Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 838/2021-T
Data da decisão: 2022-05-29  IRS  
Valor do pedido: € 37.796,81
Tema: IRS de 2015. Anexo J do Modelo 3 do IRS. Directiva da Poupança. Rendimentos de origem na Suíça.
Versão em PDF

 

                                                          

Sumário

Facultando a Autoridade Fiscal da Suíça, no âmbito da Directiva da Poupança, informação não desagregada, à Autoridade Fiscal Portuguesa, quanto a rendimentos e outros valores creditados a residentes em Portugal em contas bancárias abertas na Suíça, compete à AT, em sede de procedimento de divergências, realizar as diligências necessárias à descoberta da verdade material (nº 1 do artigo 74º da LGT)

 

Decisão Arbitral

 

1. Relatório

 

A..., NF ..., residente na Rua ..., no ... Piso, Fração ..., ...-... Aveiro, apresentou pedido de constituição de Tribunal Arbitral e de pronúncia arbitral (PPA), ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (doravante “RJAT”), tendo em vista a declaração de ilegalidade do IRS de 2015, ou seja, da liquidação adicional de IRS com o nº2019 ... de que resultou um valor a pagar de € 37.796,81.

 

É demandada a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, doravante identificada por “AT” ou Requerida.

 

No final do PPA, o Requerente peticiona que o pedido de pronúncia arbitral seja julgado procedente, declarada ilegal a liquidação adicional de IRS do ano de 2015 com o nº 2019 ... e que a mesma seja anulada.

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 23-12-2021.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular (TAS) o signatário desta decisão, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

As partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados das alíneas a) e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral singular foi constituído em 02-03-2022.

A AT apresentou resposta em 06.04.2022 e juntou na mesma data o PA, não tendo suscitado excepções, nem questões prévias, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral (PPA).

Em 29.04.2022 realizou-se a reunião de partes do artigo 17º do RJAT com inquirição da testemunha B..., relativamente aos factos constantes dos artigos 9º, 14º, 29º, 30º, 31º, 53º e 56º do PPA.

Em 05.05.2022 a Requerida apresentou alegações, pugnando pela falta de prova, quer documental, quer testemunhal, que afaste a informação que lhe foi prestada pela Autoridade Fiscal da Suíça.

Em 09.05.2022 o Requerente apresentou as suas alegações, pugnando pela procedência do PPA, uma vez que tinha feito prova da diversa natureza dos proveitos auferidos face à sua qualificação em sede de IRS.

 

Posição do Requerente

 

Refere o Requerente que é residente em Portugal e em 2015, porque auferiu rendimentos na Suíça, apresentou o Anexo J com “... todos os rendimentos que auferiu ..., provenientes de ativos financeiros, conforme informação que foi prestada pelo Bank C..., através do documento denominado Income Statement Realized Capital Gain and Loss”.

No entanto:

  1. Em Outubro de 2019 ... foi notificado pela Direção de Finanças de Aveiro para proceder à correção dos valores constantes no anexo J da declaração modelo 3 referente a 2015 pois, segundo a referida Direção, não constavam declarados rendimentos sob a forma de juros no valor de € 183.132,00 que tinham sido comunicados pela Suíça, ao abrigo da Diretiva da Poupança”.
  2. Tendo em resposta informado que tinha declarado todos esses valores no modelo 3 de IRS entregue em 30/10/2019, e “... que os valores comunicados pela Suíça não respeitavam exclusivamente a juros, respeitando o valor comunicado a rendimentos da categoria E e da categoria G, nos termos declarados no anexo J entregue em 30/10/2019”, juntando (1) - um documento “ ... do Bank C..., Ag no qual esta entidade esclarecia exatamente essa questão ou seja que não tinha individualizado na sua comunicação os rendimentos auferidos pelo Requerente a titulo de mais valias” (2) – “... um mapa elaborado, com as 43 transações comunicadas, onde consta o valor da respetiva aquisição, sustentado em documento emitido pelo Banque D... do ano de 2014 que também juntou, e o valor de realização do ativo, sustentado em comunicações do Bank C... Ag, que também juntou, bem como as despesas incorridas e saldo de mais ou menos valias apurado por referência a cada uma dessas transacções”.
  3. Acrescenta que “a Direção de Finanças de Aveiro não considerou nem as explicações nem os documentos juntos pelo Requerente e procedeu à correção do anexo J, fazendo inscrever a totalidade do valor comunicado pela Suíça, € 183.132,00, exclusivamente a título de rendimentos categoria E, juros, correção que deu origem à liquidação impugnada no 2019 ..., da qual, ..., por acerto de contas, resultou o valor a pagar de € 37.796,81
  4. Inconformado “deduziu procedimento de reclamação graciosa que correu termos pela Unidade de Grandes Contribuintes sob o no ...2020..., pela qual peticionou a anulação da liquidação adicional supra identificada no 2019 ...”, tendo em sede de audição prévia, apresentado de novo todos os documentos que já havia entregue no procedimento anterior.
  5. Procedimento de reclamação graciosa que foi indeferido em 22 de Julho de 2021, decisão que aqui impugna, invocando que “não se verificando no caso concreto nenhuma das situações previstas no nº 2 do artigo 75º da LGT, é de concluir que se presume verdadeira e de boa fé a declaração modelo 3 de IRS, relativa ao ano de 2015 - liquidação no 2019...- que o Requerente entregou em 30 de outubro de 2019” e “por outro lado a prova dos factos constitutivos dos direitos recai sobre quem os invoca, conforme se prevê no nº 1 do artigo 342º do Código Civil e artigo 74º da LGT”, o que a AT não logrou levar à prática.
  6. Até porque “dos elementos documentais juntos pelo Requerente no procedimento de reclamação graciosa ..., ficou demonstrado que este não auferiu, a título de juros, rendimentos na Suíça e no ano de 2015, no valor de € 183.132,00”.
  7. Concluindo que “a Directiva 2003/48/CE não afeta as normas internas de cada estado quanto ao enquadramento fiscal dos rendimentos auferidos”.

