Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 72/2015-T
Data da decisão: 2015-06-11  Selo  
Valor do pedido: € 4.246,77
Tema: IS - Verba 28.1 da TGIS; Inutilidade superveniente da lide; Responsabilidade pelo pagamento da taxa arbitral
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CAAD – Centro de Arbitragem Tributária

PROCESSO ARBITRAL N.º 72/2015-T

Tema: Imposto do Selo. Verba 28.1 da TGIS. Inutilidade superveniente da lide. Responsabilidade pelo pagamento da taxa arbitral.

 

DECISÃO ARBITRAL

1.    RELATÓRIO

 

A, NIF …, residente na …, B, casada, NIF …, residente na … e, C, divorciado, NIF …, residente na …, (doravante designados por Requerentes), apresentaram pedido de constituição de tribunal arbitral nos termos do disposto nos artigos 2.º e 10.º, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante AT ou Requerida), com vista à declaração de ilegalidade dos atos de liquidação das segundas prestações de Imposto do Selo do ano de 2013, relativas ao prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo ... da freguesia de ..., concelho de Lisboa, de que são comproprietários.

As referidas segundas prestações de Imposto do Selo do ano de 2013, no valor global de € 4 246,77, encontram-se tituladas pelas notas de cobrança n.ºs 2014 ...8, 2014 ...8, 2014 ...6, 2014 ...4, 2014 ...2, 2014 ...0, emitidas em nome da primeira Requerente, n.ºs 2014 ...2, 2014 ...2, 2014 ...0, 2014...8, 2014 ...6, 2014 ...4, em nome da segunda Requerente e n.ºs 2014 ...6, 2014 ...6, 2014 ...4, 2014 ...2, 2014 ...0, 2014 ...8, em nome do terceiro Requerente, todas com data de pagamento voluntário em novembro de 2014, conforme a prova documental junta ao pedido de pronúncia arbitral.

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral deu entrada no CAAD em 6 de fevereiro de 2015, foi aceite pelo Exm.º Presidente do CAAD em 9 de fevereiro de 2015 e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira, na mesma data.

 

Tendo os Requerentes optado por não nomear árbitro, o Conselho Deontológico do CAAD designou a signatária como árbitro do tribunal arbitral singular. Aceite o encargo no prazo aplicável, foram as Partes notificadas dessa designação, em 1 de abril de 2015.

 

O Tribunal Arbitral Singular foi regularmente constituído em 17 de abril de 2015 e é competente para apreciar e decidir do pedido formulado pelos Requerentes.

 

As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º

112-A/2011, de 22 de março).

 

 

2.      Matéria de facto.

a.      Factos que se consideram provados.

2.1.Na data da constituição do Tribunal Arbitral, teve a signatária conhecimento do teor do requerimento apresentado pelos Requerentes, com data de 2 de abril de 2015, e nessa data objeto de notificação à Requerida, que sobre o mesmo se não pronunciou;

2.2.Naquele requerimento, dirigido a este Tribunal Arbitral Singular, foi feita a comunicação de que (i) as segundas prestações das liquidações do Imposto do Selo (Verba 28.1, da TGIS) do ano de 2013, objeto do pedido de pronúncia arbitral, foram anuladas pela decisão proferida em 27 de março de 2015, no âmbito de outro processo que correu termos pelo CAAD (cuja decisão ainda se não encontrava então publicitada), (ii) verificando-se, assim, a inutilidade superveniente da lide, por ter sido obtida, no âmbito daquele outro processo, a satisfação da pretensão formulada nos presentes autos; (iii) no entanto, devem estes prosseguir para que se reembolsem os Requerentes da taxa arbitral que nele pagaram; (iv) o único interesse na apreciação do processo nº 72/2015-T, apenas tem a ver com a taxa arbitral e seu reembolso aos ora Requerentes, uma vez que foi e é a Administração Tributária a única e exclusiva culpada de ter procedido, ilegalmente, às liquidações correspondentes aos documentos de cobrança nele inseridos, (v) estando os Requerentes convictos de que nada havendo a decidir no que respeita à anulação das liquidações questionadas no referido processo 72/2015-T, continua a existir o direito a receberem a taxa arbitral que nele pagaram, no valor de € 306,00 e, ainda, (vi) a ver arquivados os autos por inutilidade superveniente da lide;

