Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 16/2022-T
Data da decisão: 2022-12-30  IRC  
Valor do pedido: € 95.450,10
Tema: IRC - Benefícios fiscais – RFAI – deduções à coleta de IRC – Tipologia de investimento (inicial), adições de equipamento, gastos financeiros – Art. 22.º CFI.
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Sumário:

1 – A aquisição, em 2014, de equipamentos essenciais à operacionalidade da linha de produção de lâmpadas LED, iniciada em 2013 e concluída em 2014, não configura uma aquisição isolada/avulsa de equipamentos. Esses equipamentos interligam-se à linha de produção, pelo que fazem parte integrante do investimento inicial. Devem, assim, ser enquadrados como uma adição, para efeitos do disposto no artigo 22.º, n.º 5 do CFI. 

2 – Apesar de o artigo 22.º do CFI não contemplar as despesas de transporte, alfandegárias e de deslocações, a interpretação do conceito de aplicações relevantes no âmbito do RFAI, deve tomar por referência o conceito de ativos fixos tangíveis mencionado na alínea a) do seu n.º 2, com a aceção que este tem na sua fonte legal: as normas contabilísticas. A NCRF 7 inclui como elementos do custo de um ativo fixo tangível, além do seu preço de compra, uma série de outros componentes, como direitos de importação, custos de entrega e instalação. Não vindo questionada a realização das despesas de transporte, aduaneiras e de deslocação de técnicos chineses para apoiar a instalação e ficando demonstrada a sua associação à aquisição dos equipamentos afetos à linha de produção de lâmpadas LED, não podem aquelas deixar de ser consideradas como (parte do valor do) investimento “relevante” efetuado nos ativos fixos tangíveis a que correspondem (e com os quais foram contabilizadas).

3 - A contabilização das lâmpadas LED como inventários (existências) em 2014 e 2015 pressupõe que se tratou de bens inicialmente adquiridos com a intenção de venda no decurso normal da atividade da Requerente, ou para serem aplicados no processo de produção (matérias-primas ou consumíveis) ou em prestações de serviços (v. NCRF 18, § 6). A subsequente reclassificação contabilística, derivada da aplicação das lâmpadas LED no âmbito de um contrato comercial outorgado entre a Requerente e um seu cliente, para a instalação de luminárias em postos de abastecimento de combustíveis, não consubstancia a realização de um investimento relevante para efeitos de RFAI, pois não resulta de novas aquisições de bens efetuadas, provindo de transferências internas – saídas de bens – que já se encontravam reconhecidas em inventários.

4 - A aquisição de um equipamento para modernização da linha de produção (máquina aparafusadora) é enquadrável no âmbito de um investimento inicial – estratégico e não avulso –, relacionado com o aumento da capacidade do estabelecimento (existente) da Requerente.

5 - Os custos financeiros podem ser considerados para efeitos de RFAI se forem reconhecidos como custo dos ativos (equipamentos) que constituam aplicações relevantes neste âmbito e o seu valor integrar (do prisma contabilístico) o dos próprios ativos. Impõe-se, porém, demonstrar, a efetiva ligação dos custos financeiros à aquisição dos bens que constituem os ativos elegíveis, o que no caso não sucedeu. 

6 – A preterição do direito de audiência prévia em relação à liquidação de juros compensatórios comporta a respetiva anulação.

7 – Não se constata o vício de dupla inspeção externa ao período de tributação de 2015, pois as correções em discussão respeitam a deduções à coleta concretizadas nas declarações modelo 22 dos anos 2017 e 2018, derivando de procedimentos inspetivos cujo âmbito temporal também se circunscreveu aos períodos de tributação de 2017 e de 2018.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Os árbitros Alexandra Coelho Martins (presidente), Rui Miguel Marrana e Hélder Faustino, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formarem o Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 22 de março de 2022, acordam no seguinte:

 

                                                 

            

            I.         Relatório

 

A..., S.A., doravante designada por “Requerente”, pessoa coletiva n.º..., com sede na Zona Industrial de ..., ..., ..., ...-... ..., veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral e deduzir pedido de pronúncia arbitral (“ppa”), ao abrigo do disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), na sequência da notificação da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa deduzida contra os atos de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) e juros compensatórios correspondentes, referentes aos períodos de tributação de 2017 e 2018, que resultaram no valor global a pagar de € 95.450,10. 

 

É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por “AT” ou “Requerida”. 

 

Em 14 de janeiro de 2022, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e seguiu a sua normal tramitação com a notificação da AT. 

 

De acordo com o preceituado nos artigos 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT, o Exmo. Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável. As Partes, notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar.

 

O Tribunal Arbitral Coletivo ficou constituído em 22 de março de 2022. 

 

            Em 3 de maio de 2022, a Requerida apresentou Resposta, com defesa por impugnação, e juntou o processo administrativo (“PA”). 

 

            Em 23 de junho de 2022, teve lugar a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, com inquirição de três testemunhas indicadas pela Requerente, tendo sido prescindidas duas. As Partes foram notificadas para apresentarem alegações escritas, o Tribunal designou a data de prolação da decisão arbitral e a Requerente foi advertida da necessidade de pagamento da taxa subsequente (v. ata que se dá por reproduzida e gravação áudio disponível no SGP do CAAD). 

 

Em 14 de julho de 2022, a Requerente apresentou alegações, reafirmando a posição expressa no articulado inicial. A Requerida optou por não alegar. 

 

Por despachos de 20 de setembro e de 22 de novembro de 2022, foi prorrogado o prazo para prolação da decisão, ao abrigo do artigo 21.º, n.º 2 do RJAT, derivado da tramitação processual, da interposição de períodos de férias judiciais e da situação pandémica.

 

Posição da Requerente

 

            Ilegalidades do Procedimento

 

            A Requerente começa por invocar a violação dos princípios do inquisitório, da audiência dos interessados e do contraditório, por ter solicitado no decurso do procedimento inspetivo a inquirição de testemunhas, diligência que considera essencial para o apuramento da verdade material e para a satisfação do ónus da prova que sobre si impende ao abrigo do disposto no artigo 74.º da Lei Geral Tributária (“LGT”), que foi recusada pelos Serviços de Inspeção Tributária (“SIT”). 

 

            Argui que a realização de diligências complementares é, ainda, exigida pelo disposto nos artigos 58.º da LGT e 6.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (“RCIPTA”). 

 

            Para a Requerente, a indicação de meios de prova é uma forma de exercício do direito de participação consagrado nos artigos 60.º, n.º 1 da LGT e 60.º do RCPITA, que, desta forma, foi preterido de forma substantiva.

            Argumenta ainda que o princípio do aproveitamento do ato administrativo não é passível de aplicação, pois, não só a diligência seria suscetível de influenciar a decisão final, como não está em causa uma atividade vinculada. Assim, conclui pela verificação de vícios procedimentais suscetíveis de anular os atos impugnados por violação de princípios e formalidades absolutamente essenciais impostas pelos artigos 266.º e 267.º, n.º 1 da Constituição.  

 

            Por outro lado, invoca ter sido realizada uma dupla inspeção externa com incidência no período de tributação de 2015, vigorando uma proibição de múltiplas inspeções sobre o mesmo objeto, tendo em vista a tutela da segurança jurídica do sujeito passivo, uma vez que não se demonstrou que a segunda inspeção se baseasse em factos novos, não conhecidos ou que não fossem passíveis de o ser na primeira inspeção (v. artigo 63.º, n.º 4 da LGT). 

 

            Erro nos Pressupostos – Elegibilidade dos Investimentos para efeitos do RFAI

            

            Linha de Produção de Lâmpadas LED – Exercício de 2014 

 

            Em relação ao investimento na linha de produção de lâmpadas LED, a Requerente alega que, apesar de uma parte substancial ter sido realizada em 2013, foram contabilizadas no ano 2014 despesas necessárias à instalação dos equipamentos nessa linha de produção, em complemento ao investimento relevante realizado em 2013. Invoca que não estamos perante aquisições isoladas de equipamentos e que as adições ao investimento devem ser admitidas nos termos do artigo 22.º, n.º 5 do Código Fiscal do Investimento (“CFI”), encontrando-se reunidas as respetivas condições de elegibilidade: os equipamentos integram a lista de ativos fixos, foram adquiridos a terceiros em estado de novo, potenciam o incremento da produção e constituem uma alteração fundamental do processo de produção global. Quanto ao aspeto temporal, afirma que os gastos decorrentes do investimento têm de ser imputados ao período de tributação em que foram incorridos, pelo que o investimento materializado em equipamentos adquiridos em 2014 deve ser reconhecido nesse exercício [2014]. 

 

            Sobre os gastos alfandegários decorrentes do transporte da mercadoria adquirida pela Requerente em 26 de novembro de 2013, com prazo de expedição médio de 45 dias após o pagamento, e que foram faturados em 2014, a Requerente entende que se encontram abrangidos pelo conceito de investimento relevante, que não se limita ao preço de aquisição do equipamento, compreendendo todo o investimento necessário à adição do ativo tangível em causa, à semelhança do que se passa com os critérios de mensuração do ativo aplicados no plano contabilístico. 

 

            Linha de Produção de Lâmpadas LED – Exercício de 2015 

 

            Sobre as lâmpadas LED, que foram inicialmente contabilizadas como inventários e depois reclassificadas para ativo fixo tangível, a Requerente defende que devem ser consideradas como investimento elegível no âmbito do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (“RFAI”), preenchendo os respetivos requisitos, por terem sido adquiridas em estado de novo e por estarem afetas à exploração da empresa gerando benefícios futuros. 

 

            Linha de Produção de Lâmpadas LED – Exercício de 2017 

 

            Em relação a 2017, a Requerente opõe-se à desconsideração, para efeitos de RFAI, do investimento no equipamento industrial “automatic screw machine”. Refere que, ao contrário do que foi invocado pela AT, não consubstancia uma aquisição de forma isolada sem contributo para o aumento da capacidade de produção, pois este equipamento foi integrado e constitui um dos módulos da linha de produção de lâmpadas LED, permitindo a sua atualização e a otimização do processo de produção, com melhorias de eficiência e de rapidez (fixação mecânica e automática de parafusos, em substituição da incorporação manual). 

 

            Linha de Produção de Papel Autoadesivo – 2014

 

            Segundo a Requerente, os encargos decorrentes de empréstimo bancário destinado a apoio ao investimento, em concreto para a obtenção dos ativos que integram a linha de produção de papel autoadesivo, estão diretamente associados aos custos de aquisição dos ativos, têm de ser capitalizados como parte do custo desse ativo e, portanto, enquadram-se como investimento relevante elegível, nos termos do artigo 22.º do CFI. 

 

            Juros Compensatórios

 

            A Requerente suscita a ilegalidade formal relativa à preterição do direito de audição (v. artigo 60.º da LGT) em relação aos juros compensatórios, por não ter sido previamente chamada a pronunciar-se sobre os mesmos, sendo o Relatório de Inspeção Tributária (“RIT”) omisso nesta matéria. Aduz que o incumprimento desta formalidade é passível de influenciar a decisão final do procedimento, pois os juros dependem da imputação ao agente, a título de culpa, do retardamento da liquidação. 

 

            Conclui pela anulação das liquidações de IRC impugnadas, com a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios. 

 

Posição da Requerida

 

            Para a Requerida, a Requerente não logrou provar os factos alegados (v. artigos 74.º da LGT e 342.º do Código Civil), nomeadamente no que respeita a faturas referentes à viagem e alojamento de duas pessoas em Hong Kong, ou à utilização dos fundos obtidos por empréstimo bancário para a aquisição dos ativos elegíveis, incluindo o requisito temporal previsto no artigo 2.º, n.º 5 do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro. 

 

            Em relação aos vícios procedimentais, na perspetiva da Requerida, a diligência de prova testemunhal não está prevista no artigo 60.º da LGT, nem no artigo 6.º do RCPITA, assistindo à AT a direção do procedimento. Considera decorrer do artigo 25.º do CFI, por remissão para o artigo 130.º do Código do IRC, que a dedução à coleta do RFAI é justificada por documento a integrar o processo de documentação fiscal, não estando no caso devidamente suportada, requisito que não pode ser suprido por prova testemunhal. Acrescenta que a Requerente foi validamente notificada para exercício do direito de audição, tendo-lhe sido dado o contraditório. 

            Por outro lado, no tocante à proibição de dupla inspeção externa prevista no artigo 63.º, n.º 4 da LGT, defende que não se enquadra na situação vertente, desde logo, por estarmos na presença de diferentes períodos de tributação: 2017 e 2018. A possibilidade de reporte do benefício (RFAI) pelo período máximo de 10 anos, quando ocorra insuficiência de coleta, implica que só no exercício em que é deduzido à coleta o benefício fiscal [do RFAI] possa ocorrer o respetivo ajustamento e não quando o investimento foi feito (por exemplo, 2014 ou 2015), se em períodos de tributação distintos. Assim, tendo sido efetuada a dedução à coleta nos mencionados exercícios de 2017 e 2018, nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, é quanto a estes que se reporta a inspeção.  

 

            Sobre a inelegibilidade dos investimentos, cuja dedução à coleta foi corrigida, a Requerida sublinha a natureza excecional dos benefícios fiscais, insuscetíveis de integração analógica (v. artigos 10.º do EBF e 11.º, n.º 4 da LGT), e refere que, na situação vertente, ou não são qualificáveis como despesas relevantes, segundo o disposto no artigo 22.º, n.º 2, alínea a) do CFI, e/ou não se subsumem no subsunção no conceito de investimento inicial – artigo 2.º, alínea a), § 49 do Regulamento (UE) 651/2014 (“RGIC”) e artigo 2.º, n.º 2, alínea d) da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro. 

