Sumário:
I - Verifica-se a caducidade do direito à liquidação de imposto, nos termos das disposições conjugadas dos n.ºs 1 e 4 do artigo 45.º da LGT, quando se pretende tributar, em 2016, um rendimento que o sujeito passivo auferiu em 30 de janeiro de 2003, a título de antecipação do preço da venda de um prédio ocorrida nessa data;
II - Existindo fundada dúvida sobre a quantificação do ato tributário, há lugar à anulação do ato nos termos do disposto no artigo 100.º, n.º 1, do CPPT.
DECISÃO ARBITRAL
Acordam em tribunal arbitral
I – Relatório
1. A..., Lda, com o NIPC ... com sede na Rua ..., nº ..., ..., ...-... Lisboa, vem requerer a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, para apreciar a legalidade dos atos de liquidação em IRC n.º 2020... e de retenção na fonte em IRS n.º 2020..., e correspondentes atos de liquidação de juros compensatórios, relativos ao exercício de 2016, requerendo ainda a condenação da Autoridade Tributária ao pagamento de uma indemnização pelos prejuízos resultantes com a prestação indevida de garantia.
Fundamenta o pedido nos seguintes termos.
A Requerente, então com a denominação de B...Lda., celebrou, em 11 de agosto de 2000, um contrato de promessa de compra e venda, na posição de promitente vendedora, do prédio designado por D..., em que figurava como promitente compradora a C..., S.A., que desembolsou a título de sinal e princípio de pagamento o montante em escudos equivalente a € 2.493.989,40.
Em 30 de Janeiro de 2003, as partes formalizaram um contrato de alteração e aditamento do contrato promessa pelo qual a Requerente prometia vender à C..., S.A. um prédio sito na Avenida ..., em Lisboa e o sinal no contrato promessa de compra e venda relativo à D... era reduzido de € 2. 493.989,40 para € 493.989,40, resultando dessa redução um crédito de € 2.000.000,00 a favor da promitente compradora que compensava o crédito da promitente vendedora, do mesmo montante, por efeito da promessa de compra e venda do prédio da Avenida ... .
Em 30 de janeiro de 2003, as partes celebraram o contrato de compra e venda do prédio sito na Avenida ... pelo preço de € 1.000.000,00.
Entretanto, por contrato firmado em 11 de maio de 2012, a C... cedeu à E..., Lda. a sua posição contratual no contrato promessa de compra e venda da D..., com as alterações introduzidas em 30 de Janeiro de 2003.
Em 24 de Novembro de 2016, as partes acordaram na revogação do contrato promessa de compra e venda relativo à D..., tendo convencionado através da cláusula quarta que “o sinal e reforço de sinal entregues à Primeira Outorgante (ora Requerente) relativos ao contrato promessa e seu aditamento (…), na importância total de € 493.489,40 (…) torna-se na presente data irreclamável pela Segunda Outorgante, pelo que a Primeira Outorgante pode fazer sua aquela importância incondicionalmente e a titulo definitivo.”
Por escritura de compra e venda realizada na mesma data, a Requerente vendeu os imóveis da D..., pelo preço de € 5.000.000,00, à sociedade F..., S.A.
A Autoridade Tributária, no âmbito do procedimento inspetivo, determinou a correção tributária no montante de € 1.498.797,90, relativamente ao exercício de 2016, por omissão nos rendimentos declarados referentes ao sinal e reforço de sinal recebidos em consequência da revogação do contrato de promessa de compra e venda, considerando que, para efeitos da periodização do lucro tributável, prevista no n.º 1 do artigo 18.º do CIRC, independentemente do recebimento dos montantes em causa ter ocorrido em períodos de tributação anteriores, é no exercício de 2016 que os rendimentos se tornam efetivos, através do acordo de revogação conjuntamente com a escritura de venda dos imóveis que integram a D... .
Em discordância com este entendimento, a Requerente considera que o único proveito que obteve com o contrato promessa de 11 de agosto de 2000 respeita ao montante de € 493.489,40 de sinal e reforço de sinal que passou a ser de sua titularidade por via da revogação do contrato promessa em 2016. E no que se refere ao proveito de € 1.000.000,00, há uma errónea localização do tempo do facto tributário, porquanto o contrato promessa de compra e venda celebrado em 11 de agosto de 2000 extinguiu-se com a sua revogação, em 24 de Novembro de 2016, e, por sua vez, o contrato de compra e venda celebrado nessa data com uma terceira entidade (F...) constitui um facto jurídico novo que não tem conexão com o contrato promessa entretanto extinto.
Pelo que o pretenso rendimento de € 1.000.000,00 apenas pode ser reportado a 2003, quando se celebrou o contrato promessa, verificando-se a caducidade do direito à liquidação nos termos do artigo 45.º, n.º 1, a LGT, que fixa para a liquidação de tributos de um prazo de quatro anos.
