Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 674/2021-T
Data da decisão: 2022-08-16  IMI Outros 
Valor do pedido: € 5.044,15
Tema: AIMI – Competência do Tribunal Arbitral – Indeferimento tácito - Impugnação do valor patrimonial tributário - Revisão do acto tributário - Injustiça grave ou notória.
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SUMÁRIO:

I - O controle jurisdicional do indeferimento tácito dos pedidos de revisão oficiosa é feito apenas com base na apreciação da sua legalidade e não em juízo de equidade, pelo que se situa no âmbito dos poderes atribuídos aos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD pelo artigo 2.º do RJAT;

II - Os actos de avaliação de valores patrimoniais previstos no CIMI são actos destacáveis, para efeitos de impugnação contenciosa, sendo objecto de impugnação autónoma, não podendo na impugnação dos actos de liquidação que com base neles sejam efectuadas discutir-se a legalidade daqueles actos;

III – O sujeito passivo de IMI ou de AIMI pode impugnar as liquidações de IMI e AIMI, mas não são relevantes como fundamentos de anulação eventuais ilegalidades dos antecedentes actos de fixação de valores patrimoniais, que se firmaram na ordem jurídica, por falta de tempestivo esgotamento dos meios graciosos previstos nos procedimentos de avaliações e de subsequente impugnação autónoma a deduzir no prazo de três meses, nos termos dos n.ºs 1 e 7 do artigo 134.º do CPPT;

IV - Diferente da questão da impugnabilidade dos actos de liquidação de AIMI com fundamento em ilegalidade, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º da LGT, é a da possibilidade da revisão da matéria tributável com fundamento em injustiça grave ou notória, prevista no n.º 3 do artigo 78.º da LGT, e que é um afloramento do dever de revogação de actos ilegais, que emerge do princípio a legalidade da actuação da Administração Tributária (artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 55.º da LGT); 

 

V – O facto de no n.º 4 do artigo 78.º da LGT se referir que «o dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente» a «revisão da matéria tributável», trata-se de um poder-dever, estritamente vinculado, cujo cumprimento é sujeito a controle jurisdicional; 

 

VI – Nas situações em que o erro está na fixação da matéria tributável e não propriamente nos subsequentes actos de liquidação, a revisão não depende da existência de erro imputável aos serviços ou de ilegalidade desses actos, mas apenas que se esteja perante «injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte».

 

 

DECISÃO ARBITRAL 

 

O árbitro Pedro Miguel Bastos Rosado, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral Singular, decide o seguinte:   

 

I.              Relatório

 

1. A... – FUNDO ESPECIAL DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO, com o número de identificação fiscal ..., representado pela sua sociedade gestora B...–, S.A., com o número de identificação fiscal..., doravante designado por Requerente, apresentou, em 17 de outubro de 2021, pedido de pronúncia arbitral, tendo em vista, na sequência da formação da presunção de indeferimento tácito do Pedido de Revisão Oficiosa apresentado em 15 de Junho de 2021, à anulação parcial dos actos tributários do Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (”AIMI”) n.ºs 2017...,  2018..., 2019... e 2020..., com referência, respectivamente, aos anos de 2017, 2018, 2019 e 2020, no montante global de € 5.044,15.

 

2. A Requerente pede ainda que a Autoridade Tributária e Aduaneira seja condenada a reembolsar o Requerente no valor do AIMI pago em excesso, no montante global de €  5.044,15, relativamente às liquidações sub judice, e, bem assim, condenada ao pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal, até ao reembolso integral do montante referido.

 

3. A título subsidiário, o Requerente pede que seja desaplicada, no caso concreto, a norma pretensamente extraída do artigo 45.º do Código do IMI.

 

4. É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, doravante designada por Requerida ou por AT.

 

5. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), em 18 de outubro de 2021, e posteriormente notificado à AT.

 

6. O Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou a Senhora Dra. Ana Paula Marques Rocha como árbitro do tribunal arbitral singular, a qual comunicou a aceitação da designação dentro do prazo legal.

 

7. As partes foram notificadas da designação do árbitro, não tendo arguido qualquer impedimento.

 

8. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral singular foi constituído em 27 de dezembro de 2021.

 

9. Notificada nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 17º do RJAT, a Requerida apresentou resposta em que defendeu a improcedência do pedido de pronúncia arbitral e suscitou excepções, tendo, ainda, requerido a não junção do processo administrativo aos autos.

10. Na sequência da Resposta apresentada pela Requerida, o Requerente foi notificado para, querendo, exercer contraditório relativamente à matéria de excepção e para se pronunciar sobre a suficiência da prova documental já junta ao Processo, atenta a posição da Requerida nesse sentido e o consequente pedido de não junção do Processo Administrativo aos autos.

11. O Requerente apresentou resposta às excepções e pronunciou-se sobre o pedido da Requerida.

 

12. Em 15 de fevereiro de 2022, o Tribunal convidou a Requerida a corrigir a sua Resposta no que respeita especificamente à identificação do Requerente A... e deferiu a pretensão formulada pela Requerida tendo em vista a dispensa da junção de todo o processo administrativo aos autos, com exceção da caderneta predial urbana atualizada ou de outro documento que comprove o novo valor patrimonial tributário do terreno para construção.

 

13. A Requerida corrigiu a sua Resposta e juntou aos autos documentos matriciais atualizados relativos ao terreno para construção em discussão no processo. 

 

14. A Exma. Dra. Ana Paula Marques Rocha, árbitro do tribunal arbitral singular constituído neste processo, veio renunciar às funções arbitrais invocando para tanto razões que foram consideradas como justificativas pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD.

 

15. Em 4 de março de 2022, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD determinou a substituição, como árbitro no presente processo, da Exma. Dra. Ana Paula Marques Rocha pelo aqui signatário.

 

16. As partes foram notificadas da designação do novo árbitro, não tendo arguido qualquer impedimento.

 

17. Por despacho de 27 de junho de 2022, foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, foi determinado que a matéria de excepção seria decidida aquando da prolação da decisão arbitral, bem como foi decidido a dispensa de alegações.

            18. No mesmo despacho de 27 de junho de 2022, dada a situação da substituição do árbitro e o tempo decorrido, bem como a complexidade de algumas das questões a decidir, o Tribunal decidiu a prorrogação do prazo para a prolação da decisão arbitral por um período de dois meses, pelo que a decisão arbitral seria emitida e notificada às partes até 1 de agosto de 2022, devendo o Requerente, até 15 de julho de 2022, proceder ao depósito da taxa arbitral subsequente, nos termos do n.º 3 do artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, e comunicar o pagamento ao CAAD.

            19. Por despacho de 1 de agosto de 2022, o Tribunal veio informar as partes que, por motivos de doença, a decisão arbitral seria emitida até 16 de agosto de 2022.

