SUMÁRIO:
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Nos termos da alínea e) do artigo 277.º do Código do Processo Civil (CPC), aplicável ex vi pela alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, a instância extingue-se inutilidade superveniente da lide.
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Embora ocorrida após o prazo mencionado no artigo 13.º, n.º 1, do RJAT, a verdade é que a revogação, ainda que parcial, dos atos tributários impugnados corresponde à satisfação principal da pretensão dos Requerentes, originando assim a inutilidade superveniente da lide.
DECISÃO ARBITRAL
O árbitro designado para formar o Tribunal Arbitral Singular constituído em 27 de setembro de 2022, Rui Miguel Zeferino Ferreira, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”), decide o seguinte:
I. Relatório
A... e B... adiante “Requerentes”, titulares dos números de identificação fiscal (NIF) ... e ..., com residência na Rua ..., número..., em ..., ...-... Guimarães, vieram requerer a constituição de Tribunal Arbitral e deduzir pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1 e 10.º, n.º 1, alínea a), ambos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, na redação vigente.
A Requerente no âmbito do identificado pedido de pronúncia arbitral pretendia, a declaração ilegalidade do ato de liquidação de IRS n.º 2021..., respeitante ao ano de 2020, no montante a pagar de € 56.651,37 (cinquenta e seis mil seiscentos e cinquenta um mil e trinta e sete cêntimos), e que havia sido objeto da reclamação graciosa n.º ...2021..., indeferida tacitamente.
Nesse âmbito, formula o pedido de pronuncia arbitral, para que seja declarado ilegal o ato de liquidação de IRS referenciado, com todas as demais consequências legais, designadamente o reembolso dos montantes pagos, com os devidos juros legais, incluindo os juros indemnizatórios.
Como fundamento da sua pretensão, a Requerente invoca, em síntese:
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Que, de acordo com o artigo 15.º, n.º 1, do Código do IRS (CIRS), relativamente a sujeitos passivos residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora de Portugal, mas a tributação em IRS dos rendimentos obtidos no estrangeiro origina, com frequência, situações de dupla tributação jurídica internacional, em virtude da tributação dos mesmos rendimentos também no Estado da fonte.
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Que, Portugal, na qualidade de Estado da residência, dispõe de um mecanismo de eliminação da dupla tributação jurídica internacional ao abrigo do artigo 81.º, do CIRS, aplicável em relação aos rendimentos obtidos no estrangeiro por sujeitos passivos residentes.
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Que, de acordo com o mencionado normativo, a eliminação da dupla tributação jurídica internacional opera mediante a concessão, aos titulares de rendimentos das diferentes categorias obtidos fora do território português, de um crédito relativo ao imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro por tais rendimentos.
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Que, entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha foi celebrada uma Convenção para evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento (CDT), que de acordo com o artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), possui primazia sobre a Lei nacional.
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Que, em face dos termos em que apresentaram a sua declaração de rendimentos, cumpriram todos os requisitos legais para efeitos da dedução à coleta como crédito de imposto por dupla tributação internacional, pelo que o valor da mencionada dedução à coleta teria de ser no eu entendimento de € 46.724,71 (quarenta e seis mil setecentos e vinte e quatro euros e setenta e um cêntimos), que corresponde ao valor do imposto pago suportado em Espanha, ao invés da correção operada pela Requerida no valor de € 23.382,35 (vinte e três mil trezentos e oitenta e dois euros e trinta e cinco cêntimos).
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Que, assim, a liquidação padece de erro sobre os pressupostos de facto e de direito por violação do disposto nos artigos 78.º, n.º 1, alínea j), 81.º, n.ºs 1 e 2, ambos do CIRS, no artigo 23.º n.º 2 da Convenção celebrada entre Portugal e Espanha e, por último, no artigo 8.º da CRP.
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Que, tendo a AT automaticamente corrigido a dedução à coleta por crédito de imposto por dupla tributação internacional declarada pelos Recorrentes, de acordo com o artigo 74.º, n.º 1 e 2 da LGT e 342.º do Código Civil, tinha que cumprir com o seu ónus de prova e prosseguir na realização de diligências necessárias, ao abrigo do princípio do inquisitório, tendo subjacente, designada e principalmente, para efeitos do vertido no artigo 23.º, n.º 2, alínea a) da Convenção a fim de evitar a dupla tributação.
