Decisão Arbitral
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente, designado pelos outros Árbitros), Dr. Jorge Carita e Prof. Doutor Jónatas Machado, designados pela Requerente e pela Requerida, respectivamente, para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 24-05-2022, acordam no seguinte:
1. Relatório
A..., S.A, doravante designada apenas como “Empresa”, ou “Requerente”, titular do Número de Identificação de Pessoa Coletiva (NIPC) ..., com sede social em Rua ..., n.º ... ...– ...– ...-... ..., veio, nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), apresentar pedido de pronúncia arbitral, tendo em vista a anulação da liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) n.º 2021..., emitida em 27-10-2021, relativa ao ano fiscal de 2017, bem como a correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2021..., esta última datada de 29-10-2021, da qual resultou um reembolso de imposto no montante de € 1.589,89.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 18-02-2022.
Os signatários comunicaram a aceitação do exercício das funções no prazo aplicável.
Em 04-05-2022, as Partes foram notificadas da designação dos árbitros, não tendo manifestado vontade de recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 24-05-2022.
A AT apresentou Resposta, em que defendeu a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.
Em 01-09-2022, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas simultâneas.
As partes apresentaram alegações.
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º, e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT, e é competente.
As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
Não há nulidades.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos com relevância para apreciação desta questão:
-
A Requerente é uma sociedade de direito português cuja actividade principal é a extracção de argilas (CAE principal 08122), tendo ainda como CAE secundários, até 2017, a fabricação de produtos cerâmicos não refractários (CAE 0234590) e outros produtos minerais (CAE 023992, desde 2016) e transportes rodoviários de mercadorias (CAE 049410, desde 2016) (página 6 do Relatório da Inspecção Tributária, artigo 7.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado, e depoimento da testemunha B...);
-
Foi realizada uma inspecção a Requerente, relativa ao exercício de 2017, ao abrigo da Ordem de Serviço OI2019..., em que foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária (RIT) que consta do documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:
3.1.1.2- Dedução à matéria coletável de BF - apoio ao transporte rodoviário de mercadorias Encontra-se incluído no campo 774 - benefícios fiscais (BF) - do quadro 07 da declaração modelo 22 de 2017, a importância de 114.801,23 €, a deduzir no apuramento do resultado tributável, decorrente de benefício fiscal previsto no nº 4 do artigo 70º do EBF, relativo a "majoração aplicada aos gastos suportados com a aquisição, em território português, de combustíveis para abastecimento de veículos" (no presente caso o valor indicado resulta da majoração de 20% sobre o montante base de combustíveis de 574.005.13 € referente às viaturas indicados pelo SP e adiante melhor identificadas), conforme decorre do montante indicado no anexo D da referida declaração modelo 22 que na figura seguinte se ilustra:
Em 2017, a par da sua atividade principal (extração de argilas e caulino) exerceu atividade de transportes, encontrando-se registado e certificado para efeitos da atividade de transportes de mercadorias por conta de outrem, junto do Instituto da Mobilidade e dos Transportes, IP (IMT), conforme a imagem documental reproduzida na figura seguinte evidencia (renovação da licença em 2017):
Atendendo ao descrito, para efeitos de aplicação do referido normativo em causa, designadamente o nº 4 do artigo 70º do EBF e no que diz respeito à parte eventualmente aplicável ao SP, nomeadamente o transporte rodoviário de mercadorias por conta de outrem (TCO), será assim de ter em consideração o seguidamente reproduzido
"4 - Os gastos suportados com a aquisição, em território português, de combustíveis para abastecimento de veículos são dedutíveis, em valor correspondente a 120 % do respectivo montante para efeitos da determinação do lucro tributável, quando se trate de:
(...)
b) Veículos afetos ao transporte rodoviário de mercadorias público ou por conta de outrem, com peso bruto igual ou superior a 3.5 t registados como elementos do ativo fixo tangível de sujeitos passivos IRC ou alugados sem condutor por estes e que estejam licenciados pelo IMT, I.P. (Redação do Decreto-Lei n º 36/2016, de 15 de julho)
(...)
6 - Os benefícios fiscais previstos no presente artigo são aplicáveis durante o período de tributação que se inicie em ou após 1 de janeiro de 2016 e seguintes. (Aditado pelo Decreto-Lei n.º 38/2016 de 15 de Junho)"
A referida norma do EBF refere-se à atividade de transporte rodoviário de mercadorias por conta de outrem (TCO), e não para transportes próprios (TCP), pelo que, para efeitos das definições de conceitos teremos em conta a legislação mencionada nos documentos ao IMT conforme acima reproduzido, designadamente a legislação referente ao regime jurídico do acesso à atividade e ao mercado dos transportes rodoviários de mercadorias vertida no Decreto-Lei nº 257/2007, de 16 de julho, modificado pelos Decreto-Lei n.º 137/2008, de 21 de julho, e nº 136/2009, de 5 de junho. No caso, em particular, atente-se ao referido no art. 2º do referido Decreto-Lei n.º 257/2007:
(...)
Artigo 2.º
Definições
Para efeitos do disposto no presente decreto-lei e legislação complementar, considera-se:
a) «Transporte rodoviário de mercadorias» a actividade de natureza logística e operacional que envolve a deslocação física de mercadorias em veículos automóveis ou conjuntos de veículos, podendo envolver ainda operações de manuseamento dessas mercadorias, designadamente grupagem, triagem, recepção, armazenamento e distribuição;
b) «Transporte por conta de outrem ou público» o transporte de mercadorias realizado mediante contrato, que não se enquadre nas condições definidas na alínea seguinte;
c) «Transporte por conta própria ou particular» o transporte realizado por pessoas singulares ou colectivas em que se verifiquem cumulativamente as seguintes condições:
i) As mercadorias transportadas sejam da sua propriedade, ou tenham sido vendidas, compradas, dadas ou tomadas de aluguer, produzidas, extraídas, transformadas ou reparadas pela entidade que realiza o transporte e que este constitua uma actividade acessória no conjunto das suas actividades;
ii) Os veículos utilizados sejam da sua propriedade, objecto de contrato de locação financeira ou alugados em regime de aluguer sem condutor;
iii) Os veículos sejam, em qualquer caso, conduzidos pelo proprietário ou locatário ou por pessoal ao seu serviço;
(...)
Como resulta evidente, o legislador define e distingue para efeitos de transporte de mercadorias duas formas, "Transporte por conta de outrem ou público" (TCO) e "Transporte por canta própria ou particular" (TCP) Para efeitos fiscais, a citada norma do EBF aplica-se apenas e só aos "Veículos afetos ao transporte rodoviário de mercadorias público ou por conta de outrem" (TCO) e não para "transportes por conta própria ou particular" (TCP), e como referido na norma do EBF, desde que as viaturas "estejam licenciados pelo IMT IP"
Analisados os elementos apresentados pelo SP, verificamos que o valor de 114.801,23 € considerado de majoração no âmbito do referido benefício em causa, teve por base 20% do montante de combustíveis de 574,006,13 €, relativo às viaturas e totais identificados pelo SP conforme resumido no quadro seguinte:
Observação imagem extraída do documento remetido pelo SP conforme cópia em anexo 6.
Embora a generalidade das viaturas indicadas se encontre licenciada para efeitos da atividade de transporte por conta de outrem há, contudo, algumas viaturas que apresentam gastos de combustível imputados em períodos anteriores à data de início da licença das mesmas, o que, entendemos não podem ser considerados abrangidos em face do determinado na al. b) do nº 4 do art. 78 do EBF (viatura ainda não licenciada pelo IMT. l. P.), As situações em causa são as das viaturas nos períodos e montantes de combustível que se identificam e resumem no quadro seguinte.
Contabilisticamente o SP regista serviços de transporte em contas apropriadas, designadamente subcontas da conta 721 - Serviços de Transporte, nos totais no quadro seguinte indicados:
Da análise do SAFT da faturação e concretamente das referências nas linhas de Faturação à família de "transportes", ou seja, referências de produto/serviço iniciadas por "TR", apura-se que o valor líquido (aturado no acumulado do ano ficou-se apenas pelos 525 591.02 € sendo que por cruzamento cem os registos na contabilidade se concluí que este valor foi refletido em registo na contabilidade e nas contas e pelos valores seguidamente descritos:
A diferença entre valores registados na contabilidade de serviços de transporte prestados e linhas de faturação da família "transportes" foi identificada pelo cruzamento dos registos no SAFT da faturação com a contabilidade (contas 7211 - Serviço Transporte - mercado nacional e 7212 - Serviço Transporte - mercado intracomunitário) como resultando de outros tipo de serviços diferentes de transporte rodoviário prestado pelo SP como resulta do resumido no quadro seguinte:
Deste modo, e como resulta dos montantes indicados, comparando o total de serviços prestados de transporte com os gastos em combustíveis das viaturas alegadamente afetas a esses serviços de transportes, constata-se que o montante efetivo de serviços de transporte prestados totalizou 525.591,02€ e que esse montante é inferior ao total do combustível indicado de 574.006,13€. consumido alegadamente para efeitos dos serviços prestados em causa.
Esta questão é relevante no sentido que fará pouco sentido que o SP desenvolva uma atividade de transportes por conta de outrem em que nem sequer consegue refletir no montante faturado os gastos tidos com o combustível consumido para o efeito. E assim também não considerar outros gastos e encargos necessários como manutenções, seguros, custos com os motoristas e depreciações dos encargos de aquisição das viaturas.
Contudo pelos elementos relativos aos centros de custo em que se inserem as viaturas (ver Mapa de Análise de Custos em anexo 7), é observável um desfasamento considerável entre totais de débitos (gastos) e créditos (rendimentos) face aos valores acima indicados de combustíveis e serviços de transporte prestados respetivamente.
De referir que a nossa análise se encontra prejudicada pelo facto do SP ter remetido informação incompleta relativamente aos centros de custo, nomeadamente por não ter identificado as contas contabilísticas de contrapartida, quer em termos de mapa de Análise de Custos (balancete), nem nos extratos de Centros da Custo. Essa informação devidamente retificada foi solicitada ao SP (conforme na figura seguinte reproduzida), primeiro no ponto 1 do nosso email enviado em 16/04/2021, e novamente repetida no ponto 2 da Notificação enviada em 27/04/2021 (anexo 3), mas nunca respondida em conformidade pelo SP.
2 Relativamente ao benefício fiscal - Majoração aplicada aos gastos suportados com a aquisição, em território português, de combustíveis para abastecimento de veículos (art º 70.º, n º 4 do EBF) - os elementos remetidos mostram-se insuficientes para o adequado controlo do mesmo.
Será necessário clarificar os vossos apuramentos de combustível, designadamente os registos subjacentes aos mesmos, para tal é necessário que os mapas de centros de custo (balancetes e extratos) incluam a identificação das contas da contabilidade (incluir no extrato coluna "Conta Orig") a fim de ser compreensível a que se referem as imputações indicadas. Deverão assim remeter ficheiros revistos e adequados com a informação indicada, para os dois anos em análise (2017 e 2018).
Analisada a informação possível, por referência documental e de registo, entre SAFTs contabilidade, faturação e mapas de centros de custo fornecidos, apesar das limitações inerentes, foi possível observar que alguns dos documentos relativos a facturação (tipo de documentos "FA", "NC", "NCV" e "NDV") registados nas contas de serviços de transporte acima indicadas não se encontram refletidos nos centros de custo, pelo que, dos totais registados na contabilidade apenas se evidenciam refletidos nos centros de custos das viaturas em análise os valores identificados no quadro seguinte:
De referir ainda que nenhum dos valores indicados na conta de 7212- Serviço Transporte -mercado intracomunitário encontra reflexo nos centros de custo em análise, o que, como atrás referimos, decorre do facto de se referirem a outro tipo de serviços que não de transporte rodoviário, designadamente com referência a "portes" e "outros serviços ligados a exportação".
Assim, considerando o total de documentos ligados à faturação nos centros de custo concluímos que foram registados imputados aos centros de custo outros rendimentos líquidos relacionados com a utilização das viaturas que importará compreender.
• Total líquido registado de documentos de faturação nos centros de custo em análise:
Os totais dos rendimentos líquidos registados noutras contas da contabilidade, não relacionados diretamente com serviços de transporte por conta de outrem. totaliza o montante indicado no quadro
- Total de valor registado relativo a outras rendimentos que não serviços de transporte prestados:
Assim, perante o descrito, conclui-se que o SP imputa outros rendimentos (mais de 50%), que não apenas a serviços de transporte por conta de outrem (apenas 49%), situação que assim tende a clarificar que os gastos com combustível com as referidas viaturas (assim como outros gastos), são recuperados pela utilização das viaturas não só decorrente dos serviços prestados pelas mesmas, como inserido no preço de produtos comercializados em transportes próprios.
Analisados os elementos de registo constatamos, conforme exemplificaremos seguidamente, que tais rendimentos serão parte integrante do preço de produtos comercializados pelo SP, que incorporam no preço do mesmo uma parte relativa ao transporte, cujo critério e forma de cálculo se desconhece, e cujo registo em centro de custo servirá propósitos de gestão e conhecimento da eficiência na utilização dos seus ativos (viaturas).
Observe-se como exemplo a fatura "FA 2017/31" de 13-01-2017, alguns dos elementos de detalhe da mesma com registos em centros de custo e na contabilidade;
- Começando por alguns elementos do que foi faturado e detalhado na referida fatura:
- Em centros de custo, associado a essa fatura, foram efetuados os seguintes registos:
Na contabilidade, em contas de vendas e serviços prestados foram registadas as linhas e valores descritos:
Considerando os elementos descritos no exemplo descrito, conclui-se que os registos na contabilidade em rendimentos de serviços de transporte (conta 7211) totalizaram 895,77€, correspondente às linhas na fatura referentes 303 códigos de serviços de transporte iniciados por "TR". Contudo, nos centros de custo o SP registou rendimentos (créditos) associados à referida fatura num total de 1 698,53€, que se supõe relativos a transporte. Ainda que o SP não tenha identificado nos extratos remetidos qual a conta de rendimentos associada na contabilidade (conforme lhe foi concretamente solicitado em nossa notificação em anexo 3), nomeadamente se a venda de mercadorias (conta 7111 ou 7121) ou a serviços de transporte (conta 7211), é contudo percetível pelos montantes indicados que do total dos 1.598.53€, registado de rendimentos em centros de custo, uma parte, no valor de 802,76€, não tem reflexo na conta de serviços mas estará antes relacionado com vendas de mercadorias e transportes próprios (registos nas contas 71 relativos às linhas da fatura de vendas de mercadorias).
