SUMÁRIO:
I – A caução não é verdadeiramente um rendimento, nem na perspetiva civilista, nem na perspetiva económica, sendo que não se integra verdadeiramente no património do seu beneficiário.
II – A Constituição, no seu artigo 104.º, n.º 1, exige que a tributação do rendimento pessoal tenha em conta justamente as necessidades e os rendimentos do agregado familiar, pelo que por essa lógica, não só não seria permitido ao legislador ordinário a abolição pura das deduções à coleta, mas também, apreciado o caso concreto, não seria permitida a consideração no conceito de rendimentos de realidades que visam apenas a garantia de cumprimento contratual, como é o caso da caução, pelo que o artigo 8.º CIRS só incide sobre as rendas em sentido estrito admitido pelo n.º 1 do artigo 104.º da Constituição da República Portuguesa.
Os Árbitros Guilherme W. d'Oliveira Martins, Francisco Carvalho Furtado e
Nuno Maldonado Sousa, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral Coletivo, decidem o seguinte:
DECISÃO ARBITRAL
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RELATÓRIO
A..., NIF ... e B... NI..., residentes no ... n.º ..., em ...-... ..., tendo sido notificados, da liquidação adicional de IRS n.º 2022..., no valor total de €188.077,01, acrescido de juros compensatórios, no valor de €21.182,71, no total de €209.259,72, requerem pronúncia arbitral, nos termos do artigo 2.°, n.° 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com vista a anular integralmente o referido ato tributário de liquidação adicional de IRS de 2018.
É Requerida a AT.
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral Coletivo (TAC) foi aceite pelo Senhor Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) e automaticamente notificado à AT no dia 13 de fevereiro de 2023.
Os Requerentes não procederam à nomeação de arbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.° e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.° do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), o Senhor Presidente do Conselho Deontológico designou como árbitros os signatários desta decisão, tendo sido notificadas as partes em 22 de março de 2023, que não manifestaram vontade de recusar a designação, nos termos do artigo 11.º n.º1 alíneas a) e b) e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
O TAC encontra-se, desde 24 de abril de 2023, regularmente constituído e é materialmente competente à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
Notificada para o efeito, a Requerida, apresentou a sua resposta a 2 de junho de 2023.
Em 7 de setembro de 2023, o TAC proferiu o seguinte despacho:
“1. Pretende este Tribunal Arbitral, ao abrigo do princípio da autonomia na condução do processo, previsto no artigo 16.º, alínea c) do RJAT, dispensar a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, por desnecessária, atendendo a que a questão em discussão é apenas de direito.
2. Por outro lado, estando em causa matéria de direito, que foi claramente exposta e desenvolvida, quer no Pedido arbitral, quer na Resposta, dispensa-se a produção de alegações escritas devendo o processo prosseguir para a prolação da sentença.
3. Informa-se que a Requerente deverá proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, até a data limite da prolação da decisão final.
4. Em nome do princípio da colaboração das partes solicita-se o envio das peças processuais em versão word.
Notifiquem-se as partes do presente despacho.”
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DESCRIÇÃO SUMÁRIA DOS FACTOS
II.1 Posição da Requerente
A Requerente fundamenta o seu pedido nos seguintes termos:
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Os requerentes desenvolveram, no ano de 2018, atividades empresariais agrícolas, sendo a requerente (NIF ...) enquadrada no regime simplificado e o requerente (NIF ...) no regime de contabilidade organizada (cfr. declaração de autoliquidação de IRS, - doc. 1).
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No ano de 2018 os requerentes auferiram também rendimentos prediais (doc.1).
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Mais concretamente, com relevância factual para o caso sub judice, em 27-07- 2018, o requerente outorgou, na qualidade de locador, um contrato de arrendamento rural agrícola com prazo certo (doc. 2).
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Na data da outorga do contrato acima referido, o requerente recebeu uma caução no valor de €572.470,00 (doc.2).
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O valor recebido a título de caução é igual ao valor da renda anual acordada pelas partes (doc. 2).
