SUMÁRIO:
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Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.° do Código do IRS constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos comerciais, industriais ou agrícolas, de capitais ou prediais, resultassem da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis. Pelo que, à primeira vista, os ganhos resultantes da venda daquele prédio estariam sujeitos a tributação em sede de IRS, a título de Mais-Valias.
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Não obstante, por força do disposto no n.° 1 do artigo 5.° do Dec. Lei n.º 442-A/88, que estabeleceu um regime transitório para os rendimentos da categoria G, os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias criado pelo Código do Imposto de Mais-Valias aprovado pelo Dec. Lei n° 46373, de 9 de Junho de 1965, só ficavam sujeitos a IRS se a aquisição dos bens ou direitos a que respeitassem tivesse sido efetuada depois da entrada em vigor do CIRS, ou seja, depois de 1 de Janeiro de 1989.
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Em relação aos encargos de mais-valia previstos no n.º 1 do artigo 17.º da Lei n.º 2030, de 22 de Junho de 1948 refere-se a obras de urbanização ou abertura de grandes vias de comunicação que aumentem consideravelmente o valor pela sua possibilidade de aplicação a terrenos para construção urbana.
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As despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e a alienação de um imóvel abrangidas pelo artigo 51.º, n.º 1 al. a) do CIRS são aquelas que se mostrem inseparáveis com a alienação do imóvel que tem de ser intrínseca e não, meramente, extrínseca. O que significa que para ser considerada relevante, a despesa terá de o ser em relação à alienação e, portanto, indissociável desta. Não bastando que a despesa seja conexa à obtenção do rendimento.
DECISÃO ARBITRAL
A árbitra Marisa Almeida Araújo, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o presente Tribunal Arbitral, constituído em 11 de maio de 2022, decide:
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Relatório
A..., NIF ..., residente na Rua ..., ..., ..., Vila Nova de Gaia, (adiante apenas “Requerente”) veio, ao abrigo do artigo 10.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (adiante apenas designado por RJAT) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 março, requerer a constituição de tribunal arbitral.
É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (de ora em diante “Requerida” ou “AT”).
A Requerente peticiona ao Tribunal que declare ilegal, com as devidas consequências legais, a liquidação adicional de IRS n.º 2019-...-... -... referente ao ano de 2019 e respetivos juros compensatórios, no valor total de € 23.523,79.
Para o efeito, a Requente alega sumariamente que,
Apresentou a declaração Modelo 3 de IRS respeitante ao ano de 2019 em 30/06/2020, incluindo o anexo G e G1 onde fez constar:
- Anexo G: alienação onerosa no mês de julho da fração F do prédio urbano inscrito na matriz da freguesia com o código ... sob o artigo ..., sendo o valor de realização de 225.000,00 €, o valor de aquisição em setembro de 2014 de 131.150,38 € e as despesas e encargos levadas ao respetivo campo de 107.386,01 €;
- Anexo G1: a alienação do prédio urbano inscrito na matriz da freguesia com o código ... sob o artigo ..., adquirido em 8 de setembro de 1983, sendo o valor de realização de 75.000,00 € e o de aquisição de 2.493,99 €;
Segundo a Requerente, com base nessa declaração foi efetuada pela AT uma primeira liquidação de imposto, de que resultou o total a pagar de 1.486,19 €. Posteriormente a AT suscitou a existência de divergências no que respeita aos elementos declarados, projetando-se correções no que respeita à declaração da alienação de imóveis, de que resultaria liquidação adicional de imposto. Em consequência a AT elaborou, com data de 6/01/2021, declaração oficiosa de IRS referente ao mesmo ano de 2019 (declaração n.º 2019- ...-... -...), de que resulta liquidação adicional com o apuramento total de imposto e juros compensatórios no total de 25.009,98 € (24.687,08 € de imposto e 322,90 € de juros compensatórios) e do montante a pagar de 23.523,79 € (25.009,98 € - 1.486,19 €).
Na declaração oficiosa e na liquidação adicional nela fundada foram tomados em consideração os valores e as datas quer de aquisição quer de realização que a Requerente tinha feito constar da declaração por si apresentada e considerados na liquidação inicial, mas com a desconsideração da totalidade das despesas e encargos declarados (no montante de 107.386,01 €). Da declaração oficiosa não consta o anexo G1 que a Requerente tinha apresentado, constando antes o anexo G relativo à alienação dos 2 identificados imóveis.
Notificada da liquidação referida a Requerente apresentou reclamação graciosa, que foi indeferida parcialmente, tendo contra tal decisão de indeferimento interposto recurso hierárquico.
Como fundamento a Requerente alegava, em primeiro lugar que não lhe foi dada oportunidade de exercer direito de audição nos termos do art. 60.º da LGT.
Por outro lado, sustentava a Requerente que alienou em 2019 um terreno que tinha sido adquirido em 1983, objeto de declaração pela Requerente no anexo G1, estando em causa mais-valias não sujeitas a IRS porquanto se trata de bem adquirido antes da entrada em vigor do Código do IRS, cujos ganhos não estavam sujeitos ao imposto de mais valias uma vez que estavam sujeitos a encargos de mais-valias. Sustentava igualmente que a liquidação reclamada está também influenciada pelos ganhos decorrentes da alienação de uma fração habitacional, que a reclamante tinha adquirido por doação efetuada pela sua filha em 2014. Alegava ademais que as despesas e encargos declarados pela Requerente respeitam a despesas de valorização do imóvel (2.148,19 €), despesas inerentes à aquisição correspondentes a emolumentos notariais (631,98 €) e a importância de 104.605,84 € respeitante à amortização do empréstimo relativo à aquisição pela doadora do imóvel, considerada pela Requerente como despesa inerente e necessária para a venda.
No que tange às alegadas despesas de amortização do empréstimo a fração doada à Reclamante pela filha tinha por esta sido adquirida com recurso ao crédito hipotecário. Que, a determinada altura a filha estava impossibilitada de continuar a suportar os encargos decorrentes do empréstimo hipotecário e, foi acordado entre mãe e filha que esta doaria àquela a fração desde que a donatária assumisse a dívida da doadora perante o Banco.
Essa condição da doação, segundo a Requerente, não ficou por lapso suficientemente expressa no texto da escritura de doação, o que levou a que a mesma fosse retificada.
Foi elaborado e notificado à ora Requerente projeto de decisão da reclamação apontando para o seu indeferimento parcial, com a aceitação unicamente de que sejam consideradas na liquidação encargos com a valorização dos bens e despesas inerentes à aquisição e alienação no total de 880,22 €, no mais propondo a improcedência da reclamação.
A Requerente exerceu o direito de audição sobre esse projeto de (in)deferimento parcial da reclamação, sustentando que não foi efetivamente conferida à reclamante a possibilidade de exercer adequada e fundamentadamente o direito de audição e a informação revela não ter a sua autora entendido parte das alegações da então reclamante no que respeita ao tratamento fiscal a dar quer à alienação do terreno quer à alienação da fração habitacional e, em todo o caso, segundo a Requerente, assenta em pressupostos errados quanto à alegada violação do art.º 60.º da LGT e quanto à interpretação e aplicação do art.º 5.º do decreto-lei n.° 442-A/88, de 30 de Novembro, em conjugação com o art.º 1.º, n.º 1.º, do revogado Código do Imposto de Mais-Valias, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46373, de 9 de Junho de 1965.