 

II. Saneamento

 

1. O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos arts. 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

 

2. As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

 

3. O processo não enferma de nulidades.

 

III. Matéria de facto 

 

1. Factos provados 

 

Dão-se como provados os seguintes factos com potencial relevo para a decisão:

 

A) O Requerente é proprietário de diversos prédios, incluindo um terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana sob o artº ...º da União das Freguesias de ... e ..., concelho de Loures, e identificado na caderneta predial a que corresponde o documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, e nos documentos juntos pela AT no seu requerimento de 17 de fevereiro de 2022, cujos teores se dão como reproduzidos;

 

            B) O Requerente foi notificado dos seguintes actos tributários de liquidação de Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (AIMI): 

 

i. Liquidação com o n º 2017..., de 30 de junho de 2017, referente ao ano 2017, no montante total de € 4.374,70;

ii. Liquidação com o n º 2018..., de 30 de junho de 2018, referente ao ano 2018, no montante total de € 4.375,18;

iii. Liquidação com o n º 2019..., de 30 de junho de 2019, referente ao ano 2019, no montante total de € 4.375,18.

iv. Liquidação com o n.º 2020..., de 30 de junho de 2020, referente ao ano 2020, no montante total de € 4.439,83 (Documentos n.º 2 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

 

C) Em parte, as liquidações de AIMI sub judice tiveram por base, para efeitos de determinação do valor tributável e do correspondente montante de AIMI a pagar pelo Requerente, os valores patrimoniais tributários do terreno para construção identificado em A), valores estes que estavam fixados segundo a fórmula adoptada à data pela AT, a qual considerava a aplicação de coeficientes de (i) localização, (ii) de afectação e /ou (iii) de qualidade e conforto, conforme demonstrado na caderneta predial urbana anterior à (re)avaliação efectuada em 2020 (documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral e  documentos juntos pela AT no seu requerimento de 17 de fevereiro de 2022, cujos teores se dão como reproduzidos);

 

D)  Em 2020, a AT alterou os valores patrimoniais tributários dos imóveis, deixando de considerar os referidos coeficientes (documentos juntos pela AT no seu requerimento de 17 de fevereiro de 2022, cujos teores se dão como reproduzidos);

 

E) Na sequência das alterações dos valores patrimoniais tributários, a AT não alterou as liquidações de AIMI referidas (tabelas que constam do artº 29º do pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dão como reproduzidas, que não são questionadas pela AT);

 

F) O Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa das liquidações referidas, em 15 de junho de 2021 (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

G) O Requerente pagou as quantias liquidadas;

 

H) Relativamente aos actos de liquidação de AIMI, foram liquidados os seguintes valores de AIMI superiores aos que seriam liquidados se os valores patrimoniais tributários do terreno para construção fossem determinados sem aplicação dos coeficientes previstos no artigo 45.º do CIMI:

a)            Com referência ao acto tributário de liquidação de AIMI relativo ao ano 2017, foi liquidado imposto superior no montante total de € 1.244,87;

b)            Com referência ao acto tributário de liquidação de AIMI relativo ao ano 2018, foi liquidado imposto superior no montante total de € 1.244,87;

c)            Com referência ao acto tributário de liquidação de AIMI relativo ao ano 2019, foi liquidado imposto superior no montante total de € 1.244,87;

d)            Com referência ao acto tributário de liquidação de AIMI relativo ao ano 2020, foi liquidado imposto superior no montante total de € 1.309,54;

(valores indicados pelo Requerente nas tabelas juntas no artigo 29º do pedido de pronúncia arbitral, que não são questionados pela AT);

 

I) O pedido de revisão oficiosa não foi decidido até 17 de outubro de 2021, data em que o Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

2. Fundamentação da matéria de facto dada como provada

 

Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pelo Requerente com o pedido de pronúncia arbitral e nos documentos juntos pela Requerida no seu requerimento de 17 de fevereiro de 2022, cuja autenticidade não foi colocada em causa e nas posições assumidas pelas partes nos articulados. Não há controvérsia sobre a matéria de facto. 

 

3. Factos não provados 

 

Não existem quaisquer outros factos com relevância para a decisão arbitral que não tenham sido dados como provados.

 

IV. Matéria de direito

 

Na sequência do pedido de revisão oficiosa apresentado pelo Requerente em 15 de junho de 2021, são impugnadas neste processo liquidações de AIMI, com fundamento em erros de atos de avaliação de valores patrimoniais, pedindo o Requerente a sua anulação com fundamento em erro imputável aos serviços, «erro esse que se traduziu até numa injustiça grave e notória concretizada na fixação de um VPT em valor claramente superior ao que resultaria das disposições legais que deveriam ter sido aplicadas» (vide artigo 92.º do pedido de pronúncia arbitral).

 

O pedido de revisão oficiosa não foi decidido até 17 de outubro de 2021, data em que o Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

A AT não questiona que ocorreram os erros na determinação dos valores patrimoniais tributários do terreno para construção invocados pelo Requerente, sendo certo que até refere que já os corrigiu, acolhendo a jurisprudência dos tribunais superiores (vide artigo 7.º da Resposta).

 

Todavia, a AT vem opor-se à pretensão do Requerente pelas seguintes razões, em suma:

 

– defende que o tribunal arbitral é incompetente para apreciar vícios de actos de fixação do valor patrimonial, actos esses que são destacáveis e autonomamente impugnáveis e se encontram consolidados na ordem jurídica;

– defende que os vícios do ato que definiu o valor patrimonial tributário (VPT) não são suscetíveis de ser impugnados no acto de liquidação que seja praticado com base no mesmo;

– defende que os actos de avaliação se consolidaram na ordem jurídica por não ter sido solicitada quer a primeira, quer a segunda avaliações;

– defende que o Requerente pretende que o Tribunal Arbitral profira despachos de deferimento do pedido de revisão oficiosa, o que ofende o princípio da separação dos poderes, da  indisponibilidade e da tipicidade de competências;

– defende que os pedidos de revisão oficiosa foram intempestivos;

– defende que o princípio da impugnação unitária é expressamente afastado neste caso pelo artigo 86.º da Lei Geral Tributária (LGT);

– defende que, por força do artigo 168.º, n.º 1, do Código de Procedimento Administrativo (CPA), a correção da  base de incidência do imposto, isto é, a correção dos actos de avaliação das quais resultou a fixação do VPT, por ter sido efectuada há́ mais de cinco anos, já́ não pode ser objecto de anulação;

– defende que não está em causa a violação do princípio da igualdade, mas sim o da consolidação dos actos fixação de valores patrimoniais;

– defende que o Tribunal Arbitral não pode julgar seguindo a equidade;

– defende que a AT está vinculada ao princípio da legalidade.