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«Cessando o … contrato, e tendo sido cumpridas pela 2.ª outorgante (entenda-se a locatária) todas as obrigações deste decorrentes … o 1.º outorgante (entenda-se o locador) verificará o estado do locado e, na falta de incumprimento, devolverá o valor da caução no prazo de quinze dias, contados sobre a data da cessação do presente contrato de arrendamento…» (doc. 2 - cfr. Cláusula 4.ª n.º 4, do contrato de arrendamento rural).
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Os requerentes foram alvo de uma ação inspetiva, pela Autoridade Tributária (AT), em cumprimento da ordem de serviço OI2022..., que incidiu sobre o IRS do período de 2018 (doc. 3).
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O relatório de ação inspetiva concluiu o seguinte:
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«A caução, estabelecida por qualquer das formas legais previstas, serve para que o senhorio assegure o cumprimento das obrigações decorrentes desse contrato, salvaguardando, quer o pagamento das rendas, quer a reparação de eventuais danos que possam ser causados no imóvel, e constitui, em sede de categoria F do código de IRS, um rendimento predial devendo sobre o correspondente montante ser emitido recibo de renda e, bem assim, ser declarado no anexo F.
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Na declaração de rendimentos modelo 3, consta no anexo F, relativamente ao prédio objeto do contrato de arrendamento, 270.235,00€ com retenções na fonte de 67.558,75€, não estando declarado o valor da referida caução de 572.470,00€» (doc. 3).
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Em virtude destas conclusões do relatório da ação inspetiva, foi emitido em 04/11/2022, o ato tributário de liquidação adicional de IRS, n.º 2022..., o qual, erroneamente, apurou um acréscimo de imposto a pagar desconforme com as conclusões do relatório da ação inspetiva (Doc.4).
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Mais concretamente, o relatório de ação inspetiva apurou um acréscimo de imposto no valor de €160.291,60 (ou seja, o valor da caução de €572.470,00 x Taxa de imposto de 28%) e o acto tributário de liquidação adicional n.º 2022... apurou, incorretamente, um acréscimo de imposto no valor de €154.574,99.
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A Autoridade Tributária corrigiu o erro, que lhe era desfavorável, e emitiu em 11-11-2022 um novo ato tributário de liquidação adicional (n.º 2022...), que apurou um valor de liquidação adicional de imposto no montante de €160.291,60 (€572.470,00 x 28%), acrescido de juros compensatórios no valor de €21.182,71, no total de €181.474,31 (€160.291,60 + €21.182,71), sendo este o valor do presente pedido de pronúncia arbitral (Doc. 5).
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Os requerentes constataram, após a leitura do relatório de conclusões da ação inspetiva (doc.3) e a leitura dos documentos que titulam o ato tributário de liquidação que ora se impugna (doc.5), que nenhum dos documentos enumera a(s) norma(s) de incidência de IRS (nem sequer através de mera remissão) que suporta(m) a fundamentação legal do ato impugnado.
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Em virtude da total ausência de fundamentação legal do ato tributário, foi requerido à AT a fundamentação do ato tributário, em conformidade com o previsto no artigo 37.º do CPPT (doc. 6).
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A AT não respondeu ao pedido de fundamentação do ato tributário apresentado pelos requerentes até ao dia 31-12-2022.
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Os ora requerentes discordam do tributário de liquidação adicional de IRS que agora impugnam.
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Ao nível do Direito substantivo, salienta-se que a matéria de facto não é controvertida, ou seja, tanto a AT como os ora requerentes reconhecem que a caução recebida, em 27/07/2018, pelos locadores (ora requerentes) será integralmente devolvida no final do prazo do contrato de locação, no caso de o locatário cumprir integralmente todas as suas obrigações decorrentes do referido contrato de locação.
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Apenas existe divergência, entre a AT e os requerentes, quanto ao Direito Fiscal aplicável à situação de facto ora em apreço, a saber:
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A AT entende que a referida caução está abrangida pelas normas de incidência do IRS e, por esse motivo, o valor recebido a título de caução configura um rendimento predial sujeito a IRS no ano de 2018;
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Os requerentes entendem que a referida caução não está abrangida pelas normas de incidência do IRS e, por esse motivo, o valor recebido a título de caução não configura um rendimento predial sujeito a IRS no ano de 2018.