A Requerente discute ainda a correção tributária a título de retenção na fonte em IRS relativamente a importâncias que foram consideradas como adiantamentos por conta dos lucros por se encontrar demonstrado que essas importâncias respeitam a suprimentos efetuados pelos sócios para satisfazer necessidades da empresa, encontrando-se ilidida a presunção do artigo 6.º, n.º 4, do CIRS.
A Autoridade Tributária, na sua resposta, refere, como ponto prévio, que por despacho de 1 de julho de 2021, da Subdiretora Geral dos Impostos sobre o Rendimento, foi anulado o ato de liquidação nº 2020... referente a retenção na fonte em IRS, e comunicado ao CAAD no dia 5 de julho seguinte, nos termos do artigo 13.º, n.º 1, do RJAT.
Em sede de impugnação, sustenta que o facto determinante do reconhecimento dos rendimentos associados à não devolução do sinal ao promitente comprador não foi a celebração da escritura de compra e venda mas sim a revogação do contrato-promessa, pois foi em consequência dessa revogação que as importâncias já anteriormente recebidas a título de sinal se tornaram definitivamente adquiridas.
Não se trata, por conseguinte, de um rendimento que tenha resultado da operação de venda do prédio da Rua ..., realizada em 2003, mas sim de um rendimento que só se tornou irreclamável por força da revogação do contrato promessa de compra e venda, ocorrida em 2016, e que constitui um incremento patrimonial sujeito a tributação com referência a esse exercício.
Conclui no sentido de ser mantida a correção contestada.
2. No seguimento do processo, a Requerente prescindiu da prestação de declarações de parte e da inquirição de testemunhas arroladas. Na sequência, por despacho arbitral de 19 de Novembro de 2021, foi determinado o prosseguimento do processo para alegações por prazo sucessivo de dez dias.
Em alegações, as partes mantiveram as suas anteriores posições.
3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo Carlos Fernandes Cadilha (árbitro presidente) e Paulino Brilhante Santos e Catarina Gonçalves (árbitros vogais), que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 13 de julho de 2021.
Por virtude do falecimento do Dr. Paulino Brilhante Santos, árbitro vogal do tribunal arbitral coletivo, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico, por despacho de 11 de Janeiro de 2022, designou como árbitro substituto o Dr. Martins Alfaro.
O procedimento de substituição de árbitro inviabilizou a prolação da decisão arbitral dentro do prazo inicial, pelo que, por despacho do árbitro presidente, de 12 de Janeiro, foi prorrogado o prazo para a decisão, nos termos previstos no artigo 21.º, n.º 2, do RJAT.
Nos termos do n.º 3 do artigo 9.º, do RJAT, «no caso de se verificar a substituição de árbitro, o tribunal arbitral decide se algum ato processual deve ser repetido em face da nova composição do tribunal, tendo em conta o estado do processo».
Considerando que a Requerente prescindiu da prova testemunhal arrolada e a prova coligida é constituída pelo processo administrativo junto pela Autoridade Tributária e os documentos juntos ao pedido arbitral, e apenas foram produzidos no decurso do processo os articulados e as alegações escritas, o Tribunal entende não se justificar a repetição de quaisquer atos processuais, pelo que o processo prosseguirá na apreciação do pedido de pronúncia arbitral.
3. O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas exceções.
Cabe apreciar e decidir.
II - Fundamentação
Matéria de facto
4. Os fatos relevantes para a decisão da causa que são tidos como assentes são os seguintes.
A) Em 11 de Agosto de 2000, B..., Lda (atualmente designada A... Lda), como promitente vendedora, celebrou um contrato-promessa de compra e venda com a C..., S.A., como promitente compradora, para venda de três imóveis da D..., sitos na ... n.ºs ..., ... a ... e na ... n.ºs ... a ..., em Lisboa, pelo valor de 1.900.000.000$00 (€ 9.477.160,04), cujos pagamentos, de acordo com a sua cláusula terceira, seriam repartidos da seguinte forma:
1. Com a assinatura do presente contrato, e a título de sinal e princípio de pagamento acordado, a Promitente Vendedora recebeu já da Promitente Compradora a quantia de ESC. 400.000.000$00 (€ 1.995.191,59) de que dá a correspondente quitação;
2. Esc. 100.000.000$00 (€ 498.797,90) quando for entregue na Câmara Municipal de Lisboa o estudo prévio e de volumetria;
3. Esc. 200.000.000$00 (€ 997.595,79) quando for entregue na Câmara Municipal de Lisboa o projeto de arquitetura;
4. Esc. 1.200.000.000$00 (€ 5.985.574,76) no momento da outorga da escritura de compra e venda.
B) Nos termos da cláusula 2.ª do contrato promessa, a promitente vendedora autoriza a promitente compradora a ceder a sua posição contratual.
