Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 730/2021-T
Data da decisão: 2022-03-22  IRS  
Valor do pedido: € 49.970,72
Tema: IRS – preterição do direito de audição; falta de fundamentação; mais-valias: exclusão de tributação prevista no art.º 10.º nº 5 do CIRS.
Versão em PDF

 

Sumário:

À luz da alínea a) do n.º 2 do artigo 60.º da LGT, é dispensa a audição, no caso de a liquidação se efetuar com base na declaração do contribuinte. O sujeito passivo não procedeu à comunicação da declaração do reinvestimento do valor de realização, como o impõem o n.º 4 do artigo 57.º do CIRS, quando previamente já tinha procedido à declaração do valor a reinvestir.

O dever de fundamentação formal do ato de liquidação, encontra-se preenchido quando se revela a compreensão pelo sujeito passivo do fundamento que permitiu a elaboração da liquidação adicional.

É uma condição essencial para efeitos do direito à exclusão de tributação prevista no art.º 10º nº 5 do CIRS, que o imóvel alienado seja destinado à habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, quando essa condição não é cumprida pelo sujeito passivo, não beneficia desse direito à exclusão de tributação.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I - Relatório

A - Identificação Das Partes

A..., portadora do número de identificação fiscal ..., com domicílio fiscal na ..., ...– ... ... -... Canha, doravante designado por “Requerente”, veio ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”) apresentar pedido de pronúncia arbitral tendo em vista a declaração de ilegalidade e anulação do ato tributário de liquidação de IRS do ano de 2016 com o n.º 2020..., na quantia de €49.970,72.

É requerida nos autos a AUTORIDADE TRIBUTARIA E ADUANEIRA, doravante designada por “Requerida” ou “AT”.

Em 11.11.2021, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT, conforme consta da respetiva ata.

Ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitra do tribunal arbitral a Dra. Rita Guerra Alves, que comunicou a aceitação do encargo nos termos legalmente previstos.

Em 31-12-2021, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, e não manifestaram vontade de a recusar, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e dos Artigos 6.º e 7º do Código Deontológico.

Deste modo, o Tribunal Arbitral Singular foi regularmente constituído em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66­B/2012, de 31 de dezembro.

A Requerente, deduziu pedido de pronúncia arbitral de declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação, alegando em suma, o seguinte:

  1. Em 25.05.2007, entregou a sua declaração de IRS referente ao ano de 2016 onde declarou um reinvestimento da mais-valia referente ao prédio urbano sito na ..., n.º..., ..., ..., ...-... Lisboa inscrito sob o artigo ..., tendo feito constar no campo 5006 a sua intenção de reinvestimento.
  2. Passados quase 4 (quatro), em 2 de Novembro de 2020, foi a Requerente notificada de “reliquidação automática”, sem que nunca tenha sido validamente notificada para exercer o seu direito de audição prévia em relação à liquidação em apreço nestes autos.
  3. Mais refere que não foi notificada de qualquer fundamentação, defendendo a falta de fundamentação do ato em causa, alega que a liquidação em apreço não veio acompanhada da respetiva fundamentação padecendo também de vicio de forma.
  4. Termina defendendo que deverá o presente pedido de pronúncia arbitral ser considerado procedente, por provado, determinando-se, em consequência, a total anulação do ato de liquidação de IRS de 2016 e de juros aqui colocados em crise, e no pagamento de juros indemnizatórios, tudo o mais com as necessárias consequências legais.

A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta alegando, sinteticamente o seguinte:

  1. Relativamente à questão da alegada falta de notificação para exercício do direito de audição, alega que não houve qualquer facto novo, resultando a reliquidação do facto de nem no ano da declaração, nem nos seguintes ter inscrito o valor do reinvestimento, obrigação que lhe competia.
  2. E se assim é, mostram-se preenchidos os pressupostos para a dispensa da audição prévia nos termos do disposto do art.º 60.º da LGT, na medida em que a liquidação ora sindicada apenas decorre da declaração a comprovar a manifestação de reinvestimento.
  3. Ora, a liquidação posta em crise, não traduz um verdadeiro ato lesivo do contribuinte, mas na reposição da verdade material, decorrente, ela própria, da intenção manifestada pela Requerente de pretender reinvestir 350.000,00 € do valor de realização do imóvel identificado no campo 4001.
  4. Porque nem na declaração apresentada em 2018 (mais concretamente, no anexo G) nem nas dos anos seguintes foi inscrito o reinvestimento, em 2020OUT20 foi efetuada a reliquidação, o que originou valor a pagar de 49.970,72 €.
  5. Estando reunidos os pressupostos para a dispensa do direito de audição, nos termos do n.º 2  do artigo 60.º da LGT.
  6. No caso em apreço, o ato impugnado resulta da intenção de reinvestimento, consiste numa mera correção aritmética, sem que tenha havido lugar a qualquer instrução procedimental.
  7. Em relação à alegada falta de fundamentação, a Requerida contra argumenta, nem nessa declaração (mais concretamente, no anexo G) nem nas dos anos seguintes foi inscrito o reinvestimento, tendo sido efetuada a reliquidação, o que originou valor a pagar de 49.970,72 €.
  8. Isto é, a liquidação adicional foi efetuada por não ter sido declarado o reinvestimento do valor de realização que foi inscrito como pretendido reinvestir na declaração do ano fiscal de 2016.
  9. Esse ato tributário foi devidamente fundamentado, de facto e de direito, pois a liquidação não surgiu por acaso.
  10. Aliás, consultada a petição de reclamação graciosa apresentada em nome da Requerente, verifica-se que foi perfeitamente entendido o fundamento para a elaboração da liquidação adicional.
  11. Ao que acresce que se a Requerente tinha dúvidas, o que não se concebe, face ao teor da reclamação apresentada na qual, poderia requerer, nos termos do art.º 37.º do CPPT, a notificação dos requisitos que tivessem sido omitidos, o que nunca aconteceu.
  12. Assim, apesar disso, mesmo que tivesse existido falta de notificação da fundamentação, ou se a mesma fosse obscura ou insuficiente, a consequência nunca seria a de considerar que existe nulidade da notificação da liquidação em causa.
  13. Isto porque, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 37º do CPPT, se a comunicação da  decisão em matéria tributária não contiver a fundamentação legalmente exigida,  indicação dos meios de reação contra o ato notificado ou outros requisitos exigidos pelas leis tributárias, pode o interessado, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que  desta decisão caiba, se inferior, requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento.
  14. Assim sendo, a falta dos elementos constantes no artigo 36º n.º 2 do CPPT tem como consequência apenas a alteração da data a partir da qual se conta o prazo para reclamação, recurso ou impugnação judicial, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 37º do CPPT.
  15. Termina a Requerida, sustentando, que será de julgar o pedido totalmente improcedente, mantendo-se o ato tributário na ordem jurídica.

Em 7-03-2022, mediante despacho arbitral, o Tribunal procedeu-se a dispensa a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, e de apresentação de alegações escritas.

O Tribunal Arbitral, advertiu a Requerente para o pagamento da taxa arbitral subsequente até à data da prolação da decisão arbitral, nos termos do n.º 4 do artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”) e da comunicação do pagamento ao CAAD.

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, é materialmente competente nos termos dos arts 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas (art.ºs 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de vícios que o invalidem.

B -       Matéria De Facto

Factos Provados

Cumpre apresentar a matéria factual relevante para a decisão da causa, com base na factualidade acordada, na prova documental constante dos autos, dá o presente Tribunal Arbitral por assente, os seguintes factos:

  1. Por escritura pública outorgada em 08-09-2016, a Requerente alienou por €352.500,00, o direito de propriedade plena sobre o prédio urbano sito na ..., nº ..., ..., ..., ...-... Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ..., concelho de Lisboa, sob o artigo ... . Este imóvel havia sido adquirido em 13-07-2015, pelo montante e € 124.000,00.
  2. À data da alienação, o domicílio fiscal da Requerente era na Av. ..., ..., ..., ...-... Lisboa.
  3.  À  data da alienação, a Requerente não tinha o seu domicílio fiscal no imóvel alienado, nem nunca teve o seu domicilio fiscal no imóvel alienado.
  4. Por escritura pública lavrada em 28-03-2017, a Requerente adquiriu por €350.000,00, o direito de propriedade sobre o imóvel a que corresponde a fração "O" do prédio urbano sito na R. ..., ..., ...-... Lisboa, inscrito na respetiva matriz predial freguesia de ... e concelho de Lisboa, sob o artigo ... .
  5. Este imóvel foi afeto à habitação própria e permanente da Requerente, conforme se alcança da alteração do domicílio fiscal para a morada do imóvel, em 23-06-2017
  6. Em 25 de Maio de 2017, a Requerente entregou a declaração de rendimentos do ano fiscal de 2016.
  7. Por escritura pública lavrada em 10-08-2017, a Requerente alienou prédio urbano sito na R. ..., ..., ...-... Lisboa, inscrito na respetiva matriz predial freguesia de ... e concelho de Lisboa, sob o artigo ..., pelo preço de € 555.000,00
  8. Em 24-05-2018, a Requerente submete uma declaração de substituição onde declara no campo 5006 do quadro 5 do anexo G a pretensão de reinvestir 350.000,00 € do valor de realização do imóvel identificado no campo 4001, em concreto o imóvel descrito no supra ponto 1.
  9. A Requerente não procedeu nas declarações fiscais de IRS do ano de 2017 nem nas dos anos seguintes, à inscrição no campo 5 do Anexo G do Mod. 3, do valor do reinvestimento de 350.000,00€ ou outro valor.
  10. Em 25-01-2018, a Requerente alterou o seu domicílio fiscal para a ..., ..., ...-... .
  11. Em 20 de Outubro de 2020, a AT procedeu à reliquidação automática, da declaração de IRS do ano de 2016, que resultou no ato de liquidação n.º 2020... no valor a pagar de 49.970,72 €, e dele notificada a Requerente em 2 de Novembro de 2020.
  12. A Requerente entregou o pedido de reclamação graciosa, ao qual foi atribuído o n.º ...2020..., alvo de indeferimento através do ofício n.º ..., de 1 de Outubro de 2021.
  13. No âmbito do processo de reclamação graciosa, a Requerente foi notificada para o exercício do seu direito de audição,  sem que o tenha exercido.