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Invocam ainda os vícios de falta de fundamentação e de notificação insuficiente.
II.2 Posição da Requerida
Por seu turno, a Requerida fundamenta a sua posição nos seguintes termos:
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No exercício de 2018 desenvolveram atividades agrícolas e empresariais, encontrando-se o Requerente, A..., enquadrado no regime da contabilidade organizada, e a Requerente B..., no regime simplificado.
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No ano de 2018, o Requerente celebrou um contrato de arrendamento agrícola, na qualidade de locador, onde é fixado e pago o montante de 572.470€ a título de caução, a ser reforçada de 5 em 5 anos até ao termo do contrato em 2042, com o fim de garantir, caso seja necessário, o cumprimento das obrigações contratuais e/ou extracontratuais.
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Aquando da entrega da declaração de rendimentos relativa a 2018, os Requerentes não declararam o valor relativo à caução que haviam auferido.
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No âmbito da ação inspetiva levada a efeito pelos SIT da DF Évora - OI 2022..., cujo início foi notificado no dia 26 de maio de 2022,
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concluíram os serviços que o montante da caução recebido constituía rendimento sujeito a tributação em IRS - rendimento predial, Cat F, ao abrigo do art.º 8 CIRS, pelo que deveria ter sido declarado.
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Os A foram notificados do projeto de relatório com proposta de correção oficiosa, no dia 02 de agosto de 2022 para exercer o direito de audição:
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Fundamenta o projeto de relatório que, “verifica-se que na clausula 4ª menciona o pagamento a título de caução do montante de € 572.470,00, para garantia do cumprimento das suas obrigações contratuais, para que o primeiro outorgante pudesse vir a fazer sua, na parte que vier a ser necessária para se ressarcir de montantes que venham a ser devidos em virtude de incumprimento pela segunda outorgante de quaisquer obrigações contratuais ou extracontratuais.
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“A referenciada caução deverá ser reforçada em dezembro de 2023, em dezembro de 2028, em dezembro de 2033, em dezembro de 2038 e em dezembro de 2042, conforme consta do contrato.
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A caução, estabelecida por qualquer das formas legais previstas, serve para que o senhorio assegure o cumprimento das obrigações decorrentes desse contrato, salvaguardando, quer o pagamento das rendas, quer a reparação de eventuais danos que possam ser causados no imóvel, e constitui, em sede de Categoria F do Código do IRS, um rendimento predial devendo sobre o correspondente montante ser emitido recibo de renda e, bem assim, ser declarado no anexo F.
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Este mesmo entendimento encontra-se refletido nas Informações Vinculativas emitidas pela AT – Processo n.º 2729/2018 e 731/2018 com despachos concordantes da Subdiretora-Geral do IR de 2018- 12-11 e 2018-12-12, respetivamente. Assim, o valor da caução é sujeito a tributação nos termos previstos no Código do IRS; tal como as rendas recebidas e constitui em sede de categoria F, nos termos do artigo 8.º do Código do IRS, um rendimento predial, devendo ser declarado no Anexo F da Modelo 3 de IRS”.
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Na declaração de rendimentos modelo 3, consta no anexo F, relativamente ao prédio objeto do contrato de arrendamento, 270.235,00 € com retenções na fonte de 67.558,75 €, não estando declarado o valor da referida caução de 572.470,00 €.
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Pelo que, importa proceder à correção do quadro 4.1 do Anexo F da Modelo 3 de IRS do ano de 2018.
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Nos termos da alínea e) do n.º 1 do art.º 72.º do Código do IRS, os rendimentos prediais são, em regra, tributados à taxa autónoma de 28%.
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Como tal, estamos perante uma correção ao imposto apurado no montante de 160.291,60 € (572.470,00 € x 28%).
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Os autores não exerceram o direito de audição, tendo-se remetido ao silêncio.
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Tendo em consequência sido elaborado o relatório final, notificado no dia 04 de outubro de 2022.
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O teor desta notificação é a seguinte:
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Em consequência foi emitida a liquidação nº 2022..., e a correspondente nota de demonstração da liquidação.
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Notificadas aos requerentes, conforme documento com o nome “Notificações da liquidação”, onde se lê a fls. 5:
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Os requerentes foram, pois, expressamente informados dos meios de defesa.