 

Em sede de alegações escritas, o Requerente reitera o que referiu em sede de PPA e conclui que “... prestou todos os esclarecimentos sobre a sua situação tributaria, relativamente aos identificados rendimentos, que comprovou com recurso a elementos de prova documentais, assim cumprindo a obrigação prevista no artigo 75º nº 2 da LGT”.

 

Posição da Requerida

 

            A Requerida “reconhece o facto de se tratar de imposto cedular, pelo que o Requerente pode, de forma comprovada, distinguir os elementos das suas categorias na declaração de rendimentos, para efeitos de Liquidação”.

            No entanto, sustenta a improcedência do PPA, referindo o seguinte:

  1. A declaração de IRS apresentada pelo Requerente “... deu origem a um processo de divergências em virtude de terem sido comunicados à AT pelas autoridades fiscais suíças, rendimentos sob a forma de juros pagos por agente pagador na Suíça em 2015, no valor de € 183.132,00, que o mesmo não declarou em sede de declaração de rendimentos”.
  2. Com efeito, “ao abrigo do Acordo celebrado entre a União Europeia e a Suíça, contendo medidas idênticas às da Diretiva da Poupança, (doravante Acordo) a Autoridade Fiscal da Suíça prestou informação à AT portuguesa, relativo ao Requerente, considerado residente fiscal em Portugal, relativo aos rendimentos sob a forma de juros pagos por agente naquele Estado no ano de 2015”, tendo sido “... recebida Informação da Autoridade Fiscal da Suíça, relativa a rendimentos sob a forma de juros visados pelo disposto no Acordo, de que o Requerente é titular, por ele obtidos no ano de 2015, ... rendimentos foram pagos ao Requerente no ano de 2015 pelo agente suíço Bank C..., A.G., com suporte na Conta n.º ..., no montante equivalente a € 183.132,00”. 
  3. Reitera a Requerida, quanto às mais-valias, que adquire especial relevo “a comprovação documental dos valores de aquisição, atinentes aos correspondentes elementos dos rendimentos, sem os quais se torna impossível apurar o saldo positivo das “Mais-Valias”, de acordo com as regras ínsita no CIRS para essa categoria de rendimentos”.
  4. Sendo que “...o ónus de prova dos valores de aquisição dos elementos que o requerente alega que devem ser tributados, não como parte dos rendimentos de capitais, sob a forma de juros, mas em especial como rendimentos da categoria G do IRS, para o apuramento exato do saldo positivo das correspondentes “Mais-Valias” recai sobre o Requerente, que os invoca”.
  5. Acrescendo que “... alegando o Requerente que o Agente Pagador Suíço também desconhece os “valores de aquisição”, dever ser o proprietário dos valores mobiliários, na origem dos elementos dos rendimentos em causa, ou seja, o Requerente que se encontra em condições de produzir prova bastante do alegado e não a Autoridade Fiscal da Suíça e muito menos a AT, dado tratar-se de rendimentos sob a forma de juros, visados pelo disposto no Acordo com suporte em conta bancária aberta na Suíça, no Banque C..., A.G. e antes no Banque D...”.
  6. E conclui que “na falta de prova bastante do alegado pelo Requerente, prevalece a Informação prestada pela Autoridade Fiscal da Suíça à AT portuguesa, nos termos do Acordo, atinente a rendimentos sob a forma de juros, em montante total equivalente a € 183.132,00 como consta na Declaração Oficiosa de Correção, que deu origem à Liquidação n.º 2019..., objeto da presente impugnação”. 
  7. Termina pugnando pela improcedência do PPA.

 

Em sede de alegações a Requerida reitera o que referiu na Resposta ao PPA e acrescenta quanto à testemunha que foi inquirida o seguinte: “da inquirição à testemunha resultou, como a própria reconheceu, que os valores comunicados pela autoridade fiscal Suíça foram no montante de € 183.132, 00, não conseguindo a mesma explicar esse valor nem tão pouco provar que o mesmo estava incorreto”.

 

***

 

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º, e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT.