 

1. Questão da incompetência do Tribunal Arbitral para apreciar a legalidade de actos de fixação de valores patrimoniais

 

A AT vem suscitar a questão da incompetência do Tribunal Arbitral no pressuposto de que os tribunais arbitrais que funcionam no CAAD não têm competência para apreciar a legalidade de actos de fixação de valores patrimoniais.

 

Todavia, é manifesto que não tem razão.

 

Com efeito, resulta do teor expresso das alíneas a) e b) do artigo 2.º do RJAT que os tribunais arbitrais que funcionam no CAAD são competentes, tanto para apreciar a legalidade de actos de liquidação, como para apreciar a legalidade de actos de fixação de valores patrimoniais.

 

Por isso, sem necessidade de mais considerações, improcede esta excepção.

 

 

2. Questão da competência do Tribunal Arbitral para decidir pedidos de revisão oficiosa, proibição de julgar segundo a equidade e vinculação da AT ao princípio da  legalidade

 

A AT defende que o Tribunal Arbitral não tem competência para decidir pedidos de revisão oficiosa, por força do princípio da separação dos poderes (artigo 3.º da Constituição da República Portuguesa) e dos princípios da indisponibilidade e da tipicidade de competências.

 

Contudo, o que está em causa no presente processo, não é a decisão pelo Tribunal Arbitral dos pedidos de revisão oficiosa, mas sim a apreciação da legalidade da omissão de decisão pela AT quanto ao pedido que lhe foi apresentado.

 

Sendo que a apreciação da legalidade de indeferimentos tácitos de pedidos de revisão oficiosa insere-se, manifestamente, na competência dos Tribunais, como resulta do teor expresso da alínea d) do n.º 2 do artigo 95.º da Lei Geral Tributária (LGT).

 

Além disso, especificamente quanto às competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, para apreciação de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa, a questão da incompetência suscitada pela AT já foi submetida a apreciação do Tribunal Central Administrativo que tem decidido uniformemente em sentido afirmativo.

 

Veja-se, a título de exemplo, os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 27-04-2017, processo n.º 8599/15; de 25-06-2019, processo n.º 44/18.6BCLSB; de 11-07-2019, processo 147/17.4BCLSB; de 13-12-2019, processo n.º 111/18.6BCLSB; e de 11-03-2021, processo n.º 7608/14.5BCLSB.

 

Nesta mesma linha, o Tribunal Constitucional que decidiu «não julgar inconstitucional a norma que considera os pedidos de revisão oficiosa equivalentes às situações em que existiu «recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário», para efeito da interpretação da alínea a) do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, encontrando-se tais situações, por isso, abrangidas pela jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD. (vide Acórdão to Tribunal Constitucional n.º 244/18, de 11-05-2018, processo n.º 636/17)

 

Por sua vez, este controle jurisdicional do indeferimento tácito dos pedidos de revisão oficiosa é feito apenas com base na apreciação da sua legalidade e não em juízo de equidade, pelo que se situa no âmbito dos poderes atribuídos aos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD pelo artigo 2.º do RJAT.

 

E também por isso não é afastada nesta apreciação jurisdicional a vinculação da AT ao princípio da legalidade, imposto pelo artigo 266.º, n. 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP), mas sim antes o controle do seu efetivo cumprimento.

 

Assim, sem necessidade de mais considerações, improcede a excepção invocada pela AT.

 

3. Questão da possibilidade de conhecer vícios de actos de avaliação em impugnação de actos de liquidação que neles se basearam

 

A AT defende também que os actos de fixação de valores patrimoniais são destacáveis e autonomamente impugnáveis e que se encontram consolidados na ordem jurídica por falta de impugnação tempestiva.

 

Ora, são meios processuais diferentes, e com efeitos distintos, a impugnabilidade directa de actos de liquidação, com os efeitos retroactivos próprios da declaração de anulabilidade e direito a juros indemnizatórios, e a possibilidade de revisão oficiosa, com os fundamentos previstos no artigo 78.º da LGT, com efeitos mais limitados, não retroactivos, designadamente a nível de direito a juros indemnizatórios, como resulta do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 43.º da LGT.

 

No caso em análise, não foi apresentada reclamação graciosa ou impugnação judicial dos actos de liquidação de AIMI nos prazos respectivos, os quais se encontram previstos nos artigos 70.º, n.º 1, e 102.º n.º 1, do Código do Procedimento e do Processo Tributário (CPPT), mas foi sim pedida a revisão oficiosa que, nos termos do artigo 78.º da LGT, além de outras situações, pode ser pedida no prazo de quatro anos a contar dos actos de liquidação com fundamento em erro imputável aos serviços, nos termos do n.º 1, ou no prazo de três anos com fundamento em injustiça grave e notória, nos termos dos n.ºs 4 e 5.

 

Sendo que, da revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória, prevista nos n.ºs 4  e 5 do artigo 78.º da LGT, decorre a anulação dos actos de liquidação que se tenham baseado nessa matéria tributável, pois são actos consequentes.

 

Em qualquer situação, a revisão por iniciativa da administração tributária (oficiosa), tanto da liquidação (n.ºs 1 e 3), como da matéria tributável (n.ºs 4 e 5), é admitida também a pedido do contribuinte, como se conclui do teor expresso do n.º 7 do artigo 78.º ao referir que «interrompe o prazo da revisão oficiosa do acto tributário ou da matéria tributável o pedido do contribuinte dirigido ao órgão competente da administração tributária para a sua realização».

 

Esta questão da invocação de vícios de actos de avaliação em procedimento de revisão oficiosa foi apreciada no acórdão proferido em 10-05-2021, no processo arbitral n.º 487/2020-T, cuja jurisprudência, no essencial, aqui se reafirma.

 

De acordo com o preceituado no artigo 15.º do CIMI, a avaliação dos prédios urbanos é directa e, por isso, ela é «susceptível, nos termos da lei, de impugnação contenciosa directa» (artigo 86.º, n.º 1, da LGT).

 

Igualmente nos termos do n.º 2 do referido artigo 86.º da LGT, «a impugnação da avaliação directa depende do esgotamento dos meios administrativos previstos para a sua revisão».

 

Os termos da impugnação da avaliação directa de valores patrimoniais constam do artigo 134.º do CPPT, em que se estabelece que:

 

– «os atos de fixação dos valores patrimoniais podem ser impugnados, no prazo de três meses após a sua notificação ao contribuinte, com fundamento em qualquer ilegalidade» (n.º 1); e

– «a impugnação referida neste artigo não tem efeito suspensivo e só poderá ter lugar depois de esgotados os meios graciosos previstos no procedimento de avaliação» (n.º 7).

