Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 546/2020-T
Data da decisão: 2022-01-17  IRC  
Valor do pedido: € 238.697,98
Tema: IRC - Benefícios fiscais – RFAI – deduções à coleta de IRC – Tipologia de investimento (inicial) e criação líquida de postos de trabalho – Art. 22.º CFI.
Versão em PDF

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Os árbitros Alexandra Coelho Martins (árbitro presidente), Arlindo José Francisco e Eduardo Paz Ferreira (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formarem o presente Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 13 de janeiro de 2021, acordam no seguinte:

 

I.             RELATÓRIO

 

No dia 15 de outubro de 2020, A..., S.A., adiante designada por “Requerente”, com o número de identificação de pessoa coletiva ... e sede em ...,  ..., ... ...-... ..., apresentou pedido de constituição de Tribunal Arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1 alínea a) e n.º 2, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), na redação vigente.

 

É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante identificada por “AT” ou Requerida.

 

A Requerente pretende a declaração de ilegalidade das decisões de indeferimento das reclamações graciosas deduzidas contra os atos tributários de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”), abrangendo os períodos de tributação de 2015 a 2018, emitidos sob os n.ºs 2019..., 2019..., 2019... e 2019... e dos juros compensatórios inerentes, no valor global de € 238.697,98, com as legais consequências, nomeadamente o reembolso dos montantes indevidamente pagos, acrescidos de juros indemnizatórios.

 

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD em 16 de outubro de 2020 e automaticamente notificado à AT.

 

Nos termos do disposto nos artigos 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT, o Conselho Deontológico do CAAD designou os árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

As Partes, notificadas dessa designação em 10 de dezembro de 2020, não manifestaram vontade de a recusar, atento o preceituado nos artigos 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT, 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 

O Tribunal Arbitral Coletivo ficou constituído em 13 de janeiro de 2021.

 

Com a aprovação da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, foram suspensos os prazos procedimentais e processuais, no âmbito das medidas da pandemia Covid 19. Esta suspensão cessou com a entrada em vigor da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, prosseguindo a tramitação processual a partir de 6 de abril de 2021.

 

Em 28 de abril de 2021, a Requerida apresentou a sua Resposta, na qual se defende por impugnação, tendo junto, na mesma data, o processo administrativo (“PA”).

 

Em 23 de junho de 2021, teve lugar a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, com inquirição da testemunha arrolada pela Requerente (tendo as demais sido por esta prescindidas). As Partes foram notificadas para apresentarem alegações simultâneas no prazo de 25 dias. Fixou-se, ainda, o prazo para prolação da decisão, com advertência da necessidade de pagamento da taxa arbitral subsequente por parte da Requerente até essa data (v. ata que se dá por reproduzida e gravação áudio disponível no SGP do CAAD).

Em 3 de setembro de 2021, a Requerente apresentou as suas alegações e a Requerida contra-alegou em 6 de setembro de 2021, tendo ambas as Partes reafirmado, no essencial, as posições assumidas nos articulados iniciais.

 

Por despachos de 8 de setembro e de 12 de novembro de 2021, foi prorrogado o prazo para prolação da decisão, ao abrigo do artigo 21.º, n.º 2 do RJAT, derivado da tramitação processual, da interposição de períodos de férias judiciais e da situação pandémica.

 

POSIÇÃO DA REQUERENTE

 

A Requerente contesta as correções promovidas pela Requerida às deduções à coleta que efetuou, nos períodos de 2015 a 2018, ao abrigo do benefício fiscal do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (“RFAI”), reportadas aos investimentos realizados nos anos de 2015 e 2016, considerando que os mesmos são elegíveis por cumprirem todos os requisitos previstos na lei.

 

Começa por suscitar a inconstitucionalidade orgânica do artigo 2.º, n.º 2, alínea d) da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, por violação do princípio da legalidade tributária e da reserva de lei (v. artigos 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, alínea i) da Constituição), na medida em que limita o âmbito objetivo de aplicação do RFAI aos denominados “investimentos iniciais”, o que consubstancia a introdução de um requisito adicional não previsto no artigo 22.º, n.º 2 do Código Fiscal do Investimento (“CFI”), que se basta com a aquisição de “ativos fixos tangíveis em estado de novo” que sejam “afetos à exploração da empresa”.

 

                O Regulamento (UE) n.º 651/2014, da Comissão, de 17 de junho de 2014, designado por Regulamento Geral de Isenção por Categoria ou “RGIC” , tem por exclusivo efeito permitir aos Estados-Membros aprovar regimes domésticos de auxílio, isentando-os, nas condições aí estabelecidas, da obrigação de notificação, i.e., dispensando-os de análise e autorização prévia pela Comissão Europeia. Entende, assim, não ser convocável o argumento de interpretação conforme ao RGIC.

 

Independentemente da referida inconstitucionalidade, sustenta que os investimentos em causa são plenamente elegíveis, atento o respetivo enquadramento no conceito de investimento inicial, na modalidade de aumento da capacidade (produtiva) de um estabelecimento já existente, e a observância do requisito de criação de postos de trabalho, nos termos prescritos pelo artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do Código Fiscal do Investimento (“CFI”).

 

Em relação ao aumento de capacidade, segundo a Requerente, tal não implica que se verifique um efetivo aumento da produção, dado o risco da atividade económica e o seu desfecho incerto, precisamente as características que justificam o estímulo através de um auxílio público desta natureza. Em qualquer caso, o volume de negócios não constitui indicador idóneo para essa aferição, pois a variável preço não está diretamente ligada à capacidade instalada de uma empresa. Além do mais, a Requerente refere ter lançado novos produtos em 2016.

 

Por outro lado, salienta a Requerente que o aumento da capacidade produtiva da sua unidade fabril não é apenas alcançável com a aquisição de um novo forno, podendo também sê-lo através da aquisição de ativos que aumentem a capacidade ao longo das diversas fases do processo produtivo – extrusão, prensagem, secagem e cozedura. Os concretos investimentos efetuados nos sistemas associados aos fornos e complementares (novos equipamentos de aspiração, embalamento, informáticos e de segurança) tiveram por objetivo o incremento de 7% da capacidade produtiva e foram imprescindíveis para suportar este acréscimo e para assegurar o fabrico e a comercialização dos novos produtos, não tendo sido considerados relevantes os investimentos de mera substituição. 

 

Sobre o requisito de criação de postos de trabalho, a Requerente invoca erro de direito, na análise da AT. Preconiza que o artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do CFI apenas exige que o investimento realizado contribua direta e causalmente para a criação de novos postos de trabalho no momento da sua conclusão, independentemente de, no mesmo período, se registarem outras entradas e saídas de trabalhadores. A criação de postos de trabalho tem, deste modo, de ser aferida por referência direta e causal ao investimento realizado e não à atividade global do sujeito passivo, podendo o saldo entre o número global de entradas e de saídas de trabalhadores ser negativo. Acrescenta que o período relevante para aferir a satisfação da condição de criação de postos de trabalho não abrange todo o período em que o investimento foi realizado, mas apenas o momento da conclusão do investimento realizado, quando este esteja pronto para entrada em funcionamento. Realça que a locução “postos de trabalho” empregue pelo legislador nacional abrange tanto a celebração de contratos a termo, como de contratos sem termo, e consubstancia um requisito subordinado ao objetivo principal do RFAI, conformado como um incentivo ao investimento e não à criação de emprego.

 

Nota a Requerente que, apesar de o RFAI ser um regime de auxílios com finalidade regional, o artigo 14.º do RGIC (que regula os auxílios regionais ao investimento) não exige a criação de postos de trabalho como condição, pelo que se trata de um requisito que constitui uma inovação do legislador nacional, que não deve ser interpretado por apelo ao RGIC. Mesmo que assim não se entendesse, argui a Requerente que o decalque do disposto no artigo 14.º, n.º 9, alínea a) do RGIC por parte da AT é parcial e seletivo. Com efeito, a Requerida invoca a condição de aumento líquido do número de trabalhadores relativamente à média dos 12 meses precedentes, deduzido das perdas de postos de trabalho, desconsiderando, porém, a alínea b) daquele n.º 9, que estabelece a possibilidade de cada posto de trabalho ser preenchido nos três anos subsequentes à realização do investimento. Conclui a Requerente que esta interpretação viola os princípios da legalidade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade (v. artigo 55.º da LGT).

 

Aduz que a AT nem sequer aplicou devidamente a referida fórmula, pois, nos períodos de tributação de 2015 e 2014, não atendeu ao referencial da média de trabalhadores dos 12 meses precedentes, limitando-se a apurar o saldo de entradas e saídas de trabalhadores nos exercícios em causa.

 

Por fim, invoca a ilegalidade autónoma da liquidação de juros compensatórios, por falta de fundamentação que justificasse ou demonstrasse o pressuposto de culpa do sujeito passivo, nos termos do disposto no artigo 35.º da LGT.

 

POSIÇÃO DA REQUERIDA

 

Segundo a Requerida, cabe ao contribuinte o ónus de comprovar os pressupostos dos benefícios fiscais (v. artigo 74.º, n.º 1 da LGT), não tendo a Requerente demonstrado os factos essenciais que alega, maxime o nexo causal com o objetivo de aumento da capacidade produtiva e os indicadores demonstrativos de que o resultado dos investimentos realizados se traduziu num aumento efetivo de capacidade produtiva e/ou na diversificação da produção, tendo-se verificado, em oposição, uma diminuição do número de trabalhadores no período em que os investimentos foram concluídos (2016).

 

As normas do CFI relativas ao RFAI têm que ser entendidas à luz das regras do RGIC, que é um regulamento de direito europeu de aplicação obrigatória, pelo que dispensa transposição e beneficia do princípio da prevalência do direito europeu sobre a legislação interna. O RGIC concretiza o disposto nos artigos 107.º a 109.º do TFUE e estabelece o enquadramento deste tipo de auxílios com finalidade regional, pelo que o investimento tem de enquadrar-se numa das referidas quatro tipologias.

 

Acrescenta que o CFI e a citada Portaria n.º 297/2015 são instrumentos de execução do RGIC, pelo que não se verifica a invocada inconstitucionalidade da Portaria, que se limita a transpor a noção do artigo 14.º, n.º 13 do RGIC, diploma que constitui o seu suporte legal habilitante. Assim, para que o investimento efetuado em aplicações relevantes seja elegível, é necessário que integre o conceito de "investimento inicial", salientando-se que não se considera aplicação relevante a aquisição isolada de ativos que não integrem tal conceito e, ainda, a não elegibilidade como aplicações relevantes dos investimentos efetuados na aquisição de equipamentos de substituição.

 

No que se refere à criação e manutenção de postos de trabalho, a Requerida argui que, seguindo a metodologia das orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020 (OAR), publicadas no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 209, de 23 de julho de 2013, deve atender-se não só à criação de novos postos de trabalho gerados pelo investimento relevante no âmbito do RFAI, mas também ao aumento líquido de emprego relativamente à globalidade dos trabalhadores da empresa. Tratando-se de um projeto com uma duração plurianual, admite-se que os requisitos exigidos quanto à criação dos postos de trabalho, só possam vir a ser aferidos após a conclusão do projeto mas, naturalmente, tomando como termo de comparação o período de tributação anterior ao investimento (2014).