C) Em 30 de janeiro de 2003, B..., Lda. (atualmente designada A... Lda.), e a C..., SA firmaram um acordo de alteração e aditamento ao contrato-promessa de compra e venda da D..., a que se refere a antecedente alínea A), pelo qual a primeira outorgante, como promitente vendedora, promete vender à C..., S.A., como promitente compradora, o prédio sito na Rua ... n.º..., ... e..., ... Lisboa, pelo preço de € 2.000.000,00.
D) Nos termos da cláusula quarta, alínea d), desse acordo, o sinal já pago pela promitente compradora à promitente vendedora é no valor de € 2.493.989,40, correspondente ao sinal pago na assinatura do contrato promessa (€ 1.995.191,59) e ao montante pago na ocasião em que foi entregue na Câmara Municipal de Lisboa o estudo prévio e de volumetria (€ 498.797,90).
E) Nos termos da cláusula quarta, alínea e), desse acordo, o remanescente do sinal já pago permanecerá como sinal para a aquisição da D..., o qual fica assim reduzido a € 493.989,40, ficando ajustados os valores dos restantes pagamentos, nos termos das alíneas f) e g), conforme se segue:
- € 997.595,79, quando for entregue na Câmara Municipal de Lisboa o projeto de arquitetura e
- € 7.985.574,40, no momento da outorga da escritura de compra e venda.
F) Em 30 de Janeiro de 2003, B..., Lda. (atualmente designada de A... Lda.), e a C..., S.A. outorgaram a escritura pública de compra e venda do prédio localizado na Rua ... no ..., ... e ..., em Lisboa, pelo preço de € 1.000.000,00.
G)) Em 11 de Maio de 2012, a C..., S.A. cedeu a sua posição contratual, no contrato promessa de compra e venda da D..., à E... Lda.
H) Em 24 de Novembro de 2016, a Requerente e a E..., Lda. firmaram um Acordo de Revogação de Contrato-Promessa de Compra e Venda, a que se refere a antecedente alínea A), pelo qual abdicam de todos os direitos e obrigações subjacentes ao contrato promessa e seu aditamento de 30 de Janeiro de 2003 (cláusula terceira) e se estabelece que "o sinal e reforço de sinal entregues à Primeira Outorgante, relativo ao contrato-promessa e seu aditamento (…), na importância total de € 493.489,40 (…), torna-se na presente data irreclamável pela Segunda Outorgante, pelo que a Primeira Outorgante pode fazer sua aquela importância incondicionalmente a título definitivo (cláusula quarta).
I)) Nos termos da cláusula quinta do mesmo acordo, as partes convencionaram que “não haverá devolução de quaisquer quantias entregues a título de sinal ou reforço de sinal, assim como não haverá qualquer penalização ou compensação financeira, seja a que título, relativa à presente revogação do Contrato-promessa e seu Aditamento”.
J) Em 24 de Novembro de 2016, por escritura pública de compra e venda, a Requerente vendeu à F..., S.A., pelo preço de € 5.000.000,00, os três imóveis que integravam a "D...".
L) A C..., S.A. acionou judicialmente a Requerente, no processo n.o .../08...TVLSB, que correu termos na 9.a Vara Cível de Lisboa, tendo por base a exigência do pagamento de € 997.595,79, aquando da entrega na Câmara Municipal de Lisboa do projeto de arquitetura, e no qual foi proferida sentença datada de 6 Fevereiro de 2014 com o seguinte dispositivo:
a) declarar que, até à presente data, a prestação prevista no n.º 3 da clausula 3.ª do contrato-promessa de 11 de agosto de 2000 não é exigível pela ré à autora, ocorrendo a mora da mesma ré desde, pelo menos, 25 de outubro de 2007;
b) declarar a ilicitude e, consequentemente, a ineficácia da declaração da ré, contida na sua carta datada de 14 de dezembro de 2007 [cuja cópia constitui o doc.º 15 junto com a petição inicial] e dirigida à autora, visando a resolução do contrato-promessa celebrado em 11 de agosto de 2000, parcialmente alterado pelo acordo de "Alteração e aditamento ao contrato promessa de compra e venda da D..." de janeiro de 2003.
M) A Requerente foi objeto de uma ação inspetiva, credenciada pela ordem de serviço n.º OI2018..., tendo em vista analisar a venda de imóveis por valor inferior ao valor patrimonial tributário.