 

            Neste âmbito, entende a Requerida que: 

Investimentos realizados em 2014 – Linha de Produção de Lâmpadas LED

a)    As despesas suportadas com fretes marítimos e despesas alfandegárias não cabem, em si mesmas, i.e., encaradas de forma autónoma em relação aos investimentos realizados em anos anteriores, na definição de despesas relevantes (v. artigo 22.º, n.º 2, alínea a) do CFI), independentemente das regras de valorimetria dos elementos do ativo fixo estabelecidas no artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009; 

b)    As despesas de aquisição de ferramentas e outros bens são “aquisições isoladas de diversos equipamentos”, pelo que não são abrangidas pelo conceito de investimento inicial; 

Investimentos realizados em 2015 – Linha de Produção de Lâmpadas LED

c)    A parte mais significativa dos investimentos contabilizados em contas do ativo fixo tangível não resultou de novas aquisições de bens, mas de transferências internas de bens (lâmpadas LED) que já se encontravam registados em contas de inventário, pelo que não se verificou o efeito de adicionalidade, nem o aumento da capacidade produtiva do estabelecimento, não observando os requisitos do artigo 22.º, n.ºs 2 e 5 do CFI e o conceito de “investimento inicial” da Portaria n.º 297/2015; 

d)    No que se refere aos direitos alfandegários, fretes marítimos e despesas logísticas não se percebe a que bens estão associados e em si mesmos não revestem a natureza de despesas relevantes (v. artigo 22.º, n.º 2, alínea a) do CFI); 

e)    Sobre a aquisição da “automatic screw machine”, não obstante os alegados ganhos de eficiência, a Requerida defende que se trata de um investimento avulso não incluído no âmbito do RFAI, que exige um projeto integrador global, até porque o mesmo deverá proporcionar a criação de postos de trabalho e a sua manutenção nos termos do disposto no artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do CFI;

Investimentos realizados na Linha de Produção de Papel Autoadesivo

f)     As correções efetuadas às dotações do benefício fiscal respeitam, em 2017, a investimentos realizados no exercício de 2014 e, em 2018, a investimentos realizados no exercício de 2015, tendo a Requerente contestado apenas os fundamentos da correção ao investimento de 2014, na parte dos encargos contabilizados na conta 453331-SFT-Curso-.... Isento (juros, comissões e encargos bancários). Esses encargos não podem ser aceites como investimento elegível no RFAI, pois o contrato de empréstimo não permite associar de forma inequívoca a aplicação dos fundos obtidos e as aquisições de ativos fixos consideradas elegíveis para este benefício, nem ficou provado o requisito temporal (v. artigo 2.º, n.º 5 do Decreto Regulamentar n.º 25/2009. 

 

            A Requerida conclui que o pedido é improcedente, incluindo na parte referente à pretensão de juros indemnizatórios, por inexistir erro imputável aos serviços, como postula o artigo 43.º da LGT, dado que a liquidação deriva diretamente da aplicação da lei. 

 

II.            Saneamento

 

O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, atenta a conformação do objeto do processo dirigido à anulação de atos de liquidação de IRC e correspondentes juros compensatórios (v. artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 5.º do RJAT).

 

O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, conjugado com o artigo 102.º, n.º 1, alínea e) do CPPT, a contar da notificação do indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra os atos tributários impugnados. 

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (v. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março). 

 

É admissível a cumulação de pedidos relativos a diferentes atos e anos (2017 e 2018) tendo em conta que estão em discussão as mesmas circunstâncias de facto e a interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito, relativos à elegibilidade dos benefícios fiscais, conforme previsto no artigo 3.º, n.º 1 do RJAT.

 

Não foram identificadas nulidades ou questões que obstem ao conhecimento do mérito. 

 

 

III.          Fundamentação de Facto

 

1.              Factos Provados

 

Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos que se julgam provados:

 

A.     A A..., S.A., aqui Requerente, é uma sociedade que tem por objeto social a “[i]mportação, exportação e comércio de representações e produtos para as empresas da área do comércio e serviços, prestação de serviços e assistência técnica. Transformação de todo o tipo de suportes, materiais de impressão e comunicação digital. Fabricação de componentes eletrónicas. Fabricação de lâmpadas elétricas e de outro equipamento de iluminação. Reparação e manutenção de equipamento elétrico. Aluguer de máquinas e equipamentos”, a que correspondem os seguintes códigos de atividade económica (“CAE”)

Tipo

Código CAE

Designação

Principal

46690

Comércio por grosso de outras máquinas e equipamentos

Secundário 1

17120

Fabricação de papel e de cartão (exceto canelado)

Secundário 2

27400

Fabr. lâmpadas elétricas e outro equipamento iluminação

Secundário 3

26110

Fabricação de componentes eletrónicos

– cf. Relatório de Inspeção Tributária (“RIT”).

B.      Em concreto, a Requerente é fabricante e integradora de sistemas com soluções de alto valor acrescentado para os mercados de impressão digital, exibição, etiquetagem e comunicação visual, que assenta a sua atividade em duas marcas próprias, a “H...” e a “I...”, e na representação da marca “J...” de origem japonesa – cf. RIT. 

C.     Em 2013, foi realizado pela Requerente um investimento superior a 200.000 euros relativo à criação de uma linha de produção própria de lâmpadas LED, situada na unidade fabril de ..., cuja implementação ficou concluída em 2014 – cf. RIT e depoimentos das três testemunhas inquiridas. 

D.     Esta linha de produção é composta por equipamentos e maquinaria diversa que funcionam de forma interligada e sequencial – cf. depoimentos das três testemunhas inquiridas. 

E.      Em 2014, a Requerente contabilizou aquisições de equipamentos novos, efetuadas nesse ano, contabilizados como ativos fixos tangíveis, no valor de € 6.404,00. Estes equipamentos foram afetos à linha de produção de lâmpadas LED (ferramentas, lavatório em inox, rolos de borracha para piso I..., estrutura em inox para linha de ensaio I..., armário de frio digital, bombas hidráulicas, entre outros), sendo essenciais para manter as condições necessárias, nomeadamente de temperatura, dos componentes – cf. RIT, Documentos 10 e 11 e depoimentos das três testemunhas inquiridas. 

F.      Em 2014, foram incorridos pela Requerente custos e despesas alfandegárias de transporte de equipamentos encomendados em 2013, despesas de deslocação de técnicos chineses de Hong Kong para Portugal e seu alojamento, relacionados com a implementação da linha de produção de lâmpadas LED, na importância de € 21.589,47, contabilizados em rúbricas de ativo fixo tangível em curso (“Linha Montagem I...”, sendo “I...” a marca de soluções LED da Requerente ) – cf. Documento 9, RIT e Anexo XIII do RIT.  

G.     Em 2015, a Requerente procedeu à reclassificação de inventários para ativo fixo tangível de lâmpadas LED, no valor de € 162.137,19, que haviam sido adquiridas em 2014 e 2015 em estado de novo, e incorreu, em relação às mesmas, em custos de direitos, fretes marítimos e despesas, no montante de € 2.489,63 – cf. Documento 12 e RIT.

H.     Estes bens [lâmpadas LED] foram utilizados no âmbito do contrato comercial outorgado entre a Requerente e a E..., S.A., referente à instalação de luminárias em 60 postos de abastecimento de combustíveis (cerca de 12.000 lâmpadas LED). Este contrato foi celebrado com a duração de 5 anos e previa a aplicação, manutenção e substituição de lâmpadas nesses postos – cf. RIT e depoimentos da primeira e da segunda testemunhas. 

I.       Em 2017, foi adquirido em estado de novo o equipamento “automatic screw machine” (aparafusadora mecânica), pelo valor de € 14.270,89, que foi integrado e constitui um dos módulos da linha de produção de lâmpadas LED – cf. RIT, Documento 13 e depoimentos das segunda e terceira testemunhas. 

J.       A incorporação deste equipamento permitiu a introdução de um processo mecânico e automático de fixação de parafusos no processo de produção dos módulos LED full color, que anteriormente era feito manualmente, e não só exigia mais tempo de produção como colocava em causa a uniformidade / qualidade do produto final – cf. Documento 13 e depoimentos das segunda e terceira testemunhas. 

K.     A Requerente celebrou com a Caixa ..., em 28 de fevereiro de 2013, um contrato de abertura de crédito até ao montante de um milhão de euros destinado a apoio ao investimento, tendo incorrido, em 2014, no valor de € 32.272,22 de despesas bancárias que contabilizou na conta #453313 – AFT Curso –... Isenta – cf. RIT e depoimento das primeira e segunda testemunhas. 

L.      Ainda com referência ao período de 2014, a Requerente contabilizou em rúbrica de ativo fixo tangível (#453331-A.F.T-Curso-... Merc) despesas de transporte, decoração e iluminação de fachada do edifício, com instalação de um painel Led para exibir conteúdos que dessem a conhecer a nova produção do papel Autoadesivo, no valor de € 15.646,42, e despesas com plantas decorativas de € 5.645,74 – cf. RIT.

M.    Em 2015, a Requerente considerou como investimento elegível para efeitos de RFAI € 15.704,29 referentes à aquisição de plantas de jardim e material de rega – cf. RIT. 

N.     Em 22 de julho de 2019, teve início um procedimento inspetivo externo à Requerente, de âmbito geral, realizado aos anos 2017 e 2018, ao abrigo das Ordens de Serviço n.ºs OI 2019...e OI 2019..., para controlo declarativo – cf. RIT. 

O.     Em resultado deste procedimento de inspeção, após exercício do direito de audição pela Requerente, que não foi atendido, foram efetuadas correções meramente aritméticas de IRC e juros compensatórios, com referência aos exercícios de 2017 e 2018, relativas às deduções à coleta efetuadas a título de RFAI, estando em causa os seguintes investimentos – cf. Documento 5 junto pela Requerente e RIT:

Ano

Descrição do Investimento

Investimento Relevante

Dotação

Correção ao Benefício Fiscal

2014

Instalação da linha de produção lâmpadas LED

€ 27.993,52

€ 6.998,38

€ 6.998,38

2015

Instalação da linha de produção lâmpadas LED

€ 164.626,73

€ 41.156,68

€ 41.156,68

2017

Instalação da linha de produção lâmpadas LED

€ 14.270,89

€ 3.567,72

€ 3.567,72

2014

Linha de produção de papel autoadesivo

€ 2.203.160,66

€ 550.790,17

€ 13.391,09

2015

Linha de produção de papel autoadesivo

€ 1.344.216,41

€ 336.054,10

€ 3.926,07

 

P.      Para fundamentar estas correções, na parte relevante para o objeto desta ação, refere o Relatório de Inspeção Tributária, o seguinte – cf. RIT:

II.2. Motivo, âmbito e incidência temporal

[…]

5. Benefícios fiscais dedutíveis a coleta do IRC – anos de 2017 e 2018

[…]

Conforme elementos evidenciados […], o SP apesar de ter declarado lucros tributáveis em montantes substancialmente elevados, de € 3.409.614,86, no período de tributação de 2017 e € 2.955.971,33, em 2018, os valores de IRC a pagar nos mesmos períodos de tributação foram nulos […]

O facto de não existir qualquer imposto a entregar ao Estado, é justificado pela utilização de benefícios fiscais dedutíveis à coleta, no caso relativos ao SIFIDE II (Sistema de incentivos fiscais em investigação e desenvolvimento empresarial), e ao RFAI (Regime fiscal de apoio ao investimento), previstos, respetivamente nos artigos 35.º a 42.º e 22.º a 26.º, do Código Fiscal do Investimento (CFI). 

Os montantes considerados pelo sujeito passivo para efeito desses benefícios (apresentados no quadro 07 do Anexo D das declarações modelo 22 de 2017 e 2018) são os seguintes: 

Período de tributação de 2017

Quadro 07 – Anexo D

Saldo não deduzido período anterior

Dotação do

período

Dotação do

Período

Saldo que transita

SIFIDE – quadro 073

556.374,43 €

310.991,98 €

357.709,56 €

509.656,76 €

RFAI – quadro 074

969.864,51 €

61.837,26 €

357.709,56 €

673.992,21 €

TOTAL 2017

1.526.238,94 €

372.829,24 €

715.419,12 €

1.183.648,97 €

 


 

Período de tributação de 2018

Quadro 07 – Anexo D

Saldo não deduzido período anterior

Dotação do

período

Dotação do

Período

Saldo que transita

SIFIDE – quadro 073

509.656,76 €

0,00 €

310.076,99 €

199.579,77 €

RFAI – quadro 074

673.992,21 €

25.020,70 €

310.076,99 €

388.935,92 €

TOTAL 201[8]

1.183.648,97 €

25.020,70 €

620.153,98 €

588.515,69 €

[…]

5.2. Benefício fiscal relativo ao RFAI – Exercício de 2014 a 2018

O Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), em vigor para os períodos de tributação de 2014 a 2020, foi estabelecido no âmbito do Código Fiscal do Investimento (CFI), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014 de 31 de outubro, e constitui, nos termos do n.º 2 do artigo 1.º desse normativo, um regime de auxílio de Estado com finalidade regional, aprovado nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014 (Regulamento Geral de Isenção por Categoria ou RGIC), que declara certas categorias de auxílio  compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).

O benefício fiscal do RFAI, previsto nos artigos 22.º a 26.º do CFI, consiste na dedução à coleta do IRC, até à concorrência de 50% do seu valor, de uma percentagem de 25% das aplicações relevantes consubstanciadas em aquisições, em estado novo, de ativos fixos tangíveis (com as exceções apresentadas na alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI) e intangíveis (despesas com transferência de tecnologia, cf. alínea b) do n.º 2 do artigo 22.º).

De entre as condições previstas no artigo 22.º do CFI para a atribuição deste benefício fiscal destacam-se:

a) O enquadramento da atividade exercida pelo sujeito passivo nos setores previstos no n.º 2 do artigo 2.º do CFI, (n.º 1);

b) A existência de contabilidade organizada e o lucro tributável não determinado por métodos indiretos (alíneas a) e b) do n.º 4);

c) A manutenção na empresa e na região, durante um período mínimo de 3 anos a contar da data dos investimentos (para PME, o que é o caso da A..., SA em 2014), dos bens objeto do investimento (alínea c) do n.º 4);

d) A inexistência de dívidas ao Estado e à Segurança Social (alínea d) do n.º 4);

e) O investimento relevante tem que proporcionar a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto do investimento (alínea f) do n.º 4).

Nos termos do n.º 1 do artigo 25.º do CFI, a dedução à coleta determinada no âmbito do RFAI «(…) é justificada por documento a integrar o processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 130.º do Código do IRC, que identifique discriminadamente as aplicações relevantes, o respetivo montante e outros elementos considerados relevantes.»