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Que, a ter atuado desse modo, a liquidação de IRS é ilegal por violação do disposto nos artigos 26.º da CDT celebrada entre Portugal e Espanha e, por conseguinte, 8.º da CRP.
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Que, a título subsidiário, a atuação da Requerida, traduzida na limitação da dedução à coleta de IRS por crédito de imposto por dupla tributação internacional, se mostra contrária à CRP, na medida em que viola o princípio constitucional da legalidade, patente no artigo 103.º, n.º 2 da CRP, nos seus corolários da reserva de lei parlamentar e da tipicidade e princípio da segurança jurídica e proteção da confiança.
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Que, a título subsidiário, a ser aceite a limitação/correção da dedução à coleta por crédito de imposto por dupla tributação internacional operada pela Requerida equivale à criação de uma norma pela qual os sujeitos passivos residentes que recebam rendimentos de um Estado-Membro apenas consigam deduzir 50% do imposto pago no estrangeiro, pelo que entende estar a ser violada a liberdade de circulação de capitais, consagrada no artigo 63.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE).
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Que, ocorreu falta de fundamentação do ato e a falta de participação dos requerentes na sua formação, sustentando que nunca foram dados a conhecer prévia ou concomitantemente à emissão da Liquidação os respetivos fundamentos de facto e de Direito, bem como o ato tributário não contém qualquer enunciação dos factos ou atos que deram origem àquela, nem tão pouco quaisquer razões de Direito.
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Por último, solicitam que, caso não sejam verificados os vícios invocados, a oportunidade de optar por não englobar os rendimentos de capitais estrangeiros – lucros distribuídos, optando por colocar a cruz no “Não”, no Quadro 8B, do Anexo J, da Declaração de IRS – Modelo 3.
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Que, para além da anulação da liquidação oficiosa de IRS, do ano de 2020, devem ser pagos juros indemnizatórios aos Requerentes.
É demandada a AT, doravante também designada por “Requerida”.
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi efetuado em 15 de julho de 2022, e aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD em 19 de julho de 2022 e, de seguida, notificado à AT.
Nos termos do disposto do artigo 5.º, n.º 2, do artigo 6.º, n.º 1 e do artigo 11.º, n.º 1, alínea b) do RJAT, na redação vigente, o Exmo. Presidente do Conselho Deontológico designou o árbitro do Tribunal Arbitral singular, que comunicou a aceitação do encargo.
Em 7 de setembro de 2022, as Partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados das alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
O Tribunal Arbitral Singular foi constituído em 27 de setembro de 2022.
Na mesma data, 27 de setembro de 2022, a Requerida apresentou requerimento, informando os autos que, por despacho de 13.09.2022, da Subdiretora-Geral da DIRS, foi revogado parcialmente o ato tributário impugnado, nos termos e com os fundamentos constantes da informação n.º ...2022... .
A informação referenciada, consta entre o demais, que a Requerida concluiu:
lV - Conclusão.
Após apreciação do pedido de pronúncia arbitral, afigura-se-nos que deverá ser dado provimento parcial ao solicitado.
V – Proposta de decisão. Por tudo o exposto, propõe-se que seja corrigida a liquidação de IRS n.º 2021..., de 2021-07-05, referente ao IRS do ano fiscal de 2020.
Em 10 de outubro de 2022, os Requerentes foram convidados a pronunciarem-se sobre o interesse da continuidade da instância, atenta a revogação do ato tributário, aos quais os mesmos responderam, em 12 de outubro de 2022, no sentido de não pretenderem a extinção da instância, e pugnando pela continuação do processo.
Em 2 de novembro de 2022, dando seguimento ao prévio despacho de 28 de setembro de 2022, bem como à posição assumida pelos Requerentes, a Requerida apresentou a sua resposta, em que vem defender-se por exceção, de inutilidade superveniente da lide, e concluindo que o presente pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente por não provado e, consequentemente, a Requerida absolvida de todos os pedidos.
A Requerida alega, em resumo:
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Que, informou o Tribunal que, por despacho de 13/09/2022 da Subdiretora-Geral da DIRS, foi revogado parcialmente o ato tributário impugnado, nos termos e com os fundamentos constantes da Informação n.º ...2022... da Direção de Serviços do IRS.
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Que, foi corrigida a liquidação de IRS n.º 2021..., de 2021-07-05, referente ao IRS do ano fiscal de 2020.