N) Com base em todos os fatos anteriormente descritos, o Relatório de Inspeção Tributária, elaborado no âmbito do procedimento inspetivo, justifica a correção tributária em sede de IRC nos seguintes termos:
III.1.2.2 - ANÁLISE CONTABILÍSTICO / FISCAL
De todas as operações económicas constantes do CPCV da D..., do seu Aditamento e Alteração, do Acordo de Revogação e das Escrituras de venda dos imóveis que se resumiram anteriormente em III.1.2.1, importa também fazer a sua análise do ponto de vista contabilístico e fiscal, avaliando se as mesmas foram devidamente consideradas no apuramento do lucro tributável.
Antes de analisar os elementos contabilísticos e fiscais da A..., importa ter presente o que determina a legislação fiscal.
Relativamente ao apuramento do lucro tributável, prevê o art.º 17º do CIRC que "O lucro tributável das pessoas coletivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do período e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não refletidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código".
Por sua vez, atendendo ao disposto no art.º 18.º do CIRC deve proceder-se à periodização anual do lucro tributável, estabelecendo o seu no 1 que "Os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, São imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica." Acresce que, para efeitos de aplicação do disposto no n.0 1, a alínea a) do no 3, do art.º 18.º do CIRC, prevê que u Os réditos relativos a vendas consideram-se em geral realizados, e os correspondentes gastos suportados, na data da entrega ou expedição dos bens correspondentes ou, se anterior, na data em que se opera a transferência de propriedade;"
Já o n.º 1, do art.º 20.º do CIRC determina que se consideram "rendimentos e ganhos os resultantes de operações de qualquer natureza, em consequência de uma ação normal ou ocasional, básica ou meramente acessória".
Através da análise conjugada dos documentos contabilísticos, dos extratos de conta, dos balancetes analíticos (anexo II, págs. 2 a 9) e do ficheiro SAFT, constatou-se que:
- a conta "53.1 — Outros Investimentos de Capital - Prestações suplementares" (anexo III, pág. 29 ou anexo V, pág. 13), apresenta até 30-12-2016 um saldo, precisamente no valor de €1.995.191,59. Por sinal, este valor corresponde na integra, ao sinal acordado no CPCV da D... e pago pela C... à A...;
- a conta "27.8.000011000 — Outros Devedores e Credores — Compradores D..." (anexo II, pág. 5 e anexo V, pág. 5) apresenta, em 31-12-2016, um saldo credor no montante de € 498.797,90, que corresponde à 2.ª tranche do pagamento efetuado pela C... à A..., relativamente ao CPVC da. D... .
Apesar da conclusão do negócio da D... se ter concretizado em 24-11-2016 através do acordo de revogação e subsequente realização da escritura de compra e venda, à F..., até 31-12-2016, a A... não reconheceu, contabilisticamente, parte dos rendimentos gerados pela revogação do CPCV da D..., correspondentes aos sinais que recebeu da C... e, que de acordo com o acordo de revogação, não foram devolvidos.
No Acordo de Revogação de 24-11-2016, as partes assumem que os valores recebidos pela A... a título de sinal e, reforço de sinal, relativamente ao contrato-promessa e seu aditamento, são irreclamáveis e que a A... pode fazer sua aquela importância, incondicionalmente, a título definitivo. Uma vez que os imóveis subjacentes ao CPCV da D..., foram transmitidos pela A... à F..., mediante a outorga da escritura em 24-11-2016, precisamente na mesma data do acordo de revogação, é nessa data que a A... deveria considerar os valores recebidos, a título de sinal e reforço do mesmo, como rendimentos imputáveis ao exercício de 2016 dando cumprimento ao disposto no art.º 17.º e no n.º 1 e na alínea a) do no 3, do art.º 18º, ambos do CIRC.
O valor total de rendimentos não tributados aqui em causa é de € 1.498.797,90, que se decompõe do seguinte modo:
-
€ 498.797,90 registados na conta "278000011000-0DC-Compradores D..." (anexo II, pág. 5 e anexo V, pág. 5), montante este que foi recebido pela A... e que é o correspondente ao segundo pagamento que se tornou devido com a entrega na CML do Estudo Prévio e Volumetria, conforme ficou estabelecido no n o 2 da cláusula terceira do CPCV celebrado entre a A... e a C...;
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€ 1.000.000,00 correspondentes ao diferencial entre os € 2.000.000,00 de sinal que havia sido recebido pela A... tal como estabelecia o no 1 da cláusula terceira ao CPCV da D..., que de acordo com a alteração/aditamento de 30-01-2003 foi transferido como sinal para a venda do imóvel localizado na Rua ... no..., ... e ..., ... Lisboa, com o artigo matricial n o..., mas que de acordo com a escritura de compra e venda celebrada em 30-01-2003, a transmissão ocorreu apenas pelo valor de € 1.000.000,00 (anexo II, págs. 29 a 31) e, consequentemente, apenas este valor, foi registado pela A..., como rendimento, para efeito da determinação do lucro tributável de 2003.