Em face do deferimento parcial da reclamação, foi pela AT elaborada nova declaração oficiosa (2019-...-... -...), com base na qual foi reformada a liquidação adicional, daí resultando o valor total de 24.809,17 € (24.489,03 € de imposto e 320,14 € de juros compensatórios), em vez dos indicados imposto a pagar de 23.322,98 € (24.809,17 € - 1.486,19 €), em vez dos indicados 25.009,98 €, sendo o total a pagar, após a dedução do valor da liquidação inicial, de 23.322,98 €. 44.
A Requerente não se conforma com a decisão da reclamação graciosa e interpôs recurso hierárquico.
Sustenta a Requerente que,
A liquidação inicialmente reclamada e cuja ilegalidade constitui o objeto da aqui requerida pronúncia arbitral, ao não considerar excluídas da sujeição a IRS as mais-valias relativas à alienação onerosa do terreno adquirido em 1983, é ilegal por violação do art.º 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, conjugado com o art.º 1.º, n.º 1.º, do revogado Código do Imposto de Mais-Valias, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46373, de 9 de Junho de 1965. 55. A mesma liquidação é também ilegal, segundo a Requerente, ao desconsiderar a totalidade das despesas e encargos declarados (no montante de 107.386,01 €), com especial ênfase para o montante de 104.605,84 € respeitante à amortização do empréstimo relativo à aquisição pela doadora do imóvel alienado, considerada pela Requerente como despesa inerente e necessária para a venda.
Para que a Requerente pudesse vender a identificada fração era absolutamente indispensável que efetuasse o pagamento integral da dívida hipotecária, para que sobre ela não incidissem quaisquer ónus ou encargos.
O pagamento efetuado ao Banco … constitui, pois, segundo a Requerente, despesa necessária e efetivamente praticada, inerente à alienação do imóvel, nos termos e para os efeitos da al. a) do n.º 1 do art.º 51.º do CIRS.
Acrescenta que na liquidação impugnada e nas decisões quer da reclamação graciosa quer do recurso hierárquico, ao ser desconsiderada tal despesa para o cálculo das mais-valias sujeitas a imposto, interpreta-se mal e viola-se o preceituado na referida disposição do Código do IRS. Concluindo a Requerente que tal desconsideração, ademais da direta violação do invocado preceito legal, viola o princípio da tributação do rendimento líquido bem como o princípio da capacidade contributiva.
Sustenta ainda a Requerente que, mesmo que assim não se entendesse, sempre a liquidação deve ser declarada ilegal com um outro fundamento: o errado pressuposto de que a aquisição pela Requerente da fração alienada é uma pura aquisição a título gratuito.
Alega e afirma estar documentado que a doação de que a Requerente foi beneficiária tem associada a assunção pela donatária da responsabilidade pelo pagamento da dívida hipotecária contraída pela doadora, dívida essa que ao tempo da doação ascendia aos indicados 116.450,00 €. Daqui decorre, segundo a sua perspetiva, a natureza mista (em parte gratuita e em parte onerosa) do negócio plasmado na escritura de doação por via do qual a Requerente passou a ser proprietária da identificada fração.
Nesses termos, atenta a natureza mista de tal negócio, o valor de aquisição a considerar para a determinação das mais-valias há de ter em consideração não só o valor patrimonial tributário ao tempo da doação nos termos do art.º 45.º do CIRS (131.150,38 €) como também a contraprestação paga pela Requerente, quantificada ao tempo da doação nos também indicados 116.450,00 €, nos termos do art.º 46.º do CIRS.
Tendo em consideração o supra exposto, entende a Requerente que a liquidação em apreço nos presentes autos é ilegal.
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi apresentado a 28 de fevereiro de 2022 tendo sido aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD a 2 de março de 2022 e seguiu a sua normal tramitação.
Em conformidade com os artigos 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT, o Conselho Deontológico do CAAD designou a árbitra do Tribunal Arbitral Singular, aqui signatária, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
As partes, notificadas dessa designação em 21 de abril de 2022, não se opuseram, nos termos dos artigos 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) e 8.º do RJAT, 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
O Tribunal Arbitral Singular foi constituído em 11 de maio de 2022.
Em 13 de junho de 2022, a Requerida apresentou Resposta e o processo administrativo, na qual se defende por impugnação pugna pela improcedência do pedido.
A Requerida invoca, sumariamente, que,
A ora Requerente deduziu reclamação graciosa contra a liquidação de IRS nº 2021..., efetuada em 15-01-2021, na qual foi apurado o montante de imposto a pagar de € 24.687,08, a que acresciam € 322,90 de juros compensatórios, perfazendo o valor total a pagar de € 25.009,98. Que a referida liquidação foi efetuada em seu nome após elaboração, por parte dos serviços da AT, a título oficioso, em 06-01-2021, de uma declaração modelo 3 de IRS concernente ao ano de 2019, produzida na sequência da instauração de um procedimento de gestão de divergências relativo ao IRS respeitante ao ano de 2019.
A reclamação foi objeto de despacho de deferimento parcial, proferido pelo Chefe do SF de V. N. Gaia ... em 16-04-2021, razão pela qual foi elaborada em 16-04-2021 nova declaração oficiosa em nome da Requerente, igualmente respeitante ao ano de 2019. Essa declaração deu origem à liquidação de IRS nº 2021..., que apurou o valor de IRS a pagar de € 24.489,03, a que acresciam € 320,14 de juros compensatórios, num total de € 24.809,17.
Por não concordar com o teor da decisão tomada no âmbito do procedimento de reclamação graciosa a Requerente veio interpor recurso hierárquico, o qual foi indeferido por despacho exarado em 19-10-2021 pela Diretora de Finanças Adjunta para a Área da Justiça Tributária da Direção de Finanças do Porto.
Quanto à alegada violação do art. 60.º da LGT, sustenta a Requerida que,
Na notificação que foi efetuada à Requerente é comunicado à mesma que deveria apresentar elementos especificamente mencionados na mesma (escrituras de compra e venda e documentos relativos às despesas declaradas), sob pena de as despesas não serem consideradas.
Para estas, estava especificamente cominado que não seriam consideradas, segundo a Requerida, pelo que tendo o valor sido declarado pela Requerente, esta sabia o montante que estava em causa.
Quanto aos valores de compra e venda, foi expressamente referido à ora Requerente – segundo a Requerida – que estes seriam corrigidos se necessário.
A AT alega que a Requerente não enviou os elementos no âmbito do procedimento de divergências apesar da Requerida, segundo o que afirma, ter solicitado duas vezes (por e-mail’s de 28-10 e 18-11-2020) a apresentação das escrituras e os comprovativos das despesas declaradas e informando a Requerente de que: “Caso se verifique alguma incorreção, é alertada para efetuar a correção.”
Portanto, nunca esta seria efetuada de forma automática, donde não estar ainda em causa a dimensão quantitativa de qualquer correção a efetuar, posto ser, nesse preciso momento, impossível saber, sequer, se haveria lugar a qualquer correção. Pelo que, segundo a Requerida, não se verificou qualquer preterição do direito tutelado pelo disposto no art. 60º da LGT.