Assim decorrente do exposto em sede de rendimentos, constata-se que o SP também utiliza as viaturas em fins e transportes próprios, logo, também os combustíveis imputados (pela totalidade) não se podem considerar como exclusiva ou predominantemente destinada a fins de utilização na prestação de serviços de transporte por conta de outrem, contratados e faturados enquanto tal.
Importaria assim que no mínimo o SP dispusesse de um controlo de consumo dos combustíveis utilizados que distinguisse claramente a parte utilizada em transportes próprios dos por conta de outrem e que não apresentou
A situação dos transportes por conta própria referem-se a situações de deslocações internas da empresa (entre as suas instalações) ou transportes de mercadorias vendidas pelo SP, consideradas assim como efetuadas por conta própria, conforme resulta da definição acima referida de acordo com a al. c) do art. 2.º do referido Decreto-Lei n.º 257/2007 (atendendo a que não é detalhado no faturado o valor para o contrato de transporte e só verificam cumulativamente as condições indicadas na referida norma para a qual se remete).
A definição do preço da mercadoria é influenciada pelos custos e gastos inerentes às mesmas, incluindo os tidos com o transporte por conta própria, sendo também por essa razão que se verifica a prática de preços distintos para as mesmas mercadorias (com o mesmo código), e assim nas faturas aos clientes, consta apenas e só o preço de venda das mercadorias, sem distinção de que forma esse preço é influenciado pelo transporte próprio.
Repare-se, contudo, que ainda distinguindo na fatura o valor acrescido relativo ao serviço de transporte, a al c) do art. 2º do DL 257/2007 enquadra no transporte por conta própria o transporte de mercadorias que tenham sido vendidas pela entidade que realiza o transporte e este constitua uma atividade acessória no âmbito das suas atividades, o que é o caso, podendo inclusive alguns dos transportes discriminados em faturas de venda de produtos respeitar ao transporte dos mesmos, não caindo na definição de transporte por conta de outrem.
Uma vez que o SP utilizou as viaturas em causa em atividades de transporte distintas, próprias ou por conta de outrem, tal implicaria que nos combustíveis também fizesse a distinção da afetação do mesmo, sendo que, apenas o que tivesse por destino a atividade por conta de outrem poderia ser imputado ao referido benefício fiscal.
Contudo, o combustível identificado por viatura refere-se à totalidade dos gastos de combustível registados e imputados às mesmas durante o ano 2017, sendo que estas não foram utilizadas apenas e só na atividade do transporte por conta de outrem, uma vez que foram também usadas no âmbito do transporte de mercadorias próprias, incluindo para os seus clientes.
Concluindo, no que se refere aos gastos com o combustível, o SP efetua uma repartição nos centros de custo por cada viatura de forma geral isto é, sem qualquer repartição ou evidenciação contabilística do que se refere à atividade de transporte por conta de outrem (TCO) e transporte por conta própria (TCP)
Considera-se assim que os elementos fornecidos pelo SP são incompletos e não permitem de forma direta e exata distinguir por viatura quais os gastos de combustível efetivamente utilizado em transportes por conta de outrem (TCO). O combustível indicado foi simultaneamente utilizado lambem em transportes próprios (TCP), nomeadamente decorrente de venda de mercadorias a clientes e outros fins internos da empresa.
Em nossa opinião, para poder usufruir do benefício fiscal neste ponto em análise, caberia ao SP demonstrar ter um controlo eficaz dos gastos com combustível inerente à atividade de TCO de modo a ser possível apurar de forma direta e exata o montante do combustível que poderia beneficiar do regime em causa.
Em resumo, considera-se que o SP não demonstrou que a totalidade do combustível indicado teve por fim a atividade de transporte por conta de outrem (TCO), ou sequer, qual a parte que efetivamente se poderia considerar como para esse fim, razão pela qual não estão reunidas condições para poder usufruir do benefício fiscal em causa, impondo-se corrigir o resultado tributável no montante total em causa 114.801,23 €.
3.1.1.3. Ajustamento no total dos saldos de dotações dedutíveis em sede de benefício RFAI
No exercício de 2017, em sede de IRC, o SP inscreveu na declaração de rendimentos modelo 22, no campo 355 - benefícios fiscais - do quadro 10, a dedução à coleta da importância de 25.536,28 €
Tal montante, conforme referenciado na anexo D da referida declaração, decorre da dedução de valores de dotação com origem no REGIME FISCAL DE APOIO AO INVESTIMENTO (RFAI) previsto nos artigos 22.º a 26.º do Código Fiscal do Investimento (CFI) aprovado pelo Dec.-Lei n.º 162/2014, de 31/10, conforme seguidamente se reproduz:
O RFAI (Capítulo III do CFI), conforme prevê o n.º 2 do artigo 1.º do CFI, constitui um regime de auxílio com finalidade regional, aprovado nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107ª e 108º do Tratado, publicado no Jornal Oficial da União Europeia, nº L 187, ele 26 de junho de 2014 (RGIC)
Nos termos do referido CFI, o RFAI e aplicável aos períodos de tributação iniciados em ou após 1 de janeiro de 2014, estabelecendo-se ainda o âmbito de aplicação e definições do RFAI, designadamente a quem se aplica, quais as aplicações relevantes, as condições objetivas e cumulativas exigidas aos sujeitos passivos para poderem beneficiar deste regime, outras definições e enquadramentos, os benefícios e obrigações acessórias, e designadamente os elementos a constarem do processo de documentação fiscal.
Pela Portaria 297/2015 de 21 de setembro foi estabelecido em melhor detalhe a regulamentação do RFAI, entre outros, nomeadamente, os conceitos de investimento/aplicações relevantes e elementos a constar no processo de documentação fiscal.
Analisados os elementos justificativos apresentados constata-se que o SP se refere a investimentos alegadamente efetuados nos anos de 2015 e 2016, que justifica imputável para efeitos de RFAI, que de acordo com os seus mapas totalizaria os montantes resumidos no quadro seguinte.
Os investimentos em causa efetuados em 2015 e 2016 não foram alvo de verificação inspetiva anterior, e considerando que em 2017 é deduzido parte do montante de dotação desses anos anteriores, mantendo-se alguns valores como dedutíveis, verificamos no âmbito da presente inspeção o apuramento e cumprimento das condições legais na base das dotações referentes a 2015 e 2016
Efetuados pedidos de esclarecimentos ao SP sobre os referidos investimentos e o seu enquadramento em sede de RFAI concluiu-se conforme seguidamente se descreve
Enquadramento dos investimentos efetuados:
DO ANO 2015
I. Os investimentos de 2015 (conforme descrito no anexo 8) considerados e indicados pelo SP totalizaram 1.572.836,43 €, visaram, segundo este, em particular, o aumento da capacidade de produção da empresa, e segundo esclarecido pelo SP englobados numa estratégia global de investimento que incluía um projeto de Inovação Empresarial (Produtiva) no âmbito de apoios de fundos comunitários com vista a reforçar a competitividade das pequenas e médias empresas.
II. Em face do indicado nos elementos justificativos do SP sobre os investimentos, pode-se inferir que os investimentos realizados pretenderam cobrir um pouco das várias vertentes enunciadas no referido normativa, embora pareça estar mais direcionado para a aumento da capacidade de produção conforme decorre do exposto pelo mesmo.
Porém, tendo efetuado referência a remeter parte para a diversificação da produção, então teria de se ter em conta o cumprimento do nº 2 e/ou do nº 1 do artº 3º da portaria 297/2015 de 21 de setembro constatando-se, pelos dados apresentados que o SP não demonstrou os elementos exigíveis para a consideração dos mesmos como relevantes nesta vertente, vindo mesmo a deixar cair essa pretensão indicando considerar esses investimentos apenas para efeitos do aumento da capacidade de produção,
III. De facto, nos elementos inicialmente remetidos pelo SP, em resposta a notificação inicial, este indicava que parte do investimento 1.063.136,43€ visava o aumento da capacidade de produção, e o restante, 509 700,00€, destinava-se à diversificação da produção. Contudo, questionado o SP em segunda notificação sobre os aspetos específicos no tocante à comprovação do enquadramento visando a diversificação da produção este veio retificar a sua posição inicial, considerando incorreto o enquadramento de diversificação, mas que esse mesmo investimento pode ser enquadrado como investimento inicial - aumento da capacidade (conforme ponto 3 3 do documento em anexo 10).
IV. Os investimentos efetuados em 2015, identificados no documento em anexo 8, terão ocorrido em locais diferentes, mas correspondentes a alguns dos polos onde a empresa desenvolve a sua atividade, designadamente na região centro.
V. Os investimentos foram efetuados em equipamento básico, equipamento de transporte e em imóveis (conforme quadros resumo do SP e que adaptamos seguidamente no nosso resumo)
VI. Nos termos do RFAI, consideram-se aplicações relevantes, as efetuadas no âmbito de um investimento inicial (nos termos da portaria 297/2015 de 21 de setembro), designadamente investimento em ativos fixos tangíveis afetos à exploração da empresa adquiridos em estado novo, afastando-se desde logo mobiliário e artigos de conforto ou decoração ou outros bens que não estejam afetos à exploração da empresa bem como eventuais reparações de equipamentos preexistentes.
A alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da portaria 297/2015 de 21 de setembro, regulamenta e estabelece claramente que o RFAI apertas se aplica a investimentos iniciais (novos), considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de uni estabelecimento existente.
Segundo justificado pelo SP, para efeitos do benefício RFAI, de acordo o artigo nº 2º da Portaria n.º 297/2015, este considerou o benefício fiscal enquadrado no aumento da capacidade.
Analisados os elementos e documentos de suporte fornecidos pelo SP, referenciados de acordo com os registos na contabilidade e fichas do imobilizado, concluímos que alguns não cumprem os critérios para serem enquadráveis e aceites para eleitos de RFAI, descrevendo-se em seguida os motivos da exclusão dos mesmos:
1. Investimentos Indicados como equipamento básico e de transporte
Nos investimentos indicados que parecem em geral enquadrados para efeitos do RFAI, incluiu em Equipamentos de Transporte uma viatura Pesada Mercedes ... (trator de mercadorias) e um Semi-Reboque L-... (que se tem por associado a viatura pesada, trator de mercadorias).
No caso da referida viatura, esta encontra-se identificada pelo SP igualmente em sede do benefício fiscal no n.º 4 do artigo 70º do EBF, relativo a "majoração aplicada aos gastos suportados com a aquisição, em território português, de combustíveis para abastecimento de veículos", ou seja, a referida viatura encontra-se afeta à atividade de transporte de mercadorias por conta de outrem (conforme CAE 49410 - TRANSPORTES RODOVIÁRIOS DE MERCADORIAS que o SP também possui). O SP não só indicou que todo o combustível gasto pela viatura foi imputado a esse fim dos transportes (ainda que, de facto, a totalidade possa não ter sido apenas na referida atividade de transporte por conta de outrem), como o investimento na mesma se tem de considerar como para utilização predominante nessa atividade considerando esta ter sido licenciada junto do IMT para o efeito (válida de 29/05/2017 a 28/05/2022).
Deste modo, considerando o retendo, e que a atividade de transportes encontra-se expressamente excluída do âmbito do RFAI (ver nº 1 da artº 22 conjugado com o n.º 2 e 3 do artº 2º, ambos do CFI, e com o art 1º da Portaria 282/2014 de 30 de dezembro), os investimentos indicados, associados com essa área de atividade desenvolvida pelo SP não podem ser considerados como elegíveis e enquadráveis para efeitos do RFAI, pelo que os investimentos em causa, no valor total de 121.087,02 € (87.000.00€ + 34.087,02€), devem ser excluídos dos montantes enquadráveis para efeitos de RFAI.
2. Investimentos indicados como em imóveis — terrenos de exploração
O SP indica que os investimentos efetuados tiveram por fim terrenos de exploração, contudo, a quase totalidade dos imóveis indicados tratam-se de prédios rústicos, adquiridos sem indicação de finalidade de exploração diferente da prevista na classificação dos prédios como rústicos informação esta confirmada pelo SP nos esclarecimentos prestados (ver ponto 3.5 do documento em anexo 10). O SP também não promoveu na data da aquisição ou posteriormente, a alteração nos termos do artigo 13º do CIMI por eventual afetação a fim diferente do enquadramento de definição de prédios rústicos.
De facto, nos termos do artigo 3.º do CIMI, define-se para efeitos tributários o que se entende ser um prédio rústico (designadamente que a sua afetação, ou na falta de concreta afetação tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas a silvícolas), sucedendo, quando a afetação dos mesmos se destine a fins diferentes dos aí previstos, por exemplo para fins de exploração como de "pedreiras, saibreiras, argilas e fins análogos", que a classificação de tais prédios seja alterada para a de prédio urbano (artigo 4º do CIMI) na categoria "Outros", prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 6º do CIMI (conforme entendimento já divulgado pela Autoridade Tributária nomeadamente pela Circular n.º 13/2000, de 24 de Maio com as necessárias adaptações quanto as alterações legislativas subsequentes).
Atendendo ao descrito, quanto aos prédios rústicos, apesar do SP afirmar que a aquisição dos referidos prédios terá como fim a exploração dos mesmos na âmbito da sua atividade, mas considerando o enquadramento tributário dos mesmos à data, não nos parece assim poderem ser enquadráveis nos termos do artigo 22º do CFI, designadamente na exceção prevista na subalínea i) da alínea a) do nº 2 do referido artigo: "Ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de: i) Terrenos, salvo no caso de se destinarem a exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extrativa (sublinhados nossos).
O SP adquiriu prédios rústicos sem alterar o fim para IMT/IMI e nas escrituras nada se diz a este respeito. Ora, a elegibilidade da aquisição de terrenos para exploração, é uma exceção à regra de exclusão (nº2 alínea a) do artigo 22º do CFI). Assim, na aquisição dos terrenos deveria indicar esse fim, sob pena de infração por omissão em sede de IMT. As escrituras não referindo o fim para que foram adquiridos (exploração) apenas indicando tratar-se de prédios rústicos implica a não avaliação para efeitos de um IMT superior, sendo que, a inscrição na matriz como prédios rústicos, acarreta menos IMI. Não faz sentido, interpretar a intenção do legislador como concedendo benefícios numa aquisição oficialmente omissa por evasão fiscal.
Acresce dizer ainda, apesar do SP apontar a aquisição dos terrenos rústicos alegadamente destinados a exploração, que em 2018 procedeu inclusive à alienação de alguns desses imóveis (designadamente sito na freguesia de ..., ...), conforme identificados no quadro seguinte, por permuta par imóvel urbano noutra freguesia diferente (imóvel identificado na matriz da freguesia de ...-" ...-U-...")
Perante o descrito, observa-se nestes casas uma dissonância entre os objetivos indicados pelo SP para os referidos terrenos e o fim que lhes foi dado.
