umário:
I - O exercício do direito do contraditório mediante a audiência do interessado no decurso do procedimento destina-se a permitir a participação do contribuinte na formação da decisão, não podendo considerar-se sanada a preterição da formalidade através da ulterior intervenção do interessado em procedimentos de segundo grau ou no âmbito do processo de impugnação judicial dos atos de liquidação;
II - A não identificação, no relatório de inspeção tributária, de entidades terceiras cuja atividade terá sido determinante para a correção tributária na esfera jurídica do sujeito passivo, tendo inviabilizado que o contribuinte pudesse participar e influenciar a formação da vontade da Administração, quer no plano argumentativo, quer através da carreação de novos elementos de facto, representa uma violação do princípio da participação no procedimento;
III - Neste condicionalismo, nada obsta a que o vício de forma seja conhecido com precedência relativamente à matéria de fundo, à luz do critério consignado no artigo 124.º, n.º 2, alínea b), in fine, do CPPT.
DECISÃO ARBITRAL
Acordam em tribunal arbitral
I – Relatório
1. A..., LDA, contribuinte n.º..., com sede na Rua ..., nº..., ...-... ..., vem requerer a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, para apreciar a legalidade da liquidação adicional de IRC, no valor de € 46 909,06, acrescida de juros compensatórios de € 1 740,14, e da liquidação de IVA, no valor de € 39 515,82, acrescida de juros compensatórios de € 7 589,88, referentes ao ano de 2016, bem como da decisão de indeferimento das reclamações graciosas contra eles deduzidas.
Fundamenta o pedido nos seguintes termos.
No âmbito do procedimento de reclamação graciosa, a Autoridade Tributária omitiu diligências requeridas pelo contribuinte em vista à descoberta da verdade material, designadamente no tocante à produção de prova testemunhal arrolada, com a consequente violação do princípio do inquisitório, e, no procedimento de inspeção tributária, preteriu formalidades essenciais, na medida em que o procedimento foi qualificado como inspeção interna, mas constituiu um procedimento externo por via da informação recolhida através outros procedimentos inspetivos realizados junto de terceiras entidades.
Além de que a Autoridade Tributária não procedeu à notificação prévia à impugnante do início da inspeção e do fim, âmbito e extensão do procedimento, nem possibilitou a sua participação nas decisões que lhe diziam respeito, violando assim o disposto nos artigos 60º da LGT e 8º e 60º do RCPITA.
A Autoridade Tributária incumpriu também o prazo de 6 meses, desde a notificação ao interessado do início do procedimento, a que se refere o artigo 36º, nº 2, do RCPIT.
Acresce que, por ofício de 27 de novembro de 2020, a impugnante remeteu à direção de finanças do Porto procuração forense a favor de sociedade de advogados, sendo que o mandatário foi notificado do relatório final de inspeção tributária, mas não das liquidações que resultaram das correções tributárias.
Os atos de liquidação enfermam ainda de falta de fundamentação, na medida em que o relatório de inspeção tributária, em que se baseiam, efetua transcrições do relatório elaborado no âmbito de procedimento inspetivo desencadeado contra a B..., fornecedora da Requerente, em que são feitas referências aos procedimentos inspetivos realizados às entidades designadas por C…, B…, A… e A1… (ponto III.1) e efetuado o cruzamento entre a faturação emitida pela B... a favor da Requerente e a subcontratação pela B... às entidades C… e B… (ponto III.3.2.1.), sem que a impugnante possa identificar as entidades terceiras que foram envolvidas no procedimentos inspetivos.
As correções tributárias respeitam a IVA deduzido indevidamente e ao apuramento do lucro tributável em IRC por terem sido considerados gastos não aceites fiscalmente, sendo que o procedimento inspetivo que originou essas correções tiveram por base um outro procedimento realizado à sociedade B..., LDA., em que foi apurada a existência de negócios simulados entre essa entidade e alguns dos seus fornecedores, entre os quais a impugnante.
Relativamente às diversas faturas consideradas, entende a Requerente que a data de saída das matérias-primas das instalações da impugnante sustenta a veracidade e materialidade das transações, e apenas em relação às faturas nº 397, n.º 439 e nº 455, emitidas pela B..., e às faturas n.º 09, n.º 45 e nº 72, emitidas pela impugnante à C..., é que se verificou que a mercadoria foi entregue em momento anterior à emissão da guia de transporte, o que sucedeu por se tratar de quantidades pouco significativas que foi transportada pelos trabalhadores da própria Requerente.
Havendo de concluir-se que não se trata de negócios simulados.
A Requerente contesta ainda que, com a referência ...4785-C, tenham sido faturadas quantidades inferiores às subcontratadas e que as faturas emitidas pela B... a favor da Impugnante, correspondentes a mercadoria constante de faturas emitidas pela entidade designada C… a favor da B... respeitem a negócios simulados.
Em primeiro lugar, o Relatório de Inspeção Tributária omite a identificação das entidades envolvidas, impedindo a Requerente de exercer o seu direito de participação no procedimento, o que também corresponde ao vício de falta de fundamentação.
Por outro lado, a desconsideração da veracidade das transações realizadas pela Requerente viola o princípio da liberdade de iniciativa empresarial, bem como o princípio da legalidade e da tributação segundo o lucro real.
A Autoridade Tributária, na sua resposta, sustenta que o procedimento de inspeção realizado à atividade da Requerente teve origem num anterior do procedimento de que foi objeto a sociedade B..., que revelou um esquema de fraude fiscal consistente na criação de sociedades instrumentais, que funcionavam como prestadores de serviços subcontratados, que, através de operações simuladas, permitiam a dedução a jusante do IVA nas entidades utilizadoras da faturação.
Verificou-se que as faturas emitidas pela B... a favor da Requerente, no montante global de € 235.080,06, correspondem a faturas emitidas pela entidade C (assim designada no Relatório de Inspeção Tributária), que, por sua vez, estão relacionadas com a subcontratação efetuada por C… junto de B… e por B… junto a A… e A1… e sobre as quais existem fortes indícios de se tratar de negócios simulados. Tendo em consideração que as entidades subcontratadas, incluindo a B..., não dispõem dos necessários fatores produtivos, e, em especial, de estrutura organizacional e política comercial de subcontratação para as operações de transação de bens.
Quanto à alegada preterição de formalidades essenciais, no âmbito do procedimento inspetivo, a Autoridade Tributária refere que o procedimento foi de natureza interna, tendo tido por base pedidos de esclarecimento e de informação junto do sujeito passivo e a utilização de elementos coligidos no decurso de inspeções a outras entidades que mantinham relações económicas com a Requerente.
Por outro lado, não ocorreu qualquer violação do disposto no artigo 40.º do CPPT, porquanto, tendo sido constituído mandatário pelo sujeito passivo, em 10 de novembro de 2020, e tendo sido concluído o procedimento inspetivo em 26 de novembro seguinte, não é possível estender os efeitos da procuração forense aos atos posteriores, que respeitam ao procedimento de liquidação do tributo, e que, por isso, não tinham de ser notificados ao mandatário.
Também não seria exigível que houvesse lugar à produção de prova testemunhal no decurso do procedimento inspetivo, uma vez que a prova da verosimilhança das operações económicas teria de ser efectuada através de prova documental, nomeadamente com base na correspondência a referenciar as encomendas e serviços a prestar e as guias de transporte, sendo que essa prova, ainda que tenha sido solicitada ao sujeito passivo, não foi apresentada.
Não se verificou também o invocado vício de falta de fundamentação, porquanto, mesmo que não tenham sido identificados, no procedimento inspetivo, os prestadores de serviços a montante do circuito económico, a Requerente demonstrou ter compreendido que as operações, pelas razões dele constantes, correspondiam a negócios simulados.
Nesse sentido apontam as incongruências detectadas nas faturas emitidas pela Requerente e pela B... quanto à data da colocação dos artigos à disposição do adquirente, verificando-se que, em diversas faturas, a mercadoria foi entregue em data posterior à da emissão da fatura.
Conclui a Autoridade Tributária que existem fortes indícios que permitem considerar que as operações comerciais realizadas entre Requerente e a B... correspondem a negócios simulados.
2. No seguimento do processo houve lugar à reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, também destinada à produção de prova testemunhal indicada pela Requerente, que se realizou no dia 14 de outubro de 2022.
Na reunião, o mandatário da Requerente requereu que a Autoridade Tributária juntasse aos autos cópia do despacho que ordenou a inspeção e das credenciais que tenham sido emitidas, os pedidos de extensão da inspeção, as notificações feitas à Requerente, eventuais cotas, informações ou autos lavrados pelos inspetores ou outros responsáveis do serviço de finanças e a informação donde conste as viaturas inscritas a favor da sociedade B... nos anos de 2015 a 2017.
Por despacho ditado para a ata, o tribunal notificou a Requerida para juntar, no prazo de dez dias, os documentos solicitados e determinou o prosseguimento do processo para alegações, pelo prazo sucessivo de dez dias, que começará a correr a contar da junção da prova documental requerida ou do termo do prazo concedido para o efeito.
Em alegações, a Requerente e a Requerida procuraram fixar os factos que consideram como assentes e mantiveram quanto à matéria de direito as suas anteriores posições.
3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.
Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, os árbitros foram designados pelas partes, tendo o Conselho Deontológico designado o árbitro presidente, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 6 de junho de 2022.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas exceções.
Cabe apreciar e decidir.
II - Fundamentação
Matéria de facto
4. Os factos relevantes para a decisão da causa tidos como assentes são os seguintes.
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A Requerente foi alvo de um procedimento de inspeção, credenciado pela Ordem de Serviço OI2020..., referente ao ano de 2016, que teve como objectivo averiguar se as transações comerciais realizadas entre a Requerente e a B..., no montante de € 235.800,00, se relacionam com negócios simulados que foram detectados no âmbito de um procedimento inspetivo dirigido a esta última entidade, ao abrigo da Ordem de Serviço OI2019....
-
No âmbito do procedimento inspetivo foi elaborado projeto de relatório de inspeção tributária no qual é proposta uma correção tributária, no montante de € 43.958,06, por indevida dedução de IVA, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 19.º CIVA, bem como uma correção tributária, em sede de IRC, no montante de € 191.122,00, por não dedutibilidade dos gastos para efeitos fiscais, nos termos do art.º 23.º do CIRC, relativamente às faturas n.ºs 397/2016, 421/2016, 439/2016, 455/2016, 475/2016, 497/2016, 524/2016, 549/2016, 573/2016, 596/2016, 627/2016 e 546/2016 emitidas pela B... Unipessoal, Lda. a favor da Requerente.
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Por ofício de 27 de outubro de 2020, enviado pelo correio registado, a Requerente foi notificado do projeto de relatório de inspeção tributária para efeito do exercício do direito de audição.
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Após a prorrogação do respetivo prazo, a Requerente exerceu o direito de audição, em 12 de novembro de 2020, dizendo, na parte relevante, o seguinte:
1.Desde logo, relativamente ao que consta de fls. 30, não foram emitidas faturas pelo SP relativas à referência ...3855-E quando houve subcontratação de 228 pares, cumpre esclarecer que tais pares foram vendidos, conforme fatura 2016/0314, de 02/12/2016, remetida a V. Exas. por email de 07/04/2020, que ora junta.
2.Relativamente à apontada divergência de 732 pares, referida na mesma folha do projeto de relatório, a mesma também não se verifica pois que, os 732 foram vendidos pela exponente, como resulta das suas faturas 2016/0078 e 2016/0045 (192 + 240 + 300 pares) que ora junta.
3.Esclarece que não é verdade que as operações tidas com a B... sejam inverosímeis, nem percebe como a ATA chegou a tal conclusão.
[…].
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O procedimento inspetivo originou uma correção tributária, no montante de € 43.958,06, por indevida dedução de IVA, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 19.º CIVA, bem como uma correção tributária, em sede de IRC, no montante de € 191.122,00, por não dedutibilidade dos gastos para efeitos fiscais, nos termos do art.º 23.º do CIRC, relativamente às seguintes faturas:
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O Relatório de Inspeção Tributária, elaborado no âmbito do procedimento inspetivo dirigido à atividade da Requerente, que aqui se dá como reproduzido, na parte especificamente dirigida à Requerente, encontra-se fundamentado nos seguintes termos.
III.3.2 – Procedimento de inspeção ao SP (A...)
