|
|
Versão em PDF |
SUMÁRIO:
Não é ilegal a aplicação da fórmula prevista na alínea a), do n.º 3, do artigo 15.º, do Código do Imposto do Selo, em que o fator de capitalização f = 25, por aplicação da taxa de juro aplicada pelo Banco Central Europeu às suas principais operações de refinanciamento, tal como publicada no Jornal da União Europeia e em vigor na data em que ocorra a transmissão, acrescida de um spread de 4%.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Carlos Alberto Fernandes Cadilha (Árbitro Presidente), Paulo Nogueira da Costa (Relator) e Ana Rita do Livramento Chacim, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formarem o presente Tribunal Arbitral, constituído em 08 de novembro de 2022, acordam no seguinte:
I – RELATÓRIO
-
A... (doravante “Requerente”), contribuinte n.º..., residente em ... n.º ..., ..., ...-... Alenquer, tendo sido notificado, na qualidade de donatário, do ato de liquidação de Imposto do Selo n.º 2022..., com uma matéria coletável no valor de € 827.600, e um Imposto do Selo a pagar no valor € 82.760,00, não se conformando com a mesma, veio, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 10.º, n.º 1, al. a) do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (‘RJAT’), apresentar pedido de pronúncia arbitral, tendo em vista a anulação do referido ato de liquidação.
-
É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada somente por “Requerida” ou “AT”).
-
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 29-08-2022.
-
A Requerida foi notificada da apresentação do pedido de constituição do tribunal arbitral em 05-09-2022.
-
Os signatários foram designados como árbitros pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, nos termos dos números 2, alínea a), e 3 do artigo 6.º do RJAT, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e nos termos legalmente previstos.
-
Em 19-10-2022 foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos do disposto no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, conjugado com os artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
-
Em conformidade com o preceituado na alínea c), do n.º 1, do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 08-11-2022.
-
Em 08-11-2022 foi a Requerida notificada para apresentar Resposta.
-
A Requerida apresentou a sua Resposta em 02-12-2022, tendo, na mesma data, remetido ao tribunal cópia do processo administrativo.
-
Por despacho arbitral de 08-12-2022, o Tribunal decidiu dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAJ, bem como a apresentação de alegações.
II – SANEADOR
-
A apresentação do pedido de pronúncia arbitral foi tempestiva.
-
As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.
-
Não foram alegadas exceções que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
-
Não se verificam nulidades, pelo que se impõe conhecer do mérito.
III. MÉRITO
III. 1. MATÉRIA DE FACTO
§1. Factos provados
-
Consideram-se provados os seguintes factos:
-
Em 18 de Dezembro de 2020 foi outorgado um contrato de doação de ações entre o doador B..., contribuinte n.º ... e o seu irmão A..., na qualidade de Donatário, Requerente nos presentes autos;
-
O contrato de doação teve por objeto a doação, livre de ónus ou encargos, de 20.000 (vinte mil) ações de valor nominal de € 5,00 (cinco euros) cada uma, no valor total de € 100.000,00 (cem mil euros) da sociedade C..., S.A. (‘C...’), NIPC..., com o capital social de € 1.400 000,00 (um milhão e quatrocentos mil euros), representativas de 7,14% do respetivo capital social;
-
Em 2019, a C... era proprietária de imóveis cujo Valor Patrimonial Tributário, no total, ascendia a € 132.230,98;
-
Em 26/03/2021, o Requerente procedeu à entrega da Declaração Modelo 1 de Imposto do Selo – Participação de Transmissões Gratuitas, incluindo respetivos anexos;
-
Com a Declaração Modelo 1 de Imposto do Selo, foi junta uma Declaração da C..., a certidão da CMVM com a prova da não cotação das ações transmitidas, bem como o Balanço e a Demonstração de Resultados da sociedade dos anos 2019 e 2018, nos termos e para efeitos do artigo 15.º do Código do Imposto do Selo;
-
Na sequência da participação da operação, foi o Requerente notificado do ato de liquidação de Imposto do Selo n.º 2022..., com uma matéria coletável no valor de € 827.600, e um Imposto do Selo a pagar no valor € 82.760, com data limite de pagamento voluntário em 31-05-2022;
-
Em 27/05/2021, foi pago um valor de imposto de € 71.587,40, por exercício do direito à redução do valor liquidado, por pronto pagamento, previsto no artigo 45.º do CIS;
-
Discordando da liquidação em causa, o Requerente apresentou, em 26/08/2022, o presente pedido de pronúncia arbitral.
§2. Factos não provados
-
Com relevo para a decisão, não existem factos essenciais não provados.
§3. Motivação quanto à matéria de facto
-
Cabe ao Tribunal selecionar os factos relevantes para a decisão e discriminar a matéria provada e não provada [artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT].
-
Os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos em função da sua relevância jurídica, considerando as várias soluções plausíveis das questões de Direito (cfr. artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT].