Factos Não Provados

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. artigos 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao atual artigo 596.º, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

Deste modo, não existem factos relevantes, para a Decisão Arbitral, para além daqueles que se deram como provados.

C - Questões Decidendas

Atenta a posição assumida pelas partes, constitui questão central a apreciar e decidir:

  1. Declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, com o n.º 2020 ... no valor de €49.970,72; e
  2. Condenação no pagamento de juros indemnizatórios.

 

D - Matéria De Direito

A questão colocada nos presentes autos, consiste em determinar se a liquidação em apreço sofre de vicio quanto a falta de audição prévia à pratica do ato de liquidação, se a mesma sofre o vicio de falta de fundamentação, e por ultimo compete analisar os erros sobre os pressupostos de facto e de direito, em concreto determinar se a Requerente preenche os requisitos do n.º 5 do artigo 10.º do CIRS quanto a exclusão de tributação dos ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar.

A Requerente alega em suma, quanto ao não cumprimento do direito de audição previa antes da liquidação, que a AT a notificou da liquidação, sem previamente lhe conceder a possibilidade constitucionalmente consagrada de sobre o projeto de liquidação se pronunciar previamente, alegando ser geradora de vício de procedimento, insuprível, que a falta da referida notificação torna inválido e insubsistente o ato tributário. Mais defende, que a liquidação em apreço não veio acompanhada da respetiva fundamentação, a qual constitui requisito de validade do ato, não poderá subsistir o ato tributário aqui recorrido devendo este ser anulado.

Quanto à matéria referente à mais-valia aplicada pela AT, a Requerente nada alegou ou impugnou em sede arbitral.

A AT, contra-alega, dizendo, da dispensa do direito de audição, não resulta assim, no caso sub judice, qualquer violação do princípio do contraditório, não havendo quaisquer elementos novos que pudessem ser trazidos à colação pelo Requerente que pudessem alterar a fundamentação de acto um tributário já consolidado no ordenamento jurídico, não existe assim qualquer preterição legal, consubstanciadora de qualquer ilegalidade. Mais defende, que quanto à alegada falta de fundamentação, a liquidação adicional foi efetuada por não ter sido declarado o reinvestimento do valor de realização que foi inscrito como pretendido reinvestir na declaração do ano fiscal de 2016, e, obviamente que esse ato tributário foi devidamente fundamentado, de facto e de direito, pois a liquidação não surgiu por acaso. Por último, quanto ao direito à exclusão de tributação prevista no art.º 10º nº 5 do CIRS, a AT defende que não preenche, em virtude de o prédio alienado não constituir o seu domicílio fiscal na data da venda e não ter sido feita prova de que o mesmo alguma vez tivesse sido afeto a sua habitação própria e permanente.

Cumpre apreciar, conforme resulta da factualidade descrita, a Requerente submeteu em 24 de Maio de 2018, a declaração de substituição de IRS do ano de 2016, declarando a pretensão de reinvestir €350.000,00 do valor de realização do imóvel identificado no campo 4001, respetivamente o imóvel sito na ..., nº..., ..., ..., ...-... Lisboa, alienado em 08-09-2016.

Mais resulta, que a Requerente em 28-03-2017 adquiriu por €350.000,00, o direito de propriedade sobre o imóvel a que corresponde a fração "O" do prédio urbano sito na R. ..., ..., ...-... Lisboa, não declarou em 2017, nem nos anos seguintes o referido reinvestimento.

Não tendo sido declarado o reinvestimento, a liquidação adicional foi efetuada por não ter sido declarado o reinvestimento do valor de realização, inscrito pela Requerente como pretendido reinvestir na declaração do ano fiscal de 2016, e a AT emitiu a liquidação ora em apreço, que originou valor a pagar de 49.970,72 €.