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Que, ocorreu a inutilidade superveniente da lide, visto que a mesma ocorre quando, em virtude de novos factos ocorridos durante a pendência do processo, a decisão a proferir deixa de ter efeito útil, mormente quando, ocorra a satisfação da pretensão veiculada no pedido for obtida por via extraprocessual.
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Que, se o Requerente obteve através do despacho de revogação do ato impugnado a satisfação do pedido de pronúncia arbitral, já não há razão para que o processo prossiga por a lide se ter tornado inútil, aplicando-se, no seu entendimento, o disposto na alínea e) do artigo 277º do CPC, aplicável ex vi artigo 29º, nº 1, alínea e) do RJAT.
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Que não merece tutela o princípio da estabilidade da instância subjacente às limitações legais à atuação administrativa no decurso de pendência jurisdicional, uma vez que a Parte vem, simplesmente, reconhecer que à outra assiste razão, com fundamento material na lei, e, nessa medida, permitir a resolução antecipada do litígio e consequente extinção da instância, com economia processual e de meios.
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Que esta interpretação já foi acolhida pelo Supremo Tribunal Administrativo, a que acresce que o artigo 168.º, n.º 3, do CPA, determina que a anulação de atos que tenham sido objeto de impugnação jurisdicional, como é o caso, pode ter lugar até ao encerramento da discussão.
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Que mesmo tendo as liquidações de IRS impugnadas sido apenas parcialmente revogadas, verifica-se uma integral satisfação da pretensão dos Requerentes conducente à inutilidade superveniente da lide.
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Que se encontra verificada a inutilidade superveniente da lide no que concerne aos pedidos de anulação dos atos tributários objeto do presente processo, o que determina a extinção da instância, dado que, encontrando-se sancionada por despacho da Subdiretora Geral do Rendimento a informação da DSIRS que pugna pela revogação parcial dos atos impugnados.
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Que havendo lugar à extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, concomitantemente à data da constituição do tribunal arbitral, ou seja não foi posteriormente, não pode o processo prosseguir para a apreciação do pedido de pagamento de juros indemnizatórios por pagamento indevido da prestação tributária, que, constituindo uma pretensão acessória e consequencial relativamente ao pedido principal, só poderá ser conhecida se o Tribunal apreciar o mérito da causa e declarado ilegal a liquidação impugnada.
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Que à data da constituição do tribunal arbitral a lide já era inútil porque os atos tributários já haviam sido anulados previamente.
Em 17 de novembro de 2022, os Requerentes responderam à matéria de exceção, quanto à inutilidade superveniente da lide, sustentando, entre o demais, que:
Desde logo cumpre referir que não se entende a posição da Requerida, uma vez que, efectivamente, o que aconteceu foi uma revogação parcial do acto impugnado e não, como parece fazer querer com a jurisprudência invocada, uma revogação total. 3 de 6 6
Razão pela qual os Requerentes se manifestaram pela não extinção da instância, por entenderem que a parte do acto tributário que permanece válida na sua esfera jurídica continuar a padecer de vícios vários que o Tribunal deve escrutinar.
Não obstante, antes da exposição jurídica apresentada pelos Requerentes na petição inicial, mais concretamente nos artigos 65.º e 66.º, aqueles deram a conhecer ao Tribunal os vícios em função destes, uma vez verificados, impedirem definitivamente a renovação do acto em crise, de acordo com o artigo 101.º do CPPT, aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c) do RJAT.
Ou seja, deram a conhecer ao Tribunal prioritariamente dos vícios cuja procedência, como se espera, determine mais estável ou eficaz a tutela dos interesses dos Requerentes.
(...)
Logo, caso os vícios invocados forem verificados e confirmados pelo Tribunal, os Requerentes terão direito a uma devolução do IRS pago no valor de € 23.494,44, que se refere à dedução à colecta não considerada ilegalmente pela Requerida.
Ao passo que, caso os vícios invocados não sejam verificados, em último lugar, com o exercício pela opção de “não” englobamento, os Requerentes terão direito a uma devolução do IRS pago no valor aproximado de € 12.411,82.
Pelo que não restam dúvidas que o Tribunal terá de seguir a tramitação normal do processo nos termos do RJAT, não determinando a extinção da instância conforme pronúncia dos Requerentes de 12.10.2022, já que a procedência dos vícios prioritariamente invocados determinam mais estável e eficaz a tutela dos interesses dos Requerentes.