2.3.Por despacho arbitral datado de 20 de abril de 2015, foi o dirigente máximo da AT notificado para que, no prazo de 30 dias e tendo em vista o disposto no n.º 2 do artigo 12.º, do RJAT, e no artigo 536.º, do Código de Processo Civil (CPC), subsidiariamente aplicável “ex vi” do disposto no artigo 29.º, n.º1, alínea e), do mesmo RJAT, apresentasse resposta ao requerimento anteriormente identificado, oferecendo ou solicitando a produção da prova adicional que considerasse oportuna;

2.4.Na resposta transmitida aos autos em 18 de maio de 2015, veio a AT (i) confirmar que as prestações do Imposto do Selo objeto do pedido de pronúncia arbitral já haviam sido objecto de decisão anulatória, em 27 de março de 2015, no âmbito do mencionado processo arbitral tributário; (ii) declarar que a continuação da tramitação do presente processo é inútil, uma vez que os Requerentes já tem a sua pretensão satisfeita no âmbito do referido processo, cuja decisão já transitou em julgado; (iii) declarar verificada a inutilidade superveniente da lide – artigo 277.º, alínea e) do CPC, aplicável “ex vi” do artigo 29.º do RJAT; (iv) declinar a responsabilidade da Requerida pelo pagamento de custas do processo arbitral, previstas no artigo 2.º, n.º 2 do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, conforme estatui o artigo 31.º n.º 3, alínea a) do Regulamento de Arbitragem; (v) que, caso se decida prosseguir com o processo, a AT apresenta como resposta a mesma que foi prestada no âmbito do processo em que foi proferida a decisão de anulação das prestações ora impugnadas; (vi) requerer a dispensa de realização da reunião a que se refere o artigo 18.º, do RJAT, bem como da produção de alegações finais;

2.5.Através do despacho proferido em 25 de maio de 2015, foi dispensada a reunião a que se refere o citado artigo 18.º, do RJAT, bem como a produção de alegações, notificando-se os Requerentes para, no prazo de 10 dias, produzirem prova documental dos factos que, nos termos dos n.ºs 3 e 4 do artigo 536.º, do CPC, demonstrassem ser a inutilidade superveniente da lide imputável à Requerida, nomeadamente por esta ter satisfeito voluntariamente a pretensão que esteve na origem do pedido de constituição do Tribunal Arbitral;

2.6.No mesmo despacho referido no ponto anterior, foi fixada a data de 11 de junho de 2015 para a prolação da decisão arbitral;

2.7.Por requerimento datado de 29 de maio de 2015, vieram os Requerentes reiterar o pedido de restituição da taxa arbitral inicial, assim como a condenação da AT no pagamento da taxa arbitral devida, na sua totalidade;

2.8.Em abono da sua pretensão, os Requerentes invocaram outras decisões arbitrais, àquela data ainda não publicitadas, sem que, no entanto, oferecessem prova documental da responsabilidade da Requerida pelo pagamento da taxa arbitral devida nos presentes autos.

b.      Fundamentação

A convicção deste Tribunal Arbitral Singular quanto aos factos acima descritos assentou na análise crítica das peças processuais insertas no processo.

c.       Factos não provados

Não fica provado que a inutilidade superveniente da lide se fique a dever a facto imputável à Requerida.

 

3.        MATÉRIA DE DIREITO – FUNDAMENTAÇÃO

3.1.   Delimitação da questão a decidir.

Como decorre do probatório supra, verificada a inutilidade superveniente da lide, motivada pela anulação, no âmbito de outro processo arbitral tributário, das prestações do Imposto do Selo objeto do pedido de pronúncia arbitral, a única questão decidenda é a relativa ao pedido de restituição da taxa arbitral inicial, paga pelos Requerentes com o pedido de constituição do tribunal arbitral.