Em face do exposto, os investimentos em terrenos rústicos, mantidos enquanto tal, não podem assim ser considerados como devidamente enquadrados na exceção da subalínea i) de alínea a) do nº 2 do artº 22º do CFI, sendo de os desconsiderar na totalidade no montante dos investimentos relevantes para efeitos do RFAI.
Além da situação dos imóveis terrenos rústicos adquiridos, incluiu igualmente a aquisição de três prédios urbanos, os quais concluímos referirem-se a edificações usadas (armazéns de atividade industrial) e não terrenos. De facto os referidos prédios urbanos, foram inscritos e avaliados para efeitos de IMI no ano de 2009 (ficha 15070 e 15071) e 2006 (ficha 15077) incluindo como parte do descritivo sobre a sua composição e fins dos mesmos conforme seguidamente reproduzido.
Assim, e quanto aos prédios urbanos indicados, estes foram adquiridos "usados" "Nem o novo CFI nem o RGIC (nem os diplomas anteriores que regulavam o RFAI) contém qualquer definição de "estado de novo", pelo que a AT tem vindo a considerar que um ativo fixo tangível é considerado em "estado de novo" se não integrou anteriormente o ativo não corrente da empresa que pretende usufruir do RFAI ou de qualquer outra empresa" (conforme consta das processos de informação vinculativa nº 2015 001110 - PIV n.º 8602, com Despacha de 2015-07-03 e nº2015 002015, PIV n.º 8949, com Despacho de 2015-07-07).
Deste modo, não se tratando de imóveis construídos para efeitos da revenda, ou seja, como uma nova propriedade, pelo contrário, na data em que veio à posse da A... os imóveis já tinham vários anos de uso os últimos na posse de uma sociedade locadora, e nesse âmbito já foram ou deviam ter sido reconhecidos contabilisticamente como ativos não correntes por anteriores proprietários/locatários, não podendo ser considerados ativos adquiridos em estado de novo pelo que não se verifica o requisito exigido na alínea a) da n.º 2 do art. 22 º do CFI não constituindo assim aplicações relevantes para efeitos de aproveitamento do RFAI.
Em face do exposto conclui-se que não se identificam nos imóveis adquiridos, imputados pelo SP ao RFAI, que possam ser considerados enquadráveis em sede desse mesmo benefício fiscal, pelo que serão de se desconsiderar todos os investimentos nos imóveis identificados, totalizando o montante de 924.299,41 € (=414.599.41 € + 509 700,00 €)
DO ANO 2016
VII. Os investimentos de 2016 (conforme descrito no anexo 9) considerados e indicados pelo SP totalizaram 309.092,27€, visaram, segundo este, em particular o aumento da capacidade de produção da empresa. Considerando ainda o referido para 2015, parece também inferir-se este investimento como englobado numa estratégia global de investimento que incluía um projeto de Inovação Empresarial (Produtiva) no âmbito de apoios de fundos comunitários com vista a reforçar a competitividade das pequenas e médias empresas iniciado em 2015.
VIII. Esses investimentos foram efetuados, conforme indicado pelo SP, no polo da empresa sita em ... ..., e encontram-se listados no documento em anexo 9.
IX- Os investimentos foram efetuados em equipamento básico e em imóveis
X Nos termos do RFAI. consideram-se aplicações relevantes, as efetuadas no âmbito de um investimento inicial (nos termos da portaria 297/2015 de 21 de setembro), designadamente investimento em ativos lixos tangíveis, afetos à exploração da empresa adquiridos em estado novo, afastando-se desde logo mobiliário e artigos de conforto ou decoração ou outros bens que não estejam afetos à exploração da empresa, bem como eventuais reparações de equipamentos pré-existentes.
A alínea d) do nº 2 do artigo 2.º da portaria 297/2015 de 21 de setembro, regulamenta e estabelece claramente que o RFAI apenas se aplica a investimentos iniciais (novos), considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.
Segundo justificado pelo SP para efeitos do benefício RFAI, de acordo com o artigo 2º da portaria 297/2015, considerou o benefício fiscal para aumento da capacidade.
Analisados os elementos e documentos de suporte fornecidos pelo SP, referenciados de acordo com os registos na contabilidade e fichas da imobilizado, concluímos o seguinte quanto aos investimentos efetuados:
1. Investimentos indicados como equipamento básico e de transporte
Nos Investimentos indicados, que parecem em geral enquadrados para efeitos do RFAI, constam, contudo, alguns investimentos que não se encontram nessa situação, designadamente:
- Equipamento "usado", no caso o Contentor 5000 X 3000 (...), conforme verificável na descrição inserta na Fatura em anexo 11, e assim não enquadrável nos termos do artigo 22º do CFI, designadamente na alínea a) do nº 2 da retendo artigo "Ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo";
- Viatura ligeira mista, no caso a viatura (Volkswagen Amarok a diesel) com a matricula ..., que se considera de utilização mista, pois embora classificada como ligeiro de mercadorias posam uma lotação de 5 lugares logo não pode ser considerada exclusivamente destinada ao transporte de mercadorias ou de utilização comercial / industrial, porque também serve a transporte de pessoas em número equivalente a uma viatura ligeira de passageiros, logo, embora adquirida nova, encontra-se incluída nas exceções previstas no caso na subalínea m) da alínea a) do n.º 2 do artigo 22º do CFI, não constituindo por isso investimento enquadrável em sede de RFAI.
Assim, dos investimentos indicados pelo SP, devem ser excluídas as duas situações relatadas, por não serem considerados como elegíveis e enquadráveis para efeitos do RFAI, no montante de 32.730.70 € (= 3 500,00 € + 29 230,70 €).
2. Investimentos Indicados como em imóveis - terrenos de exploração
O SP indica que os investimentos efetuados tiveram por fim terrenos de exploração, contudo, a quase totalidade dos imóveis indicados tratam-se de prédios rústicos, adquiridos sem indicação de finalidade de exploração diferente da prevista na classificação dos prédios como rústicos, informação esta confirmada pelo SP nos esclarecimentos prestados (ver ponto 3 5 do documento em anexo 10). O SP também não promoveu na data da aquisição ou posteriormente, a alteração nos termos do artigo 13º do CIMI por eventual afetação a fim diferente do enquadramento de definição de prédios rústicos.
Em relação aos terrenos rústicos (considerado de exploração pelo SP) adquiridos em 2016 dá-se aqui por reproduzido tudo quanto atrás referimos para o ano de 2015 por ser de natureza equivalente.
Decorrente do descrito, os investimentos nos referidos terrenos não podem ser considerados como devidamente enquadrados, sendo de os desconsiderar na totalidade do montante dos investimentos relevantes para efeitos do RFAI, no total de 113.099,11 €.
Criação de postos de trabalho:
XI Para efeitos do RFAI importa também ter em conta em 2015 e 2016 o cumprimento cumulativo das condições previstas no n.º 4 do art 22º do CFI designadamente o previsto na al. f) dessa norma, ou seja, que o investimento relevante proporciona a criação de pastos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento.
Em face dos elementos remetidos, o SP justifica que os investimentos proporcionaram a criação e manutenção de postos de trabalho (veja-se o preambulo do Decreto-Lei n.º 162/2014), de 31 de outubro, e o seu artigo 1º), através da celebração de contrato de trabalho sem termo (ou por tempo indeterminado), abrangendo a admissão de trabalhadores novos ou de trabalhadores que já estivessem na empresa mas ao abrigo de um contrato com termo, e a sua manutenção nos anos seguintes, designadamente em 2017, pelo que se considera condição satisfeita.
Conclusões:
XII Considerando assim tudo o acima exposto importa concluir quanto aos montantes aceites e não aceites como investimento relevante para efeitos do RFAI, considerando os mapas apresentados pelo SP e os subtotais referenciados acima, atento as situações não enquadráveis em sede da RFAI em face do exposta nos subpontos l a X, concluindo-se conforme resumido nos quadros seguintes
Em face do descrito, entende-se que o SP não reuniu no ano de 2015 as condições exigíveis para poder beneficiar da dotação do incentivo fiscal do RFAI decorrente de todos os investimentos por a indicados no montante de 1.572.836,43 € mas apenas e só relativamente a 527.450,00 € conforme resulte do acima exposto, ou seja, não são aceites no cômputo dos investimentos indicados de dotação referente ao ano de 2015 a diferença entre os montantes indicados, no total de 1.045.386,43€ (= 1572.636,43 € - 527.450,00 €)
Em face do descrito, entende-se que o SP não reuniu no ano de 2016 as condições exigíveis para poder beneficiar da dotação do incentivo fiscal do RFAI decorrente de todos os investimentos por si indicados no montante de 309 092.27 €, mas apenas e só relativamente a 163.262,46 € conforme resulta do acima exposto, ou seja não são aceites no cômputo dos investimentos indicados na dotação referente ao ano de 2015, a diferença entre os montantes indicados, no total de 145,829,81€ (= 309 092,27 € - 145.829,81 €). ( [1] )
Assim, considerando os investimentos declarados pelo SP e os aceites devidamente enquadrados em sede de RFAI recalcula-se o benefício fiscal possível de usufruir, apurando-se na sequência os montantes de dotação finais aceites e que subsistem por deduzir no início de 2017 (final de 2016):
Em face do descrito, conclui-se que o ajustamento no total dos saldos em reporte dedutíveis em sede de RFAI. com origem nos investimentos de 2015 e 2016, totaliza 203.950,81 € (=167 493.36 e relativo a 2015 + 36 457.45 € relativo a 2016)
(...)
9.1-1- Exercício do direito de audição - exposição do sujeito passivo e outros elementos
9.1.1.1- Relativamente as correções propostas
Em 01/09/2021 o SP fez chegar via email resposta, entretanto remetida também por correio entrado em 02/09/2021, em que exerce o referido direito de audição, e no qual indica o que seguidamente se reproduz de acordo com os pontos da exposição:
(...)
Assim, verifica-se que o SP, não se pronuncia sobre as correções desenvolvidas no capítulo III do presente relatório à exceção do que resulta proposto no ponto 3114 relativo a tributação autónoma em falta e resumido no ponto 1.4.1.1.3, que diz aceitar tendo inclusive procedido à regularização em conformidade com o proposto por via da entrega de modelo 22 de substituição entregue em 03/09/2021.
Nada sendo indicado quanto às restantes correções que permitam ponderar a alteração do proposto no projeto de relatório, as mesmas mantém-se na integra.
9.1.1.2- Valor de dotação do RFAI 2017 incluído na modelo 22 não justificado
Analisado o preenchimento da declaração modelo 22 de substituição entregue pelo SP, identificam-se alterações face à declaração base de análise sujeita a inspeção, e que o SP apenas mencionou no exercício do direito de audição como "outras correções", não tendo junto qualquer justificação ou elementos de suporte
Tais alterações referem-se ao preenchimento no anexo D, relativo a benefícios fiscais, de valor de dotação em sede de RFAI com referência ao ano de 2017 e que na declaração antes entregue e base de análise não se encontrava preenchida:
O SP sabia, que a base de análise da IT recaiu sobre o ano de 2017, nomeadamente anterior declaração entregue e vigente até a presente substituição, que incidiu também na análise do Benefício Fiscal do RFAI. conforme o mesmo se encontrava declarado na referida modelo 22, no que se refere às dotações reportadas de 2015 e 2016 (únicas até agora inscritas nas declarações) conforme exposto no ponto 3.1.1.3, e relativamente às quais também nada disse no direito de audição, pela que, ao inserir outros valores, nomeadamente uma dotação de 2017, esta a apresentar factos novos e que se encontravam omitidos da autoridade tributária.
Tais factos novos, agora invocados, no final de um processo inspetivo, deviam ter sido comunicados no decurso da inspeção ou no mínimo, expostos no direito de audição exercido. Contudo, nem antes ou agora aduziu qualquer justificação do valor agora declarado ou demonstração do cumprimento das condições inerentes à constituição da dotação de RFAI do ano de 2017 agora inserido, não apresentando qualquer dos elementos exigidos pelo CFI, no que se refere ao RFAI e portaria 297/2015 de 21 de setembro.
Mais se refere que a declaração de substituição em causa apenas será liquidada porque corrige a Tributação Autónoma (TA), e o art.º 122.º do CIRC conduz a uma liquidação do imposto inerente, que não é influenciado pelo benefício agora declarado, sendo certo que se não corrigisse esta TA, esta declaração não teria qualquer tratamento, ficando na situação não liquidável, por excedidos todos os prazos de reclamação. Note-se que em caso de erro na autoliquidação deverá haver reclamação graciosa prévia no prazo de 2 anos da entrega da declaração (art. 131º do CPPT). A entrega das declarações de substituição não pode servir de pretexto para o alargamento dos prazos de reclamação legalmente estabelecidos.
De referir ainda que o SP não indicou em qualquer declaração posterior, anos de 2018, 2019 e 2020, valores de reporte de RFAI com origem em dotação do ano de 2017
Considerando que se encontra excedido o prazo de reclamação graciosa e que o SP não apresentou os elementos justificativos (conforme previsto nos diplomas referenciados relativamente ao RFAI) e de suporte ao direito que invoca para incluir a dotação do benefício fiscal RFAI do ano de 2017, no montante de 380.877.38 €, não poderá o mesmo ser aceite.
Assim, mantem-se em sede de RFAI apenas os valores a reportar para os perlados seguintes, com origem em 2015 e 2016, com correção no total de 203.950,81 £ conforme indicado no final do ponto 3.1.1.3.
Em tace do descrito, em particular no presente ponto quanto à não aceitação do valor inscrito relativo à dotação em sede de RFAI do ano de 2017 em declaração de substituição agora entregue, dado se tratarem de factos novos suscetíveis de correção, sugere-se remessa de novo projeto de relatório a fim do SP, querendo, se pronunciarem novo direito de audição sobre o exposto neste ponto 9.1 1.2.
9.2- Notificação de 07/09/2021 do Projeto Relatório da Inspeção Tributária
Na sequência do envio de uma primeira notificação em 13/07/2021 para efeitos do exercício do direito de audição, que o SP exerceu, resultou na entrega de declaração de rendimentos Mod.22 de substituição com factos novos, não mencionados no direito de audição, conformei descrito no ponto que antecede, 9.1.1.2. não justificados nem documentados pelo SP face à proposta da não aceitação dos novos valores inscritos, em sede de RFAI (que resultavam num novo crédito de imposto com origem em 2017), na referida declaração de substituição, atendendo ao prazo já excedido para reclamação graciosa, remeteu-se nova notificação para o exercício do direito de audição, nos termos previstos no Artº 60º da LGT e no Art 60º do RCPITA, por correio registado pelo ofício n.º DIT2-...-2021 de 07/09/2021 inúmero de registo nos CTT RH...PT de 08/09/2021) para o domicílio fiscal conforme consta na base de dados da AT.