-
Consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo por base a prova documental junta aos autos, e considerando as posições assumidas pelas partes, e não contestadas, à luz do artigo 110.º, n.º 7, do CPPT.
III.2. MATÉRIA DE DIREITO
§1. Questão decidenda
-
Cumpre apreciar, no presente processo, a legalidade da liquidação de Imposto do Selo relativo a transmissão gratuita de ações não cotadas.
§2. Apreciação da questão controvertida
-
O Requerente não concorda com o teor da notificação recebida, mais concretamente com o valor da avaliação atribuído às ações transmitidas/ matéria coletável - e que determinou o valor do Imposto do Selo a pagar, por aplicação da taxa de 10%, prevista na verba 1.2 da Tabela Geral de Imposto do Selo Anexa ao CIS, alegando, em síntese, o seguinte:
-
Houve erro na forma de aplicação/cálculo do “fator f” previsto na alínea a) do n.º 3 do artigo 15.º do Código de Imposto do Selo (CIS);
-
Os Valores Patrimoniais Tributários dos imóveis propriedade da C... em 2019 não totalizam os € 132.230,98 considerados, mas apenas € 32.230,98, pelo que o fator “S” previsto na fórmula deveria totalizar menos € 100.000 do que o valor considerado pela AT;
-
Nos termos da letra da norma, matemática e financeiramente o fator f (multiplicativo) seria de 1,04, nunca um fator de 25 (1/4%) como o que foi aplicado in casu;
-
A aplicação matemática da fórmula contida na alínea a) do n.º 3 do artigo 15.º do CIS, conforme foi executada pela AT, não conduz a uma avaliação minimamente correta ou aproximada do valor real da sociedade, dado que a sociedade C..., conforme avaliada pela AT, teria um valor global, em 2020, de € 11.586.400,00, o que seria manifestamente excessivo, quando comparado com o capital próprio da C..., o qual totaliza, em 2019 – exercício anterior ao da operação e cujos valores serviram de base à avaliação realizada –, o valor de € 4.525.489,70;
-
O valor de capitais próprios corrigidos, nos termos da lei – i.e., considerando o fator ‘S’ da fórmula (valor substancial da empresa) e as respetivas correções dos valores dos imóveis, prevista no artigo 31.º do CIS – totalizaria “apenas” € 3.415.114,74;
-
Do ponto de vista meramente contabilístico, a empresa apresenta um valor de ativos de € 11.323.146 e de passivos (dívidas ou responsabilidades) de € 6.797.656, o que resulta num valor líquido real da empresa (capital próprio não corrigido) de € 4.525.490;
-
Se a C... fosse uma sociedade por quotas, a sociedade seria avaliada em € 4.525.489,70 (capitais próprios) ou, eventualmente, € 3.415.114,74 (capitais próprios corrigidos), nunca os € 11.586.400,00, apenas porque se trata de uma sociedade anónima;
-
Existe violação do princípio da igualdade, pela injustificada discriminação entre formas jurídico-societárias, dado que a fórmula em apreço, tal como foi aplicada pela AT, conduz a uma avaliação da sociedade anónima mais de 3 vezes superior à que resultaria se a mesma sociedade, com os mesmos e exatos indicadores económicos e patrimoniais, tivesse a forma de sociedade por quotas;
-
Quando da análise da relação entre o elemento lógico e o elemento literal, se verifica a existência de dissonância, no sentido da insuficiência, entre a letra e o espírito da lei, e que o sentido ultrapassa o que resultaria estritamente da letra, o intérprete está autorizado a ir além da letra da lei, mas dentro, sempre, do sistema, o qual, por comparação com o restante previsto na norma em análise, não determina, certamente, que o “f” multiplicativo seja 25, quando tal conduza a valores de avaliação tão dispares, entre tipo societários – entre SA’s e Lda’s – como efetivamente conduz;
-
Ainda que se admitisse que a AT aplicou corretamente a fórmula em apreço, a mesma não conduziu a um valor minimamente próximo ao valor real de mercado da sociedade;
-
O valor de mercado será aquele que entidades independentes – não relacionadas – estejam dispostas a pagar por um bem num mercado livre;
-
Em 19 de agosto de 2020 – 4 meses antes e no mesmo ano da doação em análise - foram alienadas 126.000 ações representativas de 50% do capital social da C..., pelo valor de € 3.300.000,00, entre partes absolutamente independentes, a que correspondeu um valor por ação de € 26.19, bastante inferior aos € 41,38 notificados pela AT;
-
O próprio REQUERENTE, em 17 de Setembro de 2020 – 3 meses antes da operação aqui em análise -, adquiriu a uma entidade totalmente independente – a sociedade D..., SGPS, S.A. - 25200 ações da C..., cuja compra totalizou um preço global de € 660.000;
-
As ações compradas à D..., SGPS, S.A. tiveram o mesmo valor unitário de € 26,19;
-
Mesmo que se admitisse que a forma de cálculo aplicada está correta, sempre teria que se realizar uma interpretação atualista da lei, ou seja, dever-se-ia ter em conta as circunstâncias factuais aquando da respetiva aplicação da norma, porquanto a aplicação ‘cega’ da fórmula conduz a resultados sem qualquer adesão à realidade e ao objetivo a atingir (determinar corretamente o valor real da sociedade);
-
Sendo admissível a ilisão do valor calculado pela AT, nos termos e para efeitos do artigo 73.º da LGT, e resultando provado no processo que as ações transmitidas tiveram, nesse mesmo ano de 2020 – através de duas operações realizadas com entidades independentes –, um valor de “apenas” € 26,19, por ação, deve a liquidação notificada ser anulada;
-
Essa anulação tem como consequência a obrigação legal que impende sobre a AT de proceder à devolução da quantia indevidamente paga pelo Requerente, acrescida de juros indemnizatórios.