 

 

 

As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

 

2. Matéria de facto

 

Consideram-se provados os seguintes factos, com relevo para a decisão:

 

  1. O Requerente era residente fiscal em Portugal no ano de 2015 e entregou, em 30 de Outubro de 2019, uma declaração de substituição da declaração modelo 3 de IRS, relativa ao ano de 2015, acompanhada do anexo J, no qual, entre outros rendimentos, declarou como rendimentos de fonte estrangeira, (1) no Quadro 8A- Rendimentos de Capitais Categoria E, a título de dividendos ou lucros e juros, o valor total de € 8.442,05, (2) no Quadro 9.2A- Rendimentos Categoria G Incrementos Patrimoniais, a título de mais valias na alienação onerosa de partes sociais e outros valores mobiliários, o valor total de € 48.875,40, que identificou sob os respetivos códigos: GO1 - alienação onerosa de acções/partes sociais -, G1O - alienação onerosa ou reembolso de obrigações e outros títulos de dívida - e G20 - resgates ou alienação de unidades de participação ou liquidação de fundos de investimento - (3) e no Quadro 9.2B, a título de outros incrementos patrimoniais a quantia de € 7.443,17, tendo optado pelo englobamento  – conforme artigos 4º a 7º do PPA, documento nº 5 em anexo ao PPA,  artigo 3º da Resposta da AT e instruções de preenchimento do Anexo J do Modelo 3 do IRS publicadas pela AT no seu site quanto aos códigos do quadro do quadro 9.2 A;
  2. A declaração de substituição apresentada pelo Requerente deu origem à liquidação de IRS n.º 2019..., de 09.12.2019, onde foi apurado o valor de € 54.738,05 resultando, após acerto de contas, o valor a pagar de € 20.610,93 – conforme artigo 8º do PPA, artigo 4º da Resposta da AT e documentos nºs 6 e 7 juntos com o PPA;
  3. O Anexo J do Modelo 3 do IRS apresentado pelo Requerente, relativo aos proveitos obtidos na Suíça, foi preenchido pela testemunha B..., na qualidade de consultora fiscal, com base na reconciliação de dados entre o extracto de movimentos e documentos que titulam a aplicação de capitais, movimentação e produção de proveitos, emitidos pelo Banco agente pagador (Banque C... SA, com sede em Genebra) e ainda com base no extracto patrimonial emitido pelo Banque D... (com sede em Pully) com data de 04 de Setembro de 2014, de onde foram transferidos os activos financeiros, tendo previamente elaborado um mapa resumo para o seu preenchimento, identificando  os valores mobiliários que integravam o portfolio do Requerente, referindo o ISIN, incluindo os respectivos valores de aquisição e valores de realização, o saldo das mais e menos valias apurado com referência a cada uma das transacções, bem como as despesas incorridas  – conforme artigos 9º e 14º do PPA, documentos nºs 9 a 14 juntos com o PPA, PA5 e PA 8 juntos pela Requerida em anexo à Resposta e depoimento da testemunha B...;
  4. Em dia não concretamente apurado de Outubro de 2019, o Requerente foi notificado pela Direção de Finanças de Aveiro para proceder à correção dos valores constantes no anexo J da declaração modelo 3 referente a 2015,  por nela não constar terem sido declarados rendimentos sob a forma de juros, no valor de € 183.132,00, que tinham sido comunicados pela Suíça, ao abrigo da Diretiva da Poupança, tendo o Requerente, em resposta, referido que tinha declarado todos esses valores no modelo 3 de IRS entregue em 30/10/2019, juntando o documento ora junto ao PPA com a designação de Documento nº 13, acrescentando que os valores comunicados pelas autoridades fiscais da Suíça não respeitavam exclusivamente a juros, mais sim a rendimentos da categoria E e da categoria G, nos termos declarados no anexo J entregue em 30/10/2019 -  conforme artigos 5º e 6º da Resposta da AT,  artigo 10º a 12º do PPA e Documento nº 13 junto com o PPA;
  5. O Requerente, na Resposta referida na alínea anterior, juntou um documento emitido pelo Banque C..., SA no qual esta entidade referia que na comunicação às autoridades fiscais suíças “não tinha individualizado na sua comunicação os rendimentos auferidos pelo Requerente a titulo de mais valias”, além dos documento nº 13 junto com o PPA (mapa com 43 transacções de valores mobiliários), reconciliando os  documentos nºs 12 e 9 a 11 ora juntos com o PPA – conforme artigos 13º e 14º  do PPA e falta de impugnação especificada da AT nos termos do artigo 110º-7 do CPPT;
  6. A Requerida procedeu à correção oficiosa à declaração de rendimentos de 2015, tendo sido emitida a liquidação adicional de IRS n.º 2019..., com o valor de € 92.534,86, correspondendo à nota de cobrança n.º 2019... (acerto de contas 2019...), no valor de € 37.796,81 – conforme artigo 7º da Resposta da AT ao PPA e artigos 15º e 16º do PPA;
  7. O Requerente apresentou a reclamação graciosa contra a liquidação atrás referida, à qual foi atribuído o n.º ...2020..., sobre a qual recaiu o despacho de indeferimento que lhe foi notificado, nele constando a seguinte fundamentação:

“V. DA ANÁLISE DO PEDIDO

9.   Está em causa, na presente reclamação, aferir se os valores corretos, a incluir no anexo J da declaração modelo 3 de 2015, são os que os reclamantes indicaram no anexo J da declaração de substituição que apresentaram em 30/10/201 9 (concretamente nos quadros 8A, 9.2A e 9.2B). Ou se, por sua vez, é de manter nos termos em que foi preenchido, pela AT, o anexo J da declaração modelo 3 que originou a liquidação reclamada,

10. As alegações e a documentação de suporte apresentadas pelos reclamantes, com vista a provar que foi correto o preenchimento do anexo J da declaração que submeteram em 30/10/2019, foram, atenta a sua especificidade, remetidos à DSRI, para efeitos de análise, por e-mail datado de 23/07/2020.