Importa salientar que, embora estes valores tenham sido recebidos pela A... em exercícios anteriores, correspondiam ao sinal do CPCV da D..., cuja venda se concretizou apenas no exercício em análise, mais concretamente mediante a escritura de 24-11-2016 (anexo II, págs. 45 a 48) e nos exercícios em que foram recebidos não foram considerados como rendimento, nem até 31-12-2016. Porque a referida venda se operou para uma entidade diferente da que constava no CPCV original, de 11-08-2000, seu aditamento de 30-01-2003 e cessão de posição contratual de 11-05-2012, o acordo de revogação de contrato-promessa de compra e venda igualmente datado de 24-11-2016 (anexo II, págs. 40 a 44), estabeleceu na sua cláusula quarta, conforme já se transcreveu anteriormente, que o sinal e reforço de sinal entregues à A... se tornou na mesma data irreclamável, podendo a A... e fazer sua aquela importância incondicionalmente a título definitivo.
Recorde-se que, atendendo ao disposto no n.º 1 e à alínea a) do no 3, ambos do artº 18.º do CIRC deve ser efetuada a periodização anual. De acordo com o estabelecido no referido normativo, os gastos e os rendimentos devem ser imputados nos exercícios a que dizem respeito.
Deste modo, para efeitos da periodização do lucro tributável, prevista no n.º 1 do artº 18.º do CIRC independentemente do recebimento dos montantes em causa ter ocorrido em períodos de tributação anteriores, é no exercício de 2016 que os rendimentos se tornam efetivos, através do acordo de revogação conjuntamente com a escritura de venda dos imóveis que integram a D... .
Acresce referir que, nos termos da alínea a), do no 3 do art.º 18º do CIRC, o rédito relativo à venda da D... ocorre em 24-11-2016, data em que, além do acordo de revogação, através da escritura se operou a transferência de propriedade dos bens imóveis, como tal, é no exercício de 2016 que o montante de € 1.498.797,90 deverá ser considerado para efeito da determinação do rendimento tributável.
Importa notar que em virtude da alienação dos imóveis da D..., a A... considerou, no exercício de 2016 o correspondente gasto através da conta “6111- Custo Merc. Vend. Mat.P.Consum-Mercadoria" no valor € 4.638.820,45 por transferência do mesmo valor que se encontrava registado na conta "32171 — Mercadorias Existências Isentas - D...".
Ora tendo em conta os normativos do CIRC, não pode o S.P. considerar os gastos relativos aos 3 imóveis da D... no exercício de 2016, mas não colocar os correspondentes rendimentos gerados pelos mesmos imóveis, uma vez que a obrigatoriedade de periodização do lucro tributável prevista no art.º 18 do CIRC, aplica-se tanto para os gastos como para os rendimentos.
Por todo o exposto anteriormente, permite-nos concluir, que as verbas entregues à promitente vendedora, consubstanciam um incremento patrimonial, tributável no âmbito do CIRC, conforme previsto no seu artigo 20.º n.º 1.
Desta forma, face à omissão nos rendimentos declarados pela A... referente ao sinal e reforço de sinal recebidos em consequência da revogação do CPCV inicial, quando do apuramento do lucro tributável do exercício de 2016, propõe-se a devida correção, que se consubstancia num acréscimo no montante de € 1.498.797,90, por infração ao disposto no n o 1 do artigo 17.º , dos nos 1 e 3, alínea a) do artigo 18º conjugados com o no 1 do artigo 20 0 , todos do CIRC, infração punível, nos termos do art.º 119º do RGIT”
O) O procedimento inspetivo originou os atos de liquidação em IRC n.º 2020 ... e de retenção na fonte em IRS n.º 2020 ..., relativos ao exercício de 2016.
P) Na sequência da apresentação do pedido arbitral, a Subdiretora Geral dos Impostos sobre o Rendimento, por despacho de 1 de julho de 2021, revogou o ato de liquidação nº 2020..., referente a retenção na fonte em IRS e juros compensatórios, que foi comunicado ao CAAD, nos termos do artigo 13.º, n.º 1, do RJAT, por requerimento entrado em 5 de julho de 2021.
R) O pedido arbitral deu entrada em 3 de maio de 2021.
Fatos não provados
Não existem quaisquer fatos não provados que relevem para a decisão da causa
O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e no processo administrativo junto pela Autoridade Tributária com a resposta, e em fatos não questionados pelas partes.
Matéria de direito
Delimitação do objeto do processo.
5. Tendo tido conhecimento do pedido constituição de tribunal arbitral, a Autoridade Tributária, por despacho de 1 de julho de 2021, da Subdiretora Geral dos Impostos sobre o Rendimento, revogou o ato de liquidação nº 2020 ..., referente a retenção na fonte em IRS e juros compensatórios.