9.2.1- Exercido do direito de audição – exposição do sujeito passivo e outros elementos
9.2.1.1- Relativamente às correções propostas
Em 24/09/2021 o SP fez chegar à DF de ... via email, documento e elementos relativos ao exercício do direito de audição decorrente da notificação de 07/09/2021. e no qual indica o que seguidamente se reproduz de acordo com os respetivos pontos da exposição.
(...)
Assim, verifica-se que o SP, mantém o que já anteriormente havia afirmado (no primeiro exercício do direito de audição) no que se refere as correções propostas no capítulo III do presente relatório. Nada acrescenta ao proposto no ponto 3.1 1.4. relativo a tributação autónoma em falta e resumido no ponto 1.4.1.1.3., dado no direito de audição anterior já ter indicado a sua aceitação tendo inclusive procedido a sua regularização por via da entrega de modelo 22 de substituição em 03/09/2021.
Deste modo, quanto às restantes correções do capítulo III as mesmas mantêm-se na íntegra.
Contudo, em face dos factos novos inscritos na declaração de substituição da modelo 22 entregue em 03/09/2021. e que levaram ao referido e proposto no ponto 9.1.1 2. o SP pronunciou-se nos termos descritos nos pontos 4º e 5" da sua exposição e que acima reproduzimos, assunto que será desenvolvido no ponto próprio seguinte.
9.2.1.2- Valor de dotação de RFAI 2017 incluído na modelo 22 não aceite
Conforme referido no ponto 9.1 1.2, que aqui se dá por totalmente reproduzido, e para o qual se remete primeiramente, no decurso do prazo para o exercício do primeiro direito de audição, motivado pelo envio da notificação do projeto de relatório em 13/07/2021, o SP procedeu à entrega de uma declaração de substituição da modelo 22 em 03/09/2021.
Na referida declaração de substituição incluiu a correção da tributação autónoma proposta no ponto 3.1.1.4 do relatório e, em simultâneo, aproveitando o potencial de liquidação da referida declaração incluiu no anexo D - Benefícios Fiscais - valores de dotação de RFAI para o ano de 2017 que não havia inscrito em declaração anterior entregue dentro dos prazos legais (no caso em 11/06/2013).
A liquidação de imposto de IRC proveniente desta declaração de substituição não é colocada em causa, ainda que suscetível de alteração face às restantes correções propostas no ponto III e não regularizadas, o que é colocado em causa é o valor de crédito de imposto gerado pela dotação de RFAI agora declarada no ano de 2017 ou seja, uma correção a favor do SP inserida por iniciativa deste.
Face aos elementos remetidos verifica-se que o SP pretende ver inscrito um valor de dotação de RFAI de 2017, do qual não deduz qualquer montante nesse ano, mas que ficaria em crédito para potencial uso futuro. Porém, o SP nada diz relativamente ao facto de só agora, na declaração de substituição ter incluído o referido valor, alegando apenas que teria os elementos no dossier fiscal e que não os apresentou porque não foram solicitados. Nessa medida, tem de se entender que o erro da não inclusão de tal valor em declaração modelo 22 entregue dentro dos prazos legais decorreu do comportamento do SP e subsequentemente de erro negligente apenas a si imputável.
O SP alega que a inspeção deveria ter solicitado os elementos de RFAI 2017, contudo tal não era possível, nem necessário, porquanto a autoridade tributária não podia conhecer algo que o SP não tinha ainda alegado até à entrega da referida declaração de substituição.
A invocação de um novo crédito de imposto por benefício fiscal, alegadamente originado em 2017 - dotação de benefício de RFAI de 2017, dedutível por insuficiência de coleta, nas liquidações dos 10 períodos de tributação seguintes (n º 3 do art. 5.º do CFI) - não resultou da alteração de algum ponto mencionado no projeto de correções ou sequer de facto já declarado na primeira declaração de rendimentos entregue em 2018, mas claramente um novo facto de crédito de imposto invocado na declaração agora entregue em 2021.
O SP não ignora que o procedimento inspetivo visou a declaração modelo 22 entregue dentro dos prazos legais vigente e que era conhecida da AT até ao projeto de relatório lhe ser notificado, sendo que o SP apenas no prazo e direito de audição veio declarar factos novos a seu favor - benefício de crédito de imposto no âmbito de dotação de RFAI de 2017 - razão pela qual lhe competia assim fazer prova do alegado direito (nº 1 do art. 342 do Código Civil e n.º 1 do artigo 74º da LGT).
A declaração de substituição entregue apenas é liquidada pela existência de correção de tributação autónoma do montante de 1.325,20€, nos termos do nº 1 do artº 122º do CIRC. Já a invocação de um novo direito, no caso a crédito de imposto de 380.877.38€, não tem enquadramento no nº 1 do art. 122º do CIRC, e não pode servir de pretexto para o alargamento dos prazos de reclamação legalmente estabelecidos, que no caso se encontram excedidos.
Em caso de erro na autoliquidação a favor do SP, excedido o prazo do n.º 2 do artº 122º do CIRC, poderia ainda efetuar reclamação graciosa prévia no prazo de 2 anos da entrega da declaração (art.º 131º do CPPT). Assim, tendo a anterior declaração de rendimentos sido entregue em 11/06/2018 e a nova declaração de substituição entregue em 03/09/2021, ou seja, mais de 3 anos após a primeira, o prazo para aceitação deste novo crédito/benefício fiscal invocado encontra-se ultrapassado, ainda que se considerasse a convolação desta última declaração em reclamação graciosa.
Resulta da interpretação da subalínea II) da alínea b) do n º 3 e n.º 6 do art º 59º do CPPT, em caso de erro de facto ou de direito nas declarações dos contribuintes, o sujeito passivo pode apresentar a declaração de substituição, para a correção de erros ou omissões a si imputáveis de que resulte imposto de montante inferior ao liquidado com base na declaração apresentada, até ao termo do prazo legal de reclamação graciosa ou impugnação judicial das quais não podem resultar a ampliação dos prazos de reclamação graciosa, impugnação judicial ou revisão do ato do tributário, que seriam aplicáveis caso não tivessem sida apresentadas.
Repare-se que se a intenção do SP fosse solicitar revisão oficiosa do ato, o que nunca invocou, tal situação tem procedimento autónomo próprio, que não o procedimento de inspeção tributária e seria nesse procedimento de revisão que iria comprovar o seu enquadramento conforme previsto no art.º 78.º da LGT (sendo certo que o prazo de 3 anos constante do n.º 4 também já se encontra excedido e a não invocação antecipada do benefício resulta do seu próprio comportamento e não de erro imputável ao serviço).
Conclui-se assim que o SP não apresentou argumentos que sustentem a legalidade para se aceitar a inscrição dos novos valores na modelo 22 de substituição entregue em setembro de 2021 em sede da presente inspeção, e não cabe a esta inspeção suprir os erros decorrentes do comportamento negligente do SP, beneficiando-o com um alargamento dos prazos legalmente estabelecidos para o efeito, conforme acima se refere, motivo pelo qual não será de aceitar a referida inscrição de dotação de RFAI 2017, sendo resposto assim o que havia sido declarado pelo SP na declaração anteriormente entregue em 2018, ou seja, nenhum valor de dotação de RFAI de 2017.
Sem prejuízo do referido, ainda que eventual reclamação graciosa seja intempestiva e consequentemente não haver dever legal de pronuncia sobre este novo facto, face aos elementos justificativos do apuramento da dotação de RFAI de 2017 inscrita na declaração modelo 22 de substituição entregue em setembro de 2021, sempre se esclarece que os mesmos se demonstram também insuficientes para uma potencial validação dos mesmos por exemplo
• Não demonstra o SP como conclui para apurar o número de trabalhadores e a criação de postos de trabalho, sendo incoerente com informação já prestada anteriormente. O SP indica na documentação de suporte do RFAI 2017 a criação de 1.5 postos de trabalho, contudo, considerando as entradas e saídas no mapa de "CRIAÇÃO LÍQUIDA DE POSTO DE TRABALHO POR TEMPO INDETERMINADO" (ficheiro "Ponto 9 h) Criação líquida emprego.pdf remetido pelo SP por email de 07/04/2021 em anexo 24) nos períodos de 2015 a 2017 e acompanhando-se a forma de cálculo descrito pelo SP no RFAI 2017, conclui-se que não houve criação líquida de pelo menos 1 posto de trabalho em 2017 (a variação foi de -0.58) mas apenas manutenção:
- Conforme quadro do SP no documento de suporte do RFAI 2017
• Contagem dos postos de trabalho considerando o número de pessoas no final de 2016 e as entradas e saídas em 2017 de acordo com o documento do SP e datas indicadas em anexo 24:
Note-se ainda que o SP não identifica que concretos postos de trabalho foram criados e em que medida os mesmos resultam dos investimentos relevantes em causa, em dois locais distintos geograficamente (...-..., e...).
Não é clara a justificação dos investimentos como devidamente enquadrados nos fins previstos pelo RFAI e que se trataram de investimentos novos e não de substituição ou reparação (por exemplo, a fatura 2017/133 do fornecedor C..., no montante de €141.596,80 (documento referenciado com o nº RFAI 55), refere, na descrição do serviço, nova cobertura e revestimento de pavilhões existentes na ... assim como, substituição de chapas de luz) Também se verifica a consideração de aquisição de terrenos rústicos que (oram adquiridos como tal e assim permanecem na matriz predial (e não terrenos de exploração como indica), sendo investimentos não elegíveis e não enquadrados na exceção da subalínea i) da alínea a) do nº 2 do art. 22º do CFI.
• Não é claro que os investimentos identificados sejam afetos à exploração em atividades contempláveis no âmbito do RFAI. Note-se que o SP exerceu efetivamente a atividade prevista no CAE 049410 TRANSPORTES RODOVIÁRIOS DE MERCADORIA, particularmente transportes por conta de outrem - TCO — atividade expressamente excluída do âmbito do benefício nos termos do n.º 1 do art. 22 conjugado com o n.º 2 e 3 do art 2º, ambos do CFI, e com o art 1º da Portaria 282/2014 de 30 de dezembro, constando da relação dos investimentos considerados pelo SP (documentos referenciados com os nº RFAI 40 e 23) viaturas pesadas de transporte (as quais se encontram licenciadas pelo lMT IP para TCO) e semi-reboques. Repare-se que o SP aquando da justificação do benefício da majoração dos encargos com combustível, no ponto 3.1.1.2 deste relatório, indica essas mesmas viaturas como afetas a TCO (matrículas ... 36/37/38/39).
Deste modo, mantem-se na íntegra os factos e conclusões do projeto e agora vertidos no presente relatório final.
Atendendo ao aumento de coleta do IRC resultante das correções propostas à matéria coletável, constantes dos pontos 3.1.1.1. e 3.1.1.2. deste relatório, também o benefício à coleta do RFAI poderá nesse caso ser superior, com o limite de 50% da mesma (artº 23/n.º 2/b) do CFI). Atendendo que o SP dispunha em 2017 de saldo de dotação de RFAI de 2015 de 122.747,46€ e de RFAI de 2016 da 40.815.62 €, correspondente a valores não deduzidos (conforme resulta do ponto 3.1.1 3, deste relatório), será considerada dedução a coleta corrigida até ao limite indicado (para cada RFAI em reporte), resultando ainda assim num montante remanescente a reportar para períodos posteriores de 83.769.31 € de RFAI de 2015 e de 1.837,47 € de RFAI de 2016, devendo ser ajustados os saldos e deduções dos períodos seguintes No quadro seguinte discrimina-se o descrito:
Sendo apenas possível a dedução à coleta do pagamento especial por conta (PEC) após a dedução dos benefícios fiscais à coleta, nos termos do artigo 90.º n.º 2 da CIRC, o montante deduzido de PEC pelo SP em 2017 (€ 23.338.62) e não aproveitado neste período por via de dedução de benefícios fiscais (que apenas são reportáveis por insuficiência de coleta artº 23º/nº 3 do CFI, e não por escolha do SP), será de considerar na dedução à coleta de períodos seguintes nos termos legalmente previstos.