11. Através da Informação nº 1228/2021, sancionada por despacho, de 22/07/2021, do Diretor de Serviços de Relações Internacionais, foram prestados os esclarecimentos que, seguidamente, se passam a transcrever:

"1. A Unidade dos Grandes Contribuintes (UGC) solicitou parecer de apoio para efeito da decisão a tomar sobre a Reclamação (Processo Nº ...2020...) apresentada pelos contribuintes A... (NIF...), e E... (NIF...), do IRS de 2015.

2.   A Direção de Finanças de Aveiro havia antes solicitado um esclarecimento relativo aos rendimentos sob a forma de juros visados pelo disposto no Acordo celebrado pela União Europeia com a Suíça contendo medidas idênticas às da Diretiva da Poupança, doravante Acordo, obtidos no ano de tributação de 2015 pelo Contribuinte.

3.   Ao pedido feito pela Direção de Finanças de Aveiro corresponde o Processo instaurado nesta Direção de Serviços, com o Número .../2019, no âmbito do qual foi elaborada a Informação nº .../2019, sancionada em 2019-11-28, e enviada à Consulente em 2019-11-29, através da Comunicação Nº ... (Informação e Comunicação aqui reproduzidas na íntegra).

4.   O pedido concreto da UGC refere-se aos valores a considerar para efeito do IRS de 2015, tendo em atenção a Informação antes prestada pela Autoridade Fiscal da Suíça à Autoridade Tributária Portuguesa, ao abrigo do disposto no Acordo, e os documentos que o Contribuinte alega constituírem prova do contrário.

5.   A análise restringe-se à matéria objeto do concreto pedido de parecer de apoio por parte da UGC, contando para esse fim com os elementos, designadamente registos informáticos, ao dispor da Autoridade Tributária Portuguesa.

6.   Após consulta efetuada ao Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes (SGRC), verifica-se que os Contribuintes constavam, em 2015, e continuam a constar, como residentes em território português.

7.   Por seu turno, a Autoridade Fiscal da Suíça prestou Informação, ao abrigo do disposto no Acordo, à Autoridade Tributária Portuguesa, respeitante ao Contribuinte, considerado residente fiscal de Portugal, e relativa aos rendimentos sob a forma de juros pagos por agente naquele Estado, em 2015.

8.   Por último, mas não menos importante, os Contribuintes entregaram as Declarações de Rendimentos para efeito do IRS de 2015, primeira e de Substituição, como "Casados", tendo optado pela tributação conjunta dos rendimentos, havendo-se considerado como residentes em território português naquele ano de tributação, ao que acresce o facto de se desconhecer que a residência fiscal em Portugal em 2015, integre agora a matéria controvertida, na Reclamação apresentada.

9.   Por conseguinte, haver-se-ão os Contribuintes como residentes fiscais de Portugal em 2015, quer ao abrigo do disposto na legislação fiscal portuguesa, como em conformidade com o disposto nas Convenções celebradas por Portugal para eliminação das duplas tributações ao nível internacional, e designadamente, em conformidade com o disposto na Convenção sobre Dupla Tributação celebrada entre Portugal e a Suíça (CDT Portugal — Suíça).

10. Os Contribuintes, na Reclamação apresentada, remetem para a Declaração de Substituição, entregue em 2019-10-30, à qual foi atribuída a referência ..., que deu origem à Liquidação Nº 2019..., feita em 2019-10-31, alegando que os valores inscritos no Anexo J que a acompanha, relativos a rendimentos da titularidade do Contribuinte, residente em território português, devem prevalecer para efeito da Liquidação do IRS, se bem compreendido, dado que o IRS é um imposto cedular, pelo quo assiste o Direito ao Contribuinte de desagregar os Rendimentos de Capitais obtidos no estrangeiro, em função das diferentes categorias para efeito do IRS, no caso, as categorias E, e G, considerando-se o valor anual dos rendimentos para a incidência do Imposto, depois de efetuadas as correspondentes deduções e abatimentos, ficando muito embora sujeitos a tributação esses rendimentos, independentemente do local onde se obtenham, da moeda ou forma porque sejam auferidos, ao abrigo do disposto no Artigo 1º do Código do IRS.

11. Naquela conformidade, o Reclamante alega que os diversos elementos dos rendimentos sob a forma de juros visados pelo disposto no Acordo, objeto da informação prestada pela Autoridade Fiscal da Suíça à Autoridade Tributária Portuguesa, correspondem afinal, para efeito do IRS de 2015, a Dividendos, Juros (sem retenção em Portugal), e rendimentos da categoria G do IRS, em particular, certas Mais-Valias.

12. Refira-se, a este propósito, que o Acordo toma por referência a Diretiva da Poupança, e nesta, previu-se no seu artigo 8º, número 2, último parágrafo, poderem os Estados-Membros “...limitar o conteúdo mínimo das informações que o agente pagador deve comunicar no que se refere ao pagamento de juros, ao montante total dos juros ou dos rendimentos e ao montante total do produto da cessão, do resgate ou do reembolso”.