Neste sentido, os ativos fixos tangíveis e intangíveis, adquiridos em estado novo e considerados para efeitos do benefício fiscais devem corresponder ao conceito de “investimento inicial”, definido na alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal o investimento relacionado com:

a) A criação de um novo estabelecimento;

b) O aumento da capacidade de um estabelecimento já existente;

c)  A diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento; ou

d) Uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento já existente.

A obrigação de o investimento inicial corresponder a uma das 4 tipologias elencadas no ponto anterior, está também patente na alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, que procede à regulamentação do RFAI.

Segundo a alínea a) do n.º 1 do artigo 7.º desta Portaria, o SP deve incluir no processo de documentação fiscal «a descrição do investimento inicial, indicando designadamente os objetivos, áreas de intervenção e os principais investimentos, bem como o respetivo enquadramento numa das tipologias previstas na alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da presente portaria».

Quanto ao enquadramento da atividade da A..., SA num dos setores previstos no n.º 2 do artigo 2.º do CFI, confirmou-se que o sujeito passivo, apesar de estar coletado para a atividade principal de “CAE Principal Comércio por Grosso de outras máquinas”, com o código CAE 46690, procede nas suas instalações ao fabrico de produtos de marcas próprias, sendo estas atividades secundárias elegíveis para efeitos de RFAI.

Relativamente às atividades secundárias e elegíveis para efeitos de RFAI, as mesmas caracterizam-se por:

•       H...” – fabrico de produtos consumíveis de impressão - código “CAE 17120”;

•       I...” – fabrico de painéis LED (lâmpadas Led) - código “CAE 27400”;

No que concerne ao enquadramento das aquisições de bens e serviços como “investimento inicial”, nos termos definidos na alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC e na alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, o SP caracterizou o investimento efetuado entre 2014 a 2018, como um “aumento da capacidade do estabelecimento já existente”.

No processo de documentação fiscal, a que se refere o artigo 130.º do Código do IRC, na parte que identifica discriminadamente as aplicações relevantes efetuadas, o respetivo montante e outros documentos relevantes previstos nos artigos 22.º e 25.º do Código Fiscal do Investimento (CFI), foi possível verificar que estes investimentos, foram realizados nas atividades secundárias, código “CAE 17120”, a que corresponde a “fabricação de papel e de cartão (exceto canelado)” e ao código “CAE 274002, o qual corresponde ao “fabrico lâmpadas elétricas e outro equipamento iluminação”. 

Na prática, os investimentos foram realizados em marcas próprias, “H...” (para os produtos consumíveis de impressão), a que corresponde o código CAE 17120, e na linha “I...” (lâmpadas/painéis LED), a que corresponde o código CAE 27400.

Nestes termos, e de acordo com os documentos constantes no dossier fiscal, o investimento total foi de € 5.693.899,00, o qual foi consubstanciado na construção e aquisição de:

a)  Construção de unidade industrial - Constatou-se que os investimentos efetuados, estão relacionados com a unidade fabril principal sita em ... (obras nas secções de produção de Autoadesivos e LED);

b)  Aquisição de equipamento produtivo (ativos fixos tangíveis) - Com ênfase na aquisição de ativos fixos tangíveis correspondentes à implementação de uma nova linha de produção de Autoadesivos UV, linha de produção de lâmpadas LED, nomeadamente, ferramentas produtivas diversas e máquinas para a realização de testes/ensaios); 

c)   Outros ativos fixos tangíveis – Diretamente associados à atividade produtiva, designadamente: empilhadores, caldeiras a vapor, porta paletes, sistema de ventilação, impressoras para linha de produção, moldes para rolos, estante para armazém.

Em complemento a estas informações, e por se consideram que os elementos constantes no processo de documentação eram insuficientes, em 14-02-2020, através de mail foi solicitado ao SP esclarecimentos adicionais, nomeadamente: «descrição dos investimentos, indicando designadamente os objetivos, áreas de intervenção e os principais investimentos (CAE 27400 e 17120).»

Em 10-03-2020 a A..., SA remeteu um mapa resumo no qual identifica a: descrição investimento, investimentos relevantes, objetivos, área de intervenção, enquadramento,

Mapa Resumo - Investimentos realizados pela A..., SA, ao abrigo do RFAI

O quadro anteriormente remetido pelo SP foi complementando com uma breve nota explicativa que a seguir se transcreve:

«(…) No que respeita ao ponto 1 apresentamos em anexo quadro resumo com a descrição dos investimentos, objectivos, áreas de intervenção e enquadramento para cada um dos anos. Na sua grande maioria os investimentos foram alocados ao CAE 17120 uma vez que foram efectuadas obras nas secções de produção de Autoadesivos, bem como equipamentos para apoio da produção. Também efetuámos investimentos relativos à instalação de uma linha de produção de lâmpadas LED, estando alocado ao CAE 27400.»

No dia 27 de maio de 2020, realizou-se uma visita às instalações da unidade fabril da A..., SA, em particular, à unidade de produção e armazenamento, a qual foi acompanhada pela Dra. B... (Responsável pelo departamento de contabilidade), e Dr. C... (Diretor Financeiro), os quais prestaram os devidos esclarecimentos, referente à construção do novo pavilhão (unidade industrial) e centro logístico (armazém), bem como o respetivo processo produtivo.

[…]

Salienta-se, que a análise documental e a posterior visita efetuada, verificou-se que o investimento efetuado na “linha de produção lâmpadas LED”, não é elegível para efeitos de RFAI, conforme se descreve e fundamenta no capítulo III do presente relatório.

[…]

III. Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à M. Colectável

[…]

III.4 – (RFAI) – Investimentos realizados na “linha de produção de lâmpadas LED

Da análise documental e visita às instalações da área fabril, verificou-se que o SP efetuou investimentos no âmbito do benefício fiscal do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), os quais foram considerados como elegíveis e alocados à atividade inerente ao código CAE “27400 - fabrico lâmpadas elétricas e outro equipamento iluminação”, identificados no dossier fiscal como “instalação de linha de produção LED”.

Os diversos investimentos efetuados no âmbito da atividade “linhas de produção LED”, ascenderam a um total de € 206.891,14, a que correspondeu uma dotação de benefício fiscal de € 51.722,79 (25% do valor investimento), conforme quadros infra, realçando-se que apenas foram realizados investimentos, nos exercícios de 2014, 2015 e 2017 (cfr. Anexo XIII):

XXVII – Mapa de investimento “linha lâmpadas led” e dotação período

Ano

Descrição do investimento

1 – Investimentos Relevantes

2 – Dotação Período

2014

Instalação de linha de produção lâmpadas LED

27.993,52 €

6.998,38 €

 

TOTAL INVESTIMENTOS

27.993,52 €

6.998,38 €

 

Ano

Descrição do investimento

1 – Investimentos Relevantes

2 – Dotação Período

2015

Instalação de linha de produção lâmpadas LED

164.626,73 €

41.156,68 €

 

TOTAL INVESTIMENTOS

164.626,73 €

41.156,68 €

 

Ano

Descrição do investimento

1 – Investimentos Relevantes

2 – Dotação Período

2017

Instalação de linha de produção lâmpadas LED

14.270,89 €

0,00 €

 

TOTAL INVESTIMENTOS

14.270,89 €

3.567,72 €

 

TOTAL – Instalação de linha de produção lâmpadas LED

206.891,14 €

51.722,79 €

Relativamente aos investimentos realizados ao abrigo do RFAI nesta atividade de “unidade produtiva de lâmpadas led”, importa tecer algumas considerações:

– No exercício de 2014, e da análise pormenorizada aos documentos de suporte existentes no dossier de enquadramento, e através da relação das faturas que suportavam o investimento considerado elegível na “linha de produção de lâmpadas LED”, constatou-se que parte substancial das despesas (no montante de € 21.589,47), correspondem a despesas suportadas com fretes marítimos e despesas alfandegárias, cujas faturas foram emitidas pela sociedade D..., Lda – Serviços de Logística e de Transporte.

De igual modo, na análise do teor dos documentos de suporte aos registos, concluiu-se que as restantes despesas consideradas elegíveis pelo SP, estão relacionados com aquisição de ferramentas e a outros bens, nomeadamente: lavatório inox, estrutura de inox teste (linha de ensaio), rolo borracha para piso I..., armário de frio, entre outros, tratando-se, de aquisições isoladas de diversos equipamentos.

– No exercício de 2015, o valor de investimentos imputados a esta área ascendeu a € 164.626,73, sendo que € 162.137,10, correspondem a saídas de stock, ou seja, bens existentes no inventário do SP, sendo o remanescente no valor de € 2.489,63, referente a direitos, fretes marítimos e despesas, documentalmente suportados com faturas emitidas pela sociedade D..., Lda – Serviços de Logística e de Transporte.

No âmbito das presentes ações de inspeção, e através do ofício n.º ..., já referido, foi o SP notificado para justificar o montante de € 162.137,10 e respetivo enquadramento como aplicação relevante para efeitos do RFAI, especificando em que consistiam as “saídas de stock”, evidenciadas nos documentos de suporte a estas despesas.

Em resposta ao solicitado na alínea a) do ponto 2.2, o SP informou o seguinte:

«(...) uma vez que a A... iniciou no ano de 2015 a produção de lâmpadas LED as mesmas constavam do seu inventário como produto acabado. No seguimento do contrato de eficiência energética outorgado com a E..., SA a 16 de Fevereiro de 2015 que consistiu na instalação de milhares de lâmpadas led em 60 postos de combustíveis de lâmpadas convencionais para lâmpadas led. Assim, foi necessário proceder à reclassificação destes produtos, transferindo-os para ativos fixos tangíveis dado que os mesmos geraram benefícios económicos no próprio exercício e em exercícios subsequentes. Para este tipo de operação é utilizado um documento interno denominado “Saída de Stock de Imobilizado”.»

Consideram-se aplicações relevantes para efeitos de RFAI, os investimentos efetuados no âmbito de um “investimento inicial” (nos termos da Portaria nº 297/2015, de 21 de setembro), designadamente a aquisição de ativos fixos tangíveisadquiridos em estado novo e desde que afetos à exploração da empresa, afastando, desde logo, a incorporação ou a utilização de eventuais mercadorias já existentes em stock, e excluindo, outros bens de investimento que não estejam afetos à exploração da empresa.

Conforme esclarecimentos e elementos constantes no dossier fiscal, as “lâmpadas led” que integravam o inventário do SP, foram instaladas em 60 postos de combustíveis, por via do contrato de eficiência energética outorgado com a E..., SA.

Estas “saídas de stock de imobilizado”, não se afigura ser um investimento afeto à exploração, nem uma necessidade constante ao processo de laboração normal da empresa, considerando os Serviços de Inspeção que este investimento resulta na saída, e posterior incorporação, de bens de inventário já existentes em armazém, em 60 postos de combustíveis pertencentes à sociedade E..., SA.

Em face do exposto, as “lâmpadas led” que constavam no inventário do SP, e que se destinaram à incorporação nos postos de combustíveis da E..., SA, não são ativos fixos afetos à exploração, pelo que não podem ser considerados como investimento elegível, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI. 

Relativamente aos restantes investimentos realizados em 2017, nesta “linha de produção led”, e apesar da aquisição de equipamento ser considerado ativo fixo tangível sujeito a depreciações, a sua elegibilidade para efeitos de RFAI, tem que ser enquadrada no âmbito do conceito de “investimento inicial”, considerado de uma forma global, nos termos da citada alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da Portaria 297/2015, de 21 de setembro, e consequentemente original “um aumento da capacidade instalada”.

Porém, neste caso na aquisição de equipamento de forma isolada deste equipamento designado de – automatic screw machine, não se enquadra no conceito de “investimento inicial”, e respetivo aumento da capacidade de produção, logo não enquadrável no conceito de investimento inicial, e, portanto, não elegível para efeitos de RFAI.

Esta nossa posição assenta no seguinte entendimento:

Nos termos da alínea d) do nº 2 do artigo 2º da Portaria nº 297/2015, de 21/09, os benefícios fiscais inerentes ao RFAI (artigo 23º do CFI), apenas são aplicáveis relativamente a “investimentos iniciais”, nos termos da alínea a) do parágrafo 49º do artigo 2.º do Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 16 de junho (RGIC), considerando-se como tais, os investimentos relacionados com: 

                                i)    a criação de um novo estabelecimento;

                              ii)    o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente;

                             iii)    a diversificação da produção de um estabelecimento para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento; 

                             iv)    a alteração fundamental do processo global de produção de um estabelecimento existente.

Da leitura atenta desta alínea, serão de realçar as seguintes expressões/vocábulos:


 

o   “apenas”;

o   “investimentos iniciais”;

o   “… criação de um novo …”;

o   “... aumento da capacidade ...”; 

o   “... produtos não produzidos anteriormente...”; 

o   “... alteração fundamental do processo global de produção …”.

Conclui-se, assim, que os benefícios fiscais previstos no RFAI, não respeitam a quaisquer investimentos em aplicações relevantes previstas no artigo 22º do CFI, mas apenas a investimentos, que no seu todo agregado/no seu conjunto, possam ser considerados como um “investimento inicial”, na definição constante do RGIC.

Ou seja, o legislador fiscal com a referência a “investimento inicial” não pretendeu incluir no âmbito do RFAI, investimentos avulsos, mas sim, a investimentos que tenham inerente um projeto integrado e global, até porque o mesmo deverá proporcionar a criação de postos de trabalho e a sua manutenção, nos termos previstos na alínea f) do nº 4 do artigo 22º do CFI, de forma a que esse projeto visto de per si, ou seja, isolado de toda, ou da grande maioria, estrutura empresarial já existente, apresente características de um investimento de “raiz”.

Terá que ser esse o objetivo da referência ao conceito de “investimento inicial”, contido na alínea d) do nº 2 do artigo 2º da Portaria nº 297/2015, ao dispor que os benefícios fiscais inerentes ao RFAI (artigo 23º do CFI) “… apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais ...”, sob pena de a utilização dessa expressão não fazer sentido, se tais benefícios fiscais fossem aplicáveis a qualquer investimento avulso efetuado no decurso da atividade normal de uma empresa.

