Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 499/2022-T
Data da decisão: 2023-10-30  IRC  
Valor do pedido: € 43.962,31
Tema: IRC Dedutibilidade de gastos Artigo 23º CIRC | efectividade da prestação de serviços e ónus da prova.
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A árbitro Ana Teixeira de Sousa, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para constituir Tribunal Arbitral Singular delibera o seguinte:

 

SUMÁRIO:

  1. O art. 75.º, n.º 1, da LGT estabelece uma presunção de veracidade das declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal;
  2. Aquela presunção não se verifica nas situações previstas nas várias alíneas do n.º 2 daquele preceito legal, cabendo à AT demonstrar qualquer das situações elencadas naquele n.º 2;
  3. São gastos dedutíveis em sede de IRC aqueles que cumprirem os requisitos constantes do artigo 23.º do Código do IRC:
  1. Requisito da efetividade do gasto (primeira parte do n.º 1 do art.º 23.º);
  2.  Requisito da justificação do gasto. A lei deixou de falar em indispensabilidade dos gastos, como fazia anteriormente, sendo agora determinante para a dedutibilidade que o gasto tenha como objetivo contribuir para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC (segunda parte do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC);
  3. Requisito da documentação do gasto.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I – RELATÓRIO

 

  1. A..., S.A., com o número único de matrícula e de identificação fiscal ... e sede no ...,  ..., ...-... Albufeira, doravante designada por “Requerente”, veio, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, na alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º, no n.º 1 do artigo 6.º e na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 10.º, todos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”) e, bem assim, nos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, solicitar CONSTITUIÇÃO DE TRIBUNAL ARBITRAL com vista à anulação parcial do acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) n.º 2022..., do acto de liquidação de juros compensatórios subjacente, bem como da respetiva demonstração de acerto de contas, referentes ao exercício de 2018, nos termos dos quais se apurou imposto a pagar no montante total de € 436.926,61 - embora a Requerente apenas pretenda contestar o valor de € 43.962,31, o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:
  2. A Requerente pretende que o Tribunal arbitral aprecie a legalidade (parcial) do acto de liquidação de IRC n.º 2022..., bem como do acto liquidação de juros compensatórios subjacente, ambos refletidos na demonstração de acerto de contas emitida, relativos ao exercício de 2018, de que resultou o montante de imposto a pagar de € 436.926,61 - o que configura o objeto do presente pedido de pronúncia arbitral, pretendendo discutir, em concreto, o montante de € 43.962,3.
  3. A Requerente vem, assim, peticionar a anulação parcial dos actos tributários supra identificados, na parte especificamente contestada adiante, por padecerem os mesmos de vício de violação de lei, o que se invoca nos termos do disposto na alínea a) do artigo 99.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), aplicável por força da alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.
  4. No dia 23/08/2022 foi apresentado pela Requerente o pedido de constituição do Tribunal.
  5. O pedido de constituição do Tribunal arbitral foi aceite a 24/08/2022 e automaticamente notificado à AT.
  6. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitro do Tribunal singular Ana Teixeira de Sousa, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
  7. Em 12/10/2022 as partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a mesma.
  8. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral singular foi constituído em 31/10/2022.
  9. Notificada para o efeito, nos termos do disposto no artigo 17.º do RJAT, a Autoridade Tributária apresentou a 12/12/2023 a sua resposta, tendo pugnado pela improcedência do pedido apresentado pela Requerente, peticionando, a final, pela manutenção das correções contestadas, tal como as mesmas surgem exaradas no relatório de inspeção tributária defendendo-se por excepção – caducidade do direito de acção - e por impugnação.
  10. Foram apresentados pela Requerente na ppa e pela Requerida na resposta testemunhas a serem ouvidas pelo Tribunal.
  11. Notificada da resposta apresentada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, a Requerente, apresentou, em 10/01/2023, a sua resposta à exceção de intempestividade.
  12. Em 24/04/2023 o Tribunal admitiu o requerimento apresentado pela Requerente e determinou que a excepção da caducidade seria apreciada na decisão final.
  13. A 09/05/2023 a Requerida requereu o aproveitamento de prova testemunhal anteriormente produzida no processo 41/2022-T tendo a Requerente solicitado ao Tribunal que, caso fosse decidido aproveitar a prova testemunhal fosse igualmente considerada a produção dessa prova no processo 282/2021-T.
  14. Em 12/07/2023 a Requerida entregou o processo administrativo.
  15. Também em 12/07/2023 decorreu, nas instalações do CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, tendente à produção de prova testemunhal, tendo sido inquiridas as testemunhas indicadas pela Requerente: B... e C... .
  16. Foi dispensada pela AT a audição da testemunha indicada pela Requerida.
  17. Determinou o Tribunal que as partes apresentassem alegações escritas, em 10 dias de modo simultâneo, ao que as partes deram a sua anuência bem como que a decisão seria proferida até dia 30 de Outubro.
  18.  Notificou-se a Requerente para pagamento da taxa de arbitragem subsequente dando cumprimento ao disposto no artigo 4º-3, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária [pagamento, antes da decisão e pela forma regulamentar, do remanescente da taxa arbitral] e, à luz do princípio da cooperação [cfr artigo 7º, do CPC], notificaram-se as partes para remeter ao CAAD cópias dos respetivos articulados, em formato editável (de preferência, em “Word”).
  19. Ambas as partes apresentaram as suas alegações em 08/09/2023.
  20. O Tribunal, considerando as dificuldades próprias deste processo, decidiu, no uso da faculdade prevista no nº 2 do artigo 21º do RJAT, prorrogar por 3 vezes o prazo para a prolação da decisão tendo as partes sido devidamente notificadas.
  21. O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT.
  22. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
  23. O processo não enferma de nulidades.

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.

 

POSIÇÃO DAS PARTES

Fundamentos da Requerente

  1. Em sede da ação inspetiva realizada à Requerente, os Serviços de Inspeção Tributária colocam em causa os gastos registados na conta “6222100000 - Publicidade e propaganda, referentes a “Promotion and Marketing Consultancy for ...”, no total de € 192.975,00.
  2. Nesse âmbito, os Serviços de Inspeção Tributária identificam, em concreto, pagamentos efetuados a uma entidade, designada por D..., residente na Região Administrativa Especial de Macau, invocando que “referindo que “a A... não justifica estes ditos serviços (…) [e] tão-somente anexa um relatório da Deloitte, relativamente a preços de transferência”, concluindo que “as empresas selecionadas [em sede da análise levada a cabo no contexto do mencionado relatório] não serão as mais independentes e representativas do mercado, pois, em 2017, tinham relações com o inspecionado, contudo, referentes a comissões sobre a venda de imóveis, quando as facturas emitidas pela D... se referem a promoção e consultoria em marketing sobre ... Resort (…), registados na contabilidade como publicidade e propaganda, conta 62221” (cf. a página 50 do Documento 7 junto com o pedido de constituição do Tribunal arbitral).
  3. A D... foca a sua atividade na prestação de serviços de promoção e marketing relativos a unidades turísticas e imobiliárias direcionadas para o mercado asiático, dispondo, para o efeito, de uma vasta rede de contactos, experiência e conhecimento específico associado a este mercado, que permite ultrapassar o distanciamento geográfico, as especificidades culturais e a limitação da língua (cf. Documento 11 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral).
  4. A D... desenvolve a sua atividade de promoção no respetivo “mercado de atuação” (i.e., no mercado asiático, conforme acima referido), incluindo os serviços por si prestados o acompanhamento e deslocação dos potenciais investidores a Portugal, incluindo - tal como sucede com outras entidades a quem a Requerente recorrentemente recorre para o mesmo efeito, embora a operar em diferentes mercados -, entre outras, as despesas associadas às viagens realizadas pelos potenciais investidores / clientes.
  5. Assim, no contexto dessas relações contratuais, estabelece-se a responsabilidade da D... face a determinadas atividades e custos relacionados com o transporte de potenciais investidores até à localização do ... Resort (ou seja, até ao empreendimento onde se situam as unidades de alojamento) e, por outro lado, a responsabilidade da Requerente com a respetiva acomodação e alimentação (dos potenciais compradores e agentes estrangeiros).
  6. Pelas atividades da responsabilidade da D... estabeleceu-se uma remuneração de 15,5% sobre o valor de venda, sendo que este montante apenas é pago nas situações em que a venda se concretiza, ou seja, existe uma obrigação de resultados.
  7. No âmbito da parceria estabelecida entre a Requerente e a referida entidade, foi concretizado, com referência ao exercício de 2018, ora em apreço, o seguinte negócio (cf. Documentos 12 e 13 juntos com o pedido de constituição de Tribunal arbitral):

 

Alojamento dos compradores (dias)

Nome dos compradores e unidade de negócio

Data da Escritura

Montante pago pela aquisição da unidade de negócio (em €)

Montante pago
pela prestação de serviços (em €)

19.06.2017 a 26.06.2017

(cf. Documento 14 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral)

E… e F… (S1113)

19.01.2018

1.245.000,00

 

192.975,00

 