-
Sustenta a Requerida, em síntese, o seguinte, no sentido da total improcedência do pedido de pronúncia arbitral:
-
A cópia do documento de liquidação de IMI da C... referente ao ano de 2019, junta aos autos, evidencia que o VPT dos imóveis de que era proprietária nesse ano correspondia, no seu total, a € 132.230,98, pelo que não há qualquer erro no apuramento do fator “s”;
-
A fórmula prevista na alínea a) do n.º 3 do artigo 15.º procura fazer a síntese de duas conceções clássicas de avaliação de empresas: a que assenta no valor do património líquido ou valor substancial (S) representado pelo capital próprio que figura no último balanço (ajustado) e a que se baseia no valor da empresa calculado na perspetiva do rendimento (R1 +R2) x f);
-
Dispondo o artigo 15.º do CIS de regras de determinação do valor das ações não cotadas, não pode esta norma deixar de ser aplicada pela AT;
-
Não se verifica a existência de qualquer vício de ilegalidade, na forma de aplicação da fórmula nos exatos termos previstos no artigo 15.º, n.º 3, alínea a), do CIS;
-
As diferentes metodologias adotadas pelo legislador nos nºs 1 e 3 do artigo 15.º do CIS terão sido ditadas por razões de simplificação, levando em conta que, em regra, as figuras jurídico-societárias em confronto enquadram realidades económico-empresariais bastante diferenciadas;
-
Ponderadas as diferenças existentes entre as estruturas societárias de umas e outras, não se vislumbra como é que a existência legal de regras de avaliação diferenciadas, no artigo 15.º, pode colidir com o princípio da igualdade;
-
A transposição, para o domínio das transmissões gratuitas de partes sociais, do princípio pelo qual se rege a determinação dos preços de transferência em operações realizadas entre entidades relacionadas, não está contemplada no Código do Imposto do Selo;
-
A norma contida na alínea a) do n.º 3 do artigo 15.º, do CIS, não constitui uma presunção ilidível, porquanto à semelhança das regras de avaliação dos imóveis com base na fórmula e nos coeficientes constantes dos artigos 38.º a 46.º do Código do IMI, foi o próprio legislador que admitiu que a avaliação das ações (não cotadas) com base na fórmula representa uma aproximação ao seu real valor à data da transmissão gratuita;
-
A aplicação generalizada da metodologia baseada na fórmula legal permite respeitar quer o princípio da neutralidade, pois o mesmo critério base aplica-se a todas as sociedades qualquer que seja a atividade exercida, a sua dimensão e a repartição do poder de decisão, quer o princípio da simplicidade;
-
A aplicação da fórmula em apreço a todas as situações em que ocorra a transmissão gratuita de ações de sociedades anónimas não cotadas, proporciona certeza e segurança sobre o regime aplicável;
-
A determinação do valor tributável das ações doadas não enferma de qualquer vício de ilegalidade.
-
O artigo 15.º, n.º 3, alínea a), do Código do Imposto do Selo (CIS), na versão vigente à data dos factos, estabelece o seguinte:
“3 - O valor das acções, títulos e certificados da dívida pública e outros papéis de crédito é o da cotação na data da transmissão e, não a havendo nesta data, o da última mais próxima dentro dos seis meses anteriores, observando-se o seguinte, na falta de cotação oficial:
a) O valor das acções é o correspondente ao seu valor nominal, quando o total do valor assim determinado, relativamente a cada sociedade participada, correspondente às acções transmitidas, não ultrapassar (euro) 500 e o que resultar da aplicação da seguinte fórmula nos restantes casos:
Va = [ 1 / ( 2 x n ) ] x [ S + ( (R1 + R2) / 2 ) x f ]
em que:
Va representa o valor de cada ação à data da transmissão;
n é o número de ações representativas do capital da sociedade participada;
S é o valor substancial da sociedade participada, o qual é calculado a partir do valor contabilístico correspondente ao último exercício anterior à transmissão com as correções que se revelem justificadas, considerando-se, sempre que for caso disso, a provisão para impostos sobre lucros;
R1 e R2 são os resultados líquidos obtidos pela sociedade participada nos dois últimos exercícios anteriores à transmissão, considerando-se R1 + R2 = 0 nos casos em que o somatório desses resultados for negativo, sendo f o fator de capitalização dos resultados líquidos calculado com base na taxa de juro aplicada pelo Banco Central Europeu às suas principais operações de refinanciamento, tal como publicada no jornal da União Europeia e em vigor na data em que ocorra a transmissão, acrescida de um spread de 4 %;”
-
No caso em apreço, a aplicação da fórmula referida conduziu à determinação do valor de €41,38 por ação, nos seguintes termos:
-
Contrariamente ao alegado pelo Requerente, o valor do somatório dos VPT dos imóveis de que a C... era proprietária foi corretamente apurado pela AT, conforme resulta da cópia do documento de liquidação de IMI da C... referente ao ano de 2019, não se verificando, assim, qualquer erro no apuramento do fator “s” da fórmula em apreço;
-
O Requerente contesta, igualmente, a forma de aplicação do “fator f” previsto na alínea a) do n.º 3 do artigo 15.º do Código de Imposto do Selo (CIS), alegando que o fator f (multiplicativo) seria de 1,04 (ou seja, 1+4%), e não de 25 (1/4%) como o que foi aplicado pela AT;
-
Também aqui não tem razão o Requerente.