 Pois, a não ser assim, não teria o legislador limitado a utilização dos benefícios fiscais inerentes ao RFAI, previstos no artigo 23º supra referido, às quatro categorias de investimento definidas na alínea a) do parágrafo 49º do artigo 2.º do RGIC, com a inclusão da alínea d) do nº 1 do artigo 2º na Portaria nº 297/2015, bastando, se o objetivo fosse a concessão dos benefícios fiscais a quaisquer investimentos avulsos, investimentos de mera expansão ou de modernização, o cumprimento, por parte dos sujeitos passivos, do disposto no nº 2 do artigo 22º do CFI, normativo este que define o que se consideram aplicações relevantes para efeitos de RFAI.

Assim, tendo em conta o exposto, o total dos investimentos realizados na “linha de produção lâmpadas led”, não são consideradas aplicações relevantes para efeitos de RFAI, apurando-se, assim, os seguintes montantes de investimentos não aceites, eliminando-se, em consequência, a dotacão total do benefício fiscal relativo a esta área de investimento, conforme quadro seguinte (cfr. Anexo XIII):

XXVIII - Mapa linha lâmpadas led e correção à dotação período

Ano

Descrição do investimento

1–Investimentos Relevantes

2–Dotação Período

3-Despesas não Elegíveis

4-TOTAL

Investimentos

Elegíveis(1-3)

[…]

6-Correção ao benefício Fiscal (2-5)

2014

Instalação de linha de 

produção lâmpadas LED

27.993,52 €

6.998,38 €

27.993,52 €

0,00 €

0,00 €

6.998,38 €

TOTAL INVESTIMENTOS

27.993,52 €

6.998,38 €

27.993,52 €

0,00 €

0,00 €

6.998,38 €

 

Ano

Descrição do investimento

1–Investimentos Relevantes

2–Dotação Período

3-Despesas não Elegíveis

4-TOTAL

Investimentos

Elegíveis(1-3)

[…]

6-Correção ao benefício Fiscal (2-5)

2015

Instalação de linha de 

produção lâmpadas LED

164.626,73 €

41.156,68 €

164.626,73 €

0,00 €

0,00 €

41.156,68 €

TOTAL INVESTIMENTOS

164.626,73 €

41.156,68 €

164.626,73 €

0,00 €

0,00 €

41.156,68 €

 

Ano

Descrição do investimento

1–Investimentos Relevantes

2–Dotação Período

3-Despesas não Elegíveis

4-TOTAL

Investimentos

Elegíveis(1-3)

[…]

6-Correção ao benefício Fiscal (2-5)

2017

Instalação de linha de 

produção lâmpadas LED

14.270,89 €

3.567,72 €

14.270,89 €

0,00 €

0,00 €

3.567,72 €

TOTAL INVESTIMENTOS

14.270,89 €

3.567,72 €

14.270,89 €

0,00 €

0,00 €

3.567,72 €

 

TOTAL-Instalação de linha de

produção lâmpadas LED

 

206.891,14 €

 

51.722,79 €

 

206.891,14

 

0,00 €

 

0,00 €

 

51.722,79 €

 

Em face destas correções, apura-se uma redução do benefício fiscal RFAI relativo a investimentos efetuados nos exercícios de 2014, 2015 e 2017, nos montantes de € 6.998,38, € 41.156,68 e de € 3.567.22, respetivamente.

III.5 – (RFAI) – Investimentos realizados na linha de “produção de papel autoadesivo

O SP no âmbito dos investimentos realizados na “linha de produção de papel autoadesivo”, realizou despesas no decurso dos exercícios de 2014 a 2018, que ascenderam a um total de €5.487.007,86, e corresponderam a obras de construção na seção de produção de papel autoadesivo e aquisições de ativos fixo tangíveis – equipamentos, conforme elementos evidenciados no quadro seguinte:

XXIX - Mapa de investimento linha I linha papel autoadesivo e dotação período

Ano

Descrição do Investimento

1 – Investimentos Relevantes

2 – Dotação Período

 

 

2014

Obras na secção de Produção de Autoadesivos

1.603.068,57 €

400.767,14 €

Aquisição de equipamento novos para produção de papel autoadesivo

518.207,43 €

129.551,86 €

Aquisição de viaturas para distribuição

81.884,66 €

20.471,17 €

TOTAL INVESTIMENTOS

2.203.160,66 €

550.790,17 €

 

Ano

Descrição do Investimento

1 – Investimentos Relevantes

2 – Dotação Período

 

 

2015

Obras na secção de Produção de Autoadesivos

999.045,48 €

249.761,37 €

Aquisição de equipamento novos para produção de papel autoadesivo

223.035,65 €

55.758,91 €

Aquisição de viaturas para distribuição

122.135,28 €

30.533,82 €

TOTAL INVESTIMENTOS

1.344.216,41 €

336.054,10 €

 

Ano

Descrição do Investimento

1 – Investimentos Relevantes

2 – Dotação Período

 

 

2016

Obras na secção de Produção de Autoadesivos

586.679,94 €

146.669,99 €

Aquisição de equipamento novos para produção de papel autoadesivo

969.495,00 €

242.373,75 €

Aquisição de viaturas para distribuição

50.294,91 €

12.573,73 €

TOTAL INVESTIMENTOS

1.606.469,85 €

401.617,46 €

 

Ano

Descrição do Investimento

1 – Investimentos Relevantes

2 – Dotação Período

 

 

2017

Construção de Laboratório apoio à produção de autoadesivo

117.000,00 €

29.250,00 €

Aquisição de equipamento novos para produção de papel autoadesivo

96.687,90 €

24.171,98 €

Aquisição de viaturas para distribuição

19.390,24 €

4.847,56 €

TOTAL INVESTIMENTOS

233.078,14 €

58.269,54 €

 

Ano

Descrição do Investimento

1 – Investimentos Relevantes

2 – Dotação Período

 

 

2018

Construção de Laboratório apoio à produção de autoadesivo

64.300,00 €

16.075,00 €

Aquisição de equipamento novos para produção de papel autoadesivo

35.782,80 €

8.945,70 €

TOTAL INVESTIMENTOS

100.082,80 €

25.020,70 €

 

TOTAL Investimentos Produção de Autoadesivo

5.487.007,86 €

1.371.751,97 €

 

Relativamente ao exercício de 2014, e da análise aos documentos relacionados no dossier fiscal, verificou-se que foram imputados a este projeto de investimento, despesas na conta “453313 - A.F.T- Curso –.... Isenta”, no valor de € 32.272,22, e suportados documentalmente por documentos bancários subjacentes a um empréstimo bancário.

Verificou-se, igualmente, a contabilização de despesas contabilizadas na rúbrica “453331 – A.F.T- Curso –... Merc”, referentes a despesas de transporte, e decoração e iluminação de fachada do edifício no valor de € 15.646,42, bem como, despesas com plantas decorativas no valor de € 5.645,74.

Em 7 de Maio de 2020, foi o SP notificado para apresentar cópia do contrato bancário, no qual evidenciasse respetiva natureza contratual do empréstimo, e esclarecer em que medida as despesas referentes à “fachada do edifício”, e as “plantas decorativas”, se enquadram como aplicações relevantes, nos termos do artigo 22º do CFI.

De acordo com os elementos apresentados, e relativamente ao documento bancário, verificou-se que em 28 de fevereiro de 2013, o SP contraiu um empréstimo “destinado ao investimento” no montante até um milhão de euros, sendo que os valores debitados, no montante de € 32.272,22, respeitam a juros, comissões, e demais encargos bancários.

Ora, estas despesas contabilizadas em investimentos em curso, não consubstanciam a aquisição de ativos fixos tangíveis em estado novo, mas sim fluxos financeiros de apoio ao investimento, pelo que aquelas despesas, não podem ser consideradas como investimento elegível para efeitos de RFAI, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI.

Da leitura atenta ao contrato de investimento, também não é possível associar de forma inequívoca, aquelas despesas contraídas com o empréstimo, no montante de € 32.272,22, com as aquisições de ativos fixos efetuadas no âmbito do RFAI e consideradas elegíveis no âmbito do referido processo.

Relativamente às despesas consideradas elegíveis no montante de € 15.646,42, o SP informou que estes gastos «(...) foram considerados aplicações relevantes na medida em que o equipamento em causa se destinava a dar a conhecer os novos produtos na nova unidade fabril, procedendo-se assim à instalação de um painel Led, para exibição dos conteúdos relacionados com a produção de papel Autoadesivo».

Importa ter presente que, nos termos da alínea vi) do n.º 2 do artigo 22º do CFI, são excluídas, para efeitos da consideração como aplicações relevantes “outros bens de investimento que não estejam afetos à exploração da empresa”.

Em face dos esclarecimentos prestados pelo SP, consideram estes Serviços de Inspeção que aquele investimento reveste a natureza de gastos com publicidade (Painel Led), não existindo, assim, a aquisição de ativos fixos afetos à exploração, e associados a um investimento relevante de “aumento de capacidade produtiva”. 

Os valores das despesas com as “plantas decorativos” contabilizadas no montante de € 5.645,74, à semelhança do “Painel Led”, não são, igualmente, considerados como ativos afetos à exploração, revestindo a natureza de despesas de decoração, excluídas pela alínea vi) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI.

No exercício de 2015, e na sequência da análise efetuada aos documentos de suporte às despesas realizadas no âmbito do RFAI, também se verificou que o SP considerou como investimento elegível, despesas no montante de € 15.704,29 que não cumprem os requisitos para serem classificados como investimentos “ativos fixos tangíveis afetos à exploração”. 

Os documentos de suporte às referidas despesas, são as faturas n.º FAC1500212, FAC1500213, e FAC 1500214, do fornecedor K..., Lda., nos montantes de € 2.870,34, €7.898,70 e € 4.935,25, que titulam a aquisição de plantas de jardim, material de rega, considerados artigos de decoração, logo, despesas excluídas do âmbito de despesas elegíveis, por via do disposto da alínea vi) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI.

Assim, tendo em conta o exposto, e deduzindo às aplicações relevantes indicadas pelo SP os montantes que não são enquadráveis como dedutíveis, referidos nos pontos anteriores, apuram-se os seguintes montantes finais de investimentos relevantes aceites, e a correspondente correção na dotação do benefício fiscal, anteriormente apurado pelo SP:

XXX – Mapa linha de papel autoadesivo e correção à dotação período

Ano

 

Descrição do investimento

1–Investimentos Relevantes

2–Dotação Período

(1x25%)

3-Despesas não Elegíveis

4-TOTAL

Investimentos

Elegíveis(1-3)

5-Benefício Fiscal corrigido (4x25%)

6-Correção ao benefício Fiscal (2-5)

 

 

 

2014

Obras na secção de Produção de Autoadesivos

1.603.068,57 €

400.767,14 €

53.564,38 €

1.549.504,19 €

387.376,05 €

13.391,09 €

Aquisição de equipamento novos para produção de papel autoadesivo

518.207,43€

129.551,86 €

0,00 €

518.207,43 €

129.551,86 €

0,00 €

Aquisição de viaturas para distribuição

81.884,66 €

20.471,17 €

0,00 €

81.884,66 €

20.471,17 €

0,00 €

TOTAL INVESTIMENTOS

2.203.160,66 €

550.790,17 €

53.564,38 €

2.149.596,28 €

537.399,07 €

13.391,09 €

 

Ano

 

Descrição do investimento

1–Investimentos Relevantes

2–Dotação Período

(1x25%)

3-Despesas não Elegíveis

4-TOTAL

Investimentos

Elegíveis(1-3)

5-Benefício Fiscal corrigido (4x25%)

6-Correção ao benefício Fiscal (2-5)

 

 

 

2015

Obras na secção de Produção de Autoadesivos

999.045,48 €

249.761,37 €

15.704,29 €

983.341,19 €

245.835,30 €

3.926,07 €

Aquisição de equipamento novos para produção de papel autoadesivo

223.035,65 €

55.758,91 €

0,00 €

223.035,65

55.758,91 €

0,00 €

Aquisição de viaturas para distribuição

122.135,28 €

30.533,82 €

0,00 €

122.135,28 €

30.533,82 €

0,00 €

TOTAL INVESTIMENTOS

1.344.216,41 €

336.054,10 €

15.704,29 €

1.328.512,12 €

332.128,03 €

3.926,07 €

 

Total Investimentos Produção de Autoadesivo

3.547.377,07 €

886.844,27 €

69.268,67 €

3.478.108,40 €

869.527,10 €

17.317,17 €

 

Em face das correções efetuadas, existe uma redução do benefício fiscal referente às aplicações relevantes realizadas nos exercícios de 2014 e 2015, no montante de € 13.391,09, e de € 3.926,07, respetivamente.

III.6 – Alteração da dotação do benefício fiscal RFAI inerente aos investimentos realizados em 2014, 2015 e 2017

Face ao exposto nos pontos 4 e 5 anteriores, não é considerado investimento elegível na “linha de produção led”, o montante de € 206.891,14, e na “linha de produção de papel autoadesivo”, o montante de € 69.268,67, reduzindo-se, assim, a dotação do benefício fiscal do RFAI inerente às aplicações consideradas relevantes realizadas nos anos de 2014, 2015 e 2017, no valor global de € 69.039,95, conforme Quadro seguinte:


 

XXX – Mapa de correção à dotação dos períodos de 2014, 2015 e 2017

Investimentos não elegíveis

2014

2015

2017

TOTAL

Instalação de linha de produção lâmpadas LED Despesas não elegíveis

27.993,52 €

164.626,73 €

14.270,89 €

206.891,14 €

Obras na secção de Produção de Autoadesivos

Despesas não elegíveis

53.564,38 c

15.704,29 €

0,00 €

69.268,67 €

Total despesas não elegíveis

81.557,90 €

180.331,02 €

14.270,89 €

276.159,81 €

RFAI - Dotação do benefício fiscal não elegível

(TotaL despesas não elegíveis x 25%)

20.389,48 €

45.082,76 €

3.567,72 €

69.039,95 €

 

•       Exercício de 2014:

Nos termos do n.º 3 do artigo 23.º do CFI, a dedução à coleta de IRC apurada em cada período de tributação, quando não for integralmente deduzida por insuficiência de coleta, pode sê-lo nas liquidações dos 10 períodos de tributação seguintes.