Tendo a B... declarado operações comercias com o SP, no montante €235.800,00, e face às conclusões do procedimento de inspeção realizado à referida sociedade, nomeadamente à existência de negócios simulados com o seu principal fornecedor, C…, foi solicitada a presente Ordem de Serviço Interna, com o seguinte objetivo:
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Cruzar a faturação emitida pela B... para o SP subjacente à subcontratação efetuada junto da C…, uma vez que estes negócios foram considerados simulados e, consequentemente, toda a cadeia de faturação a jusante também corresponde a negócios simulados.
Nesse sentido, foram solicitados, por e-mail, os seguintes elementos ao SP:
(…)
1. Extrato de conta corrente relativo às operações efetuadas com a sociedade B...-
Lda., doravante B..., NIPC...; 2. Faturas e/ou outros documentos emitidas pela B... e contabilizadas pelo SP,- bem como os meios de pagamento utilizados;
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Documentos de transporte que suportaram as operações realizadas com a B..., nomeadamente os que se referem aos movimentos entre as instalações do SP e da B... e vice-versa;
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Descrição pormenorizada dos serviços/bens subcontratados/adquiridos à B..., que foram faturados através das faturas mencionadas no ponto 2;
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Identificação das pessoas que representavam a B...;
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Troca de correspondência entre as referidas entidades (SP e B...) bem como emails e notas de encomenda, que evidenciem os contactos prévios tendo em vista as operações realizadas
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Faturas emitidas pelo SP para os seus clientes, que correspondam aos serviços/bens mencionados nas faturas do ponto 2;
-
Identificação de outros fornecedores que prestaram/venderam serviços/bens idênticos aos mencionados nas faturas do ponto 2, bem como os montantes respetivamente faturados. (…)
• Em resposta ao pedido, o SP remeteu os elementos solicitados, referindo o seguinte relativamente aos seguintes pontos: Ponto 2 – Pagamento através de cheque;
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Ponto 4 – Fabrico total do sapato;
-
Ponto 5 – W...; Ponto 6 – Nada refere.
Quanto aos pontos 2, 3 e 7, o SP remeteu, por mês, as faturas emitidas para os clientes que corresponderam à “subcontratação” efetuada à B... e não remeteu documentos de transporte dos bens da B... para ele.
Contudo, da consulta ao sistema de informação da AT verifica-se que a B... fez a comunicação, através do e-fatura, de guias de transporte para o SP.
Da análise às referidas guias de transporte verifica-se o seguinte:
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As guias de transporte só foram emitidas a partir de junho de 2016;
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Em regra, as datas de emissão das guias de transporte coincidem com as datas de emissão das faturas da B... para o SP, ou seja, quer as guias de transporte quer as faturas foram emitidas com a mesma data;
-
As guias de transporte não identificam a viatura de transporte e todas têm como data de “fim de transporte” 23:00 h.
Comparando as datas das faturas emitidas pela B... para o SP (que em regra coincidem com as datas das guias de transporte) com as datas das faturas emitidas pelo SP verifica-se que estas, na maioria das situações, têm datas anteriores, ou seja, o SP emitiu a fatura para o cliente sem ainda ter “recebido” os artigos e a respetiva documentação:
Por outro lado, da análise às faturas emitidas pelo SP verifica-se:
-
Tiveram como destinatário um único cliente: C... Lda., NIPC...; Mencionam como viatura de transporte “V/CARRO”, ou seja, do cliente (c...) e mencionam apenas a hora de partida (não mencionam o local de carga e descarga).
Da consulta aos documentos de transporte comunicados, através do e-fatura, pelo SP, verifica-se que para o cliente C..., com exceção de 4 documentos de transporte (1 em outubro, 1 em novembro e 2 em dezembro), nada mais foi comunicado.
Assim, face à ausência da comunicação de documentos de transporte e aos factos mencionados nas faturas emitidas para o cliente C...(“V/CARRO” e a hora), conclui-se que a fatura emitida pelo SP foi o suporte documental para a realização do transporte.
Tal facto evidência incongruências insanáveis:
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O SP nunca poderia ter entregado artigo (sapatos) que não tinha, uma vez que, em vários meses, as datas das faturas emitidas pelo SP são anteriores às datas das guias de transporte/faturas (estas também mencionam a data de colocação à disposição dos artigos) emitidas pela B..., conforme se demonstra no quadro supra.
Outros factos que realçam da análise são os seguintes:
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As quantidades faturadas pelo SP, da referência ...4785-C, foram inferiores às quantidades subcontratadas:
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Não foram emitidas faturas pelo SP relativas à referência ...3855-E, quando houve “subcontratação” de 228 pares (fatura n.º 627 da B...).
III.3.2.1 – Cruzamento entre a faturação emitida pela B... (para o SP) e a subcontratação efetuada à C
Com base nos elementos recolhidos no SP (faturas emitidas pela B...) e no procedimento de inspeção efetuada à B... procedeu-se, através dos descritivos e das quantidades mencionados nas faturas, ao cruzamento das faturas emitidas da C para a B... e às emitidas por esta para o SP.
Conforme quadro seguinte, verifica-se que as faturas emitidas da B... para o SP correspondem as seguintes faturas emitidas da C para a B..., tendo estas sido consideradas negócios simulados, por estarem correlacionadas com a subcontratação efetuada por C… junto de B:
As faturas n.º 125, 150, 171, 190, 206, 229, 268, 294, 318, 346 e 363, emitidas por C…, fazem parte da relação do Anexo 4 referido na página 24 do presente Relatório (subcontratos faturados por B a C, considerados negócios simulados).
Da análise ao quadro verifica-se que:
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As datas de emissão das faturas da C… para B... e da B... para o SP coincidem quase todas;
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O SP contabilizou faturas emitidas pela B... no montante de €235.080,06;
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Essas faturas estão correlacionadas com as faturas emitidas da C… para a B... base tributável de €191.122,00 e IVA de €43.958,06).
Uma vez que que as faturas emitidas da C… para B..., mencionadas no quadro, corresponderam a negócios simulados, consequentemente toda a cadeia de faturação correlacionada a jusante (ou seja, faturas emitidas da B... para o SP) também corresponderam a negócios simulados.
III.3.3 – CONCLUSÃO
Tendo presente que as faturas emitidas pela sociedade B... para o SP têm como descritivo serviços prestados no âmbito da fabricação de calçado - os quais se encontrariam relacionados com um conjunto de operações (corte, costura, montagem, acabamento,…) - quer pela B..., quer pelas firmas identificadas na cadeia a montante também como subcontratadas umas das outras, isso implicaria necessariamente, para todas as entidades que surgem como emitentes dessa faturação, os seguintes pontos a observar:
III.3.1 – Fatores produtivos na vertente das entidades subcontratadas na origem da cadeia de faturação
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A necessidade de capacidade instalada (instalações, equipamento, organização empresarial…); A necessidade de capital humano para as operações de transformação das matérias-primas inerentes à fabricação do calçado, ao qual acresce a especialização dos funcionários para esses trabalhos;
-
A necessidade de um planeamento organizacional como suporte às prestações de serviços subcontratadas, desde o programa fabril a partir da data da encomenda, como seja: a entrada dos materiais para manufaturar, da posterior entrega do produto acabado/semiacabado, do controle dessas quantidades, do controle de qualidade, das necessidades de transporte daí decorrentes, da movimentação e controle financeiro inerente à globalidade da atividade;
Em síntese, verificou-se a falta destes requisitos no universo das entidades identificadas como prestadores de serviços e, nessa conformidade, fica patente a inverosimilhança das operações comerciais que tiveram como último destinatário a entidade inspecionada, com suporte na faturação emitida pela B... .
III.3.2 – Na vertente do SP
A necessidade de se verificar um conjunto de fatores que induzisse para a efetivação dos negócios colocados em crise, o que não se verificou no âmbito da análise dos suportes documentais associada à faturação da B... rececionada pelo SP, ao que acresce a falta de controle interno decorrente do processo de fabricação fora das suas instalações.
Em síntese, fica patente a falta de comprovação das operações por inexistência de detalhes considerados fundamentais no âmbito da estrutura organizacional e da política comercial de subcontração, uma vez que tais operações não se relacionam com bens transacionáveis, pelo que se impõe um controle interno devidamente implementado de forma a ter em conta: a encomenda e a sua realização, a saída das matérias-primas e a entrada de produtos transformados, a observação e interligação dos prazos (encomenda e disponibilidade de execução por parte da empresa subcontratada, entrega das matérias-primas e a receção dos produtos manufaturados, o controlo de qualidade, os materiais excedentes, os materiais que foram adicionados pelo subcontratado no decorrer do processo de fabricação), o controle de qualidade, a conjugação dos transportes em todo o processo, entre outras situações.
III.3.3 – Factos apurados
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As firmas tidas como prestadoras de serviços na origem da cadeia de faturação, a montante da B..., incluindo a própria, não possuem as exigências acima elencadas (fatores produtivos na vertente da entidade subcontratada) para se poder admitir que estejam inseridas num qualquer processo produtivo na área da fabricação de calçado.
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No âmbito do SP, enquanto utilizador das faturas emitidas pela B..., apesar da documentação exibida e dos suportes financeiros pretensamente relacionados, verificou-se a falta de outros requisitos tidos como essenciais na comprovação das operações de subcontratação, nomeadamente:
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Correspondência (via postal ou via eletrónica), uma vez que não se mostra viável que uma encomenda de um serviço prestado, com aplicação de materiais fornecidos pelo SP, não tenha sido exibido um qualquer suporte documental de detalhe e da especificidade do trabalho a realizar;
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Notas de encomenda;
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Não existir evidências em cada operação relacionados com os prazos de entrega dos materiais para transformação e da sua posterior execução em toda a cadeia de faturação;
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Inexistência de ordens de fabrico relacionadas com a execução do tipo de serviço sob encomenda, no âmbito do controle interno das operações a subcontratar fora das próprias instalações;
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Falta de exibição de suporte documental do protótipo (sapato/bota) a executar no âmbito do serviço a prestar;
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Da evidente falta de logística para efeitos do controle de qualidade dos produtos manufaturados no universo das empresas que surgem em todo o processo de fabricação;
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Da falta de critério relacionado com os transportes (proprietário das viaturas a utilizar e custos inerentes), quer em relação às necessidades que decorrem dos materiais para transformação nos supostos prestadores de serviços, quer em relação às unidades após fabricação com destino às instalações do SP.
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As singularidades verificadas, após análise do conteúdo das faturas emitidas pelos operadores envolvidos e as que foram rececionadas pelo SP revelam que as operações se cingiram apenas à base documental e nunca a concretização de algum negócio comercial.
Neste contexto, verificou-se a falta de um conjunto de requisitos tidos como necessários em processos produtivos de subcontratação e, nessa conformidade, fica patente a inverosimilhança das operações comerciais que tiveram como último destinatário a entidade inspecionada, com suporte na faturação emitida pela B... .
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No Relatório Final de Inspeção Tributária, os serviços inspetivos, pronunciaram-se sobre a argumentação constante do exercício do direito de audição, a que se refere a antecedente alínea D), nos seguintes termos:
Quanto ao ponto 1, junto como anexo 1, a fatura 2016/0314, de 2020/12/02, remetida pelo SP, na qual não consta a referência ...3855-E.
Quanto ao ponto 2, as faturas n.ºs 45 e 78 não foram remetidas, ao contrário do que invoca, mas da análise ao conteúdo da fatura n.º 45, fica evidenciado mais uma incongruência insanável:
- O SP nunca poderia ter entregado artigo - ...4785-C - que não tinha, uma vez que o entregou ao cliente C... em 2016/02/16, conforme consta da fatura n.º 45 (540 quantidades), quando só foram entregues pela B... em 2016/03/5, conforme consta da fatura n.º 439.
Ou seja, o SP não invoca absolutamente nada para o probatório das operações comerciais realizadas entre o SP e a B... .
Assim, tipificados os negócios como simulados entre os operadores em causa, com a devida fundamentação de facto e direito, serão de se manter as correções propostas no Projeto de Relatório.
Relativamente à solicitação manifestada em DA para a prova testemunhal de 2 testemunhas, cumpre-nos informar:
- Considerando a consistência da comprovação adquirida no procedimento de inspeção sobre todos os elementos relevantes ou com interesse para a tomada de decisão final, bem como a argumentação do SP no exercício do respetivo direito de audição, mostra-se desnecessário realizar as diligências complementares da respetiva audição, uma vez que a realização da mesma se apresenta desprovida de qualquer utilidade para a complementaridade das necessidades de instrução do procedimento.