Quanto à não sujeição a IRS das mais valias do terreno cuja aquisição ocorreu em 1983, entende a Requerida que,
A quota-parte de 50% (e são 50% porquanto igual quota-parte já detinha atento o seu regime matrimonial de comunhão de adquiridos) que adquiriu do terreno de construção inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ..., concelho de Vila Nova de Gaia, sob o artigo ... por partilha efetuada em 09-10- 2007 esta questão nem se colocaria, atenta a data de ocorrência do facto translativo (2007, muito depois da entrada em vigor do Código do IRS) face à letra da parte final do nº 1 do art. 5º do DL nº 442-A/88, de 30/11), que aprovou aquele compêndio tributário.
Quanto à outra-quota parte de 50% (a adquirida em 1983) cumpre perscrutar, segundo a Requerida, se os ganhos obtidos com a alienação de um terreno para construção eram ou não já tributados pelo imposto de mais-valias, aprovado pelo art. 1º do DL nº 46373, de 09-06-1965 (ex vi art. 5.º do DL n.º 442-A/88, de 30/11).
Concluindo a AT, nos termos do art. 1.º, que a tributação em sede de mais-valias da transmissão onerosa de terrenos para construção já estava no compêndio que regulava esta matéria. Contendo, porém, a norma transcrita duas exceções, cumpriria apurar se o caso em apreço está abrangido por qualquer delas.
A AT entende que não. Por um lado, quanto à exceção da localização do terreno. O terreno em questão no presente processo situa-se no concelho de Vila Nova de Gaia, pelo que está fora da facti specie do art. 4º do DL nº 41616.
Por outro lado, na previsão do art. 17º da Lei nº 2030, de 22-06-1948, por o seu nº 1 prever a sujeição a encargo de mais-valia de prédios rústicos “…quando, por virtude de obras de urbanização ou abertura de grandes vias de comunicação, aumentem consideravelmente de valor pela possibilidade da sua aplicação como terrenos de construção urbana,…”. Mas entende a Requerida que a Requerente juntou à reclamação graciosa documento emitido pela Câmara de Vila Nova de Gaia em nome do anterior proprietário do terreno (Sr. B...), segundo o qual o mesmo havia pago a quantia de 479.940$00 (equivalente a € 2.393,93) por encargos de mais-valia relativo a loteamento de um terreno sito na Rua de ... em Canidelo. Mas, segundo o entendimento da Requerida, na previsão legal está prevista a possibilidade de sujeição a encargo de mais valia em função da execução de obras de urbanização ou abertura de grandes vias de comunicação. E não de simples operações de loteamento.
Desta forma, entende a Requerida que não assiste razão à Requerente.
Por outro lado, quanto à aplicação do n.º 5 do art. 10.º do CIRS, entende a Requerida que, não teve aplicação no caso em apreço, pelo que da sua pura e simples referência nenhuma consequência resultou para efeitos de análise da pretensão da Requerente em sede quer de procedimento de reclamação graciosa, quer de recurso hierárquico contra a decisão daquela deduzido.
Quanto à desconsideração de despesas e encargos referentes à fração alineada, entende a Requerida que, ao valor declarado pela Requerente na última coluna (despesas e encargos) do quadro 4 do anexo G que entregou conjuntamente com a declaração modelo 3, apresentada em 30-06- 2020, relativamente ao ano de 2019 os serviços da AT afastaram o montante de € 104.605,84, relativo ao pagamento de uma dívida hipotecária e também o de € 1.899,95, relativo a compra de eletrodomésticos (micro-ondas, máquina de lavar, forno, entre outras).
A posição da Requerida é que os encargos com a valorização dos imóveis são aqueles que, por natureza, trazem ao imóvel um valor adicional intrínseco (isto é, do próprio imóvel), pelo que, relativamente aos eletrodomésticos, tratam-se de coisas móveis e sendo-o, não têm qualquer ligação física com o imóvel, dele podendo ser retiradas a qualquer momento, pelo que nunca o encargo com o fornecimento destes eletrodomésticos poderia ser considerado como “melhoramento de bem imóvel”.
Quanto à desconsideração da dívida hipotecária, a Requerida sufraga o mesmo entendimento. Entende que o pagamento da dívida, podendo embora possibilitar um acréscimo do valor de mercado do imóvel, não determina qualquer alteração do seu valor intrínseco. Para efeitos fiscais, o valor dos prédios é determinado nos termos dos artigos 38º a 44º do Código do IMI e a existência de hipotecas sobre os mesmos constitui variável legalmente fixada para a determinação do seu valor.
Acrescenta a Requerida que o cumprimento de uma obrigação - no caso, de pagamento das prestações de um contrato de mútuo - não reveste a natureza de indemnização, conceito jurídico plasmado na parte final da al. a) do nº 1 do art. 51º do CIRS, a qual se caracteriza pela sua matriz compensatória (seja pela produção de um dano, que visa ressarcir, seja pelo não cumprimento ou manutenção de uma situação jurídica – no caso da previsão da alínea ora em apreço, a renúncia onerosa a posições contratuais ou direitos delas derivados relativamente a bens imóveis.
Por conseguinte, conclui a Requerida que o pagamento antecipado do empréstimo traduz, em sede de Direito das Obrigações, uma antecipação do cumprimento e, conforme posição da AT, a (alegada) necessidade de pagamento da dívida hipotecária não decorre da Lei mas apenas possibilita a obtenção de mais vantajosas condições de venda, se esta for efetuada com o bem a transmitir livre de ónus ou encargos.
Acrescenta ainda que os pagamentos e os respetivos documentos comprovativos foram emitidos em nome da filha da Requerente.
Quanto à alegada violação de princípios constitucionais de rendimento líquido e capacidade contributiva a AT entende que não tem que se pronunciar sobre invocação de ocorrência de inconstitucionalidade.
Quanto à alegação da natureza mista da aquisição da fração alienada entende a Requerida que a condição fundamental de um negócio há de constar do instrumento no qual se consubstancia, sobretudo se – como no caso vertente – a lei obriga à sua celebração por modo formal.
Em todo o caso, foi outorgada em 22-02-2021 escritura de retificação da sua congénere de doação mas curiosamente, já depois de haver corrido termos no Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia ..., o procedimento de gestão de divergências instaurado em nome da Requerente, relativamente ao IRS respeitante ao ano de 2019. Concluindo a AT que tal retificação apenas produz efeitos entre as partes identificadas na escritura retificativa, mas não perante a AT.
Mas acrescenta a AT que, ainda que tal se considerasse, devia ser tido em consideração a determinação das mais-valias não só o valor patrimonial tributário da fração ao tempo da doação, como também o montante da dívida hipotecária. Ora, a soma desses montantes ultrapassaria o próprio valor de realização da fração, dando, assim, origem a uma menos-valia. Não sendo assim, segundo a Requerida, que se determina o valor de aquisição caso o negócio revestisse natureza mista, uma vez que teria de ser apurado o valor da parte gratuita e o da parte onerosa.
Efetivamente, segundo a Requerida, o bem doado haverá de ter um valor superior ao do encargo que recai sobre o donatário. O montante do encargo estaria sujeito a IMT e o excesso do valor patrimonial do bem em relação àquele (parte gratuita) sujeito a Imposto do Selo.