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O pedido a que se referem os A em 13 e 14, foram respondidos por carta registada em 30/01/2023, registo n.º RH ... PT, da Direção de Finanças de Évora, cfr. documentos juntos ao PA.
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E rececionado pelos Requerentes no dia 31/012023, cfr. pesquisa no sitio CTT, disponível em https://appserver.ctt.pt/CustomerArea/PublicArea_Detail?ObjectCodeInput=RH7...PT&SearchInput=RH...PT&IsFromPublicArea=true
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O presente pedido de pronúncia arbitral foi deduzido dia 10/02/2023. Ou seja, em data posterior ao recebimento da resposta enviada pela AT.
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Ali se remetendo para os fundamentos do relatório por serem os existentes e os bastantes,
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Os Requerentes imputam ao acto sindicado “Ausência de fundamentação e notificação insuficiente”.
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Não lhes assiste razão. De resto faltam à verdade, como resulta dos factos elencados e do PA.
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Os A não podem afirmar que não lhes foi notificada “a base legal de suporte à correção”, porquanto a base legal é expressamente referida pela AT, como supra se citou em 12º
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“Assim, o valor da caução é sujeito a tributação nos termos previstos no Código do IRS; tal como as rendas recebidas e constitui em sede de categoria F, nos termos do artigo 8.º do Código do IRS, um rendimento predial, devendo ser declarado no Anexo F da Modelo 3 de IRS”.
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Na declaração de rendimentos modelo 3, consta no anexo F, relativamente ao prédio objeto do contrato de arrendamento, 270.235,00 € com retenções na fonte de 67.558,75 €, não estando declarado o valor da referida caução de 572.470,00 €.
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Pelo que, importa proceder à correção do quadro 4.1 do Anexo F da Modelo 3 de IRS do ano de 2018.
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Nos termos da alínea e) do n.º 1 do art.º 72.º do Código do IRS, os rendimentos prediais são, em regra, tributados à taxa autónoma de 28%.
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Os A conhecem a norma legal que fundamenta a liquidação, uma vez que é uma liquidação oficiosa decorrente da inspeção, cujos relatórios lhe foram notificados, e onde lhes foi explicado o fundamento legal.
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É falso também que não lhe foram dados a conhecer os meios de defesa, o que vai escalpelizado supra em 15 a 18 e resulta do PA.
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Assim como é falso que não tenham obtido resposta ao requerimento como supra se descreveu em 19 a 21 e resulta do PA.
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O presente pedido de pronúncia arbitral foi em data posterior ao recebimento da resposta enviada pela AT.
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Assim e considerando-se, portanto, que o rendimento disponibilizado a titulo de caução traduz-se efetivamente num acréscimo de valor ao património de quem cede o uso e o gozo temporário do bem locado, no caso trata-se de contrato de arrendamento agrícola, e que não obstante não seja uma retribuição direta em razão do gozo do locado, o certo é que se mostra associado e é acordada a sua disponibilização em razão do contrato celebrado, a que acresce o facto de que em caso de devolução esta operação é passível de ser considerada no apuramento final de IRS (bem como de IRC de for o caso), é de manter a sua sujeição a tributação sob a égide da Cat F.
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SANEAMENTO
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (vide artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT.
O processo não enferma de nulidades.
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Fundamentação
IV.1. Matéria de facto
Factos dados como provados
Considera-se como provada a seguinte matéria de facto:
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No exercício de 2018 desenvolveram atividades agrícolas e empresariais, encontrando-se o Requerente, A..., enquadrado no regime da contabilidade organizada, e a Requerente B..., no regime simplificado.
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No ano de 2018, o Requerente celebrou um contrato de arrendamento agrícola, na qualidade de locador, onde é fixado e pago o montante de 572.470€ a título de caução, a ser reforçada de 5 em 5 anos até ao termo do contrato em 2042, com o fim de garantir, caso seja necessário, o cumprimento das obrigações contratuais e/ou extracontratuais.
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Aquando da entrega da declaração de rendimentos relativa a 2018, os A não declararam o valor relativo à caução que haviam auferido.