Em sede de reclamação graciosa, a Requerente, alegou que esse valor de 350.000,00€ tinha sido revestido em 2017 com a aquisição da fração "O" do prédio urbano sito na R. ..., ..., ...-... Lisboa, imóvel que foi adquirido pela Requerente em 28-03-2017.

Com base nesta nova informação, a AT em sede de reclamação graciosa, verificou que a Requerente nunca teve o seu domicílio fiscal na morada ..., nº ..., ..., ..., ...-... Lisboa, imóvel que originou a presente mais valia alvo da liquidação em apreço, tendo a AT nessa sede, notificado a Requerente para vir exercer o seu direito de audição, a qual não exerceu, ou juntou mais informação ao processo.

A AT decidiu, que a Requerente não tinha direito à exclusão de tributação prevista no art.º 10º nº 5 do CIRS, em virtude de o prédio alienado não constituir o seu domicílio fiscal na data da venda e não ter sido feita prova de que o mesmo alguma vez tivesse sido afeto a sua habitação própria e permanente, mantendo assim a liquidação.

Neste sentido, analisemos as declarações de 2016 e 2017 submetidas pela Requerente. Em 24-05-2018, submete a declaração de substituição referente ao ano de 2016, onde, declara no campo 5006 do quadro 5 do anexo G a pretensão de reinvestir 350.000,00 € do valor de realização do imóvel identificado no campo 4001. Em 30-05-2018, submete a declaração referente ao ano de 2017, onde no quadro 5 do anexo G, não declara o valor reinvestido, em concreto no campo 5008 a 5011, que serve para esse efeito. Contudo a Requerente, declara a alienação do prédio urbano sito na R. ..., ..., ...-... Lisboa, realizada em 10-08-2017, pelo preço de € 555.000,00 e valor de aquisição de 350.000,00€.

Desta forma conclui-se, perante a factualidade descrita, que a Requerente, não procedeu ou comunicou a declaração do reinvestimento do valor de realização, como impõem o n.º 4 do artigo 57.º do CIRS, e desta forma a AT, com base na não declaração, decorridos mais de 36 meses da alienação, procedeu automaticamente à liquidação da mais-valia gerada.

Por último, já em sede de Reclamação graciosa, a Requerente alegou que esse valor tinha sido reinvestido na compra de um imóvel em 2017, contudo a AT entendeu que a Requerente não tem o direito à exclusão de tributação prevista no art.º 10º nº 5 do CIRS, em virtude do prédio alienado não constituir o seu domicílio fiscal, na data da venda e não ter sido feita prova de que o mesmo alguma vez tivesse sido afeto à sua habitação própria e permanente. Prova que não foi feita pela Requerente em sede da reclamação graciosa, bem como não adicionou novas informações em sede da reclamação graciosa ou aquando do exercício do direito de audição.

Igualmente em sede do presente processo arbitral, a Requerente não alega que o referido imóvel tenha sido a sua habitação própria e permanente, ou junta qualquer prova a atestar.

Neste sentido, e perante a factualidade anteriormente exposta, iniciaremos pela análise da questão do vicio quanto à falta de audição prévia à prática do ato de liquidação em apreço.

Ora, da análise do probatório dos presentes autos, resulta que a Requerente, não foi notificada para o exercício do seu direito de audição antes da emissão do ato de liquidação aqui em apreço.

Por conseguinte, a questão aqui decidir é a de saber, se existiu violação de preterição do exercício do direito de audição antes da liquidação.

Sobre o princípio da participação e o consequente direito de audição, estabelece o artigo 60.º da LGT, o seguinte:

“Artigo 60.º

Princípio da participação

1 - A participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efectuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, por qualquer das seguintes formas:

a) Direito de audição antes da liquidação;

b) Direito de audição antes do indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições;

c) Direito de audição antes da revogação de qualquer benefício ou acto administrativo em matéria fiscal;

d) Direito de audição antes da decisão de aplicação de métodos indirectos, quando não haja lugar a relatório de inspecção;

e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária.

2 - É dispensada a audição:

a) No caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte ou a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe seja favorável;

b) No caso de a liquidação se efectuar oficiosamente, com base em valores objectivos previstos na lei, desde que o contribuinte tenha sido notificado para apresentação da declaração em falta, sem que o tenha feito.

3 - Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dispensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais se não tenha pronunciado.

4 - O direito de audição deve ser exercido no prazo a fixar pela administração tributária em carta registada a enviar para esse efeito para o domicílio fiscal do contribuinte.