 

No caso, no cômputo do saldo das entradas e saídas verificadas nos anos em que os investimentos foram realizados, por comparação a 2014 , há sempre uma diminuição do número total de trabalhadores. E, numa análise específica efetuada em função dos contratos de trabalho sem termo no acumulado dos dois anos relativo ao período do investimento verificou-se uma diminuição do número de postos de trabalho na Requerente. Além de que um dos trabalhadores que a Requerente indicou como especificamente contratado em razão da realização do investimento efetuado já não exercia funções na Requerente em 2017. Para a Requerida o entendimento da Requerente contraria um dos objetivos do RFAI, expresso no Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, que visa apoiar os investimentos que proporcionam “a criação ou manutenção de postos de trabalho”.

 

Conclui a Requerida não estar satisfeita a condição relativa à criação de postos de trabalho que compreende não só os novos postos de trabalhos gerados pelo investimento relevante no âmbito do RFAI, como também o aumento líquido de emprego relativamente à globalidade dos trabalhadores da empresa. Assim, à luz do disposto no artigo 22.º, n.º 4, alínea c) do CFI:

i)             Cada novo posto de trabalho diretamente relacionado com o investimento realizado, tem de ser mantido durante o período mínimo de detenção dos bens objeto de investimento;

ii)            O investimento deve conduzir a um aumento líquido do número de trabalhadores durante cada um dos períodos abrangidos pela norma por comparação com o final do período de tributação do ano pré-projeto;

iii)           Apenas relevam trabalhadores admitidos por contrato de trabalho sem termo.

 

Por fim, a Requerida propugna não serem devidos juros indemnizatórios por não se verificar o pressuposto de erro imputável aos serviços.

 

II.            SANEAMENTO

 

O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, relativa a liquidações de IRC e juros compensatórios inerentes, atenta a conformação do objeto do processo (v. artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 5.º do RJAT).

 

O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, conjugado com o artigo 102.º, n.º 1, alínea e) do Código de Processo e Procedimento Tributário (“CPPT”), i.e., até ao decurso de 90 dias sobre a notificação das decisões de indeferimento das reclamações graciosas deduzidas contra os atos tributários impugnados na presente ação.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (v. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

Não foram identificadas questões prévias a apreciar. O processo não enferma de nulidades.

 

III.          FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

 

1.            FACTOS PROVADOS

 

Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos:

 

A.           A A..., S.A., aqui Requerente, é uma sociedade comercial anónima, inscrita com o CAE  principal 23322 – Fabricação de Telhas, que se dedica à produção de telhas cerâmicas na unidade fabril localizada no concelho de ...– cf. Relatório de Inspeção Tributária de 2015/2016 (“RIT1”) junto aos autos (Documento 12 e PA).

B.            Nos anos 2015 e 2016, com o objetivo de incremento da capacidade produtiva da referida fábrica, a Requerente realizou investimentos na sua unidade fabril, no valor global de € 898.674,05, consubstanciados na aquisição, em estado de novo, dos seguintes ativos – cf. depoimento da testemunha inquirida, em relação ao aumento da capacidade de produção, e RIT1:

Descrição do investimento         2015      2016

Edifícios

Reparação instalações afetas a atividades fabris               29.792,01             30.807,10

Edifícios total    29.792,01             30.807,10

Equipamento básico

Balança térmica                               1.314,00

Cais de carga                     9.150,00

Caixa matriz       91.099,59             200.816,70

Componentes para linha produtiva         2.006,00              

Compressor                       26.138,00

Computador industrial  3.741,28              

Consola 4.000,00              

Controlador de temperatura e humidade                            4.800,00

Controladores                  24.228,53

CPU industrial   2.124,16              

Equipamento de acondicionamento       1.448,00              

Equipamento de suporte de telhas para cozedura           47.366,60             47.995,00

Equipamento informático                           7.398,84

Extrusora            11.930,00            

Forno de laboratório para testes                             6.700,00

Furadora             3.143,48              

Material refratário para vagonas              9.909,50              

Pinças                   12.000,00

Sistema de aspiração     6.870,00              

Sistema de despoeiramento                      29.260,00

Sistema de proteção e segurança contra incêndio                            10.008,19

Sistema de proteção e segurança de proteção   20.800,84            

Sistema de segurança    40.278,61            56.992,17

Sistema de segurança Lototo     12.040,00           

Software de embalagem              6.835,98              

Suporte de telhas (queimadores)                            9.968,50

Vagonetas e Vagonas    30.000,00            29.999,86

Variador de frequência 19.177,49            5.292,00

Equipamento básico total            312.771,53          482.061,79

Equipamento administrativo

Equipamento informático            9.712,73               6.457,52

Sistema de climatização da produção     2.151,52              

Sistema de comunicação              1.232,00              

Sistema de comunicação e interconectividade   107,15  

Sistema de prevenção de interrupções 3.147,70              

Sistema de segurança Lototo     17.821,00           

Equipamento administrativo total            34.172,10            6.457,52

Equipamento administrativo Total Indef.

Sistema para prevenção de interrupções produtivas       777,00  

Equipamento administrativo total indef.              777,10   6.457,52

Intangíveis – software

Software de controlo de carga                   770,00

Software de controlo de temperatura                   1.065,00

Intangíveis – software total                        1.835,00

Subtotal por anos            377.512,64          521.161,41

Total Geral         898.674,05

 

C.            As fases do processo produtivo da Requerente – extrusão, prensagem, secagem e cozedura – estão funcionalmente interligadas, pelo que o aumento de capacidade de produção implicou a realização de investimentos ao longo da cadeia, nomeadamente, a aquisição de:

a)            Matrizes de resina, em vez de gesso, para aumentar a disponibilidade de moldes e a produção de peças;

b)           Vagonetas, para permitir o transporte e o acondicionamento (no processo de secagem) de um maior número de peças;

c)            Vagonas e equipamentos de suporte das peças para aumentar a respetiva capacidade de acondicionamento e transporte no processo de cozedura,

– cf. depoimento da testemunha inquirida em relação aos equipamentos listados no RIT1.

D.           A Requerente realizou também investimentos complementares, adquirindo novos equipamentos de aspiração, de embalamento, informáticos e de segurança e duplicou o número de cais de carga, tudo para suportar o acréscimo de capacidade produtiva – cf. depoimento da testemunha inquirida em relação aos equipamentos listados no RIT1.

E.            Em 2016 a Requerente lançou novas referências de produtos: telha vidro ... (...); telha... (...), telhão ... (...) e telha mini ... (...) – cf. depoimento da testemunha inquirida e Documento 4.

F.            Em outubro de 2016 a Requerente encomendou ao fornecedor alemão B... GmbH equipamentos (matrizes) para a produção de telhas, sob a designação “...”, os quais foram inteiramente faturados à Requerente por documento datado de 5 de dezembro de 2016 e determinado o seu pagamento em 21 de dezembro do mesmo ano. O referido fornecedor reportou a transmissão intracomunitária dos ditos equipamentos com referência ao mês de setembro de 2017 – cf. Documentos 30 e 32 e RIT1.

G.           Em 26 de maio de 2017, a Requerente apresentou uma declaração de substituição da modelo 22 de IRC referente ao período de tributação de 2015, na qual fez constar um crédito fiscal de € 94.378,16, deduzido à coleta de IRC, por considerar que, ao abrigo do disposto no artigo 22.º do CFI, em resultado dos investimentos realizados nesse ano, lhe assistia o benefício fiscal do RFAI, por serem suscetíveis de contribuir diretamente para o aumento da sua capacidade produtiva – cf. RIT1 e Documentos 5, 3 e 9.

H.           Na declaração modelo 22 respeitante a 2016, a Requerente inscreveu um crédito fiscal no montante de € 130.290,35, também resultante dos investimento realizados nesse exercício que considerou elegíveis para efeitos de RFAI, nos moldes referidos no ponto precedente. Este crédito foi parcialmente deduzido à coleta de IRC de 2016, na importância de € 38.870,68, tendo o valor remanescente, de € 91.419,67, sido reportado para os períodos seguintes, nos termos do disposto nos artigos 23.º, n.ºs 2 e 3 do CFI – cf. RIT1 e Documentos 6, 3 e 9.

I.             No cômputo dos investimentos considerados relevantes pela Requerente, para efeitos de aplicação do RFAI, esta incluiu diversas adições cujo descritivo nas correspondentes faturas de compra consiste em “reparar”, “reparação”, “alterar”, ou “trocar”. As faturas que contêm estas referências perfazem o valor de € 27.713,83, líquido de IVA (€ 6.374,18) – cf. RIT1 (anexo 3).

J.             O mencionado crédito fiscal reportado pela Requerente no valor de € 91.419,67 foi deduzido à coleta do IRC dos exercícios de 2017 e 2018, nas importâncias de € 49.983,53 e de € 41.436,14, respetivamente – cf. RIT1 e Documentos 7 e 8.

K.            No ano 2019, foi realizado um procedimento inspetivo à Requerente, pela Divisão de Inspeção Tributária II da Direção de Finanças de..., ao abrigo das Ordens de Serviço n.ºs 012018... e 012019..., abrangendo os períodos de tributação dos anos 2015 e 2016, respetivamente, para efeitos de controlo declarativo de IRC e avaliação de benefícios fiscais utilizados – cf. RIT1.

L.            No âmbito do referido procedimento, foi proposta a desconsideração total das deduções à coleta declaradas pela Requerente nos períodos de tributação de 2015 e 2016, correspondentes aos créditos fiscais apurados no âmbito do RFAI, acima referidos – cf. Documento 10.

M.          A Requerente exerceu o direito de audição e manifestou a sua discordância em relação aos argumentos invocados pela AT no Projeto de Correções do Relatório de Inspeção – cf. Documento 11.

N.           O projeto de relatório foi convolado em definitivo e notificado à Requerente em julho de 2019, com a manutenção de todas as correções propostas, com os fundamentos seguidamente transcritos – cf. RIT1.

“III-DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

As situações detetadas sujeitas a correção são as que seguidamente se descrevem:

3.1- Exercícios de 2015 e de 2016

3.1.1- Em sede de IRC anos de 2015 e 2016

3.1.1.1- Dotação de benefício RFAI indevido e correção da dedução à coleta

Nos exercícios de 2015 e 2016, em sede de IRC, o sujeito passivo inscreveu nas declarações de  rendimentos modelo 22, entregues em 2017-05-26, no campo 355 — benefícios fiscais - do quadro 10  das referidas declarações, a dedução à coleta das importâncias de € 94.378,16 e € 38.870,68 respetivamente.

Tais montantes, conforme referenciados no anexo D das referidas declarações, decorre da dedução de  valores de dotação com origem no REGIME FISCAL DE APOIO AO INVESTIMENTO (RFAI) previsto nos artigos 22.º  a 26.º do Código Fiscal do Investimento (CFI) aprovado pelo Dec.-Lei n.º 162/2014, de 31/10, conforme se reproduz por cada um dos anos em causa

[…]

Nos termos do referido CFI, o RFAI é aplicável aos períodos de tributação iniciados em ou após 1 de  janeiro de 2014, estabelecendo-se ainda o âmbito de aplicação e definições do RFAI, designadamente a   quem se aplica, quais as aplicações relevantes, as condições objetivas e cumulativas exigidas aos  sujeitos passivos para poderem beneficiar deste regime, outras definições e enquadramentos, os benefícios e obrigações acessórias, e designadamente os elementos a constarem do processo de  documentação fiscal.