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Em 11-06-2018, a Requerente apresentou a declaração modelo 22 relativa ao exercício de 2017 que consta do documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que, além do mais, declarou os seguintes valores relativos ao Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), designadamente:
– no campo 713: um saldo de RFAI não deduzido de anos anteriores no montante de 367.513,89€ (respeitante 290.240,82€ ao RFAI do ano de 2015 e 77.273,07€ ao RFAI do ano de 2016)
– no campo 714, destinado a inscrever o montante do benefício obtido no período de tributação a que respeita a declaração (dotação do período), o valor 0 (zero);
– no campo 715, o montante de € 26.536,28, deduzido à colecta no período de tributação;
– no campo 716, o valor de 340.977,61, como saldo que transita para períodos seguintes:
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Em 03-09-2021, a Requerente apresentou a declaração modelo 22 de substituição relativa ao exercício de 2017 que consta do documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que manteve os valores indicados nos campos 713 e 715, e indicou no campo 714 o valor de € 380.877,38, como montante do benefício obtido no período de tributação a que respeita a declaração (dotação do período) e alterou o saldo a transitar para os seguintes para valor de € 721.854,99:
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Na sequência da inspecção referida, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação de IRC n.º 2021 ..., relativa ao ano fiscal de 2017, bem como a correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2021..., que constam do documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
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A viatura de mercadorias com matrícula ... e o semi-reboque com matrícula ... a ela associada estavam afectos ao serviço de transporte de mercadorias por conta própria da Requerente, considerando-se que eles incluem o «transporte inerente aos produtos extraídos da sua atividade normal, entre as várias instalações da empresa e para os seus clientes» (acordo das Partes – artigos 40.º e 41.º do pedido de pronúncia arbitral e 35.º e 39-º da Resposta);
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A Requerente, por vezes, não consegue assegurar os transportes de que necessita apenas com as suas viaturas, tendo de contratar serviços de transportes externos (depoimento da testemunha B...);
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A Requerente adquiriu nos anos de 2015, 2016 e 2017 terrenos para extracção de minérios no âmbito da sua estratégia de ir continuamente adquirindo terrenos para ampliar a sua capacidade de produção (depoimento da testemunha B...);
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A Requerente incluiu na dotação de RFAI do ano de 2015, a aquisição de terrenos, que totalizaram o montante de € 924.299,41 (Documento 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, e depoimento da testemunha B...);
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A Requerente incluiu na dotação de RFAI do ano de 2016, a aquisição de terrenos, que totalizaram o montante de € 113.099,11, que são indicados no artigo 101.º do pedido de pronúncia arbitral e no Documento 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral (documento referido, cujo teor se dá como reproduzido, e depoimento da testemunha B...);
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A Requerente incluiu na dotação de RFAI do ano de 2017 a aquisição de terrenos, que totalizaram o montante de € 73.805,01, que são indicados no Documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral (documento referido, cujo teor se dá como reproduzido, e depoimento da testemunha B...);
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A actividade de extracção de minérios, designadamente argilas e caulino, é a actividade principal da Requerente (depoimento da testemunha B...);
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Para essa actividade a Requerente utiliza camiões pesados para transporte dos minérios extraídos em vários sítios de extracção e levá-los para as fábricas de processamento, onde produz objectos em cerâmica (depoimento da testemunha B...);
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A matéria que é objecto de extracção é finita, terminando a extracção em cada local quando se extingue o respectivo filão (depoimento da testemunha B...);
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Por essa actividade de extracção ter como limite a capacidade extractiva dos terrenos, para desenvolver essa actividade e assegurar a sua continuidade, a Requerente necessita de aquisição de terrenos como reservas de extracção de argilas e caulino (depoimento da testemunha B...);
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Os investimentos realizados em 2015, 2016 e 2017 foram em terrenos para extracção de argilas, pois tratava-se de zonas cativas de argila (depoimento da testemunha B...);
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Os terrenos adquiridos são necessários para aumento da capacidade de produção da Requerente (depoimento da testemunha B...);
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Nos seus terrenos na ..., onde tem a fábrica, a Requerente construiu infra-estruturas, designadamente o alongamento de um pavilhão, fez um pavilhão de área coberta com um parte aberta em que pode secar argila e homogeneizar o material, para ser armazenado e ser utilizado para continuar a trabalhar no Inverno, quando não podem fazer extracções, o que permitiu aumentar muito a capacidade de produção da empresa (depoimento da testemunha B...);
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A Requerente é detentora da licença de exploração de pedreira de argila denominada “D...” com o nº 5297, que consta do Documento n.º 7, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, obtida pela sociedade E..., Lda, a quem a Requerente adquiriu este complexo de exploração, na qual se se incluem os terrenos de exploração adquiridos no ano de 2015, que a Requerente considerou como aplicações relevantes para RFAI, sitos em .../..., com o valor contabilístico global de € 404.447,63, indicados no artigo 87.º do pedido de pronúncia arbitral (documento referido e depoimento da testemunha B...);
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A Requerente é detentora da licença de exploração de pedreira denominada “F...” com o nº 6711, que consta do Documento n.º 8, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, na qual se se inclui o terreno de exploração adquirido no ano de 2015 sito ...- ... indicado no artigo 88.º do pedido de pronúncia arbitral, que tem o valor contabilístico de € 16.285,60, que a Requerente considerou como aplicação relevante para RFAI (documento referido e depoimento da testemunha B...);
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A Requerente apresentou dois pedidos de licença de exploração de pedreira denominadas “G...” e “H...”, sitas nas freguesias de ... e ..., concelhos ... e ..., respectivamente (Documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e depoimento da testemunha B...);
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A Requerente tem em curso um pedido de licença de depósitos minerais de quartzo e caulino denominado “I...”, sito no concelho de ..., conforme Documento n.º 10 e respetivas cartas topográficas e vistas áreas da zona, conforme Documento n.º 11, juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos, nas quais se incluem os terrenos de exploração adquiridos no ano de 2015 sitos no ... ... e ..., que têm o valor contabilístico global de € 88.240,44, que a Requerente considerou como aplicações relevantes para RFAI (documento referido e depoimento da testemunha B...);
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Os terrenos de exploração adquiridos no ano de 2015 indicados no artigo 91.º do pedido de pronúncia arbitral, que a Requerente considerou como aplicações relevantes para RFAI, não se encontram ainda associados a qualquer licença de exploração, mas são terrenos que a Requerente está a adquirir de forma estratégica na zona de ..., por serem terrenos que têm potencialidade para integrarem futuras concessões de exploração (depoimento da testemunha B...);
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Os referidos terrenos tinham natureza de prédios rústicos, para efeitos de IMI, e mantiveram essa natureza, não tendo a Requerente requerido qualquer alteração matricial (Relatório da Inspecção Tributária);
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A Requerente nunca fez loteamento ou construção nos terrenos que adquirem para a extracção de materiais (depoimento da testemunha B...);
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A Requerente vai adquirindo terrenos para atribuição de concessões antes de as pedir, pois as empresas que tiverem mais terrenos próprios têm vantagem na obtenção de concessões (depoimento da testemunha B...);
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Os processos de licenciamento para extracção e sua ampliação demoram vários anos (depoimento da testemunha B...);
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Há vantagem em comprar terrenos antes de ser feita concessão, pois são muito mais baratos (depoimento da testemunha B...);
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Quando a Requerente adquire terrenos não sabe exactamente as suas potencialidades extractivas, mas, conhecendo as zonas, sabe aproximadamente o mínimo com que pode contar (depoimento da testemunha B...);
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Em 2017, a Requerente aumentou em mais de 40% a sua produção (depoimento da testemunha B...);
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A Requerente tem vindo a aumentar o número de trabalhadores na zona da ...;
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A Requerente celebrou os contratos de trabalho a termo certo que constam do documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
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As datas de entradas e saídas de trabalhadores da Requerente, nos anos de 2015 a 2018 é a que consta da lista que integra no anexo 24 ao Relatório da Inspecção Tributária, cujo teor se dá como reproduzido;
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Nos terrenos adquiridos pela Requerente em 2015 e 2016, cujos investimentos foram por esta declarados para efeitos de RFAI, não existe qualquer construção (facto afirmado no artigo 74.º do pedido de pronúncia arbitral e não questionado);
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Em 17-02-2022, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos pela Requerente e, nos pontos indicados, também com base no depoimento da testemunha B... .
A testemunha é encarregado geral da Requerente desde 2010 e aparentou depor com isenção e com conhecimento dos factos que foram dados como provados com base no seu depoimento.
O processo administrativo apresentado pela Autoridade Tributária e Aduaneira não tem por objecto a acção inspectiva relativa ao exercício de 2017, mas sim a de 2018, que não está subjacente à liquidação e correcções impugnadas no presente processo.
No entanto, uma cópia do Relatório da Inspecção Tributária e seus anexos foram juntos perla Requerente como documento n.º 4 e é suficiente para a decisão da causa.
2.2.1. Utilização da viatura de matrícula ... e do semi-reboque ...
2.2.1.1. Prova produzida
Como se refere na alínea F) da matéria de facto fixada, há acordo das Partes quanto ao facto de a viatura de matrícula ... e o semi-reboque ... terem utilizados para actividade de transportes por conta própria da Requerente.
A divergência entre as Partes é sobre a questão de saber se, para além dessa utilização, a referida viatura e o semi-reboque foram utilizados também para prestação de serviços de transporte por conta de outrem.
No pedido de pronúncia arbitral, a Requerente afirma que a aquela viatura e semi-reboque foram apenas utlizados por conta própria da Requerente.
A testemunha B... corroborou esta afirmação, dizendo, no início do seu depoimento, que aquela viatura e semi-reboque fazem serviço interno da empresa, sendo utilizada nas instalações da ..., e não ter conhecimento de prestação de serviços de transporte a terceiros, nem haver disponibilidade para tal, pois sucede mesmo que por vezes são insuficientes os transportes próprios de que dispõe, tendo de recorrer a serviços externos. Posteriormente, afirmou mesmo ter a certeza da utilização daquela viatura apenas em serviço da Requerente, por até conhecer o motorista que utiliza aquela viatura, de nome J..., que vive próximo do local onde trabalha.
No entanto, apontam em sentido contrário os factos de, para efeitos de usufruir do benefício fiscal previsto no n.º 4 do artigo 70.º do EBF (que não se aplica ao transporte rodoviário de mercadorias por conta própria), a Requerente ter licenciado a viatura para transportes de mercadorias por conta de outem e ter imputado todo o combustível gasto pela viatura no ano de 2017 a esse fim dos transportes por conta de outrem, mesmo em período do ano de 2017 em que aquela viatura não estava licenciada para esse fim (só foi licenciada a partir de 29-05-2017) e, ainda, a existência de uma factura relativa a transporte de resíduos, datada de 13-01-2017, que a Autoridade Tributária e Aduaneira interpreta como reportando-se a transporte por conta de outrem.
2.2.1.2. Apreciação da prova relativa à utilização de viatura e semi-reboque
O Tribunal Arbitral fica na dúvida se a testemunha B... poderia ter um controle permanente sobre a actividade da viatura referida, designadamente porque a razão de ciência invocada (conhecimento pessoal do motorista) não tem, pelo menos necessariamente, potencialidade para permitir formular um juízo seguro sobre a globalidade da sua actividade.
O facto de a Requerente ter imputado todo o combustível gasto pela viatura no ano de 2017 à actividade de transporte por conta de outrem não tem relevância probatória apreciável, neste circunstancialismo, em que não há dúvida (inclusivamente havendo acordo das partes) de que isso não corresponde à realidade. Afigura-se que a inclusão de todos o gasóleo na lista destinada à obtenção do referido benefício fiscal é uma tentativa de obtenção de um benefício fiscal de majoração das despesas com gasóleo, com base em elementos que não correspondiam à realidade, e, neste contexto, o licenciamento da viatura para aquela actividade de transporte por conta de outrem será mais um dos passos necessários para obtenção desse benefício fiscal [à face da alínea b), do n.º 4 do artigo 70.º do EBF]. Isto é, o licenciamento será um indício de que a Requerente queria obter o benefício fiscal, apesar de não satisfazer os requisitos legais, e não uma prova de que a Requerente pretendia efectivamente utilizar a viatura para a actividade de transportes por conta de outrem ou que a utilizou para este fim.
No que concerne à referida factura relativa a «transporte de resíduos» não há elementos que permitam concluir, como faz a Autoridade Tributária e Aduaneira na sua Resposta, que são resíduos do cliente, pois não é de excluir que uma actividade como a que exerce a Requerente, de utilização de argila e fabricação de objectos de cerâmica, gere resíduos para a Requerente que possam ter valor comercial e possam ter sido transportados numa viatura da Requerente, pagando o comprador o respectivo transporte.
Mas, mais relevante é que, na apreciação da prova produzida, há que ter em conta que o pressuposto fáctico desta correcção invocado no Relatório da Inspecção Tributária foi o de que o investimento foi efectuado para utilização predominante daquele viatura e semi-reboque para actividade de transporte por conta de outrem:
“O SP não só indicou que todo o combustível gasto pela viatura foi imputado a esse fim dos transportes (ainda que, de facto, a totalidade possa não ter sido apenas na referida atividade de transporte por conta de outrem), como o investimento na mesma se tem de considerar como para utilização predominante nessa atividade considerando esta ter sido licenciada junto do IMT para o efeito (válida de 29/05/2017 a 28/05/2022).”
Afigura-se que não há elementos de prova que sustentem esta conclusão da utilização predominante da viatura em transportes por conta de outrem e, pelo contrário, é de presumir o contrário, à face das regras da experiência comum, que os Árbitros devem utilizar na livre apreciação dos factos [artigo 16.º, alínea e], do RJAT].
Na verdade, o que está em causa é a aplicação do RFAI a um investimento realizado em 2015, pois a viatura estava na posse da Requerente (através de leasing) desde 10-04-2015 e o semi-reboque estava na posse da Requerente (através de leasing) desde 24-03-2015 (quadro do anexo 8 ao Relatório da Inspecção Tributária, que consta da página 78 do documento n.º 4).
Só tendo a Requerente passado a ter licenciamento para transportes rodoviários por conta de outrem a partir de 29-05-2017, esse entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira de que o licenciamento é prova da utilização conduziria à conclusão de que a viatura e o semi-reboque referidos não foram utilizados para transportes por conta de outrem em 2015, nem em 2016 nem nos dias de 2017 anteriores a 29 de Maio. E, por isso, nos anos de 2015, 2016 e 2017 analisados no Relatório da Inspecção Tributária a propósito do RFAI a utilização largamente predominante seria para transportes por conta própria.
Por outro lado, o licenciamento para transportes por conta de outrem foi para uma actividade secundária da Requerente (CAE secundário da Requerente 049410, desde 2016) e esse licenciamento não tem potencialidade para diminuir as necessidades de viaturas para uso por conta própria nas outras actividades da Requerente, pelo que é de presumir que a viatura continuou a ser utilizada a partir de Maio de 2017 com a mesma intensidade com que era utilizada anteriormente nas actividade enquadráveis no CAE principal (08122 extracção de argilas) e transportes de produtos fabricados no âmbito de actividades enquadráveis nos outros CAE secundários (fabricação de produtos cerâmicos não refractários - CAE 0234590 e outros produtos minerais - CAE 023992, desde 2016).
Esta necessidade intensa de transportes para a actividade da Requerente foi referida pela testemunha, que disse que, por vezes, tem de recorrer a serviços de transportes externos por insuficiência dos seus meios próprios.
Por isso, é de presumir que a viatura e semi-reboque não foram adquiridos (através de leasing), em 2015, para a actividade de transporte de mercadorias por conta de outrem, para que a Requerente nem sequer estava licenciada até Maio de 2017, mas sim para a utilização para transportes por conta própria e que mesmo após o licenciamento referido a utilização largamente predominante (se não mesmo exclusiva, como disse a testemunha) foi a utilização para transportes por conta própria.
Aliás, se a utilização predominante da viatura fosse para transportes por conta de outrem, decerto seriam encontradas na contabilidade da Requerente inúmeras facturas dos serviços prestados e isso não sucedeu, o que corrobora a conclusão de que, se existiu essa actividade de transportes por conta de outrem com a viatura em causa, esta seria uma actividade rara.
Neste contexto, considera-se não provado que o investimento na viatura e semi-reboque referidos tenham sido efectuados para utilização predominante na actividade de transportes por conta de outrem ou que esta tenha sido a sua utilização predominante.
2.2.2. Investimentos em transportes em 2017
A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu no Relatório da Inspecção Tributária que investimentos da Requerente com a aquisição de 4 viaturas pesadas de mercadorias de marca Volvo, com matrículas ..., ..., ... e ..., no valor de 357.248,08€, bem como a aquisição de 4 semi-reboques com matrículas L-..., L-..., L-... e L-... no valor de 136.348,08, estavam afectos à actividade prevista no CAE 049410 – Transportes Rodoviários de Mercadorias, particularmente transportes por conta de outrem, pelo que não se enquadram no âmbito do RFAI.
Valem aqui as considerações que se fizeram no ponto anterior sobre ser presumível que as viaturas e semi-reboques referidos foram utilizados para actividades por conta própria da Requerente, designadamente transporte inerente aos produtos extraídos da sua atividade normal, entre as várias instalações da empresa e para os seus clientes.