 

Como decorre do n.º 1 do artigo 134.º, ao fixar um prazo especial de três meses para impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais, «com fundamento em qualquer ilegalidade», e do n.º 7 do mesmo artigo, ao exigir o esgotamento dos meios graciosos, está afastada a possibilidade de essa impugnação com fundamento em ilegalidade se fazer, por via indirecta, na sequência da notificação de actos de liquidação que a tenham como pressuposto, como são os actos de IMI, sem observância do prazo de impugnação referido e sem esgotamento dos meios de revisão previstos no procedimento de avaliação.

 

No âmbito do IMI e do AIMI, quando o sujeito passivo não concordar com o resultado da avaliação directa de prédios urbanos, pode requerer ou promover uma segunda avaliação, no prazo de 30 dias contados da data em que o primeiro tenha sido notificado (artigo 76.º, n.º 1, do CIMI).

 

E só do resultado das segundas avaliações, que esgotam os meios graciosos do procedimento de avaliação, cabe impugnação judicial nos termos do CPPT (artigo 77.º, n.º 1 do CIMI).

 

Tal significa que os actos de avaliação de valores patrimoniais previstos no CIMI são actos destacáveis, para efeitos de impugnação contenciosa, sendo objecto de impugnação autónoma, não podendo na impugnação dos actos de liquidação que com base neles sejam efectuadas discutir-se a legalidade daqueles actos.

 

Esta questão foi apreciada no acórdão proferido em 15-02-2022, no processo arbitral n.º 676/2021-T, cuja jurisprudência aqui se reafirma.

 

Desta forma, “o sujeito passivo de IMI ou de AIMI pode impugnar as liquidações de IMI e AIMI, mas não são relevantes como fundamentos de anulação eventuais ilegalidades dos antecedentes actos de fixação de valores patrimoniais, que se firmaram na ordem jurídica, por falta de tempestivo esgotamento dos meios graciosos previstos nos procedimentos de avaliações e de subsequente impugnação autónoma a deduzir no prazo de três meses, nos termos dos n.ºs 1 e 7 do artigo 134.º do CPPT”.

 

Assim, ‘não sendo impugnado tempestivamente o acto de fixação de valores patrimoniais, forma-se caso decidido ou resolvido sobre a avaliação, que se impõe em sede de liquidação de IMI, sendo que «o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada município, pelos serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita» (artigo 113.º do CIMI).

 

Este regime de impugnação autónoma justifica-se por razões de coerência do sistema jurídico tributário inerentes ao facto de cada acto de avaliação poder servir de suporte a uma pluralidade de actos de liquidação de impostos (liquidações anuais de IMI e eventuais liquidações de IMT) e ser relevante para vários efeitos a nível de IRS, IRC e Imposto do Selo, o que não se compagina com a possibilidade de plúrima avaliação incidental que se reconduzisse à fixação de diferentes valores patrimoniais tributários para o mesmo prédio, no mesmo momento.

 

Por outro lado, a caducidade do direito de acção derivada da inércia do lesado por actos administrativos durante um prazo razoável, é generalizadamente justificada por razões de segurança jurídica, necessária para adequado funcionamento da administração pública, que é um valor constitucional ínsito no princípio do Estado de Direito democrático e é reconhecida generalizadamente em matéria administrativa e tributária.

            (vide acórdão proferido em 15-02-2022, no processo arbitral n.º 676/2021-T)

 

Sendo que o prazo de três meses para impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais nos afigura perfeitamente razoável, sendo, aliás, o prazo geral previsto a lei para a impugnação da generalidade dos actos administrativos com fundamentos geradores de vícios de anulabilidade (artigo 58.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e artigo 102.º do CPPT).

 

A natureza de actos destacáveis que é atribuída aos actos de avaliação de valores patrimoniais é, há muito, reconhecida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (STA), desde o tempo em que regime idêntico ao do artigo 134.º, n.ºs 1 e 7 do CPPT, previsto nos n.ºs 1 e 6 do artigo 155.º do Código de Processo Tributário de 1991, quer em sede de Sisa, quer de Contribuição Autárquica, quer de IMI, quer de IMT. 

 

Veja-se, a título de exemplo, nos seguintes acórdãos do STA de 30-06-1999, processo n.º 023160; de 02-04-2003, processo n.º 02007/02; de 06-02-2011, processo n.º 037/11; de 19-09-2012, processo n.º 0659/12; de 5-2-2015, processo n.º 08/13; de 13-7-2016, processo n.º 0173/16; de 10-05-2017, processo n.º 0885/16.

 

Daqui decorre que as ilegalidades dos actos de avaliação invocados pelo Requerente, que não foram objecto de impugnação tempestiva autónoma, não podem considerar-se ilegalidades dos actos de liquidação de AIMI, susceptíveis de serem invocadas em processo impugnatório destes actos.

 

Além disso, o pedido de revisão apresentado pelo Requerente não foi efectuado no prazo da reclamação administrativa a que se refere a 1.ª parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT, pelo que só poderia ser feita a revisão com fundamento em erro imputável aos serviços, nos termos da 2.ª parte daquele número.

 

Só que os actos de liquidação de AIMI, em si mesmos considerados, não enfermam de qualquer erro imputável aos serviços, uma vez que, por força do disposto no nº 1 do artigo 135.º-C do CIMI «o valor tributável corresponde à soma dos valores patrimoniais tributários, reportados a 1 de janeiro do ano a que respeita o adicional ao imposto municipal sobre imóveis, dos prédios que constam nas matrizes prediais na titularidade do sujeito passivo».

 

Deste modo, tendo as liquidações sido efectuadas com base nos valores patrimoniais dos prédios que constavam das matrizes a 1 de Janeiro dos anos a que respeita o AIMI, não há erro da AT ao efectuar as liquidações e, por isso, o pedido de revisão oficiosa não podia ser deferido ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º da LGT.

 

Neste ponto, tem razão a AT quanto a esta questão.

 

4. Questões da admissibilidade de revisão oficiosa dos actos com fundamento em injustiça grave ou notória, da consolidação dos actos de fixação de valores patrimoniais por não impugnação das avaliações e dos limites à revogabilidade previstos no artigo 168,º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo

 

Entende o Tribunal que estas questões estão conexionadas pelo que se irão apreciar conjuntamente.

 

A questão da impugnabilidade dos actos de liquidação de AIMI com fundamento em ilegalidade, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º da LGT, é diferente da questão da possibilidade da revisão da matéria tributável com fundamento em injustiça grave ou notória, prevista no n.º 3 do artigo 78.º da LGT, que o Requerente pediu, e que é um afloramento do dever de revogação de actos ilegais, que emerge do princípio a legalidade da actuação da Administração Tributária (artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 55.º da LGT).