  1. Contudo, como resulta da análise do relatório de inspeção tributária, os Serviços de Inspeção Tributária concluem, erroneamente, pela não aceitação do referido gasto, no montante de € 192.975,00, em virtude de entenderem existir dúvidas fundadas de que a operação em causa não foi efetivamente realizada, não tendo, no seu entendimento, a Requerente comprovado o contrário (cf. as páginas 50-51 do Documento 7 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral).  
  2. Versando especificamente o relatório elaborado pela G..., os Serviços de Inspeção Tributária questionam a escolha das entidades para comparação, considerando que os serviços de promoção e marketing vs. comissões pela angariação de clientes na venda das unidades de alojamento, quanto à sua natureza, não se igualam, mais questionando a normalidade, idoneidade e (des)proporcionalidade dos montantes envolvidos, em face da percentagem da remuneração praticada (cf. a página 50 do Documento 7 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral). 
  3. Não é verdade que tais serviços não se igualem, como referem os Serviços de Inspeção Tributária. A diferença apontada é, pura e simplesmente, uma diferença de nomenclatura.
  4. Com efeito, da leitura do referido relatório, resulta expressamente que se trata de “promoção e marketing das unidades de alojamento”, naturalmente tendo em vista a sua venda, daí que também se mencionem as “visitas de inspeção”, incluindo as despesas associadas à deslocação (viagem) dos potenciais investidores ao empreendimento (cf. Documento 11 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral).  
  5. E, como decorre da inquirição de testemunhas, os serviços subjacentes à referida factura foram, efetivamente, prestados pela D..., através da sub-agente Ms. H... (cf. C... , no segundo ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 7:36 ao minuto 8:05).
  6. Assim, ainda que se considerasse estar em causa uma irregularidade contabilística, no que respeita à conta em que foi registado o gasto sob análise, nos termos e para os efeitos do artigo 121.º do Regime Geral das Infrações Tributárias (“RGIT”) - que dispõe sobre a não organização da contabilidade de harmonia com as regras de normalização contabilística e atrasos na sua execução -, apenas haveria lugar à aplicação de uma coima na esfera da Requerente.
  7. Ter-se-á, porém, de atender ao princípio da substância sobre a forma, que determina que “nuclearmente, o que releva, para o direito fiscal, é o apuramento da efectiva realidade, relevante para efeitos de tributação” (cf. o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 23 de fevereiro de 2017, proferido no processo n.º 637/09.2BELRS, disponível em www.dgsi.pt).
  8. Atendendo à documentação fornecida durante o procedimento de inspeção tributária e no âmbito do presente processo arbitral, bem como à prova testemunhal produzida através da inquirição das testemunhas arroladas pela Requerente, é manifesto que os serviços prestados pela sociedade D... foram efetivamente prestados, revelando-se essenciais para a concretização da venda da unidade de negócio identificada, de montante significativo;
  9. No que concerne ao valor pago à referida entidade, o mesmo não se afigura anormal, excessivo ou desajustado, desde logo por não ser adequado ou sequer razoável, por todas as razões apontadas pelas testemunhas arroladas, comparar as percentagens habitualmente cobradas e pagas, a título de comissão, no contexto da mediação imobiliária desenvolvida no mercado nacional, porque a D... presta diversos serviços que não se incluem no escopo dos normais serviços de mediação imobiliária;
  10. O pagamento do serviço prestado depende integralmente do resultado - i.e., da concretização da venda -, verificando-se um (i) risco acrescido que corre por conta da D..., ao suportarem custos bastante avultados a fim de conseguirem atrair clientes para um país longínquo, situado noutro continente, sem a certeza de que terá um efetivo retorno desse investimento - uma vez que o potencial comprador poderia eventualmente desistir do investimento -, e (ii) uma segurança adicional para a Requerente, enquanto adquirente dos serviços, que apenas se constitui na obrigação de pagar quando assegurado o retorno associado à concretização da venda, das suas unidades de negócio, correndo assim o risco por conta da sociedade angariadora;
  11. A D..., que é uma sociedade sediada na Região Administrativa Especial de Macau, pelo que a mesma se encontra fora do âmbito de aplicação do disposto na alínea r) do n.º 1 do artigo 23.º-A do Código do IRC, porquanto a Região Administrativa Especial de Macau não integrava a Portaria n.º 292/2011, de 8 de novembro (aplicável à data dos factos) e, portanto, não ocorre, neste âmbito, qualquer inversão do ónus da prova determinada pelo sobredito normativo;
  12. Estando em causa uma sociedade sediada na Região Administrativa Especial de Macau e estando vigentes, à data do procedimento inspetivo, acordos que previam a troca de informações, poderiam (aliás, deveriam) os Serviços de Inspeção Tributária, por forma a dar cumprimento ao ónus probatório que recai sobre si nos termos do disposto no artigo 74.º da LGT, acionar os mesmos, tendo em vista apurar a efetiva (ou não) prestação de serviços, o que não foi feito, em clara violação do princípio do inquisitório a que alude o artigo 58.º da LGT;
  13. No caso sub judice é por demais evidente que a Autoridade Tributária não logrou colher nem provar indícios sérios e objetivos capazes de conduzir, com elevada probabilidade, à não efetividade das operações realizadas entre a Requerente e a D..., antes pelo contrário: limitou-se a solicitar à Requerente a prova cuja produção incumbia, nos termos da lei, à própria Autoridade Tributária, concluindo, sem mais, pela falta de verificação dos pressupostos de que depende a dedutibilidade dos gastos contabilizados com comissões pagas à referida entidade, sem fundamentar adequadamente essa sua opção;
  14. A Requerente juntou a documentação que, na sua ótica e à luz do artigo 23.º do Código do IRC, permitia justificar a efetiva prestação dos serviços, a saber: a escritura da compra e venda da unidade de alojamento, a factura emitida pela D..., o comprovativo do pagamento da referida factura e o comprovativo do alojamento (dos potenciais compradores - que se tornaram definitivos - e da sub-agente, a Ms. H...);
  15. Atendendo às regras do ónus da prova aplicáveis à situação ora em análise, e subsistindo dúvidas de que as operações foram efetivamente realizadas (as quais notoriamente subsistem, porquanto são enfatizadas pelos Serviços de Inspeção Tributária, servindo como ponto de partida e chegada da sua argumentação), sempre deveria a Autoridade Tributária abster-se de tributar, ao abrigo do princípio in dubio contra fiscum, vertido no artigo 100.º do CPPT;
  16. Não obstante a argumentação relativa à aplicação do artigo 100.º do CPPT no caso concreto ter sido expressamente alegada em sede de audição prévia, da análise do relatório final de inspeção verifica-se que os Serviços de Inspeção Tributária não analisaram de forma consistente - e, portanto, não foram capazes de efetivamente refutar - a argumentação aduzida pela Requerente, não se tendo pronunciado a respeito do n.º 1 do artigo 100.º do CPPT, verificando-se, assim, que Autoridade Tributária violou, de forma clara e inequívoca, o disposto no n.º 7 do artigo 60.º da LGT,  o que deverá determinar a falta de fundamentação das correções efetuadas por referência à mencionada sociedade e, em consequência, a anulação dos actos tributários contestados, na parte concretamente em causa;
  17. Face à argumentação amplamente exposta, bem como à documentação junta na presente sede e prova testemunhal efetuada, é forçoso concluir, por um lado, que o pagamento em causa, à D..., está devidamente justificado, por se tratar de serviços efetivamente prestados e com base no sucesso (no caso, a efetiva venda da unidade de negócio) e, bem assim, que, não havia uma alternativa a preço inferior que permita obter um serviço de semelhante qualidade (precisamente como aquele que foi, e vem sendo, prestado pela D...), concluindo-se que os gastos em causa, correspondentes aos pagamentos efetuados, a título de fee de promoção e marketing, pelos resultados alcançados no âmbito da parceria encetada com a referida entidade, além de normais, não revestem um montante exagerado, encontrando-se preenchidos os requisito a que alude a alínea r) do n.º 1 do artigo 23.º-A do Código do IRC (que, embora não seja legalmente aplicada, foi utilizada pela Autoridade Tributária);
  18. No que respeita ao momento do pagamento da factura da D... (de 27 de dezembro de 2018), foi esclarecido pela prova testemunhal de que esta foi paga em momento anterior por a Requerente já ter os fundos na sua posse e não ser possível reverter o negócio;
  19. A Requerente foi, no decurso de 2019 e 2020, alvo de uma ação inspetiva de natureza interna e de âmbito parcial, em sede de IRC e de IVA, com incidência sobre o exercício de 2016, que versou, entre outras questões, sobre os gastos relativos a pagamentos efetuados pela Requerente a favor de entidades residentes em países, territórios ou regiões com um regime de tributação claramente mais favorável (no caso, às entidades I..., J... e K... Ltd., não incidindo, assim, perante a sociedade em análise nos presentes autos, a D...), designadamente o cumprimento dos requisitos plasmados na alínea r) do n.º 1 do artigo 23.º-A do Código do IRC, para efeitos da aceitação da dedutibilidade fiscal dos referidos encargos;
  20. Na decisão arbitral proferida nesse processo - o processo n.º 282/2021-T - concluiu o Tribunal que, no que respeita à K... Ltd., - sociedade com sede em Macau, tal como a sociedade D...-, “não se está perante um empresa sedeada em qualquer dos países ou territórios indicados na Portaria n.º 292/2011, de 8 de Novembro, pelo que, estando devidamente contabilizada a despesa, se houvesse dúvida sobre a sua realização, teria de ser valorada processualmente contra a Autoridade Tributária e Aduaneira, por força do preceituado nos artigos 75.º, n.º 1, da LGT”, anulando (parcialmente) a referida liquidação, por ilegal;
  21. Na ótica da Requerente, tal interpretação legal e respetivas conclusões terão de ser, ipsis verbis, aplicadas ao caso em análise, referente à correção efetuada por referência à sociedade D..., em estrito cumprimento do disposto no n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil, onde se determina que “[n]as decisões a proferir, o julgador terá em considerar terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito” e do princípio da tutela jurisdicional efetiva, na sua vertente do processo equitativo, a que alude o n.º 4 do artigo 20.º da CRP;
  22. A alegação da Autoridade Tributária, de que a decisão proferida no processo n.º 282/2021-T se baseou em meros indícios e juízos presuntivos, não atende ao facto de caber ao “juiz aprecia[r] livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”, nos termos do n.º 5 do artigo 607.º do CPC, aplicável por força da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, preceito e princípio que a Autoridade Tributária, aparentemente, parece ignorar;
  23. Termina solicitando a anulação parcial do acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) n.º 2022..., do acto de liquidação de juros compensatórios subjacente, bem como da respetiva demonstração de acerto de contas, referente ao exercício de 2018, nos termos dos quais se apurou imposto a pagar no montante global de € 436.926,61 - embora a Requerente apenas pretenda contestar o valor de € 43.962,31

Fundamentos da Requerida

  1. A Requerida defende-se por excepção e por impugnação.
  2. Por excepção alega que o presente p.p.a. foi apresentado em 23/08/22.
  3. A liquidação ora impugnada tem prazo para pagamento voluntário até ao dia 26/04/22, conforme documento de liquidação junto pela requerente com o p.p.a.
  4. Nos termos do art. 10º do RJAT:

“ 1 - O pedido de constituição de Tribunal arbitral é apresentado:

a) No prazo de 90 dias, contado a partir dos factos previstos nos n.os 1 e 2 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, quanto aos actos susceptíveis de impugnação autónoma e, bem assim, da notificação da decisão ou do termo do prazo legal de decisão do recurso hierárquico;”

  1. E, segundo o mencionado art. 102º do CPPT, “  1- A impugnação será apresentada no prazo de três meses contados a partir dos factos seguintes:

a) Termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte;”

  1. Donde, tendo em conta o referido constata-se que o presente p.p.a. foi apresentado para além do prazo de 90 dias, contado do termo do prazo para pagamento voluntário da liquidação em causa.
  2. Pelo que, o mesmo é intempestivo tendo operado a caducidade do direito de ação.
  3. Por impugnação são os seguintes os fundamentos da defesa
  4. As correções em causa nos autos resultam da não aceitação do montante de € 192.975,00, como gasto fiscal, nos termos dos n.ºs 1 e 3 do artigo 23.º do CIRC, referente à factura n.º A2018001, de 27/12/2018, emitida pela “D... UNIPESSOAL, LIMITADA” ou “D... LIMITED”, relativamente a “Promotion and Marketing Consultancy for ... Resort”, valor registado na conta “6222100000- Publicidade e propaganda”, conforme registo Doc. 1, em anexo.
  5. A não aceitação deste gasto baseou-se na residência do prestador do serviço, Região Administrativa Especial de Macau, no facto de se tratar de uma factura anual, datada do final do ano, desta ter o n.º 1, repetindo-se o padrão do ano anterior, (levantou-se a questão desta entidade só emitir uma factura por ano, sendo a A... a sua única cliente), e principalmente no facto da A... não ter comprovado a efetiva realização dos serviços por parte da D..., não ter justificado a realização daqueles serviços, não ter juntado o contracto de prestação de serviços, um relatório do serviço ou outro registo efetivo da realização do serviço por parte do emitente da aludida factura.
  6. No decurso da inspeção, a A..., tão-somente fez chegar um relatório da G..., relativamente a preços de transferência, muito idêntico ao exibido para 2017.
  7. Porém, nesta análise económica para 2018 a percentagem sobre o preço de venda aplicada pela D... sofre um acréscimo, agora para 15,5%, quando as entidades comparadas, J... e L..., mantêm os 12% e 16%, respetivamente.
  8. Por fim, a G... volta a concluir pela adequação da remuneração acordada no contexto de partes relacionadas, e afirma ter demonstrando que a aquisição dos serviços de promoção e marketing pela A... à D... não impactaram negativamente a atividade da Empresa em 2018.
  9. A Requerente entende que, na presente situação, cabe à AT o ónus de provar que os serviços não foram prestados, uma vez que o território antes citado não integra a Portaria nº 292/2011 de 8 de Novembro, e além disso, nos termos do nº 1 do artigo 75º da LGT, “ presumem – se verdadeiras e de boa - fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na Lei , bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ( … ). “ Mais acrescenta que, “ no entanto, foi solicitada à requerente que efetuasse essa prova. “.
  10. Efetivamente, no caso em apreço, procederam os SIT a notificação à A... para esta provar que a operação foi realizada.
  11. No entanto, os elementos apresentados pela requerente para comprovação desta operação foram somente a factura antes citada, o comprovativo da transferência, e um relatório da G... relativo a preços de transferência, idêntico ao já apresentado para o exercício de 2017.
  12. A requerente não juntou qualquer contracto, relatório ou registo efetivo do serviço prestado.
  13. Quanto a este relatório da G..., veja-se o que a este propósito foi referido em sede de inspeção tributária, cfr. RIT,  a páginas 50 :

O contribuinte anexa um relatório da G..., relativamente a preços de transferência, muito idêntico ao exibido para 2017. Porém, nesta análise económica para 2018, a percentagem sobre o preço de venda aplicada pela D... sofre um acréscimo, agora para 15,5%, quando as entidades comparadas, J... e L..., mantêm os 12 % e 16 %.”

Por fim, a G... volta a concluir pela adequação da remuneração acordada no contexto de partes relacionadas, e afirma ter demonstrando que a aquisição dos serviços de promoção e marketing pela A... à D... não impactaram negativamente a atividade da Empresa em 2018.