-
A Requerente foi notificada do Relatório Final de Inspeção Tributária, nos termos do artigo 62.º, n.º 2, do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA), por ofício datado de 27 de novembro de 2020.
-
A Requerente outorgou procuração forense à sociedade de advogados D... e E..., em 10 de novembro de 2020.
-
O Relatório Final de Inspeção Tributária foi notificado ao mandatário da Requerente, nos termos do artigo 40.º do CPPT, por ofício datado de 18 de dezembro de 2020.
-
A Autoridade Tributária comunicou à Requerente, por ofício datado de 15 de janeiro de 2021, a notificação efetuada ao seu mandatário constituído.
-
A Requerente apresentou reclamação graciosa contra a correção tributária em sede de IVA, que foi indeferida por despacho de 7 de dezembro de 2021, do Chefe de Serviço de Finanças, notificado por ofício enviado por carta registada em 9 de dezembro seguinte.
-
A decisão de indeferimento da reclamação graciosa encontra-se fundamentada por remissão para a informação dos serviços elaborada para efeito do exercício do direito de audição, que consta do processo administrativo, parte 13, e que aqui se dá como reproduzida.
-
Relativamente à prova testemunhal arrolada na reclamação graciosa, a informação dos serviços a que se refere a antecedente alínea M) consignou o seguinte:
III.4 Prova testemunhal
No que respeita à prova testemunhal apresentada, cumpre dizer que no procedimento de reclamação graciosa, a prova está restringida à sua forma documental, de acordo com o disposto no artigo 69.º al. e) do CPPT, em obediência aos princípios da simplicidade e celeridade que norteiam este tipo de procedimento. Por outro lado, atendendo a que os factos aqui em apreço não se compaginam com a prova testemunhal, requerendo-se que a mesma seja documental, objetiva e inequívoca, será a mesma dispensável, pelo que se indefere a pretensão do reclamante quanto à inquirição requerida.
-
A Requerente apresentou reclamação graciosa contra a correção tributária em sede de IRC, que foi indeferida por despacho de 7 de dezembro de 2021, do Chefe de Serviço de Finanças, notificado por ofício enviado por carta registada em 9 de dezembro seguinte.
-
A decisão de indeferimento da reclamação graciosa encontra-se fundamentada por remissão para a informação dos serviços elaborada para efeito do exercício do direito de audição, que consta do processo administrativo, parte 6, e que aqui se dá como reproduzida.
-
Relativamente à prova testemunhal arrolada na reclamação graciosa, a informação dos serviços a que se refere a antecedente alínea P) consignou o seguinte:
III.4 Prova testemunhal
No que respeita à prova testemunhal apresentada, cumpre dizer que no procedimento de reclamação graciosa, a prova está restringida à sua forma documental, de acordo com o disposto no artigo 69.º al. e) do CPPT, em obediência aos princípios da simplicidade e celeridade que norteiam este tipo de procedimento. Por outro lado, atendendo a que os factos aqui em apreço não se compaginam com a prova testemunhal, requerendo-se que a mesma seja documental, objetiva e inequívoca, será a mesma dispensável, pelo que se indefere a pretensão do reclamante quanto à inquirição requerida.
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As correções tributárias originaram a liquidação em IRC n.º 2020..., com o valor a pagar de € 46.909,05, e a liquidação em IVA n.º 2020..., com o valor a pagar de € 1.740,14.
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Na sequência do requerimento deduzido pela Requerente na reunião a qu se refere o artigo 18.º do RJAT, a Autoridade Tributária veio juntar, através do requerimento de 24 de novembro de 2022, o procedimento inspetivo completo relativo à Requerente, de que consta uma informação do inspetor tributário, datada de 26 de fevereiro de 2020, a proposta de emissão de credencial para a abertura do procedimento, o respetivo despacho de concordância e uma informação relativa às conclusões de uma anterior ação inspetiva, credenciada pela OI2019..., referente à B..., Lda., bem como os pedidos de esclarecimento e a resposta do sujeito passivo, documentos esses que aqui se dão como reproduzidos.
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No mesmo requerimento, a Autoridade Tributária juntou uma listagem de viaturas inscritas em nome da sociedade B..., Lda, que aqui se dá como reproduzida.
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A informação a que se refere a antecedente alínea S) da matéria de facto é do seguinte teor:
INFORMAÇÃO
Na sequência da ação inspetiva ao sujeito Passivo (SP) B... LDA., doravante B..., NIPC..., credenciada pela Ordem de Serviço Externa 012019... e com incidência ao ano 2016, foi apurada a existência de negócios simulados entre ele e alguns dos seus fornecedores.
A sociedade B... declarou prestações de serviço de fabrico de calçado de € 2.299.198,59 e contabilizou na rubrica de subcontratos o montante de € 2.048.715,48 do qual € 1.875.480,20 foi considerado negócios simulados no âmbito da ação inspetiva supra referida.
Nessa ação, foi apurada a existência de um esquema de fraude fiscal através da criação de sociedades instrumentais a montante da B... - controladas por esta — o que permitiu a dedução a jusante do IVA pelas entidades utilizadoras da faturação.
No ano de 20161 a B... teve como principais fornecedores a sociedade F... LDA., doravante F..., NIPC ... e a sociedade G... UNIPESSOAL, LDA., doravante G..., NIPC..., tendo contabilizado na rubrica de subcontratos os montantes de € 1.844.737,20 e € 30.743,001 respetivamente.
Por sua vez, a sociedade F... teve como principal fornecedor a sociedade G..., tendo contabilizado na rubrica de subcontratos o montante € 1.822.144,23 que posteriormente faturou, como prestações de serviço, para a sociedade B... por € 1.844.73722.
A sociedade F... teve início de atividade em 2014-03-07 e emitiu faturas de prestação de serviços de fabrico de calçado (corte, costura, montagem, acabamento e embalamento), tendo como gerente o filho da gerente da B... .
A sociedade G... teve início de atividade em 2015-09-02 e emitiu faturas de prestações de serviços de fabrico de calçado (corte, costura, montagem, acabamento e embalamento), tendo como funcionários o irmão e sobrinho do gerente da B... .
Apesar de ambas sociedades terem sido cumpridoras das suas obrigações fiscais, verificou-se que as mesmas se limitaram a emitir faturas de prestações de serviços que, por sua vez. foram supostamente subcontratadas a fornecedores que não dispunham de estrutura para realizar essas operações e não cumpriam com as suas obrigações fiscais, pelo que as operações realizadas pelas sociedades G... e F... com os seus fornecedores (H... UNIPESSOAL Lda. e I... UNIPESSOAL Lda.) foram também consideradas negócios simulados.
Ou seja, basicamente a cadeia de faturação foi a seguinte:
Em conclusão, na ação inspetiva à Sociedade B... as faturas emitidas pelas sociedades F... e G... que tiveram subjacente subcontratações efetuadas aos fornecedores, H... e I... foram consideradas operações simuladas e, por sua vez, as faturas emitidas pela B..., relativas a essas subcontratações, também corresponderam a operações simuladas, pelo que se propõe, para apreciação, ações inspetivas ao ano de 2016, em sede de IVA e IRC, aos seguintes clientes da B..., a fim de serem corrigidas as operações que comprovadamente sejam tidas como simuladas:
J... Lda, NIPC ...;
A... Lda., NIPC...;
K... Lda., NIPC ...;
L... - Unipessoal Lda., NIPC ...;
M... Lda., NIPC ...;
N... Lda., NIPC...;
O... Lda., NIPC...;
P... Unipessoal Lda., NIPC...;
Q... Unipessoal Lda., NIPC...;
R... Lda., NIPC ... .
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A sociedade B... Unipessoal, Lda. emitiu a favor da Requerente, em 26 de janeiro de 2016, a fatura n.º 1/397 referente a prestação de serviços de corte, costura, montagem e acabamento de 1.920 pares de sapatos, com a referência ...3939-C.
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A sociedade B... emitiu a favor da Requerente, em 18 de fevereiro de 2016, a fatura n.º 1/421 referente a prestação de serviços de corte, costura, montagem e acabamento do total de 2.400 pares de sapatos, com a referência ...3939-C.
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A sociedade B... emitiu a favor da Requerente, em 15 de março de 2016, a fatura n.º 1/439 referente a prestação de serviços de corte, costura, montagem e acabamento de 2.158 pares de sapatos, com a referência ...-4785-C.
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A sociedade B... emitiu a favor da Requerente, em 31 de março de 2016, a fatura n.º 1/455 referente a prestação de serviços de corte, costura, montagem e acabamento de 2.582 pares de sapatos, com a referência 5309-F.
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A sociedade B... emitiu a favor da Requerente, em 4 de maio de 2016, a fatura n.º 1/475 referente a prestação de serviços de corte, costura, montagem e acabamento de 2.730 pares de sapatos, com a referência ...5309-F.
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A sociedade B... emitiu a favor da Requerente, em 8 de junho de 2016, a fatura n.º 1/497 referente a prestação de serviços de corte, costura, montagem e acabamento de 1962 pares de sapatos, com a referência ...4785-A, e de 1.138 pares de sapatos, com a referência ...3939-D.
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A sociedade B... emitiu a favor da Requerente, em 14 de julho de 2016, a fatura n.º 1/524 referente a prestação de serviços de corte, costura, montagem e acabamento de 1.114 pares de sapatos, com a referência ...3939-D, e de 1.560 pares de sapatos, com a referência ...3939-Z.
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A sociedade B... emitiu a favor da Requerente, em 10 de agosto de 2016, a fatura n.º 1/549 referente a prestação de serviços de corte, costura, montagem e acabamento de 2.000 pares de sapatos, com a referência ...3872-A.
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A sociedade B... emitiu a favor da Requerente, em 27 de setembro de 2016, a fatura n.º 1/573 referente a prestação de serviços de corte, costura, montagem e acabamento de 2.100 pares de sapatos, com a referência ...3855-X.
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A sociedade B... emitiu a favor da Requerente, em 27 de outubro de 2016, a fatura n.º 1/596 referente a prestação de serviços de corte, costura, montagem e acabamento de 3.588 pares de sapatos, com a referência ...3855-X.
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A sociedade B... emitiu a favor da Requerente, em 28 de novembro de 2016, a fatura n.º 1/627 referente a prestação de serviços de corte, costura, montagem e acabamento de 252 pares de sapatos, com a referência ...3855-X.
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A sociedade B... emitiu a favor da Requerente, em 19 de dezembro de 2016, a fatura n.º 1/646, referente a prestação de serviços de corte, costura, montagem e acabamento de 1.800 pares de sapatos, com a referência ...4785-A.
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O preço da prestação de serviços titulada pela fatura 1/397, acrescido do IVA a 23%, foi pago em 18/02/2016.
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A Requerente emitiu a favor da C..., Lda., a fatura n.º 9, de 13/01/2016, referente à venda do produto acabado de 2.163 de pares de sapatos, com a referência ... 3939-C, e a fatura n.º 19, de 26 de fevereiro de 2016, relativa a 1420 pares de sapatos, com diferentes referências.
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A C... emitiu a favor da sociedade S..., B.V., sita na Holanda, a fatura n.º 21, de 15/01/2016, referente a 2.747 de pares de sapatos, e n.º 33, de 29/01/2016, referente a 1.420 de pares de sapatos, ambos com a referência ... 3939-C.
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A Requerente emitiu a favor da B... as guias de transporte de matérias-primas n.º 45, de 8/01/2016, e n.º 82, de 14/01/2016.
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O preço da prestação de serviços titulada pela fatura 1/421, acrescido do IVA a 23%, foi pago em 18/03/2016.
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A Requerente emitiu a favor da C... a fatura n.º 50, de 22/02/2016, referente a 1098 pares de sapatos, a fatura n.º 52, de 24/02/2016, relativa 252 pares de sapatos, a fatura n.º 85, de 01/04/2016, relativa a 120 pares de sapatos, a fatura n.º 88, de 5/04/2016, relativa a 240 pares de sapatos, a fatura n.º 89, de 07/04/2016, relativa a 200 pares de sapatos, a fatura n.º 119, de 03/05/2016, relativa a 200 pares de sapatos, todos com a referência ... 3939-C, e a fatura n.º 120, de 03/05/2016, relativa a 200 pares de sapatos, com diferente referência.