A revogação foi comunicada ao CAAD, nos termos do artigo 13.º, n.º 1, do RJAT, por requerimento entrado em 5 de julho de 2021, e, notificada para se pronunciar sobre o prosseguimento do processo, a Requerente, por requerimento entrado em 13 de Julho seguinte, veio dizer que aceita a anulação da liquidação nº 2020..., referente a retenção na fonte, e pretende o prosseguimento do processo quanto ao ato de liquidação em IRC, no montante de € 331.367,41.
Cabe preliminarmente referir que o novo Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, passou a distinguir entre a revogação e a anulação administrativa, fazendo corresponder a cada uma destas figuras as duas anteriores modalidades de revogação ab-rogatória ou extintiva e revogação anulatória. Segundo a definição constante do artigo 165.º, a revogação é “o ato administrativo que determina a cessação dos efeitos de outro ato, por razões de mérito, conveniência ou oportunidade” (n.º 1), ao passo que a anulação administrativa é “o ato administrativo que determina a destruição dos efeitos de outro ato, com fundamento em invalidade” (n.º 2).
No caso vertente, o despacho de 1 de julho de 2021, embora adote a fórmula verbal anteriormente aplicável, corresponde a um verdadeiro ato anulatório, com os efeitos que resultam do disposto no artigo 165.º, n.º 2, do CPA.
Por outro lado, a anulação do ato impugnado pela própria Administração, na pendência do processo, satisfazendo a pretensão impugnatória do autor, conduz à impossibilidade superveniente da lide, que constitui causa de extinção da instância (artigo 277.º, alínea e), do CPC).
Assim sendo, o processo apenas pode prosseguir para apreciar a legalidade dos atos de liquidação em IRC.
Caducidade do direito à liquidação
6. A Requerente invoca a caducidade do direito à liquidação do imposto, nos termos das disposições conjugadas dos n.ºs 1 e 4 do artigo 45.º da LGT, por considerar que os factos tributários que serviram de base à correção tributária em sede de IRC ocorreram em 2003, quando foi acordado entre as partes a alteração e o aditamento ao contrato promessa de compra e venda da D..., que havia sido celebrado em 2000.
Em contraposição, a Autoridade Tributária justifica a correção com base no princípio da periodização dos exercícios, a que se refere o artigo 18.º, n.º 1, do CIRC, vindo a concluir, no âmbito do procedimento inspetivo, que, apesar da venda da D... se ter concretizado em 24 de Novembro de 2016 através do acordo de revogação do contrato promessa de compra e venda anteriormente celebrado com a C..., S.A. e a subsequente outorga da escritura de compra e venda com a F..., a Requerente não reconheceu contabilisticamente, até ao termo do exercício de 2016, parte dos rendimentos gerados pela revogação do contrato promessa, correspondentes ao sinal e parte do pagamento do preço do imóvel, que não foram devolvidos.
Ainda segundo o Relatório de Inspeção Tributária, embora os valores em causa sejam imputáveis a exercícios anteriores, não foram registados como rendimentos nesses exercícios e só com a revogação do contrato promessa é que vieram a integrar o património da Requerente, a título definitivo, por se terem tornado irreclamáveis. E, desse modo, entenderam os serviços inspetivos que, para efeitos da periodização do lucro tributável, independentemente do recebimento dos montantes ter ocorrido em períodos de tributação anteriores, é no exercício de 2016 que os rendimentos se tornam efetivos, havendo lugar à sua consideração para apuramento do lucro tributável.
Cabe ainda referir, a título preliminar, que a correção tributária é de € 1.498.797,90, que se decompõe do seguinte modo: € 498.797,90, montante correspondente ao segundo pagamento que era devido com a entrega na Câmara Municipal de Lisboa do Estudo Prévio e Volumetria; € 1.000.000,00 correspondentes ao valor de aquisição do prédio sito na Avenida ..., e que engloba o valor do sinal de € 2.000.000,00 que havia sido transferido para a promessa de compra e venda deste prédio, por efeito do acordo de alteração e aditamento ao contrato de compra e venda da D... .
Para dilucidar a questão que vem colocada, interessa recordar, em termos esquemáticos, a factualidade que foi dada como assente e relativamente à qual não existe dissídio entre as partes.
Em 11 de Agosto de 2000, foi celebrado entre a antecessora do Requerente, como promitente vendedora, e a C..., S.A., como promitente compradora, o contrato promessa de compra e venda da D..., pelo valor de € 9.477.160,04, que previa o pagamento, pela promitente compradora, de € 1.995.191,59, na assinatura do contrato, a título de sinal e princípio de pagamento, e de € 498.797,90 quando fosse entregue na Câmara Municipal de Lisboa o estudo prévio e de volumetria, correspondendo esses montantes ao valor global de € 2.493.989,49.