 

3.2.A taxa arbitral inicial e subsequente. Sua restituição.

O Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (adiante, RCPAT) estabelece o regime das taxas de arbitragem aplicáveis aos processos arbitrais tributários organizados no CAAD, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 12.º, do RJAT. Ao RCPAT são subsidiariamente aplicáveis, nos termos do seu artigo 6.º: i) as normas relativas ao valor da causa constantes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e, ii) as normas relativas aos encargos, constantes do artigo 17.º e da “Tabela IV” do Regulamento das Custas Processuais.

Por sua vez, estabelece o n.º 1 do artigo 12.º, do RJAT, que, pela constituição do tribunal arbitral, é devida taxa de arbitragem, a calcular nos termos do RCPAT, prevendo o n.º 2 do mesmo preceito que, nos casos em que o impugnante opta por não designar árbitro, paga, na data da apresentação do pedido de constituição do tribunal arbitral, a taxa de arbitragem inicial, sendo efetuada, na decisão final, a fixação do montante das custas e sua eventual repartição pelas partes.

 

Assim, nos casos de designação do(s) árbitro(s) pelo CAAD, a taxa de arbitragem inicial corresponde a 50% da taxa arbitral resultante da Tabela I anexa ao RCPAT, a pagar antes da formulação do pedido de constituição do tribunal arbitral, devendo os 50% do valor remanescente ser transferidos para a conta do CAAD, antes da data indicada para a prolação da decisão arbitral (artigo 4.º, n.ºs 1 a 3, do RCPAT).

 

Sendo o(s) árbitro(s) designado(s) pelo CAAD e fixado, na decisão final, o montante das custas e sua eventual repartição pelas partes, são estas notificadas, após o trânsito em julgado da decisão, da conta de custas; se a parte vencida não tiver pago a taxa arbitral inicial, por lhe não ter pertencido o impulso processual, deverá efetuar o pagamento das custas em que foi condenada, no prazo e trinta dias a contar da data da notificação, após o que, sendo caso disso, o CAAD reembolsará o impugnante do valor a que tiver direito (artigo 4.º, n.ºs 4 e 5, do RCPAT).

 

De acordo com o disposto no n.º 6 do artigo 4.º, do RCPAT, não haverá lugar ao reembolso, devolução ou compensação, a qualquer título, da taxa de arbitragem, fora dos casos expressamente previstos no mesmo Regulamento.

 

Para além da situação identificada na parte final do n.º 5 do artigo 4.º, do RCPAT, apenas se encontra expressamente prevista a possibilidade de restituição da taxa de arbitragem, no caso de o procedimento ter cessado, por qualquer motivo, antes da data da constituição do tribunal arbitral, conforme se dispõe no seu artigo 3.º-A.

 

 

 

3.3.Do pedido de constituição do tribunal arbitral até à sua efetiva constituição.

Nos processos arbitrais tributários organizados no CAAD sucedem-se, na maior parte dos casos, duas fases distintas: a fase do procedimento (Capítulo II, do RJAT) e a fase do processo, propriamente dito (Capítulo III, do RJAT), sendo a transição entre as fases marcada pela constituição do tribunal arbitral.

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral é dirigido ao Presidente do CAAD, dentro dos prazos e com os formalismos previstos no artigo 10.º, do RJAT, devendo ser precedido do pagamento da taxa de arbitragem inicial, cujo comprovativo lhe deve ser anexo (cfr. o artigo 10.º, n.º 2, alínea f), do RJAT).

 

A aceitação do pedido de constituição do tribunal arbitral marca o início da fase do procedimento, no decurso da qual a entidade Requerida pode, no prazo de trinta dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, “proceder à revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja ilegalidade foi suscitada, praticando, quando necessário, ato tributário substitutivo”, devendo, nesse caso, notificar o Presidente do CAAD da sua decisão (cfr. o n.º 1 do artigo 13.º, do RJAT).