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A C... emitiu a favor da sociedade S..., B.V., a fatura n.º 71, de 23/02/2016, referente a 368 pares de sapatos, a fatura n.º 72, de 23/02/2016, referente a 154 pares de sapatos, a fatura n.º 73, de 23/02/2016, referente a 576 pares de sapatos, a fatura n.º 77, de 25/02/2016, referente a 252 pares de sapatos, a fatura n.º 116, de 01/04/2016, referente a 120 pares de sapatos, a fatura n.º 122, de 06/04/2016, referente a 240 pares de sapatos, a fatura n.º 123, de 07/04/2016, referente 200 pares de sapatos, a fatura n.º 153, de 03/05/2016, referente a 200 pares de sapatos, e a fatura n.º 155, de 04/05/2016, referente a 300 pares de sapatos, todos com a referência ... 3939-C.
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O preço da prestação de serviços titulada pela fatura 1/439, acrescido do IVA a 23%, foi pago em 13/04/2016.
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A Requerente emitiu a favor da C... a fatura n.º 128, de 18/05/2016, relativa a 132 pares de sapatos, com a referência ... 4785-C.
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A C... emitiu a favor da sociedade S..., B.V., a fatura n.º 85, de 04/03/2016, relativa a 946 pares de sapatos, a fatura n.º 91, de 11/03/2016, referente a 132 pares de sapatos, a fatura n.º 110, de 01/04/2016, referente a 240 pares de sapatos, e a fatura n.º 135, de 21/04/2016, referente a 120 pares de sapatos, todos com a referência ...-4785-A.
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A Requerente emitiu a favor da B... as guias de transporte de matérias-primas n.º 239, de 12/02/2016, e n.º 252, de 16/02/2016.
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O preço da prestação de serviços titulada pela fatura 1/455, acrescido do IVA a 23%, foi pago em 9/05/2016.
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A Requerente emitiu a favor da C... a fatura n.º 72, de 15/03/2016, relativa a 572 pares de sapatos, com a referência 5309-F.
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A C... emitiu a favor da sociedade S..., B.V., a fatura n.º 94, de 16/03/2016, relativa a 2.054 pares de sapatos, com a referência 5309-F.
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A Requerente emitiu a favor da B... as guias de transporte de matérias-primas n.º 2016/0448, de 21/03/2016, e n.º 2016/0418, de 15/03/2016.
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O preço da prestação de serviços titulada pela fatura 1/475, acrescido do IVA a 23%, foi pago em 13/06/2016.
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A Requerente emitiu a favor da C... a fatura n.º 88, de 05/04/2016, relativa a 782 pares de sapatos, a fatura n.º 90, de 12/04/2016, relativa a 1.390 pares de sapatos, a fatura n.º 111, de 19/04/2016, relativa um par de sapatos, a fatura n.º 119, relativa a 182 pares de sapatos, e a fatura n.º 122, relativa a um par de sapatos, com a referência ... 5309-F.
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A C... emitiu a favor da sociedades S..., B.V., a fatura n.º 118, de 06/04/2016, relativa a 782 pares de sapatos, a fatura n.º 128, de 13/04/2016, relativa a 990 pares de sapatos, a fatura n.º 133, de 21/04/2016, relativa a 559 pares de sapatos, a fatura n.º 152, de 3/05/2016, relativa a 406 pares de sapatos, com a referência ... 5309-F.
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A Requerente emitiu a favor da B... as guias de transporte de matérias-primas n.º 2016/0552, de 11/04/2016, e n.º 2016/0490, de 31/03/2016.
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O preço da prestação de serviços titulada pela fatura 1/497, acrescido do IVA a 23%, foi pago em 14/07/2016.
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A Requerente emitiu a favor da C... as faturas n.º 127, de 17/06/2016, relativa a 726 pares de sapatos, n.º 128, de 18/05/2016, relativa a 132 pares de sapatos, n.º 152, de 02/06/2016, relativa a 956 pares de sapatos, n.º 173, de 28/06/2016, relativa a 320 pares de sapatos, n.º 242, de 10/08/2016, relativa a 536 pares de sapatos, todos com a referência ... 4785-A.
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A C... emitiu a favor da sociedade S..., B.V, a fatura n.º 169, de 20/05/2016, relativa a 858 pares de sapatos, n.º 182, de 03/06/2016, relativa a 966 pares de sapatos, n.º 228, de 28/06/2016, relativa a 320 pares de sapatos, e n.º 330/2016, relativa a 132 pares de sapatos, todos com a referência ... 4785-A.
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A Requerente emitiu a favor da B... as guias de transporte de matérias-primas n.º 2016/0748, de 11/05/2016, n.º 2016/0765, de 04/05/2016, e n.º 20 16/0708, de 04/05/2016.
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O preço da prestação de serviços titulada pela fatura 1/524, acrescido do IVA a 23%, foi pago em 10/08/2016.
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A Requerente emitiu a favor da C... a fatura n.º 202, de 12/07/2016, relativa 1.138 pares de sapatos, a fatura n.º 208, de 19/07/2016, relativa a 240 pares de sapatos, a fatura n.º 216, de 2/08/2016, relativa a 4.000 pares de sapatos, a fatura n.º 242/2016, de 10/08/2016, relativa a 336 pares de sapatos, e a fatura n.º 245, de 11/08/2016, relativa a 538 pares de sapatos, todos com a referência ... 3939-D.
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A C... emitiu a favor da sociedade S..., B.V. a fatura n.º 330, de 10/08/2016, relativa a 116 pares de sapatos, e a fatura n.º 337, de 12/08/2016, relativa a 538 pares de sapatos, com a referência ... 3939-D.
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A Requerente emitiu a favor da B... as guias de transporte de matérias-primas n.º 2016/0958, de 15/06/2016, e n.º 2016/0939, de 13/06/2016.
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O preço da prestação de serviços titulada pela fatura 1/549, acrescido do IVA a 23%, foi pago em 09/09/2016.
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A Requerente emitiu a favor da C... a fatura n.º 216, de 02/08/2016, relativa a 4.000 pares de sapatos, com a referência ... 3872-A.
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A C... emitiu a favor da sociedade S..., B.V. a fatura n.º 294, de 03/08/2016, referente 4.000 pares de sapatos, com a referência ... 3872-A.
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A Requerente emitiu a favor da B... as guias de transporte de matérias-primas n.º 2016/1165, de 13/07/2016, e n.º 2016/1169, de 14/07/2016.
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O preço da prestação de serviços titulada pela fatura 1/573, acrescido do IVA a 23%, foi pago em 25/10/2016.
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A Requerente emitiu a favor da C... a fatura n.º 288, de 25/10/2016, relativa a 2.100 pares de sapatos, e a fatura n.º 45, de 16/02/2016, relativa 349 pares de sapatos, com a referência ... 3855-X.
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A C... emitiu a favor da sociedade S... B.V., a fatura n.º 420, de 26/10/2016, relativa a 2.100 pares de sapatos, com a referência ... 3855-X.
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A Requerente emitiu a favor da B... as guias de transporte de matérias-primas n.º 2016/1557, de 23/09/2016, e n.º 2016/0288, de 25/10/2016.
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O preço da prestação de serviços titulada pela fatura 1/596, acrescido do IVA a 23%, foi pago em 21/11/2016.
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A Requerente emitiu a favor da C... a fatura n.º 302, de 10/11/2016, referente ao total de 3.747 pares de sapatos, com a referência ... 3855-X.
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A C... emitiu a favor da sociedade S..., B.V., a fatura n.º 442, referente a 1.140 pares de sapatos, e a fatura n.º 443, da mesma data, referente a 2.448 pares de sapatos com a referência ... 3855-X.
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A Requerente emitiu a favor da B... as guias de transporte de matérias-primas n.º 2016/1481, de 14/09/2016, e n.º 2016/1557, de 23/09/2016.
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O preço da prestação de serviços titulada pela fatura 1/627, acrescido do IVA a 23%, foi pago em 14/12/2016.
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A Requerente emitiu a favor da C... a fatura n.º 310, de 28/11/2016, relativa a 252 pares de sapatos, com a referência ... 3855-X.
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A C... emitiu a favor da sociedade S..., B. V. a fatura n.º 471, de 29/11/2016, relativa a 252 pares de sapatos, com a referência ... 3855-X.
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A Requerente emitiu a favor da B... as guias de transporte de matérias-primas n.º 2016/1866, de 08/11/2016, e n.º 2016/1962, de 22/11 /2016.
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O preço da prestação de serviços titulada pela fatura 1/646, acrescido do IVA a 23%, foi pago em 09/01/2016.
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A Requerente emitiu a favor da C... a fatura n.º 309, de 25/11/2016, relativa a 1.800 pares de sapatos, com a referência ... 4785-A.
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A C... emitiu a favor da sociedade S..., B.V., a fatura n.º 470, de 25/11/2016, referente a 1.800 pares de sapatos, com a referência ... 4785-A.
Factos não provados
Não há factos não provados que revelem para a decisão da causa.
O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição, no processo administrativo junto pela Autoridade Tributária com a resposta, e no requerimento da Autoridade Tributária de 24 de setembro de 2022, e na produção de prova testemunhal em audiência.
As testemunhas inquiridas referiram que existe uma relação efetiva entre a S... (gestor de logística) e a C... (fábrica de sapatos) e entre a Requerente e a B..., visto que os sapatos eram encomendados e comprados à C..., na sequência de uma negociação de preço e prazos de entrega (T... e U...). A B...era subcontratada pela A..., produzindo o sapato (corte, costura, montagem, acabamento, embalagem) a partir da matéria-prima recebida desta sociedade ou de outros fornecedores, ou subcontratando a execução a terceiros (U... e W...).
Todos os sapatos fornecidos pela B... eram vendidos à C... . A A... (fábrica e serviços administrativos) e a C... (comercial) estão sediadas no mesmo espaço físico e a C... é administrada pelos filhos do gerente da A... (U... e X...).
A B... emitia faturas ao fim do mês, por vezes depois da A... ter vendido a mercadoria à C... (U...) e, nalguns casos, as guias de transporte de mercadorias para a B... eram emitidas posteriormente ao transporte, nem sempre havendo sincronização entre as operações e a sua formalização (X... e W...).
Matéria de direito
Vícios formais
5. A Requerente invoca, no pedido arbitral, os seguintes vícios formais:
a) Preterição de formalidades essenciais no âmbito do procedimento inspetivo que originou a correção tributária, porquanto o procedimento foi qualificado como interno quando se traduziu num procedimento externo, na medida em que utilizou informação recolhida através de outros procedimentos inspetivos realizados junto de terceiras entidades e fora das instalações da Autoridade Tributária;
b) Ausência de notificação prévia ao sujeito passivo do início e do fim da inspeção e de emissão da ordem de serviço necessária para credenciar a prática dos atos de inspeção;
c) Inobservância do prazo de 6 meses de duração do procedimento;
d) Falta de notificação ao mandatário constituído dos atos de liquidação resultantes das correções tributárias;
e) Omissão de diligências requeridas no âmbito do procedimento em vista à produção de prova testemunhal arrolada;
f) Falta de fundamentação dos atos tributários;
g) Violação do princípio da participação no procedimento inspetivo;
São estas as questões que interessa começar por analisar.
Qualificação do procedimento inspetivo
6. O artigo 13.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA), sob a epígrafe “Lugar do procedimento de inspeção”, dispõe nos seguintes termos:
Quanto ao lugar da realização, o procedimento pode classificar-se em:
a) Interno, quando os atos de inspeção se efetuem exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise formal e de coerência dos documentos;
b) Externo, quando os atos de inspeção se efetuem, total ou parcialmente, em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso.
Quanto à distinção entre estes dois tipos de procedimentos, Joaquim Freitas da Rocha e João Damião Caldeira, in Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária Anotado e Comentado, págs. 45-46, referem o seguinte:
Quanto ao lugar da realização, o procedimento de inspeção pode classificar-se em procedimento interno e procedimento externo, consoante os atos que o integram se efetuem, respetivamente, nas dependências orgânicas e nos serviços da Administração tributária ou em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais entidades abrangidas.