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No âmbito da ação inspetiva levada a efeito pelos SIT da DF Évora - OI 2022..., cujo início foi notificado no dia 26 de maio de 2022,
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Os Requerentes foram notificados do projeto de relatório com proposta de correção oficiosa, no dia 02 de agosto de 2022 para exercer o direito de audição:
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Na declaração de rendimentos modelo 3, consta no anexo F, relativamente ao prédio objeto do contrato de arrendamento, 270.235,00 € com retenções na fonte de 67.558,75 €, não estando declarado o valor da referida caução de 572.470,00 €. Pelo que a AT procedeu à correção do quadro 4.1 do Anexo F da Modelo 3 de IRS do ano de 2018.
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Nos termos da alínea e) do n.º 1 do art.º 72.º do Código do IRS, os rendimentos prediais são, em regra, tributados à taxa autónoma de 28%, pelo que a correção ao imposto foi apurada no montante de 160.291,60 € (572.470,00 € x 28%).
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Tendo em consequência sido elaborado o relatório final, notificado no dia 04 de outubro de 2022.
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O teor desta notificação é a seguinte:
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Em consequência foi emitida a liquidação nº 2022..., e a correspondente nota de demonstração da liquidação.
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Notificadas aos requerentes, conforme documento com o nome “Notificações da liquidação”, onde se lê a fls. 5:
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O pedido a que se referem os Requerentes em 13 e 14 do seu PPA, foram respondidos por carta registada em 30/01/2023, registo n.º RH ... PT, da Direção de Finanças de Évora.
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E rececionado pelos A dia 31/012023, cfr. pesquisa no sitio CTT, disponível em https://appserver.ctt.pt/CustomerArea/PublicArea_Detail?ObjectCodeInput=RH...PT&SearchInput=RH...PT&IsFromPublicArea=true
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O presente pedido de pronúncia arbitral foi deduzido dia 10/02/2023.
Factos dados como não provados
Não existem quaisquer factos não provados relevantes para a decisão da causa.
O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e no processo administrativo junto pela Autoridade Tributária, e em factos não questionados pelas partes.
Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
A matéria de facto foi fixada por este TAC e a convicção ficou formada com base nas peças processuais e requerimentos apresentados pelas Partes, bem como nos documentos juntos aos autos.
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor, cfr. n.º 1 do artigo 596.º e n.ºs 2 a 4 do artigo 607.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi das alíneas a) e e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e consignar se a considera provada ou não provada, cfr. n.º 2 do artigo 123.º Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do n.º 7 do artigo 110.º do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Acórdão do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo n.º 07148/13[1], “o valor probatório do relatório da inspeção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a decisão, em relação às provas produzidas, na íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a experiência de vida e conhecimento das pessoas, conforme n.º 5 do artigo 607.º do CPC.
Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g., força probatória plena dos documentos autênticos, conforme artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
IV. 2. Matéria de Direito
Em primeiro lugar, quanto à falta de fundamentação e insuficiência de notificação está claramente provado que os elementos disponibilizados no PA são suficientes para comprovar a suficiência da fundamentação e da respetiva notificação. Aliás refira-se que não ocorre violação do dever de fundamentação, nem há lugar a insuficiência de notificação, se, em função do contexto do qual emerge o ato de liquidação, é possível ao sujeito passivo alcançar o itinerário cognoscitivo levado a cabo pela AT na tomada de decisão, não sendo censurável a remissão implícita daquele ato para o Relatório de Inspeção Tributária (veja-se o capítulo V a pp. 5-6) do qual consta um quadro factual pormenorizado e exaustivo, bem como um enquadramento aprofundado das normas jurídicas aplicáveis, designadamente da interpretação que é feita das normas do artigo 8.º do CIRS, expendido nas informações vinculativas que identifica e que, embora não sejam fonte de direito, são forma legalmente prevista da Administração manifestar a sua posição relativamente ao sentido desses comandos legais. Assim sendo os argumentos invocados pelos Requerentes, designadamente a ausência de fundamentação legal (veja-se 20.º e 22.º do PPA)improcedem totalmente.
Em segundo lugar, cumpre analisar a única questão material que está aqui em causa – a sujeição a IRS da caução paga ao abrigo do contrato de arrendamento.