Pela Portaria 297/2015 de 21 de setembro foi estabelecido em melhor detalhe a regulamentação do RFAI, entre outros nomeadamente os conceitos de investimento/aplicações relevantes e elementos a constar no processo de documentação fiscal.

Analisados os elementos justificativos apresentados constata-se que o sujeito passivo se refere a investimentos efetuados alegadamente entre os anos de 2015 e 2016, que justifica imputável para efeitos de RFAI e de acordo com os seus mapas nos montantes resumidos no quadro seguinte:

Ano       Investimento    Percentagem apuro benefício fiscal        Benefício Fiscal apurado pelo SP              Valor utilizado na dedução à coleta       Em saldo no final de 2016

                                                               Do ano 2015       Do ano 2016      

(1)          (2)          (3)          (4)=(2)x(3)         (5)          (6)          (7)=(4)-(5)-(6)

2015      377.512,64          25%       94.378,16            94.378,16             0,00       0,00

2016      521.161,41          25%       130.290,35          0,00       38.870,68             91.419,67

Totais    898.674,05          -              224.668,51          94.378,16             38.870,68            91.419,67

 

Os investimentos em causa efetuados em 2015 (referenciados no quadro anterior em €377.512,64) encontram-se registados em ativos fixos tangíveis em curso, tendo sido dados como concluídos em 2016, ano em que foram registados outros investimentos (referenciados no quadro anterior em €521.161,41).

Efetuados pedidos de esclarecimentos ao sujeito passivo sobre os referidos investimentos e o seu   enquadramento em sede de RFAI concluiu-se conforme seguidamente se descreve.

               

1-  Enquadramento dos investimentos efetuados

Nos termos do RFAI, consideram-se aplicações relevantes, as efetuadas no âmbito de um investimento inicial (nos termos da portaria 297/2015 de 21 de setembro) e, designadamente investimento em ativos fixos tangíveis afetos à exploração da empresa adquiridos em estado novo, afastando-se desde logo mobiliário e artigos de conforto ou decoração ou outros bens que  não estejam afetos à exploração da empresa, bem como eventuais reparações de equipamentos pré-existentes.

A alínea d) do nº 2 do artigo 2º da portaria 297/2015 de 21 de setembro, regulamenta e estabelece claramente que o RFAI apenas se aplica a investimentos iniciais (novos), considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação  da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente  nesse estabelecimento,  ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um  estabelecimento existente.

Atendendo ao justificado pelo sujeito passivo quanto ao enquadramento dos seus investimentos obtivemos a seguinte resposta:

«A..., S.A.

Regime Fiscal de Apoio ao Investimento

DESCRIÇÃO E ENQUADRAMENTO DO INVESTIMENTO INICIAL

(ao abrigo da alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da Portaria 297/2015, de 21 de Setembro)

A A..., S.A. (“A...” ou “Empresa”), com instalações localizadas no concelho de ... (...), dedica-se ao fabrico de telhas cerâmicas e acessórios (CAE 23322), caracterizando-se pela aposta na modernização tecnológica, assente numa estratégia de diversificação e de qualidade dos produtos oferecidos.

No decurso dos períodos de tributação de 2015 e de 2016, a A... realizou um conjunto de investimentos em equipamentos e tecnologias considerados relevantes para a sua actividade, tendo por objectivo o aumento substancial da capacidade de produção instalada nas suas instalações produtivas em ... .

Os investimentos realizados permitiram a criação de condições para a produção de novos produtos e, ainda, o aumento da produção dos produtos existentes, tendo culminado na geração de capacidade para entrar em novos mercados (desde logo, iniciaram exportações para o mercado da Argélia).

De modo a comportar este aumento significativo de capacidade, foi necessário realizar investimentos em sistemas de segurança tecnologicamente avançados, bem como, investimentos que permitiram obter ganhos significativos de produtividade e de eficiência energética.

Concretamente, os principais investimentos centraram-se em automação de parte da linha produtiva através da aquisição de vagonas de estufa, aumento da qualidade da produção e do produto por via da aquisição de equipamentos laboratoriais tecnologicamente avançados, elevação dos níveis de segurança de toda a operação de produção através da aquisição de estruturas de protecção, sistema de aspiração, entre outros, essenciais para suportar o aumento de capacidade instalada e, ainda, outros investimentos em equipamentos com inovadoras características e funcionalidades técnicas, nomeadamente caixas matrizes para novos produtos e fornos de cozedura de telhas e acessórios.

Estes investimentos permitiram, desde logo, uma variação positiva significativa nas quantidades de unidades de acessórios produzidos e vendidos em 2016.

***

Em face do exposto no presente documento, julgamos estar devidamente fundamentado que o conjunto de investimentos realizados pela A... nos períodos de tributação de 2015 e de 2016 enquadra-se na tipologia de investimento de “aumento da capacidade de um estabelecimento já existente”, nos termos previstos na alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de Setembro.»

Em face da resposta do sujeito passivo, pode-se inferir que os investimentos realizados pretenderam cobrir um pouco das várias vertentes enunciadas no referido normativo, embora pareça estar mais direcionado, como se conclui, para o “aumento da capacidade de produção”.

Porém, algumas referências podem pretender remeter em parte para a diversificação da produção ou eventualmente alteração fundamental do processo de produção, e nesse caso teria de se ter conta o cumprimento do nº 2 e/ou do nº  1 do art. 3º da portaria 297/2015 de 21 de setembro, constatando-se pelos dados exigíveis não terem os investimentos efetuados enquadramento para serem considerados como investimentos / aplicações relevantes nesta vertente.

[…]

Como se constata do quadro resumo [idêntico ao constante do ponto B. supra], a parte mais significativa dos investimentos, cerca de 88%, refere-se a equipamentos básicos.

Contudo, desses equipamentos básicos, uma parte representativa de cerca de 32% do total de investimentos refere-se a “matrizes”, ou seja, moldes para a indústria cerâmica, sendo outra parte de cerca de 18% do total referente a outro material de desgaste, cuja necessidade de substituição é constante e fundamental para o fabrico dos seus produtos, como será o caso por exemplo de “equipamento de suporte de telhas para cozedura”, “material refratário para vagonas”, “Vagonetas e Vagonas”. O conjunto dos bens referidos representam assim cerca de 51 % do total dos investimentos indicados (e 58% em relação a todo o equipamento básico).

Relativamente ainda à aquisição dos bens referidos no parágrafo anterior, sendo decorrente de uma necessidade constante e fundamental para o fabrico dos seus produtos, é manifesto que, enquanto equipamento básico fundamental e constante para o processo de laboração normal da empresa, não estará a contribuir para «… criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente», não podendo assim integrar o conceito de investimento inicial.

Tendo sido solicitadas cópias de documentos de suporte de alguns dos itens de investimento identificados, a título de amostragem, verifica-se pela análise das mesmas a existência de algumas que se incluem no âmbito de reparações, beneficiação ou complemento de equipamentos pré-existentes (veja-se, a título de exemplo, cópias de algumas faturas de 2015 e 2016 em anexo 3 - páginas 7 a 11 dos anexos).

Também se identificam nos investimentos itens que mais não são do que complemento à produção como é o caso por exemplo de sistemas de segurança, incêndio, aspiração, de embalamento e informáticos, os quais, ainda que necessários, eventualmente enquadráveis num plano de investimento mais concreto e evidente, não os encontramos porém associados a investimentos claros que permitam a leitura preconizada de «Aumento da capacidade de um estabelecimento já existente», como seria expectável nesta indústria, por exemplo com a construção de um novo forno e sistemas associados ou situações equivalentes.

Acresce que, da amostra selecionada, se detetaram valores incluídos nos investimentos alegadamente elegíveis que indiciam corresponderem a adiantamentos financeiros de valores referente a bens a serem fornecidos, e como tal não enquadrável nos investimentos elegíveis nos termos do nº 5 do artº 22º do CFI («Considera-se investimento realizado o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis  e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a  adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso.» sublinhado nosso), como  é o caso da fatura de € 144.844,70 incluído no item de investimento “Caixa matriz” de 2016 e  que se junta em anexo 4  […]

 Também se faz notar que a evolução do volume de negócios dos anos de 2015 a 2017, não  acompanha a afirmação de que tenha havido um aumento significativo da produção:

                2014      2015       2016      2017

Vendas e serviços prestados      13.386.980,32    13.422.927,13    11.838.895,19    11.508.531,74

 

Considerando também a variação da produção nos anos de 2016 (finalização do investimento) e 2017, a tendência foi de diminuição, o que agregado ao volume de negócios, reforça a incongruência da afirmação de que tenha havido aumento significativo da produção:

                2016      2017

Variação nos inventários da produção   -224.331,11        -38.972,33

 

Não se identificam assim investimentos que de uma forma relevante e coerente evidencie como novo e agregador de outros, não parecendo dos investimentos indicados resultar evidência de constituírem um investimento capaz de se enquadrar como integrando no conceito de investimento inicial.

Criação de postos de trabalho

Além dos investimentos relevantes a considerar, importa também ter em conta o cumprimento cumulativo das condições previstas no nº 4 do artº  22º  do CFI, designadamente o previsto na al.  f) dessa norma, ou seja, que o investimento relevante proporcione a criação de postos de  trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de   investimento.

De referir que um dos objetivos dos benefícios fiscais ao investimento previstos no Código Fiscal do Investimento (CFI) no qual se inclui o RFAI é de que os investimentos proporcionem a criação  e manutenção de postos de trabalho (veja-se o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de  outubro, e o seu artigo 1º).

Ora, é nessa referida condição, a da criação de postos de trabalho, que observamos que o sujeito passivo não cumpriu com a mesma, pois contratou menos trabalhadores do que os que saíram no acumulado dos períodos de investimento, conforme elementos seguidamente descritos.

Atendendo a valores agregados sem distinção de tipo de contrato de trabalho (com termo ou sem termo), retira-se de alguns dados constantes do declarado pelo sujeito passivo em obrigações fiscais ou parafiscais os seguintes elementos indicativos da evolução do número de postos de trabalho da empresa:

1-            Segundo os dados da IES:

 

IES          Ano 2014             Ano 2015             Ano 2016             Variação 14/16

Pessoas remuneradas   109         111         103         -6

 

2-            Segundo os dados das DMR (último período anual):

 

IES          Ano 2014             Ano 2015             Ano 2016             Variação 14/16

Pessoas remuneradas   111         108         100         -11

 

[…]

 

1-            De acordo com o anexo B – fluxo de entrada e saída de trabalhadores – do referido relatório único de cada um dos anos (anexos 1 e 2 ao presente relatório), o número de trabalhadores entrados e saídos, independentemente da situação e relação laboral que tinham, se por contrato a termo ou sem termo, verifica-se que as diferenças entre trabalhadores entrados e os saídos totalizaram as quantidades seguintes:

 

          Descrição            Ano 2015             Ano 2016             Totais

1             Entradas              14           5             19

2             Saídas   14           14           28

3             Diferenças (=1-2)             0             -9            -9

 

2-            Analisados as situações laborais, inícios dos contratos, alterações legais e aditamentos, conclui-se que os trabalhadores referenciados na listagem remetida pelo sujeito passivo parecem enquadrar-se na tipologia requerida, ou seja, entradas e saídas de trabalhadores na situação de contratação sem termo com a seguinte observação:

- Relativamente à trabalhadora “C...” não foi remetida informação sobre a situação laboral da mesma: embora pareça poder enquadrar-se no presente caso;

3-            Contudo, além das situações entradas e saídas referidas, quer pela análise das DMRs, quer por via do anexo B do relatório único, apuraram-se saídas de outros seis trabalhadores no ano de 2015, com tipo de contrato sem termo, e não referenciados na listagem do sujeito passivo, designadamente dos seguintes casos:

o             D...  (NIF: ...)

o             E... NIF:...)

o             F... (NIF: ...)

o             G...  (NIF: ...)

o             H...  (NIF: ...)

o             I...  (NIF: ...)