Note-se que para que possa ser classificado como interno, o procedimento deve materializar-se em atos, todos eles, praticados exclusivamente nos seus serviços, instalações ou dependências, designadamente através da análise formal e de coerência dos documentos. Caso contrário (isto é, caso existam atos praticados fora, ainda que diminutos), estaremos perante um procedimento externo.
O procedimento interno é uma espécie de inspeção cadastral, efetuada dentro dos próprios serviços de inspeção, com recurso aos elementos declarados pelos sujeitos passivos, e engloba atividades de mera constatação em que a Administração se limita a verificar o cumprimento por parte dos sujeitos passivos dos seus deveres declarativos. Nestes casos a Administração tributária limita-se particularmente a confrontar, através do cruzamento de informação disponível nas suas bases de dados, se o sujeito passivo cumpriu ou não com os seus deveres e se os elementos declarados coincidem com os elementos fornecidos pelas declarações entregues por outros obrigados tributários com quem o sujeito passivo mantém ou manteve relações. Não se trata portanto de uma atividade propriamente fiscalizadora, em sentido estrito, trata-se de uma atividade de comprovação formal para verificação da exatidão do formalmente declarado pelo sujeito passivo. No quadro desse procedimento interno pode a inspeção tributária solicitar informações e esclarecimentos aos sujeitos passivos, podendo ser feitas correções em resultado do que for apurado.
O procedimento será externo quando os atos de inspeção sejam praticados, total ou parcialmente, nas instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso. Nesta atividade, já de cariz investigatório, visa-se verificar a exatidão dos valores declarados em função dos elementos que constam na sua contabilidade e documentos, se ocorre ou não 46 alguma omissão de valores e se os valores declarados estão de acordo com as normas de incidência tributária que são aplicadas à sua atividade. Sempre que o procedimento de inspeção vise a análise ou verificação da contabilidade, dos livros de escrituração ou outros documentos relacionados com a atividade do sujeito passivo inspecionado, o procedimento de inspeção deve classificar-se sempre como sendo de natureza externa e realiza-se, regra geral, nas instalações ou dependências onde aqueles elementos estejam ou devam estar localizados.
Compulsando o Relatório de Inspeção Tributária elaborado no âmbito da ação inspetiva realizada à Requerente (alínea F) da matéria de facto), o que se constata é que os serviços inspetivos tiveram em consideração, para procederem à correções tributárias, os resultados dos procedimentos inspetivos anteriormente desencadeados relativamente à B..., fornecedor da Requerente, e às sociedades C…, B…, A… e A1…, enquanto entidades subcontratadas, tendo por base o cruzamento de faturação emitida entre esses diversos sujeitos passivos.
Nem as diligências diretamente relacionadas com o procedimento inspetivo referente à Requerente – que envolveram meros pedidos de esclarecimento e a análise de elementos contabilísticos –, nem a informação coligida no âmbito das ações de inspeção realizadas a outras entidades, implicou a prática de atos de inspeção em instalações ou dependências do sujeito passivo ou de terceiros com quem o sujeito passivo tenha mantido relações económicas.
E mesmo neste último caso, o que está em causa é a transcrição de excertos dos relatórios de inspeção tributária elaborados no âmbito dos procedimentos inspetivos dirigidos a terceiras entidades, e não uma atividade investigatória de carácter externo, que pressuponha a deslocação dos inspetores às instalações ou dependências dos sujeitos passivos que foram objeto de inspeção.
Haverá de concluir-se, neste contexto, que os atos de inspeção praticados no procedimento inspetivo dirigido contra a Requerente revestem natureza meramente formal, pelo que a qualificação do procedimento como interno obedece à definição constante do artigo 13.º do RCPITA e não enferma de qualquer ilegalidade.
Ausência de notificação prévia ao sujeito passivo do início e do fim do procedimento inspetivo e de emissão da ordem de serviço de credenciação para a prática dos atos de inspeção
7. Os artigos 46.º e 49.º do RCPITA, que especialmente relevam para a análise das presentes questões, na parte que mais interessa considerar, têm a seguinte redação:
Artigo 46.º
Credenciação
1 - O início do procedimento externo de inspeção depende da credenciação dos funcionários e do porte do cartão profissional ou outra identificação passada pelos serviços a que pertençam.
2 - Consideram-se credenciados os funcionários da Direcção-Geral dos Impostos munidos de ordem de serviço emitida pelo serviço competente para o procedimento ou para a prática do ato de inspeção, ou no caso de não ser necessária ordem de serviço de cópia do despacho do superior hierárquico que determinou a realização do procedimento ou a prática do ato.
[…]
Artigo 49.º
Notificação prévia para procedimento de inspeção
1 - O procedimento externo de inspeção deve ser notificado ao sujeito passivo ou obrigado tributário com uma antecedência mínima de cinco dias relativamente ao seu início. 2 - A notificação prevista no número anterior efetua-se por carta-aviso elaborada de acordo com o modelo aprovado pelo diretor-geral dos Impostos, contendo os seguintes elementos: a) Identificação do sujeito passivo ou obrigado tributário objeto da inspeção; b) Âmbito e extensão da inspeção a realizar. 3 - A carta-aviso conterá um anexo contendo os direitos, deveres e garantias dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários no procedimento de inspeção.
Como resulta com evidência da transcrita norma do artigo 46.º, a obrigatoriedade de credenciação dos funcionários mediante a emissão de ordem de serviço, com vista à notificação do sujeito passivo, apenas tem aplicação no procedimento de inspeção externo, não sendo exigível quando se trate de procedimento de inspeção interno, segundo a tipologia descrita no artigo 13.º do RCPITA (cfr. neste sentido, Joaquim Freitas da Rocha/João Damião Caldeira, ob. cit., pág. 159).
Na situação do caso, não só houve lugar à emissão de ordem de serviço, com indicação do respetivo âmbito e extensão (doc. 3 anexo ao requerimento da Autoridade Tributária de 24 de novembro de 2022), como também, estando em causa um procedimento de natureza externa (cfr. supra ponto 5.), não poderia considerar-se verificada a violação da referida disposição do artigo 46.ºdo RCPITA, ainda que os funcionários inspetivos não dispusessem dessa credencial.
À mesma conclusão haverá de chegar-se, necessariamente, no que respeita à notificação prévia do sujeito passivo para o procedimento de inspeção.
Tal como prevê o n.º 1 do artigo 49.º, a obrigatoriedade de notificação prévia da inspeção opera no procedimento externo (e apenas neste) e explica-se pela necessidade de evitar a realização de inspeções-surpresa nas próprias instalações do sujeito passivo, e de permitir que este possa preparar os elementos contabilísticos que possam ser objeto de consulta no âmbito do procedimento inspetivo e os aspetos logísticos associados à visita dos inspetores. Assim se compreendendo que a notificação deva ser feita com uma antecedência mínima de cinco dias relativamente ao início do procedimento (cfr. Joaquim Freitas da Rocha/João Damião Caldeira, idem, págs. 162-163, e, na jurisprudência, o acórdão do TCA Norte de 18 de março de 2011, Processo n.º 00178/06).
Estando em causa, no presente caso, um procedimento interno não era, como tal, exigível a prévia notificação ao sujeito passivo do início do procedimento e não se verifica a alegada violação do disposto no artigo 49.º do RCPITA.
Inobservância do prazo de procedimento de inspeção
8. O artigo 36.º do RCPITA, sob a epígrafe “Início e prazo do procedimento de inspeção”, na parte que releva, dispõe nos seguintes termos:
1- O procedimento de inspeção tributária pode iniciar-se até ao termo do prazo de caducidade do direito de liquidação dos tributos ou do procedimento sancionatório, sem prejuízo do direito de exame de documentos relativos a situações tributárias já abrangidas por aquele prazo, que os sujeitos passivos e demais obrigados tributários tenham a obrigação de conservar.
2- O procedimento de inspeção é contínuo e deve ser concluído no prazo máximo de seis meses a contar da notificação do seu início.
[…]
A norma estabelece dois diferentes limites temporais: um refere-se ao prazo para se iniciar o procedimento de inspeção, que se encontra correlacionado com o termo do prazo de caducidade do direito à liquidação dos tributos (n.º 1); outro diz respeito ao próprio prazo de duração do procedimento de inspeção, sem embargo da possibilidade de prorrogação do prazo nas condições elencadas no n.º 3 (n.º 2).
Entende-se que o início do procedimento ocorre com a notificação da sua abertura ao sujeito passivo, como prevê o artigo 36.º, n.º 1, do RCPITA, e o seu termo com a notificação ao sujeito passivo do relatório final de inspeção, nos termos do artigo 62.º desse diploma.
Não existe, no entanto, na legislação tributária, qualquer específica consequência legal para a inobservância do prazo de duração do procedimento. A única regra que é possível retirar é a do artigo 46.º, n.º 1, da LGT, relativa à suspensão do prazo de caducidade da liquidação, que estatui nos seguintes termos: “o prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da ação de inspeção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo desde o seu início, caso a duração da inspeção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação”.
Nestes termos, a inobservância do prazo do procedimento inspetivo não implica a invalidade do ato tributário de liquidação, mas unicamente pode determinar a não suspensão do prazo de caducidade, nos termos da referida disposição da LGT, tudo se passando “como se não tivesse sido feita a inspeção, correndo o prazo de caducidade continuamente e sem qualquer suspensão” (cfr. acórdão do STA de 29 de novembro de 2006, Processo n.º 0695/06).
No entanto, atenta a falada disposição do artigo 46.º, n.º 1, da LGT, o efeito jurídico da suspensão do prazo de caducidade da liquidação só ocorre quando esteja em causa uma ação de inspeção externa, ou seja, nos casos em que os atos de inspeção são total ou parcialmente praticados nas instalações dos sujeitos passivos (cfr. Joaquim Freitas da Rocha/João Damião Caldeira, idem, págs. 119).
Mantém relevância, por isso, também para este efeito, a classificação do procedimento de inspeção, uma vez que só o transcurso do prazo no âmbito de um procedimento externo, e não já no âmbito de um procedimento interno, pode justificar a suspensão do prazo de caducidade do direito de liquidação.
Nas circunstâncias do caso, o procedimento de inspeção iniciou-se em 24 de março de 2020, com a emissão da ordem de serviço – ainda que se desconheça a data da sua notificação ao sujeito passivo – e o seu termo ocorreu com a notificação do Relatório Final de Inspeção Tributária, efetuada por ofício datado de 27 de novembro de 2020.
Todavia, como se deixou exposto, mesmo que se considere ultrapassado o prazo de seis meses de duração do procedimento inspetivo, tal não consubstancia a nulidade do procedimento ou a ilegalidade do ato de liquidação, nem gera a interrupção do prazo de caducidade de liquidação.
Improcede, por conseguinte, o invocado vício formal.
Falta de notificação ao mandatário constituído dos atos de liquidação resultantes das correções tributárias
9. Relativamente à questão em análise importa ter presente as disposições dos artigos 36.º e 40.º do CPPT.
A primeira dessas disposições, sob a epígrafe “Notificações em geral”, na parte relevante, dispõe nos seguintes termos:
1- Os atos em matéria tributária que afetem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados.
[…].
O artigo 40.º refere-se às notificações aos mandatários e tem a seguinte redação:
1 - As notificações aos interessados que tenham constituído mandatário são feitas na pessoa deste da seguinte forma:
a) Nos procedimentos tributários, por carta registada, dirigida para o seu escritório;
b) Nos processos judiciais tributários, nos termos previstos nas normas sobre processo nos tribunais administrativos.
2- Quando a notificação se destine a chamar o interessado para a prática de ato pessoal, além de ser notificado o mandatário, será enviado pelo correio um aviso registado ao próprio interessado, indicando a data, o local e o fim da comparência.
[…].
Abordando esta temática, o acórdão do STA de 22 de janeiro de 2020 (Processo n.º 0915/16) extrai as seguintes conclusões:
Os atos de liquidação praticados no seguimento de um procedimento de inspeção tributária em que tenha sido constituído mandatário tributário são atos intrinsecamente ligados àquele procedimento, mas que gozam de autonomia jurídico-procedimental em relação ao mesmo, uma vez que o procedimento de inspeção tributária termina com a assinatura do relatório final da inspeção, onde são sistematizados os factos detetados e sua qualificação jurídico-tributária, e o sancionamento superior das suas conclusões.