13. Parece, pois, legitimo afirmar, perante uma lacuna no Acordo quanto ao conteúdo mínimo da Informação a prestar pela Autoridade Fiscal da Suíça, que esta lacuna só poderá ser integrada interpretando-se a obrigação de comunicação em contexto idêntico ao que tem na Diretiva, que o Acordo toma por referência, pelo que o sentido e alcance do disposto no artigo 8º, número 2, último parágrafo, da Diretiva, será aplicável para efeito do Acordo, no que respeita à comunicação da Informação.

14. Foi nesta conformidade recebida Informação da Autoridade Fiscal da Suíça, relativa a rendimentos sob a forma de juros visados pelo disposto no Acordo, da titularidade do Contribuinte, por este obtidos no ano de tribulação de 2015.

15. Os referidos rendimentos foram pagos ao Contribuinte em 2015 pelo agente suíço com a firma Bank C..., AG., com suporte na Conta N. 0 (abreviado)..., no montante total equivalente a euros 183.132,00.

16. Estando em causa o lançamento e liquidação do IRS de 2015, reconhece-se o facto de se tratar de imposto cedular, pelo que o Contribuinte pode, comprovadamente, distinguir os elementos das suas categorias, na Declaração, para efeito de Liquidação.

17. Os Contribuintes não alegam qualquer dedução específica aos rendimentos da categoria E, e optaram pela tributação a taxa especial de todos os rendimentos da titularidade do Contribuinte obtidos no estrangeiro, portanto, não englobados, para tributação às taxas gerais.

18. Restam, pois, os elementos dos rendimentos obtidos no estrangeiro que o Contribuinte alega serem da categoria G do IRS, em particular, certas "Mais-Valias».

19. Parece, tal como referido pela UGC no pedido de parecer de apoio, que na Reclamação, os Contribuintes reiteram os argumentos utilizados no âmbito do procedimento tendente à liquidação adicional de imposto, que acabou por ser feita pela Autoridade Tributária Portuguesa, com suporte. de resto, nos mesmos documentos já remetidos à Direção de Finanças de Aveiro.

20. Sucede que tal como os Contribuintes reconheceram, do forme expressa, na Petição Inicial da Reclamação, a enumeração dos factos geradores de imposto atinentes às alegadas “Mais-Valias” é meramente exemplificativa, quando, para a correta Liquidação desses elementos dos rendimentos, como da categoria G do IRS, teria de ser exaustiva, adquirindo especial relevo. em função do alegado pelos Contribuintes, a comprovação documental dos valores de aquisição, atinentes aos correspondentes elementos dos rendimentos, sem os quais se torna impossível apurar o saldo positivo das “Mais-Valias”, de acordo com as regras ínsitas no Código do IRS para tal categoria de rendimentos.

21.  Retira-se, a este propósito, que a Informação prestada pela Autoridade Fiscal da Suíça à Autoridade Tributária Portuguesa ao abrigo do disposto no Acordo faz fé, em conformidade com o disposto no Artigo 76º da Lei Geral Tributária (LGT), sem prejuízo da prova (documental) em contrário por parte do Contribuinte, pelo que, o ónus de prova dos valores de aquisição dos elementos que o Contribuinte alega que devem afinal ser tributados, já não como parte dos rendimentos de capitais, sob a forma de juros, mas em especial, como rendimentos da categoria G do IRS, isto, para o apuramento exato do saldo positivo das correspondentes «Mais-Valias», recai sobre o Contribuinte, que os invoca.

22. Afigura-se, de resto. nas circunstâncias dadas, alegando o Contribuinte que o Agente Pagador Suíço também desconhece os alegados “valores de aquisição”, ser o proprietário dos valores mobiliários, na origem dos elementos dos rendimentos em causa, ou seja, o Contribuinte, que se encontra em condições de produzir prova bastante do alegado, e não a Autoridade Fiscal da Suíça, por remissão para o conteúdo mínimo da Informação Automática, muito menos a Autoridade Tributária Portuguesa, dado se tratar de rendimentos sob a forma de juros, visados pelo disposto no Acordo, pagos com suporte em Conta Bancária aberta na Suíça, à data do pagamento, no Bank C..., A.G., antes, conforme alegado pelo Contribuinte, no Banque D... .

23. A referida prova documental poderá bem passar pelos comprovativos de aquisição das quantidades dos valores mobiliários, aos quais tenha sido atribuído código internacional (Código ISIN), objeto da realização atinente aos pagamentos correspondentes, feitos em 2015 pelo Bank C..., A.G. ao Contribuinte.

24. Na falta de prova bastante do alegado, restará, salvo melhor opinião, e tal como antes referido na Informação n. .../2019, fazer prevalecer a Informação prestada sobre a matéria, pela Autoridade Fiscal da Suíça, à Autoridade Tributária Portuguesa, nos termos do Acordo, atinente a rendimentos sob a forma de juros, em montante total equivalente a Euro 183.132, como constam, à presente data, na Declaração Oficiosa de Correção, recolhida em 2019-12-03, à qual foi atribuída a referência ..., e que deu origem à Liquidação Vigente do IRS de 2015, com o Número 2019..., feita aos Contribuintes em 2019-12-16".