-
Conforme afirmado no Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS), de 11/10/2011, no âmbito do Processo n.º 05052/11, “[o] factor “f”, constante da fórmula prevista no artº.15, nº.3, al. a), do C.I.Selo, na redacção resultante da Lei 39-A/2005, de 29/7 (cfr.anterior artº.20, §5, al.a), do C.I.M.S.I.S.S.D.) corresponde ao factor de capitalização dos resultados líquidos, ou seja, o factor que vai determinar o valor do capital que dá aquele rendimento, tendo por comparação a taxa de juros de referência das aplicações financeiras isentas de risco, no caso a taxa de juro aplicada pelo Banco Central Europeu às suas principais operações de refinanciamento, portanto 1% na data da avaliação. Este factor é dado pelo inverso da taxa de juro de referência, assim determinando o capital que rende a taxa de juros. Nestes termos: f = 1 : 1% = 1 : 0,01 = 100 (pelo que o factor “f” é, no caso concreto, igual a 100).”.
-
Também no acórdão arbitral de 16/11/2016, proferido no processo n.º 287/2016-T, se reconhece que a fórmula em questão, na qual “f” corresponde a 100/i, foi corretamente aplicada.
-
Assim, no caso vertente, considerando uma taxa de juro de 0%, acrescida de um spread de 4%, temos: f= 1/ 0,04 = 25.
-
Pelo que se conclui que, também no que diz respeito à aplicação do fator “f” não houve qualquer erro por parte da AT.
-
Contrariamente ao que é alegado pelo Requerente, a norma que determina a aplicação da fórmula em apreço não configura uma presunção ilidível, mas sim perante a manifestação da opção do legislador pela adoção de um método objetivo de determinação do valor tributável das ações (não cotadas) à data da transmissão gratuita.
-
E também não tem qualquer base normativa o entendimento do Requerente segundo o qual, em vez do valor resultante da aplicação da fórmula, deve ser considerado o valor de mercado, o qual corresponderia àquele que entidades não relacionadas estariam dispostas a pagar pelas ações, em operações comparáveis.
-
Entende, ainda, o Requerente que a aplicação da fórmula em apreço se traduz numa violação do princípio da igualdade, por assentar numa discriminação injustificada entre formas jurídico-societárias, considerando que a referida fórmula, tal como foi aplicada pela AT, conduz a uma avaliação da sociedade anónima mais de 3 vezes superior à que resultaria se a mesma sociedade, com os mesmos indicadores económicos e patrimoniais, tivesse a forma de sociedade por quotas.
-
Para reforçar a sua argumentação, invoca o acórdão arbitral proferido no âmbito do processo n.º 287/2016-T, no qual se entendeu, designadamente, que a norma contida na alínea a) do n.º 3 do artigo 15.º do CIS, “…na redacção inicial, vigente em 2015, é materialmente inconstitucional, quando aplicado com base na taxa de juro de 0,05% para cálculo do factor de capitalização, por violação do princípio constitucional da igualdade (artigo 13.º da CRP) …”, em virtude de se ter considerado existir uma tributação excessiva, que não ocorre “… com as outras transmissões de participações sociais economicamente equiparáveis, designadamente acções cotadas e quotas, sem que haja qualquer justificação razoável para tributar acrescidamente as primeiras [as transmissões de ações não cotadas]”.
-
No referido acórdão, atendendo à data da transmissão em causa, foi julgada inconstitucional a norma contida na alínea a) do n.º 3 do artigo 15.º do CIS na versão anterior à alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 41/2016, de 1 de agosto.
-
Com efeito, o Decreto-Lei n.º 41/2016, de 1 de agosto, introduziu uma alteração à redação do artigo 15.º, n.º 3, alínea a), do CIS, determinando que à taxa de juro aí referida acrescesse, para efeitos de cálculo do fator de capitalização, um spread de 4 %.