  1. A AT não discorda do método utilizado, contudo, continua a afirmar que as empresas selecionadas não serão as mais independentes e representativas do mercado, pois, em 2017, tinham relações com o inspecionado, contudo, referentes a comissões sobre a venda de imóveis, quando as facturas emitidas pela D... se referem a promoção e consultoria em marketing sobre ... Resort.
  2. Note-se que, em 2017, ano em que se encontraram facturas emitidas pela J... e pela L..., os valores em causa levantaram muitas dúvidas quanto à sua normalidade, idoneidade e desproporcionalidade face às facturas referentes às comissões emitidas pela N... .
  3. Acontece que o referido estudo da G... se baseia em comissões, ainda que de montantes anormais, mas em comissões sobre as vendas de imóveis, quando os serviços prestados pela D..., conforme consta nas facturas exibidas e o S.P. regista na contabilidade, referem-se a “ Promotion and Marketing Consultancy for ... Resort”, tradução livre: “ Promoção e Consultoria de Marketing para Resort...”, registados na contabilidade como publicidade e propaganda, conta 62221 “.
  4. Acresce ao antes referido que, a factura que titula os gastos aqui em discussão, é a factura nº 1de 2018, emitida nos últimos dias de 2018, colocando - se a dúvida se essa entidade, só tem um único cliente a A... .
  5. Vem a Requerente, no art. 28.º do p.p.a., prestar correspondência entre estes supostos serviços e a alienação de um imóvel (S1113), cuja escritura pública, segundo a A..., data de 19.01.2018, conforme doc.2.
  6. A Requerida realça o facto de que a factura não se refere a mediação imobiliária e não identificar nem o imóvel agora invocado nem os adquirentes do mesmo.
  7. Sublinha a distância de quase um ano entre a data da referida escritura pública 19.01.2018, momento que formaliza/finaliza o negócio, e a data da aludida factura n.º A2018001, 27.12.2018.
  8. Alega ser no mínimo estranho o facto de a referida factura de dezembro de 2018  ter sido paga em março de 2018, conforme comprovativo bancário, doc. 3, nove meses antes da sua emissão.
  9. Refere que esta análise começou pela solicitação à A... de justificações referentes a discrepâncias e dúvidas assinaladas aquando de cruzamentos de informação, nomeadamente transferências bancárias para países ou territórios fiscalmente privilegiados, tendo o SP justificado a transferência a que se refere o doc. 3 com a factura em causa.
  10. Analisando a referida escritura pública, verifica-se que ela só faz referência a uma imobiliária, a N..., sociedade de mediação imobiliária, Unipessoal, lda. e esta agência, no dia 30 de junho de 2018, emitiu a factura n.º 3300000206, onde identifica o referido imóvel “S1113” e que se refere à comissão de 2% sobre a aludida venda, a saber € 24.900,00 mais IVA.
  11. Consta na mesma escritura pública que, a quase totalidade do valor de realização do S1113 foi recebido em dezembro de 2017, € 1.029.000,00, ficando somente € 216.000,00 por receber no prazo de 30 dias.
  12. Os outorgantes da escritura pública só mencionaram a imobiliária N..., esta emitiu a respetiva factura, o negócio foi encerrado em janeiro e no final de fevereiro de 2018 terá ficado totalmente liquidado, não se consegue compreender a suposta relação entre este negócio e a factura da D... aqui em causa, nem muito menos o seu valor desproporcionado.
  13. No que concerne ao registo contabilístico, “6222100000- Publicidade e propaganda”, ele reforça  o facto de que não se mostra provado que esta factura se destinou a pagar esta suposta e generosa “comissão” de 15,5%.
  14. Esta situação não permitiu aos SIT concluir, de forma clara e inequívoca, que a “ D..., Ltd “ prestou efetivamente os serviços que diz ter prestado à requerente, mostrando - se a documentação apresentada nitidamente insuficiente para suportar os referidos custos.
  15. Nestes termos, a presunção referida no n.º 1 do artigo 75.º da LGT, a qual estabelece que, “ Presumem –se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos.”, tinha de ficar forçosamente afastada nos termos das alíneas a) e b) do n.º 2 do mesmo artigo 75.º da LGT.
  16. Na verdade, como se referiu no RIT, “ Os registos contabilísticos não valem só por si, é necessário que o contribuinte os justifique e os comprove com documentos que não deixem dúvidas, motivos pelos quais foi notificado para apresentar provas. “.
  17. Ora, não tendo sido feita essa prova pela requerente, no sentido de justificar de forma plena o custo que incorreu no montante de 192.975,00 €, fica afastada a presunção antes enunciada.
  18. A AT demonstrou a existência de fortes indícios de que os serviços facturados não tinham sido efetivamente realizados e por isso procedeu a notificação para apresentação de prova  (inversão do ónus da prova).
  19. A Requerente não conseguiu prestar essa prova, o que até seria fácil bastando, por exemplo, apresentar a documentação resultante do trabalho alegadamente prestado pela empresa macaense, como relatórios - apresentações - prospetos, etc.
  20. Pelo que,  in casu, não está provada a efetividade das operações uma vez que, não foram aportados aos autos novos elementos de prova que evidenciem que foi na realidade prestado o serviço de intermediação que deu lugar ao pagamento de uma tão alta comissão a entidade sedeada em Macau, quando é certo que na escritura de compra e venda só aparece mencionada como intermediadora uma empresa nacional, “N...- Sociedade de Mediação Imobiliária, Unipessoal, Ldª “  a quem também foi paga uma comissão.
  21. Ora,  tendo em consideração o Acórdão também do CAAD de 25.09.2019, proferido no processo nº 102/2019 - T:“… Ainda que não fosse exigível a apresentação de todos os elementos sugeridos pela AT ( até porque, de facto, dificilmente a Requerente poderia ter acesso a dados como a identificação de recursos humanos envolvidos, horas aplicadas e taxas horárias por consultor ), sempre poderia ter disponibilizado elementos que permitissem demonstrar a materialidade das operações, como correspondência trocada relativamente a cada cliente ou evidência de informação sobre as vantagens do investimento facultadas aos parceiros não residentes por estes facultada aos seus potenciais clientes. ”
  22. Também no processo nº 453/2009 - T, de 07.05.2020 se conclui que : “… decerto haveria outros elementos para, com razoabilidade e fiabilidade, demonstrar a materialidade desses serviços, nomeadamente a troca de correspondência, a apresentação de um modelo de prestação de serviços ou projeto de promoção, contactos efetuados, parceiros, cálculo e pagamento de comissões, etc…”
  23. A Requerente considera relevantes o nº de unidades de negócio vendidas resultantes da parceria estabelecida com a D... .
  24. Ora, no caso em apreço, no exercício de 2018 o que se verifica é que, neste ano, o nº total de imóveis vendidos alegadamente por este agente foi somente 1.
  25. A Requerente solicita também que, em cumprimento do disposto no nº 3 do artigo 8º do Código Civil, seja aplicada na presente situação, as conclusões retiradas da decisão arbitral a que diz respeito o processo nº 282/2021 - T.
  26. A Requerida reconhece que o processo em questão diz respeito a correções semelhantes às aqui em apreço, efetuadas à recorrente mas relativas ao exercício de 2016.
  27. Refere que, nesse processo arbitral, foi decidido na realidade que a correção efetuada era ilegal, contudo, analisada a decisão em apreço referente a correções a gastos suportados em 2016 com prestações de serviços realizados pelas empresas L..., J..., e K..., verificou - se que  o Tribunal Arbitral, salvo o devido respeito, baseou-se em meros indícios como o refere, por exemplo, a pág. 43 “ na verdade, o facto de terem sido celebrados contractos com clientes residentes na China e Emiractos Árabes Undos indicia que houve atividades de angariação realizada por empresas sedeadas nesses países, pois, à face do que consta dos autos, é essa a única explicação para que esses clientes tivessem conhecimento dos imóveis que a Requerente tinha para venda” ou que “ Por outro lado, não se vê razão para duvidar que esses agentes tenham ligações às empresas com as quais a Requerente fez contractos de angariação e que emitiram as facturas relativas às comissões, o que até é indiciado pelo facto, expressamente referido como não questionado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, de «que os agentes tenham ficado alojados no ... Resort em simultâneo com os potenciais investidores”.
  28. Ora, tais juízos presuntivos não são admissíveis in casu, como bem se considerou no Ac. Arbitral proferido no Proc. 871/2021-T  que se cita: “ A Requerente invoca ainda a jurisprudência arbitral que, em situações similares, julgou procedentes os pedidos arbitrais. No entanto, essa jurisprudência assenta justamente em meros juízos presuntivos justificados pela crise do mercado imobiliário nacional à época e na actividade global da M... na angariação de cidadãos chineses que pretendiam investir em imobiliário em Portugal. Mas o que se toma exigível, como se deixou esclarecido, é a prova concreta da actividade desenvolvida em vista a justificar os pagamentos que foram efecuados e que a Autoridade Tributária entendeu ser de desconsiderar, para efeitos fiscais, com fundamento nessa ausência de prova. “ ( o realce é da nossa responsabilidade).
  29. Nestes termos, a prova testemunhal tem um carater eminentemente acessório, valendo sobretudo a prova documental.
  30. Ora, analisados os documentos agora remetidos com o PPA não se vislumbra que algum deles possa alterar a posição da AT.
  31. Por outro lado, em sede de Direito fiscal, a prova rainha é a prova documental, pela própria natureza das coisas, e não existindo esta, nomeadamente num caso em que era fácil obtê - la, não pode a mesma ser substituída por prova testemunhal.
  32. Conclui solicitando que seja considerada procedente a excepção invocada e a AT ser absolvida da instância, ou, caso assim não se entenda, o presente pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente, mantendo-se na ordem jurídica o acto tributário de liquidação impugnado.

Resposta da Requerente à excepção da caducidade alegada pela Requerida

  1. A Requerente veio a responder à excepção alegada pela AT na sua resposta nos seguintes termos:
  2. Invoca a Autoridade Tributária e Aduaneira que, tendo o presente pedido de pronúncia arbitral sido apresentado em 23 de agosto de 2022, foi o mesmo apresentado depois do prazo de 90 dias definido no artigo 10.º do RJAT, i.e., o prazo de 90 dias contado desde o termo do prazo para pagamento voluntário da liquidação em causa.
  3. A Autoridade Tributária e Aduaneira retira uma conclusão precipitada da análise do citado artigo 10.º do RJAT ao contar o prazo em causa como se de um acto procedimental se tratasse, seguindo a forma de contagem prevista no Código do Procedimento Administrativo (“CPA”) - entendimento não pode prevalecer.
  4. Em rigor, o prazo para entrega do pedido de constituição de Tribunal arbitral é um prazo substancial, da mesma forma que o é a entrega de uma qualquer petição inicial junto de um Tribunal comum, mormente, de impugnação judicial.
  5. O acto de entrega da petição inicial, pela sua própria natureza, poderia ser inserido no âmbito do procedimento tributário.
  6. O prazo para entrega do pedido de constituição é, naturalmente, um prazo substantivo porque ainda não há processo nem procedimento arbitral( ). Nestes termos, o prazo para este acto deve seguir as regras previstas no artigo 279.º do Código Civil, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a), mormente, ao artigo 20.º, n.º 1, in fine, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”)( ).
  7. À prática deste acto é, então, aplicável o disposto na parte final da alínea e) do artigo 279.º do Código Civil, nos termos da qual “[o] prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo”.
  8. Posto isto, terminando o prazo em período de férias judiciais, o prazo para a sua apresentação, porque se considera tratar-se de acto que tenha de ser praticado em juízo, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte( ) que não seja férias judiciais (i.e., 1 de setembro).
  9. Em abono da sua tese cita diversa jurisprudência, a decisão em 20 de junho de 2014, no processo arbitral n.º 17/2014-T; a decisão proferida em 14 de fevereiro de 2022, no âmbito do processo arbitral n.º 558/2021-T; a decisão na decisão proferida em 23 de janeiro de 2017, no processo n.º 432/2016-T, entre outros.
  10. Termina solicitando que a exceção invocada pela Autoridade Tributária e Aduaneira ser julgada totalmente improcedente, por não provada, conhecendo-se o mérito do presente pedido de constituição de Tribunal arbitral.

Alegações da Requerente

  1. Nas suas alegações a Requerente mantém toda a sua argumentação de facto e de direito apresentada na p,p.a.
  2. Mais retira como relevante da produção da prova testemunhal o seguinte:
  3. Da inquirição da testemunha B... resultou que:

O nosso negócio assenta numa componente hoteleira e de exploração turística e uma componente imobiliária associada à turística, ou seja, nós vendemos unidades de alojamento e que se mantêm, depois, em exploração connosco. Portanto, podemos explorar unidades que são nossas (e que são da nossa propriedade) e podemos explorar unidades que eram nossas, que alienámos, e que mantêm em exploração connosco” (cf. o primeiro ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 2:55 ao minuto 3:28);

“[O pagamento da comissão pela angariação de clientes] só ocorre, porque existiu uma venda efetiva. Não há outros pagamentos em situações em que não haja uma venda efetiva. (…) Foi enviada cópia da escritura, cópia da fatura, entre a unidade de alojamento vendida e o montante pago. Relativamente à questão e à comparabilidade, se quisermos, relativamente a outras comissões que são praticadas em território nacional, do nosso ponto de vista e do meu ponto de vista pessoal (…), não são comparáveis, porque nós estamos a falar da angariação de clientes em mercados nos quais não temos acesso. Ou seja, são clientes do mercado, e, neste caso em concreto, do mercado asiático, que, desde logo, pelas limitações de língua, de distância, etc., não temos acesso, e, portanto, há a necessidade de contratar estes intermediários, no fundo, para fazerem esta ponte.” (cf. o primeiro ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 4:26 ao minuto 5:30);

“Ao contrário de uma empresa que preste o mesmo tipo de serviços no mercado nacional, em que recebe o cliente, tem o contacto e introduz, nós aqui estamos a falar de agentes que, para além dessa angariação e dessa promoção, têm todos os encargos de trazer o cliente cá. Ou seja, eu não tenho qualquer responsabilidade, a não ser o pagamento deste montante que estamos aqui a discutir, nesse aspeto. Ou seja, o meu único envolvimento é a receção deste cliente cá, levá-lo ao Resort, mostrar-lhe as unidades que temos disponíveis para vender e, naturalmente, depois completar todo o processo de venda. (…), este gasto para a empresa só ocorre, única e exclusivamente, quando a venda é executada. E, portanto, estes gastos (…), incluem um conjunto de custos com a viagem e com trazer o cliente cá que, em situações normais, em comparação com aquilo que seria uma comissão praticada em Portugal, não é possível comparar por esta ordem de razões. [estas comissões estavam] claramente dentro daquilo que era a prática de mercado para este tipo de angariação de clientes nestes mercados e que se praticava naquela altura e que se continua a praticar, mas naquela altura em particular, em que estávamos a trabalhar.” (cf. o primeiro ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 5:43 ao minuto 7:25);