 

Em bom rigor, a utilidade prática da revisão com fundamento em injustiça grave ou notória verifica-se tão somente após o decurso do prazo da reclamação administrativa, precisamente quanto a actos que já não podem ser impugnados com fundamento em qualquer ilegalidade ou em erro imputável aos serviços.

 

Aqui estamos perante, de forma explícita, da possibilidade de revisão da matéria tributável, inclusivamente de actos de fixação de valores patrimoniais quando são eles que definem a matéria tributável, já após a normal consolidação que decorre da não impugnação das avaliações nos prazos legais.

 

Todavia, esta possibilidade de revisão da matéria tributável no âmbito do procedimento de revisão oficiosa está prevista em termos mais restritos do que aqueles em que podem ser tempestivamente impugnados os actos de liquidação, uma vez que, por um lado, só a injustiça grave ou notória é fundamento de revisão e não qualquer ilegalidade e, por outro lado, mesmo a nível de revisão oficiosa, esta revisão da matéria tributável é mais restrita do que a prevista no n.º 1 do artigo 78.º para a revisão de actos de liquidação, pois o prazo é de três anos, em vez do de quatro, mesmo que o erro seja imputável à AT.

 

Atente-se que a possibilidade de revisão oficiosa de actos de avaliação de valores patrimoniais não está prevista no CIMI. Concretamente, o artigo 115.º do CIMI reporta-se a actos de liquidação e não a actos de fixação de valores patrimoniais.

 

Além disso, entendemos que se trata de um regime especial para cumprimento pela AT do dever de revogação que emana do princípio da legalidade o qual, estando especialmente previsto para o contencioso tributário, afasta a aplicabilidade subsidiária do artigo 168.º do Código do Procedimento Administrativo, pois não há uma lacuna de regulamentação.

 

Assim, entendemos que apenas à face do regime geral da revisão oficiosa, previsto no artigo 78.º da LGT, se pode apontar a possibilidade de revisão, nos termos dos seus n.ºs 4 e 5, que estabelecem o seguinte:

“4. O dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente, nos três anos posteriores ao do acto tributário a revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte.”

“5. Para efeitos do número anterior, apenas se considera notória a injustiça ostensiva e inequívoca e grave a resultante de tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade ou de que tenha resultado elevado prejuízo para a Fazenda Nacional.”

 

Com efeito, da revisão da matéria tributável prevista no n.º 4 do artigo 78.º da LGT decorrerá a anulação dos actos consequentes que a tenham como pressuposto, como são os actos de liquidação de IMI ou AIMI, embora sem os efeitos retroactivos previstos para a impugnação tempestiva, designadamente a nível de juros indemnizatórios, como decorre dos n.ºs 1 e 3 alíneas b) e c)  do artigo 43.º da LGT.

 

E, atente-se, apesar de no n.º 4 do artigo 78.º da LGT se referir que «o dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente» a «revisão da matéria tributável», entendemos tratar-se de um poder-dever, estritamente vinculado, cujo cumprimento é sujeito a controle jurisdicional, tal como tem entendido o Supremo Tribunal Administrativo:

– «o facto de a lei determinar que “o dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente,” a revisão, não obsta à possibilidade de convolação da reclamação graciosa em pedido de revisão com fundamento em injustiça grave ou notória pois tal poder de autorização não é mera faculdade mas, antes, um verdadeiro poder-dever»; trata-se de «um poder estritamente vinculado»; (vide o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07-10-2009, processo n.º 0476/09)

– «a previsão constante do dito art. 78.º n.º 4, como excepcional, é de entender como correspondendo a um poder-dever que implica a sua aplicação a todos os casos, verificados que sejam os referidos requisitos». (Vide o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17-02-2021, processo n.º 39/14.9BEPDL 0578/18).

 

Ademais, como decorre do n.º 7 do artigo 78.º da LGT, esta revisão com fundamento em injustiça grave ou notória pode ser efectuada a pedido do contribuinte e, neste caso, pode ser efectuada após o prazo de três anos, pois o pedido do contribuinte interrompe o prazo inicial, contando-se um novo prazo a partir da apresentação do pedido.

 

E nestas situações em que o erro está na fixação da matéria tributável e não propriamente nos subsequentes actos de liquidação, a revisão não depende da existência de erro imputável aos serviços ou de ilegalidade desses actos, mas apenas que se esteja perante «injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte».

 

E como entendeu o Supremo Tribunal Administrativo no citado acórdão de 17-02-2021, a previsão da autorização como excepcional, não afasta o «poder-dever que implica a sua aplicação a todos os casos, verificados que sejam os referidos requisitos».

 

5. Tempestividade do pedido de revisão oficiosa para efeitos do n.º 4 do artigo 78.º da LGT

 

É entendimento deste Tribunal que o prazo para ser autorizada a revisão da matéria tributável pelo dirigente máximo do serviço não é o previsto no n.º 1 do artigo 78.º da LGT, mas sim o prazo reduzido aos «três anos posteriores ao do acto tributário», previsto no n.º 4 da mesma disposição legal.

 

Assim, os «três anos posteriores ao do acto tributário» terminam no dia 31 de Dezembro do terceiro ano posterior àquele em que foi praticado o acto tributário.

 

Ora, as liquidações de AIMI cuja revisão oficiosa foi pedida pelo Requerente foram emitidas em 2017, 2018, 2019 e 2020, pelo que os três anos posteriores à primeira terminaram em 31 de dezembro de 2020, os três anos posteriores à segunda terminaram em 31 de dezembro de 2021, os três posteriores à terceira e à quarta ainda não terminaram.

 

O Requerente apresentou o pedido de revisão oficiosa em 15 de junho de 2021, pelo que tem de se concluir que foi apresentado tempestivamente quanto às três últimas liquidações de AIMI, mas já não quanto à liquidação de AIMI relativa ao ano de 2017.

 

Assim, procede a pretensão da AT quanto à intempestividade do pedido de revisão oficiosa quanto a liquidação de AIMI relativa ao ano de 2017, mas não quanto às liquidações de AIMI relativas aos anos de 2018, 2019 e 2020.

 

6. Exigência de que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte

 

Neste ponto é manifesto que a fixação da matéria tributável foi efectuada pela AT, com base numa fórmula prevista na lei, sem que se tenha demonstrado que o Requerente tenha fornecido qualquer informação errada quanto à natureza dos prédios, pelo que o eventual erro na aplicação na fórmula de avaliação invocado pelo Requerente não pode ser considerado imputável a um seu comportamento negligente.

 

7. O erro imputado pela Requerente à fixação de valores patrimoniais relativo à aplicação de coeficientes aplicáveis a prédios edificados

 

O erro que o Requerente imputa à fixação de valores patrimoniais é o de se terem aplicado à avaliação de terrenos para construção normas relativas às avaliações dos prédios edificados.