 

Decorrido aquele prazo de trinta dias sobre a data do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, sem que a Requerida tenha adotado qualquer das condutas previstas no n.º 1 do artigo 13.º, do RJAT, e tendo o sujeito passivo optado por não designar árbitro, o CAAD designa o(s) árbitro(s), notifica as partes da designação (artigo 11.º, n.º 1, do RJAT) e, se estas se não opuserem a tal designação, comunica-lhes a constituição do tribunal arbitral, nos dez dias subsequentes (artigo 11.º, n.º 1, alínea c) e n.º 8, do RJAT).

 

Constituído o tribunal arbitral, tem início o processo arbitral tributário (artigo 15.º, do RJAT), seguindo-se a tramitação que culminará com a decisão final.

 

3.4.Repartição das custas em caso de inutilidade superveniente da lide.

 

Verifica-se a inutilidade superveniente da lide quando, à data da apresentação da pretensão em juízo pelo autor ou a oposição pelo réu eram fundadas e deixaram de o ser, por circunstâncias supervenientes.

 

Quanto à responsabilidade pelo pagamento das custas em situações que tais, regem as regras constantes do artigo 536.º, do CPC, subsidiariamente aplicáveis ao processo arbitral tributário, ex vi do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

 

Ali se distinguem as situações em que a inutilidade superveniente da lide se deve a facto não imputável às partes, sendo as custas repartidas entre si em partes iguais (n.ºs 1 e 2 do artigo 536.º, do CPC), daquelas em que a causa da inutilidade superveniente é imputável a uma das partes, ficando esta responsável pelo pagamento das custas, na sua totalidade.

 

Considera-se, no n.º 4 do mencionado artigo, que a inutilidade superveniente é imputável ao réu (aqui, a Requerida), designadamente, quando este satisfaça voluntariamente a pretensão do autor (neste caso, os Requerentes).

 

3.5.Da anulação das prestações de Imposto do Selo (verba 28.1, da TGIS) objeto do pedido de constituição do tribunal arbitral pelos ora Requerentes.

 

Tal como consta do probatório supra, o pedido de constituição do tribunal arbitral singular, tendo por objeto a anulação das segundas prestações das liquidações de Imposto do Selo (verba 28.1, da TGIS) do ano de 2013, emitidas em nome dos Requerentes, deu entrada no CAAD em 6 de fevereiro de 2015, foi aceite pelo Exm.º Presidente do CAAD em 9 de fevereiro de 2015 e automaticamente notificado à AT, na mesma data.

 

Decorrido o prazo estabelecido pelo n.º 1 do artigo 13.º, do RJAT, sem que a AT tivesse procedido à revogação dos atos impugnados, foram as Partes notificadas da designação da signatária como árbitro, em 1 de abril de 2015.

 

Por requerimento datado de 2 de abril de 2015, dirigido ao Tribunal Arbitral Tributário a constituir, e, portanto, ainda na fase do procedimento, vieram os Requerentes dar conta da inutilidade superveniente da lide, pedindo o prosseguimento do processo para que lhes fosse restituída a taxa arbitral inicial.

 

Segundo os Requerentes, a inutilidade superveniente ficar-se-ia a dever à anulação da totalidade das liquidações (1.ªs e 2.ªs prestações) de Imposto do Selo do ano de 2013, em 27 de março de 2015, no âmbito de outro processo arbitral tributário que correu termos pelo CAAD, não obstante apenas ter sido pedida a anulação das 1.ªs prestações, sendo as 2.ªs, precisamente, as que constituíam objeto dos presentes autos.