12. Afigurando-se-nos de acolher o teor da Informação da DSRI, propõe-se, com base na fundamentação nela vertida, que a liquidação controvertida — liquidação de IRS nº 2019 ... — se mantenha como vigente e a produzir os seus efeitos jurídicos.

 VL. DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE AUDIÇÃO PRÉVIA

13. Após apreciação dos argumentos invocados pelos reclamantes na sua petição inicial, foi, por parte desta unidade orgânica elaborado o competente projeto de decisão integrante dos autos, consubstanciado na nossa anterior Informação nº 202-AlR2/2021.

14. Através de ofício emanado da UGC, os reclamantes foram devidamente notificados para, querendo, exercer, no prazo de 15 (quinze) dias, o seu direito de participação, na modalidade de audição prévia, sob a forma escrita, nos termos do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 60º da LGT, por sua vez conjugado com o preceituado no artigo 122º do Código do Procedimento Administrativo (CPA).

15. Em 17/09/2021, foi enviado para esta unidade orgânica um requerimento conducente ao exercício do aludido direito de participação (juntamente com diversos documentos), no qual o reclamante:

-    Identifica os documentos que remeteu no âmbito do procedimento que correu termos na Divisão de Tributação e Cobrança da Direção de Finanças de Aveiro;

-    Revela que se "impõe nova junção integral" de tais documentos;

-    Refere que em momento algum suscitou ou questionou a sua residência fiscal em 2015;

-    Alude ao facto de ter sido reconhecido na Informação n" 1228/2021 que os rendimentos declarados pela Autoridade Fiscal da Suíça sob a forma de juros podem corresponder em Portugal, para efeitos de IRS, a juros, dividendos e/ou rendimentos de categoria G;

-    Alega que os elementos e documentos remetidos à Divisão de Tributação e Cobrança da Direção de Finanças de Aveiro "aparentemente (...) não chegaram ao conhecimento da entidade que emitiu o parecer pois esta afirma, conforme resulta do ponto 18, 20 e 21 da Informação 1228/2021 emitida pelos Serviços de Relações Internacionais, que o Contribuinte não apresentou prova documental bastante, tendo-se limitado a uma enumeração meramente exemplificativa",

-    Alega que a informação prestada pelas autoridades suíças, que consta do documento no 2, não corresponde, com exceção da operação1, a rendimentos de categoria E;

-    Invoca que todas as restantes 42 transações, reproduzidas no documento nº 55, constituem rendimentos da categoria G.

VII. DA ANÁLISE DO DIREITO DE AUDIÇÃO PRÉVIA

16. Após a leitura das alegações do reclamante, impõe-se clarificar que:

-    a residência fiscal do reclamante e do cônjuge em Portugal, com referência ao ano de 2015, não é um facto controvertido, sendo que a sua referência, na Informação no 1228/2021, teve como único propósito enquadrar a situação tributária dos contribuintes, no que se refere à sua residência fiscal;

-    de facto, reconheceu-se, nessa Informação, que o IRS é um imposto cedular, em que um contribuinte pode distinguir as suas diversas categorias na declaração de rendimentos, no entanto, tratou-se de uma afirmação em abstrato, sem nenhuma conclusão quanto à natureza dos rendimentos e respetivo valor, constantes dos documentos enviados;

-    os documentos a que o reclamante faz alusão na petição de audição prévia, denominados "Doc. nº 1 “Doc. nº 2", "Doc. nº 3.1". e "Doc. 4" (documentos que não foram elaborados pelo reclamante - de referir que os documentos 5 e 6. assim denominados pelo reclamante, não são, em rigor, documentos, nos termos que o Código Civil se refere nos artigos 362º e seguintes. São meros mapas/quadros da inteira do reclamante, portanto, por si elaborados) foram, efetivamente, remetidos para a DSRI no âmbito do já aludido e-mail de 23/07/2020, tendo, portanto, os mesmos sido naturalmente objeto de examinação por parte daquele Serviço.

17. Acresce, por outro lado, referir que, de acordo com o artigo 60º nº 7 da LGT "[o]s elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão".

18. Ora, o reclamante, em sede de audição prévia, não invocou nenhum facto e/ou argumento novo nem trouxa aos autos documentação distinta da já enviada anteriormente.

19. Pelo que, na estrita medida em que, conforme aludido, apenas os novos elementos apresentados deverão, nesta sede, ser objecto de consideração e análise, em face da sua ausência, continuamos a acompanhar as conclusões da DSRI, expostas na Informação nº 1228/2021, elaborada na sequência de pedido de análise dos documentos a que o reclamante vem aludir no seu requerimento.

20. Em suma, considerando-se a permanência da validade dos pressupostos que, de facto e de direito, alicerçaram o nosso anterior projeto de decisão, assente na Informação da DSRI, acima identificada, entendemos peia definitividade do mesmo, com todas as consequências legais.

 VIII. DA CONCLUSÃO

Face ao exposto, afigura-se de converter o projeto de INDEFERIMENTO anteriormente notificado em decisão final ...

Afigura-se, ainda, que, em caso de Concordância Superior, se deve promover a notificação dos reclamantes, através de ofício, nos termos do previsto nos artigos 35º a 41º, todos do CPPT, com todas as consequências legais”.