Com efeito, os artigos 39.º, 41.º, 42.º e 45.º do CIMI, nas redacções da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (vigente até à Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro),  estabelecem o seguinte, no que aqui interessa:

 

Artigo 39.º

Valor base dos prédios edificados

1 - O valor base dos prédios edificados (Vc) corresponde ao valor médio de construção, por metro quadrado, adicionado do valor do metro quadrado do terreno de implantação fixado em 25% daquele valor.

(...)

Artigo 41.º

Coeficiente de afectação

O coeficiente de afectação (Ca) depende do tipo de utilização dos prédios edificados, de acordo com o seguinte quadro:

(...)

Artigo 42.º

Coeficiente de localização

(...)

3 - Na fixação do coeficiente de localização têm-se em consideração, nomeadamente, as seguintes características:

a) Acessibilidades, considerando-se como tais a qualidade e variedade das vias rodoviárias, ferroviárias, fluviais e marítimas;

b) Proximidade de equipamentos sociais, designadamente escolas, serviços públicos e comércio;

c) Serviços de transportes públicos;

d) Localização em zonas de elevado valor de mercado imobiliário.

 

4 - O zonamento consiste na determinação das zonas homogéneas a que se aplicam os diferentes coeficientes de localização do município e as percentagens a que se refere o n.º 2 do artigo 45.º

Artigo 45.º

Valor patrimonial tributário dos terrenos para construção

1 - O valor patrimonial tributário dos terrenos para construção é o somatório do valor da área de implantação do edifício a construir, que é a situada dentro do perímetro de fixação do edifício ao solo, medida pela parte exterior, adicionado do valor do terreno adjacente à implantação.

2 - O valor da área de implantação varia entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas.

3 - Na fixação da percentagem do valor do terreno de implantação têm-se em consideração as características referidas no n.º 3 do artigo 42.º.

4 - O valor da área adjacente à construção é calculado nos termos do n.º 4 do artigo 40.º .

5 - Quando o documento comprovativo de viabilidade construtiva a que se refere o artigo 37.º apenas faça referência aos índices do PDM, devem os peritos avaliadores estimar, fundamentadamente, a respectiva área de construção, tendo em consideração, designadamente, as áreas médias de construção da zona envolvente. (aditado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30-12)

 

O Supremo Tribunal Administrativo (STA) tem vindo a decidir, uniformemente, na esteira Acórdão do Pleno do STA de 23-10-2019, processo n.º 170/16.6BELRS 0684/17, que:

I – Na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção há que observar o disposto no artigo 45.º do Código do IMI, não havendo lugar à consideração do coeficiente de qualidade e conforto (cq).

II – O artigo 45 do CIMI é a norma específica que regula a determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção.

III – O coeficiente de qualidade e conforto, factor multiplicador do valor patrimonial tributário contidos na expressão matemática do artigo 38 do CIMI com que se determina o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação comércio indústria e serviços não pode ser aplicado analogicamente por ser susceptível de alterar a base tributável interferindo na incidência do imposto

 

Na fundamentação deste acórdão refere-se o seguinte:

“O terreno em causa nos autos integra uma das espécies de prédios urbanos na categoria de terreno para construção. E, tratando-se de uma das espécies de prédio urbano o valor patrimonial deverá ser determinado por avaliação directa (nº 2 do artigo 15 do CIMI) devendo ser avaliado de acordo com o disposto no artigo 45º do mesmo compêndio normativo pois que a fórmula prevista no nº 1 do artigo 38 do CIMI (Vt= Vc x A x CA x CL x Cq x Cv) apenas tem aplicação aos prédios urbanos aí discriminados ou seja àqueles que já edificados estão para habitação, comércio, indústria e serviços (assim se decidiu no ac. deste STA de 20/04/2016 tirado no recurso 0824/15 disponível no site da DGSI - Jurisprudência do STA) onde se expendeu:

(…)

Todavia o legislador não incluiu aí os terrenos para construção que também classifica de prédios urbanos no artigo 6º do CIMI.

 

Para a determinação do valor patrimonial tributário dos mesmos há a norma do artigo 45 já referida onde apenas é relevada a área de implantação do edifício a construir e o terreno adjacente e as características do nº 3 do artigo 42.

 

Os restantes coeficientes não estão aí incluídos porquanto apenas podem respeitar aos edifícios, como tal.

 

O coeficiente de afectação só pode relevar face à comprovada utilização do prédio edificado e bem assim o de conforto e qualidade.

 

Tais coeficientes multiplicadores do valor patrimonial tributário apenas respeitam ao edificado mas não têm base real de sustentação na potencialidade que o terreno para construção oferece.

 

A aplicação destes factores valorizadores na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos de construção só poderia ser levada a cabo por analogia com o disposto no artigo 38 do CIMI.

 

Mas porque a aplicação desses factores tem influência na base tributável tal analogia está proibida por força do disposto no nº 4 do artigo 11 da LGT por se reflectir na norma de incidência na medida em que é susceptível de alterar o valor patrimonial tributário.

 

A aplicação desses coeficientes na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção seria violadora do princípio da legalidade e da reserva de lei consagrado no artigo 103 nº 2 da CRP.

 

A própria remissão para os artigos 42 e 40 do CIMI constante do artigo 45 e mesmo a redacção dada ao artigo 46 relativo ao valor patrimonial tributário dos prédios da espécie “outros” em que expressamente se refere que “o valor patrimonial tributário é determinado nos termos do artigo 38 com as necessárias adaptações “é demonstrativo de que na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção não entram outros factores que não sejam o valor da área da implantação do edifício a construir e o valor do terreno adjacente à implantação.

 

É que mesmo a remissão feita para os artigos 42 e 40 do CIMI não consagra a aplicação dos coeficientes aí referidos mas apenas acolhe, respectivamente as características que hão-de determinar o valor do coeficiente a utilizar e o modo de cálculo.

O que se compreende face à definição de terrenos para construção do nº 3 do artigo 6 do C.I.M.I. (…)

 

Concordando e não olvidando a doutrina expressa por José Maria Fernandes Pires in Lições de Impostos Sobre o Património e do Selo 2012, 2ª edição pp104 de que “o valor de um terreno para construção corresponde, fundamentalmente, a uma expectativa jurídica, consubstanciada num direito de nele se vir a construir um prédio ou prédios com determinadas características e com determinado valor,” e que para a avaliação de terrenos para construção a lei manda separar duas partes do terreno (uma primeira parte a do terreno onde vai ser implantado o edifício a construir) e uma segunda parte a restante constituída pelo terreno que fica livre no lote de terreno para construção expressando que para alcançar o valor da primeira parte é necessário proceder à avaliação do edifício a construir como se ele já estivesse construído.