A referida autonomia jurídico-procedimental daqueles atos de liquidação adicional determina que a sua eficácia, nos casos em que tenha sido constituído mandatário tributário no âmbito do procedimento de inspeção tributária, dependa apenas de notificação dos mesmos segundo a regra geral da notificação dos atos tributários do artigo 36.º, n.º 1 do CPPT, e não de notificação ao mandatário tributário nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 40.º do CPPT.
Esclarece-se, deste modo, conforme já tinha sido decidido no acórdão do STA de 3 de maio de 2018 (Processo n.º 0167/18), que “concluído o procedimento de inspeção, nos termos do artigo 62.º, n.ºs 1 e 2, do RCPITA, termina o mandato constituído no âmbito deste procedimento”.
Por outro lado, o ato de notificação de uma liquidação tributária não pode considerar-se como um ato pessoal para efeitos do n.º 2 do artigo 40.º do CPPT, uma vez que não se trata de qualquer notificação do interessado para comparecer ou praticar qualquer ato.
E, sendo assim, o ato de liquidação adicional decorrente de procedimento de inspeção tributária em que tenha sido constituído mandatário tributário tem apenas de ser notificado ao contribuinte, nos termos gerais do artigo 36.º do CPPT.
Revertendo à situação do caso, constata-se que a Requerente foi notificada do Relatório Final de Inspeção Tributária por ofício datado de 27 de novembro de 2020, a Requerente outorgou procuração forense à sociedade de advogados D... e E..., em 10 de novembro de 2020, e o Relatório Final de Inspeção Tributária foi notificado ao mandatário da Requerente, nos termos do artigo 40.º do CPPT, por ofício datado de 18 de dezembro de 2020 (alíneas H), I) e J) da matéria de facto).
Considerando-se findo o procedimento inspetivo com a notificação ao sujeito passivo do relatório final, não havia que notificar o mandatário constituído dos ulteriores atos de liquidação que resultaram das correções tributárias.
Improcede o alegado vício procedimental.
Preterição do dever de inquirição de testemunhas
10. A Requerente invoca ainda a preterição da inquirição das testemunhas arroladas no procedimento de reclamação graciosa, na medida em que a Administração Tributária, por efeito do disposto no artigo 58.º da LGT, tinha o dever de proceder a essas diligências instrutórias em vista à descoberta da verdade material.
Ora, o princípio do inquisitório que decorre do falado artigo 58.º da LGT apenas pressupõe que a Administração deverá proceder às diligências que entenda serem úteis para a preparação da decisão, e não significa que lhe caiba realizar todas as diligências requeridas pelo contribuinte no decurso do procedimento ou todas aquelas que o interessado venha a entender a posteriori como necessárias face ao conteúdo da decisão final que tenha sido adotada.
O principal efeito jurídico da insuficiência das diligências instrutórias a realizar pela Administração no âmbito do procedimento tributário traduz-se, em sede de impugnação judicial num non liquet probatório sobre os factos materiais da causa, implicando que o tribunal emita uma pronúncia desfavorável em relação à parte a quem incumbia fazer a prova dos factos, à luz dos critérios de repartição do ónus da prova do artigo 74.º da LGT (Serena Cabrita Neto/Carla Castelo Trindade, Contencioso Tributário, Vol. I, Coimbra, 2017).
Como vício invalidante do ato tributário, a preterição do princípio do inquisitório (e, consequentemente, do princípio da verdade material) apenas pode ser considerado na situação limite em que os serviços omitam diligências essenciais à averiguação da situação tributária de tal modo que não se encontre justificação plausível para a correção fiscal que tenha sido impugnada.
Por outro lado, embora a legislação tributária consagre, no âmbito do procedimento tributário, o princípio da plenitude probatória, não excluindo que o órgão instrutor possa utilizar “todos os meios de prova admitidos em direito” (artigo 72.º da LGT), podendo designadamente “tomar declarações de qualquer natureza do contribuinte ou outras pessoas” (artigo 50.º do CPPT), o certo é que, em procedimentos de segundo grau, como é o caso da reclamação graciosa, subsiste a regra da limitação dos meios probatórios à “forma documental e aos elementos oficiais de que os serviços disponham”, ainda que sem prejuízo da realização de outras diligências complementares que se mostrem indispensáveis à descoberta da verdade material - artigo 72.º do CPPT (cfr. Joaquim Freitas da Rocha, Lições de Procedimento e Processo Tributário, 5.ª edição, Coimbra, págs. 98-99; Serena Cabrita Neto/Carla Castelo Trindade, ob. cit., págs. 520-530).
No caso vertente, a Autoridade Tributária não admitiu a produção de prova testemunhal indicada no procedimento de reclamação graciosa com base em dois diferentes fundamentos: a limitação dos meios probatórios, nesse tipo de procedimento, à prova documental e a inidoneidade da prova testemunhal para a averiguação dos factos que eram objeto de fiscalização.
A Administração baseou-se, por conseguinte, na restrição à utilização da prova testemunhal, que constitui, nos termos do artigo 69.º, alínea e), do CPPT, uma das regras fundamentais do procedimento de reclamação graciosa e, subsidiariamente, na própria inutilidade da prova a produzir tendo em conta o objeto do procedimento tributário.
Não pode considerar-se verificada, neste condicionalismo, a violação do princípio do inquisitório e da verdade material.
Violação do dever de fundamentação dos atos tributários
11. A Requerente suscita ainda o vício de falta de fundamentação por não terem sido identificadas, no procedimento inspetivo, as sociedades designadas por C…, B…, A… e A1…, que supostamente, como entidades subcontratadas pela B..., teriam intervindo em negócios simulados, implicando que viessem a ser consideradas como simuladas as relações comerciais estabelecidas a jusante entre esta última entidade e a Requerente.
Defende a Requerente, neste plano, que a não identificação de entidades coenvolvidas na alegada cadeia de faturação falsa corresponde a falta de fundamentação, por omissão, deficiência ou obscuridade dos fundamentos adotados.
Como é entendimento jurisprudencial corrente, a fundamentação do ato tributário é um conceito relativo que varia conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto, sendo que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do ato decidiu num certo sentido e não de forma diferente. Nessa linha de orientação, um ato administrativo está suficientemente fundamentado desde que um destinatário normal possa ficar ciente do sentido dessa mesma decisão e das razões que a sustentam, permitindo-lhe optar conscientemente entre a aceitação do ato ou o acionamento dos meios legais de impugnação (acórdão do STA de 14 de julho de 2008, Processo n.º 024/08) e de 11 de setembro de 2008, Processo n.º 0112/07).
O ato de liquidação em sede de IRC (liquidação n.º 2020...) encontra-se fundamentado nos seguintes termos:
Apuramento proveniente de liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) decorrente do procedimento de Inspeção, credenciado pela ordem de serviço 012020..., no âmbito do qual foi remetida a respetiva funda mentação, constante do Relatório Final Inspeção Tributária.
Em idênticos termos, o ato de liquidação em sede de IVA (liquidação n.º 2020 ...) contém uma referência à fundamentação que é do seguinte teor:
Liquidação emitida nos termos do artigo 87.º do CIVA. A liquidação decorre do procedimento de Inspeção, credenciado pela ordem de serviço 012020..., no âmbito do qual foi remetida a respetiva fundamentação, constante do Relatório Final Inspeção Tributária”.
Haverá de entender-se, em face da referência expressa ao Relatório Final Inspeção Tributária, que estamos perante uma forma de fundamentação por remissão, que é legalmente admissível, atento o disposto no artigo 77.º da LGT, onde se consigna que “a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de fato e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária”.
Não pode deixar de reconhecer-se, por outro lado, que o Relatório de Inspeção Tributária se encontra suficientemente fundamentado.
Não obstante a não identificação das entidades coenvolvidas, o Relatório de Inspeção Tributária explicita desenvolvidamente as razões pelas quais são propostas as correções tributárias, baseando-se em factos diretamente imputáveis ao sujeito passivo, e que proveem da averiguação efetuada no âmbito do procedimento inspetivo contra si dirigido, e em factos coligidos nesse procedimento a partir dos resultados probatórios alcançados nas ações inspetivas dirigidas à sociedade B... e a outras entidades designadas como C…, B…, A… e A1….
A partir da informação recolhida nos procedimentos inspetivos realizados às sociedades C…, B…, A… e A1… e cujos relatórios foram parcialmente transcritos (ponto III.1), considerou-se, no Relatório, que as empresas subcontratadas, que estão na origem da cadeia de faturação, não dispõem dos necessários fatores produtivos (instalações, equipamento e organização empresarial, recursos humanos e planeamento organizacional de suporte à prestação de serviços), concluindo-se que, por falta desses requisitos no universo das entidades identificadas como prestadores de serviços, fica patente a inverosimilhança das operações comerciais que tiveram como último destinatário a entidade inspecionada, com suporte na faturação emitida pela B... .
No que especificamente se refere à Requerente (pontos III.3.2. e III.3.3) o Relatório aponta para a inexistência de mecanismos de controlo interno da contratação de serviços (suporte documental, notas de encomenda, prazos de entrega, ordens de fabrico, protótipo do produto a executar, controlo de qualidade dos produtos, transporte), chegando-se à conclusão, pela análise das faturas emitidas pelos operadores envolvidos e das rececionadas pelo sujeito passivo, que as operações se cingiram apenas à base documental e não visaram a concretização de um negócio comercial.
A Requerente não pode invocar, por conseguinte, o desconhecimento do percurso cognoscitivo e valorativo seguido pela Administração para praticar os atos tributários impugnados.
Importa distinguir, a este propósito, tal como se refere, entre outros, no acórdão do STA de 9 de dezembro de 2021 (Processo n.º 11078/14), entre a fundamentação substancial, que é caracterizada pela verificação dos pressupostos de facto e de direito que justificam a decisão de fundo, e a fundamentação formal, que é exigível pela lei procedimental (artigos 153.º do CPA e 77.º da LGT) para se determinar se o ato administrativo dá a conhecer ao interessado, de forma clara, congruente e suficiente os fundamentos da decisão adotada.
Estando em causa a liquidação baseada em relatório da inspeção tributária, o que interessa considerar, do ponto de vista do dever de fundamentação, são os elementos de suporte da correção tributária que veio a ser proposta e eles constam do relatório e são acessíveis ao interessado.
Certo é que o dever de confidencialidade a que se refere o artigo 64.º, n.º 1, da LGT, obrigando os agentes da administração tributária a guardar sigilo sobre os dados recolhidos sobre a situação tributária dos contribuintes apenas se torna exigível em relação a terceiros que não tenham qualquer relação com os factos que são objeto de averiguação num dado procedimento inspetivo, e não em relação a outras entidades que se encontrem conjuntamente implicadas em situações de ilicitude fiscal.
Nada obstava, por conseguinte, a que fossem identificadas, no Relatório de Inspeção Tributária, as diversas entidades envolvidas. No entanto, a indevida aplicação do princípio da confidencialidade, na situação do caso, não obstaculizou o acesso do interessado à fundamentação dos atos tributários, pelo que se não verifica o invocado vício de falta de fundamentação.
Violação do princípio da participação no procedimento
12. A não identificação, no procedimento inspetivo, das sociedades nele designadas por C…, B…, A… e A1…, constitui também fundamento, no pedido arbitral, de violação do princípio de participação da decisão do procedimento por ter impossibilitado o interessado de exercer o direito do contraditório.
O princípio da audiência dos interessados decorre do imperativo constitucional ínsito no artigo 267.º, n.º 5, da Lei Fundamental, que consagra o princípio da participação dos cidadãos na preparação da decisão final e se encontra vertido com carácter geral no artigo 121.º do CPA.
Nos termos do artigo 121.º do CPA, fora dos casos em que haja dispensa de audiência dos interessados que estão elencados no artigo 124.º, “os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta”.
O mesmo princípio encontra-se concretizado, no âmbito do procedimento tributário, no artigo 60.º da LGT, que prevê a participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito, e, designadamente, o direito de audição antes da liquidação, antes do indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições, e antes da conclusão do relatório da inspeção tributária (alíneas a), b) e e)). E está igualmente estabelecido no artigo 45.º do CCPT.