-
Conforme explicitado no Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 41/2016, de 1 de agosto, a referida alteração “… corrige uma distorção criada pela redação anterior, na medida em que a taxa de referência do Banco Central Europeu se encontra atualmente em níveis próximos do zero, alterando, assim, a ratio subjacente à fórmula criada para o efeito …”.
-
Isto significa que o caso sub judice não é comparável com o que foi objeto de apreciação e decisão no processo n.º 287/2016-T, em virtude de o texto da norma ser distinto, sendo, naturalmente, diferente o resultado da sua aplicação.
-
A distinção, para efeitos fiscais, entre sociedades por quotas e sociedades anónimas é legítima, tal como o é a aplicação de regras diferenciadas na determinação do valor de transmissão de ações cotadas, de ações não cotadas e de quotas.
-
Refira-se que a solução legislativa espelhada na norma contida no artigo 15.º, n.º 3, alínea a), do CIS, permite assegurar a igualdade na determinação do valor da transmissão das ações não cotadas, com base em elementos objetivos, em linha com objetivos de neutralidade, transparência, previsibilidade e simplicidade.
-
Nesta matéria, subscreve-se o teor do Acórdão do Tribunal Constitucional nº 750/2022, de 4 de novembro de 2022, na parte em que refere o seguinte:
“13.1. A respeito dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, afirmou-se no Acórdão n.º 590/15:
«O princípio constitucional da igualdade tributária, como expressão específica do princípio geral estruturante da igualdade (artigo 13.º da Constituição), encontra concretização “na generalidade e na uniformidade dos impostos. Generalidade quer dizer que todos os cidadãos estão adstritos ao pagamento de impostos (…); por seu turno, uniformidade quer dizer que a repartição dos impostos pelos cidadãos obedece ao mesmo critério idêntico para todos” (TEIXEIRA RIBEIRO, Lições de Finanças Públicas, 5.ª edição, pág. 261). E tal critério, como sublinha CASALTA NABAIS, encontra-se no princípio da capacidade contributiva: “Este implica assim igual imposto para os que dispõem de igual capacidade contributiva (igualdade horizontal) e diferente imposto (em termos qualitativos ou quantitativos) para os que dispõem de diferente capacidade contributiva na proporção desta diferença (igualdade vertical)” (Direito Fiscal, 7.ª edição, 2012, pág. 155). Como pressuposto e critério de tributação, o princípio da capacidade contributiva “de um lado, constituindo a ratio ou causa da tributação afasta o legislador fiscal do arbítrio, obrigando-o a que na seleção e articulação dos factos tributários, se atenha a revelações da capacidade contributiva, ou seja, erija em objeto e matéria coletável de cada imposto um determinado pressuposto económico que seja manifestação dessa capacidade e esteja presente nas diversas hipóteses legais do respetivo imposto” (CASALTA NABAIS, ob. cit., pág. 157).
Assim o tem afirmado o Tribunal Constitucional, de que é exemplo o Acórdão n.º 84/2003:
«O princípio da capacidade contributiva exprime e concretiza o princípio da igualdade fiscal ou tributária na sua vertente de “uniformidade” – o dever de todos pagarem impostos segundo o mesmo critério – preenchendo a capacidade contributiva o critério unitário da tributação», entendendo-se esse critério como sendo aquele em que «a incidência e a repartição dos impostos – dos “impostos fiscais” mais precisamente – se deverá fazer segundo a capacidade económica ou “capacidade de gastar” (…) de cada um e não segundo o que cada um eventualmente receba em bens ou serviços públicos (critério do benefício). (…) Não obstante o silêncio da Constituição, é entendimento generalizado da doutrina que a “capacidade contributiva” continua a ser um critério básico da nossa “Constituição fiscal” sendo que a ele se pode (ou deve) chegar a partir dos princípios estruturantes do sistema fiscal formulados nos artigos 103º e 104º da CRP (…)».
Este Tribunal tem, todavia, salientado que o princípio da capacidade contributiva não dispensa o concurso de outros princípios constitucionais. Como se referiu no Acórdão n.º 711/2006, «é claro que o “princípio da capacidade contributiva” tem de ser compatibilizado com outros princípios com dignidade constitucional, como o princípio do Estado Social, a liberdade de conformação do legislador, e certas exigências de praticabilidade e cognoscibilidade do facto tributário, indispensáveis também para o cumprimento das finalidades do sistema fiscal». E prossegue: «Averiguar, porém, da existência de um particularismo suficientemente distinto para justificar uma desigualdade de regime jurídico, e decidir das circunstâncias e fatores a ter como relevantes nessa averiguação, é tarefa que primariamente cabe ao legislador, que detém o primado da concretização dos princípios constitucionais e a correspondente liberdade de conformação. Por isso, o princípio da igualdade se apresenta fundamentalmente aos operadores jurídicos, em sede de controlo da constitucionalidade, como um princípio negativo (…) - como proibição do arbítrio».