“Relativamente à não apresentação de bilhetes de avião ou de outras provas destes serviços] (…) a questão é que a minha responsabilidade perante o agente é pagar uma determinada remuneração na efetivação do contrato. Todas essas despesas são incorridas pelo agente. Eu não posso, nem tenho, essa informação comigo. A minha função era validar se a transação ocorreu e se aquela percentagem do montante está de acordo com o acordado. Se assim estiver, eu tenho a evidência da documentação da fatura, da própria escritura, se os clientes que estão identificados para aquela transação são os clientes que vieram cá com aquele agente. A minha validação é feita dessa forma. A restante informação, seja os vistos para trazer os clientes cá, as viagens para trazer os clientes cá, tudo isso são encargos que estão do lado do agente aos quais não tenho acesso. Essa foi sempre a limitação que “colocámos na mesa". Eu não tenho esses documentos - não estão na minha esfera para que os possa apresentar.” (cf. o primeiro ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 9:25 ao minuto 10:38);

“Esta entidade é responsável por trazer o cliente até Portugal. Depois, estando em Portugal, a responsabilidade é nossa. Ou seja, é-lhes alocado um agente, nosso interno, que é alocado à concretização da venda. Essa é parte que ocorre em Portugal, após a vinda deste potencial investidor até Portugal, e na qual há essa intervenção – o agente vai, de facto, mostrar as várias unidades disponíveis ao proprietário com o objetivo de concretizar o negócio final. Estamos a falar de agentes que já são muito especializados, ou seja, aquilo que são considerados como potenciais compradores (…) já estão previamente filtrados e identificados. Mas há toda a componente depois cá - de mostrar a propriedade, de os acolher, de os acompanhar – para levar à escolha final da propriedade, porque isso não está predefinido. Por isso é que o proprietário ou potencial investidor vêm cá - para ver e escolher a unidade” (cf. o primeiro ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 10:53 ao minuto 12:35).

  1. Da inquirição da testemunha C... resultou que:

“Relativamente a este tipo de comissões temos que recuar um bocadinho até aos anos de 2012/2013, (…) estávamos numa crise imobiliária. As vendas imobiliárias eram parcas e em finais de 2012 surgiu o Golden Visa. Nessa altura, conseguimos estabelecer contactos com um mercado promissor, que foi o mercado chinês, que é um mercado muito abrangente. Para entrarmos nesse mercado foi necessário estabelecer parcerias com agentes locais que pediam comissões altas. Estávamos a falar de comissões entre os 15% e os 16% e, em alguns mercados, chegavam aos 18%. Obviamente também estavam estabelecidos como métrica os valores de vendas, permitiu-nos subir preços de venda, mas permitiu-nos entrar num mercado no qual não tínhamos capacidade de entrar sozinhos. Ou seja, seja por uma questão de marketing, porque faz marketing lá era impossível – qualquer investimento não iria permitir alcançar resultados, seja por uma questão de barreira linguística, seja por uma questão cultural. Sendo assim estabelecemos parcerias com algumas entidades que nos traziam clientes altamente qualificados ao empreendimento e que nove em cada dez clientes adquiria uma das nossas unidades. Obviamente isto foi passando – 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 – em que fomos mantendo essa relação, porque é uma relação que para nós nos convém, porque não despendemos recursos em promoção desse mercado, são relações que nos permitem trazer clientes altamente qualificados, que adquirem as nossas propriedades e que na média geral entre unidades vendidas a clientes diretos, nacionais, clientes com agências nacionais, clientes com agências internacionais, na média, o custo acaba por se encaixar na nossa política de venda de unidades.” (cf. o primeiro ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 33:27 ao minuto 37:00);

“Não é um mercado que hoje em dia seja muito expressivo - à data de hoje -, mas é um mercado que foi altamente importante e que continuamos a manter relações, apesar de o número de vendas agora ser muito reduzido, porque é algo que não nos obriga a despender recursos em termos de promoção. Eles próprios fazem essa promoção, trazem-nos os clientes, acompanham os clientes até aos empreendimentos. A única coisa que n

Nós temos de providenciar é a estadia, ir buscá-los ao aeroporto e trazê-los para o empreendimento, bem como as refeições e os consumos que façam dentro do empreendimento. (…) Se é caro? É. Mas em 2013 quando ninguém estava a vender, ter clientes que chegavam e compravam e que estavam dispostos a pagar, permitiu-nos subir o preço das propriedades e aumentar a rentabilidade dos investimentos nos nossos proprietários” (cf. o primeiro ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 33:27 ao minuto 37:44);

“[Quanto ao preço acordado com a Ms. H...] nós aí [na empresa para quem a Ms H... trabalhava antes] pagávamos 16 a 18%, dependendo do volume de vendas que fosse feito no ano (…). [Contratar a Ms. H... através da D...] é mais favorável” (cf. o segundo ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 2:29 ao minuto 2:45);

“Enquanto grupo, nós temos de cumprir as nossas obrigações perante o branqueamento de capitais, perante o IMPIC (…). Para tal, temos a nossa própria mediadora, que é parte interveniente em todos os negócios [por essa razão é que na escritura é interveniente outra empresa], que é utilizada de forma a cumprir todas as obrigações legais - fazer o dossier de branqueamento de capitais, prestar declarações perante o IMPIC e por aí fora -, porque até há bem pouco tempo, só os mediadores é que estavam obrigados. Só há alguns anos que se começou a exigir que os promotores prestassem declarações de IMPIC. Adicionalmente, nós temos, também, os nossos consultores internos, ou seja, vendedores internos, que estão no empreendimento, que são quem faz a receção dos clientes, vão mostrar todas as propriedades que estão disponíveis, que trabalham sob comissão. Mesmo para estes clientes de origem asiática - eles vinham, eram acompanhados pelos nossos consultores, que mostravam todas as nossas propriedades, o que é que está disponível e o que é que não está disponível -, em que, quando a venda se concretiza, também recebem comissão. Essa comissão é paga pela nossa mediadora” (cf. o segundo ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 3:00 ao minuto 4:28);

“Numa visita de um cliente chinês temos: o cliente, temos o agente chinês, temos um consultor nosso, temos um tradutor nosso e, por vezes, ainda temos um motorista. Todos estão a fazer parte de um quadro promotor, em que vão ser mostradas as diversas propriedades que estão disponíveis, para se tentar concretizar a venda. (…) A única despesa que temos é o alojamento dele, ir buscá-lo ao aeroporto, trazê-lo até ao empreendimento, a estadia dele e pequenos-almoços” (cf. o segundo ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 5:22 ao minuto 6:54);

“Há um acompanhamento próximo de todos os negócios e de toda a faturação. A faturação, normalmente, é precedente ou de um grande pagamento ou da escritura. Por norma, até é sempre da escritura. Faz-se a escritura, a Ms. H... sabe que tem a escritura, vai emitir a fatura à D... . A D... emite-nos a fatura, nós sabemos que aquele montante corresponde aos 15,5% daquele negócio e é pago” (cf. o segundo ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 7:36 ao minuto 8:05);

“[A fatura de 27 de dezembro de 2018 foi paga em momento anterior] porque já tínhamos grande parte do dinheiro do nosso lado. A partir do momento em que há um contrato-promessa de compra e venda assinado, que não pode ser cancelado, e temos grande parte dos fundos recebidos. (…) atualmente, normalmente pago as comissões a todos os agentes com base em pro rata. Se o cliente já pagou 50% do valor de aquisição, o agente poderá receber 50% da comissão dele” (cf. o segundo ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 9:05 ao minuto 9:53);

“Nós não somos o promotor tradicional que vende e depois de estar vendido vai embora. Nós temos propriedades que ficamos a administrar para os clientes e ficamos a prestar serviços. Por isso, nós temos de garantir que a informação que é transmitida ao cliente, mesmo sendo de origem chinesa, é transmitida por nós, nos nossos termos, para garantir que a nossa relação, de hoje para amanhã, continua saudável. Daí eu ter agente chinês, cliente, agente nosso, tradutor e motorista, para controlar todo o circuito e garantir que toda a informação final, que leva à decisão do cliente a comprar ou não, é fidedigna e está de acordo com os nossos padrões e com os nossos termos” (cf. o segundo ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 15:09 ao minuto 16:59);

Quanto à eventual troca de informação com esses agentes “muitas das vezes são informações que são trocadas através de redes sociais como a Badu e que têm outras coisas para além de informação estritamente de negócios (…). Eu forneço a informação que acho que devo fornecer: o cliente e a agente estiveram cá: provo (…) pela reserva de hotel (…). As pessoas comunicam com os nossos tradutores na língua deles (no mandarim), muitas vezes por redes sociais - os WhatsApp da China -, eu não vou estar a pedir a colaboradores para fazer print screen dessa informação, estar a pedir a um tradutor oficial para estar traduzi-la, para prestar à Sra. Dra., quando eu tenho comprovativo de que o cliente esteve hospedado no nosso empreendimento acompanhado do agente e que comprou uma unidade e fez uma escritura” (cf. o segundo ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 17:03 ao minuto 19:15);

“Contrato-promessa com cliente fazemos sempre (…) até porque no contrato-promessa de compra e venda têm de assinar logo o contrato de exploração turística e damos toda a informação da unidade (…) e é assinado ou pelo cliente ou pelo representante legal em Portugal, o procurador dele” (cf. o segundo ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 22:40 ao minuto 23:15);

“[Quanto à não entrega do contrato-promessa à Autoridade Tributária] eu não acompanho o processo na parte legal, não sei se a informação foi prestada, o contrato se foi prestado ou só a escritura (…)”, concluindo que “a escritura é a consolidação do negócio (…) a gente faz contratos [promessa] com todos, fazemos escritura não se apresenta o contrato. O contrato normalmente cessa com a execução da escritura” (cf. o segundo ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 23:35 ao minuto 24:49).

  1. A Requerida mantém nas suas alegações todo o exposto na resposta já apresentada.

Tudo visto, cumpre proferir:

II. DECISÃO

A. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

  1. As correções em causa nos autos resultam da não aceitação do montante de € 192.975,00, como gasto fiscal, nos termos dos n.ºs 1 e 3 do artigo 23.º do CIRC, referente à factura n.º A2018001, de 27/12/2018, emitida pela “D..., LIMITADA” ou “D... LIMITED”, relativamente a “Promotion and Marketing Consultancy for ... Resort”, valor registado na conta “6222100000- Publicidade e propaganda”, conforme registo Doc. 1, em anexo.
  2. A Requerente é uma sociedade comercial que se dedica à construção e desenvolvimento de projetos imobiliário-turísticos no Algarve, fazendo parte da sua atividade, entre outras, a promoção e exploração imobiliária-turística de empreendimentos turísticos e estabelecimentos conexos e similares, incluindo um aldeamento turístico, um estabelecimento hoteleiro, apartamentos turísticos e estabelecimentos de restauração e bebidas (cf. Documento 4 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral);
  3. A Requerente é sujeito passivo de IRC, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e, bem assim, da alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º, ambos do Código do IRC, estando enquadrada, no período relevante, no regime geral de determinação do lucro tributável previsto naquele código;
  4. A Requerente encontra-se registada para o exercício da sua atividade com o código de atividade empresarial (CAE) principal n.º 55111 - Hotéis com restaurante - e com os CAE secundários n.ºs 68100 - Compra e venda de bens imobiliários - e 96022 - Institutos de beleza;
  5. No decurso de 2021, a Requerente foi alvo de uma ação inspetiva de natureza externa e de âmbito geral, em sede de IRC e de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”), realizada ao abrigo das Ordens de Serviço n.ºs OI2021... e OI2021..., com incidência sobre os exercícios de 2017 e 2018, respetivamente, tendo em vista à comprovação e verificação dos valores declarados pela Requerente em sede dos referidos impostos;
  6. Em 26 de outubro de 2021, através do Ofício n.º ..., datado de 21 de Outubro, a Requerente foi notificada do projeto de relatório de inspeção tributária, contendo as correções técnicas projetadas pelos Serviços de Inspeção Tributária, resultantes de alegadas omissões e inexatidões verificadas no apuramento dos resultados fiscais declarados pela Requerente, com referência aos referidos exercícios (2017 e 2018), bem como para, assim querendo, exercer o seu direito de participação no procedimento, na modalidade de audição prévia (cf. Documento 5 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral) que aqui se dá por integralmente reproduzido;
  7. No referido projeto de relatório de inspeção tributária foram propostas as seguintes correções técnicas em sede de IRC:

 