 

A responsabilidade pela inutilidade superveniente, seria, segundo os Requerentes, da AT, “uma vez que foi e é a Administração Tributária a única e exclusiva culpada de ter procedido, ilegalmente, às liquidações correspondentes aos documentos de cobrança nele inseridos e acima referidos”, motivo pelo qual “Requerem ao Meritíssimo Juiz Árbitro que decrete o reembolso da taxa arbitral de 306,00 € aos requerentes e que ordene o arquivo dos autos por inutilidade superveniente da lide.”.

 

Notificada pelo CAAD do requerimento apresentado pelos Requerentes, a AT não se pronunciou sobre o respetivo teor.

 

Aqui chegados, cumpre indagar:

a.       Se o procedimento cessou com a anulação das prestações de Imposto do Selo em causa, permitindo a restituição da taxa arbitral inicial, nos termos do artigo 3.º - A, do RCPAT;

b.      Se, não tendo cessado o procedimento, a quem deve ser imputada a inutilidade superveniente da lide, a fim de ser determinada a responsabilidade pelo pagamento da taxa arbitral;

c.       Se os factos determinantes da referida responsabilidade são de conhecimento oficioso ou se o ónus da respetiva prova impende sobre a parte que pretende a obtenção do efeito útil a que os mesmos conduzam.

 

Vejamos:

a.       Quanto à primeira das questões acima enunciadas, a resposta deverá ser negativa.

De facto, muito embora a anulação das 2.ªs prestações das liquidações do Imposto do Selo do ano de 2013 aqui sindicadas, tivesse ocorrido em 27 de março de 2015, portanto, em data anterior à constituição do Tribunal Arbitral, o procedimento não cessou.

E não cessou por facto imputável aos Requerentes, que expressamente formularam perante o Tribunal Arbitral a constituir, o pedido de restituição da taxa arbitral inicial, declarando que, para esse efeito, “(…), materialmente falando, a apreciação material no citado processo 72/2015-T, embora se revista de total inutilidade superveniente, mesmo assim, com o devido respeito e salvo melhor opinião, devem prosseguir, para que se reembolsem os requerentes da taxa arbitral que nele pagaram” (sublinhado nosso).

 

b.      Tendo o pedido de restituição da taxa arbitral inicial sido dirigido ao Tribunal Arbitral a constituir, este Tribunal Arbitral Singular apenas poderia proceder à sua apreciação após ter sido constituído e, portanto, já na fase de processo.

Assim sendo, haverá que, por aplicação das regras sobre custas em caso de inutilidade superveniente, ínsitas nos n.ºs 3 e 4 do artigo 536.º, do CPC, determinar a responsabilidade pelo seu pagamento.

Porém, nada consta dos presentes autos que permita, como pretendem os Requerentes, imputar à AT a responsabilidade pela inutilidade superveniente da lide, em data anterior à da constituição do Tribunal Arbitral.

Nomeadamente, nada existe que indicie ter a pretensão dos Requerentes sido satisfeita voluntariamente pela AT, por esta ter, dentro do prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º, do RJAT, revogado os atos impugnados, caso em que não teria havido lugar à constituição do Tribunal Arbitral, a menos que, tal como veio a acontecer, este tivesse sido constituído por exclusiva iniciativa dos Requerentes.

Ora, embora a revogação do ato pela AT seja uma revogação anulatória, o vocábulo “anulação” fica reservada à sua eliminação da ordem jurídica em consequência de uma decisão jurisdicional.

Convergindo as declarações tanto dos Requerentes como da Requerida, de que a anulação das prestações objeto do presente pedido de pronúncia arbitral ocorreu no âmbito de outro processo arbitral tributário, não poderá concluir-se ter havido uma satisfação voluntária da pretensão daqueles, por parte da AT, porquanto foi aquele outro Tribunal Arbitral Tributário que determinou a anulação dos atos impugnados.

Nem bastará dizer que “foi e é a Administração Tributária a única e exclusiva culpada de ter procedido, ilegalmente, às liquidações correspondentes aos documentos de cobrança nele inseridos e acima referidos”, porquanto essa é matéria já decidida no processo arbitral tributário em que as liquidações do Imposto do Selo de 2013 foram anuladas, e cuja decisão constitui caso julgado.