                   - conforme artigo 19º do PPA e documento nº 4 em anexo ao PPA;

  1. O Requerente não pagou o valor referido na alínea F) supra aqui impugnado o que levou à instauração pela AT do PEF n.º ...2020..., o qual se encontra suspenso – conforme artigo 9º da Resposta ao PPA
  2. Em 23.12.2021 o Requerente entregou no CAAD o presente pedido de pronúncia arbitral – conforme registo no SGP do CAAD.

 

 

2.1.  Fundamentação da decisão da matéria de facto.  Factos não provados.

 

            Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o

que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe selecionar os factos que importam para a decisão e

discriminar a matéria provada da matéria não provada (cf. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo

607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

 Os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em

função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis

das questões objeto do litígio (v. 596.º, n.º 1, do CPC, ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do

RJAT).

 Consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

Os factos provados basearam-se nos documentos juntos pelas partes e nos articulados, na parte em que estão em consonância, de forma expressa ou implícita, com os factos alegados por ambas. Por cada alínea dos factos provados, são indicados os documentos ou artigos das peças processuais que não mereceram dissentimento entre as partes e que foram considerados relevantes.

            O depoimento da testemunha inquirida foi, neste caso, muito relevante (vide alínea C) dos factos provados) na medida em que, na qualidade de consultora fiscal, elaborou o Documento nº 14 em anexo ao PPA, que é reconciliação de todos os movimentos ocorridos ao nível dos activos financeiros do Requerente aplicados, o que justifica os valores declarados no Anexo J do Modelo 3.

A reconciliação foi feita “com suporte em Conta Bancária aberta na Suíça, à data do pagamento, no Bank C..., A.G., antes, conforme alegado pelo Contribuinte, no Banque D...”, fazendo a ponte entre o facto dos investimentos terem sido realizados, em primeiro lugar, através dos serviços do Banque D... e depois transferidos para o Bank C..., A.G. Ou seja, a testemunha, realizou o seu depoimento de forma isenta e credível, até porque os elementos que reconciliou integram os documentos nºs 9 a 13 juntos com o PPA, sendo possível escrutinar como chegou à elaboração do referido Documento nº 14 em anexo ao PPA:

            Todos estes documentos tinham, inclusive, já sido apresentados em sede de procedimento gracioso.

Não há outros factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.

 

 

3. Matéria de direito

 

Em primeiro lugar, constata-se que a Requerida não juntou ao processo qualquer documentação que comprovasse qual a Informação, em concreto, que lhe foi prestada pela Autoridade Fiscal da Suíça, ao abrigo do disposto no Acordo de Troca de Informações, limitando-se a alegar que tomou conhecimento de uma informação não documentada e daí retirar a sua força probatória por via do artigo 76º-4 da LGT, suscpetível de prova documental do sujeito passivo, em contrário (vide ponto 21 da fundamentação da liquidação na alínea G) dos factos provados).

Desde logo se poderá retirar, do próprio discurso da Requerida, que se para o sujeito passivo a contraprova só poderia ser documental, por paridade de razão, a prova do teor concreto da comunicação da Autoridade Fiscal Suíça, também deveria revestir a forma documental, fosse ela qual fosse. Ou, pelo menos, produzir alguma prova testemunhal.

 

A propósito de um caso idêntico escrevemos no Processo CAAD 540/2019-T o seguinte: “quanto aos factos ... fulcrais para a resolução deste litígio, tendo em conta:

(1) a presunção de veracidade e boa-fé que beneficiam as declarações dos contribuintes (artigo 75º da LGT);

(2) o ónus que comete à AT em esclarecer a situação tributária, face à informação recebida da Autoridade Fiscal da Suíça (artigo 74º nº 1 da LGT);

considerou este TAS que não foi pedida pela AT portuguesa à AT Suíça, a informação, de forma desagregada, tal como se configura ser praticado em situação inversa (quanto aos rendimentos da poupança gerados em Portugal e pagos a residentes na Suíça), tendo em conta o que consta nas instruções de preenchimento dos Modelos 35 e 36 do IR, que dão expressão prática à recolha de informação para troca entre Estado português ..., ao nível dos rendimentos da poupança, a saber:

Uma imagem com mesa

Descrição gerada automaticamente

            Daqui poderá retirar-se que, se nas relações inversas de comunicação à Autoridade Fiscal Suíça, pela Autoridade Fiscal Portuguesa, são os próprios bancos portugueses que facultam a informação base, com alguma desagregação nos termos acima indicados, o problema de fundo pode residir no facto da Autoridade Fiscal Suíça, no modelo de recolha da informação perante os Bancos Suíços quanto a residentes em Portugal, não proceder de forma simétrica, facultado apenas a soma global dos valores creditados em conta bancária, sejam eles juros, dividendos, reembolso de obrigações ou outros créditos. Isto pressupondo que a Autoridade Fiscal Portuguesa comunica à Autoridade Fiscal Suíça a informação desagregada, tal como a obtém junto dos bancos com sede em Portugal.