Qualquer dessas regras está em sintonia com a garantia constante do artigo 267.º, n.º 5, da Constituição, que, mediante a exigência de participação dos interessados na formação das decisões ou deliberações administrativas que lhes disserem respeito, pressupõe a sua intervenção no processo de formação das mesmas, ou seja, antes de serem tomadas, nomeadamente através da audição sobre o projeto de decisão (cfr. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, II vol., 4.ª edição, Coimbra, pág. 814)
Na situação do caso, a Requerente foi notificada do projeto de relatório de inspeção tributária para efeito do exercício do direito de audição e exerceu esse direito, tal como consta da alínea D) da matéria de facto, sem ter feito qualquer referência à faturação emitida pelas entidades subcontratadas.
Com o requerimento da Autoridade Tributária de 24 de novembro de 2022, foi entretanto junto o processo de inspeção tributária completo, de onde consta, entre outros elementos, uma informação do inspetor tributário, elaborada na sequência da ação inspetiva realizada à B..., em que são identificadas as sociedades subcontratadas que teriam intervindo em negócios simulados e é proposta a abertura de procedimento inspetivo a diversas entidades entre as quais se inclui a Requerente (alínea U) da matéria de facto).
Seguidamente à apresentação do requerimento de 24 de novembro de 2022 houve lugar à produção de alegações e, na sua peça processual, a Requerente continua a invocar o desconhecimento da identidade das sociedades designadas como C…, B…, A… e A1…, considerando verificada, por essa razão, a inobservância do ónus da prova quanto à existência de indícios de simulação e, embora rebata o entendimento de que as sociedades C… e B… não dispunham dos fatores produtivos necessários para a prestação de serviços subcontratados, extrai essa conclusão com base na própria análise do Relatório de Inspeção Tributária.
Resulta claro que a Requerente não se pronunciou, no processo arbitral, sobre a factualidade que é imputada, no Relatório de Inspeção Tributária, às sociedades C…, B…, A… e A1…, ainda que fosse possível, através da documentação entretanto junta, efetuar a identificação dessas entidades.
Em todo o caso, como se deixou já esclarecido, o exercício do direito do contraditório mediante a audiência do interessado no decurso do procedimento destina-se a permitir a participação do contribuinte na formação da decisão e antes de efetuadas as correções tributárias que tenham tido por base o Relatório de Inspeção Tributária, não podendo considerar-se sanada a preterição da formalidade através da ulterior intervenção do interessado em procedimentos de segundo grau, como seja a reclamação graciosa ou o recurso hierárquico, ou no âmbito do próprio processo de impugnação judicial dos atos de liquidação (cfr., neste sentido, acórdão do STA de 26 de setembro de 2006, Processo n.º 01273/05).
A impossibilidade de a Requerente exercer o direito do contraditório, no âmbito do procedimento inspetivo, quanto às operações tidas como simuladas a montante da relação comercial mantida com a B..., por virtude de se não encontrarem identificadas as entidades envolvidas, representa objetivamente uma violação do princípio da participação no procedimento.
Conforme dispõe o artigo 124.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, na sentença a proferir no processo de impugnação, o tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do ato impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam à sua anulação (n.º 1), havendo lugar, no primeiro grupo, à apreciação prioritária dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos, e, no segundo grupo, a indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público ou, nos demais casos, o critério seguido para os casos de inexistência ou nulidade (n.º 2).
No presente caso, não são arguidos vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do ato impugnado ou outros que resultem do exercício da ação pública, estando apenas em causa vícios que conduzem à anulação do ato administrativo. Por outro lado, a Requerente não indica uma relação de subsidiariedade entre os vícios, pelo que, atento o disposto na alínea b) do n.º 2 do dito artigo 124.º, haveria de definir-se a ordem de conhecimento dos vícios em termos de assegurar ao interessado, segundo o prudente critério do julgador, a mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos.
Esta regra, no entanto, não é absoluta pois tem de reportar-se à situação concreta em juízo, podendo haver lugar por razões de ordem lógica ao conhecimento prioritário de um vício de forma, nomeadamente por preterição do direito de audiência (cfr. acórdão do STA de 22 de março de 2006, Processo n.º 0916/04).
No caso vertente, as correções tributárias que resultam do Relatório de Inspeção e para que se remete a respetiva fundamentação, baseiam-se em factos diretamente imputáveis ao sujeito passivo e que proveem da averiguação efetuada no âmbito do procedimento inspetivo, e em factos coligidos nesse procedimento a partir dos resultados probatórios alcançados nas ações inspetivas dirigidas à sociedade B... e outras entidades designadas como C…, B…, A… e A1…, que teriam intervindo como entidades subcontratadas num esquema de fraude fiscal mediante a prática de operações simuladas.
Relativamente aos factos diretamente imputáveis à Requerente, os serviços inspetivos destacam incongruências relativamente às guias de transporte e à emissão de faturas (pontos III.3.2 e III.3.2.1) e a inexistência de mecanismos de controlo interno da contratação de serviços, levando a concluir que as operações se cingiram apenas à base documental e não visaram a concretização de um negócio comercial (ponto III.3.3).
Por outro lado, o Relatório considerou que as empresas subcontratadas, que estão na origem da cadeia de faturação, e que foram objeto de ações de inspeção autónomas, não dispõem dos necessários fatores produtivos, concluindo-se que, por falta desses requisitos no universo das entidades identificadas como prestadores de serviços, se demonstra a inverosimilhança das operações comerciais que tiveram como último destinatário a entidade inspecionada, com suporte na faturação emitida pela B... (ponto III.3.1).
A relevância da prova obtida relativamente às entidades C…, B…, A…. e A1… (e que se encontra transcrita no Relatório) é evidenciada pelo facto de ter isso a inexistência de fatores produtivos no universo das empresas subcontratadas que justificou que a faturação emitida a jusante pela B... a favor da Requerente fosse igualmente considerada como simulada.
Ora, a não identificação de entidades terceiras cuja atividade terá sido determinante para a própria correção tributária na esfera jurídica da Requerente, inviabilizou que o contribuinte, pudesse participar e influenciar a formação da vontade da Administração, quer no plano meramente argumentativo, quer através da carreação de novos elementos de facto, e, desse modo, impediu que o interessado pudesse pôr em causa a veracidade dos factos que, sendo imputáveis a terceiros, afetam a sua posição jurídica.
O exercício do direito de participação no procedimento inspetivo, caso a Requerente tivesse conhecimento da identidade das entidades coenvolvidas no suposto esquema de faturação falsa, poderia conduzir a uma ampliação da matéria de facto e a uma apreciação mais alargada dos pressupostos substanciais em que se fundamentam os atos tributários.
E importa fazer notar, a este propósito, que as informações prestadas pela inspeção tributária apenas fazem fé quando fundamentadas e baseadas em critérios objetivos, como decorre do disposto nos artigos 76.º, n.º 1, da LGT e 115.º, n.º 2, do CPPT, significando que terão de encontrar-se comprovadas através de elementos indiciários bastantes. E, para além disso, o valor probatório do relatório de inspeção está condicionado pela aplicação do princípio do contraditório, sob pena de direta violação do artigo 20.º, n.º 4, da CRP, que postula um processo judicial tributário equitativo e subordinado a critérios de legalidade e requer plena igualdade de armas entre ambas as partes, como é reconhecido pelo artigo 98.º da LGT (nestes precisos termos, o acórdão do TCA Sul de 26 de junho de 2914, Processo n.º 07841/14).
Na situação do caso, a Requerente não pôde exercer de modo eficiente o direito do contraditório, nem impugnar as asserções que dele constam relativamente a entidades que tenham intervindo a montante na cadeia de faturação, em virtude de a sua identidade não ter sido revelada no relatório de inspeção, o que consubstancia sem margem para dúvidas a violação do princípio vertido nos artigos 60.º da LGT e 45.º do CPPT.
Neste condicionalismo, concluindo-se pela violação do princípio de participação da decisão do procedimento, nada obsta a que este vício seja conhecido com precedência relativamente à matéria de fundo, à luz do critério consignado no artigo 124.º, n.º 2, alínea b), in fine, do CPPT.
Resta acrescentar que não opera, na situação do caso, o princípio do aproveitamento do ato administrativo, que permite afastar o efeito anulatório resultante da ocorrência de um vício de forma, em qualquer das situações elencadas no artigo 163.º, n.º 5, do CPA. Não só não poderá afirmar-se que a ilegalidade proveniente da violação do princípio da participação no procedimento não influi no sentido da decisão a proferir, visto que poderá haver lugar, com a anulação contenciosa, à aquisição de novos elementos de facto relevantes para a instrução do procedimento, como também não se verifica a descaracterização do vício por efeito da degradação de formalidade essencial em formalidade não essencial, como ainda não estamos perante um ato discricionário a que seja aplicável a regra da alínea c) daquele n.º 5.
O princípio do aproveitamento do ato administrativo surge justificado por razões de economia dos atos públicos e resulta da concordância prática entre o princípio da legalidade e o princípio da eficiência administrativa e a ideia que lhe está subjacente é a de evitar que sejam tomadas decisões judiciais sem alcance real para o impugnante.
Não é essa a hipótese em análise, como resulta do já exposto, pelo que nada obsta a que os atos tributários sejam anulados pelo apontado vício de forma.
Vícios de conhecimento prejudicado
13. Fica prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas.
III – Decisão
Termos em que se decide julgar procedente o pedido arbitral e declarar a ilegalidade das liquidações adicionais de IRC e de IVA que vêm impugnadas, e as correspondentes liquidações de juros compensatório, todas referentes ao ano de 2016, bem como da decisão de indeferimento das reclamações graciosas contra elas deduzidas.
Valor da causa
Fixa-se o valor da causa em € 95.754,90, que corresponde ao valor da liquidação a que se pretendia obstar.
Notifique.
Lisboa, 19 de dezembro de 2022
O Presidente do Tribunal Arbitral
Carlos Fernandes Cadilha
O Árbitro vogal
Jónatas Machado
O Árbitro vogal
Jorge Carita
(vota vencido conforme declaração anexa)
DECLARAÇÃO DE VOTO
Estou inteiramente de acordo com abordagem que o presente Tribunal faz relativamente ao facto de a AT não ter dado a conhecer ao sujeito passivo a identidade concreta das entidades a quem a B..., sua sub contratada, por sua vez sub contratava a produção dos sapatos – é um facto indesmentível.
Contudo, e com todo o respeito não estou inteiramente convencido que tal realidade possa constituir uma violação do princípio da participação no procedimento, já que, em meu entender, tal facto não impossibilitou a empresa contribuinte de exercer o contraditório.
O texto da Decisão remete para os artigos 121º. do CPA, 60º. da LGT, 45º. do CPPT e finalmente para o 267º., nº. 5 da CRP.
Todos eles consagram o direito à participação nas decisões das autoridades administrativas.
Ora a agora impugnante participou previamente, em todas as decisões tomada. A saber:
a). Ao longo do processo inspetivo (alínea A do Probatório);
b). No exercício do direito de audição aquando da notificação do Projeto de Relatório; (alínea B e C do Probatório);
c). No direito de audição aquando do projeto de indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada (Alínea L do Probatório).
Consta da alínea S) do Probatório o seguinte:
-
Na sequência do requerimento deduzido pela Requerente na reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, a Autoridade Tributária veio juntar, através do requerimento de 24 de novembro de 2022, o procedimento inspetivo completo relativo à Requerente, de que consta uma informação do inspetor tributário, datada de 26 de fevereiro de 2020, a proposta de emissão de credencial para a abertura do procedimento, o respetivo despacho de concordância e uma informação relativa às conclusões de uma anterior ação inspetiva, credenciada pela OI2019..., referente à B..., Lda., bem como os pedidos de esclarecimento e a resposta do sujeito passivo, documentos esses que aqui se dão como reproduzidos.
Da transcrição efetuada na alínea U) do Probatório da Informação do Inspetor Tributário de 26 de fevereiro de 2022 consta a identificação de todas as sociedades envolvidas no esquema de fraude, a montante da Requerente e da própria B..., sem que a Requerente se tivesse sobre esta matéria pronunciado, nomeadamente em sede de alegações. Admito que o não tenha feito, porque conhecedora da realidade dos factos admitiu que tal análise não lhe fosse …
E a argumentação utilizada em sede de direito de audição após a notificação do Projeto de Relatório, os termos de apresentação da reclamação graciosa, a participação na decisão antes do indeferimento da reclamação graciosa e o presente PPA fazem supor que o sujeito passivo bem conhece toda a realidade que o envolve, desde a compra da matéria-prima, até à sua entrega nas instalações do fabricante, até ao seu envio para as suas instalações, passando pelo obrigatório controlo de qualidade que tinha que ser feito, fundamentalmente junto dos verdadeiros fabricantes do produto final (os sub - contratados da sub- contratada B...).