Ora, face à redação dada ao artigo 115.º pela Lei n.º 82-E/2014 de 31 dezembro (Lei da Reforma Fiscal do IRS), os senhorios são obrigados a emitir recibo de renda eletrónico pelas rendas recebidas ou colocadas à disposição ainda que a título de caução ou adiantamento, quando não optem pela sua tributação no âmbito da categoria B (rendimentos empresariais).
Em termos jurídicos, a caução será a forma de garantir a concretização do contrato negociado entre as partes, ou estabelecida por um outro tipo de exigência pré-contratual de forma a garantir a intenção de estabelecer o contrato. Habitualmente, a caução será devolvida à entidade que prestou essa garantia, quando o contrato ou exigência subjacente a essa caução deixar de existir.
Atendendo a estes conceitos, a entidade que presta a caução a uma outra entidade, no momento inicial, terá o direito de lhe ser devolvida essa garantia prestada, no pressuposto de todas as condições serem satisfeitas ou deixar de existir essa exigência.
O momento da emissão de faturas decorre das regras previstas em termos fiscais, nomeadamente no Código do IVA, não devendo influenciar o momento do reconhecimento dos respetivos factos ou operações nas demonstrações financeiras.
Assim com a celebração do contrato de arrendamento, as partes podem estipular o recebimento de valores a título de antecipação de rendas (conforme n.º 1 do artigo 1076.º do Código Civil) e a título de caução (como previsto no n.º 2 do mesmo artigo), podendo esta última assegurar o cumprimento das obrigações decorrentes desse contrato, ou seja, quer o pagamento das rendas, quer a reparação de eventuais danos que possam ser causados no imóvel e/ou mobiliário.
Sucede, porém, que a caução não é verdadeiramente um rendimento, nem na perspetiva civilista, nem na perspetiva económica. Aliás, a caução não se integra verdadeiramente no património do seu beneficiário. Basta que se pense que a caução, para além de depósito em dinheiro "pode ser prestada por meio de títulos de crédito, pedras ou metais preciosos, ou por penhor, hipoteca ou fiança bancária" (623.º-1 CC). Mesmo quando é prestada de forma pecuniária, não se trata de um verdadeiro recebimento de dinheiro mas antes de "depósito de dinheiro".
O mesmo desenho pode ver-se no artigo 199.º-1 do CPPT, na TGIS que nas verbas 2 e 10 distingue claramente a caução, como o faz o CIVA (artigo 29.º-27 - b) e as rendas, enquanto contrapartida da locação (artigo 9.º, 29). Refira-se, aliás, em termos de IRC também é pacífico que a caução não é um rendimento.
Note-se, a título de exemplo, que se um senhorio arrendar um imóvel por 10 anos, com início em 01-01-2020 e termo em 31-12-2029, na orientação da AT, veria tributada em 2019 a caução que recebesse e, quando o contrato acabasse em 2029, teria de restituir a caução já em 2030. Essa restituição da caução só seria um gasto e no fim do exercício um prejuízo. Se porventura não quisesse voltar a arrendar o imóvel, acabaria por ser tributado pela caução que tinha devolvido.
Na verdade, a Constituição, no seu artigo 104.º, n.º 1, exige que a tributação do rendimento pessoal tenha em conta justamente as necessidades e os rendimentos do agregado familiar, pelo que por essa lógica, não só não seria permitido ao legislador ordinário a abolição pura das deduções à coleta, mas também, apreciado o caso concreto, não seria permitida a consideração no conceito de rendimentos de realidades que visam apenas a garantia de cumprimento contratual, como é o caso da caução, pelo que o artigo 8.º CIRS só incide sobre as rendas em sentido estrito admitido pelo n.º 1 do artigo 104.º da Constituição da República Portuguesa.
Adicional e consequentemente, as orientações constantes do no Ofício Circulado n.º 20256, de 7 de junho de 2023, dos entendimentos sancionado por despachos da Subdiretora-Geral da Área de Gestão dos Impostos sobre o Rendimento, enfermam de violação de lei, por ofensa do princípio da igualdade e da capacidade contributiva constante do n.º 1 do artigo 104.º da CRP, ao qual a AT se encontra subordinada em toda a sua atuação (artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 55º da LGT), devidamente explicitado no artigo 3.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, devendo assim, e em conclusão, proceder totalmente o pedido de pronúncia arbitral.