5 - Em qualquer das circunstâncias referidas no n.º 1, para efeitos do exercício do direito de audição, deve a administração tributária comunicar ao sujeito passivo o projecto da decisão e sua fundamentação.

6 - O prazo do exercício oralmente ou por escrito do direito de audição é de 15 dias, podendo a administração tributária alargar este prazo até o máximo de 25 dias em função da complexidade da matéria.

7 - Os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão. “

 

A este propósito importa, reter, o princípio da audiência dos interessados previsto no n.º 1 do artigo 100.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), embora não corresponda a um direito fundamental, é uma concretização do modelo da administração participada expresso no n.º 5 do artigo 267.º da C.R.P., que impõe à Administração Pública o principio da participação dos particulares na formação das decisões que lhe digam respeito, sendo uma das manifestações mais flagrantes do modelo da Administração aberta.

O direito de audição, encontra a sua consagração constitucional no artigo 267.º, n.º 5, da CRP: “o processamento da atividade administrativa será objeto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito”.

Como decorre da norma constitucional, o regime do direito de audição é relegado para «lei especial», a definição dos termos em que tal direito será exercido, o que no caso presente, encontramos o seu regime no disposto no artigo 60.º da LGT:

Com efeito, o direito ou o dever de audição-prévia, constitui uma garantia de defesa dos particulares, de modo a permitir a justeza e a correção do ato final do procedimento.

Dada a sua importância, o direito de audição-prévia só pode ser dispensado nas situações legalmente previstas no artigo 60.º, n.º 2 e 3 da LGT.

É entendimento jurisprudencial, a existência de duas situações em que a omissão previa da audição poderá não ter consequências invalidantes.

Tem sido admitido o princípio do aproveitamento do ato tributário, quando a intervenção do interessado no procedimento tributário for inequivocamente insuscetível de influenciar a decisão final, o que acontece em geral, nos casos em que se esteja perante uma situação legal evidente, ou, se trate de atividade administrativa vinculada, não se vislumbrando a mínima possibilidade de a audição poder ter influência sobre o conteúdo da decisão. (Ac. do STA n.º 0548/12 de 24-10-2012 Relator: Fernanda Maçãs)

O que exige um exame casuístico, de análise das circunstâncias particulares e concretas de cada caso, com vista a aferir se se está ou não perante uma situação de absoluta impossibilidade de a decisão do procedimento ser influenciada pela participação do interessado. (Ac. do STA n.º 01391/14 de 25-06-2015 Relator: Francisco Rothes).

Na segunda situação, havendo procedimento de segundo grau, quer o ato primário tenha sido mantido quer tenha sido alterado e substituído pelo ato do segundo grau, “...a decisão administrativa final acaba por ser o ato de segundo grau, pelo que deverá ser em relação a este ato que deverá aferir-se se o contribuinte teve ou não oportunidade de participar na sua formação” Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa in "Lei Geral Tributária" anotada, 2012, pp. 517. (Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, processo: 01196/05.0BEPRT de 02-02-2017)

Como nos diz também o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo no processo: 02046/04.0BELSB de14-10-2020: “O afastamento do efeito anulatório por preterição do direito de audiência, por via da aplicação do princípio do aproveitamento do acto administrativo, apenas pode ocorrer quando a intervenção do interessado no procedimento tributário for inequivocamente insusceptível de influenciar a decisão final, o que acontece, em geral, nos casos em que se esteja perante uma situação legal evidente ou se trate de actividade administrativa vinculada.”.

Retomando os autos, da factualidade descrita nos presentes autos, face ao regime legal gizado, a AT emitiu a ora liquidação, com base nos dados fornecidos pelo sujeito passivo.

Sobre as obrigações do sujeito passivo, estabelece a aliena a) do  n.º 4 do artigo 57.º do CIRS, à data, o seguinte:

4 - Para efeitos do disposto nos n.os 5 a 7 do artigo 10.º, devem os sujeitos passivos: a) Mencionar a intenção de efetuar o reinvestimento na declaração do ano de realização, indicando na mesma e nas declarações dos dois anos seguintes, os investimentos efetuados;

Compete assim, à Requerente declarar o valor do reinvestimento pretendido, e declarar o valor do reinvestimento quando feito, através do Mod. 3 anexo G, quadro 5 campo 5008 a 5011.

A liquidação foi efetuada com base nas declarações do sujeito passivo, como lhe é exigido nos termos do estabelecido na aliena a) do n.º 4 do artigo 57.º do CIRS em concreto, a Requerente declarou a intenção de efetuar o reinvestimento do valor de realização do imóvel, para o ano de 2016, contudo não procedeu nos anos seguintes à declaração do valor reinvestido.