4-            Em face da conjugação de toda a informação de entradas e saídas de trabalhadores nas condições contratuais do tipo “sem termo” concluímos que o número de trabalhadores entrados (incluindo-se nestas entradas alterações de contratos a termo para contratos sem termo) e os saídos (de contratos sem termo) totalizaram as quantidades seguintes:

          Descrição            Ano 2015             Ano 2016             Totais

1             Entradas              1             11           12

2             Saídas   6              10           16

3             Diferenças (=1-2)             -5            +1           -4

 

 Verifica-se, quer numa abordagem genérica, quer numa abordagem seguida em função dos  contratos de trabalho sem termo, que no acumulado dos dois anos, período do investimento, se   verificou uma diminuição do número de postos de trabalho na empresa.

Constata-se assim que tendo na prática havido mais saídas do que entradas em contratos de  trabalho celebrados entre o sujeito passivo e os trabalhadores (postos de trabalho criados  diretamente pela própria empresa), o sujeito passivo não demonstra reunir na conclusão do investimento as condições exigíveis para poder beneficiar do incentivo fiscal do RFAI, designadamente por não cumprir com a condição de criação de postos de trabalho prevista pela al. f) do nº 4 do artigo 22º do CFI.

O entendimento por nós seguido encontra-se também em consonância com a interpretação já  publicamente expressa pela Autoridade Tributária constante da informações vinculativas designadamente no âmbito dos processos “2010 002853, PIV n.º 1212, com entendimento sancionado por Despacho de 2010-10-27, do Director-Geral”, e “2010 001800, PIV n.º 818, com Despacho de 2010-07-16, do Director-Geral” (ambos consultáveis no portal da AT na internet   […]

Em face do descrito, entende-se que o sujeito passivo não reuniu, as condições exigíveis para poder beneficiar do incentivo fiscal do RFAI (decorrente de investimentos efetuados entre 2015 e 2016), dado  não cumprir com as condições objetivas referidas em termos de investimento relevante e de criação de  postos de trabalho aferida no final do período de investimento ocorrido em 2016, pelo que se propõe a  correção dos montantes das dotações relativas aos anos de 2015 e 2016, nos montantes respetivamente de € 94.378,16 e € 130.290,35.

Dado que o montante da dotação de 2015 foi totalmente deduzido nesse mesmo ano será de proceder à correção do valor de coleta desse ano no referido montante de imposto de € 94.378,16. Quanto ao montante da dotação de 2016, dado que apenas foi parcialmente deduzido nesse mesmo ano será de proceder à correção do valor de coleta desse ano no montante de imposto de € 38.870,68, sendo que o remanescente (saldo transitado para períodos seguintes) no montante de €91.419,67, por não ser dedutível, não pode ser utilizado sendo de corrigir nos períodos seguintes e pelos montantes que tenha  sido utilizado.

[…]

                IX – DIREITO DE AUDIÇÃO – FUNDAMENTAÇÃO

[…]

9.2- Exercício do direito de audição exposição do sujeito passivo e outros elementos

Na sequência da notificação para o exercício do direito de audição veio o sujeito passivo exercer o  mesmo através de exposição entrada nesta Direção de Finanças de ... em 03/07/2019 […]

9.3- Apreciação dos factos expostos pelo sujeito passivo e conclusões

[…]

Sobre a referida dedução à coleta, a inspeção aponta duas razões para a sua não aceitação:

1-            Falta de evidência de que os investimentos indicados pelo sujeito passivo se constituam como capazes de se enquadrar como integrando o conceito de investimento inicial;

2-            Não cumprimento da condição de que o investimento proporcionou a criação líquida de postos de trabalho.

[…]

9.3.1- Relativamente à elegibilidade como investimento inicial – aumento da capacidade

O sujeito passivo aponta […] as razões pelas quais entende que os investimentos efetuados e considerados para efeitos do RFAI se encontram devidamente justificados, repartindo a sua exposição em referências mais específicas por tópicos que seguidamente se identificam:

1º DO ENQUADRAMENTO NO CONCEITO DE INVESTIMENTO INICIAL (pontos 11º a 20º);

A.           Enquadramento na tipologia de aumento de capacidade de estabelecimento existente (pontos 21º a 33º);

A1. Dos investimentos realizados em matrizes, vagonas, vagonetas, equipamentos de suporte de telhas (pontos 34º a 44º);

A2. Reparações, beneficiação ou complemento de equipamentos pré-existentes (pontos 45º a 49ª);

A3. Dos investimentos complementares (pontos 50º a 57º);

A4. Dos adiantamentos financeiros (pontos 58º a 61º);

A5. Dos indicadores de aumento de capacidade de um estabelecimento existente (pontos 62º a 66º);

Seguindo a ordem da exposição do sujeito passivo, concluímos o seguinte:

1º DO ENQUADRAMENTO NO CONCEITO DE INVESTIMENTO INICIAL (pontos 11º a 20º);

O sujeito passivo alega que «o legislador não definiu uma metodologia para comprovar o enquadramento na tipologia de investimento inicial - aumento da capacidade de um estabelecimento já existente (critério este aplicável à A...) – nem tão pouco determinou/categorizou as rubricas de investimento não elegíveis nas tipologias de investimento inicial, para além das anteriormente transcritas  no artigo 11.º.

Argumenta ainda que a AT não procurou obter informação qualitativa relevante, que não procurou obter esclarecimentos junto dos responsáveis da empresa relativamente às razões para terem sido considerados como relevantes / elegíveis os investimentos em causa, na tipologia de aumento de capacidade de estabelecimento existente, e que ao abrigo do princípio do inquisitório deveria a AT ter procurado compreender / confirmar quais os elementos agregadores que permitam o referido enquadramento dos investimentos conforme preconizado pelo sujeito passivo.

Importa assim referir, quanto ao exposto pelo sujeito passivo, que o conceito de investimento inicial compreende, nos termos da legislação citada no relatório da inspeção, designadamente a aquisição de ativos fixos tangíveis, em estado de novo, considerando-se nomeadamente os que visem, por exemplo, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, conforme o sujeito passivo veio alegar ser o seu caso.

Sucede, que por regra as leis são sejam gerais e abstratas e como tal não procuram necessariamente detalhar questões tão concretas como sugere o sujeito passivo, sendo possível em função das diversas normas apontadas, dos regulamentos europeus, fonte da origem destas, bem como de diversa jurisprudência, compreender o alcance e o pretendido pelas mesmas.

Nesse âmbito procedemos à análise dos elementos que o sujeito passivo forneceu decorrente do que lhe foi sendo solicitado e se traduziu nas conclusões que julgamos fundamentadas conforme expresso no  presente relatório.

O sujeito passivo foi oportunamente notificado no âmbito do controlo do incentivo fiscal previsto no Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (inserto no Código Fiscal ao Investimento- CFI) de 2015 e de 2016, para nomeadamente fornecer “Descrição do investimento inicial, indicando designadamente os  objetivos, áreas de intervenção e os principais investimentos, bem como o respetivo enquadramento  numa das tipologias previstas na alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da citada portaria”, bem como à “[i]dentificação da data e custo de aquisição de todas as aplicações relevantes, bem como listagem das faturas que titulem a respetiva aquisição” entre outros elementos e questões colocadas.

Em resposta o sujeito passivo forneceu o que entendeu, descrevendo os investimentos efetuados  conforme reproduzimos a página 7 do presente relatório, e que resultou, em face dos elementos analisados e conforme fundamentos expostos, nas conclusões descritas.

Ou seja, o principio do inquisitório, no presente procedimento, foi tido em conta, e visou a realização das diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não se encontrando subordinada à iniciativa do autor do pedido (artigo 58º da LGT).

Mas, porque o procedimento inspetivo não se esgota apenas no referido princípio, e atento entre outros ao princípio da participação/contraditório (artigos 8º da LGT, 45º do CPPT e 8º do RCPITA), o sujeito passivo teve no presente exercício do direito de audição a oportunidade de ultrapassar as lacunas na informação que anteriormente prestou e que entende que a inspeção não obteve, e que, do seu ponto de vista levou a que esta concluísse erradamente.

No sentido referido e porque o sujeito passivo não se conforma com as conclusões e o proposto em sede de projeto de correções da inspeção exerceu o referido direito de audição (princípio da participação/contraditório) juntando os elementos e argumentos que entendeu e que importa agora apreciar e concluir conforme expomos e fundamentamos ao longo do presente capítulo.

A. Enquadramento na tipologia de aumento de capacidade de estabelecimento existente (pontos 21º a 33º);

O sujeito passivo entende que não existe nenhuma definição na legislação sobre o que se deve entender por aumento da capacidade de um estabelecimento existente, mas, conclui no ponto 23º da sua exposição o que entende sobre este conceito, designadamente «o aumento de capacidade nesta (e em qualquer indústria) deve ser preconizada com a aquisição de um conjunto de equipamentos e tecnologias que promovam inequivocamente alcançar um aumento de produção (nº de peças produzidas) face à situação corrente ou de crescimento normal da Empresa».

Ora, parece-nos que o conceito do sujeito passivo vai de encontro ao que preconizamos no relatório, ou seja, os investimentos em causa devem visar “inequivocamente” (conforme salientado pelo sujeito passivo e que nós sublinhamos) o aumento da capacidade de produção.

 Nesse conceito de investimento enquadrável, como refere e bem o sujeito passivo, está um “conjunto de  equipamentos e tecnologias que promovam” tal desiderato, que na prática vai de encontro ao que expressamos no relatório no sentido de que os investimentos deveriam ter uma natureza agregadora em  torno de um investimento de conjunto e que, de forma independente, se destaque em relação ao preexistente.

Em função da atividade e indústria em que se insere o sujeito passivo (indústria cerâmica), e a título meramente de exemplo (pelo que como tal se admite outros possíveis), apontamos a construção de um novo forno e de eventuais sistemas associados como um tipo de investimento normal de aumento da capacidade.

Contudo, e porque se admite outros investimentos possíveis, não nos ficamos apenas pelo exemplo do forno conforme decorre na sequência do expresso no final do mesmo parágrafo como “ou situações  equivalentes”.

Claro está que tais investimentos devem ser vistos no “conjunto de equipamentos e tecnologias” que de forma fundamentada e inequívoca permitiam aferir o objetivo do aumento da capacidade de produção.

Não vemos de que forma o que expressamos no relatório seja assim tão desprovido de sentido ou não condicente até com os conceitos expressos peto sujeito passivo.