Em 30 de Janeiro de 2003, as partes firmaram um acordo de Alteração e Aditamento ao Contrato-promessa de Compra e Venda da D..., pelo qual a promitente vendedora, promete vender à C..., S.A. o prédio sito na Rua ..., em Lisboa, pelo preço de € 2.000.000,00. Nos termos do mesmo acordo, o sinal já pago pela promitente compradora à promitente vendedora no valor de € 2.493.989,40, no âmbito do contrato promessa de compra e venda da D..., passaria a ficar afeto ao contrato promessa de compra e venda do prédio da Rua ..., no valor de € 2.000.000,00, e o remanescente, no valor de € 493.989,40, permanecia como sinal para a aquisição da D... .
Na mesma data, a antecessora da Requerente e a C..., S.A. outorgaram a escritura pública de compra e venda do prédio localizado na Avenida ..., pelo preço de € 1.000.000,00, não se fazendo alusão, na escritura, ao pagamento do preço.
Em 24 de Novembro de 2016, a Requerente e a E..., Lda, a quem a C..., S.A. havia cedido a sua posição contratual de promitente compradora, firmaram um Acordo de Revogação do Contrato-Promessa de Compra e Venda relativo à D..., pelo qual abdicam de todos os direitos e obrigações subjacentes ao contrato promessa e seu aditamento de 30 de Janeiro de 2003 e se estabelece que o sinal e reforço de sinal entregues à promitente vendedora, na importância total de € 493.489,40, se torna irreclamável pela promitente compradora e não há devolução de quaisquer quantias entregues a título de sinal ou reforço de sinal, assim como não haverá qualquer penalização ou compensação financeira que se relacione com a revogação do contrato-promessa e seu aditamento.
Na mesma data, por escritura pública de compra e venda, a Requerente vendeu à F..., S.A., pelo preço de € 5.000.000,00, os três imóveis que integravam a D... .
Como tudo indica, face a todos estes elementos, o “acordo de alteração e aditamento do contrato promessa” relativo à D... teve em vista reduzir de € 2. 493.989,40 para € 493.989,40 o sinal e reforço de sinal já pago, pela promitente compradora, no âmbito do contrato promessa de compra e venda da D... . Embora no aludido “acordo de alteração e aditamento do contrato promessa” não se especifique a que título passa a ser considerado o valor remanescente de € 2.000.000,00, resulta implicitamente do contexto da operação que essa importância passaria a valer como sinal para a aquisição do prédio da Avenida ..., operando-se assim uma compensação entre a redução do sinal num contrato promessa e a prestação de sinal no outro contrato promessa.
Em todo o caso, no contrato de promessa de compra e venda, presume-se que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento (artigo 441.º do Código Civil). E, por outro lado, em caso de cumprimento do contrato promessa, o sinal funciona como antecipação do pagamento (artigo 442.º, n.º 1, do Código Civil).
Tendo sido outorgada a escritura de compra e venda do prédio prometido no mesmo dia em que foi celebrado o contrato promessa, sem qualquer referência ao pagamento do preço, haverá de entender-se que a compensação operada pelo “acordo de alteração e aditamento do contrato promessa” da D... serviu como antecipação de pagamento.
É assim claro que a Requerente auferiu o rendimento correspondente à venda do prédio da Avenida ... em 30 de Janeiro de 2003, quando, por efeito do “acordo de alteração e aditamento do contrato promessa” da D..., aceitou que parte do sinal e reforço de sinal já pago pela promitente compradora, no âmbito do contrato promessa de compra e venda da D..., pudesse ser imputado como sinal e antecipação do preço da venda do prédio da Avenida ... .
É, para o caso, irrelevante que pudesse ter ocorrido uma simulação no preço da venda, visto que o que se discute, no presente processo, não são as consequências jurídicas de uma eventual simulação de preço, mas a correção tributária realizada pela Administração, que incidiu sobre o preço declarado na escritura de compra e venda, ou seja, sobre o valor de € 1.000.000,00, que correspondia, em parte, ao sinal e antecipação do preço da venda do imóvel.
Verifica-se assim a caducidade do direito à liquidação de imposto, nos termos das disposições conjugadas dos n.ºs 1 e 4 do artigo 45.º da LGT, quando se pretende tributar, em 2016, um rendimento de € 1.000.000.00 que é imputável ao período de tributação de 2003, porquanto a Requerente auferiu essa importância - correspondente à venda do prédio da Avenida ...-, em 30 de Janeiro de 2003, aquando do “acordo de alteração e aditamento do contrato promessa” e da outorga, na mesma data, da escritura pública de compra e venda do prédio (cfr. alíneas C) e F) da matéria de facto).