Em 20 de março de 2023, foi dispensada a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, bem como as respetivas alegações. Em 26 de março de 2023, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 21.º do RJAT, fez-se uso da possibilidade aí prevista, e determinou-se a prorrogação do prazo acima identificado por um período de 2 (dois) meses.
Em 17 de abril de 2023, os Requerentes procederam à junção aos autos da taxa de arbitragem subsequente.
II. Do Saneamento do processo
O Tribunal Arbitral Singular é materialmente competente, e encontra-se regularmente constituído nos termos dos artigos 2º, nº 1, alínea a), 5º e 6º do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devida e legalmente representadas (artigos 3º, 6º e 15º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ex vi artigo 29º, nº 1, alínea e) do RJAT.
O processo não enferma de nulidades.
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Da fundamentação
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Matéria de facto
A.1. Factos Provados
Com relevo para a decisão do processo arbitral, importa atender à seguinte factualidade, que se julga provada:
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Os Requerentes são residentes na Rua do..., número ..., em ..., ...-... Guimarães;
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Os Requerentes foram notificados da liquidação de IRS n.º 2021..., respeitante ao ano de 2020, no montante de € 56.651,37 (cinquenta e seis mil seiscentos e cinquenta um mil e trinta e sete cêntimos), cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 31 de agosto de 2021;
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Os Requerentes, em 20 de dezembro de 2021, apresentaram reclamação graciosa sobre a liquidação de IRS n.º 2021..., respeitante ao ano de 2020;
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No dia 15 de julho de 2022 os Requerentes apresentaram um pedido de constituição de Tribunal Arbitral Singular, que deu origem aos presentes autos;
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Por despacho de 13 de setembro de 2022, proferido pela Subdiretora-Geral da área de Gestão Tributária – Impostos sobre o rendimento, em concordância com a informação n.º ...2022..., 12 de agosto de 2022, foi parcialmente revogado o ato de liquidação impugnado nos presentes autos, determinando-se a correção da liquidação de IRS;
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Solicitado a pronunciarem-se, por despacho de 10 de outubro de 2022, sobre o interesse em prosseguir, nos termos e para os efeitos do artigo 13.º, n.º 2, do RJAT, os Requerentes, em 12 de outubro de 2022, vieram declarar o seu interesse no prosseguimento do procedimento/processo arbitral.
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O Tribunal Arbitral Singular ficou constituído em 27 de setembro de 2022.
A.2. Factos não Provados
Com relevo para a decisão, não existem outros factos alegados que devam considerar-se não provados.
A.3. Fundamentação da matéria de facto dada como provada e não provada
Relativamente à matéria de facto, o tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe sim o dever de selecionar os factos que importa, para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. artº 123º, nº 2 do CPPT e artigo 607º, nº 3, aplicáveis ex vi artigo 29º, nº 1, alíneas a) e e) do RJAT.
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. artigo 596º do CPC, aplicável ex vi artigo 29º, nº 1, alínea e) do RJAT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes à luz do artigo 110º, nº 7 do CPPT, a prova documental, consideram-se provados, com relevo para a decisão, os factos supra elencados.
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Do direito
B.1 Questões a decidir
Cumpre solucionar a existência ou não de inutilidade (impossibilidade) superveniente da lide e/ou a impossibilidade da lide.
B.2 Da Fundamentação da decisão
Questão Prévia:
Na questão a decidir existe alguma confusão entre duas figuras, ambas mencionadas no artigo 277.º, al. e), do Código de Processo Civil: a impossibilidade da lide; e a inutilidade superveniente da lide.
A impossibilidade da lide ocorre em caso de morte ou extinção de uma das partes, por desaparecimento ou perecimento do objeto do processo ou por extinção de um dos interesses em conflito. Se o objeto da lide deixou de existir, a instância deve ser extinta.
A inutilidade superveniente da lide tem lugar quando, em virtude de novos factos ocorridos na pendência do processo, a decisão a proferir já não tem efeito útil, ou porque não é possível a satisfação à pretensão que o demandante quer fazer valer no processo, ou porque o fim visado com a ação foi atingido por outro meio.
Na realidade, os Requerentes no seu requerimento de 12 de outubro de 2022, ao declararem o seu interesse no prosseguimento do procedimento/processo arbitral para efeito de pronúncia quanto ao mérito da integralidade do pedido de 15 de julho de 2022, constitui uma verdadeira e própria impossibilidade (ou inutilidade originária) da lide.