Em concreto, a AT, tinha em sua posse o valor do reinvestimento declarado pela Requerente em 24 de Maio de 2018, mediante a declaração de substituição de declaração de IRS do ano de 2016, contudo não foi declarado pela Requerente nos anos seguintes o revestimento desse valor.

Perante a factualidade, atendendo que a AT procedeu à liquidação, com base na falta de declaração do valor do revestimento, e tendo decorridos mais de 36 meses da data da alienação, a liquidação foi feita com base na declaração do contribuinte, enquadrando-se n.º 2 alínea a) do artigo 60.º, LGT, permitindo a dispensa do direito de audição.

Mais se diga, que a Requerente, foi devidamente notificada para o exercício do seu direito de Audição no âmbito da reclamação graciosa, a qual não utilizou.

A Requerente, em sede da reclamação graciosa, ou no âmbito do direito de audição na mesma sede, que não exerceu, trouxe ou produziu elementos novos que pudessem alterar a fundamentação do ato um tributário, ou que AT tivesse de ter em consideração, para a alteração do ato de liquidação.

Neste sentido, tem sido entendido pela jurisprudência que cumpre sempre indagar se ocorrem os pressupostos que legitimem o aproveitamento do ato administrativo, isto é, se se justifica manter a decisão impugnada por se considerar que a audiência dos interessados é de todo inútil, não podendo modificar ou influenciar a decisão final.

Do mesmo modo, e atendendo à jurisprudência e doutrina elencada, igualmente se verificam cumpridos os critérios de aplicação do princípio do aproveitamento do ato administrativo.

Assim, e por tudo o que se vem de expor, a Requerida não estava legalmente obrigada à audição da Requerente antes da liquidação, uma vez que a liquidação foi feita com base nas declarações do contribuinte, nos termos do artigo 60.º n.º 2 alínea a) da Lei Geral Tributária.

Em face do exposto, a presente liquidação está abrangida pela dispensa do direito da audição previa, à luz da alínea a) do n.º 2 do artigo 60.º da LGT, bem como, e seguindo a jurisprudência supra-referida, a falta de audiência previa anterior à liquidação, a preterição daquela formalidade não resultou lesados os direitos da Requerente, uma vez que a defesa contra o ato tributário se tornou efetiva através da reclamação graciosa e da presente impugnação. Ou seja, uma vez que os direitos do contribuinte, com a omissão do direito de audição, não foram prejudicados, tal procedimento não assume carácter invalidante, não se verificou qualquer preterição de formalidade.

Passemos agora à análise da questão do vício de falta de fundamentação, invocado pela Requerente.

Sobre este assunto e seguindo de perto a jurisprudência, o Supremo Tribunal Administrativo (“STA”) preconiza que a fundamentação é um conceito relativo que varia em função do tipo legal de ato, visando responder às necessidades de esclarecimento do contribuinte, permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática e por que motivo se decidiu num sentido e não noutro – vide a título de exemplo os acórdãos do STA, processos n.ºs 065/09, de 15 de abril de 2009, e 01114/05, de 2 de Fevereiro de 2006. 

Segundo JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE a insuficiência da fundamentação conduz  a um vício de forma equivalente à falta de fundamentação, quando for manifesta – cf. O Dever da Fundamentação Expressa de Atos Administrativos, Coleção Teses, 2003, Almedina, pp. 232-239.

A fundamentação é suficiente quando proporcione aos destinatários do ato a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que o praticou, i.e., quando um destinatário normal, colocado perante o ato em causa, possa ficar ciente das razões que sustentam a decisão nele prolatada (cf. acórdãos do STA, processos n.ºs 0512/17, de 14 de março de 2018, 42180, de 20 de novembro de 2002, e 46796, de 14 de março de 2001.

Sobre a fundamentação do ato de liquidação mais não é do que a forma de a “AT exteriorizar os motivos por que procedeu àquela liquidação e não a qualquer outra, de uma forma clara, congruente e racional de molde a constituir a base que suporta a decisão” (Ac. TCA Sul de 25.01.2011 – Proc. 04410/10, o que é aplicável, com as devidas adaptações, ao presente caso.