7. A segunda parcela da correção tributária efetuada pela Autoridade Tributária refere-se ao reforço de sinal no montante de € 498.797,90, que haveria de acrescer ao valor já pago no momento da assinatura do contrato, de € 1.995.191,59, quando fosse entregue na Câmara Municipal de Lisboa o estudo prévio e de volumetria.
Ora, como se deixou entrever, a soma dessas duas importâncias, no total de € 2.493.989,40, corresponde ao sinal e reforço de sinal já pago pela promitente compradora, no âmbito do contrato promessa de compra e venda da D..., que foi objeto de renegociação através do “acordo de alteração e aditamento do contrato promessa de compra e venda” da D..., pelo qual o sinal entregue relativamente a esse contrato promessa ficaria reduzido ao valor de € 493.989,40.
Por efeito da revogação do contrato promessa, acordada em 24 de Novembro de 2016, as partes abdicaram de todas as obrigações inerentes ao contrato promessa e seu aditamento e de qualquer penalização ou indemnização a que houvesse lugar, como também ficaram dispensadas da devolução de quaisquer quantias entregues a título de sinal ou reforço de sinal. Nesse condicionalismo, não se verifica o incumprimento do contrato promessa, nem há lugar à cláusula penal da perda do sinal em favor da outra parte.
Por outro lado, como resulta, com evidência, de todos os elementos do processo, a importância que a Requerente passou a integrar no seu património, a título definitivo, por efeito da revogação do contrato promessa, não foi o reforço de sinal, no montante de € 498.797,90, que era devido quando fosse entregue na Câmara Municipal de Lisboa o estudo prévio e de volumetria, mas sim o remanescente de € 493.989,40 a que ficou reduzido o sinal e reforço de sinal no âmbito do contrato promessa de compra e venda” da D..., por efeito do “acordo de alteração e aditamento”. Isso porque, como ficou esclarecido, o montante excedente de € 2.000.000,00 ficou afeto, a título de sinal e antecipação de pagamento ao contrato de promessa de venda do prédio da Rua ... .
Existe, por conseguinte, nesta parte, fundada dúvida sobre a quantificação do ato tributário, visto que a Administração Tributária não poderia tomar em consideração para efeito da correção do apuramento do lucro tributável, o montante de € 498.797,90, mas apenas o valor de € 493.989,40, que é aquele de que o promitente vendedor passa a beneficiar por efeito do falado acordo de revogação do contrato, o que, por si só, conduz à anulação do ato nos termos do disposto no artigo 100.º, n.º 1, do CPPT.
Face à solução a que se chega, fica prejudicada a questão de saber em que período de tributação devia ter sido reconhecido o rédito.
Por todo o exposto, o pedido arbitral mostra-se ser procedente.
Prestação de garantia indevida
9. A Requerente veio ainda requerer a condenação da Administração no pagamento de indemnização pelos prejuízos resultantes de prestação de garantia indevida.
Sem dúvida que o artigo 171.º do CPPT garante a indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada, que poderá ser requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda, havendo de entender-se que o processo arbitral é também o meio processual próprio para deduzir esse pedido.
O artigo 53.º da LGT admite ainda que o devedor que ofereça garantia bancária ou equivalente para suspender a execução fiscal será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos, salvo quando se verifique na impugnação judicial que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo, caso em que a indemnização não está dependente do prazo pelo qual vigorou a garantia.
Em qualquer caso, a indemnização está dependente da prestação de garantia, tendo em vista o ressarcimento das despesas em que o interessado, a esse título, tenha incorrido.
Não tendo sido alegado que tenha sido instaurado o processo executivo nem prestada a garantia destinada a obter a sua suspensão, não se verificam os pressupostos de que depende a atribuição da pretendida indemnização, que assim é improcedente.
III – Decisão
Termos em que se decide:
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Não conhecer do pedido relativamente ao ato de liquidação nº 2020..., referente a retenção na fonte em IRS e juros compensatórios, que foi objeto de anulação administrativa, por impossibilidade superveniente da lide;
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Julgar procedente o pedido arbitral e anular o ato de liquidação em IRC n.º 2020 ... e correspondentes juros compensatórios, relativo ao exercício de 2016;
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Julgar improcedente o pedido de condenação da Administração no pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida.
Valor da causa
A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 391.432,65, que não foi contestado pela Requerida e corresponde ao valor da liquidação a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da causa.
Custas
Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 24.º, n.º 4, do RJAT, e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e Tabela I anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 6.426,00, que fica a cargo da Requerida, tendo ainda em consideração o disposto no artigo 536.º, n.º 3, do CPC quanto à extinção parcial da instância por impossibilidade superveniente da lide.
Notifique.
Lisboa, 11 de fevereiro de 2022
O Presidente do Tribunal Arbitral
Carlos Fernandes Cadilha
O Árbitro vogal,
Martins Alfaro
A Árbitro vogal
Catarina Gonçalves