  1. Por discordar das correções projetadas pelos Serviços de Inspeção Tributária, a Requerente exerceu, em 22 de novembro de 2021 e ao abrigo do disposto nos artigos 60.º da Lei Geral Tributária (“LGT”) e do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (“RCPITA”), o seu direito de audição prévia, contestando, entre outras, as correções que acima se indicaram (cf. Documento 6 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral);
  2. A Requerente aceitou em sede de audição prévia, algumas correções projetadas pelos Serviços de Inspeção Tributária, designadamente o montante de € 294,00, respeitante a retenções na fonte referentes a retenções na fonte do exercício sob escrutínio, contante no ponto III.2.2.2. do projeto de relatório de inspeção tributária) (cf. Documento 6 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral);
  3. Os Serviços de Inspeção Tributária mantiveram as correções propostas, convolando-as em definitivas, com base nos seguintes argumentos:
  4. No que respeita às correções atinentes a “encargos não dedutíveis para efeitos fiscais (territórios não listados) (…) III.2.1.2 (2018)”, que “relativamente a estas 4 entidades, sediadas em Macau e na China, ainda que não se encontrem referidos na Portaria n.º 292/2011, de 08/11, os documentos de suporte fornecidos deixaram-nos algumas dúvidas, pelo que se notificou o S.P. para comprovar a efetiva realização, por parte dos mesmos, dos serviços em causa” (cf. a página 74 do Documento 7 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral);
  5. Embora a Região Administrativa de Macau não se encontre na citada Portaria, segundo o Banco de Portugal (…) é um ordenamento turístico offshore”, pelo que, “assim, uma vez que tais dúvidas se levantaram e levantam, foi o S.P. notificado para comprovar a realização efetiva das operações pelas entidades em causa, bem como, para comprovar que os valores envolvidos não são anormais nem de montante exagerado” (cf. a página 74 do Documento 7 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral);
  6. Em nosso entender, a prova não foi prestada, pois a requerente não nos exibiu nem nos vem agora exibir documentos que atestem condignamente (…) a dedutibilidade dos gastos”, pelo que “a presunção referida no n.º 1 do artigo 75.º da LGT fica afastada nos termos das alíneas a) e b) do n.º 2 do mesmo artigo (…) uma vez que a A... não demonstrou que os indícios de que a sua contabilidade poderia não relevar exatamente a sua realidade não se verificam” (cf. a página 74 do citado Documento 7 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral);
  7. Os Serviços de Inspeção Tributária mantiveram “a conclusão de que os elementos apresentados são insuficientes para aferir que os encargos correspondem a operações efetivamente realizadas por aquelas entidades, pelo que, nos termos dos n.º 1 e 3 do artigo 23.º do CIRC, mantemos a não aceitação da pretensão da requerente e a manutenção da correção anteriormente projetada nos pontos (…) III.2.1.2.1 e III.2.1.2.2 (2018)” (cf. a página 75 do Documento 7 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral, negrito do original);
  8. quanto à suposta contradição com a oposição tomada pela AT no decurso de inspeções anteriores, nomeadamente aos anos de 2013 e 2014, temos a referir que a análise não foi efetuada na mesma ótica do presente procedimento inspetivo”, sendo que “ainda que as inspeções sejam de âmbito geral, a AT num acto inspetivo não tem a pretensão de analisar todos os registos contabilísticos, muito menos numa empresa com as dimensões da A...” (cf. a página 75 do Documento 7 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral);
  9. A Requerente não efectuou o pagamento do IRC adicionalmente liquidado no prazo legal pelo que lhe foi instaurado o processo para cobrança coerciva da dívida com o nº ...2022... (cf. Documento 9 junto com a p,p.a.);
  10. A Requerente efectuou o pagamento da totalidade do valor em dívida em 02/06/2022 (cf. Documento 10 junto com a p,p.a.):;
  11. As correções técnicas plasmadas no relatório final de inspeção tributária, e relativas ao exercício de 2018 (cf. Documento 7 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral) consolidaram-se nos seguintes termos:

Natureza da correção

Relatório final de inspeção tributária

Montante (em €)

Correções à matéria coletável

 

Pontos III.1.1. / IX.3.2 / IX 8.3

 

852.524,89

Imposto em falta

 

Pontos III.1.3. / IX. 6.2 / IX.7.2.

 

226.450,00

 

Total: 1.078.974,89

  1. Na sequência das correções efetuadas, a Requerente foi notificada, através do ofício n.º..., de 30 de dezembro de 2021, de novo relatório contendo as correções resultantes de ação de inspeção (análise interna) credenciada pela ordem de serviço n.º OI2021..., para efeitos do cumprimento do disposto no artigo 70.º do Código do IRC, nomeadamente para apuramento do lucro consolidado corrigido das correções através indicadas (cf. Documento 8 junto com o pedido de constituição de Tribunal arbitral);
  2. Em 19/01/2018 a Requerente procedeu à alienação de um apartamento de um prédio urbano classificado para fins turísticos sito em ..., freguesia de ... e ... tendo sido adquirido por duas cidadãs de nacionalidade da República Popular da China (cf. Documento 12 junto à p,p.a. Como escritura de compra e venda);
  3. O valor inscrito na escritura é de € 1.245.000,00 (um milhão, duzentos e quarenta e cinco mil euros) tendo sido o valor de € 514.500.00 (quinhentos e catorze mil e quinhentos euros) sido pago por duas vezes em Dezembro de 2017 e o remanescente pago em Janeiro de 2018;
  4. A Requerente recebeu uma factura da D... datada de 27/12/2018 por serviços de “promotion and marketing consulting” no valor de € 192.975,00 (cento e noventa e dois, novecentos e setenta e cinco mil euros) (cf. Documento 13 junto à p.p.a);
  5. A Requerente pagou à D... o valor de € 192.975,00 (cento e noventa e dois, novecentos e setenta e cinco mil euros) em 20/03/2018 (cf. Documento 13 junto à p.p.a);
  6. Por não se conformar com as correções efetuadas em sede de IRC, relativo ao exercício de 2018, a Requerente apresentou, em 23/08/2022 o presente pedido de constituição do Tribunal arbitral.

2. Factos não Provados

Com relevo para a apreciação e decisão da causa, não resultaram provados os seguintes factos:

Não se provou que a factura emitida - cfr. Ponto 22  supra - à Requerente pela D... corresponde uma efectiva prestação de serviços, seja de angariação de clientes, seja de promoção e marketing ou qualquer outra.

Não se provou que os gastos com o pagamento da factura emitida pela D... tenham sido incorridos pela Requerente para obter ou garantir os seus rendimentos sujeitos a IRC.

Com relevo para a decisão da causa não existem outros factos não provados.

A3. Motivação quanto à Matéria de Facto

Cabe ao Tribunal Arbitral selecionar os factos relevantes para a decisão, em função da sua relevância jurídica considerando as várias soluções plausíveis das questões de Direito, bem como discriminar a matéria provada e não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Segundo o princípio da livre apreciação dos factos, o Tribunal baseia a sua decisão, quanto à matéria de facto, na sua íntima e prudente convicção, formada a partir do exame e avaliação dos meios de prova trazidos ao processo, e de acordo com as regras da experiência (cfr. artigo 16.º, alínea e), do RJAT, e artigo 607.º, n.º 4, do CPC, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 Somente relativamente a factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, a factos que só possam ser provados por documentos, a factos que estejam plenamente provados por documentos, acordo ou confissão, ou quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g., força probatória plena dos documentos autênticos, cfr. artigo 371.º do Código Civil), é que não domina, na apreciação da prova produzida, o referido princípio da livre apreciação (cfr. artigo 607.º, n.º 5, do CPC, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

Consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados como factos provados, tendo por base a análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos.

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos pela Requerente e os que constam do processo administrativo.

As testemunhas B... e C... aparentaram depor com conhecimento directo da forma de operar da Requerente mas não com conhecimento pormenorizado da operação que conduziu ao gasto da Requerente cuja dedutibilidade fiscal é posta à prova perante este Tribunal. Por outro lado, nem sempre o aparentaram fazer com a necessária isenção e distanciamento, como é compreensível tendo em consideração as posições que ocupam e funções que desempenham no seio da Requerente.

B. DO DIREITO

EXCEPÇÃO DA CADUCIDADE

  1. Notificada para o efeito, nos termos do disposto no artigo 17.º do RJAT, a Autoridade Tributária apresentou a sua resposta, tendo pugnado pela improcedência do pedido apresentado pela Requerente, peticionando, a final, pela manutenção das correções contestadas, tal como as mesmas surgem exaradas no relatório de inspeção tributária.
  2. A Autoridade Tributária defendeu-se por excepção e por impugnação.
  3. Por excepção alegou a caducidade do direito de ação, na medida em que, considerando que “[o] presente p.p.a. foi apresentado em 23/08/2023”, “[a] liquidação ora impugnada tem prazo para pagamento voluntário até ao dia 26/04/2023” e, ainda, que “segundo o art. 102º do CPPT, “1- A impugnação será apresentada no prazo de três meses contados a partir dos factos seguintes: a) Termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte”, “constata-se que o presente p.p.a. foi apresentado para além do prazo de 90 dias, contado do termo do prazo para pagamento voluntário da liquidação em causa”, concluindo que “o mesmo é intempestivo tendo operado a caducidade do direito de ação” (cf. os pontos 5., 6., 8. e 10. da Resposta);
  4. A Requerente, notificada da resposta apresentada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, apresentou, no dia 10 de Janeiro de 2023, a sua resposta à exceção de intempestividade concluindo no sentido de que a exceção invocada pela Autoridade Tributária deve ser julgada totalmente improcedente, por não provada, conhecendo-se o mérito do presente pedido de constituição de Tribunal arbitral.
  5. Tendo-se iniciado o prazo de 90 dias para a apresentação do presente pedido arbitral em 27 de Abril de 2022 (o dia seguinte ao termo do prazo para pagamento voluntário, que terminou em 26 de Abril de 2022), este terminaria a 27 de Julho de 2022.
  6. Alegou a Requerente que, verificando-se que, a essa data, estavam já iniciadas as férias judiciais - desde dia 16 de Julho, nos termos do artigo 28.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto -, pelo que, terminando o prazo em férias, este transfere-se, nos termos da alínea e) do artigo 279.º do Código Civil, para o primeiro dia útil seguinte, in casu, dia 1 de Setembro de 2022.
  7. Tendo o presente pedido de pronúncia arbitral sido apresentado em 23 de Agosto de 2022, conclui a Requerente que o mesmo foi, inequivocamente, apresentado tempestivamente.
  8. Cumpre decidir sobre a excepção da caducidade antes de conhecer do mérito da pretensão da Requerente.
  9. Na verdade, impõe-se ao Tribunal o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, donde que urge apreciar a questão colocada pela Requerida da caducidade do direito de acção.
  10. O artº 9º da Lei Geral Tributária garante o acesso à justiça tributária para tutela plena e efetiva de todos os direitos ou interesses legalmente protegidos, no seguimento, do direito constitucional de acesso à justiça (artº 20º nº 1 e artº 268º, nº 4 da CRP).
  11. Para tanto, é garantido aos administrados a tutela jurisdicional efetiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos é levada a cabo através da impugnação dos actos tidos como ilegais, com recurso à justiça tributária exercida, atualmente, pelos tribunais administrativos e fiscais em jurisdição plena por via do processo judicial tributário (artº 96º e 97º do CPPT) ou, alternativamente, pelos tribunais arbitrais, conforme prevê o artº 1º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, criado pelo Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro.
  12. Em primeiro lugar o administrado tem um direito constitucional para interpor uma ação junto dos órgãos jurisdicionais competentes no sentido de instaurarem um processo de impugnação judicial ou de pronúncia arbitral, consoante a sua opção, com vista à apreciação da legalidade dos actos da administração tributária o qual, como todos os direitos, por questões relacionadas com o princípio da segurança jurídica, deve ser exercido dentro de um determinado prazo sob pena de o não exercício dentro desse prazo legalmente fixado o fazer caducar.
  13. Segundo a doutrina e jurisprudência largamente maioritária trata-se de um direito, cujo prazo para o seu exercício tem natureza substantiva, anterior e independente do processo, que deve ser exercido, no caso de a opção ser a via arbitral, no prazo de 90 dias ou de 30 conforme as situações previstas no nº 1 do artº 10º do RJAT, pelo que a sua natureza não pode ser de cariz nem procedimental nem processual, mas antes inerente à relação jurídica tributária material que compreende o direito de impugnar ou reclamar das situações que sejam desconformes com a legalidade.
  14. Efectivamente, na ótica do processo arbitral em sentido amplo, entende-se  que antes da apresentação da petição inicial nem sequer há procedimento, o qual só pode, obviamente, ter início precisamente com esse pedido do interessado, como decorre do artº 53º do CPTA, subsidiariamente aplicável, pelo que a previsão do artº 3º/A do RJAT não pode ser aplicada ao direito de acção que é autónomo e anterior a qualquer procedimento.
  15. Por outro lado, como decorre do artº 15º do RJAT, o processo arbitral só tem início na data da constituição do Tribunal arbitral, ou seja, continua a ser uma realidade o facto de o direito de ação não ter natureza processual por ser prévio ao próprio procedimento arbitral, não lhe sendo, por isso, aplicável nem o nº 1 nem o nº 2 do citado artº 3º/A do RJAT, ao contrário do que decorre da decisão maioritária tomada no presente processo.
  16. É com a apresentação do pedido arbitral que se inicia primeiramente o procedimento e, depois da constituição do Tribunal, o processo.
  17. Acompanhamos a posição que parece ser não unânime mas largamente prevalecente na doutrina e até mesmo na jurisprudência do STA de que na contagem do prazo para o exercício do direito de acção, por este ser um direito de natureza substantiva, se aplica o artº 279º do Código Civil, aqui subsidiariamente aplicável por força do artº 29º, nº 1, in fine, do RJAT, com remissão para o artº 20º do CPPT.
  18. E, efetivamente, não fazendo o direito de ação parte do procedimento arbitral, constatamos que nem o artº 3º/A do RJAT, nem outro qualquer referem qual a forma ou modo de contagem do respetivo exercício do direito. As normas referentes à apresentação só dizem que o direito deve ser exercido em 90 ou em 30 dias, conforme o artº 10º. Trata-se, pois, de prazos de natureza substantiva e não processuais ou procedimentais, por isso, o regime aplicável é necessariamente o do artº 279º do Código Civil.
  19. Ora, de acordo com o previsto no artigo 279º do Código Civil “à fixação do termo são aplicáveis, em caso de dúvida, as seguintes regras: a) Se o termo se referir ao princípio, meio ou fim do mês, entende-se como tal, respectivamente, o primeiro dia, o dia 15 e o último dia do mês; se for fixado no princípio, meio ou fim do ano, entende-se, respectivamente, o primeiro dia do ano, o dia 30 de Junho e o dia 31 de Dezembro; b) Na contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr; c) O prazo fixado em semanas, meses ou anos, a contar de certa data, termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data; mas, se no último mês não existir dia correspondente, o prazo finda no último dia desse mês; d) É havido, respectivamente, como prazo de uma ou duas semanas o designado por oito ou quinze dias, sendo havido como prazo de um ou dois dias o designado por 24 ou 48 horas; e) O prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo”
  20. Ou seja, manda aplicar à contagem do prazo para a apresentação do pedido arbitral o regime estabelecido no artº 279º do CC, e que se o termo coincidir com um dia em que os serviços estão encerrados então o termo transfere-se para o primeiro dia útil seguinte.
  21. A jurisprudência do STA desde há muito que vem decidindo pacificamente que o primeiro dia útil seguinte será o do primeiro dia pós-férias se o termo do prazo se verificar no decurso do período de férias, uma vez que é feita a equiparação do período de férias aos dias em que o Tribunal está encerrado.
  22. Neste âmbito, e conforme escreve Carla Castelo Trindade, “(…) na contagem dos prazos para entrega do pedido de constituição do Tribunal arbitral não se inclui o dia em que ocorre o evento (…) a partir do qual o prazo começa a correr, de forma contínua, e caso termine a um sábado, domingo ou feriado, transfere-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte. De referir ainda que tem sido entendimento unânime na Doutrina e na jurisprudência que à entrega do pedido de constituição de Tribunal arbitral (…) é também aplicável o disposto na parte final da alínea e) do artigo 279º do CC, nos termos da qual o prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais (…). Isto mais não significa do que, terminando o prazo em período de férias judiciais (…) o termo do prazo para entrega do pedido de constituição de Tribunal arbitral se transfere para o primeiro dia útil posterior às férias”.[1]
  23. Inexistindo no RJAT, como ficou demonstrado, forma expressa de contagem desse prazo, é subsidiariamente aplicável o disposto no artº 20º do CPPT e no art.º 279º do CC para a contagem do prazo para exercer o direito de ação com a apresentação de pedido de pronúncia, pelo que, o último dia do prazo que termine em período de férias judiciais se transfere para o primeiro dia útil após férias.
  24. Nessa conformidade, é entendimento do Tribunal de que o pedido é tempestivo, pelo que o processo deverá prosseguir os termos ulteriores com a apreciação pelo Tribunal arbitral da restante matéria do pedido.