Assim, e de acordo com as informações contidas na modelo 22 de IRC, a dotação do exercício de 2014, foi deduzida na liquidação dos três períodos de tributação seguintes: exercícios de 2015, 2016 e 2017.

Sendo o exercício de 2017, o período de tributação máximo utilizado pelo SP para efeitos das referidas deduções, as correções à dotação do período de 2014, no montante de € 20.389,48, serão efetuadas na declaração modelo 22 de IRC do exercício de 2017 (campo 355):

Dotação apurada

pelo SP

Correção AT

Dotação do período de 2014

557.788,55 €

20.389,48 €

537.399,07 €

•       Exercício de 2015:

A utilização do benefício fiscal no exercício de 2015, e por insuficiência de coleta, foi deduzida nos períodos de tributação de 2017 e 2018. Em face do exposto, a correção apurada será efetuada na modelo 22 de IRC, do ano de 2018:

Dotação apurada

pelo SP

Correção AT

Dotação do período de 2014

377.210,79 €

45.082,76 €

332.128,03 €

 

•       Exercício de 2017:

O SP ainda não deduziu à coleta, qualquer valor referente ao benefício fiscal apurado no exercício de 2017, sendo que a correção efetuada ao benefício fiscal do exercício de 2017 no montante de € 3.567,72, terá apenas reflexos apenas no preenchimento do Quadro 074 - campo 714, do anexo D da modelo 22 de IRC, reduzindo-se, assim, a dotação do período, e alterando-se o saldo que transita para os períodos seguintes.

Será ainda de referir, que deverá ser corrigido o valor declarado pelo sujeito passivo, no campo 713 (saldo não deduzido no período anterior), do anexo D da modelo 22 de IRC, referente ao exercício de 2017, devido à entrega de uma declaração de substituição referente ao exercício de 2015, em 18/12/2019, na qual o sujeito passivo alterou a dedução inerente ao RFAI de 134.399,94 para € 137.806,16, ou seja, um aumento de € 3.406,22. Não tendo o sujeito passivo procedido à correção das declarações dos anos seguintes, refletindo aquela alteração de valor, verifica-se que o “saldo de período anteriores” referente ao RFAI declarado em 2017 (€ 969.864,51 – campo 713 do Anexo D), se encontra incorreto, pois, o valor que deveria constar nesse campo era € 966.458,29.

Em face desta correção, e das correções inerentes ao exposto nos pontos 4, 5 e 6, do presente relatório, deverão corrigir-se, em conformidade, os campos 713, 714, 715 e 716 do Anexo D, bem como, do campo 355 da Modelo 22, com referência aos períodos de 2017 e 2018. 

[…]

IX. Direito de audição

O sujeito passivo foi notificado por carta registada, através do ofício n.º ..., datado de 05-06-2020 […] para exercer, no prazo de 15 dias, o direito de audição sobre o Projeto de Relatório de Inspeção Tributária. 

O direito de audição foi exercido por escrito, o qual foi rececionado nesta Direção de Finanças em 23-06-2020 […]. 

Articulados 23 a 39: o SP argumenta que «a apreciação de benefícios fiscais elegíveis nos anos de 2014 e 2015 encontram-se fora do âmbito de incidência do presente processo de inspeção tributária, não tendo, portanto, a AT legitimidade e competência para, no âmbito do presente processo, propor correções por considerar não elegíveis benefícios fiscais reconhecidos em 2014 e 2015, no âmbito dos projetos de investimento realizados nestes anos.»

Invocando o SP que sem factos, não é admissível realizar-se novo procedimento de inspeção externo respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação.

Análise dos Serviços de Inspeção (Articulados 23 a 39):

No âmbito das presentes Ordens de Serviços, os Serviços de Inspeção procederam à confirmação, dos valores deduzidos pelo SP no âmbito do RFAI, estando em análise a “dedução efetiva do período”, a qual foi concretizada nos exercícios fiscais de 2017 e 2018.

O RFAI consta do capítulo III - artigos 22º a 26º do CFI -, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, e o legislador determinou que a dedução deste respetivo benefício fiscal, quando não possa ser efetuada integralmente por insuficiência de coleta, a importância pode ser deduzida nas liquidações dos 10 períodos seguintes, nos termos do artigo 23º do CFI.

Ora, o legislador ao definir um período temporal de 10 anos, veio automaticamente permitir o “reporte do benefício”, cujo direito real do mesmo, é usufruído pelo SP, no “momento da sua dedução”.

Isto porque, inscrevendo o SP na sua Declaração Modelo 22 (Quadro 10 - Cálculo do imposto), o valor da dedução inerente ao RFAI, está a invocar um direito, o qual é efetuado por via da dedução à colecta do IRC, e que determina o momento em que o direito se torna conhecido da Administração Tributária, ainda que, aquele se tenha constituído em momento anterior.

Assim, apenas no exercício em procede à dedução à colecta do IRC do benefício fiscal, consubstanciada no preenchimento da declaração Modelo 22 de IRC, o sujeito passivo a manifesta a sua intenção de deduzir o referido benefício à coleta, e só neste momento que o SP invoca o direito ao mesmo benefício, pelo que o respetivo ajustamento, só poderá ocorrer neste momento da sua “dedução”.

Os Serviços de Inspeção não efetuaram novos procedimentos de inspeção externa respeitante ao mesmo sujeito passivo, ou obrigados tributários, imposto e período, apenas corrigiu um direito que o SP invocou, no âmbito da sua esfera jurídica, nos exercícios fiscais de 2017 e 2018, através da respetiva dedução à colecta do IRC, nos termos do artigo 90.º do CIRC.

Relativamente à “linha de produção led”, será de referir que, para que os investimentos possam ser considerados elegíveis, devem ser observados o “conjunto de elementos que o constituem”, nos termos da alínea d) do nº 2 do artigo 2º da Portaria nº 297/2015, de 21/09, e assume particular relevância o conceito de “investimento inicial”, e a sua qualificação como “aplicação relevante”.

No que respeita ao conceito de “investimento inicial”, remete-se para o exposto no ponto III.4, no qual estes Serviços de Inspecção referiram que, em resumo:

-   os benefícios fiscais previstos no RFAI, não respeitam a quaisquer investimentos em aplicações relevantes previstas no artigo 22º do CFI, mas apenas a investimentos, que no seu todo agregado/no seu conjunto, possam ser considerados como um “investimento inicial”, na definição constante do RGIC;

-   Ou seja, o legislador fiscal com a referência a “investimento inicial” não pretendeu incluir no âmbito do RFAI, investimentos avulsos, mas sim, a investimentos que tenham inerente um projeto integrado e global, até porque o mesmo deverá proporcionar a criação de postos de trabalho diretamente inerente a esses investimento, e a sua manutenção, nos termos previstos na alínea f) do nº 4 do artigo 22º do CFI, de forma a que esse projeto visto de per si, ou seja, isolado de toda, ou da grande maioria, estrutura empresarial já existente, apresente características de um investimento de “raiz”;

-   Terá que ser esse o objetivo da referência ao conceito de “investimento inicial”, contido na alínea d) do nº 2 do artigo 2º da Portaria nº 297/2015, ao dispor que os benefícios fiscais inerentes ao RFA (artigo 23º do CFI) “… apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais ...”, sob pena de a utilização dessa expressão não fazer sentido, se tais benefícios fiscais fossem aplicáveis a qualquer investimento avulso efetuado no decurso da atividade normal de uma empresa;

-   Pois, a não ser assim, não teria o legislador limitado a utilização dos benefícios fiscais inerentes ao RFAI, previstos no artigo 23º supra referido, às quatro categorias de investimento definidas na alínea a) do parágrafo 49º do artigo 2.º do RGIC, com a inclusão da alínea d) do nº 1 do artigo 2º na Portaria nº 297/2015, bastando, se o objetivo fosse a concessão dos benefícios fiscais a quaisquer investimentos avulsos, investimentos de mera expansão ou de modernização, o cumprimento. por parte dos sujeitos passivos, do disposto no nº 2 do artigo 22º do CFI, normativo este que define o que se consideram aplicações relevantes para efeitos de RFAI.

Por fim, é de referir que o sujeito passivo exerceu o direito de audição por escrito, tendo solicitado que toda a matéria articulada no requerimento, seja suscetível de prova testemunhal, indicando como testemunhas: o Sr. G... e o Sr. C... .

É de salientar que a diligência de prova testemunhal não está prevista nem no artigo 60.º da LGT nem no artigo 60.º do RCPITA.

Em vista a concretização dos princípios do Procedimento de Inspeção Tributária e no âmbito dos mesmos, incumbe à Administração Tributária a direção do procedimento e a realização de todas as diligências necessárias, refletidas na prática dos atos de inspeção realizados ao abrigo das prerrogativas que lhe assistem no âmbito e decurso deste procedimento ao abrigo do Regime Complementar de Procedimento da Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA).

Por outro lado, em concreto, e em observância do princípio da cooperação mútua, entre a Entidade Inspecionada e a Inspeção Tributária, é igualmente na fase da prática dos atos de inspeção que são esclarecidas todas as dúvidas suscitadas no âmbito do procedimento, para dessa forma se atingir um projeto de decisão.

Este projeto de decisão é, e foi validamente, notificado ao sujeito passivo em análise, após conclusão dos atos de inspeção capazes de o fundamentar. E, é agora, neste momento, analisado o documento apresentado, que se atende como exercício do direito de audição do sujeito passivo, e que por opção, foi efetuado por escrito.

Ainda assim, sempre se dirá que o contraditório foi exercido por escrito, e foi nesta fase analisado todo o conteúdo alegado no documento remetido, pelo que quaisquer factos pretendidamente testemunhados pelas pessoas identificadas no documento, capazes de consubstanciar o exercício do direito ao contraditório (direito de audição), estão por opção incluídos nas alegações escritas que aqui devidamente se analisaram, nem se compreende que assim não seja.

Em relação à prova testemunhal a apresentar no âmbito dos “benefícios fiscais”, nomeadamente à dedução à coleta, e tal como decorre do artigo 25.º do Decreto-Lei nº 162/2014, de 31 de outubro, e por remissão ao artigo 130.º do CIRC, a dedução é justificada por documento a integrar no processo de documentação fiscal.

No mesmo sentido, os artigos 7.º e 8.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, determinam a forma e os procedimentos, os quais devem fazer parte integrante do processo de documentação fiscal, contendo os seguintes elementos:

-   Descrição do investimento inicial, indicando designadamente os objetivos, áreas de intervenção e os principais investimentos, bem como o respetivo enquadramento numa das tipologias previstas na alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da citada portaria;

-   Identificação da data e custo de aquisição de todas as aplicações relevantes, bem como listagem das faturas que titulem a respetiva aquisição e identificação da região ou regiões em que foi realizado o investimento e das respetivas aplicações relevantes; (etc.).

Face ao exposto, carece de fundamento o alegado no documento de exercício de audição pelo que se mantêm as correções propostas. […]

Q.     O projeto de Relatório de Inspeção Tributária e, bem assim, o Relatório Final (RIT) são omissos em relação a juros compensatórios – cf. Projeto de Relatório e RIT constantes do PA. 

R.     A Requerente tinha sido anteriormente objeto de um procedimento de inspeção tributária externa, de âmbito geral, com incidência no período de tributação de 2015, realizada a coberto da Ordem de Serviço n.º OI2017..., que deu origem ao relatório de inspeção tributária datado de 20 de dezembro de 2019, que determinou correções em IVA e IRC. Em matéria de benefícios fiscais, por via da exclusão de despesas de investimento que foram consideradas inelegíveis no âmbito do Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento (“CFEI”), este benefício sofreu uma alteração (“dotação do período”) com repercussão no saldo que transitou para os períodos seguintes – cf. Documento 8 junto pela Requerente. 

S.      Na sequência do procedimento inspetivo acima mencionado, foram emitidos os seguintes atos tributários à Requerente – cf. Documentos 1 a 4 juntos pela Requerente: 

a)     Liquidação n.º 2020..., datada de 19 de outubro de 2020, relativa ao período de tributação de 2017, e respetiva demonstração de acerto de contas n.º 2020..., datada de 21 de outubro de 2020, da qual resultou o valor a pagar de € 29.368,58 (sendo € 27.317,89 de imposto [IRC] e € 2.050,69 referente a juros compensatórios), com data limite de pagamento fixada em 9 de dezembro de 2020; e

b)    Liquidação n.º 2020..., datada de 21 de outubro de 2020, relativa ao período de tributação de 2018, e respetiva demonstração de acerto de contas n.º 2020..., datada de 23 de outubro de 2020, da qual resultou o valor a pagar de € 66.081,52 (sendo € 63.754,91 de imposto [IRC] e € 2.326,61 referente a juros compensatórios), com data limite de pagamento fixada em 10 de dezembro de 2020.

T.      A Requerente procedeu ao pagamento do valor de € 29.368,58 - liquidação de IRC do período de 2017 – em 9 de dezembro de 2020 – cf. Documento 14 junto pela Requerente. 

U.     Em relação à liquidação referente ao imposto de 2018, o valor de € 66.081,52 foi pago em 10 de dezembro de 2020, por via da compensação de um crédito fiscal (€ 62.666,18) e, no remanescente (€ 3.415,34), em dinheiro– cf. Documentos 15 e 16 juntos pela Requerente. 

V.     Inconformada com as liquidações de IRC e juros supra identificadas, a Requerente deduziu Reclamação Graciosa em 17 de junho de 2021, autuada sob o n.º ...2021... (Direção de Finanças de ...), sobre a qual recaiu despacho de indeferimento, notificado em 18 de outubro de 2021 – cf. Documentos 6 e 7 juntos pela Requerente. 

W.    Mantendo a discordância em relação aos atos tributários impugnados de liquidação de IRC e juros compensatórios e à decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa que os manteve inalterados, a Requerente apresentou no CAAD, em 12 de janeiro de 2022, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral na origem da presente ação – cf. registo de entrada no SGP do CAAD. 

            

            2.         Motivação da Decisão da Matéria de Facto e Factos não Provados

 

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, não tendo o Tribunal que se pronunciar sobre todas as alegações das Partes, mas apenas sobre as questões de facto necessárias para a decisão. 

 

No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se essencialmente na análise crítica da prova documental junta aos autos pelas Partes e nas posições por estas assumidas em relação aos factos. 