Aliás, o próprio sujeito passivo vem adiante reconhecer que o aumento da capacidade (na sua atividade) até acaba por passar pelos fornos, conforme se retira do concluído no ponto 24º da sua exposição ao admitir que: «De facto o aumento da capacidade está diretamente relacionado com a aposta na aquisição de um conjunto de activos que venham aumentar a capacidade de produção de um dos dois fornos da  Empresa».

Não estamos assim em desacordo com o sujeito passivo quanto a essa realidade, o que não   acompanhamos é que de forma inequívoca os investimentos em análise se enquadrem como um  investimento novo para efeitos de aumento de capacidade, antes se enquadrando a nosso ver como decorrente de uma necessidade constante e fundamental para o fabrico dos seus produtos no processo de laboração normal de empresa em torno e complementar dos ativos preexistentes naquilo que descreveríamos, usando a expressão do sujeito passivo, como «situação corrente ou de crescimento normal da Empresa».

O sujeito passivo resume e agrupa no ponto 25º os investimentos da seguinte forma:

Investimentos relevantes            2015      2016      Total

Matrizes de resina          91.099,59            200.816,70          291.916,29

Vagonas, vagonetas e equipamentos de suporte das telhas         87.276,10            87.963,36            175.239,46

Controladores, sistema de aspiração, sistema de despoeiramento, construção de novos cais de carga e outros equipamentos produtivos necessários ao projeto            105.048,80          165.380,99          270.429,79

Sistema de segurança    94.088,15            67.000,36            161.088,51

Total      377.512,64          521.161,41          898.674,05

 

Afirma o sujeito passivo que o conjunto dos investimentos indicados, pretendiam dotar a empresa de condições de incremento do número de peças produzidas. O objetivo era aumentar a capacidade de  produção em cerca de 7%, tendo por isso equacionado a realização de investimentos ao nível das várias fases nevrálgicas do processo produtivo, gerando o aumento de capacidade global. Afirmando ainda na sequência que logo a partir do ano de conclusão houve um aumento significativo das quantidades globais produzidas, num crescimento que indica de cerca de milhão de peças por ano.

Apesar do afirmado, não juntou quaisquer detalhes desses dados, não sendo assim possível aferir por essa via de que artigos concretamente está a falar, e até de que forma isso se refletiu em termos económico e financeiros, pois por via da análise das suas demonstrações financeiras não se extrai diretamente essa informação.

Vem aliás e ainda acrescentar no ponto 31º que os investimentos tiveram em vista também a criação de condições de produção de novos produtos. Contudo, tal afirmação coloca numa dúvida, de que conceito falamos, de apenas novas “telhas”, ou seja, outras referências de produtos que já produzia (por alteração por exemplo de modelos, dimensões, design), ou de facto refere-se a um “novo produto” enquanto alga verdadeiramente diferente dos artigos que já vinha produzindo.

Tais referências de alteração de métodos e introdução de novos produtos, poderiam apontar para alteração de processos de produção existentes e/ou para a diversificação da atividade, sendo estes enquadramentos diferentes do pretendido justificar enquanto apenas aumento da capacidade e que como tal implicariam o cumprimento do disposto respetivamente nos números 1 e 2 do artigo 3º da portaria 297/2015 de 21 de setembro que regulamenta o RFAI, o que em face dos valores e justificativos apresentados não permitem validar enquanto tal,.

Contudo, os produtos identificados pelo sujeito passivo, no caso “telhas” não podem ser considerados verdadeiramente novos produtos, mas antes novas referências de “telhas” sendo manifesto que esses produtos não podem ser considerados «(…) diversificação da produção de um estabelecimento no que  se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento» sendo, portanto, de excluir  essa eventualidade.

A1. Dos investimentos realizados em matrizes, vagonas, vagonetas, equipamentos de suporte de telhas (pontos 34º a 44º);

Em relação aos investimentos em matrizes e vagonas, vagonetas e equipamentos de suporte de telhas, o passivo afirma que no caso das matrizes tal investimento permitiu aumentar a produção de peças por minuto, e nas vagonas, vagonetas e equipamentos de suporte de telhas permitiram aumentar a capacidade na cozedura e na secagem.

Volta a referir ainda que lançou novos produtos (novas referências de telhas) aumentando a capacidade de produção existente, o que só se tornou possível devido à realização do investimento em análise.

Em face do descrito, verifica-se que a forma como o sujeito expõe quase aponta para uma alteração dos processos de produção existentes e para a diversificação da atividade, ainda que potencialmente se possam refletir em aumento da produção, o que para efeitos do RFAI implicaria enquadramento diferente e como atrás se referiu e designadamente o cumprimento de condições previstas nos números 1 e 2 do artigo 3º da portaria 297/2015 de 21 /09 o que não se verifica conforme já acima referimos.

No caso em apreço, e relativamente às “matrizes” que utiliza, as quais são fundamentais à realização da sua atividade de exploração visto serem utilizados no fabrico dos seus produtos, porque sem as mesmas não seria possível o fabrico dos seus produtos, sendo assim uma necessidade constante quer pelo desgaste das existentes, quer decorrente de alterações de modelo, dimensão e/ou “design” dos produtos (ainda que dê lugar a novas referências de artigos de produtos já anteriormente produzidos - ex.: telhas).

Também as vagonas, vagonetas e equipamentos de suporte de telhas, são fundamentais à realização da sua atividade de exploração visto serem utilizados no fabrico dos seus produtos, porque sem as mesmas não seria possível o fabrico dos seus produtos, sendo assim uma necessidade constante quer pelo desgaste dos existentes, quer decorrente de alterações de modelo, dimensão e/ou “design” dos produtos (ainda que dê lugar a novas referências de artigos de produtos já anteriormente produzidos ex.: telhas).

Ou seja, embora contabilisticamente sejam enquadrados como equipamento básico do ativos fixos, a aquisição dos mesmos é uma necessidade constante e fundamental para o fabrico dos seus produtos sendo que tais investimentos não integram o conceito de investimento inicial.

Refira-se que, não obstante, dada a referência à disponibilização de novos produtos associados aos investimentos em novas matrizes: vagonas, vagonetas e equipamentos de suporte de telhas, esses produtos fazem parte do ciclo normal de produção, assim como os investimentos em causa necessários para a continuidade de produtos já anteriormente produzidos, ainda que com alterações de modelo,  dimensão e/ou “design”.

Conforme referido no relatório, os investimentos em matrizes (moldes para indústria cerâmica), bem  como nas vagonas, vagonetas e equipamentos de suporte de telhas, por serem decorrentes de uma  necessidade constante e fundamental para o fabrico dos seus produtos, enquanto equipamento básico fundamental e constante para o processo de laboração normal da empresa, não estarão a contribuir para «… criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente», não podendo assim integrar o conceito de investimento inicial (ver aliás sobre esta matéria o entendimento da AT na informação vinculativa disponibilizada no portal da AT na internet em 23/01/2019 com o assunto «RFAl-Aplicações relevantes (aquisição de moldes)» - Processo:2018 003941, PIV n.º 14471, sancionado por Despacho, de 12 de dezembro de 2018, da Diretora de Serviços do IRC).

A2. Reparações, beneficiação ou complemento de equipamentos pré-existentes (pontos 45º a 49ª);

O sujeito passivo afirma que apenas considerou investimentos que visaram o aumento da capacidade de produção, e que nenhum dos casos assinalados pela inspeção dizem respeito a meras reparações, antes as enquadrando no objetivo do aumento da capacidade.

Na sequência dos elementos solicitados ao sujeito passivo, nomeadamente documentos de suporte das aquisições incluídas nos investimentos em análise para efeitos do RFAI, este remeteu os documentos cujas cópias juntamos ao relatório em anexo 3 […]

Relativamente à análise que sobre estes recaiu no enquadramento dos investimentos em que se incluem identificam-se expressões como “reparar”, “alterar, “reparação”, “trocar” relativos a equipamentos vários.

Em face do referido constata-se existência de evidência de reparações, beneficiação ou complemento de equipamentos pré-existentes, no sentido de que tais fornecimentos de bens e serviços serviram o propósito de reparar e beneficiar os equipamentos pré-existentes sobre os quais recaíram (“Reparar Caldeiros”, “alteração de Molde”, “Reparação de 100 Vagonetas”, “trocar controladores forno”, “Reparação de vagonas”).

Conforme referido no relatório, nos termos do RFAI, ainda que com propósito de aumentar a capacidade de produção, encontram-se afastadas das aplicações relevantes, as reparações de equipamentos pré-existentes dado que não estamos perante Ativos Fixos Tangíveis, adquiridos em estado de novo (al. a) do nº 2 do 22 do CFI).

A3. Dos investimentos complementares (pontos 50º a 57º);

Tal como referido quanto às matrizes (moldes), vagonas e vagonetas também para os identificados investimentos complementares, ainda que fundamentais à persecução da atividade, visto serem utilizados nos processos de fabrico dos produtos, são também uma necessidade constante e fundamental para o fabrico dos mesmos, mas em muitos dos casos nem contribuindo de forma direta para a produção, sendo antes e apenas complemento das necessidades de exploração, pelo que tais investimentos não integram por si só o conceito de investimento inicial.

Considerando que os investimentos mais relevantes foram em bens que não se consideram como integrantes do conceito de investimento inicial (matrizes, vagonas, vagonetas e equipamentos de suporte de telhas) pelo motivos já expostos, logo os investimentos complementares, ainda que fundamentais à  persecução da atividade, não se consideram no cenário descrito associados a investimentos que inequivocamente permitam a leitura preconizada de “Aumento da capacidade de um estabelecimento já existente”, mais não sendo que enquadráveis como uma necessidade constante e fundamental para o fabrico dos produtos, ou seja, também enquadrável num lógica de “situação corrente ou de crescimento normal da Empresa” e não para o inequívoco aumento da capacidade preexistente.

A4. Dos adiantamentos financeiros (pontos 58º a 61º);

O sujeito passivo alega não concordar com o referido no relatório quanto a indícios de existência de valores de adiantamentos financeiros, que a situação (fatura) identificada diz respeito à aquisição de matrizes e não um adiantamento financeiro, concluindo no que se refere a este tema que não foram considerados nos investimentos relevantes quaisquer valores de adiantamentos.

 Salienta-se o que no relatório, no capitulo III, se diz relativamente a esta questão, no sentido de que decorrente da análise dos elementos fornecidos pelo sujeito passivo foi identificada a situação de adiantamento referente a bens a serem fornecidos conforme decorre da fatura de € 144.844,70 incluído no item de investimento “Caixa matriz” de 2016 e que se junta em anexo 4 […]

O sujeito passivo afirma que a denominação constante da fatura, “...” “… corresponde apenas à designação do próprio bem”. Informa ainda “… caso dúvidas existissem, tal resulta claro de uma breve pesquisa, desta designação, na Internet”.

A simplificação dos termos usados pelo sujeito passivo nada esclarece, pois atenta a designação “...” verifica-se que se refere a “telhas principais” da linha de telhas produzidas e vendidas pela A... denominadas “...” o que até poderia supor o fornecimento das referidas telhas (mercadoria) e não de “equipamentos” (ativos fixos tangíveis).