 

De facto, tal como a Requerida refere no artigo 15º do PPA da Resposta: “o Acordo toma por referência a Diretiva da Poupança e nesta previu-se no art. 8., n.º 2, poderem os Estados-Membros “…limitar o conteúdo mínimo das informações que o agente pagador deve comunicar no que se refere ao pagamento de juros, ao montante total dos juros ou dos rendimentos e ao montante total do produto da cessão, do resgate ou do reembolso.”

O agente pagador na Suíça, face a este normativo que certamente existe ao nível do direito interno daquele país, comunicou à Autoridade Fiscal Suíça, uma única soma total dos (1) juros pagos (2) outros rendimentos (3) produto da cessão, do resgate ou do reembolso; que por sua vez retransmitiu à Autoridade Fiscal Portuguesa.

Assim tendo ocorrido, como se pode retirar dos factos provados, configura-se que, à AT portuguesa não poderá deixar de competir o apuramento

 (1) perante a AT Suíça para que o suscite ao agente pagador suíço,

(2) ou junto do próprio contribuinte para que obtenha elementos da entidade bancária Suíça de que é cliente,

dos elementos necessários para determinar a desagregação do valor global comunicado por via do Acordo de Troca de Informações entre os dois Estados, em caso de fundadas divergências.

                        Na decisão CAAD Processo 68/2019-T, com contornos em tudo semelhantes aos deste caso, escreveu-se:

38. ... as autoridades fiscais suíças comunicaram à AT a informação de que foram pagos rendimentos sob a forma de juros, na quantia de € ..., reportados ao Requerente. Fizeram-no, desde logo, porque os mesmos se enquadram no conceito amplo de “pagamento de juros” relevante para efeitos de obrigação de comunicação de informação. No entanto, a comunicação foi feita de forma sintética, pela totalidade, sem desagregar a informação relativamente às várias subcategorias de rendimento.

39. Este aspeto reveste-se de grande importância prática, na medida em que, se é certo que, nos termos e para efeitos do regime de comunicação da informação da Diretiva e do Acordo, as operações subjacentes aos rendimentos em causa devem ser qualificadas como “pagamentos de juros”, daí não decorre necessariamente que, uma vez desagregadas, as mesmas devam sempre ser consideradas como “juros” para efeitos de tributação em sede de Categoria E.

40. A tributação direta continua a ser competência reservada aos Estados, não tendo sido objeto de harmonização pelo direito da União Europeia em matéria de incidência subjetiva e objetiva – sem prejuízo da sua subordinação aos respetivos princípios estruturantes (v.g. não discriminação em razão da nacionalidade e residência, salvaguarda da concorrência não falseada no mercado interno). De resto, quer a Diretiva Poupança, quer o Acordo, apontam para o objetivo de que a tributação efetiva dos rendimentos auferidos pelo beneficiário efetivo seja feita em conformidade com a legislação do Estado da sua residência. Assim sendo, continua entre nós a ser ao CIRS que cabe qualificar os diferentes tipos de rendimento, incluindo os obtidos no estrangeiro, para efeitos de subsunção às diferentes categorias de tributação.

41. No caso concreto, foi com base na informação transmitida, resultante do mecanismo de troca automática, que foi desencadeado o processo referente à correção da declaração modelo 3 de IRS do ano de .... Pretendia-se, desse modo, aplicar aos juros pagos o disposto no artigo 5.º do CIRS, respeitante à Categoria E, dos rendimentos de capitais, que inclui, nomeadamente, os juros e outras formas de remuneração de títulos de participação.

...

48. A tributação dos rendimentos das diferentes categorias depende da verificação do correspondente facto tributário, constitutivo da relação jurídico-tributária (artigo 36.º, n. º1, da LGT). Os princípios da justiça e da verdade material obrigam a que sejam tomados em conta os elementos probatórios adequados e necessários à respetiva comprovação. À AT incumbe, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido. Nos termos do artigo 100.º, n. º1, do CPPT, «sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o ato impugnado ser anulado»”.

 

Mesmo que assim não fosse, ao nível do ónus da prova que recai sobre a AT, provou-se em C) da matéria facto, que os valores declarados pelo Requerente no Anexo J do Modelo 3, estão em conformidade com a verdade material, face à informação disponibilizada pelos dois bancos que trataram dos investimentos do Requerente na Suíça.

Acrescendo que, a prova produzida pelo Requerente (conforme também a alínea C) dos factos provados), será susceptível de causar no julgador dúvida fundada, quanto à existência e quantificação do facto tributário, pelo que nos termos do artigo 100.º, n. º1, do CPPT, a liquidação aqui em dissídio sempre teria que ser anulada, por desconformidade com o artigo 5ºdo CIRS, porque não podem ser tributados como juros os rendimentos que não cabem na previsão desta norma.

 

Procede, pois, o PPA.

           

            4. Decisão

 

Nestes termos decide este Tribunal Arbitral julgar procedente o PPA e consequentemente anular à liquidação referida em F) dos factos provados e bem assim a decisão que recaiu sobre a reclamação graciosa referida em G) da matéria de facto assente.

 

5. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 1, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 37 796,81.         

 

6. Custas

 

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 1 836,00 face à Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida, por ter decaído na totalidade (artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC e 122.º, n.º 2, do CPPT).

    

Lisboa, 29 de Maio de 2022

Tribunal Arbitral Singular,

Augusto Vieira