 

Foram tidos em conta os depoimentos das três testemunhas inquiridas, funcionários da Requerente: B..., técnica de contabilidade, C..., Diretor Financeiro, e F..., responsável operacional pela área digital (I...), que responderam de forma objetiva e com conhecimento direto dos factos no âmbito das funções que exercem na empresa. 

 

Em relação aos factos não provados, não se demonstrou o alegado no artigo 110.º do ppa, relativamente aos fundos emprestados pela Caixa ... terem sido, em concreto, usados para a obtenção dos ativos que integram a linha de produção de papel autoadesivo. Apesar de o contrato de abertura de crédito mencionar que o financiamento se destinava a investimento, não foram fornecidos elementos que permitam estabelecer uma conexão específica com a aquisição de equipamentos para esta linha de produção, pelo que este Tribunal não formou a convicção de que os custos associados ao empréstimo estejam diretamente relacionados com a mesma. 

 

            Com relevo para a decisão não existem outros factos alegados que devam considerar-se não provados. 

 

Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas Partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.

 

 

IV.          Do Direito 

 

Considerando a tutela mais estável e eficaz dos interesses em presença neste processo, importa apreciar, em primeiro lugar, as ilegalidades materiais invocadas em relação à (in)elegibilidade dos investimentos para efeitos do RFAI, e, após, na medida em que não resultem prejudicados, os vícios praticados no procedimento, incluindo a preterição do direito de audição sobre a liquidação de juros compensatórios (v. artigo 124.º do CPPT, por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea a) do RJAT).

 

1.     Erro nos Pressupostos – Elegibilidade dos Investimentos para efeitos do RFAI

1.1. Investimentos na Linha de Produção de Lâmpadas LED 

ano 2014

 

Invoca a Requerente a ilegalidade substantiva da liquidação de IRC realizada pela AT, pela não aceitação de investimentos efetuados em 2014, posteriormente considerados para o benefício da dedução à coleta ao abrigo do regime do RFAI, em função da disponibilidade de coleta (dotação deduzida no exercício de 2017). Estes investimentos respeitam a: 

 

a)      Equipamentos novos adquiridos no valor de € 6.404; e 

b)      Serviços de transporte/fretes marítimos, despesas alfandegárias e despesas com deslocações (de Hong Kong), no total de € 21.589,47.

 

Interessa notar que não é controvertido que a Requerente procedeu à criação de uma nova linha de produção em 2013, relativa a lâmpadas LED, com observância dos requisitos de elegibilidade previstos no artigo 22.º do CFI, para efeitos de RFAI, designadamente: 

(a)  Do ponto de vista da sua subsunção ao conceito de “investimento inicial”, para efeitos do disposto no artigo 2.º, alínea a), § 49 do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho, (“RGIC”), e no artigo 2.º, n.º 2, alínea d) da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro; e

(b)  Dos critérios estabelecidos no n.º 4 do artigo 22.º do CFO, como sejam o “aumento da capacidade do estabelecimento já existente”, ou a criação e manutenção de postos de trabalho derivados do investimento na Linha de Produção de Lâmpadas LED.

 

A questão que se suscita prende-se com o enquadramento nestes critérios de investimentos complementares destinados a essa linha de produção realizados no ano subsequente [2014]. 

 

Ficou demonstrado nos presentes autos que a implementação da linha de produção de lâmpadas LED só se concluiu em 2014, ano em que foram integrados alguns equipamentos essenciais à operacionalidade da linha de produção, assegurando que os componentes das lâmpadas LED mantinham determinadas características e níveis de temperatura, cuja não verificação causaria alterações nos materiais e imperfeições no processo produtivo. 

 

Assim, em relação ao investimento da alínea a) supra, afigura-se que não estamos perante a aquisição isolada/avulsa de equipamentos, como sustentou a Requerida na sua fundamentação (RIT), defendendo aí não serem despesas abrangidas pelo conceito de investimento inicial. Pelo contrário, estamos perante equipamentos cuja aquisição se interliga à implementação da linha de produção, pelo que fazem parte integrante do investimento inicial e constituem uma aplicação relevante (ativos fixos tangíveis adquiridos em estado de novo), afetos à exploração da empresa. Devem, assim, ser enquadrados como uma adição, para efeitos do disposto no artigo 22.º, n.º 5 do CFI[1], sendo ilegal, por violação do artigo 22.º, n.ºs 2 a 5 do deste diploma, a desconsideração (pela AT) do valor do investimento de € 6.404 no âmbito do RFAI, com a consequente procedência, neste segmento, da pretensão da Requerente.

 

No que se refere aos custos e despesas alfandegárias de transporte de equipamentos encomendados em 2013, despesas de deslocação de Hong Kong e alojamento em Portugal, que totalizam a importância de € 21.589,47, a Requerente provou tê-los incorrido e, bem assim, “capitalizado”, reconhecendo-os em rubricas de ATF em curso respeitantes à linha de produção de lâmpadas LED (“Linha Montagem I...”). Em conformidade com as normas contabilísticas aplicáveis, estes valores foram, pois, adicionados ao dos ativos a que respeitam, os quais foram integrados na dita linha de produção. 

 

Na tese da Requerida, despesas desta natureza (transportes e alfandegárias) não são relevantes por não caberem na definição do artigo 22.º, n.º 2, alínea a) do CFI. Erradamente, a nosso ver, porém.

 

Com efeito, apesar de o artigo 22.º do CFI não contemplar autonomamente as despesas de transporte, alfandegárias e de deslocações, a interpretação do conceito de aplicações relevantes no âmbito do RFAI, deve tomar por referência o conceito de ativos fixos tangíveis mencionado na alínea a) do seu n.º 2, com a aceção que este tem na sua fonte legal, ou seja, nas normas contabilísticas. Neste âmbito, a NCRF[2] 7 inclui como elementos do custo de um ativo fixo tangível, além do seu preço de compra, uma série de outras componentes, como direitos de importação, custos necessários para colocar o ativo a funcionar na localização e condições pretendidas, custos de entrega e manuseamento, de instalação e montagem, entre outros (§§ 17 a 23). 

 

Neste sentido, não vindo questionada a realização das mencionadas despesas (de transporte, aduaneiras e de deslocação de técnicos chineses para apoiar a instalação) e demonstrando-se, como se demonstra, a sua associação à aquisição dos equipamentos afetos à linha de produção de lâmpadas LED, não podem aquelas deixar de ser consideradas como (parte do valor do) investimento “relevante” efetuado nos ativos fixos tangíveis a que correspondem (e com os quais foram contabilizadas). Deste modo, também neste segmento assiste razão à Requerente[3]

 

Em relação à perspetiva temporal, tendo os equipamentos para a criação da linha de produção de lâmpadas LED sido encomendados na China em finais de novembro de 2013, com prazo estimado de entrega de 45 dias, as despesas com a sua expedição e importação em Portugal apenas ocorreram, naturalmente, em 2014, o que não desvirtua a respetiva natureza de investimento inicial, pois respeitam aos equipamentos adquiridos, ab initio, para a instalação daquela linha de produção. Em conformidade com o regime de periodização económica, esses custos foram reconhecidos nas correspondentes rubricas do ativo no período (ano/exercício) em que foram incorridos, in casu, 2014.  

ano 2015

 

A Requerente não se conforma, igualmente, com a inelegibilidade do montante de € 164.626,73 reportado a investimentos realizados no período de 2015, cuja dotação foi deduzida à coleta do exercício de 2018, que a AT julgou não preencherem o conceito de investimento inicial, nem os requisitos previstos no artigo 22.º, n.ºs 2 e 5 do CFI. O referido valor decompõe-se em € 162.137,19 referente a lâmpadas LED, adquiridas em 2014 e 2015 pela Requerente em estado de novo e contabilizadas no ativo como inventários, posteriormente reclassificadas, em 2015, para ativo fixo tangível, e € 2.489,63 de direitos aduaneiros, fretes marítimos e despesas. 

 

Começando pelas lâmpadas LED, a sua contabilização como inventários (existências) em 2014 e 2015 pressupõe que se tratou de bens inicialmente adquiridos com a intenção de venda no decurso normal da atividade da Requerente, ou para serem aplicados no processo de produção (matérias-primas ou consumíveis) ou em prestações de serviços (v. NCRF 18, § 6). 

 

A subsequente reclassificação contabilística, derivada da aplicação das lâmpadas LED no âmbito de um contrato comercial outorgado entre a Requerente e a E..., S.A., referente à instalação de luminárias em 60 postos de abastecimento de combustíveis (cerca de 12.000 lâmpadas LED), não consubstancia a realização de um investimento relevante para efeitos de RFAI sob diversas perspetivas, como bem assinalado pela AT. 

 

Desde logo, importa notar que o investimento em causa não resulta de novas aquisições de bens efetuadas, como previsto no artigo 22.º, n.º 2, alínea a) do CFI, provindo de transferências internas – saídas de bens – que já se encontravam reconhecidas em inventários[4]. Não se verificou a entrada de bens novos. 

 

Por outro lado, ainda que assim não se entendesse, e sem prejuízo de as lâmpadas instaladas nos postos de abastecimento do cliente visarem proporcionar rendimentos à Requerente, por via da remuneração da prestação de serviços, aquela [Requerente] não estabelece a indispensável conexão com o investimento inicial do projeto da linha de produção de lâmpadas LED, ou explica de que forma esses ativos se relacionam ou contribuem para esse investimento (mesmo que por via de adições), nomeadamente como meio ou fator de produção das referidas lâmpadas. Tarefa que, além do mais, se afigura dificilmente exequível, pois a produção de lâmpadas LED é o resultado ou finalidade almejada pelo investimento projetado não sendo as ditas lâmpadas, em simultâneo, fator/meio de produção e produto final do mesmo processo produtivo.

 

Embora este Tribunal não concorde com a apreciação vertida no RIT de que os ativos – lâmpadas LED – após a respetiva reclassificação não constituem um investimento afeto à exploração da empresa da Requerente (pois essa afetação é efetiva, através da realização de serviços de caráter continuado ao seu cliente), tal não afasta a conclusão, também expressa no RIT, e que nessa parte se acompanha, de que:

-      A reclassificação contabilística entre rubricas do ativo não deve ser enquadrada como uma aplicação relevante no escopo do artigo 22.º, n.º 2, alínea a) do CFI, preceito que respeita unicamente a aquisições de ativos ex novo[5]; e que

-      Essa reclassificação não se enquadra no âmbito de um investimento inicial de aumento da capacidade (produtiva) do estabelecimento já existente, como dispõe o RGIC – v. artigo 2.º, alínea a), § 49 do RGIC e artigo 2.º, n.º 2, alínea d) da Portaria n.º 297/2015. Aliás, como atrás se referiu, não se alcança como é que as lâmpadas LED podem ser consideradas uma aplicação relevante no investimento de aumento da capacidade instalada de produção das próprias lâmpadas LED, pois estas não são meios de produção de si mesmas.

 

Não sendo os ativos em questão – lâmpadas LED – elegíveis para efeitos de RFAI, não o são, de igual modo, e pelas mesmas razões, as despesas associadas à sua aquisição referentes a direitos aduaneiros, fretes marítimos e despesas. Improcede, nestes termos, o pedido de invalidade desta correção referente ao ano 2015. 

 

ano 2017

 

Relativamente ao ano 2017, foi desconsiderado pela Requerida o investimento de € 14.270,89 no equipamento de aparafusadora mecânica automática (“automatic screw machine”), por considerar tratar-se de um investimento avulso, de mera expansão ou de modernização, que não tem inerente um projeto integrador global constitutivo de “investimento inicial” nos termos contemplados na Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, que estipula que os “benefícios fiscais previstos no artigo 23.º do Código Fiscal do Investimento apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”, invocando ainda que o investimento deve proporcionar a criação de postos de trabalho e a sua manutenção (v. artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do CFI). 

 

No invocado artigo 2.º, § 49.º, al. a), do RGIC pode ler-se que investimento inicial consiste num “investimento em ativos corpóreos e incorpóreos relacionado com a criação de um novo estabelecimento, aumento da capacidade de um estabelecimento existente, diversificação da produção de um estabelecimento para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento ou mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”.

 

Como salienta a decisão do processo arbitral n.º 837/2021-T, de 6 de maio de 2022, da  leitura conjugada dos referidos preceitos, conclui-se que a aquisição do equipamento, para poder ser elegível: i) tem de revestir a natureza de investimento estratégico (por contraposição a isolado), dado o disposto na citada al. c) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI [que requer a manutenção dos bens objeto do investimento durante um período mínimo de 3 ou 5 anos, consoante os casos]; e ii) deve consistir num investimento inicial (por contraposição a investimento de substituição), dado o disposto nos citados artigos 2.º, § 49.º, alínea a), do RGIC, e 2.º, n.º 2, alínea d), da Portaria n.º 297/2015, sendo que a Requerente declarou na documentação fiscal que o investimento visou o aumento da capacidade de um estabelecimento existente.  

 

No caso concreto, o equipamento cuja aquisição foi desconsiderada como aplicação relevante para efeitos de RFAI, constitui um dos módulos integrados na linha de produção de lâmpadas LED, pelo que não configura um mero investimento avulso, mas um complemento daquela linha e, portanto, enquadrado no projeto global da linha de produção de lâmpadas LED. 

 

Acresce que permitiu a melhoria do processo produtivo, substituindo um processo de fabrico manual, mais moroso e sem idêntica garantia de qualidade/uniformidade do produto final, por um processo automático e mecânico de fixação de parafusos, dotado de maior celeridade e rigor. Da introdução da máquina em apreço resultaram, de forma inequívoca, ganhos de eficiência, a otimização do processo de produção e a consequente correlação com o aumento da capacidade produtiva do estabelecimento da Requerente. De notar ainda que os aumentos de capacidade produtiva devem ser vistos como um todo, sendo a aquisição de bens que permitam aumentar a capacidade produtiva do estabelecimento industrial da Requerente elegíveis para efeitos de RFAI. 