Como se diz no Ac. STA de 2.07.2014 - Proc. nº 01074/13: “É inquestionável que a Administração tem o dever de fundamentar os actos que afectem os direitos ou os legítimos interesses dos administrados – em harmonia com o princípio plasmado no artigo 268º da CRP e acolhido nos artigos 124º do CPA e 77º da LGT. Ora, como a doutrina e a jurisprudência têm vindo exaustivamente a repetir, a fundamentação há-de ser expressa, através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão; clara, permitindo que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide; suficiente, possibilitando ao contribuinte um conhecimento concreto da motivação do acto; e congruente, de modo que a decisão constitua a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação. É também incontroverso que as exigências de fundamentação não são rígidas, variando de acordo com o tipo de acto e as circunstâncias concretas em que este foi proferido, bastando-se com a expressão clara das razões que levaram a determinada deliberação decisória. A determinação do âmbito da declaração fundamentadora pressupõe, portanto, a busca de um conteúdo adequado, que há-de ser, num sentido amplo, o suficiente para suportar formalmente a decisão administrativa. Assim, a fundamentação deve ser entendida como a obrigação de enunciar expressamente (de modo directo ou por remissão) os motivos de facto e de direito que determinaram o agente ou órgão decisor, esclarecendo o seu destinatário das razões que o motivaram e do porquê do sentido decisório, visando proporcionar ao administrado o conhecimento do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto. Deste modo, o acto estará suficientemente fundamentado quando o administrado, colocado na sua posição de destinatário normal - o bonus pater familiae de que fala o artigo 487º, nº 2, do C. Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, por aceitar, ou não, o acto”.

Sendo certo que “não ocorre o vício formal de falta de fundamentação se a própria impugnante expressamente revela ter compreendido perfeitamente o processo lógico e jurídico que conduziu à decisão de tributação, reconhecendo ter percebido os pressupostos concretamente levados em conta pelo autor do ato e as razões por que foram alcançados os valores tributados, denunciando o percurso cognoscitivo e valorativo percorrido” (…», in (Ac. STA de 30.01.2013 – Proc. n.º 0105/12).

Em face do exposto, e tendo presente a factualidade já supra exposta, podemos concluir que na presente liquidação, a AT cumpriu cabalmente tal dever de fundamentação, alias  a compreensão pela Requerente do fundamento para a elaboração da liquidação adicional,  revela-se desde logo na petição de reclamação graciosa.

Alem do mais foi a requerente que declarou que pretendia reinvestir a totalidade do valor de realização, mas nem na declaração de 2016 nem nos anos posteriores inscreveu o reinvestimento efetuado.

Por conseguinte a Requerente entendeu perfeitamente o sentido e alcance do ato, improcedendo o vicio invocado pela Requerente.

Por último, pese embora a Requerente no seu pedido de pronuncia arbitral, nada referira ou impugne sobre a existência de erros sobre os pressupostos de facto e de direito da liquidação, em sede de reclamação graciosa alegou o direito à exclusão de tributação do art.º 10.º nº 5 do CIRS, o que a AT impugnou.

Vejamos então se lhe assiste razão.

Ora, conforme já mencionado, a presente liquidação, foi emitida pela AT, pelo facto de a Requerente não ter declarado a utilização do valor do reinvestimento, e posteriormente em sede de reclamação graciosa, a Requerente alegou que tinha utilizado o valor do reinvestimento na aquisição de um imóvel, contudo a AT verificou que a Requerente, não cumpria com os requisitos legais, que lhe permitiriam beneficiar do direito à exclusão da tributação, nos termos do n.º 5 do artigo 10.º do CIRS, uma vez que a Requerente não possuía o seu domicílio fiscal no imóvel alienado aquando da sua alienação, e não foi feita prova nessa sede de que o mesmo alguma vez tivesse sido afeto à sua habitação própria e permanente.

Atendendo à factualidade descrita, vejamos primeiro o que estabelece o regime das mais valias, em apreço, conforme resulta do n.º 5 do artigo 10.º do CIRS:

“5 - São excluídos da tributação os ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, desde que verificadas, cumulativamente, as seguintes condições:

a) O valor de realização, deduzido da amortização de eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel, seja reinvestido na aquisição da propriedade de outro imóvel, de terreno para construção de imóvel e ou respetiva construção, ou na ampliação ou melhoramento de outro imóvel exclusivamente com o mesmo destino situado em território português ou no território de outro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal;

b) O reinvestimento previsto na alínea anterior seja efetuado entre os 24 meses anteriores e os 36 meses posteriores contados da data da realização;

c) O sujeito passivo manifeste a intenção de proceder ao reinvestimento, ainda que parcial, mencionando o respetivo montante na declaração de rendimentos respeitante ao ano da alienação;”

Do exposto resulta que para beneficiar da exclusão da tributação de mais-valias, deverá preencher os seguintes requisitos cumulativos:

Quer o imóvel alienado (imóvel de partida), quer o imóvel adquirido (imóvel de chegada) destinar-se à habitação própria e permanente “do sujeito passivo ou do seu agregado familiar”;

Que o reinvestimento do valor de realização do imóvel de partida, para os fins indicados, ocorra dentro do prazo máximo de 36 meses, na aquisição de novo imóvel com o mesmo destino exclusivo, e,

Que o novo imóvel (imóvel de chegada) seja afeto a habitação própria do sujeito passivo ou do seu agregado familiar.