Se a importância do encargo excedesse o valor do bem e mesmo assim o donatário aceitasse a doação, estaríamos, segundo a Requerida, perante uma aquisição onerosa, a tributar pelo valor declarado do encargo, nos termos do nº 1 do art. 12º do Código do IMT, sendo também este o valor que se deveria considerar como de aquisição para efeitos de IRS, de acordo com o nº 1 do art. 46º do CIRS.
Sendo o montante do dito encargo inferior ao valor do bem doado, teria de ser este último, segundo a Requerida – então coincidente com o valor patrimonial tributário – a ser entendido como valor de aquisição para efeitos de IRS. Assim se observando, segundo a Requerida, o disposto conjugadamente quer no nº 1 do art. 12º do CIMT (para as transmissões onerosas), quer no nº 1 do art. 13º do CIS (para as transmissões gratuitas), impostos a cuja matéria tributável os artigos 45º e 46º do CIRS recorrem para efeitos de determinação do valor de aquisição em sede imposto sobre o rendimento.
Explana a Requerida que, na situação ora em apreço, o montante do encargo, no caso, pagamento de dívida, revestiria natureza onerosa (€ 104.605,84), sendo inferior ao valor patrimonial do bem (€ 131.150,38). Pelo que deveria ser este o montante a considerar como valor de aquisição da fração habitacional em sede de IRS.
E, tendo-o sido (quer nos campos 4001 dos quadros 4 dos anexos G que acompanharam as declarações oficiosas elaboradas pela AT quer em idênticos campo e quadro do mesmo anexo que acompanhou a declaração modelo 3 originalmente apresentada pela requerente relativamente ao ano de 2019), em nada resultam prejudicados os interesses daquela.
Pelo que, ao ser considerado como valor de aquisição não o montante do encargo que sobre a donatária recaía, mas sim o valor patrimonial tributário do imóvel (mais elevado que aquele outro), menor se tornou o quantum da mais-valia, porquanto resultar menor a diferença entre os valores de realização e de aquisição da mencionada fração.
Concluindo a Requerida que não colhe o argumento relativo à natureza mista do negócio da Requerente.
Por despacho de 23 de setembro de 2022 (depois de ser dada sem efeito data anterior) foi agendada reunião a que alude o art. 18.º do RJAT para inquirição de testemunhas que se realizou a 13 de outubro de 2022 conforme ata da reunião junta aos autos, tendo sido inquiridas as testemunhas arroladas pela Requerente.
Nessa data foi concedido prazo para alegações e fixou-se, como data provável para a prolação da decisão, o dia 28 de dezembro de 2022 tendo posteriormente este prazo sido prorrogado.
A Requerente e Requerida apresentaram as suas alegações a 3 de novembro de 2022 onde, no essencial, mantiveram as respetivas posições assumidas nos respetivos articulado inicial e resposta, respetivamente.
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Saneamento
O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, atenta a conformação do objeto do processo (cf. artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 5.º do RJAT).
O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
Não há nulidades para conhecer.
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Fundamentação
III.I. Matéria de facto
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Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos que se julgam provados:
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A Requerente apresentou em 30/06/2020 a declaração Modelo 3 de IRS respeitante ao ano de 2019, incluindo os respetivos anexo G e G1 (declaração ... - 2019 - ... - ...), tendo feito constar:
- Do anexo G: a alienação onerosa no mês de Julho da fração F do prédio urbano inscrito na matriz da freguesia com o código ... sob o artigo ..., sendo o valor de realização de 225.000,00 €, o valor de aquisição em Setembro de 2014 de 131.150,38 € e as despesas e encargos levadas ao respetivo campo de 107.386,01 €;
- Do anexo G1: a alienação do prédio urbano inscrito na matriz da freguesia com o código ... sob o artigo ..., adquirido em 8 de Setembro de 1983, sendo o valor de realização de 75.000,00 € e o de aquisição de 2.493,99 €;
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A Requerente adquiriu em 2014, por doação da filha, o imóvel referido no ponto 1.º do número anterior, que alineou em 2019;
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Aquando da doação em 2014, sobre a fração estava registada uma hipoteca e respetiva ampliação a favor do Banco …;
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A devedora do empréstimo bancário era a filha da Requerente e assim se manteve depois da doação do imóvel;
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À data o valor em dívida ao Banco era de € 116.450,00;
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Desde a data da aquisição do imóvel, por doação, a Requerente entregou dinheiro à filha para proceder ao pagamento das prestações devidas ao credor hipotecário;
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O valor patrimonial do imóvel à data da doação era de € 131.150,38;
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Em 2019, na altura da venda, o valor do crédito hipotecário era de € 104.605,84, conforme documento emitido pelo credor hipotecário do qual consta:
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Em 2018 a Requerente adquiriu a C..., Lda., bens para os quais foi emitida fatura-recibo n.º 52967, no valor de € 172,26, com a seguinte descrição:
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Em 2018 a Requerente adquiriu a C..., Lda., bens para os quais foi emitida fatura-recibo n.º 53376, no valor de € 81,18, com a seguinte descrição:
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Para as faturas/ recibos referidas nos números precedentes consta, como local de descarga, “Rua ..., ...– ...– Canidelo - ...-...”;
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Em 2018 a Requerente adquiriu eletrodomésticos para os quais foi emitida fatura n.º FS 0730A/120992, no valor de € 1.899,95, com a seguinte descrição:
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O local de descarga destes bens, conforme a fatura referida no ponto anterior, é “morada cliente”;
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A Requerente gastou € 631,98 em honorários, despesas notariais e imposto, no Cartório da Notária D..., conforme Factura/recibo n.º FAC 2014001/1056 emitida em 16/09/2014 da qual consta:
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A Requerente vendeu este imóvel pelo valor de € 225.000,00;
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A venda deste imóvel realizou-se em 2019;
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O imóvel foi vendido livre de quaisquer ónus ou encargos sendo que, em relação às hipotecas referidas no ponto 3. consta da escritura que:
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Do talão de depósito do montante correspondente à amortização do capital em dívida de 4 de julho de 2019 consta:
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A 22 de fevereiro de 2021 foi outorgada uma retificação à escritura de doação deste imóvel de 16-09-2014 onde consta:
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A Requerente alineou em 2019 o terreno referido no 2.º ponto do número 1., adquirido em 1983, objeto da declaração no anexo G1;
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O valor de aquisição foi de € 2.493,99;
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Da escritura de compra e venda de 1983 resulta que, pelo marido da Requerente:
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Em relação a “loteamento de terreno na Rua...”, o Presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia emitiu o seguinte em 1983:
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A Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia emitiu uma guia de receita eventual em 1983:
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Resulta da escritura de compra e venda de 2019 que a Requerente:
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Com base na declaração da Requerente referida no ponto 1., foi efetuada pela AT uma primeira liquidação de imposto, de que resultou o total a pagar de 1.486,19 €;
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A AT suscitada a questão de eventuais divergências no que respeita aos elementos declarados, projetando-se correções no que respeita à declaração da alienação de imóveis;
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A Requerente foi notificada através de carta recebida no dia 8/07/2020 de que a declaração de rendimentos relativa ao ano de 2019 foi selecionada para análise por ter sido detetada a seguinte situação: “Alienação de imóveis não declarada ou necessidade de comprovação dos valores das despesas, valor de alienação, data de aquisição dos imóveis alienados ou afetação a atividade profissional”;
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A Requerente respondeu a esta notificação através do Portal das Finanças no dia 15/07/2020 da seguinte forma:
“Foi feita constar do anexo G a alienação em 2019 de um imóvel que tinha sido adquirido a título gratuito em 2014. Por outro lado, no anexo G1 foi feita constar a alienação em 2019 de imóvel adquirido antes de 1/1/1989, cujas mais-valias estão afastadas da tributação em IRS Fico disponível para apresentar os elementos que sejam considerados necessários e pertinentes”
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A Requerente recebeu no dia 19/10/2020 o ofício com o n.º GI1..., com a epígrafe “Notificação para audição prévia” da qual consta: “Da análise efetuada aos documentos/elementos apresentados relativamente à declaração de IRS, Modelo 3, do ano de 2019, com a identificação .../18, constatou-se a existência da(s) seguinte(s) incorreção(ões): Deverá enviar escrituras de compra, escrituras de venda e documentos das despesas, a comprovar os valores inseridas no Anexo G e Anexo G1. Caso não sejam indicadas no prazo dado para o efeito, iremos proceder à correção oficiosa, retirando as despesas e corrigindo se necessário valores àquela compra e venda. Mais se informa que, caso pretenda exercer o direito de audição prévia a que se refere o artigo 60.º da Lei Geral Tributária […], poderá apresentar as suas alegações no prazo de 15 dias, no site www.portaldasfinancas.gov.pt, mediante seleção da opção “Serviços Tributários – Cidadãos – Consultar – Divergências”, ou, em alternativa, junto do Serviço de Finanças”
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A Requerente respondeu no Portal das Finanças a 23/10/2020 da seguinte forma:
“Notificada (ref. GI-...) para, além do mais, exercer o direito de audição sobre a intenção de proceder a correções para efeitos de IRS de 2019, no que respeita a valores de aquisição e de venda, sem que da notificação constem quais sejam esses valores, para que possa ser exercido fundamentada e esclarecidamente tal direito, é imprescindível que sejam fornecidos ao contribuinte todos os elementos que permitam a rigorosa quantificação das pretendidas correções. Assim, pretendendo exercer de forma adequada o direito de audição, solicito seja feita nova notificação com os elementos em falta”.
