n.ºs 709/2019-T, 383/2019-T e 887-2019-T, este último com voto de vencido da Prof. Doutora Clotilde Celorico Palma.
[12] N.º 34 do acórdão Banco Mais (C-183/13).
[13] A atividade financeira está, em regra, abrangida pelo regime de isenção de IVA.
[14] Ou seja, quando a quantia do capital é paga pelo locatário, por via das rendas, não constitui a remuneração da atividade do locador, mas o pagamento parcelar do custo de aquisição do bem locado, in casu, dos bens que, findo o contrato, e se este se executar e desenvolver dentro da normalidade, passarão para a esfera jurídica do locatário mediante o exercício da opção de compra e o pagamento do valor residual constante do contrato. Só a componente de juro incluída nas rendas constitui verdadeiramente a “remuneração” do locador.
[15] A manutenção da propriedade do bem adquirido na esfera do locador constitui uma forma de garantia acrescida do cumprimento das obrigações, um “colateral” reforçado, tal como o é a reserva de propriedade.
[16] V. Regulamento (CE) N.º 1126/2008 da Comissão, de 3 de novembro de 2008, com as alterações subsequentes, designadamente a do Regulamento (UE) 2017/1986 da Comissão, de 31 de outubro de 2017. Note-se que este tratamento contabilístico determina o regime fiscal, para efeitos de IRC, pois dada a dependência (parcial) da fiscalidade em relação à contabilidade, somente concorre para a formação do lucro/rendimento tributável o valor dos juros e já não do reembolso de capital, como não podia deixar de ser, pois este último não representa qualquer acréscimo patrimonial na esfera do locador.
[17] Neste sentido, veja-se a fundamentação da decisão proferida no processo arbitral n.º 278/2020-T, de 13 de abril de 2021.
[18] Acórdão de 6 de outubro de 1982, processo n.º 283/81.