 

DEFESA POR IMPUGNAÇÃO

  1. As correções em causa nos autos resultam da não aceitação do montante de € 192.975,00, como gasto fiscal, nos termos dos n.ºs 1 e 3 do artigo 23.º do CIRC, referente à factura n.º A2018001, de 27/12/2018, emitida pela “D..., LIMITADA” ou “D... LIMITED”, relativamente a “Promotion and Marketing Consultancy for ... Resort”, valor registado na conta “6222100000- Publicidade e propaganda”, conforme registo Doc. 1, em anexo.
  2. Nos termos do Relatório da Inspecção Tributária e resposta da Requerente, que se dão por integralmente reproduzidos, não aceitação deste gasto baseou-se na residência do prestador do serviço, Região Administrativa Especial de Macau, no facto de se tratar de uma factura anual, datada do final do ano, desta ter o n.º 1, repetindo-se o padrão do ano anterior, (levantou-se a questão desta entidade só emitir uma factura por ano, sendo a A... a sua única cliente), e principalmente no facto da A...  não ter comprovado a efetiva realização dos serviços por parte da D..., não ter justificado a realização daqueles serviços, não ter juntado o contracto de prestação de serviços, um relatório do serviço ou outro registo efetivo da realização do serviço por parte do emitente da aludida factura.
  3.  Face a estas dúvidas e nos termos do Relatório da Inspecção Tributária os SIT procederam à notificação da A... para esta provar que a operação foi realizada.
  4. No entanto, os elementos apresentados pela Requerente para comprovação desta operação foram somente a factura antes citada, o comprovativo da transferência, e um relatório da G... relativo a preços de transferência, idêntico ao já apresentado para o exercício de 2017.
  5. A requerente não juntou qualquer contracto, relatório ou registo efetivo do serviço prestado.
  6. Quanto a este relatório da G..., veja-se o que a este propósito foi referido em sede de inspeção tributária, cfr. RIT,  a páginas 50 :

O contribuinte anexa um relatório da G..., relativamente a preços de transferência, muito idêntico ao exibido para 2017. Porém, nesta análise económica para 2018, a percentagem sobre o preço de venda aplicada pela D... sofre um acréscimo, agora para 15,5%, quando as entidades comparadas, J... e L..., mantêm os 12 % e 16 %.”

  1. O Relatório refere que a G... volta a concluir pela adequação da remuneração acordada no contexto de partes relacionadas, e afirma ter demonstrando que a aquisição dos serviços de promoção e marketing pela A... à D... não impactaram negativamente a atividade da Empresa em 2018.
  2. A Requerida afirma não discordar do método utilizado, contudo, continua a afirmar que as empresas selecionadas não serão as mais independentes e representativas do mercado, pois, em 2017, tinham relações com o inspecionado, contudo, referentes a comissões sobre a venda de imóveis, quando as facturas emitidas pela D... se referem a promoção e consultoria em marketing sobre ... Resort.
  3. Relembra que em 2017, ano em que se encontraram facturas emitidas pela J... e pela L..., os valores em causa levantaram muitas dúvidas quanto à sua normalidade, idoneidade e desproporcionalidade face às facturas referentes às comissões emitidas pela N... .
  4. Considera que o referido estudo da G... se baseia em comissões, ainda que de montantes anormais, mas em comissões sobre as vendas de imóveis, quando os serviços prestados pela D..., conforme consta nas facturas exibidas e o S.P. regista na contabilidade, referem-se a “ Promotion and Marketing Consultancy for... Resort”, tradução livre: “ Promoção e Consultoria de Marketing para ... Resort ”, registados na contabilidade como publicidade e propaganda, conta 62221 “.
  5. Está em causa uma transferência efetuada pela Requerente para o pagamento da factura n.º A_.2018001, de 27/12/2018, emitida pela "D..., LIMITADA" ou "D... LIMITED", relativamente a "Promotion and Marketing Consultancy for ... Resort", no total de€ 192.975,00.
  6. A factura influenciou o lucro tributável apurado em 2018, porquanto, foi registada na conta 6222100000- Publicidade e propaganda aquele mesmo montante.
  7. Estamos perante a factura n. º 1 de 2018, emitida nos últimos dias do ano.
  8. A Requerida pugna pela não aceitação fiscal do custo com a supra referida factura ao abrigo do artigo 23º do Código do IRC, nos 1. E 3: “ 30º - Havendo dúvidas fundadas de que as operações foram efetivamente realizadas e não tendo o S.P. comprovado o contrário, nos termos dos n.ºs 1 e 3 do artigo 23.º do CIRC, propõe-se a não aceitação destes gastos, registadas na conta "6222100000- Publicidade e propaganda", no montante de € 192.975,00”.
  9. Cumpre decidir
  10. O Artigo 23.º do Código do IRC determina o seguinte:

Gastos e perdas

1 - Para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.

2 - Consideram-se abrangidos pelo número anterior, nomeadamente, os seguintes gastos e perdas:

a) Os relativos à produção ou aquisição de quaisquer bens ou serviços, tais como matérias utilizadas, mão-de-obra, energia e outros gastos gerais de produção, conservação e reparação;

b) Os relativos à distribuição e venda, abrangendo os de transportes, publicidade e colocação de mercadorias e produtos;

c) De natureza financeira, tais como juros de capitais alheios aplicados na exploração, descontos, ágios, transferências, diferenças de câmbio, gastos com operações de crédito, cobrança de dívidas e emissão de obrigações e outros títulos, prémios de reembolso e os resultantes da aplicação do método do juro efectivo aos instrumentos financeiros valorizados pelo custo amortizado;

d) De natureza administrativa, tais como remunerações, incluindo as atribuídas a título de participação nos lucros, ajudas de custo, material de consumo corrente, transportes e comunicações, rendas, contencioso, seguros, incluindo os de vida, doença ou saúde, e operações do ramo 'Vida', contribuições para fundos de poupança-reforma, contribuições para fundos de pensões e para quaisquer regimes complementares da segurança social, bem como gastos com benefícios de cessação de emprego e outros benefícios pós-emprego ou a longo prazo dos empregados;

e) Os relativos a análises, racionalização, investigação, consulta e projetos de desenvolvimento

f) De natureza fiscal e parafiscal;

g) Depreciações e amortizações;

h) Perdas por imparidade;

i) Provisões;

j) Perdas por reduções de justo valor em instrumentos financeiros;

k) Perdas por reduções de justo valor em ativos biológicos consumíveis que não sejam explorações silvícolas plurianuais; 

l) Menos-valias realizadas;

m) Indemnizações resultantes de eventos cujo risco não seja segurável.

3 — Os gastos dedutíveis nos termos dos números anteriores devem estar comprovados documentalmente, independentemente da natureza ou suporte dos documentos utilizados para esse efeito.

4 - No caso de gastos incorridos ou suportados pelo sujeito passivo com a aquisição de bens ou serviços, o documento comprovativo a que se refere o número anterior deve conter, pelo menos, os seguintes elementos:

a) Nome ou denominação social do fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e do adquirente ou destinatário;

b) Números de identificação fiscal do fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e do adquirente ou destinatário, sempre que se tratem de entidades com residência ou estabelecimento estável no território nacional;

c) Quantidade e denominação usual dos bens adquiridos ou dos serviços prestados;

d) Valor da contraprestação, designadamente o preço;

e) Data em que os bens foram adquiridos ou em que os serviços foram realizados.

  1. Relativamente à alegação da Requerida de que a entidade beneficiária está sedeada numa região de tributação especialmente vantajosa, por ser residente na Região Administrativa Especial de Macau, a mesma não está incluída na lista que consta da Portaria n.º 292/2011, de 8 de Novembro, pelo que não é aplicável aos pagamentos efectuados pela Requerente o regime da alínea r) do n.º 1 do artigo 23.º-A.
  2. Pelo que cabe ao Tribunal decidir pela determinação de quem tem o ónus da prova e, nos termos das regras aplicáveis nesta sede, se a Requerida cumpriu com essas regras e o mesmo relativamente à Requerente, no sentido de terem carreado para o processo os elementos comprovativos da tese que cada uma delas defende. Vejamos.
  3. Afastado que já está o processo de prova decorrente do artigo 23º A nº 1, alínea r) aplicar-se-ão as regras gerais de determinação do ónus de prova.
  4. Ora, a regra geral no direito tributário em matéria de ónus da prova encontra-se no art. 74.º da LGT, sendo que o seu n.º 1, dispõe que “O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.”
  5. Por outro lado, o art. 75.º, n.º 1, da LGT estabelece uma presunção de veracidade das declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal.

Artigo 75.º - Declarações e outros elementos dos contribuintes

 1 — Presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos.