Com efeito, repare-se que a revogação do ato tributário ocorreu por despacho de 13 de setembro de 2022, pelo que mesmo que se tratando de uma revogação parcial à data da constituição do tribunal arbitral, tal ato tributário era já inexistente no ordenamento jurídico.
Isto é, o objeto do processo teria desaparecido já no momento da constituição do Tribunal Arbitral a 27 de setembro de 2022. Assim, a lide não poderia prosseguir porque o ato tributário sindicado já tinha cessado os seus efeitos, nos termos do artigo 165º do Código de Procedimento Administrativo.
Portanto, a lide era impossível, por inexistência do seu objeto, em sua substituição surgirá uma nova liquidação, a qual essa sim, poderá ser objeto de nova reação por parte dos Requerentes
Pelo que a situação é totalmente diversa, se os Requerentes de em vez de terem adotado esse comportamento, tivessem no seu requerimento de 12 de outubro de 2022, declarado o seu interesse no prosseguimento do procedimento/processo arbitral para efeito único de se apreciar a questão do direito a juros indemnizatórios, questão suscitada no pedido de pronúncia, e sobre a qual o despacho revogatório não atendeu à vontade dos Requerentes.
E aí, salvo se subscrevêssemos o entendimento minoritário na doutrina e na jurisprudência, que recusa aos Tribunais Arbitrais a possibilidade de apreciação do direito a juros indemnizatórios, impõe-se reconhecer que, até ao pagamento efetivo desses juros indemnizatórios, era legítima a questão do direito ou não a juros indemnizatórios.
Por outro lado, é de acompanhar o entendimento de Jorge Lopes de Sousa, que sustenta que “se for praticado um ato revogatório sem nova regulação da situação jurídica, mas subsistirem efeitos produzidos pelo ato revogado, afigura-se que o processo poderá prosseguir em relação a esses efeitos, se foi pedida a sua eliminação, como permite o artigo 65.º, n.º 1, do CPTA, subsidiariamente aplicável, ao abrigo do artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT. (…)
Porém, não é isso que está em causa nos presentes autos.
Numa situação deste tipo, estar-se-ia perante uma eliminação apenas parcial do objeto do processo, que não deveria ser obstáculo ao seu prosseguimento para apreciação dos pedidos formulados que não foram satisfeitos pelo ato revogatório.
Da impossibilidade superveniente:
Na sequência do pedido de pronúncia formulado pelos Requerentes, o Tribunal Arbitral foi constituído em 27 de setembro de 2022, e ainda antes dessa constituição, por despacho de 13 de setembro de 2022, que foi junto aos presentes autos na data da constituição deste Tribunal Arbitral, a Subdiretora-Geral da área de Gestão Tributária – Impostos sobre o rendimento, revogou parcialmente o ato tributário impugnado.
O despacho de revogação, datado de 13 de setembro de 2022, remete para os termos e fundamentos constantes da informação elaborada pela Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, pela qual entende ser de revogar o ato tributário de liquidação adicional de IRS, ao referir que “(...) afigura-se-nos que deverá ser dado provimento parcial ao solicitado. (...) propõe-se que seja corrigida a liquidação de IRS n.º 2021..., de 2021-07-05, referente ao IRS do ano fiscal de 2020”, mas excluindo o direito dos Requerentes a juros indemnizatórios, sob o entendimento de “(...) não existe erro imputável aos serviços nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT (...)”.
De modo preliminar, cumpre referir que o novo Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, passou a distinguir entre a revogação e a anulação administrativa, fazendo corresponder a cada uma destas figuras as duas anteriores modalidades de revogação ab-rogatória ou extintiva e revogação anulatória. Segundo a definição constante do artigo 165.º, a revogação é “o ato administrativo que determina a cessação dos efeitos de outro ato, por razões de mérito, conveniência ou oportunidade”, ao passo que a anulação administrativa é “o ato administrativo que determina a destruição dos efeitos de outro ato, com fundamento em invalidade”. A revogação produz, em regra, apenas efeitos para o futuro (artigo 171.º, n.º 1), enquanto, que a anulação administrativa, tendo por objeto a eliminação do mundo jurídico de atos anuláveis, tem, em regra, efeitos retroativos (artigo 171.º, n.º 3).
No caso vertente, a Autoridade Tributária entendeu ser de alterar o sentido decisório, pelo que praticou, segundo a nova terminologia, um ato de anulação administrativa, isto é, um ato que tem como fundamento considerações de legalidade administrativa e não de mera discricionariedade. Assim sendo, o referido despacho embora adote a fórmula verbal anteriormente aplicável, corresponde a um verdadeiro ato anulatório.