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A Requerente deduziu reclamação graciosa contra a liquidação de IRS n.º 2021..., efetuada em 15-01-2021;
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A referida liquidação foi efetuada a título oficioso, em 06-01-2021, de uma declaração modelo 3 de IRS relativa ao ano de 2019, produzida na sequência da instauração de um procedimento de gestão de divergências relativo ao IRS respeitante ao ano de 2019;
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A reclamação supra mencionada foi objeto de despacho de deferimento parcial, proferido pelo Chefe do SF de V. N. Gaia ... em 16-04-2021, razão pela qual foi elaborada em 16-04-2021 nova declaração oficiosa em nome da Requerente, igualmente respeitante ao ano de 2019;
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Essa declaração deu origem à liquidação de IRS nº 2021 ... que apurou o valor de IRS a pagar de € 24.489,03, a que acresciam € 320,14 de juros compensatórios, num total de € 24.809,17;
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Sendo deduzido o valor da liquidação inicial de € 1.486,19 referida no ponto 14., o que perfaz um valor total de € 23.322,98;
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Por não concordar com o teor da decisão tomada no âmbito do procedimento de reclamação graciosa supra referida, a Requerente veio interpor recurso hierárquico, o qual foi indeferido por despacho exarado em 19-10-2021 pela Diretora de Finanças Adjunta para a Área da Justiça Tributária da Direção de Finanças do Porto;
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A AT conclui que:
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A informação de 15-03-2021 refere, entre o mais que:
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Requerente foi notificado da decisão do recurso hierárquico em 29-11-2021;
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O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi apresentado a 28 de fevereiro de 2022.
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Não há factos relevantes para esta Decisão Arbitral que não se tenham provado.
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Fundamentação da Fixação da Matéria de Facto
A matéria de facto foi fixada por este Tribunal Arbitral Singular e a sua convicção ficou formada com base nas peças processuais e requerimentos apresentados pelas Partes e nos documentos juntos pelas Partes, mormente processo administrativo.
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor, conforme n.º 1 do artigo 596.º e n.º 2 a 4 do artigo 607.º, ambos do Código Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi das alíneas a) e e) do n.º do artigo 29.º do RJAT e consignar se a considera provada ou não provada, conforme n.º 2 do artigo 123.º Código do Procedimento e do Processo Tributário (CPPT).
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento das pessoas, conforme n.º 5 do artigo 607.º do CPC. Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g. força probatória plena dos documentos autênticos, conforme artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
Nos presentes autos, o tribunal formou também a sua convicção tendo em conta, também, a prova testemunhal para, em particular, a matéria relativa à doação do prédio, e as circunstâncias que levaram a filha da Requerente doar o imóvel à mãe. A filha e o ex-marido da Requerente explicaram as circunstâncias pessoais que desencadearam a doação do apartamento à Requerente e o facto de esta passar a fazer transferências de dinheiro para a filha para que o empréstimo fosse sendo pago. O ex-marido da Requerente explicou ainda, a forma como estes pagamentos eram efetuados mensalmente e da proveniência do dinheiro por parte da Requerente que, também, fez o pagamento do montante ainda em dívida em 2019 ao Banco antes da venda do imóvel.
Tendo em conta a explicação, coerência e credibilidade das testemunhas o tribunal considera provados os factos relativos a esta matéria.
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes e a prova documental junta aos autos, bem como a prova testemunhal, consideraram-se provados, com relevo para esta Decisão Arbitral, os factos acima elencados.
III.II Matéria de Direito (fundamentação)
Cumpre decidir quanto às seguintes questões:
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Verifica-se no caso concreto violação do art. 60.º da LGT?
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Não estão sujeitas a IRS a mais valias relativas à alienação de terreno adquirido em 1983?
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Ter sido erradamente chamado à colação o n.º 5 do art. 10.º do CIRS?
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Quanto à última questão a decidir, cumpre avaliar se terá existido ilegal desconsideração de despesas e encargos declarados relativos a fração habitacional e se o pagamento da dívida ao Banco constitui despesa subsumível na al. a) do n.º 1 do art. 51.º do CIRS?
Cumpre decidir,
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Em relação à alegada preterição do art. 60.º da LGT no processo de divergências
Conforme factualidade dada como provada a Requerente deduziu reclamação graciosa contra a liquidação de IRS nº 2021..., efetuada em 15-01-2021, na qual foi apurado o montante de imposto a pagar de € 24.687,08, a que acresciam € 322,90 de juros compensatórios, perfazendo o valor total a pagar de € 25.009,98.
A reclamação graciosa foi objeto de despacho de deferimento parcial, proferido pelo Chefe do SF de V. N. Gaia ... em 16-04-2021 e, em consequência, foi elaborada em 16-04-2021 nova declaração oficiosa em nome da Requerente, igualmente respeitante ao ano de 2019, a qual deu origem à liquidação de IRS nº 2021..., que apurou o valor de IRS a pagar de € 24.489,03, a que acresciam € 320,14 de juros compensatórios, num total de € 24.809,17.