  1. — A presunção referida no número anterior não se verifica quando:
  1. As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo;
  2. O contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua situação tributária, salvo quando, nos termos da presente lei, for legítima a recusa da prestação de informações;
  3. A matéria tributável do sujeito passivo se afastar significativamente para menos, sem razão justificada, dos indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica previstos na presente lei.
  4.  Os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos, sem razão justificativa, dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestações de fortuna evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89.º-A.
  1. Quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz (cf. n.º 1, do art. 350.º do C.C.). Não obstante, aquela presunção não se verifica nas situações previstas nas várias alíneas do n.º 2 daquele preceito legal, cabendo à AT demonstrar qualquer das situações elencadas naquele n.º 2, que obstam à verificação da presunção.
  2. Como se pode ler na Decisão Arbitral, proferida no processo n.º 735/2019-T, são três requisitos para que um gasto possa ser deduzido.
  3. O primeiro requisito encontra-se na primeira parte do n.º 1 do art.º 23.º e consiste em que o gasto tenha efetivamente ocorrido. Trata-se do requisito da “efetividade” do gasto, que a jurisprudência há muito estabeleceu (ac. STA de 22-01-2014, proc. nº 01632/13). Ter o gasto efetivamente ocorrido implica que tenha sido efetuado um pagamento, ou a obrigação de pagamento tenha sido satisfeita e extinta por outra forma que não o pagamento (compensação ou dação em pagamento, por exemplo), ou que tenha sido criada na esfera do sujeito passivo uma obrigação de pagamento.
  4. De uma forma genérica, não é possível aos sujeitos passivos deduzirem um gasto, ainda que bem documentado e ainda quando os documentos de suporte mostrem que tal gasto seria perfeitamente justificado pelo fim de realização do lucro, se não se demonstrar que o gasto é real, seja por existir um pagamento, seja por se ter extinguido por outra forma a dívida respetiva (vg. por compensação de créditos), seja ainda por ter sido gerada para o sujeito passivo uma obrigação de pagamento.
  5. O segundo requisito encontra-se na segunda parte do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, sendo este um requisito de natureza finalística, que consiste em que o gasto deve ter sido realizado “para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC”. A lei deixou de falar em indispensabilidade dos gastos, como fazia anteriormente, exigindo agora que o gasto tenha sido incorrido para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC. Determinante para a dedutibilidade do gasto na atualidade é que o gasto tenha como objetivo contribuir para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC. A este segundo requisito, a fim de facilitar a exposição, daremos a designação de “justificação do gasto”.
  6. O terceiro requisito diz respeito à documentação do gasto, subdividindo-se em dois aspetos. Em primeiro lugar, é necessário que o gasto se encontre documentado, ou seja que exista prova documental que permita verificar, pelo menos, a existência do gasto. Em segundo lugar, é necessário que o documento que prova a existência do gasto cumpra, ele próprio, vários requisitos quanto ao seu conteúdo, nomeadamente que contenha os elementos de informação elencados nas alíneas a) a c) do nº 4 do artigo 23º.
  7. Por sua vez, em relação ao funcionamento do ónus de prova, constitui jurisprudência pacífica que nesta sede tal ónus incide sobre o Sujeito Passivo, por estar em causa um facto constitutivo da dedução invocada (art. 74.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária). A este respeito, constitui pertinente orientação jurisprudencial que: “Se a contabilidade organizada goza da presunção de veracidade e, por isso, cabe à AT o ónus de ilidir essa presunção, demonstrando que os factos contabilizados não são verdadeiros, já no que respeita à qualificação das verbas contabilizadas como custos dedutíveis, cabe ao contribuinte o ónus da prova da sua indispensabilidade para a obtenção dos proveitos ou para a manutenção da força produtora, se a AT questionar essa indispensabilidade” (cfr. os acórdãos do TCA Norte de 11-02-2016, proc. n.º 00080/03 e do TCA Sul de 02-02-2010, proc. n.º 03669/09 e de 16-10-2012, proc. n.º 05014/11). Nestes termos, os gastos contabilizados fundadamente questionados pela AT, para serem fiscalmente dedutíveis, têm de ser objeto de comprovação objetiva quanto à sua indispensabilidade por parte do sujeito passivo que os contabilizou. Neste sentido, cfr., entre outras, as Decisões Arbitrais proferidas nos processos n.ºs 735/2019-T; 510/2020-T; 534/2020-T.  Embora hoje se tenha deixado de se falar em indispensabilidade, a verdade é que o ónus de prova da ligação do custo à atividade empresarial continua a caber ao Sujeito Passivo, atenta a fundamentação subjacente deste ónus.
  8. Finalmente, no que concerne à comprovação dos custos, constitui jurisprudência pacífica que, nesta sede, os meios de prova não têm de revestir necessariamente natureza documental. Como ficou consignado nas Decisões arbitrais proferidas nos processos 510/2020-Te 534/2021-T, “(…) para efeitos de dedutibilidade de um custo entendia a doutrina e a jurisprudência que aquele requisito se demonstra através de documentos que comprovem os custos realizados, sendo que esses documentos podem consistir em meros documentos, facturas, recibos ou até uma nota interna da empresa, conquanto se revelem credíveis e consistentes. Só não sendo considerados como custos fiscalmente relevantes os que não são suportados em documentos válidos. Assim sendo, quanto à prova documental, esta é por norma o meio de prova exigido em razão da sua adequação à prática comercial, não sendo, no entanto, de excluir outros meios de prova para comprovar os custos efetivamente realizados, e como complemento da mesma, como, por exemplo, a prova testemunhal ou a prova pericial.”
  9. Apliquemos então estes princípios à situação subjacente no presente acórdão.
  10. Está em causa apenas uma transferência efetuada pela requerente para o pagamento da fatura n.º A_.2018001, de 27/12/2018, emitida pela "D..., LIMITADA" ou "D... LIMITED", relativamente a "Promotion and Marketing Consultancy for ... Resort", no total de€ 192.975,00.
  11. Aquela fatura influenciou o lucro tributável apurado em 2018, porquanto, foi registada na conta 6222100000- Publicidade e propaganda aquele mesmo montante.
  12. Sendo que estamos perante a fatura n. º 1 de 2018, emitida a 27/12/2018. No final do ano.
  13. Ora serviços de consultoria em promoção e marketing (tradução livre) não são necessariamente comissões por intermediação na venda de imóveis.
  14. Comissões são, numa explicação normal, uma recompensa, na maioria das vezes financeira, oferecida pela intermediação de negócios ou cumprimento de metas ou objetivos definidos previamente com o intuito de incentivar os resultados comerciais.
  15. Serviços de promoção e marketing são, também em linguagem média, serviços que visam alcançar clientes em potencial, estabelecer uma comunicação eficiente com eles, garantir a contratação do serviço e boas impressões a respeito dele.
  16. Obviamente que também o marketing e a promoção visam divulgar os produtos/serviços e incrementar as vendas mas são geralmente remunerados, com base em orçamentos, taxas horárias, projectos globais e não usualmente com a concretização da própria venda.
  17. Acresce que também a Requerente, no decorrer da Inspecção Tributária, foi chamada a apresentar documentação adicional sobre a operação contratual que originou o gasto para a Requerente de € 192.975,00 (cento e noventa e dois, novecentos e setenta e cinco mil euros).
  18. Contudo a Requerente não junta qualquer meio de prova excepto a factura com a descrição já mencionada, o meio de pagamento à D... e uma escritura de Janeiro de 2018 quando a factura data de Dezembro de 2018 e o pagamento de Março de 2018.
  19. É a própria Requerente quem afirma (e se alonga a desenvolvê-lo, nos seus articulados) que à entidades não residente em questão cabia incorrer numa multiplicidade de despesas, avultadas e manifestamente superiores às despesas em que incorrem as empresas de mediação imobiliária nacionais.
  20. Torna-se assim torna-se algo difícil de compreender, e estranho, que, no meio de tantas, não se tenha conseguido juntar aos autos uma única de tais despesas.
  21. Não é plausível, segundo as regras da experiência comum, que - sendo as ditas despesas de tanta relevância e monta, sendo as relações de prestações de serviços invocadas de carácter estável a Requerente, - não conseguisse, a ser o caso, juntar o comprovativo de uma única dessas tão relevantes e diversas despesas.
  22. Sobretudo quando tal foi sendo solicitado à Requerente pela Autoridade Tributária, a quem competem poderes, precisamente, de verificação da situação para esclarecimento de dúvidas relativas às declarações ou documentos dos contribuintes.
  23. E sobretudo, ainda, tendo em consideração que tal aportar de elementos seria no seu próprio interesse, da Requerente.
  24. Aliás é notório no depoimento das testemunhas, como evidenciado pela Requerente ao longo de todo o processo - seja nos presentes autos, seja em sede de procedimento

administrativo - o entendimento no sentido de que não tinham que ser juntos outros elementos de prova. De que o que se juntou é o suficiente.

  1. Relembrando o nº 2 do artigo 75º da LGT:

— A presunção referida no número anterior não se verifica quando:

  1. As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo;
  2. O contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua situação tributária, salvo quando, nos termos da presente lei, for legítima a recusa da prestação de informações;
  3. ………………………..
  1. Face à inexactidão contabilística registada bem como à falta de vontade da Requerente de trazer para o processo elementos que pudessem esclarecer a sua situação tributária entende o Tribunal que não se pode aplicar neste caso o nº 1 do artigo 75º da LGT pelo que se aplicará a regra do artigo 74º da mesma LGT.
  2. Impedirá então sobre a Requerente o ónus de prova quer da relação entre esta despesa e a sua atividade, por um lado, e, por outro lado, fazer prova desse gasto.
  3. Neste ponto, para além da exiguidade de documentação justificativa do pagamento do montante de € € 192.975,00 (cento e noventa e dois, novecentos e setenta e cinco mil euros) – não junta qualquer contrato de prestação de serviços, troca de informação e comunicações com a D... referentes à venda ou ao processo anterior da venda, comunicação acerca dos clientes que iriam ser enviados pela D..., entre outros possíveis – a prova testemunhal não acrescentou também elementos que permitam fazer a correspondência entre o gasto em causa e a obtenção de ganhos pela Requerente.
  4. A testemunha B..., director financeiro, não conseguiu explicar o processo de verificação e validação da factura, nomeadamente como é que comprovou que a factura em causa – de Dezembro 2018 - respeitava à escritura de venda de um apartamento datada de Janeiro de 2018, uma vez que a factura não identifica o imóvel, nem o agente/intermediário nem o período a que respeitam os serviços.
  5. Também não conseguiu explicar porque é que a tendo a escritura sido celebrada em Janeiro, o pagamento foi efectuado em Março e a factura recebida em Dezembro.
  6. Tal dilação e falta de sentido lógico de um processo de aceitação, documentação e pagamento de um gasto também não foi explicado pela testemunha C... .
  7. Esta testemunha referiu que a Requerente faz sempre contratos promessa referentes à venda dos imóveis e que o pagamento em Março de 2018 teria sido efectuado por haver anteriormente um contrato promessa que assegurava à Requerente o valor da venda do imóvel.
  8. Citando parte do seu depoimento sobre este tema: ­      “Contrato-promessa com cliente fazemos sempre (…) até porque no contrato-promessa de compra e venda têm de assinar logo o contrato de exploração turística e damos toda a informação da unidade (…) e é assinado ou pelo cliente ou pelo representante legal em Portugal, o procurador dele” (cf. o segundo ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 22:40 ao minuto 23:15);
  9. ­    “[Quanto à não entrega do contrato-promessa à Autoridade Tributária] eu não acompanho o processo na parte legal, não sei se a informação foi prestada, o contracto se foi prestado ou só a escritura (…)”, concluindo que “a escritura é a consolidação do negócio (…) a gente faz contratos [promessa] com todos, fazemos escritura não se apresenta o contrato. O contrato normalmente cessa com a execução da escritura” (cf. o segundo ficheiro áudio da inquirição realizada em 12 de julho de 2023, disponibilizada pelo CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, do minuto 23:35 ao minuto 24:49).
  10. Contudo a Requerente nunca mostrou à AT qualquer contrato promessa e a testemunha não conseguiu confirmar que o mesmo tinha sido celebrado neste caso.no caso das entidades não listadas.
  11. Como se pode ler na Decisão Arbitral, proferida no processo n.º 534/2020-T «O lucro tributável para efeitos de IRC tem como suporte o resultado apurado na contabilidade (art. 17.º, n.º 1 do CIRC), o que implica que esta esteja organizada de modo a permitir o respectivo controlo, o que impõe, precisamente, que todos os lançamentos estejam apoiados em documentos justificativos e susceptíveis de apresentação sempre que necessário. Os registos contabilísticos, para que possam ser compreendidos e aceites, têm de estar devidamente sustentados em documentação que forneça os dados concretos necessários ao perfeito conhecimento da operação ou operações que os justificam na plenitude dos seus elementos constitutivos. Surge aqui o denominado princípio da documentação, que visa assegurar a verificabilidade externa dos registos contabilísticos e dos respectivos suportes.».
  12. Em suma, como vimos supra não estava a Requerente impedida de apresentar outra documentação mesmo interna ou até mesmo socorrer-se da prova testemunhal para suprir os elementos em falta, o que não aconteceu.
  13.  Neste contexto, temos de concluir que a Requerente não logra, assim, fazer prova que permita retirar dos dados probatórios a convicção quanto à conexão com a sua atividade, impossibilitando, desta forma, a formulação de um juízo positivo sobre a ligação desses gastos à geração do rendimento sujeito a imposto.
  14. Iremos a partir daqui acompanhar a análise e deduções extraídas do acórdão do CAAD no processo 41/2022-T, na parte aplicável, com cujas conclusões o Tribunal concorda.
  15. Após diligenciar sucessivamente com vista à obtenção de documentação e prova da efectividade das operações junto da Requerente, a Requerida considerou, analisando-os e exteriorizando essa análise, que os documentos existentes exibidos pela primeira com respeito às operações com estas entidades não atestam condignamente a dedutibilidade dos gastos.
  16. Concluiu, face à documentação existente, e em aplicação do disposto no art.º 23.º, n.ºs 1 e 3 do CIRC, levantarem-se sérias ou fundadas dúvidas quanto à efectiva realização das prestações de serviços e fundadas dúvidas de que os gastos em questão tenham efectivamente servido para obtenção dos réditos invocados.
  17. Assim também, haver indícios de que a contabilidade da Requerente poderia não revelar exactamente a sua realidade. E considerou neste sentido afastada a presunção constante do art.º 75.º, n.º 1 da LGT, nos termos do respectivo n.º 2, al.s a) e b).
  18. Mais entendeu, pelos motivos explanados e que exteriorizou - cfr. RIT - que a Requerente não veio demonstrar o contrário e que os valores em causa influenciaram indevidamente as declarações entregues à AT.
  19. E assim é. Senão vejamos.
  20. No exercício em questão, e tudo como resulta provado, a Requerente procedeu à transferência bancária aqui enquadrada (i.e., destinadas a entidades não listadas) a favor da D..., com sede em Macau, país que não consta da lista aprovada pela referida Portaria, na sua versão aplicável à data dos factos (tudo cfr. probatório supra).
  21. E pretende, neste caso também, o respectivo montante seja considerado como gastos fiscalmente dedutível (e, assim, sejam anuladas as correcções que o desconsiderou).
  22. Contrariamente ao enquadramento que a Requerente faz nos seus articulados, na situação – “no caso das comissões pagas às entidades não beneficárias de regime privilegiado” - não se trata de que “é à AT que cabe provar a não efectividade das operações e o carácter anormal/montante exagerado.” Não.
  23. É certo que não há, como a Requerente bem refere, inversão do ónus da prova - a inversão do ónus da prova consagrada no já percorrido art.º 23.º-A, n.º 1, al. r), aplicável ao caso dos gastos com pagamentos às entidades listadas - aa. (supra).
  24. Porém o que há, aquilo de que se trata, é de estes gastos terem que – para o fim de serem fiscalmente dedutíveis – passar o crivo deste artigo - o artigo 23.º.
  25. É que não será por força da presunção (esta outra) consagrada no n.º 1 do art.º 75.º da LGT - a presunção de veracidade e de boa-fé de que beneficiam as declarações e a contabilidade dos contribuintes - que os requisitos de que depende a dedutibilidade dos custos deixarão de se aplicar.
  26. Rege o princípio da verificação. Princípio que constitui consequência directa, como a respeito observava Saldanha Sanches, do princípio da justiça na distribuição dos encargos tributários. Como bem se compreende. Não só a presunção resulta afastada em circunstâncias determinadas, previstas expressamente pelo legislador desde logo no n.º 2 do mesmo dispositivo legal, como, ademais, a mesma há-de operar sem perder de vista a, sempre pretendida, verdade material.
  27. Ora de tudo o que se analisou, não há prova de que a venda em 2018 do imóvel que a Requerente identifica e alega se ficou a dever à intervenção da D... . Não há nos autos qualquer prova de uma intervenção desta entidade na venda do imóvel escriturada em Janeiro de 2018.
  28. Dependendo a dedutibilidade dos gastos de os mesmo terem sido incorridos pelo SP “para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC”,
  29. Mais devendo os mesmos “estar comprovados documentalmente”.
  30. Desde logo não eram os documentos cabalmente idóneos ao preenchimento do requisito de empresarialidade que se exige.
  31. Acresce que,
  32. Conforme se demonstrou anteriormente, da inexactidão na contabilidade da Requerente quanto ao registo da “comissão” que foi registada como prestação de serviços de promoção e marketing e da exiguidade dos esclarecimentos necessários para clarificar a situação tributária.
  33. Resultou ilidida a presunção de veracidade e boa-fé de que beneficiava a contabilidade da Requerente, pelo art.º 75.º, n.º 1. Por força do preenchimento das al.s a) e b) do n.º 2 do mesmo artigo.
  34. E, ao assim ser, recaía sobre a Requerente o ónus da prova de que incorrera nos gastos em questão para (a fim de) obter ou garantir os seus rendimentos sujeitos a IRC, cfr. art.º 23.º, n.º 1.
  35. Assim cumprindo o ónus da prova do direito à dedução dos respectivos gastos, de que se arroga. Sendo que, em harmonia com o disposto no art.º 74.º, n.º 1 da LGT – “O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque”. Cfr., também, art.º 350.º, n.º 1 do Código Civil (v. supra).
  36. Prova que, também aqui, a Requerente não logrou fazer. Recaía sobre a Requerente o ónus de provar os gastos terem sido por si incorridos para obter rendimentos sujeitos a IRC. Prova que permitiria a subsunção dos mesmos à previsão da norma (art.º 23.º). E prova que a Requerente não fez.
  37. Falta, assim, por não provado, o propósito económico entre gastos e rendimentos. Consequentemente, também os gastos incorridos pela Requerente com pagamentos às entidades não listadas não eram fiscalmente dedutíveis.
  38. Andou bem a Requerida quando, em sede de procedimento inspectivo, assim o considerou - que se verificavam indícios de que a contabilidade da Requerente poderia não revelar exactamente a sua realidade e deu por afastada a presunção de veracidade. Após análise e concatenação de documentos e contabilidade, levantamento de insuficiências e contradições, solicitando à Requerente, como devido, provas de os gastos terem servido para a obtenção dos réditos invocados e/ou da efectividade das alegadas prestações de serviços (que esta última, diga-se, a provar-se abria caminho à prova da primeira; ou, se se preferir: que sobre esta última recaindo fundada dúvida afastada fica a prova da primeira) e concluindo pela não idoneidade dos documentos à dedutibilidade fiscal, fundadas as dúvidas sobre efectividade e sobre o fim da obtenção dos réditos invocados.
  39. No sentido de para a Administração Tributária proceder à correcção do lucro tributável por desconsideração de custos suportados por faturas ser suficiente a prova dos factos suscetíveis de abalar a presunção de veracidade dessas operações, competindo ao contribuinte o ónus da prova do direito de dedução que se arroga, e se dúvidas houvesse, v., entre outros, com as devidas adaptações, o Acórdão do STA de 27.02.2019, no proc.º 01424/05, e também aí, em extracto de ensinamento de Vieira de Andrade, assim: “Na verdade, embora a regularidade formal da escrita constitua presunção da sua veracidade – estendida aos seus elementos de apoio (art.º 75.º da LGT) -, tal presunção cessa no caso da existência de indícios sérios de que as operações escrituradas se não realizaram. Daí que, como se disse, provando a AT a existência de indícios sérios e credíveis de que tais operações não são verdadeiras, cabe ao contribuinte o ónus da prova da veracidade das mesmas.”
  40. Não colhe a invocação da Requerente no sentido de que devia a Requerida ter accionado Acordos para troca de informações com a Região Administrativa Especial de Macau, e que, ao assim não proceder, violou o princípio do inquisitório. Com efeito, não se compreende como pretende a Requerente não ser ela própria quem estaria em melhor posição para facultar toda a informação sobre a situação que pretendeu provar nestes autos. Estando na posição em que estava não tendo conseguido obter, para facultar à Autoridade Tributária, nenhuma da informação que lhe era solicitada, como poder pretender-se que seria através dos invocados Acordos que terceiros iriam, melhor que a própria Requerente, alcançar fazer a prova do aqui em questão? E tendo em conta os deveres de colaboração que sobre si impendiam – art.º 59.º da LGT, art.º 9.º do RCPITA.
  41. À cautela vem ainda a Requerente convocar a aplicação do art.º 100.º, n.º 1 do CPPT.
  42. Defende que na dúvida sobre se as operações foram efectivamente realizadas deveria a Requerida AT abster-se de tributar. À AT, segundo afirma, cabe provar a inexistência das operações, aplica-se o princípio in dubio contra fiscum. E sendo em consequência de anular as correcções.
  43. Vimos já que assim não sucede. À AT basta-lhe, em desconsideração de custos, provar os factos susceptíveis de abalar a presunção de veracidade das operações. O que sucedeu.
  44. Mais se diga que o art.º 100.º do CPPT tem aplicação na conjugação com o equilíbrio existente, em cada caso, entre as partes, em matéria de deveres de cooperação. E numa situação como a dos autos sempre impendiam sobre a própria Requerente acrescidos deveres de cooperação – por, tendo em consideração o contexto da operação em questão, ser-lhe, a ela Requerente, mais próxima a informação concreta necessária do que à própria Requerida. Como facilmente se compreenderá. O art.º 100.º do CPPT não era aplicável, também aqui não assistindo razão à Requerente.
  45. Cabe à Administração Fiscal assentar os pressupostos que levaram à tributação, em juízos de probabilidade, necessariamente elevada, sem exigir uma certeza do facto tributário, em que a maior parte das vezes, não é possível. E ao contribuinte, que alegue e prove factos (através de prova concludente) que ponham em dúvida (fundada) os pressupostos em que assentou o juízo de probabilidade elevado feito pela Administração para prova da existência do facto tributário. A fundada dúvida prevista na norma do art.º 100.º do CPPT, fundamento de anulação do acto de liquidação, não pode assentar na ausência ou inércia probatória das partes, sobretudo do impugnante, ao qual lhe cabe provar os factos que ponham em dúvida a existência e a quantificação do facto tributário, sem embargo de o juiz, no âmbito do seu poder-dever inquisitório, diligenciar também comprová-los.[2]
  46. Por fim quanto à invocada contradição de entendimento da Requerida face a anteriores inspecções à Requerente.
  47. Invoca a Requerente que aos seus exercícios de 2013 e 2014 fez a Requerida inspecções sem que tenha desconsiderado gastos como agora com referência ao exercício 2017. E que por essa via, uma vez que havia também efectuado transferências transfronteiriças e a essas a AT não questionou, ao agora o fazer age em venire contra factum proprium. E semelhantemente quanto ao exercício de 2015 ao terem sido solicitadas pela AT informações às quais a Requerente respondeu.
  48. A Requerida explica que os procedimentos inspectivos em questão não analisaram esta matéria, mais expondo que nem faria sentido a Requerida deixar de poder corrigir irregularidades em inspecções posteriores por razões de antes não terem sido detectadas.
  49. Assiste razão à Requerida. Como bem se compreende, e sem necessidade de maiores aprofundamentos, não poderiam as funções que a mesma exerce ficar dependentes de procedimentos inspectivos ocorridos no passado, a não ser na estrita medida do imposto por lei. Tanto impõem desde logo os princípios por que se rege o procedimento de inspeção tributária – cfr. art.º 5.º e ss. do RCPITA, e sem prejuízo do disposto no art.º 18.º do mesmo Diploma.
  50. Não há, também por aqui, violação dos princípios da segurança jurídica e protecção da confiança, violação de direitos adquiridos ou frustração de expectativas legítimas, nem do princípio da legalidade. Não resulta violado o invocado art.º 2.º da CRP, nem o art.º 103.º também da CRP em que vem consagrado o princípio da legalidade – invocado pela Requerente.
  51. A todas as questões a que o Tribunal foi chamado a decidir responde negativamente.

 

A esta luz e face ao exposto, deve o pedido arbitral ser considerado improcedente na sua totalidade.

*

C. DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral Singular

  1. Indeferir totalmente o pedido de anulação da correcção à matéria colectável de IRC do exercício de 2018 melhor identificadas supra;
  2. Manter o acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) n.º 2022... e o acto de liquidação de juros compensatórios subjacente, referentes ao exercício de 2018, nos termos dos quais se apurou imposto a pagar no montante total de € 436.926,61 embora a Requerente apenas conteste o valor de € 43.962,31
  3. Absolver a Requerida do pedido de pronúncia arbitral.
  4. Condenar a Requerente nas custas do processo, no montante abaixo fixado.

 

D. VALOR DO PROCESSO

Fixa-se o valor do processo em € 43.962,31 (quarenta e três mil, novecentos e sessenta e dois euros e trinta e um cêntimos) nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

E. CUSTAS

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 2.142,00 (dois mil, cento e quarenta e dois euros), nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerente, uma vez que o pedido foi totalmente improcedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do citado Regulamento.

 

Notifique-se, incluindo o Ministério Público.

 

 

 

 

 

   Lisboa, 30 de Outubro de 2023

 

O Árbitro do Tribunal Singular

 

 

(Ana Teixeira de Sousa)

 

 



[1] 1.         Vide “Regime Jurídico da Arbitragem Tributária”, Almedina, 2016, pág. 262-263. 4 No mesmo sentido, vide Jorge Lopes de Sousa, in “Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária” (pág. 174). 5 Neste sentido, vide Acórdão do STA de 07-09-2011 (processo nº 0677/10). pedido de pronúncia arbitral transferir-se-ia para o primeiro dia útil seguinte às férias, ou seja, para o dia 01-09-2021 e não para 06-09-2021, que foi a data de entrega do referido pedido.

[2] Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul

Data de Publicação: 2011-10-11

 

Processo: 04238/10