Nos termos do artigo 13.º, n.º 1, do RJAT, dispõe-se que:
“Nos pedidos de pronúncia arbitral que tenham por objeto a apreciação da legalidade dos atos tributários previstos no artigo 2.º, o dirigente máximo do serviço da administração tributária pode, no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, proceder à revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja ilegalidade foi suscitada, praticando, quando necessário, ato tributário substitutivo, devendo notificar o presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) da sua decisão, iniciando-se então a contagem do prazo referido na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º”
O prazo previsto a alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º a que essa disposição se refere é o que respeita à comunicação às partes da constituição do tribunal arbitral, o que permite concluir que esse é um prazo procedimental, inserido no procedimento de constituição do Tribunal Arbitral, e que decorre ainda antes de ter início o processo arbitral (cfr. artigo 15.º).
Tal não significa, no entanto, que à administração tributária esteja vedado a anulação administrativa do ato impugnado já na pendência do processo arbitral, pelo que haverá de se considerar válido o ato designado pela Requerida como de “revogação”, e desse modo decide este Tribunal Arbitral. Esta decisão é ainda mais reforçada pelo facto dessa decisão ter sido adotada antes da constituição do Tribunal Arbitral (ainda que comunicada no próprio dia da referida constituição).
A Autoridade Tributária, enquanto entidade administrativa, encontra-se subordinada às disposições do Código de Procedimento Administrativo (artigo 2.º, n.º 1), e, por outro lado, como resulta do disposto no artigo 29.º do RJAT, são de aplicação subsidiária ao processo arbitral tributário, de acordo com a natureza do caso omisso, entre outras, as normas sobre o processo nos tribunais administrativos.
O artigo 168.º do CPA, que define os condicionalismos aplicáveis à anulação administrativa, no seu n.º 3, estabelece que “quando o ato tenha sido objecto de impugnação jurisdicional, a anulação administrativa só pode ter lugar até ao encerramento da discussão”.
Deve entender-se como encerramento da discussão, em correspondência com o estabelecido no artigo 604.º, n.º 3, alínea e), do CPC, o momento em que as partes produzam alegações orais ou o termo do prazo para alegações escritas ou o termo da fase dos articulados quando as partes tenham dispensado as alegações finais e o estado do processo permita sem necessidade de mais indagações a apreciação do pedido.
Haverá de concluir-se, por conseguinte, que o CPA alargou os poderes de disposição da Administração na pendência do processo, permitindo, na linha do que já vinha sugerido pela doutrina, que a anulação administrativa, quando o ato tenha sido objeto de impugnação jurisdicional possa ter lugar até ao encerramento da discussão, e não apenas até à resposta, como estava previsto no artigo 141.º, n.º 1, do CPA de 1991.
Seja como for, nada obsta a que a Administração, ao abrigo do citado artigo 168.º, n.º 3, possa anular o ato tributário impugnado na pendência do processo, desde que dentro do limite temporal definido nessa disposição, e essa faculdade nada tem a ver com o regime específico a que se refere o artigo 13.º, n.º 1, do RJAT, que confere a possibilidade de a Administração anular o ato impugnado ainda no âmbito do procedimento de constituição do tribunal arbitral.
E mesmo que se entendesse de modo diferente, o facto de a “revogação” ter ocorrido antes da constituição do Tribunal Arbitral, teria de conduzir a solução que se admita esse comportamento como relevante para efeitos da impossibilidade da lide.
O que o regime especial desse artigo proíbe, para além do prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, é a prática de um novo ato tributário relativamente ao mesmo sujeito passivo, imposto e período de tributação, a não ser com fundamento em factos novos (n.º 3).
Dito isto, não pode deixar de reconhecer-se que a anulação administrativa é tempestiva, visto que a Autoridade Tributária praticou o ato anulatório ainda dentro prazo para a apresentação da resposta (apresentou-o, inclusivamente, antes da própria constituição do tribunal arbitral), havendo de atribuir-se à anulação, nesse condicionalismo, os correspondentes efeitos de direito.