Em suma, na síntese do Acórdão n.º 695/2014, “o princípio da igualdade tributária pode ser concretizado através de vertentes diversas: uma primeira, está na generalidade da lei de imposto, na sua aplicação a todos sem exceção; uma segunda, na uniformidade da lei de imposto, no tratar de modo igual os contribuintes que se encontrem em situações iguais e de modo diferente aqueles que se encontrem em situações diferentes, na medida da diferença, a aferir pela capacidade contributiva; uma última, está na proibição do arbítrio, no vedar a introdução de discriminações entre contribuintes que sejam desprovidas de fundamento racional”.
O princípio da igualdade tributária é um corolário do princípio da igualdade perante a lei, consagrado no artigo 13.º da Constituição. Ora, tal princípio não proíbe todo e qualquer tratamento diferenciado, nem constitui função deste princípio garantir que todas as escolhas do legislador sejam racionais, coerentes ou correspondem à melhor solução possível.
Neste sentido, pode ainda trazer-se à colação a posição firmada no Acórdão n.º 546/2011:
«[O] n.º 1 do artigo 13.º da CRP, ao submeter os atos do poder legislativo à observância do princípio da igualdade, pode implicar a proibição de sistemas legais internamente incongruentes, porque integrantes de soluções normativas entre si desarmónicas ou incoerentes. Ponto é, no entanto – e veja-se, por exemplo, o Acórdão n.º 232/2003 – que o carácter incongruente das escolhas do legislador se repercuta na conformação desigual de certas situações jurídico-subjetivas, sem que para a medida de desigualdade seja achada uma certa e determinada razão. É que não cabe ao juiz constitucional garantir que as leis se mostrem, pelo seu conteúdo, “racionais”. O que lhe cabe é apenas impedir que elas estabeleçam regimes desrazoáveis, isto é, disciplinas jurídicas que diferenciem pessoas e situações que mereçam tratamento igual ou, inversamente, que igualizem pessoas e situações que mereçam tratamento diferente. Só quando for negativo o teste do “merecimento” – isto é, só quando se concluir que a diferença, ou a igualização, entre pessoas e situações que o regime legal estabeleceu não é justificada por um qualquer motivo que se afigure compreensível face à ratio que o referido regime, em conformidade com os valores constitucionais, pretendeu prosseguir – é que pode o juiz constitucional censurar, por desrazoabilidade, as escolhas do legislador. Fora destas circunstâncias, e, nomeadamente, sempre que estiver em causa a simples verificação de uma menor “racionalidade” ou congruência interna de um sistema legal, que contudo se não repercuta no trato diverso – e desrazoavelmente diverso, no sentido acima exposto – de posições jurídico-subjetivas, não pode o Tribunal Constitucional emitir juízos de inconstitucionalidade. Nem através do princípio da igualdade (artigo 13.º) nem através do princípio mais vasto do Estado de direito, do qual em última análise decorre a ideia de igualdade perante a lei e através da lei (artigo 2.º), pode a Constituição garantir que sejam sempre “racionais” ou “congruentes” as escolhas do legislador. No entanto, o que os dois princípios claramente proíbem é que subsistam na ordem jurídica regimes legais que impliquem, para as pessoas, diversidades de tratamento não fundados em motivos razoáveis.»
No caso em apreço, a argumentação que conduziu ao juízo de inconstitucionalidade e, consequente, recusa de aplicação da fórmula de cálculo constante da alínea a), do n.º 3, do artigo 15.º do CIS – ou, com maior precisão, da dimensão da variável f integrante dessa norma – por ofensa ao princípio da igualdade, elege um tertium comparationis (um «par comparativo») que não tem razão de ser perante o objetivo e função da norma em análise. Com efeito, a decisão a quo acaba por olvidar que não estamos perante situações objetivamente comparáveis – num caso, estamos perante ações com cotação oficial, cujo valor é imediatamente aferível, quer pelo titular das ações, quer por terceiros, e, no outro caso, não. Ora, é justamente pelo facto de estas últimas não terem uma cotação oficial que o legislador teve de adotar um critério (válido) de determinação do seu valor tributável. E, muito embora se reconheça que, ao estabelecer um critério ou método de avaliação fiscal das ações não cotadas, o legislador deve ter por desiderato último que o valor obtido nesse procedimento de avaliação (o valor presumido das ações) se aproxime do seu valor real, cabe ao legislador definir, com ampla margem de discricionariedade, qual é o melhor método para o fazer e tipificar a respetiva fórmula de cálculo.