 

No mesmo sentido fundamenta a decisão do processo arbitral n.º 837/2021-T e jurisprudência aí citada: “«o pressuposto de extensão da capacidade de um estabelecimento existente tem naturalmente subjacente a finalidade de aumento da produção, ou seja, do número de unidades produzidas, em regra, conducente ao acréscimo do volume de negócios. Contudo, esta finalidade não constitui em si mesma uma condição de aplicação do regime, mas a sua teleologia. Dito por outras palavras, o aumento de capacidade do estabelecimento aponta para o aumento da produção, mas não é imposta uma obrigação de resultado. O aumento efetivo da produção depende de diversos fatores, não controláveis pelos sujeitos passivos, que não constam da previsão legal como pressupostos de aplicação do RFAI.» (Decisão arbitral de 17/1/2022, proferida no Proc. n.º 546/2020-T); «o n.º 49 do artigo 2.º do RGIC e o artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Portaria n.º 297/2015 apenas exigem, no que aqui interessa, que os investimentos estejam «relacionados» com aumento da capacidade de um estabelecimento existente. [...] basta a relação desses investimentos com o aumento da capacidade produtiva para assegurar o direito da Requerente a dele usufruir, independentemente de ela se concretizar imediatamente na fabricação de novos produtos. Não há suporte legal para restringir a aplicação do benefício fiscal a investimentos que produzam resultados imediatos, nem sequer para o afastar quando, contra a vontade do investidor, os investimentos acabarem por não produzir os resultados pretendidos.» (Decisão arbitral de 10/12/2021, proferida no Proc. n.º 726/2020-T); «[as] aquisições de ativos fixos tangíveis em estado de novo que modificam substancialmente a funcionalidade dos ‘Robots’ e das prensas, revest[em] caráter incremental. [...]. Os investimentos em causa são [...] enquadráveis no conceito de um investimento inicial relacionado com o aumento da capacidade do estabelecimento da Requerente. O facto de as máquinas e equipamentos adquiridos não produzirem, por si só, qualquer peça, não tem relevância, por não ser um requisito legal.» (Decisão arbitral de 28/9/2021, proferida no Proc. n.º 427/2020-T); «a referência que se faz naquele artigo 22.º, n.º 2, [do CFI,] a «ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo», não exclui a aquisição de peças para melhorar equipamentos existentes, desde que sejam adquiridas em estado novo.» (Decisão arbitral de 28/9/2020, proferida no Proc. n.º 789/2019-T).”

 

Em relação ao requisito de criação de postos de trabalho e da sua manutenção, reclamado pelo artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do CFI, este deve ser aferido por referência ao investimento globalmente considerado (a linha de produção de lâmpadas LED), devendo acompanhar o período de mínimo de detenção dos bens objeto do investimento, ponto em relação ao qual a Requerida o RIT não suscita o incumprimento por parte da Requerente, limitando-se a considerar que tal requisito não faz sentido em relação a investimentos avulsos.

 

            Convém assinalar que as normas que preveem benefícios fiscais não devem ser objeto de interpretação restritiva (v. o artigo 10.º do EBF admite a sua interpretação extensiva) em linha com a conceção de que não têm natureza excecional, como preconizam a jurisprudência (v. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 01047/14.5BEALM 0889/17, de 6 de novembro de 2019) e a doutrina contemporâneas, constituindo, nas palavras de Casalta Nabais, “um instrumento normal de política económica e social do Estado social contemporâneo e não um instrumento excepcional à maneira do entendimento próprio do Estado liberal” (apud citado acórdão)[6].

 

            À face do exposto, conclui-se que a aquisição da máquina aparafusadora é enquadrável no âmbito de um investimento inicial, estratégico e não avulso, relacionado com o aumento da capacidade do estabelecimento (existente) da Requerente e constitui aplicação relevante (v. artigo 2.º, n.º 49, alínea a) do RGIC, artigo 22.º, n.º 2, alínea a) do CFI), em consonância com a teleologia imanente ao RFAI, de estímulo ao investimento produtivo empresarial para reforço da competitividade e da capacidade produtiva da economia, configurando o investimento em modernização um exemplo paradigmático. Procede, assim, a alegação da Requerente, sendo inválida, por erro nos pressupostos de facto e de direito, a desconsideração, pela Requerida, do valor do investimento em equipamento de € 14.270,89 do âmbito do RFAI. 

 

1.2.          Investimentos na Linha de Produção de Papel Autoadesivo

ano 2014

 

            Em relação a este ano, foram realizadas diversas correções a investimentos, a saber: (i) € 32.272,22, de custos financeiros capitalizados em AFT em curso; (ii) € 15.646,42 de despesas de transporte, decoração e iluminação de fachada; e (iii) € 5.645,74, referente a plantas decorativas. Ainda que a Requerente peticione a anulação integral das liquidações de IRC e juros compensatórios impugnadas não contesta, todavia, as correções aos valores referidos em (ii) e (iii), sendo a pretensão deduzida, nessa medida, desprovida de causa de pedir e manifestamente improcedente. 

 

            No que se refere aos custos financeiros (juros, comissões e demais encargos bancários) imputados ao projeto de investimento, no referido valor de € 32.272,22 [alínea (i) antecedente], reconhecidos como ATF em curso, a Requerente alega que estes estão diretamente relacionados com os ativos adquiridos e que foram com estes capitalizados, de modo a integrar o respetivo custo de aquisição, cabendo no âmbito do artigo 22.º, n.º 2, alínea a) do CFI. À semelhança do que antes se disse a respeito dos custos de transporte e despesas e importação de equipamentos, o conceito de ativo fixo tangível para que o artigo 22.º, n.º 2, alínea a) do CFI remete deve ser o das normas contabilísticas (aliás, tanto quanto sabemos não existe outro tecnicamente definido), atento o modelo de dependência parcial incorporado no IRC e o expresso apelo da norma do CFI a uma noção cuja definição pertence ao plano do reporte financeiro e das suas proposições reguladoras e, por fim, ao contexto e finalidade da locução à luz do princípio hermenêutico do artigo 11.º, n.º 2 da LGT[7]

 

            Desta forma, os custos financeiros poderão ser considerados para efeitos de RFAI se forem reconhecidos como custo dos ativos (equipamentos) que constituam aplicações relevantes neste âmbito e, por conseguinte, o seu valor integrar (do prisma contabilístico) o dos próprios ativos. Neste ponto, discorda-se da apreciação feita no RIT de que, cumpridas tais condições, esses custos não sejam passíveis de enquadramento como investimento elegível. 

 

Impõe-se, porém, demonstrar, a ligação dos custos financeiros à aquisição dos bens que constituem os ativos elegíveis, o que foi questionado no decurso do procedimento inspetivo pela AT, que solicitou esclarecimentos à Requerente. Tendo a AT concluído, da análise do documento bancário disponibilizado, reportado a um contrato de abertura de crédito em 2013 com um banco financiador, que contém a singela referência a “destinado ao investimento”, não tendo sido feita prova que permitisse aferir da conexão entre o financiamento bancário gerador dos custos e a concreta aquisição dos bens para a linha de produção de papel autoadesivo. Conclusão que se mantém na ação arbitral, pois não foi carreada prova, que teria de ser documental, dos fluxos financeiros, que demonstrasse ou ao menos indiciasse essa ligação entre os encargos financeiros e os ativos.  

 

O acesso da Requerente ao benefício fiscal do RFAI postula a revelação à AT dos pressupostos da sua concessão (v. artigo 14.º, n.º 2 e 74.º, n.º 1 da LGT e artigos 6.º a 8.º da Portaria n.º 297/2015). Não sendo possível estabelecer e validar todos os necessários pressupostos constitutivos do benefício, por falta de elementos documentais comprovativos, cuja apresentação compete à Requerente, conclui-se que a desconsideração do valor em causa não enferma de ilegalidade material, improcedendo, nesta matéria, o pedido anulatório da Requerente.  

 

ano 2015

 

Em relação a este ano, foram realizadas correções por desconsideração de investimento efetuado no valor de € 15.704,29 em relação às quais a Requerente não apresenta quaisquer argumentos para a sua anulação (apesar de impugnar os atos de liquidação in totum), pelo que se mantêm válidas na parte aplicável. 

 

1.3.          Juros Compensatórios

 

Uma vez que os juros compensatórios são devidos quando for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido, nos termos do disposto no artigo 35.º da LGT, a anulação parcial da liquidação de IRC, comporta, na medida correspondente, a anulação parcial dos juros compensatórios sobre aquele calculados. 

 

 

2.     Ilegalidades Procedimentais 

 

2.1. Preterição do Direito de Audição – Juros Compensatórios

 

O artigo 267.º, n.º 5 da Constituição determina que seja assegurada a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito, comando que o legislador ordinário incorporou no artigo 12.º do Código do Procedimento Administrativo (“CPA”) e, em sede tributária, nos artigos 60.º da LGT e 45.º do CPPT. A concretização deste princípio implica a atribuição aos contribuintes do direito de serem ouvidos antes da emissão dos atos de liquidação e previamente ao indeferimento total ou parcial de “pedidos, reclamações, recursos ou petições” (v. artigo 60.º, n.º 1, alíneas a) e b) da LGT). No caso vertente, a Requerente foi notificada para exercer o direito de audição em relação ao Projeto de Relatório da Inspeção Tributária (“PRIT”), que contém os fundamentos das correções de IRC em crise. Porém, desse Projeto não consta qualquer proposta de liquidação de juros compensatórios ao abrigo do artigo 35.º da LGT, os quais vieram, no entanto, a ser liquidados. 

 

Desta forma, em relação aos juros, a Requerente não foi previamente informada da sua aplicação e respetivos fundamentos, nomeadamente em relação à imputação a título de culpa, à fórmula de cálculo e ao período de contagem, nem pôde exprimir as suas razões sobre os mesmos. A falta de audiência prévia à decisão administrativa, quando a sua concessão seja obrigatória, como sucede no presente caso, constitui preterição de formalidade essencial (v. artigo 60.º da LGT) e conduz, nessa medida, à anulabilidade do ato tributário, entendimento que se encontra consolidado na jurisprudência (v. a título de exemplo os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 14 de outubro de 2010, processo n.º 2046/04.0BELSB 0808/18, e de 24 de setembro de 2008, processo n.º 0489/08). 

 

Por outro lado, a superação do efeito anulatório pelo princípio de aproveitamento do ato “apenas pode ocorrer quando a intervenção do interessado no procedimento tributário for inequivocamente insusceptível de influenciar a decisão final, o que acontece, em geral, nos casos em que se esteja perante uma situação legal evidente ou se trate de actividade administrativa vinculada”, por exemplo, se a decisão a proferir nunca puder ser senão aquela que foi tomada. 

 

Tendo em conta que a liquidação de juros compensatórios depende da imputação da infração fiscal a título de culpa, não se está perante uma situação de absoluta impossibilidade de a decisão do procedimento de liquidação ser influenciada pela audição da Requerente, pelo que o direito de audição desta se impunha. A omissão dessa audiência comporta a anulação dos atos tributários em relação aos juros indemnizatórios neles liquidados, no valor de € 4.377,30, sendo € 2.050,69 de 2017 e € 2.326,61 de 2018. Fica prejudicado, por ser inútil, o conhecimento das demais questões suscitadas em relação aos juros compensatórios. 

  

2.2.Da Alegada Violação dos Princípios do Inquisitório, da Audiência dos Interessados e do Contraditório

 

As diligências instrutórias constituem uma importante prerrogativa da AT para o exercício da atividade inspetiva e para o cumprimento do dever de “realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material” – v. artigo 58.º da LGT e 29.º, n.º 1, alínea g) do RCPITA. 

 

Argui a Requerente que a não inquirição, pelos Serviços Inspetivos da AT, das duas testemunhas por si indicadas em fase de direito de audição comprometeu o apuramento da verdade material, pois o seu depoimento permitiria esclarecer o conteúdo e finalidade dos investimentos realizados entre 2014 e 2017, sob pena de, assim não sendo, lhe estar a ser negada a satisfação do ónus da prova, que lhe compete, relativo comprovação das condições de acesso ao benefício fiscal do RFAI, nos termos do disposto no artigo 74.º, n.º 1 da LGT, e dos artigos 6.º a 8.º da Portaria n.º 297/2015. 

 

Não podemos, porém, seguir tal raciocínio. No decurso do procedimento inspetivo, a AT realizou diversas diligências instrutórias tendo em vista a identificação e demonstração das correções e sua efetividade, e solicitou esclarecimentos à Requerente, que teve a oportunidade de os prestar. 

 

Como salienta a decisão arbitral no processo n.º 14/2021, de 21 de novembro de 2021: “[…] do princípio do inquisitório não resulta a obrigação, por parte da administração tributária, de realizar todas diligências requeridas pelo contribuinte no decurso do procedimento ou realizar todas aquelas que o interessado venha a entender a posteriori como necessárias face ao conteúdo da decisão final que tenha sido adotada. O principal efeito jurídico da insuficiência das diligências instrutórias a realizar pela Administração no âmbito do procedimento tributário traduz-se, em sede de impugnação judicial, num non liquet probatório sobre os factos materiais da causa, implicando que o tribunal emita uma pronúncia desfavorável em relação à parte a quem incumbia fazer a prova dos factos, à luz dos critérios de repartição do ónus da prova do artigo 74.º da LGT (SERENA CABRITA NETO/CARLA CASTELO TRINDADE, Contencioso Tributário, Vol. I, Coimbra, 2017). Como vício invalidante do ato tributário, a preterição do princípio do inquisitório (e, consequentemente, do princípio da verdade material) apenas pode ser considerada na situação limite em que os serviços omitam diligências essenciais à averiguação da situação tributária de tal modo que não se encontre justificação plausível para a correção fiscal.” 

 

Não é esse o caso quando a AT fundamenta as correções em múltipla factualidade, devidamente suportada em elementos documentais coligidos relativamente aos procedimentos do contribuinte e em esclarecimentos por este prestados, que permitem retirar as conclusões alcançadas e justificadas no RIT, isto, independentemente de com as mesmas se concordar do ponto de vista jurídico (dos pressupostos de direito). Acresce que em relação às questões suscitadas a prova é essencialmente documental, como a relativa à evidência dos fluxos financeiros/circuito financeiro que comprove a aplicação dos fundos do financiamento bancário na aquisição dos ativos elegíveis para o RFAI (o que, relembra-se, não se comprovou). É igualmente elucidativo que as pretensões de mérito que o Tribunal julga procedentes assentam em erro de direito e não em erro nos pressupostos de facto (já depois de ouvidos pelo Tribunal os depoimentos das testemunhas indicadas pela Requerente).