Com o devido respeito, não se acolhe integralmente esta doutrina pelas dúvidas e imprecisões que pode acarretar e que em matéria fiscal devem ser evitadas. Desde logo a lei, no artº 6º nº 3 do CIMI classifica de terrenos para construção realidades que não têm aprovado qualquer projecto de construção pelo que a sua inexistência determina por si só a inviabilidade de efectuar o cálculo da chamada área de implantação do edifício porque inexistente mesmo em projecto e por outro lado, nos casos em que existe esse projecto (parece ser o caso dos autos uma vez que no processo administrativo apenso se faz referência a uma moradia unifamiliar (vide fls.48 a 56)) cumpre salientar que a qualidade e o conforto têm de ser efectivos o que se compreende porque o direito tributário se preocupa com realidades e verdades materiais não podendo a expectativa ou potencial construção de um edifício com anunciados/programados índices de qualidade e conforto integrar um conceito que objectivamente, só é palpável e medível se efectivada a construção e se, realizada sem desvios ao constante da comummente conhecida “memória descritiva” que acompanha cada projecto de construção. Também é certo que a valorização imediata do prédio por efeito da atribuição do alvará de terreno para construção não deixará de ser levada em conta para efeitos de tributação, em caso de alienação, com a tributação noutra sede tributária.

 

Como se expressou no acórdão deste STA a que supra fizemos referência

(…) Efectivamente o coeficiente de afectação tem a ver com o tipo de utilização do prédio já edificado e o mesmo se diga do coeficiente de qualidade e conforto.

Nos terrenos em construção as edificações aprovadas são meramente potenciais e é o valor dessa capacidade construtiva, geradora de acréscimo de valor patrimonial ou riqueza para o seu proprietário que se procura taxar. E não factores ainda não materializados (…).

 

Tendo em conta a realidade o legislador consagrou para a determinação do valor patrimonial tributário desta espécie de prédios a regra específica constante do supra referido artigo 45 do CIMI e não outra, onde reitera-se se tem em conta o valor da área de implantação do edifício a construir e o valor do terreno adjacente à implantação bem como as características de acessibilidade, proximidade, serviços e localização descritas no nº 3 do artigo 42, tendo em conta o projecto de construção aprovado, quando exista, e o disposto no nº 2 do artigo 45 do C.I.M.I, mas não outras características ou coeficientes. Isto só pode significar que na determinação do seu valor patrimonial tributário dos terrenos para construção não tem aplicação integral a fórmula matemática consagrada no artigo 38º do CIMI onde expressamente se prevê, entre outros o coeficiente, aqui discutido, de qualidade e conforto relacionado com o prédio a construir. O que, faz todo o sentido e dá coerência ao sistema de tributação do IMI uma vez que os coeficientes previstos nesta fórmula só podem ter a ver com o que já está edificado, o que não é o caso dos terrenos para construção alvo de tributação específica, sim, mas na qual não podem ser considerados para efeitos de avaliação patrimonial factores ainda não materializados. E, sendo verdade que para calcular o valor da área de implantação do edifício a construir a lei prevê que se pondere o valor das edificações autorizadas ou previstas (artº 45º nº 2 do CIMI) para tal desiderato, salvo melhor opinião não necessitamos/devemos entrar em linha de conta, necessariamente, com o coeficiente de qualidade e conforto pois que não estando materializado não é medível/quantificável, sendo consabido da experiência comum que um projecto de edificação contemplando possibilidades modernas de inserção acessória de equipamentos vulgarmente associados ao conceito de conforto tais como ar condicionado, videovigilância robótica doméstica, luzes inteligentes etc, se edificado/realizado com defeitos pode não se traduzir em qualquer comodidade ou bem estar, antes pelo contrário ser fonte de problemas/insatisfações e dispêndios financeiros.”

 

Esta jurisprudência foi posteriormente reafirmada pelo STA, como pode ver-se, entre vários outros, pelos acórdãos seguintes:

– de 05-04-2017, processo n.º 01107/16 («Na fórmula final de cálculo do VPT dos terrenos para construção é de afastar a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse factor de localização do terreno já está contemplado na percentagem prevista no nº 3 do art. 45º do CIMI»);

– de 28-06-2017, processo n.º 0897/16 («II – Os coeficientes de afectação e conforto, factores multiplicadores do valor patrimonial tributário contidos na expressão matemática do artigo 38 do CIMI com que se determina o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação comércio indústria e serviços não podem ser aplicados analogicamente por serem susceptíveis de alterar a base tributável interferindo na incidência do imposto. III – Na fórmula final de cálculo do VPT dos terrenos para construção é de afastar a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse factor de localização do terreno já está contemplado na percentagem prevista no nº 3 do art. 45º do CIMI»).

– de 16-05-2018, processo n.º 0986/16 («O coeficiente de qualidade e conforto, factor multiplicador do valor patrimonial tributário contidos na expressão matemática do artigo 38 do CIMI com que se determina o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação comércio indústria e serviços e bem assim o coeficiente de afectação não podem ser aplicados analogicamente por serem susceptíveis de alterar a base tributável interferindo na incidência do imposto (IMI)»;

– de 14-11-2018, processo n.º 0133/18 («No cálculo do VPT dos terrenos para construção é de afastar a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse fator de localização do terreno já está contemplado na percentagem prevista no nº 3 do art. 45º do CIMI»;

– 23-10-2019, processo n.º 170/16.6BELRS 0684/17 («os coeficientes de localização, qualidade e conforto, factores multiplicadores do valor patrimonial tributário contidos na expressão matemática do artigo 38 do CIMI com que se determina o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação comércio indústria e serviços e bem assim o coeficiente de afectação não podem ser aplicados analogicamente por serem susceptíveis de alterar a base tributável interferindo na incidência do imposto (IMI)

– de 13-01-2021, processo n.º 0732/12.0BEALM 01348/17 («Relativamente à avaliação de terrenos para construção, sobre o que regula o art. 45.º do C.I.M.I., não são de aplicar os coeficientes ou características não especificamente previstos, entre os quais o coeficiente de qualidade e conforto».

 

Na linha desta jurisprudência do STA, é entendimento deste Tribunal que a avaliação dos terrenos para construção devia ser efectuada sem aplicação dos coeficientes não especificamente previstos, entre os quais os coeficientes de localização, de qualidade e conforto e de afectação.

 

No presente processo, as partes estão de acordo quanto à fixação de um valor patrimonial tributário, que consta da cadernetas predial urbana junta como documento n.º 2 do pedido de pronúncia arbitral, em que foram aplicados os coeficientes de localização e afectação na avaliação do terreno para construção do Requerente.