Tal conhecimento é esmagadoramente valorado pelos nossos Tribunais no sentido de afastar alguma veleidade das partes quando pretendem atacar os atos administrativos por vício de falta de fundamentação e tal jurisprudência, com todo o respeito, não deve aqui ser afastada.
Na minha modesta opinião e com todo o respeito que me merece a posição assumida maioritariamente por este Tribunal, o mesmo inviabiliza a invocação da violação do princípio da participação.
O sujeito passivo participou e muito em todo este processo, com perfeito conhecimento de causa.
Exerceu a Requerente em todos os momentos o contraditório.
Em que é que este contraditório fica prejudicado pelo simples facto de cada uma das sociedades envolvidas em vez da sua denominação comercial estarem identificadas com uma simples letra?
São estas as sociedades em causa:
“No ano de 2016 a B... teve como principais fornecedores a sociedade F... LDA., doravante F..., NIPC ... e a sociedade G... UNIPESSOAL, LDA., doravante G..., NIPC..., tendo contabilizado na rubrica de subcontratos os montantes de € 1.844.737,20 e € 30.743,001 respetivamente.
Por sua vez, a sociedade F... teve como principal fornecedor a sociedade G..., tendo contabilizado na rubrica de subcontratos o montante € 1.822.144,23 que posteriormente faturou, como prestações de serviço, para a sociedade B... por € 1.844.73722.”
Não se pode acreditar que num meio pequeno – Felgueiras -, mas bastante industrializado em que todos se conhecem (a “fábrica” da B... dista menos de meia dúzia de quilómetros das instalações da Requerente (depoimento do gerente da B...), esta se abstenha de averiguar quais os fornecedores da B... que na realidade produzem os sapatos que depois, com grande responsabilidade pela sua qualidade, vai vender para o estrangeiro.
Não deixa de ser estranho que o Gerente da B... (W...) nunca tenha dito aos responsáveis da Requerente onde mandava fazer os seus sapatos… sendo que todas as empresas aqui em causa têm sede em Felgueiras (questão que apurei posteriormente).
E o RIT descreve as operações praticadas com as sociedades a montante da B..., do mesmo modo que a Requerente defende o circuito físico, documental e financeiro das operações em causa.
E sobre tudo isto se pronunciou a Requerente com rigor e detalhe ao longo de todas as peças escritas que elaborou sobre o assunto.
Mas as correções efetuadas pela AT tiveram por base, nomeadamente:
“12.No decurso do procedimento de inspeção à sociedade B... concluiu-se que a faturação emitida pela sociedade C, a título da prestação de serviços, correspondeu a negócios simulados.
13. Por sua vez, a sociedade C… teve como principal “fornecedor” a sociedade B….
14. Apesar das sociedades C… e B… terem sido cumpridoras das suas obrigações fiscais, verificou-se que as mesmas se limitaram a emitir faturas de prestações de serviços que, por sua vez, foram supostamente subcontratadas a outras entidades que também não dispunham de estrutura para realizar essas operações, nem cumpriam com as suas obrigações fiscais, pelo que as operações realizadas por estas firmas (A… e A1…) foram também consideradas como negócios simulados.
15. A cadeia de faturação entre os vários operadores económicos, atrás relatada, teve por base um esquema de fraude fiscal, que consistia na criação de sociedades instrumentais (uma delas incumpridora) a montante da B... - controladas por esta – que permitiam a dedução a jusante do IVA nas entidades utilizadoras da faturação:
16. Ou seja, as faturas emitidas pelas sociedades B..., C… e B…, que tiveram subjacente subcontratações efetuadas às firmas A… e A1…, foram consideradas operações simuladas, conforme se passa a fundamentou no âmbito do Procedimento de Inspeção realizado à B... (fornecedor do SP, a ora Requerente).
17. De acordo com o Relatório Final de Inspeção de 2020-01-19, realizado pela Direção de Finanças do Porto, ao abrigo da Ordem de Serviço OI2019..., concluiu-se pela existência de negócios simulados entre a B... e os seus principais fornecedores.”
Posta esta diversidade de fornecedores, procedimento já por si estranho que envolvia a interposição de pelo menos 4 empresas antes do sujeito passivo e mais duas ou três antes do consumidor final (supostamente num total de sete), o que é facto é que a AT faz recair as suas investigações sobre as operações praticadas entre a B... e a sua principal fornecedora - a sociedade C….
A Requerida refere esta situação nas suas alegações:
“Tendo a B... declarado operações comercias com o SP, no montante €235.800,00, e face às conclusões do procedimento de inspeção realizado à referida sociedade, nomeadamente à existência de negócios simulados com o seu principal fornecedor, C…, foi solicitada a presente Ordem de Serviço Interna, com o seguinte objetivo:
Cruzar a faturação emitida pela B... para o SP subjacente à subcontratação efetuada junto da C…, uma vez que estes negócios foram considerados simulados e, consequentemente, toda a cadeia de faturação a jusante também corresponde a negócios simulados.
Ora, acontece que as faturas emitidas pela B... para o SP correspondem a faturas emitidas por C… para a B..., por sua vez relacionada com a sua faturação para B… (ver pág 9 das alegações da Requerida)”
Estas operações a montante da B... e naturalmente do SP foram consideradas como falsas e não há conta de que tal situação tenha sido anulada por qualquer Tribunal, pois nesse caso a Requerente teria sido a primeira a disso dar conta a este Tribunal.
Tais decisões condicionam a consideração da faturação da B... para a Requerente como igualmente falsas.
E não se vislumbra até ao momento que a defesa da Requente tenha ficado condicionada por ela não saber a identificação dessas empresas a montante.
Mas vejamos a fundamentação da decisão da AT no presente processo.
“III.3.1 – Factores produtivos na vertente das entidades subcontratadas na origem da cadeia de faturação.
A necessidade de capacidade instalada (instalações, equipamento, organização empresarial,…);
A necessidade de capital humano para as operações de transformação das matérias-primas inerentes à fabricação do calçado, ao qual acresce a especialização dos funcionários para esses trabalhos;
A necessidade de um planeamento organizacional como suporte às prestações de serviços subcontratadas, desde o programa fabril a partir da data da encomenda, como seja: a entrada dos materiais para manufaturar, da posterior entrega do produto acabado/semiacabado, do controle dessas quantidades, do controle de qualidade, das necessidades de transporte daí decorrentes, da movimentação e controle financeiro inerente à globalidade da atividade;
Em síntese, verificou-se a falta destes requisitos no universo das entidades identificadas como prestadores de serviços e, nessa conformidade, fica patente a inverosimilhança das operações comerciais que tiveram como último destinatário a entidade inspecionada, com suporte na faturação emitida pela B... .”
Perante esta situação, definida desde logo a partir do projeto de RIT e neste contexto, necessário seria que a Requerente indagasse junto da B... quem eram essas sociedades por ela sub contratadas, e a partir daí demonstrar que as mesmas tinham:
Capacidade instalada, capital humano e planeamento organizacional.
Mas não o fez.
E isso não era nem é um ónus da Autoridade Tributária.
Preferiu antes guardar o facto de as mesmas não estarem devidamente identificadas, para utilizar esse argumento a favor da anulação das liquidações.
Porque do processo parece resultar, sem muita margem para dúvidas, de que estamos perante faturação falsa.
É sabido que se admite a recusa do direito à dedução quando um sujeito passivo sabia ou devia saber que a operação fazia parte de uma fraude.
O que é rigorosamente o caso dos autos.
A Requerente sabia, por via do RIT, que havia problemas a montante na cadeia produtiva.
Admite-se no contexto comunitário deste imposto que se um sujeito passivo adquiriu bens ou serviços quando sabia ou devia saber que, com essa aquisição, participava numa operação implicada numa fraude ao IVA cometida a montante, tal tem como consequência que se pode considerar que esse sujeito passivo participou nessa fraude, ficando necessariamente em causa o seu benefício do direito a dedução.
Claro que se não sabia, devia saber, porque estava a lidar com empresas sem estrutura instalada e é sua a responsabilidade por essa indagação.
Diz ainda o Senhor Professor; “…sabia ou devia saber – se tinha procedido às verificações que podiam ser razoavelmente exigidas a qualquer operador económico – que a operação em que participava estava ligada a uma fraude.”
E não consta do processo que a Requerente tenha feito essa indagação, que razoavelmente pudesse ser solicitada a qualquer operador económico a qual, aliás, estava perfeitamente ao seu alcance. Era tudo gente de Felgueiras….
O melhor interesse das empresas parceiras de negócio passa sempre pela melhor cooperação entre elas, razão pela qual sempre deveria a Requerente ter indagado junto da B... quais eram os seus fornecedores, sendo que aliás em princípio a matéria-prima adquirida pela Requerente sempre teria que ser lá entregue.
Estranha-se que o não tenha feito.
Não posso deixar de salientar que a razoabilidade dos argumentos utilizados pela Requerente para anular a liquidação em causa está bem à vista, já que todos eles foram afastados por este Tribunal e era longa a lista:
“a) Preterição de formalidades essenciais no âmbito do procedimento inspetivo que originou a correção tributária, porquanto o procedimento foi qualificado como interno quando se traduziu num procedimento externo, na medida em que utilizou informação recolhida através de outros procedimentos inspetivos realizados junto de terceiras entidades e fora das instalações da Autoridade Tributária;
b) Ausência de notificação prévia ao sujeito passivo do início e do fim da inspeção e de emissão da ordem de serviço necessária para credenciar a prática dos atos de inspeção;
c) Inobservância do prazo de 6 meses de duração do procedimento;
d) Falta de notificação ao mandatário constituído dos atos de liquidação resultantes das correções tributárias;
e) Omissão de diligências requeridas no âmbito do procedimento em vista à produção de prova testemunhal arrolada;
f) Falta de fundamentação dos atos tributários;
g) Violação do princípio da participação no procedimento inspetivo;”
Na minha modesta opinião o último dos argumentos invocado deveria ser decido do mesmo modo que os anteriores.
Refere o presente Acórdão (págs. 32 e 33) que:
“A relevância da prova obtida relativamente às entidades C…, B…, A… e A1… (e que se encontra transcrita no Relatório) é evidenciada pelo facto de ter isso a inexistência de fatores produtivos no universo das empresas subcontratadas que justificou que a faturação emitida a jusante pela B... a favor da Requerente fosse igualmente considerada como simulada.”
Extremamente simples para a Requerente a sua defesa de um modo consistente:
Juntava, em qualquer dos momentos que teve ao logo de todo o processo para o fazer, os elementos de prova que demonstrassem que as entidades a montante do processo produtivo tinha ao seu dispor os fatores produtivos, cuja ausência provocou a conclusão da AT quando à simulação das suas próprias operações.
Razão pela qual e com todo o respeito, não posso concordar com a conclusão que leva ao sentido da Decisão neste processo:
“Ora, a não identificação de entidades terceiras cuja atividade terá sido determinante para a própria correção tributária na esfera jurídica da Requerente, inviabilizou que o contribuinte, pudesse participar e influenciar a formação da vontade da Administração, quer no plano meramente argumentativo, quer através da carreação de novos elementos de facto, e, desse modo, impediu que o interessado pudesse pôr em causa a veracidade dos factos que, sendo imputáveis a terceiros, afetam a sua posição jurídica.”
O sujeito passivo não juntou novos elementos de facto relativamente a sociedades que tão bem conhecia, pura e simplesmente porque esses elementos em nada abonavam a favor da sua tese.
E esta realidade - a realidade do mundo real – não fica, na minha modesta opinião, valorada nem salvaguardada com esta decisão.
Este Tribunal entende que o conhecimento da identidade dessas sociedades “…poderia conduzir a uma ampliação da matéria de facto e a uma apreciação mais alargada dos pressupostos substanciais em que se fundamentam os atos tributários.”
Mas essa ampliação da matéria de facto não se deu porque a Requerente não o quis. Foi tática, não foi impossibilidade.
E assim prevalece a forma sobre a substância. Os vícios formais sobre a realidade dos factos e a realidade da vida.
Razões pelas quais e com todo o respeito, não acompanho o sentido projetado para a presente decisão.
Lisboa 19 de dezembro de 2022
(Jorge Carita)