Também nestes casos, não se afigura com valor probatório decisivo a obtenção de licenciamento para a actividade de transportes por conta de outrem e o facto de não serem encontradas na contabilidade da Requerente inúmeras facturas dos serviços prestados por conta de terceiros leva a presumir que não terá havido utilização para serviços por conta de outrem.
Assim, considera-se não provado que o investimento nas viaturas e semi-reboques com matrículas..., ..., ... e ..., no valor de 357.248,08€, bem como a aquisição de 4 semi-reboques com matrículas L-..., L-..., L-... e L-... no valor de 136.348,08, tenham sido efectuados para utilização na actividade de transportes por conta de outrem ou que esta tenha sido a sua utilização predominante.
2.2.3. Terrenos alegadamente alienados
Não se apurou se a Requerente alienou os terrenos sitos na freguesia de ..., que a Requerente adquiriu em 2015.
A Autoridade Tributária e Aduaneira refere no Relatório da Inspecção Tributária que a Requerente «em 2018 procedeu inclusive à alienação de alguns desses imóveis (designadamente sito na freguesia de ..., ...), conforme identificados no quadro seguinte, por permuta por imóvel urbano noutra freguesia diferente (imóvel identificado na matriz da freguesia ...-"...-U-...")».
A testemunha B... referiu-se a terrenos sitos naquela freguesia como estando englobados na estratégia da Requerente de adquirir terrenos com potencialidades extractivas para assegurar a continuidade da actividade da Requerente e afirmou desconhecer alienações.
E, corroborando a manutenção daqueles terrenos em poder da Requerente, esta alega que tinha em curso, em 2019, dois pedidos de licença de exploração de pedreira denominadas “G...” e “H...”, sitas nas freguesias de ... e ..., que estavam pendentes em 2019, o que se confirma pelo documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral.
Por outro lado, a Autoridade Tributária e Aduaneira faz referência a uma permuta, mas não foi junto aos autos qualquer documento comprovativo da sua ocorrência, nem é indicada qual a fonte da informação sobre a existência daquela permuta, pelo que não se pode considerar provado que o que é afirmado corresponde à realidade. Na verdade, as informações contidas em relatórios de inspecção, têm a natureza de «informações oficiais» para efeitos do artigo 115.º, n.º 2, do CPPT, ( [2] ), pelo que «só têm força probatória quando devidamente fundamentadas, de acordo com critérios objectivos». Para além disso, mesmo confrontada no presente processo com a alegação da Requerente que tinha em curso, em 2019, processos de licenciamento destes terenos, a Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou qualquer prova de que eles tinham sido alienados, apesar de considerar estranha essa alegação da Requerente (artigos 79.º e 80.º da Resposta).
Assim, tem de considerar-se que como não fundamentada, por falta de indicação da razão de ciência, a conclusão a que chegou a Autoridade Tributária e Aduaneira de que esses terrenos adquiridos em 2015 teriam sido permutados em 2018.
Corroborando a inviabilidade de formular uma conclusão segura sobre se a permuta, a ter ocorrido, teve por objecto aqueles terrenos adquiridos em 2015, a Autoridade Tributária e Aduaneira vem dizer no artigo 76.º da sua Resposta, que «a verdade é que em 2018, logo no ano seguinte à aquisição, procedeu à alienação de alguns desses imóveis (no valor de 275.993,35 €); pelo que, nem sequer os chegou a afetar à exploração e nem os manteve “afetos” pelo período mínimo de detenção exigido por lei» (negrito nosso).
Isto é, segundo esta afirmação, que a Autoridade Tributária e Aduaneira na sua Resposta diz que é a verdade, os terrenos permutados teriam sido adquiridos em 2017, o ano anterior à alienação, e é por isso que defende, no artigo 77.º da Resposta, que «tais prédios serão desde logo excluídos por falta de permanência na titularidade da requerente pelo período de mínimo de permanência exigido no artigo 22º do CFI, aos bens objeto de investimento».
No artigo 15.º das suas alegações, a Autoridade Tributária e Aduaneira volta a afirmar que os terrenos foram alienados em 2018, «logo no ano seguinte à aquisição».
Neste contexto, perante indícios de que os terrenos adquiridos em 2015 sitos na freguesia de ... se mantinham na titularidade da Requerente em 2019 (prova testemunhal e documento n.º 9) e a falta de fundamentação probatória e afirmações contraditórias da Autoridade Tributária e Aduaneira sobre a data da aquisição dos terrenos que diz terem sido alienados, não se considera provada a alegada alienação.
3. Matéria de direito
A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma inspecção à Requerente de que resultara várias correcções em sede de IRC e IVA.
Das correcções efectuadas, a Requerente apenas impugna no presente processo as relativas à aplicação do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), previsto no artigo 22.º e seguintes do Código Fiscal do Investimento (CFI).
Na declaração modelo 22 relativa ao exercício de 2017 apresentada inicialmente, a Requerente não indicou qualquer valor no campo 714 do anexo D da declaração modelo 22, tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuado correcções relativas à aplicação do RFAI a investimentos efectuados em 2015 e 2016, cujo saldo transitou para o exercício de 2017.
Depois de notificada do projecto de Relatório da Inspecção Tributária, a Requerente apresentou uma declaração modelo 22 de substituição em que, além de aceitar uma correcção projetada pela Autoridade Tributária e Aduaneira relativa a tributações autónomas (ponto 3.1.1.4 do Relatório da Inspecção Tributária), indicou no campo 714 do anexo D o valor de € 380.877,38, com repercussão no saldo do RFAI a transitar para os exercícios seguintes.
A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu no Relatório da Inspecção Tributária que «não será de aceitar a referida inscrição de dotação de RFAI 2017, sendo resposto assim o que havia sido declarado pelo SP na declaração anteriormente entregue em 2018, ou seja, nenhum valor de dotação de RFAI de 2017», por a declaração modelo 22 de substituição ser intempestiva. Para além disso, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que não se demonstraram os requisitos para aplicação do RFAI aos investimentos que suportam aquele valor de € 380.877,38.
Dependendo a apreciação da aplicação do RFAI aos investimentos inscritos na declaração modelo 22 de substituição da tempestividade da sua apresentação, justifica-se que se aborde, antes de mais, esta questão, pois, no caso de se concluir que a apresentação foi intempestiva, será inútil apreciar se se demonstram os requisitos substantivos da aplicação do RFAI, relativamente aos investimentos de 2017.
3.1. Questão da tempestividade da apresentação da declaração modelo 22 de substituição
A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que não podia ser aceite a declaração de substituição, na parte em que foi aditado um valor de investimentos efectuados em 2017, pelo seguinte, em suma:
A declaração de substituição entregue apenas é liquidada pela existência de correção de tributação autónoma do montante de 1.325,20€, nos termos do nº 1 do artº 122º do CIRC. Já a invocação de um novo direito, no caso a crédito de imposto de 380.877.38€, não tem enquadramento no nº 1 do art. 122º do CIRC, e não pode servir de pretexto para o alargamento dos prazos de reclamação legalmente estabelecidos, que no caso se encontram excedidos.
Em caso de erro na autoliquidação a favor do SP, excedido o prazo do n.º 2 do artº 122º do CIRC, poderia ainda efetuar reclamação graciosa prévia no prazo de 2 anos da entrega da declaração (art.º 131º do CPPT). Assim, tendo a anterior declaração de rendimentos sido entregue em 11/06/2018 e a nova declaração de substituição entregue em 03/09/2021, ou seja, mais de 3 anos após a primeira, o prazo para aceitação deste novo crédito/benefício fiscal invocado encontra-se ultrapassado, ainda que se considerasse a convolação desta última declaração em reclamação graciosa.
Resulta da interpretação da subalínea II) da alínea b) do n º 3 e n.º 6 do art º 59º do CPPT, em caso de erro de facto ou de direito nas declarações dos contribuintes, o sujeito passivo pode apresentar a declaração de substituição, para a correção de erros ou omissões a si imputáveis de que resulte imposto de montante inferior ao liquidado com base na declaração apresentada, até ao termo do prazo legal de reclamação graciosa ou impugnação judicial das quais não podem resultar a ampliação dos prazos de reclamação graciosa, impugnação judicial ou revisão do ato do tributário, que seriam aplicáveis caso não tivessem sida apresentadas.
Repare-se que se a intenção do SP fosse solicitar revisão oficiosa do ato, o que nunca invocou, tal situação tem procedimento autónomo próprio, que não o procedimento de inspeção tributária e seria nesse procedimento de revisão que iria comprovar o seu enquadramento conforme previsto no art.º 78.º da LGT (sendo certo que o prazo de 3 anos constante do n.º 4 também já se encontra excedido e a não invocação antecipada do benefício resulta do seu próprio comportamento e não de erro imputável ao serviço).
A Requerente defende o seguinte, em suma:
– não actuou ao abrigo do disposto no artigo 131.º do CPPT, mas sim ao abrigo do disposto no artigo 59.º, do CPPT e do artigo 122.º n.º 1 do Código do IRC;
– o parágrafo III da alínea b) do n.º 3 do artigo 59.º do CPPT é claro no sentido de ser admitida a substituição da declaração apresentada sempre que da mesma resulte imposto a favor do Estado;
– foi precisamente o que sucedeu no caso em apreço, pois da declaração de substituição apresentada resultou o pagamento de imposto.
– tanto assim é, ou seja, a declaração (de substituição) foi devidamente apresentada, que a mesma foi processada e liquidada pela Autoridade Tributária.
O artigo 122.º, n.º 1, do CIRC estabelece que «quando tenha sido liquidado imposto inferior ao devido ou declarado prejuízo fiscal superior ao efetivo, pode ser apresentada declaração de substituição, ainda que fora do prazo legalmente estabelecido, e efetuado o pagamento do imposto em falta».
O n.º 3 do artigo 59.º do CPPT estabelece o seguinte:
3 – Em caso de erro de facto ou de direito nas declarações dos contribuintes, estas podem ser substituídas:
a) Seja qual for a situação da declaração a substituir, se ainda decorrer o prazo legal da respectiva entrega;
b) Sem prejuízo da responsabilidade contra-ordenacional que ao caso couber, quando desta declaração resultar imposto superior ou reembolso inferior ao anteriormente apurado, nos seguintes prazos:
I) Nos 30 dias seguintes ao termo do prazo legal, seja qual for a situação da declaração a substituir;
II) Até ao termo do prazo legal de reclamação graciosa ou impugnação judicial do acto de liquidação, para a correcção de erros ou omissões imputáveis aos sujeitos passivos de que resulte imposto de montante inferior ao liquidado com base na declaração apresentada;
III) Até 60 dias antes do termo do prazo de caducidade, para a correcção de erros imputáveis aos sujeitos passivos de que resulte imposto superior ao anteriormente liquidado.
O estabelecimento destes prazos, com as inerentes limitações à reposição da legalidade, tem subjacente evidentes razões de segurança jurídica, sendo o resultado da ponderação legislativa do valor dos interesses conflituantes do contribuinte e do interesse público.
«Com efeito, como sucede, em regra, com a generalidade dos direitos, o decurso do tempo pode provocar a sua extinção, e, nomeadamente no caso da cobrança dos tributos, o interesse público reclama que, em regra, haja uma rápida definição dos direitos dos entes públicos, para poderem eficazmente programar as suas actividades e aplicarem as quantias cobradas à satisfação os interesses públicos que visam prosseguir.
A fixação de qualquer prazo para impugnação de decisões administrativas constitui a determinação de um ponto de equilíbrio entre dois interesses conflituantes, que são o do interessado em ver anulado o acto que considera ilegal e o da administração tributária em ver assegurada a estabilidade das situações jurídicas tributárias. O peso deste último interesse acentua-se com o decurso do tempo e a fixação do prazo legal deve corresponder ao ponto de equilíbrio entre estes dois interesses, permitindo aos interessados o direito de impugnação contenciosa enquanto não houver razões de segurança jurídica que se lhe sobreponham». ( [3] )
Nos casos de autoliquidação, que foi o que a Requerente fez com a declaração de substituição, o ponto de equilíbrio entre esses dois interesses foi encontrado legislativamente no prazo de dois anos a contar da apresentação da declaração, previsto no n.º 1 do artigo 131.º do CPPT, sendo também esta ponderação legislativa que está subjacente ao parágrafo II do n.º 3 do artigo 59.º do CPPT, em que se prevê a aplicação desse mesmo prazo de impugnação necessária, para a correcção de erros ou omissões imputáveis aos sujeitos passivos que os tenham prejudicado.
A consequência jurídica que, em regra, está associada à falta de prática de actos no prazo legal é a extinção do direito de os praticar, que se baseia na velha máxima "Dormientibus non sucurrit jus" que explica a preclusão de direitos por falta de exercício tempestivo imputável ao seu titular, em benefício da segurança jurídica imprescindível ao funcionamento geral da sociedade. ( [4] )
A esta luz, o prazo previsto no parágrafo III deste n.º 3 do artigo 59.º do CPPT, permitindo a substituição de declarações até 60 dias antes do termo do prazo de caducidade, para a correcção de erros imputáveis aos sujeitos passivos de que resulte imposto superior ao anteriormente liquidado, mesmo depois de estar esgotado o prazo de impugnação administrativa e contenciosa, é um prazo excepcional que se justifica porque, sendo as correcções favoráveis ao Estado, não vale com a mesma intensidade o referido interesse estadual na estabilidade da situação jurídica tributária gerada com a declaração substituída, pois, por um lado, não é afectado o referido interesse público de as entidades públicas «poderem eficazmente programar as suas actividades e aplicarem as quantias cobradas à satisfação os interesses públicos que visam prosseguir» e, por outro lado, sendo o contribuinte quem apresenta a declaração de substituição que provoca a alteração dos termos da relação jurídica tributária, não se coloca a necessidade da sua protecção contra a instabilidade que a ele mesmo é imputável.
Por isso, interpretado aquele prazo alargado previsto no parágrafo II do n.º 3 do artigo 59.º do CPPT à luz da sua razão de ser, a possibilidade de alteração dos elementos da relação jurídica tributária que resulta da declaração substituída tem de ser limitada aos erros dessa declaração de que resultou imposto inferior ao que deveria ser liquidado, sendo a substituição admitida apenas tendo em vista liquidar o imposto superior devido conexionado com esses erros, pois «Cessante ratione legis cessat eius dispositio (lá onde termina a razão de ser da lei termina o seu alcance)». ( [5] )
Essa mesma relação entre a correcção do erro da declaração inicial e a liquidação e pagamento dos impostos em falta é patente no n.º 1 do artigo 122.º do CIRC.