Estando em causa a aplicação de métodos de avaliação distintos e situações objetivamente diversas, não se pode concluir que a solução jurídica consagrada pelo legislador ao integrar a dimensão normativa da variável f na fórmula constante da alínea a), do n.º 3, do artigo 15.º, do CIS, como método de avaliação das sociedades não cotadas, contende com o princípio da igualdade ou que o legislador tenha adotado uma solução discriminatória, arbitrária e carecida de fundamento racional. Aliás, tal asserção seria, desde logo, desmentida (e refutável) se estivesse em causa o apuramento do valor tributável de ações não cotadas a que fosse aplicável a taxa de juro de referência do BCE em vigor no ano de 2006 que, como se assinalou, se encontrava fixada em 4,5%. Por outro lado, não se pode também esquecer que as bolsas de valores sofrem também flutuações muitas vezes abruptas, podendo as ações cotadas sofrer valorizações ou desvalorizações inesperadas, provocadas por fatores efémeros ou conjunturais, muitas vezes alheios ao próprio funcionamento da empresa, que se refletem no seu valor tributável, em igual medida.
É, assim, de concluir que a dimensão normativa objeto de apreciação sub specie constitutionis não colide com o princípio da igualdade fiscal e, por essa via, não atinge o princípio da capacidade contributiva, entendido este, nos termos anteriormente referidos, como um critério de «autovinculação» do legislador.”
-
Questão distinta é a que se refere a uma eventual ofensa do princípio da proporcionalidade, por se considerar excessivo o valor resultante da aplicação da fórmula em apreço.
-
Sobre esta questão também se pronunciou o Tribunal Constitucional, no mesmo Acórdão, nos seguintes termos:
“14. Como tem este Tribunal sublinhado, no domínio da chamada «constituição fiscal», por força dos princípios formais e materiais que conformam o conceito constitucional de imposto e das garantias que são conferidas aos contribuintes, o exercício, por parte do Estado, do poder de tributar não pode ser concebido como uma afetação ou restrição de direitos fundamentais (cf. Acórdãos nºs. 846/2014 e 362/2016). O pagamento do imposto surge como um dever fundamental do contribuinte, orientado para a satisfação das necessidades públicas, e não como afetação de um direito, desde que respeitados os limites que decorrem do artigo 103.º da Constituição. Porém, como se fez notar naquele aresto, «se a conceção constitucional de tributo» […] é inimiga de qualquer construção que veja similitudes entre estas imposições e as vulgares restrições a direitos, liberdades e garantias, tal como estas últimas são reguladas pelo artigo 18.º da CRP, nem por isso se dispensa, quanto a elas, o requisito ou crivo da proporcionalidade, enquanto expressão de um princípio que, como já se disse, vale em Estado de direito (artigo 2.º) para todo o agir estadual. […].»
Ora, sendo certo que, como adverte o Acórdão n.º 285/2020, seja qual for o método de avaliação utilizado, «assiste uma inescapável margem de incerteza: não existe um «valor exato» quando se trata de avaliar uma determinada empresa», a liberdade tipificadora ou conformadora do legislador não pode deixar de ser sujeita a controlo, não podendo o legislador fazer uso de critérios que conduzam a um resultado de avaliação totalmente arbitrário, sem substrato ou aderência à realidade económica, ou eivado de «erro manifesto».
O princípio da proibição do excesso surge, assim, como parâmetro e princípio de controlo da atuação dos poderes públicos. Como se referiu no Acórdão n.º 362/2016, «o princípio do Estado de direito democrático consagrado no artigo 2.º da Constituição, pelas suas conotações históricas e devido à sua natureza de “princípio fundamental”, é expressão da ideia de que a garantia da liberdade, igualdade e segurança dos cidadãos se funda na sujeição do poder público a normas jurídicas: um Estado informado pela ideia de Direito não pode, sem negar a sua essência, ser um Estado prepotente, arbitrário ou injusto (cfr. os Acórdãos n.ºs 205/2000 e 491/2002)». Nessa mesma perspetiva, o Acórdão n.º 73/2009 entendeu «o princípio da proporcionalidade [como um] princípio geral de limitação do poder público que pode ancorar-se no princípio geral do Estado de Direito, impondo limites resultantes da avaliação da relação entre os fins e as medidas públicas, devendo o Estado (também o Estado legislador) adequar a sua ação aos fins pretendidos, e não estatuir soluções desnecessárias ou excessivamente onerosas ou restritivas». Na síntese do Acórdão n.º 387/2012, «o Estado de direito não pode deixar de ser um “Estado proporcional”».
Num juízo prima facie, a fórmula de cálculo acolhida na alínea a), do n.º 3, do artigo 15.º, do CIS, como critério de avaliação das ações que titulam o capital social de uma sociedade não cotada, parece respeitar o chamado teste da adequação, por permitir aferir do valor tributável destas ações, em sede de Imposto do Selo. Ou seja, a medida seria apta a atingir o fim a que se propõe.
Por outro lado, gozando o legislador de uma ampla liberdade de conformação na definição dos métodos ou critérios de avaliação a utilizar para avaliar as ações não cotadas, e apesar de poder haver outros métodos de avaliação igualmente eficazes, a solução legal encontrada parece ainda respeitar o crivo da necessidade (ou da exigibilidade).