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DECISÃO
Em face do supra exposto, o Tribunal Arbitral decide:
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Julgar totalmente procedente o presente pedido arbitral e anular a liquidação adicional de IRS n.º 2022..., com as legais consequências.
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Condenar a Requerida nas custas arbitrais.
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Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 181.474,00, nos termos do disposto no artigo 32.º do CPTA e no artigo 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).
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Custas
Nos termos da Tabela I anexa ao RCPAT, as custas são no valor de € 3.672,00, a pagar pela Requerida, uma vez que o pedido principal foi totalmente procedente, conformemente ao disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do RCPAT.
Notifique-se.
Lisboa, 30 de outubro de 2023.
Os Árbitros,
(Guilherme W. d’Oliveira Martins – com voto de vencido)
(Francisco Carvalho Furtado)
(Nuno Maldonado Sousa)
Voto de vencido pelo Árbitro Guilherme Waldemar d’Oliveira Martins
Considerando o estabelecido no artigo 8.º do Código do IRS, verifica-se que o legislador fiscal procedeu a uma redefinição, para efeitos de IRS, do conceito de renda utilizado no direito civil, dando-lhe uma amplitude maior do que a que resulta desse ramo do Direito.
Com efeito, nos termos do n.º 1 do artigo 8.º do Código do IRS, consideram-se rendimentos prediais as rendas de prédios rústicos, urbanos e mistos colocadas à disposição dos respetivos titulares, quando estes não optarem pela sua tributação no âmbito da categoria B, explicitando o n.º 2 as ações incidentes sobre o bem imóvel que dão origem à qualificação do rendimento como renda, nomeadamente, “as importâncias relativas à cedência do uso do prédio ou de parte dele e aos serviços relacionados com aquela cedência”.
Ora, está perfeitamente claro na lei que o rendimento disponibilizado a título de caução traduz-se, efetivamente, num acréscimo de valor ao património de quem cede o uso ou o gozo temporário do bem locado, associado e acordado em razão do contrato celebrado e com reflexos na sua capacidade contributiva do ano da disponibilização, e tendo em conta que, nos termos do n.º 1 do artigo 8.º do Código do IRS, os rendimentos prediais (rendas) relevam no momento do seu pagamento ou colocação à disposição dos respetivos titulares, é de considerar a caução como renda para efeitos de IRS, no ano do seu recebimento.
Tanto é assim que as entidades que disponham ou devam dispor de contabilidade organizada são obrigadas a reter IRS na fonte, mediante aplicação de uma taxa, em regra de 25%, aos rendimentos ilíquidos de que sejam devedores, inclusive a caução, em função do previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 101.º do Código do IRS.
Finalmente, e no caso de ocorrer a devolução da caução ao locatário (naturalmente no final do contrato), a mesma deve ser considerada um gasto suportado e pago pelo senhorio, no anexo F da declaração modelo 3 do ano em que ocorrer a devolução. Sendo que, em relação ao valor da retenção na fonte que recaiu sobre a mesma, não releva para a situação em concreto, pois foi considerada a título de “pagamento por conta”, no apuramento do imposto a pagar ou a receber respeitante ao ano do recebimento da caução.
Nada disto é novo e há muito que está esclarecido, como aliás o princípio da legalidade fiscal e a tipicidade concetual exigida pelo n.º 2 do artigo 8.º do Código do IRS. Contudo, com vista a uma uniformização de procedimentos por todos os seus Serviços, a Autoridade Tributária procedeu à divulgação, no Ofício Circulado n.º 20256, de 7 de junho de 2023, dos entendimentos sancionado por despachos da Subdiretora-Geral da Área de Gestão dos Impostos sobre o Rendimento.
Por tudo isto, é meu entender que o presente processo deveria improceder totalmente quanto ao pedido formulado pela Requerente.
O Árbitro-Presidente,
Guilherme d’Oliveira Martins
[1] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.