Assim, fora destas situações excepcionais em que se justifica a aplicação de um prazo alargado, o decurso do prazo normal de impugnação administrativa de autoliquidação (que é necessária, por força do n.º 1 do artigo 131.º do CPPT), preclude o direito de o contribuinte alterar os pressupostos em que ela assentou.
O n.º 6 do mesmo artigo 59.º, que estabelece que «da apresentação das declarações de substituição não pode resultar a ampliação dos prazos de reclamação graciosa, impugnação judicial ou revisão do acto tributário, que seriam aplicáveis caso não tivessem sido apresentadas», confirma a preclusão do direito de impugnar a nova autoliquidação com fundamento em alegados erros que já afectavam a autoliquidação substituída depois de esgotado o prazo em que esta podia ser objecto de impugnação. Isto é, como bem diz a Autoridade Tributária e Aduaneira no Relatório da Inspecção Tributária, «a entrega das declarações de substituição não pode servir de pretexto para o alargamento dos prazos de reclamação legalmente estabelecidos».
Pelo exposto, tem de se concluir que a Autoridade Tributária e Aduaneira tem razão ao entender que, por ter sido excedido o prazo da reclamação graciosa da autoliquidação inicial, a dotação do benefício fiscal RFAI do ano de 2017, no montante de 380.877.38 €, não poderá ser aceite.
Refira-se, finalmente, que estando precludido o direito de a Requerente indicar valor dos investimentos realizados em 2017 que entendia ser relevante para o RFAI, não se divisa uma violação do princípio do inquisitório, por a Autoridade Tributária e Aduaneira não ter detectado no dossier fiscal da Requerente que existiam esses alegados investimentos que poderiam beneficiar do RFAI.
Na verdade, o princípio do inquisitório, enunciado no artigo 58.º da LGT, apenas impõe à Autoridade Tributária e Aduaneira «realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material», e, relativamente a eventuais direitos do sujeito passivo que estavam extintos não havia, naturalmente, necessidade de realizar quaisquer diligências.
Pelo exposto, improcede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta questão.
3.1.1. Questões de conhecimento prejudicado relativas ao RFAI de 2017
Estando extinto o direito de a Requerente invocar investimentos efectuados no período de 2017, tem de se concluir que as correcções relativas a estes investimentos e a liquidação impugnada não podem enfermar de vício de violação de lei por não lhes ter sido dada relevância.
Assim, fica prejudicado, por ser inútil, o conhecimento das questões atinentes à potencial relevância desses investimentos, suscitadas pela Requerente, [artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do CPC, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT].
3.2. Questão dos investimentos feitos em 2015 relativos à viatura Pesada de matrícula ... (trator de mercadorias) e um Semi-Reboque de matrícula ...
A Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou a relevância desta viatura e semi-reboque por entender em suma, o seguinte:
– o investimento tem de se «considerar como para utilização predominante nessa actividade» de transportes de mercadorias por conta de outrem;
– «considerando o retendo, e que a atividade de transportes encontra-se expressamente excluída do âmbito do RFAI (ver nº 1 da artº 22 conjugado com o n.º 2 e 3 do artº 2º, ambos do CFI, e com o art 1º da Portaria 282/2014 de 30 de dezembro), os investimentos indicados, associados com essa área de atividade desenvolvida pelo SP não podem ser considerados como elegíveis e enquadráveis para efeitos do RFAI, pelo que os investimentos em causa, no valor total de 121.087,02 € (87.000.00€ + 34.087,02€), devem ser excluídos dos montantes enquadráveis para efeitos de RFAI.
Como resulta da decisão sobre a matéria de facto, considerou-se não provado que o investimento na viatura e semi-reboque referidos tenham sido efectuados para utilização predominante na actividade de transportes por conta de outrem ou que esta tenha sido a sua utilização predominante.
Sendo a Autoridade Tributária e Aduaneira quem invoca tal utilização predominante como pressuposto da correcção que efectuou, é sobre ela que recai o respectivo ónus da prova, como resulta do n.º 1 do artigo 74.º da LGT.
A falta de prova dos factos que administração tributária invoca, quando sobre ela recai o ónus da prova, equivale processualmente à situação de esses factos não terem ocorrido. É com este alcance que alguma jurisprudência fala em falta de «fundamentação substantiva» ou «fundamentação substancial» que se reconduz a falta de demonstração dos pressupostos substantivos da actuação correctiva da administração tributária. ( [6] )
Por isso, esta correcção enferma de vício de erro sobre os pressupostos de facto, que constitui vício de violação de lei, e justifica a anulação da liquidação, na parte em que tem como pressuposto esta correcção.
3.3. Questão dos investimentos em terrenos nos anos de 2015 e 2016
A Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou a relevância para efeitos do RFAI das aquisições de terrenos efectuadas em 2015 e 2016.
A fundamentação destas correcções é a seguinte, em suma:
2015
– «o SP indica que os investimentos efetuados tiveram por fim terrenos de exploração, contudo, a quase totalidade dos imóveis indicados tratam-se de prédios rústicos, adquiridos sem indicação de finalidade de exploração diferente da prevista na classificação dos prédios como rústicos»;
– «o SP também não promoveu na data da aquisição ou posteriormente, a alteração nos termos do artigo 13º do CIMI por eventual afetação a fim diferente do enquadramento de definição de prédios rústicos»;
– «nos termos do artigo 3.º do CIMI, define-se para efeitos tributários o que se entende ser um prédio rústico (designadamente que a sua afetação, ou na falta de concreta afetação tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas a silvícolas), sucedendo quando a afetação dos mesmos se destine a fins diferentes dos aí previstos, por exemplo para fins de exploração como de "pedreiras, saibreiras, argilas e fins análogos", que a classificação de tais prédios seja alterada para a de prédio urbano (artigo 4º do CIMI) na categoria "Outros", prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 6º do CIMI (conforme entendimento já divulgado pela Autoridade Tributária nomeadamente pela Circular n.º 13/2000, de 24 de Maio com as necessárias adaptações quanto as alterações legislativas subsequentes)»;
– «quanto aos prédios rústicos, apesar do SP afirmar que a aquisição dos referidos prédios terá como fim a exploração dos mesmos na âmbito da sua atividade, mas considerando o enquadramento tributário dos mesmos à data, não nos parece assim poderem ser enquadráveis nos termos do artigo 22º do CFI, designadamente na exceção prevista na subalínea i) da alínea a) do nº 2 do referido artigo: "Ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de: i) Terrenos, salvo no caso de se destinarem a exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extrativa (sublinhados nossos)»;
– O SP adquiriu prédios rústicos sem alterar o fim para IMT/IMI e nas escrituras nada se diz a este respeito. Ora, a elegibilidade da aquisição de terrenos para exploração, é uma exceção à regra de exclusão (nº2 alínea a) do artigo 22º do CFI). Assim, na aquisição dos terrenos deveria indicar esse fim, sob pena de infração por omissão em sede de IMT. As escrituras não referindo o fim para que foram adquiridos (exploração) apenas indicando tratar-se de prédios rústicos implica a não avaliação para efeitos de um IMT superior, sendo que, a inscrição na matriz como prédios rústicos, acarreta menos IMI. Não faz sentido, interpretar a intenção do legislador como concedendo benefícios numa aquisição oficialmente omissa por evasão fiscal.
– Acresce dizer ainda, apesar do SP apontar a aquisição dos terrenos rústicos alegadamente destinados a exploração, que em 2018 procedeu inclusive à alienação de alguns desses imóveis (designadamente sito na freguesia de ..., ...), conforme identificados no quadro seguinte, por permuta por imóvel urbano noutra freguesia diferente (imóvel identificado na matriz da freguesia de ...-" ...-U-...")
– Perante o descrito, observa-se nestes casos uma dissonância entre os objetivos indicados pelo SP para os referidos terrenos e o fim que lhes foi dado.
– Em face do exposto, os investimentos em terrenos rústicos, mantidos enquanto tal, não podem assim ser considerados como devidamente enquadrados na exceção da subalínea i) de alínea a) do nº 2 do artº 22º do CFI, sendo de os desconsiderar na totalidade no montante dos investimentos relevantes para efeitos do RFAI.
2016
– O SP indica que os investimentos efetuados tiveram por fim terrenos de exploração, contudo, a quase totalidade dos imóveis indicados tratam-se de prédios rústicos, adquiridos sem indicação de finalidade de exploração diferente da prevista na classificação dos prédios como rústicos, informação esta confirmada pelo SP nos esclarecimentos prestados (ver ponto 3.5 do documento em anexo 10). O SP também não promoveu na data da aquisição ou posteriormente, a alteração nos termos do artigo 13º do CIMI por eventual afetação a fim diferente do enquadramento de definição de prédios rústicos.
– Em relação aos terrenos rústicos (considerado de exploração pelo SP) adquiridos em 2016 dá-se aqui por reproduzido tudo quanto atrás referimos para o ano de 2015 por ser de natureza equivalente.
– Decorrente do descrito, os investimentos nos referidos terrenos não podem ser considerados como devidamente enquadrados, sendo de os desconsiderar na totalidade do montante dos investimentos relevantes para efeitos do RFAI, no total de 113.099,11 €.
A Requerente defende o seguinte, em suma:
– «A aquisição dos referidos terrenos consubstancia um aumento de capacidade da empresa, estando os mesmos inseridos na estratégia de investimentos da empresa, dado que no sector de atividade em que está inserida, torna-se necessário a aquisição de terrenos estratégicos para que a sua capacidade vá aumentando, assim como assegurar a sustentabilidade futura da exploração»;
– «O sujeito passivo desde logo indicou que a aquisição dos prédios rústicos, e esse investimento teria como objetivo o aumento da extração, produção e venda de argilas para cerâmica plana (pavimento e revestimento), sanitário, tableware, e argila expandida (...)»;
– «Os investimentos realizados foram terrenos para extração de argilas nos lugares de ..., ..., ...»;
– «não tem a Requerente qualquer obrigação de requerer a alteração matricial dos prédios em causa»;
– as orientações administrativas «não são vinculativas nem para os particulares nem para os tribunais»;
– «a Requerente é titular de várias licenças de exploração de pedreira de argilas, bem como tem em curso vários pedidos de licenciamento de concessão mineira».
No presente processo, a Autoridade Tributária e Aduaneira mantém a posição assumida no Relatório da Inspecção Tributária, invocando ainda, em suma, que, quanto aos prédios que diz terem sido permutados pela Requerente, não se verificou o período mínimo de manutenção dos investimentos.
3.3.1. Permuta de prédios adquiridos em 2015
No que concerne ao fundamento invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira de a Requerente ter permutado alguns dos imóveis adquiridos em 2015, sitos na freguesia de ..., já se referiu na apreciação da matéria de facto que não se pode dar como provado que essa permuta tenha ocorrido (ponto 2.2.3. deste acórdão).
O ónus da prova da existência dessa permuta recai sobre a Autoridade Tributária e Aduaneira, pois é ela que a invoca (artigo 74.º, n.º 1, da LGT), pelo a situação de non liquet tem de ser processualmente valorada contra a Autoridade Tributária e Aduaneira.
Assim, pelo que se disse no ponto anterior, está-se perante uma situação processualmente equivalente à de essa premissa não ter ocorrido, o que leva a concluir que esta correcção enferma de vício de erro sobre os pressupostos de facto, quanto a esta parte da fundamentação.
Por isso, resta apreciar se estas correcções se podem manter com base nos outros fundamentos invocados, designadamente a Requerente ter adquirido os prédios como rústicos, sem indicação nas escrituras de aquisição de finalidade de exploração diferente da prevista na classificação dos prédios como rústicos e não ter promovido a «alteração nos termos do artigo 13º do CIMI por eventual afetação a fim diferente do enquadramento de definição de prédios rústicos».
De qualquer modo, mesmo que se provasse que esses prédios sitos na freguesia de ... tinham sido permutados, o fundamento só poderia justificar, eventualmente, a irrelevância do investimento feito na sua aquisição para efeitos de RFAI e não a irrelevância da totalidade dos investimentos em prédios feitos em 2015 e 2016.
Por outro lado, quanto ao fundamento invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira no presente processo de a Requerente não ter mantido, quanto aos prédios referidos. o prazo mínimo de manutenção previsto na alínea c) do n.º 4 do artigo 22.º CFI, para além de ser uma alegação que se baseia no pressuposto errado de que se trata de prédios adquiridos em 2017 e permutados «logo no ano seguinte à aquisição», trata-se de fundamentação a posteriori, pois não foi invocada no Relatório da Inspecção Tributária. A fundamentação sucessiva ou a posteriori não é relevante para assegurar a legalidade de actos, quando não é acompanhada de revogação e prática de um novo acto. ( [7] )
Pelo exposto, não pode basear-se nestes fundamentos a não aceitação da relevância dos investimentos para beneficiar do RFAI.
3.3.2. Aquisição dos prédios como rústicos e não alteração da sua natureza para efeitos de IMI
O artigo 22.º do CFI estabelece o seguinte, no que aqui interessa:
2 - Para efeitos do disposto no presente regime, consideram-se aplicações relevantes os investimentos nos seguintes ativos, desde que afetos à exploração da empresa:
a) Ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:
i) Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extrativa;
Os investimentos em terrenos destinados à exploração de barreiros consideram-se aplicações relevantes para o RFAI, desde que afectos à exploração da empresa.
Da prova produzida resulta que os terrenos adquiridos pela Requerente em 2015 e 2016 se destinavam à sua exploração de extracção de argilas [alíneas O) e P) da matéria de facto fixada], pelo que se lhes aplica a designação de «...», cuja definição é «terreno argiloso, de onde se retira barro» ou «lugar onde há ou donde se extrai barro» ( [8] ), pelo que a situação se enquadra no teor literal daquele n.º 2 do artigo 22.º do CFI.
No entanto, a Autoridade Tributária e Aduaneira invoca ainda como fundamento de não aceitação para efeitos do RFAI dos investimentos em terremos adquiridos em 2015 e 2016, no facto de a Requerente os ter adquirido como prédios rústicos e não ter alterado essa classificação para efeitos de IMI, posição que a Autoridade Tributária e Aduaneira sustenta invocando a Circular Circular n.º 13/2000, de 24 de Maio com as necessárias adaptações quanto as alterações legislativas subsequentes.
3.3.2.1. Questão da relevância da Circular n.º 13/2000, de 24 de Maio
Antes de mais, impõe-se esclarecer que, como defende a Requerente, é inadmissível a criação de uma norma sobre os requisitos de um benefício fiscal através de uma circular.
Na verdade, nos termos do artigo 68.º-A, n.º 1, da LGT, vinculam (unicamente) Administração Tributária, surgindo no âmbito do princípio da colaboração recíproca que compreende, designadamente, a publicação de orientações genéricas sobre a interpretação e a aplicação das normas tributárias [art. 59.º, n.º 3, alínea b) da LGT].