Mas o que está em causa será o fornecimento futuro de “equipamentos” para a produção da referidas telhas com a referência “...”, conforme decorre da leitura da fatura na íntegra.

[…]

3. Embora entendamos que a leitura da fatura fosse suficiente, conforme resulta do anteriormente já descrito, tivemos na nossa análise em conta outro elemento que consideramos revelador de que a interpretação que fazemos é correta, a qual se prende com os dados constantes da base de dados VIES (Sistema de Intercâmbio de Informações sobre o IVA a nível intracomunitário) e no qual consta disponível à AT informação relativa à transmissão de bens e serviços à A... por parte de fornecedores do espaço europeu.

Nessa informação e com referência ao fornecedor em causa, conclui-se pelo dados transmitidos pelo mesmo que a fatura em 2016 tida como de adiantamento não consta dos dados declarados por de facto não se enquadrar como efetiva transmissão de bens ou serviços à data.

De facto, e com referência ao 4º trimestre de 2016 consta declarado no VIES pelo fornecedor com o NIF DE-... as transmissões de bens à A..., por mês, nos  montantes seguintes:

Mês do 4ºT de 2016        Valor em Euros

Outubro              600

Novembro         500

Dezembro          -Nada consta-

Ou seja, se Outubro e Novembro cruza com as faturas do fornecedor (nº 417413 de 07-10-2016 e nº 417482 de 15-11-2016) registadas pela A... e incluídas nos dados fornecidos relativamente aos investimentos em Matrizes, já relativamente a dezembro o fornecedor nada declarou de transmissão de bens ou serviços à A..., pelo que a referida fatura nº 417546 de 02/12/2016 não foi incluída, porque de facto não sendo transmissão de bens ou serviços, mas antes apenas por conta de valor a receber de depósito/adiantamento financeiro, não poderia constar no VIES.

Mais se observa no VIES, no ano seguinte, no caso no 3º trimestre de 2017, que consta  declarado pelo fornecedor com referência ao mês de setembro de 2017 o montante de   transmissão de bens de €144.844 à A..., ou seja, montante compatível com o  adiantamento de dezembro de 2016, significando isto o fornecimento e transmissão de bens nessa data de setembro de 2017.

Em face do descrito, e que foi tido em conta na análise originando as conclusões vertidas no relatório, não nos parece assim assistir razão ao sujeito passivo, pelo contrário, os factos são claros, nem há data da referida fatura nem até final do ano de 2016 tinham sido fornecidos os bens em causa e como tal não poderiam ser considerados como ativos fixos tangíveis do ano.

Como tal, não era enquadrável nos investimentos elegíveis nos termos do nº 5 do artº 22º do CFI («Considera-se investimento realizado o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos se traduza em adições aos investimentos em curso.»  - sublinhado nosso).

 A5. Dos indicadores de aumento de capacidade de um estabelecimento existente (pontos 62º a  66º);

O sujeito passivo não concorda com as observações efetuadas no relatório quanto às referências à evolução do volume de negócios como dos inventários da produção, nomeadamente como adequados para aferir o aumento da capacidade, entendendo e apontando como mais válido o aumento do número de unidades produzidas (que diz ter sido de 1 milhão de peças ano), bem como a necessidade de ter passado de 2 para 4 cais de carga de forma a dar resposta ao aumento do número de peças expedido,

Relativamente aos argumentos do sujeito passivo, também não nos parece por si só informação suficiente para aferir que o aumento da capacidade tenha decorrido dos investimentos em causa, até porque os mesmos visaram manter e melhorar a capacidade instalada que já anteriormente detinha, numa lógica que já atrás se referiu de necessidade constante e fundamental para o fabrico dos seus  produtos. A capacidade instalada por si só poderia ser capaz de dar resposta a oscilações na produção decorrente de maior procura em dado momento face a momento anterior, afinal de contas os fornos são os mesmos e quer matrizes quer outros equipamentos complementares também já existiam,

As referências do sujeito passivo a dados genéricos de quantidades de peças produzidas por si só nada justificam, até porque falta fundamentar com uma análise coerente de outros elementos, nomeadamente referências de artigos, dimensões, pesos e preços, quer da capacidade instalada antes e depois, e efeitos económicos e financeiros obtidos.

A observação que deixamos no relatório, é apenas alguma evidencia de que pelo menos economicamente não se verifica uma melhoria evidente em tais indicadores (vendas e inventários da produção, isolada ou conjuntamente) quando alegados investimentos no aumento da capacidade poderiam e, parece-nos, deveriam refletir-se designadamente num aumento do volume de negócios.

Contudo, acresce referir, que tal observação se insere num contexto geral do que é descrito no referido ponto, enquanto avaliação de que os investimentos em causa não se enquadram para efeitos de consideração do benefício RFAI, com justificação no enquadramento de aumento da capacidade produtiva,

9.3.2- Relativamente ao exposto quanto à criação dos postos de trabalho

O sujeito passivo não concorda com a conclusão descrita no relatório de que não criou os postos de trabalho a que se encontrava obrigado porquanto entende que decorrente de entendimentos da AT vertidos em informações vinculativas, designadamente no processo “2010 001800, PIV n.º 818, com Despacho de 2010-07-16, do Director-Geral”, o seguido pela inspeção no seu caso não é coerente com o referido nessa informação.

Em suma, entende o sujeito passivo que a aferição da criação dos postos de trabalho deve ser efetuada no final de 2016, apenas e só relativamente à criação líquida de postos de trabalho em contratos sem termo acontecidos nesse mesmo ano.

Refere que em 2015, nem as entradas, e sobretudo, nem as saídas de colaboradores estão relacionadas com o investimento relevante considerado para efeitos de cálculo do RFAI, já que este transita, em curso, para o ano seguinte, sendo apenas concluído no final do ano de 2016, e apenas nesse ano, com a conclusão do investimento, é que entende que a A... estava em condições de criar postos de trabalho (ocupar as novas funções) na sequência da aquisição dos equipamentos associados ao projeto de investimento que entraram então em funcionamento.

Refere, ainda, em relação a 2015, no ponto 78º da sua exposição: «Aliás, em relação ao período de tributação de 2015, por não cumprir a condição de criação de postos de trabalho nesse ano, a Empresa não usufruiu do beneficio fiscal do RFAI relativamente às adições de activos fixos tangíveis registadas  nesse mesmo período de tributação, sendo já “penalizada” por este facto».

Ora, relativamente ao exposto pelo sujeito passivo e que procuramos nos parágrafos anteriores sintetizar, verificamos algumas incoerências e leitura diferente dos entendimentos administrativos que importa clarificar.

A admitir o pensamento do sujeito passivo, este nunca poderia beneficiar em 2015 do RFAI, e apenas a partir de 2016 o poderia fazer, pois afinal foi nesse ano que concluiu o investimento e a incorporação nos ativos fixos tangíveis normais dos que estavam em curso no final de 2015.

Importa neste ponto dizer que, não obstante grande parte dos investimentos efetuados em 2015 se referirem a bens prontos a usar e até de difícil compreensão como inseríveis enquanto investimento em curso, ainda assim e admitindo-os apenas e só como tal, a verdade é que desde o início até ao termo do investimento existe uma associação direta à criação dos postos de trabalho que importará avaliar e verificar no termo face à situação de início dos investimentos.

 O entendimento administrativo a que o sujeito passivo faz referência apenas refere que no caso dos investimentos realizados num primeiro ano constituam, tão só, adições às imobilizações em curso, elegíveis nos termos do n.º 5 do art.º 22.º do CFI, então a criação de postos de trabalho pode ser aferida no final do período de tributação em que o investimento estiver concluído.

Não retiramos do referido entendimento que a aferição no final não deva ter por base comparativa a situação no início do investimento, sendo esse a nosso ver o espírito das normas em causa.

Refira-se aliás que no n.º 5 do art.º 22º do CFI se considera como investimentos realizados elegíveis o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, nestes se incluindo também os que tendo a natureza de ativo fixo tangível se traduzam em adições aos investimentos em curso.

Tal consideração no referido normativo aponta desde logo para a possibilidade de o sujeito passivo poder beneficiar do RFAI no ano de início do investimento, ainda que apenas com base em investimentos em curso. Nesse sentido, e contrariamente ao que alega, o sujeito passivo beneficiou no período de tributação de 2015 do benefício do RFAI.

A condição da al. f) do nº 4 do artigo 22º do CFI é aplicável desde o início do investimento, nada sendo dito de diferente. O entendimento da AT para o caso vertido na informação vinculativa referida, é que atendendo a que o investimento ainda esteja em curso no final do ano, se aguarde pelo seu termo para avaliar da criação dos postos de trabalho, Contudo, nada sendo dito como fazer a referida aferição, entendemos que a base comparativa não pode ser apenas a criação de postos de trabalho sucedido em 2016 (no termo do investimento), mas terá de abranger todos os períodos de investimento e que estão a usufruir do beneficio fiscal, por análise comparativa da evolução dos postos de trabalho antes do início do investimento, com a situação na conclusão do investimento.

De outra forma, poderiam artificialmente os contribuintes, verificando não cumprir com a referida condição no ano de início de um investimento, por real perda de postos de trabalho nesse ano, considerar e registar artificialmente os investimentos como em curso no final desse ano, para, no ano seguinte, por uma simples reposição dos postos perdidos no anterior beneficiar então sobre um investimento total de dois anos em comparação com a criação de emprego verificado apenas no ano de termo do investimento, sem que na realidade tivesse havido um real acréscimo de postos de trabalho no decurso do período de investimento (período esse que no caso decorreu durante dois anos).

A nosso ver terá de haver um paralelismo de comparação entre o período dos investimentos (ainda que plurianual) com a criação de emprego no mesmo período em que decorreram tais investimentos e benefícios fiscais.

Quando no ponto 78º da sua exposição o sujeito passivo indica que por não cumprir a condição de criação de postos de trabalho em 2015 a empresa não usufruiu do benefício fiscal do RFAI relativamente às adições de ativos fixos tangíveis registadas nesse mesmo período de tributação, sendo já “penalizada” por este facto, esquece-se que no n.º 5 do art.º 22.º do CFI se considera ao mesmo nível de investimentos elegíveis no ano os decorrentes das adições de ativos fixos tangíveis (AFT) e das adições de AFT em curso.

O expresso pelo sujeito passivo é nesse sentido incoerente e até porque de facto, em 2015, aproveitou do benefício fiscal (RFAI) por inserção na modelo 22 entregue (ainda que apenas na de substituição entregue em 2017), da referida dedução à coleta desse ano de 2015), quando afinal nem nesse ano de 2015, nem no acumulado do período do investimento (2015 e 2016) cumpriu a condição de criação de postos de trabalho, conforme se sintetiza no quadro seguinte:

Descrição            Ano 2015             Ano 2016             Totais

 

Valores de investimentos e de benefícios apurados e deduzidos em sede de RFAI

Investimento considerado elegível pelo SP          377.512,64          521.161,41          898.674,05

Benefício apurado pelo SP           94.378,16            130.290,35          224.668,51

Deduzido à coleta em cada um dos anos                                             

- ano de 2015     94.378,16                            94.378,16

- ano de 2016                     38.870,68            38.870,68

 

Criação líquida de postos de trabalho totais        0             -9            -9

 

Criação líquida de postos de trabalho sem termo             -5            1             -4

 

O sujeito passivo nada disse quanto ao quantitativo de postos de trabalho criados em cada um dos anos, à exceção da referência de que em 2016 criou um posto, pelo que se mantém os dados que apuramos e descrevemos no relatório.