 

Improcede, assim, o argumento de violação do princípio do inquisitório e do comprometimento da verdade material. 

 

Em relação ao princípio do contraditório, como atrás assinalado a propósito dos juros compensatórios, deve ser assegurada a participação dos cidadãos na formação das decisões que lhes disserem respeito, assistindo-lhes o direito de audição antes da emissão dos atos decisórios negativos/impositivos (v. artigos 60.º, n.º 1, alíneas a) e b) da LGT e 45.º do CPPT). 

 

A Requerente foi notificada para exercer o direito de audição em relação ao PRIT e teve a possibilidade de, não só nessa fase, como em momento anterior do procedimento, expor os seus esclarecimentos e juntar documentos ou indicar meios de prova, exceto quanto aos juros compensatórios, pois o PRIT e o RIT são totalmente omissos nessa matéria. No mais, o sujeito passivo foi informado e ficou habilitado a pronunciar-se. Não exige a lei que a AT concorde com a conceção do contribuinte, quanto aos pressupostos de facto e/ou de direito, ou que realize as diligências instrutórias de acordo com as orientações e interesses deste. Exprimir as razões e valorações é diferente de as impor. 

 

À face das circunstâncias descritas e com exceção dos juros compensatórios, matéria que foi acima versada de forma autónoma, não pode deixar de considerar-se acautelada a garantia procedimental de participação do sujeito passivo na formação da decisão tributária, emanação do princípio de origem processual audi alteram partem, questão que não se confunde com a da validação dos pressupostos das liquidações efetuadas e do seu mérito (atrás objeto de análise), pelo que improcede igualmente a alegada violação do princípio do contraditório. 

 

2.3.  Sobre a Dupla Inspeção Externa  

 

A Requerente aponta terem sido realizadas duas inspeções externas com incidência no (mesmo) período de tributação de 2015: aquela que deu origem às liquidações cuja anulação se pretende nesta ação arbitral e uma outra, cujo relatório de inspeção determinou correções de IVA e de IRC, ambas identificadas na matéria de facto fixada nos autos. 

 

Para a Requerente, a realização de duas inspeções abrangendo o mesmo âmbito temporal infringe a proibição consagrada no artigo 63.º, n.º 4 da LGT, que dispunha, na redação à data, o seguinte: “O procedimento da inspeção e os deveres de cooperação são os adequados e proporcionais aos objetivos a prosseguir, só podendo haver mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço, salvo se a fiscalização visar apenas a confirmação dos pressupostos de direitos que o contribuinte invoque perante a administração tributária e sem prejuízo do apuramento da situação tributária do sujeito passivo por meio de inspeção ou inspeções dirigidas a terceiros com quem mantenha relações económicas”[8]

 

Efetivamente, quando concorra a tripla identidade – de sujeito passivo, de imposto e de período de tributação – o legislador vedou a possibilidade de repetição de procedimento inspetivo externo, numa ponderação articulada dos interesses tributários da AT e de proteção da esfera dos contribuinte, que não deve ficar sujeito a múltiplas ações inspetivas com o incómodo e consumo de recursos que tal acarreta, ressalvadas circunstâncias especiais, como o surgimento de factos novos, que não se verificam na situação vertente. 

 

Não se constata, contudo, terem ocorrido dois procedimentos de inspeção abrangendo o exercício de 2015, pois as correções em discussão nos presentes autos respeitam a deduções à coleta concretizadas nas declarações modelo 22 dos anos 2017 e 2018 e à coleta desses anos, derivando de procedimentos inspetivos cujo âmbito temporal também se circunscreveu aos períodos de tributação de 2017 e de 2018. 

 

A tese da Requerente assenta na conceção, errónea, de que sendo as deduções à coleta efetuadas em 2017 e 2018 provenientes investimentos realizados em anos anteriores, nomeadamente (embora não exclusivamente) de 2015, que não foram objeto de correção no âmbito de um procedimento inspetivo realizado em 2015, ficariam impedidas de ser escrutinadas no momento posterior, da sua dedução à coleta, cristalizando-se de forma inabalável, mesmo enfermando de ilegalidade. Não se afigura ser assim. 

 

O benefício do RFAI é efetivado através do mecanismo de dedução à coleta de IRC e é exercido no momento dessa dedução, no caso, como referido, em 2017 e 2018, ainda que a sua origem possa remontar a períodos anteriores, por não se ter materializado à data a dedução ou se ter materializado de forma limitada, nomeadamente por falta ou insuficiência de coleta, prevendo a lei, nessas circunstâncias, o seu reporte por um período temporal de 10 anos. 

 

É no exercício em que é deduzido à coleta o benefício fiscal, no caso o RFAI, que, caso esta dedução seja indevida se pode efetivar o respetivo ajustamento e não noutro (por exemplo, quando o investimento foi feito, em 2014), se em períodos de tributação distintos, pois é precisamente essa dedução que está a ser retificada. Tendo a dedução à coleta sido efetuada nos períodos de tributação de 2017 e 2018, nos termos do disposto no artigo 90.º do Código do IRC, é quanto a estes que se reporta a inspeção e as correções na origem dos atos de liquidação em crise e não ao período de 2015 e ao procedimento inspetivo a este reportado[9].

 

Em linha de argumentação similar, o Supremo Tribunal Administrativo entendeu em relação ao reembolso das deduções de IVA, que aqueles não devem ser concedidos sem a comprovação, no momento do reembolso, da verificação dos seus pressupostos, considerando que, nem seria compreensível outro regime, pois, reportando-se o pedido de reembolso à globalidade das relações tributárias relativas a um determinado período, o seu conteúdo definitivo está forçosamente por definir, mesmo sabendo que a dedução por via declarativa já foi realizada e que tenha decorrido o prazo de caducidade de liquidação dos impostos previsto no artigo 45.º da LGT – v. acórdão de 12 de julho de 2007, processo n.º 303/07. 

 

Atentas as razões expostas, improcede a ilegalidade invocada pela Requerente de violação do princípio da não duplicação de inspeções externas. 

 

            Em síntese, os atos tributários de liquidação de IRC e de juros compensatórios de que a Requerente foi alvo, acima identificados, são parcialmente anuláveis por vício substantivo de erro nos pressupostos e por preterição do direito de audição (juros compensatórios), em conformidade com o disposto no artigo 163.º, n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo (“CPA”), aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea d) do RJAT, nos termos apresentados no quadro seguinte, com a indicação da procedência ou improcedência do pedido de anulação deduzido pela Requerente:    

 

Ano

Investimento Relevante

Dotação do Benefício Fiscal

Correção do Benefício Fiscal

Pedido de Anulação

Linha de Produção Lâmpadas LED

2014

€ 27.993,52

€ 6.998,38

(em 2017)

€ 6.998,38

Procedente 

2015

€ 164.626,73

€ 41.156,68

(em 2018)

€ 41.156,68

Improcedente

2017

€ 14.270,89

€ 3.567,72

(em 2017)

€ 3.567,72

Procedente

Linha de Produção de Papel Autoadesivo

2014

€ 2.230.160,66

€ 550.790,17

2017

€ 13.391,09

Improcedente

2015

€ 1.344.216,41

€ 336.054,10

2018

€ 3.926,07

Improcedente

Juros compensatórios

2017

€ 2.050,69

Procedente 

2018

€ 2.326,61

Procedente 

 

 


 

3.     Juros Indemnizatórios 

 

A Requerente, peticiona, como decorrência da anulabilidade dos atos de liquidação de IRC e juros compensatórios, a restituição das quantias pagas (em dinheiro ou por compensação) acrescidas de juros indemnizatórios.

 

A jurisprudência arbitral tem reiteradamente afirmado a competência destes Tribunais para proferir pronúncias condenatórias derivadas do reconhecimento do direito a juros indemnizatórios originados em atos tributários ilegais que aí sejam impugnados, ao abrigo do disposto nos artigos 24.º, n.º 1, alínea b) e n.º 5 do RJAT e 43.º e 100.º da LGT. 

 

Esta disciplina deriva do dever, que recai sobre a AT, de reconstituição imediata e plena da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, como resulta do disposto nos artigos 24.º, n.º 1, alínea b) do RJAT e 100.º da LGT, fazendo este último preceito referência expressa ao pagamento de juros indemnizatórios, compreendido nesse efeito repristinatório do statu quo ante.

 

O que significa que na execução do julgado anulatório a AT deve reintegrar a ordem jurídica violada, restituindo as importâncias de imposto pagas em excesso e, neste âmbito, a privação ilegal dessas importâncias deve ser objeto de ressarcimento por via do cálculo de juros indemnizatórios, por forma a reconstituir a situação atual hipotética que “existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado”. 

 

Sobre os juros indemnizatórios rege o disposto no artigo 43.º da LGT que, no seu n.º 1, o faz depender da ocorrência de erro imputável aos serviços do qual tenha resultado o pagamento de prestação tributária superior à legalmente devida. Subscrevendo a fundamentação da decisão do processo arbitral n.º 604/2020-T: 

 

Como resulta do teor expresso do n.º 1 do artigo 43.º da LGT, há direito a juros indemnizatórios em caso de anulação por vício que constitua «erro», entendendo-se como tal os vícios que na dogmática administrativa têm tal designação, que são os vícios de erro sobre os pressupostos de facto e erro sobre os pressupostos de direito.

 

Neste sentido tem vindo a decidir uniformemente o Supremo Tribunal Administrativo como pode ver-se pelos seguintes acórdãos: de 05-05-1999 processo n.º 05557-A; de 17-11-2004 processo n.º 0772/04; de 01-10-2008 processo n.º 0244/08; de 29-10-2008 processo n.º 0622/08; de 25-06-2009 processo n.º 0346/09; de 09-09-2009 processo n.º 0369/09; de 04-11-2009 processo n.º 0665/09; de 08-06-2011 processo n.º 0876/09; de 07-09-2011, processo n.º 0416/11; de 30-05-2012, processo n.º o410/12; e de 22-05-2013, processo n.º 0245/13.”

 

Na linha desta jurisprudência, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios quanto às partes das liquidações de IRC anuladas por enfermarem de ilegalidade por violação de lei (erro de direito na aplicação do artigo 22.º, n.ºs 2 e 5 do CFI) e proporção de juros compensatórios que lhes corresponda. 

 

No entanto, não beneficia de direito a juros indemnizatórios na parte remanescente dos juros compensatórios anulados, por se ter ficado a dever a preterição de direito de audição. Também improcede o pedido de juros indemnizatórios em relação à parte das liquidações que não vai anulada e se mantém na ordem jurídica. 

 

* * *

 

Por fim, importa referir que foram conhecidas e apreciadas as questões relevantes submetidas à apreciação deste Tribunal, não o tendo sido aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras, ou cuja apreciação seria inútil (artigo 608.º do CPC, ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT). 

 

 

 

V.            Decisão

 

            Em face do exposto, acordam os árbitros deste Tribunal Arbitral em: 

a)      Julgar parcialmente procedente o pedido de anulação dos atos tributários de liquidação de IRC e de juros compensatórios supra identificados, relativos aos períodos de tributação de 2017 e 2018, na medida em que corrigem o benefício fiscal do RFAI nos valores de € 6.998,38 e € 3.567,72 (2017), que vão anulados, e em relação à totalidade da liquidação de juros compensatórios, com a consequente anulação parcial da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa; 

b)      Julgar parcialmente procedente o pedido de juros indemnizatórios sobre o valor da liquidação de imposto (IRC) anulada e dos juros compensatórios correspondentes a esse segmento;

c)      Julgar o pedido improcedente na parte remanescente, tudo com as legais consequências. 

 

 

VI.      Valor do Processo 

 

            Fixa-se ao processo o valor de € 95.450,10, indicado pela Requerente, respeitante ao montante das liquidações de IRC e juros compensatórios cuja anulação pretende, e não impugnado pela Requerida, de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, este último ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

 

 

VII.     Custas

 

            Custas no montante de € 2.754,00 (dois mil e setecentos e cinquenta e quatro euros), sendo € 2.203,20 (80%) a cargo da Requerente e € 550,80 (20%) a cargo da Requerida, na proporção do decaimento, em conformidade com a Tabela I anexa ao RCPAT e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT e 4.º do RCPAT. 

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 30 de dezembro de 2022

 

 

Os árbitros,

 

 

Alexandra Coelho Martins, Relatora

 

 

Rui Miguel Marrana

 

 

Hélder Faustino 

 

 



[1] Dispõe a citada norma o seguinte: “Considera-se investimento realizado o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso.”

[2] Acrónimo de Norma Contabilística e de Relato Financeiro, que fazem parte do Sistema de Normalização Contabilística (“SNC”) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 158/2009, de 13 de julho. 

[3] Por outro lado, tal solução não seria sequer neutral, pois bastaria que o fornecedor alterasse as condições comerciais de fornecimento, assumindo os custos com fretes e desalfandegamento, que seriam incorporados no preço dos bens vendidos, conforme previsto em diversos dos “Incoterms” utilizados nas transações internacionais. 

[4] Em grande medida noutro exercício. 

[5] No sentido de aquisições de ativos fixos tangíveis efetuadas, como tal, no período de tributação respetivo, sendo que na situação vertente parte dos ativos já tinha sido adquirida no exercício anterior. 

[6] Em sentido diferente, v. decisões arbitrais n.ºs 545/2018-T e 488/2019-T. 

[7] Que dispõe o seguinte: “2 - Sempre que, nas normas fisc​ais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se​​ outro decorrer diretamente da lei.”

[8] A atual redação, introduzida pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, é similar: “O procedimento da inspeção e os deveres de cooperação são os adequados e proporcionais aos objetivos a prosseguir, só podendo haver mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço, salvo se o procedimento visar apenas a consulta, recolha de documentos ou elementos ou a confirmação dos pressupostos de direitos que o contribuinte invoque perante a administração tributária e sem prejuízo do apuramento da situação tributária do sujeito passivo por meio de inspeção ou inspeções dirigidas a terceiros com quem mantenha relações económicas.”

[9] Período no qual (2015) saliente-se não foi efetuada qualquer apreciação e correção em sede de RFAI.