A aqui Requerente, não concordando com o teor da decisão, veio interpor recurso hierárquico, o qual foi indeferido por despacho exarado em 19-10-2021 pela Diretora de Finanças Adjunta para a Área da Justiça Tributária da Direção de Finanças do Porto, tendo o procurador da (então) Requerente sido notificado dessa decisão em 29-11-2021.
Alega a Requerente em primeiro lugar que foi preterido no art. 60.º da LGT porquanto tendo respondido, não obstante, a informação para que remete o projeto de decisão da reclamação “[…] é omissa no que respeita às respostas e solicitações da Requerente, não se referindo nem reproduzindo o que foi vertido na informação que precede o despacho de 6 de Janeiro de 2021, notificado através do ofício de 13/01/2021, informação essa que, como se diz na reclamação, contêm descrição factual correta, com exceção do que respeita a emails que tenham sido enviados à reclamante, porquanto nunca a reclamante recebeu uma qualquer comunicação por correio eletrónico, suspeitando que possa eventualmente ter sido utilizado um endereço que constava (ainda que não fiabilizado) no Portal das Finanças e que se constata não estar ativo e, em todo o caso, não ser da Requerente.”
Concluindo que se encontra violado o art. 60.º da LGT.
Quanto a isto resulta que, entre o mais, a Requerente foi notificada para audição prévia – que respondeu no Portal das Finanças – resultando que “Da análise efetuada aos documentos/elementos apresentados relativamente à declaração de IRS, Modelo 3, do ano de 2019, com a identificação .../..., constatou-se a existência da(s) seguinte(s) incorreção(ões): Deverá enviar escrituras de compra, escrituras de venda e documentos das despesas, a comprovar os valores inseridos no Anexo G e Anexo G1. Caso não sejam indicadas no prazo dado para o efeito, iremos proceder à correção oficiosa, retirando as despesas e corrigindo se necessário valores àquela compra e venda. Mais se informa que, caso pretenda exercer o direito de audição prévia a que se refere o artigo 60.º da Lei Geral Tributária […], poderá apresentar as suas alegações no prazo de 15 dias, no site www.portaldasfinancas.gov.pt, mediante seleção da opção “Serviços Tributários – Cidadãos – Consultar – Divergências”, ou, em alternativa, junto do Serviço de Finanças”.
Resulta, entre o mais ainda, que foi dada à Requerente, nos termos do aludido art. 60.º para o qual foi especificamente notificada, para apresentar os elementos probatórios necessários aos valores inseridos no Anexo G e Anexo G1 e, caso fosse omitida, se necessários os valores seriam corrigidos.
A verdade é que foi a Requerente notificada – naquela sede pelo menos – para juntar os elementos documentais e, dos próprios factos que alega, não o fez naquele momento. A verdade é que a Requerente solicita informação – que não especifica em relação ao que, naquele momento, se encontrava em análise – mas a verdade é que não envia no âmbito do processo de divergências os documentos solicitados para comprovar os valores que a própria inseriu nos Anexo G e Anexo G1 que lhe eram essenciais para o respetivo preenchimento e para esclarecer o que era solicitado pela AT no âmbito do aludido procedimento de divergências.
Para além disso, naquele momento não está em causa qualquer correção automática, nem sequer o quantum dessa correção mas a eventual averiguação da verificação de uma incorreção, através de suportes documentais que a Requerente, em qualquer caso – e independentemente de eventuais informações que considerasse necessárias, ainda que não as especifique nem demonstre sobretudo, no caso concreto, a efetiva necessidade para que só com essa informação seria possível dar cumprimento à junção dos elementos documentais em causa.
Desta forma conclui-se que não há qualquer preterição do preceituado no disposto no art. 60.º da LGT.
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Relativamente à não sujeição a IRS das mais-valias resultantes da alineação do terreno para construção adquirido em 1983
O imóvel em apreço neste ponto corresponde a terreno para construção adquirido em 1983 e alineado em 2019 conforme factualidade data como provada constando, desta escritura de compra e venda que «[…] o prédio urbano composto por terreno destinado a construção […]».
Nesta matéria o que se impõe saber é se são ou não tributados em sede de IRS os ganhos obtidos com a transmissão onerosa do prédio urbano referido.
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.° do Código do IRS constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos comerciais, industriais ou agrícolas, de capitais ou prediais, resultassem da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis. Pelo que, à primeira vista, os ganhos resultantes da venda daquele prédio estariam sujeitos a tributação em sede de IRS, a título de Mais-Valias.
Não obstante, por força do disposto no n.° 1 do artigo 5.° do Dec. Lei n.º 442-A/88, que estabeleceu um regime transitório para os rendimentos da categoria G, os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias criado pelo Código do Imposto de Mais-Valias aprovado pelo Dec. Lei n° 46373, de 9 de Junho de 1965, só ficavam sujeitos a IRS se a aquisição dos bens ou direitos a que respeitassem tivesse sido efetuada depois da entrada em vigor do CIRS, ou seja, depois de 1 de Janeiro de 1989.
A questão que se coloca é saber se o imóvel e apreço nos autos se subsume na previsão deste preceito do regime transitório.
De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 1.° do Código do Imposto de Mais-Valias, este imposto incidia sobre:
A «transmissão onerosa de terreno para construção, qualquer que seja o título por que se opere, quando dela resultem ganhos não sujeitos aos encargos de mais-valia previstos no artigo 17.º da Lei n.º 2030, de 22 de Junho de 1948, ou no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 41616, de 10 de Maio de 1958, e que não tenham a natureza de rendimentos tributáveis em contribuição industrial»
No § 2.º estabelecia o preceito que «[s]ão havidos como terrenos para construção os situados em zonas urbanizadas ou compreendidos em planos de urbanização já aprovados e os assim declarados no título aquisitivo».
É pacífico na jurisprudência, nomeadamente que nos acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo: de 9/11/2005, proferido no recurso n.º 733/05; de 29/03/2004, proferido no recurso n.º 1213/05; de 12/12/2006, proferido no recurso n.º 1100/05; de 6/06/2007, proferido no recurso n.º 179/07; de 13/02/2008, proferido no recurso n.º 763/07; de 29/10/2008, proferido no recurso n.º 539/08 e de 4/02/2009, proferido no recurso n.º 872/08, todos consultáveis em www.dgsi.pt, no sentido «de que à luz do disposto no artigo 5.º do Dec. Lei n.º 442-A/88 não são tributados em sede de IRS os ganhos obtidos com a transmissão onerosa de prédio urbano adquirido como rústico antes da entrada em vigor do Código do IRS e que ainda conservava essa natureza no momento da entrada em vigor deste Código, pese embora tenha, posteriormente, adquirido a natureza de urbano (terreno para construção) e sido alienado como tal», como resulta do acórdão do TC Administrativo norte de 11/10/2017, proferido no âmbito do processo n.º 01657/06.4BEBRG.
Tipicamente o que aqui está em causa é que o Código de Mais-Valias só sujeitava a imposto os terrenos para construção, os quais eram assim classificados por se encontrarem abrangidos por planos de urbanização, ou por se localizarem em zona urbanizada ou, ainda, por se destinarem a construção urbana segundo declaração dos próprios contraentes.