 

c.       Vêm os Requerentes, quer no seu requerimento de 2 de abril de 2015, quer no que apresentaram em 29 de maio de 2015, fazer referência a decisões proferidas em processos arbitrais tributários, ainda não publicitadas, sem juntar as respetivas cópias ou, sequer, cópia da resposta da AT no processo em que foram anuladas as liquidações do Imposto do Selo acima identificadas.

Se bem que os elementos juntos aos autos (petição inicial, requerimento de 2 de abril de 2015, resposta da AT e requerimento de 29 de maio de 2015) permitam fundamentar a convicção da signatária, adiante expressa, poderá levantar-se a questão de saber se os restantes elementos a que é feita referência nas peças processuais (as sobreditas decisões arbitrais), caso fossem necessários à decisão, seriam de conhecimento oficioso.

De acordo com o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 5.º, do CPC, são de conhecimento oficioso, não carecendo de prova, os factos notórios e aqueles que o tribunal conhece no exercício das suas funções (artigo 412.º, n.º 2, do CPC).

Os factos de que o juiz tem conhecimento funcional são os que constam de outro processo que tenha corrido termos pelo mesmo tribunal e que permitem, por exemplo, verificar as exceções do caso julgado ou da litispendência (artigo 577.º, alínea i)), mas não os de processo que correu em tribunal diverso e que podendo ter efeitos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito, devem ser alegados e provados pelas partes.

Embora o Tribunal Arbitral Tributário não possa ser considerado um Tribunal ad hoc, dada a permanência da Instituição que o acolhe, o certo é que “intervém sob a forma de formações de julgamento efémeras cuja atividade termina ao mesmo tempo que o processo para a resolução do qual foram designadas[1], sendo o(s) árbitro(s) designado(s) processo a processo e dissolvendo-se o Tribunal com o arquivamento do processo que determinou a sua constituição (artigo 23.º, do RJAT).

Assim sendo, não são de conhecimento oficioso por este Tribunal Arbitral Singular os factos que determinaram a satisfação da pretensão dos Requerentes em outro processo arbitral tributário[2], cuja decisão já transitou em julgado, e de que estes não fizeram prova.

 

 

4.        DECISÃO

Com base nos fundamentos de facto e de direito acima enunciados e, nos termos do artigo 12.º, do RJAT, decide-se em, julgando improcedente o presente pedido de restituição da taxa arbitral inicial, declarar a responsabilidade dos Requerentes pelo pagamento das custas, na sua totalidade.

 

VALOR DO PROCESSO: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, 97.º-A, do CPPT e 3.º, n.º 2, do RCPAT, fixa-se ao processo o valor de € 4 246,77 (quatro mil duzentos e quarenta e seis euros e setenta e sete cêntimos).

CUSTAS: Calculadas de acordo com o artigo 4.º do RCPAT e da Tabela I a ele anexa, no valor de € 612,00 (seiscentos e doze euros), a cargo dos Requerentes.

 

Lisboa, 11 de junho de 2015.

O Árbitro,

 

 

/Mariana Vargas/

 

Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do artigo 131.º do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do DL 10/2011, de 20 de janeiro.

A redação da presente decisão rege-se pelo acordo ortográfico de 1990. 

 



[1] Cfr., em especial a conclusão 37 do Advogado‑Geral Maciej Szpunar, apresentadas em 8 de abril de 2014, o processo C‑377/13 (caso Ascendi), disponível em https://www.caad.pt/noticias/arbitragem-tributaria/246-primeiro-reenvio-prejudicial.

[2] Cfr. FREITAS, José Lebre de Freitas, “Introdução ao Processo Civil – Conceito e princípios gerais à luz do novo código”, 3.ª Edição, Coimbra Editora, 2013, pág. 171, nota 49, “O conhecimento oficioso da exceção do caso julgado (art.578) não implica o conhecimento oficioso dos factos em que se funda a exceção”.