Em face do exposto considera-se não assistir razão ao sujeito passivo nesta matéria da criação de postos de trabalho e que a avaliação descrita no nosso relatório se encontra a nosso ver correta.

9.4- Conclusão da apreciação do direito de audição e correções finais propostas

Analisado o exposto pelo sujeito passivo no âmbito do exercício do direito de audição nos termos descritos ao longo do anterior ponto (9.3), concluímos que os factos e enquadramento legal que motivaram algumas das correções propostas se encontram objetiva e devidamente fundamentadas, porquanto são inteligíveis.

Concluímos assim, analisados os argumentos expostos pelo sujeito passivo, não encontrar nos mesmos razões para alterar as correções propostas conforme fundamentamos ao longo do anterior ponto (9.3),

Em consequência. entendemos ser manter todas as correções propostas pelos motivos expostos no presente relatório.”

O.           Em consequência, foram emitidos e notificados à Requerente os atos tributários de liquidação de IRC e de juros compensatórios referentes aos períodos de tributação de 2015 e 2016, de seguida identificados – cf. Documentos 13 a 18:

                a)            Período de 2015 – liquidação de IRC n.º 2019 ... e liquidação de juros compensatórios n.º 2019 ..., de 23 de julho de 2019, resultando no valor global a pagar de € 102.207,66 (dos quais € 7.829,51 a título de juros compensatórios), com data limite de pagamento de 2 de setembro de 2019, conforme demonstração de acerto de contas n.º 2019...;

                b)           Período de 2016 – liquidação de IRC n.º 2019 ... e liquidação de juros compensatórios n.º 2019..., de 23 de julho de 2019, resultando no valor global a pagar de € 41.929,21 (dos quais € 3.058,53 a título de juros compensatórios), com data limite de pagamento de 5 de setembro de 2019, conforme demonstração de acerto de contas n.º 2019... .

P.            Tendo em vista ajustar os efeitos da correção da dotação de RFAI apurada pela Requerente em 2016 nas deduções à coleta dos períodos posteriores, em concreto 2017 e 2018, foi realizado um procedimento inspetivo interno à Requerente, ao abrigo das Ordens de Serviço n.ºs OI2019... (2017) e OI2019... (2018) – cf. PA.

Q.           Na sequência deste segundo procedimento inspetivo, foi proposta a desconsideração total do crédito fiscal proveniente do RFAI deduzido à coleta de IRC dos anos 2017 e 2018 nos montantes respetivos de € 49.983,53 e de € 41.436,14 – cf. PA.

R.            A Requerente optou por não exercer o direito de audição, tendo-se convolado o projeto em relatório definitivo, com a manutenção das correções identificadas no ponto anterior e fundamentos idênticos aos do Relatório de Inspeção respeitante aos períodos de tributação de 2015 e 2016, supra reproduzidos, do que foi a Requerente notificada em novembro de 2019 – cf. PA.

S.            Em consequência, foram emitidos e notificados à Requerente os atos tributários de liquidação de IRC e de juros compensatórios referentes aos períodos de tributação de 2017 e 2018, de seguida identificados  – cf. Documentos 20 a 25:

                a)            Período de 2017 – liquidação de IRC n.º 2019... e liquidação de juros compensatórios n.º 2019..., de 11 de dezembro de 2019, resultando no valor global a pagar de € 52.607,31 (dos quais € 2.623,79 a título de juros compensatórios), com data limite de pagamento de 30 de janeiro de 2020, conforme demonstração de acerto de contas n.º 2019...;

                b)           Período de 2018 – liquidação de IRC n.º 2019... e liquidação de juros compensatórios n.º 2019..., de 17 de dezembro de 2019, resultando no valor global a pagar de € 41.953,80 (dos quais € 517,66 a título de juros compensatórios), com data limite de pagamento de 6 de fevereiro de 2020, conforme demonstração de acerto de contas n.º 2019... .

T.            Inconformada, a Requerente apresentou reclamação graciosa contra os atos tributários praticados relativamente aos períodos de tributação corrigidos, de 2015 a 2018, contestando com fundamentos idênticos aos da presente ação arbitral a legalidade das correções subjacentes – cf. Documentos 26 e 27 e PA.

U.           A Requerente foi notificada das decisões de indeferimento das reclamações graciosas cujos fundamentos reiteram a argumentação dos relatórios inspetivos, pelos ofícios datados de 14 de julho de 2020 (anos 2015 e 2016) e de 14 de setembro de 2020 (anos 2017 e 2018) – cf. Documentos 1 e 2.

V.           Em discordância com as liquidações de IRC e de juros compensatórios acima identificadas e com as decisões de indeferimento das reclamações graciosas, a Requerente apresentou junto do CAAD, em 15 de outubro de 2020, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral Coletivo que deu origem ao presente processo – cf. registo de entrada do pedido de pronúncia arbitral (“ppa”) no SGP do CAAD.

 

2.            FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO E FACTOS NÃO PROVADOS

 

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT.

 

Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas Partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.

 

No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se na análise crítica da prova documental junta aos autos e no depoimento da testemunha J..., diretor industrial da Requerente, que manifestou conhecimento pessoal e direto dos factos e relatou-os de forma objetiva, na parte em que os mesmos se referem ao processo produtivo da Requerente.

Não se provou que o equipamento adquirido ao fornecedor alemão B... GmbH para a produção de telhas, lhe tenha sido entregue a 21 de dezembro de 2016, pois o documento apresentado (documento 31) constitui um mero documento interno, não tendo sido apresentada qualquer guia de transporte ou documento comprovativo da movimentação intracomunitária dos bens.

 

Também não se provou que o operador de produção –K...– e a técnica de qualidade –L..., contratados pela Requerente em 7 de dezembro de 2015 e em 22 de agosto de 2016, respetivamente, o tenham sido em conexão e por causa dos investimentos efetuados de incremento da capacidade produtiva do estabelecimento da Requerente (artigo 16.º do ppa), sendo que o primeiro já não exercia funções na Requerente em 2017 (artigo 128.º da resposta, não contestado pela Requerente). Com efeito, a alegação da contratação destes dois trabalhadores em conexão com o investimento, não foi objeto de qualquer elemento de prova, seja documental, seja testemunhal, e, no caso do operador de produção, o posto de trabalho nem sequer perdurou pelo período mínimo exigível de três anos.

Com relevo para a decisão não existem outros factos alegados que devam considerar-se não provados.

 

IV.          DO DIREITO

 

São dois os fundamentos em que a Requerida se alicerça para desconsiderar o benefício fiscal do RFAI associado aos investimentos realizados em 2015 e 2016  e deduzido à coleta nos períodos de tributação de 2015 a 2018:

 

a)            A falta de comprovação do respetivo enquadramento no conceito de “investimento inicial” (v. artigo 2.º, n.º 2, alínea d) da Portaria n.º 297/2017, de 21 de setembro; 

b)           O incumprimento da condição relativa à criação de postos de trabalho (v. artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do CFI).

 

                Apreciam-se, de seguida, os vícios de erro nos pressupostos de facto e de direito suscitados pela Requerente em relação à posição adotada pela Requerida.

 

1.            Falta de enquadramento no conceito de investimento inicial

 

1.1.        Sobre a invocada inconstitucionalidade orgânica da norma regulamentar que institui o pressuposto do “investimento inicial”

 

A Requerente começa por invocar a inconstitucionalidade orgânica, e consequente inaplicabilidade, da norma da citada Portaria n.º 297/2017 [o artigo 2.º, n.º 2, alínea d)], que estabelece que o benefício fiscal do RFAI apenas é aplicável a investimentos iniciais, nos termos do artigo 2.º, parágrafo 49, alínea a) do RGIC, entendendo que aquela constitui uma disposição regulamentar inovadora que limita o âmbito objetivo do referido regime, introduzindo um pressuposto adicional, sem estar, como devia, suportada em norma legal habilitante.

 

Segundo a Requerente, os benefícios fiscais devem ser criados por lei (v. artigo 103.º, n.º 3 da Constituição) e o sistema fiscal constitui matéria da exclusiva competência da Assembleia da República, salvo autorização ao Governo (v. artigo 165.º, n.º 1, alínea i) da Constituição). No caso, está-se perante a configuração de um elemento essencial do benefício fiscal do RFAI, abrangido pelos princípios da legalidade tributária e da reserva de lei. Circunstância em que o respetivo recorte inovatório por mera norma regulamentar representa uma violação dos mencionados princípios constitucionais.

 

Por outro lado, entende a Requerente que o RGIC não é diretamente aplicável, tendo por exclusivo efeito permitir aos Estados-Membros aprovar regimes domésticos de auxílio, isentando-os de prévia autorização da Comissão Europeia, caso satisfaçam os requisitos enunciados nesse regulamento. Assim, conclui ser indevida uma interpretação da legislação interna conformada ao RGIC e suscetível de integrar o requisito adicional relativo à realização de um “investimento inicial”.

 

Interessa começar por apreciar este último argumento, pois, caso se conclua pela aplicabilidade do RGIC ao RFAI, nomeadamente do seu artigo 2.º, parágrafo 49, alínea a), está encontrado o suporte legal da condição relativa ao “investimento inicial”. Este entendimento resulta da conjugação do disposto no artigo 8.º, n.º 4 da Constituição, segundo o qual “[a]s disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respetivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União”, com o artigo 288.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (“TFUE”), que determina o caráter geral dos regulamentos e a sua obrigatoriedade e aplicabilidade direta em todos os Estados-Membros, ou seja, dispensando a transposição para o direito interno (acompanha-se, neste âmbito, a fundamentação das decisões arbitrais proferidas nos processos n.º 545/2018-T, de 23 de maio de 2019, e n.º 427/2020-T, de 28 de setembro de 2021).

 

O regime europeu relativo às regras de concorrência necessárias ao funcionamento do mercado interno integra a reserva de competência exclusiva da União Europeia, nos termos do artigo 3.º, n.º 1, alínea b) do TFUE, pelo que, configurando matéria de competência exclusiva da União, só esta pode legislar e adotar atos juridicamente vinculativos e os Estados-Membros apenas poderão fazê-lo se habilitados pelo direito europeu, ou a fim de dar execução aos atos da União (v. artigo 2.º, n.º 1 do TFUE).

 

Compulsados os artigos 107.º a 109.º do TFUE, que contêm a regulação do direito primário em matéria de auxílios concedidos pelos Estados, constatamos que estes instituem um regime-regra de proibição dos auxílios de Estado que ponham em perigo a concorrência dentro da União Europeia.

 

Neste quadro, a Comissão Europeia, adotou o RGIC, que sucedeu ao anterior regulamento geral de isenção por categoria, o Regulamento (CE) n.º 800/2008, de 6 de agosto de 2008 , mantendo a simplificação do procedimento autorizativo dos auxílios, no sentido de dispensar os Estados-Membros da obrigação de notificação, desde que verificados determinados pressupostos, orientando-os no sentido de dirigirem os recursos públicos para a realização de objetivos europeus comuns .