Aliás, o próprio preâmbulo do Código do Imposto das Mais-Valias refere expressamente que «[n]a verdade, as mais-valias ou ganhos de capital já são coletados entre nós através quer dos encargos de mais-valia previstos na Lei n.º 2030 e no Decreto-Lei n.º 41616, quer do selo de traspasse, pago embora pelo tomador do local; e foram-no até há pouco, ainda que não exclusivamente, também noutro caso - o da tributação, em imposto sobre a aplicação de capitais, dos aumentos de capital das sociedades por ações e por quotas, mediante incorporação de fundos de reserva e emissão de ações com preferência para os acionistas. Precisamente por se ter reconhecido que esta tributação só poderia justificar-se como de mais-valias, é que ela foi subtraída ao domínio do atual imposto de capitais e reservada para o imposto que se cria agora.
[…]
2. A ideia de que se partiu para traçar os limites do imposto foi a de considerar mais-valias os aumentos de valor dos bens que os contribuintes não produziram nem adquiriram para venda. É uma ideia decerto sujeita a reparos sob o ponto de vista teórico, mas que tem a vantagem de poder ser utilizada na prática. No entanto, resolveu-se aplicá-la, não a todos os bens naquelas condições, e sim apenas aos bens cujas mais-valias se verificam com maior frequência, são de maior vulto ou não oferecem dificuldades sérias de determinação. É o que acontece, sem dúvida, com os terrenos para construção; com os elementos do ativo imobilizado das empresas (entre eles os traspasses e os alvarás) e os seus bens de rendimento; com o direito ao arrendamento dos escritórios e consultórios; com as quotas em sociedades e as ações».
Neste contexto, e como conclui aquela última decisão do TCA Norte, para que a transmissão do terreno seja tributada em sede de IRS, é necessário que, antes da data da entrada em vigor do CIRS, que ocorreu em 1 de Janeiro de 1989, o terreno fosse já qualificado como terreno para construção, pois só a valorização desse tipo de terrenos era tributada em sede de Imposto de Mais-Valias.
No caso em concreto, em 1983 o terreno em apreço nos autos – conforme resulta da respetiva escritura – era destinado a construção, o que significa que tal prédio – que se destina a construção e como tal é declarado na escritura de 1983.
Cumpre agora determinar se, nos termos do transcrito artigo 1.º, 1.º se verifica alguma das exceções:
Por um lado, em relação aos encargos de mais-valia previstos no n.º 1 do artigo 17.º da Lei n.º 2030, de 22 de Junho de 1948 refere-se a obras de urbanização ou abertura de grandes vias de comunicação que aumentem consideravelmente o valor pela sua possibilidade de aplicação a terrenos para construção urbana, ficam sujeitos a um encargo de mais valia, nos termos dos números seguintes.
Destes números resultam elementos interpretativos importantes, mormente quem faz as obras e a partir de que condição é o encargo cobrado, ou seja, nos termos do n.º 6, o encargo de mais valia não será cobrado antes de requerida a licença de construção.
Tendo em conta este regime o que se pode concluir é que no caso concreta estão em causa obras, quer de urbanização ou abertura de grandes vias de comunicação, que se demonstre que aumentaram consideravelmente o valor pela sua aplicação a terrenos de construção.
Mas, mesmo que fosse possível determinar, não é demonstrado pela Requerente que foi realizada qualquer obra de urbanização – na realidade, não há qualquer construção no imóvel já que se manteve como “terreno para construção” na escritura de 2019 – ou abertura de grandes vias de comunicação naquele terreno. Qualquer um dos casos com exige o aludido art. 17.º.
No caso em concreto, existe um encargo corresponde a loteamento de terreno sito na Rua de Salgueiros, Canidelo, no valor de € 2.393,93. Ora, e independente de discutir neste momento a natureza proter rem das obrigações ou ainda se o âmbito da previsão é mais amplo, como discute a Requerente, a verdade é que o problema está a montante. A verdade é que a Requerente omite a alegação e demonstração de factos que são essenciais para desencadear a aplicação do regime que resulta do art. 17.º, nomeadamente, e desde logo, que dos elementos documentais emitidos pela Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia não é possível determinar se os mesmos se referem ao terreno em construção em apreço nos autos.
Para além disso, também não é demonstrado em que é que o loteamento – ainda que se admitisse – aumentou consideravelmente o valor.
Por fim, e como resulta do n.º 6 do art. 17.º, omite a alegação e demonstração de que foi requerida a licença de construção já que, na realidade, para efeito do art. 17.º, só a partir dessa data seriam os encargos devidos.
Por outro lado, em relação aos encargos de mais valias previstas no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 41616, de 10 de maio de 2958. Estabelece este preceito que ficam sujeitas a encargos de mais-valia «[…] os terrenos na margem sul do Tejo situados na zona valorizada pela construção da ponte e acessos. […]».
Situando-se o terreno em apreço nos autos em Canidelo, Vila Nova de Gaia, não está abrangido na área territorial do preceito.
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Quanto à terceira questão a decidir, a Requerente vem alegar que foi erradamente chamado à colação o n.º 5 do art. 10.º do CIRS
A informação de 21/03/2021 refere-se a este preceito que não teve aplicação no caso concreto manifestando-se uma referência da qual, para efeitos da posição da Requerente e da sua pretensão, bem como em sede procedimental, não teve qualquer consequência.
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Quanto à última questão a decidir, cumpre avaliar se terá existido ilegal desconsideração de despesas e encargos declarados relativos a fração habitacional e se o pagamento da dívida ao Banco constitui despesa subsumível na al. a) do n.º 1 do art. 51.º do CIRS?
A Requerente procedeu ao pagamento de € 107.386,01 correspondente, € 104.605,84 ao pagamento de crédito hipotecário e o remanescente relativo à compra de materiais e eletrodomésticos; bem como as despesas notariais.
Estabelece o preceituado no art. 51.º, n.º 1, al. a) do Código do IRS que, para a determinação de mais-valias os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos, e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, bem como a indemnização comprovadamente paga pela renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a esses bens, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º.
O TCA Sul no Acórdão 06824/13, de 2015/04/14 já se pronunciou sobre o alcance das “despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e a alienação” de um imóvel abrangidas pelo artigo 51.º do CIRS. Resulta desta decisão que «do texto legal resulta a expressão despesas “necessárias” e “inerentes” pelo que devem ser interpretadas conforme a necessidade e a inerência da despesa face à alienação do imóvel, pelo que se coloca a questão de saber se tal “assunção”, com os gastos inerentes, constitui despesa enquadrada naquele normativo, a considerar para efeitos de tributação da mais-valia respetiva. E, aí, a subordinante é, sem dúvida, “a inerência” da despesa à alienação. No critério legal, só as despesas inerentes são necessárias, pelo que só elas são relevantes. Tal critério contém uma ideia de inseparabilidade, uma relação intrínseca - que não meramente extrínseca - com a alienação: para ser considerada relevante, a despesa há de sê-lo pela sua posição relativamente à alienação, há de, em suma, ser dela indissociável. De outro modo: a despesa há de ser integrante da própria alienação.
Não se vê, efetivamente, que outro sentido se possa atribuir à expressão “inerentes à alienação”.
Não basta, pois, que as despesas sejam conexas à obtenção do rendimento, é necessário que elas dele sejam indissociáveis.
Ora, não é a hipótese das despesas em causa, que apenas são conexas à alienação, não são dela inseparáveis. (...)