Deste modo, a Circular não constitui fonte de direito fiscal, integrando antes o chamado «direito circulatório», composto por orientações genéricas dirigidas aos serviços da administração fiscal relativas à interpretação e aplicação das normas tributárias, mas que não vinculam os Tribunais nem os contribuintes.
À face do princípio da legalidade fiscal, proclamado no artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa, «os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes», pelo que não pode por via de uma orientação administrativa ser modificado o âmbito de aplicação de um benefício fiscal. Esta matéria insere-se na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, por forma d disposto no artigo 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP.
Esta inviabilidade de criar através de um diploma emitido pela Administração os requisitos de concessão de benefícios fiscais não previstos em diploma de natureza legislativa é conformada pelo princípio da hierarquia das fontes normativas, consubstanciado no n.º 5 do artigo 112.º da CRP que estabelece que «nenhuma lei pode criar outras categorias de actos legislativos ou conferir a actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos».
Por isso, a Circular n.º 13/2000, de 24 de Maio não tem relevância para afastar o enquadramento da situação da Requerente no âmbito daquele n.º 2 do artigo 22.º do CFI.
3.3.2.2. Questão do afastamento da aplicação do RFAI a terrenos adquiridos como rústicos e mantidos com essa classificação para efeitos de IMI
A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu, em suma, que
– nos termos do artigo 3.º do CIMI, define-se para efeitos tributários o que se entende ser um prédio rústico (designadamente que a sua afetação, ou na falta de concreta afetação tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas a silvícolas), sucedendo quando a afetação dos mesmos se destine a fins diferentes dos aí previstos, por exemplo para fins de exploração como de "pedreiras, saibreiras, argilas e fins análogos", que a classificação de tais prédios seja alterada para a de prédio urbano (artigo 4º do CIMI) na categoria "Outros", prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 6º do CIMI.
«na aquisição dos terrenos deveria indicar esse fim, sob pena de infração por omissão em sede de IMT. As escrituras não referindo o fim para que foram adquiridos (exploração) apenas indicando tratar-se de prédios rústicos implica a não avaliação para efeitos de um IMT superior, sendo que, a inscrição na matriz como prédios rústicos, acarreta menos IMI. Não faz sentido, interpretar a intenção do legislador como concedendo benefícios numa aquisição oficialmente omissa por evasão fiscal».
É manifesto que, como defende que Requerente, não há qualquer elemento no texto do artigo 22.º do CFI ou da legislação europeia em que se baseia o RFAI [nos anos de 2015 e 2016, o Regulamento (UE) n.º 651/2014, da Comissão, de 16 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado, publicado no Jornal Oficial da União Europeia, n.º L 187, de 26 de junho de 2014, na sua redacção inicial], que preveja limitação do seu âmbito à aquisição de terrenos não classificados como rústicos para efeitos de IMI, nem qualquer exigência de que no acto de aquisição seja indicada a finalidade a os terrenos adquiridos se destinam, nem se refere na lei a obrigatoriedade de alteração matricial dos prédios para a categoria «outros» de prédios urbanos.
Por outro lado, esta questão da classificação de prédios destinados a actividades não agrícolas nem silvícolas, mas de natureza extractiva, tem sido objecto de jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal Administrativo, no sentido de que «a mera não afectação ou não destinação normal de um prédio rústico, situado fora de aglomerado urbano, a uma utilização geradora de rendimentos agrícolas não basta, só por si, para “desclassificar” o prédio como rústico e classificá-lo como urbano, antes se exigindo que, nos casos em que não tenha tal afectação, o prédio não se encontre construído ou disponha apenas de edifícios ou construções de carácter acessório», como pode ver-se pelo acórdão de 30-05-2012, processo n.º 01109/11, em que se refere o seguinte:
4.4. O art. 3º do CIMI (que corresponde ao art. 3º do anterior CCAutárquica) estabelece uma definição positiva de prédio rústico, assumindo a classificação dos restantes prédios (em urbanos e mistos – cfr. arts. 4° a 6° do CIMI) natureza meramente residual: são assim classificados todos os que, de acordo com os critérios constantes do art. 3º, não devam ser classificados como rústicos.
E como apontam Silvério Mateus e Corvelo de Freitas, («Os Impostos sobre o Património Imobiliário, o Imposto do Selo», Anotados e comentados, Engifisco, 2005, anotações aos arts. 4º e 6º do CIMI, pp. 113/114 e 116 a 118, respectivamente) na classificação de um prédio como rústico relevam duas ordens de critérios: a localização e o destino económico, sendo que, no que respeita à localização, a referência relevante se centra na situação do prédio dentro ou fora de aglomerados urbanos e no que respeita ao destino económico o prédio não deve ser classificável como terreno para construção, deve estar afecto ou ter como utilização normal a produção de rendimentos agrícolas [tais como estes são considerados para efeitos de IRS (Note-se que, como refere André Salgado Matos [Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), Anotado, Instituto Superior de Gestão, Coimbra Editora, 1999], embora a al. b) do nº 1 do art. 5º do CIRS considere como rendimentos agrícolas os lucros das actividades agrícolas, silvícolas ou pecuárias, os rendimentos imputáveis, entre outros, a actividades de exploração de «outros produtos espontâneos», esta referência deve ser entendida com alguma cautela, uma vez que estes nunca abrangerão as explorações mineiras e outras indústrias extractivas, referidas pela al. b) do nº 1 do art. 4° do mesmo CIRS.) ou, não tendo afectação agrícola, não se encontre construído ou disponha apenas de edifícios ou construções meramente acessórias sem autonomia económica e de reduzido valor.
Como se disse, a classificação de um prédio como urbano assume natureza residual (art. 4º do CIMI): classificar-se-ão como urbanos todos os prédios que não integrem os conceitos de rústico ou misto, constantes dos arts. 3° e 5°, respectivamente (a delimitação da categoria de prédios urbanos é, pois, feita por via negativa).
E nos prédios classificados como urbanos compreendem-se diversas espécies, de acordo com o destino económico que lhes é atribuído: habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços, terrenos para construção, «outros» (cfr. as diversas alíneas do nº 1 do art. 6º do CIMI, tendo sido nesta espécie «outros» que a AT classificou, ao abrigo da al. d) do nº 1 deste artigo, os prédios aqui questionados).
Volvendo, pois, ao caso dos autos, verificamos que se trata, desde logo, de prédios situados fora de um aglomerado urbano (o que é aceite por ambas as partes) e que nem estão afectos nem têm como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas, tais como estes rendimentos são considerados para efeitos de IRS (al. a) do nº 1 do art. 3º do CIMI).
E se, em princípio, a não afectação a uma utilização geradora de rendimentos agrícolas poderia levar à desclassificação dos ditos prédios como rústicos, tal desclassificação é impedida pelo disposto na al. b) do mesmo nº 1, que dispõe que os terrenos situados fora de aglomerado urbano também são classificados como prédios rústicos desde que, não tendo a afectação indicada na alínea anterior (isto é, desde que não tendo afectação a actividade geradora de rendimentos agrícolas), não se encontrem construídos ou disponham apenas de edifícios ou construções de carácter acessório, sem autonomia económica e de reduzido valor.
(...)
a mera não afectação ou não destinação normal a uma utilização geradora de rendimentos agrícolas não basta para «desclassificar» o prédio como rústico e classificá-lo como urbano, antes se exigindo que, nos casos em que não tenha tal afectação, o prédio não se encontre construído ou disponha apenas de edifícios ou construções de carácter acessório, é, então, de concluir que, estando os prédios dos autos classificados como prédios rústicos e não se verificando as circunstâncias referidas na al. b) do nº 1 do art. 3º do CIMI, não poderá tal classificação ser alterada (para prédios urbanos) em função do disposto no art. 4º e 6º do mesmo código (o nº 4 limita-se a estabelecer que prédios urbanos são todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos e o art. 6º limita-se a distribuir os prédios urbanos por várias espécies ou categorias).
Por isso, a mera afectação de prédios rústicos à exploração de pedreiras, saibreiras, argilas e fins análogos, não pode determinar, desde logo, a sua classificação como prédios urbanos, na mencionada categoria de «outros» prevista na al. d) do nº l do art. 6° do CIMI, como parece decorrer da Circular da DGCI nº 13/2000, de 24/5/2000, invocada pela AT. Com efeito, não obstante essa afectação, a al. b) do nº 1 do art. 3º do CIMI classifica o prédio como rústico se o mesmo, estando situado fora de aglomerado urbano, não se encontrar construído ou dispuser apenas de edifícios ou construções de carácter acessório e sem autonomia económica e de reduzido valor.
(...)
.5. É certo, também, que a recorrente Fazenda Pública alega (...) que, do disposto no art. 3º do CIMI, o que resulta é que, para serem rústicos, os prédios ou têm uma utilização concreta geradora de rendimentos agrícolas, ou não geram qualquer outro rendimento: isto é, ou têm aptidão para gerar rendimentos agrícolas, ou não têm ou não podem ter uma utilização geradora de quaisquer outros rendimentos. Tanto que o nº 2 do mesmo art. 3º refere que, estando situados dentro de aglomerado urbano, os prédios só são considerados rústicos se por força de disposição legalmente aprovada não puderem ter utilização geradora de quaisquer rendimentos.
No entanto, além de esta referência ao nº 2 do art. 3º colidir, desde logo, com o facto de, no caso dos autos, estarmos perante terrenos situados fora de aglomerado urbano, aquela alegação também colide, no mais, com o facto de, apesar de a al. a) do nº 1 do citado artigo impor a afectação ou o destino normal a uma utilização geradora de rendimentos agrícolas, logo a al. b) estabelecer que, nos casos em que assim não suceda, a classificação de rústico só se altera se o prédio estiver construído. Ou seja, ao contrário do que sucedia no âmbito da Contribuição Predial, em que se considerava prédio urbano o que estava afecto a quaisquer outros fins (que não a agricultura), ou não pudesse destinar-se à agricultura (cfr. o § 2º do art. 5º do respectivo Código), não parece que decorra da actual lei que se tais prédios estiverem afectos a qualquer outra actividade económica que não a agrícola, devam, sem mais e apenas em face de tal afectação, ser classificados como urbanos, nem que o conceito de prédio rústico seja restritivo em termos de apenas se incluírem nesta designação os prédios que realmente só tenham rendimentos agrícolas, os que não tendo esses rendimentos tenham aptidão para os produzir ou então que não tenham qualquer rendimento de outra actividade económica (...)
A ser assim, ficaria destituída de sentido a norma da citada al. b), acrescendo que, como aponta a recorrida, face à classificação abrangente do termo «outros» constante da al. d) do nº 1 do art. 6º do CIMI, tem que entender-se o nº 4 desse mesmo art. 6º como uma delimitação necessária daquela classificação, duplamente residual, sob pena de se admitir uma interpretação tão ampla que seria violadora do princípio da legalidade do imposto.
Esta jurisprudência foi reafirmada pelo Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 27-06-2012, processo n.º 01004/11, e no acórdão de 27-11-2013, processo n.º 0317/12.
No caso em apreço, nos terrenos adquiridos pela Requerente em 2015 e 2016 cujos investimentos foram por esta declarados para efeitos de RFAI não existe qualquer construção [alínea GG) da matéria de facto fixada].
Consequentemente, à face desta jurisprudência, os terrenos estavam adequadamente classificados como prédios rústicos, não havendo necessidade de declarar como destino a actividades extractivas no acto de aquisição com a finalidade a sua classificação ser alterada para a categoria «outros», nem a Requerente tinha obrigação de requerer a alteração da sua classificação para esta categoria dos prédios urbanos.
Assim, na linha desta jurisprudência, que se adopta, conclui-se que este fundamento invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira para afastar a aplicação do RFAI não tem suporte legal, pelo que esta correcção relativa à não aceitação dos investimentos efectuados pela Requerente na aquisição dos prédios como rústicos em 2015 e 2016 enferma de vício de violação de lei, por erro de interpretação do artigo 22.º, n.º 2, alínea a) subalínea i) do CFI e dos artigos 3.º, 4. e 6.ºdo CIMI.
Este vício justifica a anulação da liquidação impugnada, na parte correspondente a esta correcção, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT
4. Decisão
Nestes termos acordam neste Tribunal Arbitral em:
-
Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto às correcções relativas ao RFAI de 2017 (pontos 3.1. e 3.1.1. deste acórdão);
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Julgar o pedido de pronúncia arbitral procedente quanto às correcções relativas aos investimentos que beneficiaram do RFAI efetuados em 2015 e 2016, referidas nos pontos 3.2., 3.3., 3.3.1., 3.3.2., 3.3.2.1. e 3.3.2.2.;
-
Anular parcialmente a liquidação de IRC n.º 2021..., relativa ao ano fiscal de 2017, bem como a correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2021..., na parte em que tem como pressupostos as correcções referidas nos pontos 3.2., 3.3., 3.3.1., 3.3.2., 3.3.2.1. e 3.3.2.2.
6. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 584.828,19, valor indicado pela Requerente, sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 26-09-2022
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(relator)
(Jorge Carita)
(Jónatas Machado)
[1] Estes são os valores que constam do Relatório da Inspecção Tributária.
No entanto, há lapso, pois a diferença entre 309. 092,27 € e 145.829,81€ é de 163.262,46 €, como consta do quadro acima.
[2] Neste sentido, pode ver-se o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 13-10-2016, processo n.º 388/11.8BEAVR.
[3] Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 15-04-2009, proferido no processo n.º 065/09, em que se acrescenta, em nota de rodapé, que «relativamente aos actos nulos, pela sua raridade, não se levantam preocupações legislativas em limitar a sua impugnabilidade, por serem também raros e, por isso, quantitativamente limitados e suportáveis os efeitos nocivos que podem advir de uma impugnação tardia».
[4] Sem prejuízo de outra situação excepcional, prevista nos n.ºs 4 e 5 do artigo 78.º da LGT, em que se admite a revisão da fixação da matéria tributável desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte.
[5] BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, página 186.
[6] Neste sentido, podem ver-se o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 20-12-2011, processo 00171/06.2BEBRG, e o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 28-09-2017, processo n.º 578/13.9BEALM.
( [7] ) Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: de 11-2-93, do Pleno, processo n.º 26389, publicado em Apêndice ao Diário da República de 16-10-95, página 103; de 4-11-93, processo n.º 31798, publicado em Apêndice ao Diário da República de 15-10-96, página 6007; e de 3-2-94, processo n.º 32325, publicado em Apêndice ao Diário da República de 20-12-96, página 791.
No mesmo sentido, podem ver-se os acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 24-11-1999, processo n.º 23720; e 19-12-2007, recurso n.º 874/07.