Sobre a questão do domicílio fiscal e da habitação própria e permanente, a Lei n.º 82-E/2014 de 31 de Janeiro, veio clarificar a questão com o aditamento ao artigo 13.º do CIRS, do qual se transcrevem o disposto nos números 10 a 13:

“10 - O domicílio fiscal faz presumir a habitação própria e permanente do sujeito passivo que pode, a todo o tempo, apresentar prova em contrário.

11 - Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se preenchido o requisito de prova aí previsto, designadamente quando o sujeito passivo

a) Faça prova de que a sua habitação própria e permanente é localizada noutro imóvel; ou

b) Faça prova de que não dispõe de habitação própria e permanente.

12 - A prova dos factos previstos no número anterior compete ao sujeito passivo, sendo admissíveis quaisquer meios de prova admitidos por lei.

13 - Compete à Autoridade Tributária e Aduaneira demonstrar a falta de veracidade dos meios de prova mencionados no número anterior ou das informações neles constantes.”

Com efeito, com o aditamento ao art.º. 13º, a questão ficou resolvida de forma clara, permitindo ao sujeito passivo ilidir a presunção, através de qualquer meio de prova.

Entendimento que é defendido pela jurisprudência, designadamente dos processos TCAS de 8/10/2015, proc. 6685/13, bem como, entre outras, as seguintes decisões Arbitrais proferidas no CAAD a saber: n.º 721/2015-T; 92/2016-T; 21/2017-T.

Decorre sucintamente da jurisprudência anteriormente indicada, que a não comunicação dos sujeitos passivos da mudança de domicílio para o prédio relativamente ao qual pediram a exclusão para reinvestimento, por si só, não indicia que não têm habitação própria e permanente nesse prédio, a morada em certo lugar, a habitatio, pode demonstrar-se através “factos justificativos” de que o sujeito passivo fixou no prédio o centro da sua vida pessoal.

Decorre do exposto, a presunção de que o domicílio fiscal do sujeito passivo é a sua habitação própria e permanente, contudo o sujeito passivo pode a todo o tempo, apresentar prova em contrário, e a AT pode demonstrar a falta de veracidade dos meios de prova ou das informações neles constantes.

É assim entendido, que o sujeito passivo pode demonstrar mediante prova documental e testemunhal que a sua habitação própria e permanente era no imóvel em questão, quer do imóvel alienado ou o imóvel adquirido.

Retornando aos presentes autos temos que a Requerente não dispunha o seu domicílio fiscal no imóvel alienado que gerou a mais-valia, e não alegou ou produziu prova documental em como a sua habitação própria e permanente corresponde ao imóvel, afastando a dita presunção.

Neste sentido, sendo uma condição essencial para efeitos do direito à exclusão de tributação prevista no art.º 10º nº 5 do CIRS, que o imóvel alienado seja destinado à habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, não foi cumprida pela Requerente essa condição, não beneficiando dessa exclusão.

Neste termos, improcede o pedido de anulação do ato de liquidação.

 

F - Dos Juros Indemnizatórios

A Requerente pede, ainda, que a Requerida seja condenada a restituir-lhe o imposto indevidamente pago acrescido de juros indemnizatórios, fixados nos termos do artigo 43.º da LGT.

Atendendo à improcedência do pedido de anulação do ato de liquidação, improcede o pedido de condenação de pagamento de juros indemnizatórios.

 

G - Decisão

Termos em que, de harmonia com o exposto, decide-se:

  1. Julgar improcedente o pedido arbitral formulado pela Requerente de declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação, em sede Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, com o n.º 2020 ... no valor de €49.970,72;
  2. Julgar improcedente o pedido arbitral formulado pela Requerente de pagamento de juros indemnizatórios.

 

H - Valor Do Processo, Custas

Fixa-se o valor do processo em € 49.970,72 (quarenta e nove mil novecentos e setenta euros e setenta e dois cêntimos), correspondente ao valor da liquidação, atendendo ao valor económico do processo aferido pelo valor da liquidação de imposto impugnada, e em conformidade fixam-se as custas, no respetivo montante em 2,142,00€ (dois mil cento e quarenta e dois euros), a cargo da Requerente, de acordo com o disposto no nº 2 do artigo 12.º do Regime de Arbitragem Tributária, do artigo 4.º do RCPAT e da Tabela I anexa a este último. – n.º 10 do art.º 35º, e n.º 1, 4 e 5 do art.º 43º da LGT, n.º 1, al. a) do art.º 5.º do RCPT, n.º 1, al. a) do 97.º-A, do CPPT e 559.º do CPC).

 

Lisboa, 22 de Março de 2022

 

Notifique-se

 

 

Rita Guerra Alves

Árbitra