Segundo a doutrina mais recente são exemplos de “despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação”, são os registos e as escrituras-publicas – leia-se Rui Duarte Morais in Sobre o IRS, 2ª Edição, pag. 141 e Paula Rosado Pereira in Estudos sobre o IRS, Rendimentos de Capitais e Mais-valias, Cadernos IDEFF, nº 2.
Poder-se-á também considerar as despesas de mediação mobiliária, mais concretamente a comissão de intermediação, como despesas necessárias e inerente à venda do imóvel para efeitos no nº 1 alínea a) do art. 51º C.IRS.»
Posição reiterada pelo mesmo Tribunal Superior no Acórdão referente ao Processo 715/11.8 BEAL, de 2017/05/25.
Assim, impõe-se concluir – seguindo a decisão 257/2021-T do CAAD – as despesas são aquelas que são indissociáveis da alienação do imóvel, não bastando que sejam conexas;
Quanto às despesas em apreço nos autos:
Em relação aos materiais/ bens não é alegado nem demonstrada que as despesas são inerentes e necessárias à venda do imóvel. A Requerente junta as faturas e refere-se a elas por mera indicação não apresentando a relação intrínseca com o imóvel e a sua alineação. Assim sendo, e ainda que omissa a alegação e fundamentação, do que resulta do teor documental é que as despesas são, in extremis, conexas e, em qualquer caso, separáveis não se alegando ou demonstrando a indissociabilidade.
Para além disso não é demonstrado que as mesmas tenham sido necessárias e inerentes à venda do próprio imóvel e, no caso dos eletrodomésticos nem se consegue concluir pela fatura que os mesmos se destinem à fração em apreço nos autos. Da fatura junta aos autos, a morada da Requerente que consta daquele documento não é o da fração e o local de descarga é a “morada do cliente”, não podendo, sequer, concluir-se que a despesa se refere à fração em apreço nos autos. Que, de qualquer forma, também não sendo uma despesa indissociável com a alienação da fração não seria de considerar para o efeito pretendido pela Requerente.
Quanto às despesas notariais referentes a ano de 2014 não é alegado nem demonstrado a que atos dizem respeito e a relação efetiva com a compra e venda em apreço nos autos. Não se extraindo do documento, sequer, qual o bem objeto do ato 1 “doação” sendo omissa qualquer alegação quanto ao mesmo.
Desta forma, em relação a estas despesas não se evidencia qualquer relação de indissociabilidade com a alienação do imóvel em apreço nos autos.
Por fim, no que tange ao crédito hipotecário em apreço nos autos e pago pela Requerente.
Tendo em conta a fundamentação apresentada nas decisões referidas quanto a esta matéria cumpre considerar que para efeitos de apuramento de mais-valias. De acordo com a al. a) do n.º 1 do art. 51.º do CIRS apenas as despesas inerentes são consideradas necessárias.
Esta posição tem associada, como já referido anteriormente, a ideia de inseparabilidade com a alienação do imóvel que tem de ser intrínseca e não, meramente, extrínseca. O que significa que para ser considerada relevante, a despesa terá de o ser em relação à alienação e, portanto, indissociável desta. Não bastando que a despesa seja conexa à obtenção do rendimento.
No caso concreto as despesas associadas e relativas à obtenção do distrate da hipoteca não são despesas inerentes à alienação do imóvel, mas sim despesas decorrentes com um outro contrato, o empréstimo bancário que, no caso, está em nome de terceiro, a filha da Requerente. Ainda que se admita que a Requerente procedeu à amortização do capital para a obtenção do distrate da hipoteca, a verdade é que tais despesas não são inerentes à alienação nem, na verdade são conexas com esta, estas despesas são, isso sim, conexas com o financiamento, que é outro e distinto negócio.
Ainda que se admita, uma vez mais, que a Requerente pagou o montante em falta à data da escritura de compra e venda e tenha alienado o imóvel livre de ónus ou encargos, a verdade é que o valor das quantias pagas a título de amortização do capital em dívida e eventuais despesas não correspondem nem são “inerentes à alienação”. Só as despesas inerentes são necessárias, pelo que só elas são relevantes. Como se extrai do Acórdão do STA, de 18 de novembro de 2009, processo n.º 585/09, “[…] o qualificativo «inerente», logo etimologicamente - in re - contém, a se, uma ideia de inseparabilidade, uma relação intrínseca - que não meramente extrínseca - com a alienação: para ser considerada relevante, a despesa há-de sê-lo pela sua posição relativamente à alienação, há-de, em suma, ser dela indissociável. De outro modo: a despesa há-de ser integrante da própria alienação.”
A esta luz, não se afigura que a amortização do capital para a obtenção do distrate seja inerente à alineação da fração em apreço nos autos, nem são indissociáveis ou inseparáveis das operações de aquisição ou venda dessa mesma fração, pelo que resulta afastado o regime jurídico suscitado pela Requerente e a pretensão que formula, por falta de enquadramento nos respetivos pressupostos.
Da mesma forma se entende que o pagamento de tais quantias se subsume em encargo com a valorização dos bens cujo valor intrínseco não se mostra alterado.
Desta forma não se considera que o pagamento do empréstimo consubstancie uma despesa relativa a fração habitacional para os efeitos pretendidos pela Requerente.
Por fim, entende-se também que a solução legal não viola o princípio da capacidade contributiva já que, o que a lei tributa é a mais-valia, o acréscimo patrimonial, realizada pela venda do imóvel. O destino que o alienante dá ao montante que recebe, salvas as exceções que a lei consigna, não se mostra relevante e, por isso, a tributação incide sobre o rendimento obtido, seja qual for o destino que lhe seja ou venha a ser dado.
O Tribunal tem o dever de se pronunciar sobre todas as questões, abstendo-se de se pronunciar sobre questões de que não deva conhecer (segmento final do n.º 1 do artigo 125.º, do CPPT). Contudo as questões sobre que recaem os poderes de cognição do Tribunal, são, de acordo com o n.º 2 do artigo 608.º, do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo arbitral tributário, por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, “as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”.
Tendo em conta a posição assumida em relação aos pedidos da Requerente fica prejudicado o conhecimento de qualquer outra questão.
Face ao exposto, devem as liquidações impugnadas ser mantidas na ordem jurídica, por legais.
Da responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais
Nos termos do disposto no artigo 527.º, n.º 1 do CPC (ex vi 29.º, nº 1, alínea e) do RJAT), deve ser estabelecido que será condenada em custas a Parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito.
Neste âmbito, o n.º 2 do referido artigo concretiza a expressão “houver dado causa”, segundo o princípio do decaimento, entendendo que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
Nestes termos, tendo em consideração o acima exposto, a responsabilidade em matéria de custas arbitrais deverá ser da Requerente.
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Decisão
Nestes termos, este Tribunal Arbitral Singular decide julgar improcedentes os pedidos de pronúncia arbitral com as legais consequências.
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Valor do processo
Tendo em consideração o disposto nos artigos 306.º, n.º 2 do CPC, artigo 97.º-A, n.º 1 do CPPT e no artigo 3.º, nº. 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em € 23.322,98.
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Custas
Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas do Processo Arbitral em € 1.224,00 a cargo da Requerente, de acordo com o artigo 22.º, n.º 4 do RJAT.
Notifique-se.
Lisboa e CAAD, 14 de março de 2023
A Árbitra,
(Marisa Almeida Araújo)