 

Pelo exposto, no respeito pela jurisprudência referida, o Tribunal tem de concluir que a fixação de valor patrimonial do prédio referido enferma dos erros que o Requerente lhes imputa, os quais são exclusivamente imputáveis à AT que praticou o acto de avaliação.

 

8. Injustiça grave ou notória

 

Finalmente, o último requisito da revisão oficiosa ao abrigo do n.º 4 do artigo 78.º da LGT é o de o apuramento da matéria tributável consubstanciar «injustiça grave ou notória».

 

Ora, o n.º 5 do artigo 78.º da LGT esclarece o alcance destes conceitos, estabelecendo que «para efeitos do número anterior, apenas se considera notória a injustiça ostensiva e inequívoca e grave a resultante de tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade ou de que tenha resultado elevado prejuízo para a Fazenda Nacional».

 

Este requisito é exigido em alternativa, como se pode depreender do uso da conjunção «ou».

 

No caso em análise, entendemos que se afigura ser manifesta a natureza «grave» da injustiça gerada com a errada avaliação, uma vez que a tributação em AIMI do terreno para construção foi consideravelmente superior ao devido, como resulta da quantificação efectuada pelo Requerente.

 

 

9. Conclusão

 

Entende o Tribunal que se verificam, deste modo, todos os requisitos de que depende a revisão da matéria tributável prevista nos n.ºs 4 e 5 do artigo 78.º da LGT, pelo que em vez do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa, a AT deveria ter efectuado a revisão e anulado parcialmente as liquidações de AIMI relativas aos anos de 2018, 2019 e 2020.

 

Todavia, o mesmo já não sucede com a liquidação relativa ao ano de 2017, por não ter sido apresentado o pedido de revisão no prazo previsto no n.º 4 do artigo 78.º da LGT.

 

Pelo exposto, impõe-se a anulação do indeferimento tácito do pedido de revisão nas partes respeitantes aos anos de 2018, 2019 e 2020, quanto à revisão da matéria tributável, bem como as anulações parciais das consequentes liquidações de AIMI, nas partes em que excederam o que seria devido se tivessem tido como pressuposto avaliações realizadas nos termos legais, isto é, Euros 1.244,87 em 2018, Euro 1.244,87 em 2019 e Euros 1.309,54 em 2020 [artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT].

 

10. Pedido subsidiário

 

            No pedido de pronúncia arbitral, o Requerente veio, a título subsidiário, requererer que: “Seja desaplicado, no caso concreto, a norma pretensamente se extraída do artigo 45.º do Código do IMI, na redacção vigente à data da verificação do facto tributário, no sentido de que os coeficientes de avaliação consagrados no artigo 38.º do mesmo compêndio legal deveriam ter aplicação na determinação do VPT de terrenos para construção, por manifesta inconstitucionalidade, por violação do princípio da legalidade tributária, no sentido de reserva de lei formal, ínsito na alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º e no n.º 2 do artigo 103.º, ambos da CRP e, consequentemente, seja declarada a ilegalidade dos actos tributários de liquidação de AIMI sub judice, porque assentes em normas inconstitucionais, sendo os mesmos prontamente anulados, com todas as consequências legais”. 

 

Com efeito, o pedido subsidiário visa a desaplicação, por inconstitucionalidade, do artigo 45.º do CIMI.

 

Como resulta do atrás exposto, existe consenso das partes quanto à ilegalidade da fixação de valores patrimoniais à face do referido artigo 45.º, pelo que fica prejudicado, por ser inútil, o conhecimento da referida questão da inconstitucionalidade.

 

11. Reembolso de quantias pagas e juros indemnizatórios

 

            No pedido de pronúncia arbitral, o Requerente veio ainda requererer que: “Seja a AT condenada a reembolsar a Requerente do valor do AIMI pago em excesso, no montante global de € 5.044,15, relativamente às liquidações sub judice, e, bem assim, condenada ao pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal, até ao reembolso integral do montante referido.”.

 

Ou seja, o Requerente pede o reembolso do imposto indevidamente pago acrescido de juros indemnizatórios.

 

Como consequência da anulação parcial das liquidações há lugar a reembolso da quantia indevidamente paga, no montante de Euros 3.799,28, relativa às liquidações dos anos de 2018, 2019 e 2020, valor que a AT não contesta.

 

O n.º 1 do artigo 43.º da LGT reconhece o direito a juros indemnizatórios quando se determinar em processo de reclamação graciosa ou impugnação judicial que houve erro imputável aos serviços.

 

O pedido de revisão do acto tributário é equiparável a reclamação graciosa quando é apresentado dentro do prazo da reclamação administrativa, que se refere no n.º 1 do artigo 78.º da LGT, como se refere no acórdão do STA de 12-7-2006, proferido no processo n.º 402/06.

 

Como igualmente se refere no mesmo acórdão do STA, «nos casos de revisão oficiosa da liquidação (quando não é feita a pedido do contribuinte, no prazo da reclamação administrativa, situação que é equiparável à de reclamação graciosa) (...) apenas há direito a juros indemnizatórios nos termos do art. 43.º, n.º 3, da LGT».

 

No caso em análise, a norma à face da qual tem de ser aferida a existência do direito a juros indemnizatórios é a alínea c) do n.º 3 do artigo 43.º da LGT, que estabelece que estes são devidos «quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária».

 

Ora, como decorre da matéria de facto dada como provada, o pedido de revisão foi apresentado em 15 de junho de 2021, pelo que apenas a partir de 16 de junho de 2022, haveria direito a juros indemnizatórios.

 

Assim, tendo o Requerente optado por impugnar o indeferimento tácito, formado antes daquela data, não tem o mesmo direito a juros indemnizatórios.

 

            V. Decisão          

 

Em face do exposto, o Tribunal Arbitral decide:

 

a)         Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral;

b)         Anular parcialmente a liquidação de AIMI n.º 2018..., referente ao ano 2018, quanto ao valor de Euros 1.244,87;

c)         Anular parcialmente a liquidação de AIMI n.º 2019..., referente ao ano 2019, quanto ao valor de Euros 1.244,87;

d)         Anular parcialmente a liquidação de AIMI n.º 2020..., referente ao ano de 2020, quanto a valor de Euros 1.309,54;

e)         Julgar parcialmente procedente o pedido de reembolso e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar ao Requerente a quantia de Euros 3.799,28;

f)         Julgar improcedente o pedido de juros indemnizatórios e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira deste pedido.

 

 

VI. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de Euros 5.044,15, atribuído pelo Requerente, sem contestação da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

VII. Custas

 

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em Euros 612,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, na percentagem de 24,68% a cargo do Requerente e na percentagem de 75,32% a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Lisboa, 16 de agosto de 2022

 

O Árbitro,

                                                                

Pedro Miguel Bastos Rosado