De igual modo, ter-se-á de reconhecer que, ao estabelecer um critério de avaliação das sociedades não cotadas, com a consequente imposição da tributação deste facto tributário em sede de Imposto do Selo, não obstante a mesma implicar ipso facto uma ablação do património do titular das ações, não estamos perante uma medida restritiva de um direito fundamental (designadamente, do direito à propriedade privada, consagrado no artigo 62.º da Constituição).
Sucede, porém, que o princípio da proibição do excesso tem uma dimensão axiológica inequívoca, impedindo o sacrifício desproporcionado do que seja valioso. Ora, no caso em apreço, o comportamento estadual – consubstanciado na imposição da tributação sindicada nos autos – atinge um desvalor ostensivo e manifesto. Com efeito, é inegável que o critério normativo legalmente previsto para a avaliação deste lote de 6.910 ações, assente na aplicação da variável f da fórmula de cálculo constante da alínea a), do n.º 3, do artigo 15.º, do CIS, como fator de capitalização dos resultados líquidos da sociedade comercial em causa, em que f = a 2000, conduzindo a um valor final de avaliação em que “Va” = € 25.024.877,08, é notoriamente (frontalmente) iníquo e excessivo. Retomando os valores resultantes do apuramento efetuado pela Administração Tributária na avaliação reportada a 31 de dezembro de 2014, num juízo de normalidade das coisas e perante a nossa realidade económica, não é de todo equacionável que um lote de 6.910 ações de uma sociedade com o capital social de € 225.000,00, dividido em 45.000 ações, que tem um valor substancial de € 1.834.244,71 e resultados líquidos, nos dois últimos exercícios, de € 324.104,82, atinja o valor de € 25.024.877,08 (note-se que, se estivesse em causa a avaliação da global da sociedade – das 45.000 ações – tal corresponderia, com base no mesmo critério, a um valor aproximado de € 162.661.700,5).
Recorde-se aliás, como anteriormente se deixou exposto, que este lote de ações foi avaliado novamente, em 21 de dezembro de 2016, com base na mesma fórmula de cálculo, mas já com a redação que foi dada à norma legal em apreço pelo Decreto-Lei n.º 41/2016, de 1 de agosto, em que o fator de capitalização dos resultados líquidos foi calculado com base na taxa de juro de refinanciamento do BCE, acrescida de um spread de 4%, do qual resultou f = 25. De acordo com essa avaliação, foi atribuído a este lote de 6.910 ações o valor de € 472.389,70. Ou seja, estas ações teriam sofrido uma desvalorização, diga-se meramente artificial, por força da introdução (pelo próprio legislador) de um mecanismo destinado à correção da distorção gerada pelo facto de a taxa de refinanciamento do BCE se encontrar em valores (anormalmente) baixos.
Fica, assim, patente que a aplicação do segmento normativo sindicado conduziu a um resultado de avaliação do valor de “Va” – e, consequente, liquidação em sede de Imposto do Selo – que padece de erro manifesto.
Perante o exposto, é forçoso concluir que o segmento normativo constante da variável f, integrada na fórmula prevista na alínea a), do n.º 3, do artigo 15.º, do CIS, em que o fator de capitalização f = 100/0,05 (ou f = 2000), por aplicação da taxa de juro aplicada pelo Banco Central Europeu às suas principais operações de refinanciamento, tal como publicada no Jornal Oficial da União Europeia, em vigor na data em que ocorreu a transmissão, viola o princípio da proporcionalidade, enquanto proibição de excesso.”
-
Do Acórdão do Tribunal Constitucional citado resulta evidente a importância da alteração legislativa introduzida em 2016, tendo, em virtude dela, um “f” = 2000, que conduzia a um resultado “notoriamente (frontalmente) iníquo e excessivo”, passado para um “f “= 25.
-
E esse diferente resultado é decisivo em sede de princípio da proibição do excesso.
-
Entende este Tribunal que a aplicação da fórmula contida na alínea a) do n.º 3 do artigo 15.º do Código do Imposto do Selo, na redação vigente, na qual se considera, no caso sub judice, um fator “f” = 25, não se traduz num resultado totalmente arbitrário ou frontalmente iníquo ou excessivo, que permita concluir pela violação do princípio da proibição do excesso, contendo-se dentro dos limites da liberdade de conformação do legislador.
-
Conclui, assim, este Tribunal pela legalidade do ato impugnado, ficando prejudicado o conhecimento dos demais pedidos.
IV – DECISÃO
Nestes termos, e com os fundamentos expostos, este Tribunal Arbitral decide julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira do pedido, com todas as consequências legais.
V- VALOR DO PROCESSO
De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 82.760,00.
VI – CUSTAS
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.754,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo do Requerente.
Notifique-se.
Lisboa, 23 de fevereiro de 2023
Os árbitros,
Carlos Alberto Fernandes Cadilha
(Presidente)
Paulo Nogueira da Costa
(Relator)
Ana Rita do Livramento Chacim
|
|