No que concerne às consequências processuais da anulação administrativa interessa a norma do artigo 64.º do CPTA, subsidiariamente aplicável, que, entre outros dispositivos, se refere às situações em que, na pendência do processo impugnatório, o ato impugnado é objeto de anulação administrativa acompanhada ou seguida de nova definição da situação jurídica, caso em que se admite que o processo impugnatório prossiga contra o novo ato com fundamento na reincidência nas mesmas ilegalidades. Prevê-se aí a hipótese típica de ampliação do objeto do processo quando, na pendência de um processo impugnatório, a Administração anule o ato impugnado praticando um novo ato em sua substituição contra o qual o impugnante poderá ter ainda interesse em reagir. E, por outro lado, importa reter que, por efeito do disposto no artigo 13.º, n.º 3, do RJAT, a substituição do ato na pendência do processo apenas poderia ocorrer desde que não implicasse a invocação de factos novos.
É patente que não é essa, no entanto, a situação do caso.
A Administração anulou os atos sem instituir uma qualquer nova regulação da situação jurídica. Ora, a anulação do ato impugnado pela própria Administração, na pendência do processo, satisfazendo a pretensão impugnatória do autor, conduz à impossibilidade superveniente da lide, que constitui causa de extinção da instância (artigo 277.º, alínea e), do CPC).
Segundo Lebre de Freitas, “a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da proveniência pretendida. Num e noutro caso, a proveniência deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outros meios” Cfr. Código de Processo Civil Anotado, vol. III, p. 633.
Assim, analisados os autos, obviamente que visando o pedido de pronúncia em primeira linha a anulação por ilegalidade, da liquidação de IRS n.º 2021..., relativa ao período de tributação de 2020, o sobredito despacho de revogação parcial dessa, esvazia totalmente de objeto este processo arbitral. Isto é, destruídos o ato tributário sindicado por “revogação” (anulação) administrativa na pendência da causa, a continuação da instância é não só inútil como mesmo impossível por falta de objeto da lide.
Independentemente do entendimento dos Requerentes, nomeadamente, da posição assumida nos presentes autos, sempre haveria de considerar que a anulação administrativa é de iniciativa oficiosa da Administração e, constituindo um ato unilateral, os seus efeitos não dependem da manifestação de vontade do interessado particular.
A isto acresce que, o próprio pedido de juros indemnizatórios, apenas pode ser entendido como uma pretensão condenatória de natureza acessória ou consequencial relativamente ao pedido principal.
O certo é que a anulação administrativa determina a destruição dos efeitos do ato administrativo anulado (artigo 165.º, n.º 2, do CPA), com a sua consequente eliminação da ordem jurídica, pelo que se verifica uma situação de impossibilidade superveniente da lide por falta de objeto processual.
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Decisão
Termos em que este Tribunal Arbitral Singular decide julgar extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide.
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Valor do processo
Os Requerentes indicaram como valor da causa o montante de € 56.651,37 (cinquenta e seis mil seiscentos e cinquenta um mil e trinta e sete cêntimos), correspondente ao valor da liquidação de IRS a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da causa.
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Custas
Entende este Tribunal Arbitral Singular que o valor a considerar para efeitos de determinação das custas no presente Pedido de Pronúncia Arbitral é o valor que motivou a constituição deste Tribunal Arbitral Singular, i.e., o valor de € 56.651,37 (cinquenta e seis mil seiscentos e cinquenta um mil e trinta e sete cêntimos).
Tendo em consideração que a revogação do ato tributário ocorreu já na pendência da instância, atento que, a instância inicia-se pela propositura da ação e esta considera-se proposta, intentada ou pendente logo que seja recebida na secretaria do CAAD, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral (artigo 259.º, n.º 1, do CPC, adaptado ao processo arbitral), as custas deverão ser imputadas à requerida, como sendo a Parte que deu origem ao presente processo.
Nos casos de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do Requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável à Requerida, caso em que é esta a responsável pela totalidade das custas.
Ora, no caso essa impossibilidade deve ser imputada à Requerida, sendo que no caso em apreço a revogação do ato apenas ocorreu já na pendência da instância, pelo que foi a mesma que deu origem aos presentes autos, a que acresce o facto, que embora comunicado no mesmo dia da constituição do Tribunal Arbitral, sequencialmente, o ato processual foi comunicado após a referida constituição.
Termos em que no n.º 2 do artigo 12.º e do n.º 4 do artigo 22.º, ambos do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.142,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida, a Autoridade Tributária de Aduaneira (artigo 536.º, n.º 3, CPC).
Notifique-se.
Porto, 24 de maio de 2023
O árbitro,
Rui Miguel Zeferino Ferreira