 

Note-se que, na sua génese, a disciplina portuguesa do RFAI foi criada pelo Orçamento Suplementar para 2009  com invocação expressa deste Regulamento (CE) n.º 800/2008 (que declara certas categorias de auxílios compatíveis com o mercado comum), assumindo-se como um “instrumento de política fiscal anticíclica que, por via da promoção do investimento empresarial em determinadas regiões e da criação de emprego, pretendia contribuir para a revitalização da economia nacional (cfr. Rodrigo Rebeca Domingos, O Regime Fiscal de Apoio ao Investimento, in Revista da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, nº.56, Janeiro/Março de 2012, pág.45 e seg.).”, nos moldes assinalados pelo acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 23 de junho de 2021, processo n.º 0907/14.8BEVIS.

 

O primeiro capítulo do atual RGIC, sob a epígrafe “Disposições comuns”, versa sobre as normas comuns a todas as categorias de auxílios aí abrangidas, e consagra “a obrigatoriedade de os Estados respeitarem certos princípios quando se decidem a implementar auxílios sob o seu manto” , incorporando as diretrizes sobre os elementos que estes auxílios devem respeitar, para serem considerados compatíveis com o mercado interno e estabelecendo expressamente a obrigação de os auxílios terem um efeito de incentivo (v. artigo 6.º do RGIC).

 

Assim, o RGIC , além do propósito de isentar certos auxílios de Estado da obrigação de notificação, define os princípios e diretrizes que devem servir de enquadramento à ação legislativa dos Estados-Membros nesta área, fazendo parte do respetivo quadro regulatório. Os referidos princípios e diretrizes, ao constarem de regulamento adotado pela Comissão Europeia, são, como atrás referido, obrigatórios em todos os seus elementos e diretamente aplicáveis em todos os Estados-Membros, como expressamente reitera o artigo 59.º do RGIC.

 

O RFAI consubstancia um benefício fiscal regulado no CFI  que opera por dedução à coleta , enquadrado, nos termos previstos no artigo 1.º, n.º 2 do CFI , como um regime de auxílio com finalidade regional “nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado, publicado no Jornal Oficial da União Europeia, n.º L 187, de 26 de junho de 2014 (adiante Regulamento Geral de Isenção por Categoria ou RGIC)”.

 

Se porventura restassem dúvidas, o próprio direito interno, neste artigo 1.º, n.º 2 do CFI, convoca (ainda que tal não se afigurasse necessário) os “termos do Regulamento”, tal como o regime anterior, do RFAI 2009, mencionava a correspondente fonte europeia, à data, o Regulamento (CE) n.º 800/2008.

 

É, pois, no contexto institucional e normativo do RGIC que devem ser interpretados e aplicados o CFI e a Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, como salientam as decisões arbitrais n.ºs 545/2018-T  e 427/2020-T supra citadas. Nestes termos, não procede o argumento da Requerente de inaplicabilidade das condições estabelecidas no RGIC ao RFAI, uma vez que, como acabado de descrever, o primeiro constitui o diploma base e o parâmetro de validade  do quadro regulatório dos auxílios estatais conferidos pelos Estados-Membros, impondo-se como fonte legal, de patamar superior, à face do disposto no artigo 8.º, n.º 4 da Constituição e do princípio do primado do direito da União. Desta forma, há que concluir que o RFAI e a Portaria n.º 297/2015 são instrumentos de execução e de densificação do quadro normativo dos auxílios com finalidade regional contido no RGIC (v. artigo 1.º, n.º 1, alínea b)) e nos artigos 107.º a 109.º do TFUE.

 

À face do exposto, não se pode concordar com a posição da Requerente de que a Portaria n.º 297/2015 é inconstitucional, por “legislar” sobre matéria da exclusiva competência da Assembleia da República (benefícios fiscais), em violação do disposto nos artigos 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, alínea i) da Constituição, por duas ordens de razões.

 

A primeira deriva de a Portaria em causa ter natureza meramente regulamentar e não inovatória, limitando-se a concretizar as normas previstas no CFI e no RGIC, i.e., estando a coberto de normas legais habilitantes, no âmbito do exercício de poderes administrativos (não legiferantes - v. também o artigo 112.º da Constituição).

 

Isso mesmo resulta do preceituado no artigo 1.º, n.º 1 da Portaria n.º 297/2015, segundo o qual esta procede à regulamentação do RFAI estabelecido no CFI “assegurando a aplicação integral das regras previstas no Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 17 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado”.

 

A segunda prende-se com a conceção, expressa na declaração de voto no processo arbitral n.º 545/2018-T, de que a atividade regulamentadora, sendo “mediada pela lei, não é suscetível de entrar em colisão direta com a Constituição e é, antes de inconstitucional, ilegal”. Assim, o vício da Portaria, caso existisse (que não existe), não representaria uma violação das normas constitucionais mencionadas, situando-se num plano inferior, de ilegalidade. Porém, a Requerente não argui que a Portaria tenha infringido qualquer norma legal.

 

Soçobra, pelas razões descritas, o argumento esgrimido pela Requerente de que a Portaria n.º 297/2015 é inconstitucional, por violação do princípio da legalidade e da reserva de competência da Assembleia da República, constituindo condição válida de acessibilidade ao benefício fiscal do RFAI que as aquisições efetuadas se insiram no contexto de um “investimento inicial”, relacionado com “a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”.

 

1.2.        Sobre o pressuposto de enquadramento das aquisições efetuadas como “investimento inicial”

 

No RGIC

 

De acordo com o RGIC, os auxílios com finalidade regional destinam-se a contribuir para o desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas, apoiando o investimento e a criação de emprego num contexto sustentável, prevendo o seu Considerando 31 que “podem ser concedidos para promover a criação de novos estabelecimentos, a extensão da capacidade de um estabelecimento existente, a diversificação da produção de um estabelecimento ou uma mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.”

 

No recorte das definições aplicáveis aos auxílios com finalidade regional, e com relevância para o caso em análise, o artigo 2.º, n.º 49, alínea a) do RGIC considera como “investimento inicial”:

 

“Um investimento em ativos corpóreos e incorpóreos relacionado com a criação de um novo estabelecimento, aumento da capacidade de um estabelecimento existente, diversificação da produção de um estabelecimento para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento ou mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento”.

 

Quer o referido Considerando 31, quer a definição da categoria “investimento inicial” mencionam quatro tipologias de situações passíveis de elegibilidade no âmbito dos auxílios com finalidade regional e, portanto, do RFAI. O investimento tem de se materializar em ativos corpóreos e incorpóreos e estar relacionado com as seguintes condições não cumulativas:

 

(a)          A criação de um novo estabelecimento;

(b)          O aumento da capacidade de um estabelecimento existente;

(c)          A diversificação da produção de um estabelecimento para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento; ou

(d)          A mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento.

 

A subsunção do investimento numa destas tipologias é essencial, atentas as considerações anteriores, para que os incentivos em causa sejam considerados compatíveis com o mercado interno e conformes ao direito, devendo estar satisfeitas todas as condições previstas no capítulo I do RGIC, assim como as condições específicas para a categoria pertinente de auxílio estabelecidas no Regulamento (v. artigo 3.º do RGIC). 

 

Na lei interna: CFI e Portaria n.º 297/2015

 

O âmbito de aplicação e os requisitos de acesso ao RFAI constam dos artigos 22.º a 26.º do CFI sendo as correções efetuadas pela AT fundadas, em concreto, no artigo 22.º do CFI e no disposto no artigo 2.º, n.º 2, alínea d) da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro , de que se transcrevem os segmentos com relevo para a matéria em discussão nos presentes autos, na redação vigente à data dos factos:

 

“Artigo 22.º

Âmbito de aplicação e definições

1. O RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º, tendo em consideração os códigos de atividade definidos na portaria prevista no n.º 3 do referido artigo, com exceção das atividades excluídas do âmbito sectorial de aplicação das OAR e do RGIC.

2. Para efeitos do disposto no presente regime, consideram-se aplicações relevantes os investimentos nos seguintes ativos, desde que afetos à exploração da empresa:

a) Ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:

i) Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extrativa;

ii) Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo se forem instalações fabris ou afetos a atividades turísticas, de produção de audiovisual ou administrativas;

iii) Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas;

iv) Mobiliário e artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;

v) Equipamentos sociais;

vi) Outros bens de investimento que não estejam afetos à exploração da empresa;

b) Ativos intangíveis, constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, «know-how» ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente.

[…]

4. Podem beneficiar dos incentivos fiscais previstos no presente capítulo os sujeitos passivos de IRC que preencham cumulativamente as seguintes condições:

[…]

f)            Efetuem investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, nos termos da alínea c) .

5. Considera-se investimento realizado o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso.

[…]”

 

No que se refere à Portaria n.º 297/2015, o respetivo artigo 2.º, n.º 2, alínea d) regula o âmbito de aplicação do RFAI e estabelece que “para efeitos do disposto no artigo 22.º do Código Fiscal do Investimento:

[…]

d)           Os benefícios fiscais previstos no artigo 23.º do Código Fiscal do Investimento apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”.

 

Atento o quadro legal exposto, podem sistematizar-se, como requisitos do regime do RFAI, com relevância decisiva para a situação sub iudice, tendo em conta as ilegalidades concretas imputadas aos atos tributários, os seguintes:

i)             Que as aquisições respeitantes a ativos tangíveis em estado de novo se enquadrem num investimento inicial relacionado com o aumento de capacidade de um estabelecimento já existente;

ii)            Que esse investimento proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, no caso três anos.

 

Em relação ao primeiro requisito, interessa recordar que a Requerente declarou que os investimentos por si realizados em 2015 e 2016 foram efetuados em ativos fixos tangíveis adquiridos em estado de novo que foram afetos à exploração da empresa, nos moldes preceituados pelo artigo 22.º, n.º 2 do CFI, tendo por objetivo o aumento da capacidade de produção instalada nas suas instalações produtivas em ..., permitindo a criação de condições para a produção de novos produtos e, ainda, o aumento da produção dos produtos existentes.

 

Não é questionado pela AT que os ativos em apreço tenham sido adquiridos em estado de novo e afetos à atividade da Requerente, sendo a questão controvertida a de aquilatar se tais aquisições se enquadram num investimento novo agregador (i.e., não consubstanciado em meras aquisições isoladas de equipamentos), passível de reconhecimento como “investimento inicial” na aceção do RGIC e da Portaria n.º 297/2015.

 

Importa aferir se este pressuposto fundamental foi demonstrado, ónus que impende sobre a Requerente, ao abrigo do disposto no artigo 74.º, n.º 1 da LGT e dos artigos 6.º e 7.º da Portaria n.º 297/2017 (neste sentido, v. decisão arbitral n.º 82/2020, de 22 de janeiro de 2021).

 

Retomando o caso em análise, ficou demonstrado nos autos que foram realizados investimentos em equipamentos diversos nos sistemas associados aos fornos que permitiram incrementar a capacidade produtiva da unidade fabril da Requerente, abrangendo as diversas fases do processo de produção, tendo sido adquiridas, designadamente: novas matrizes de resina permitindo produzir um maior número de peças; vagonetas para transporte e acondicionamento no processo de secagem; vagonas e equipamentos de suporte das peças no processo de cozedura; equipamentos complementares de suporte ao acréscimo da capacidade produtiva relativos a aspiração, embalamento, informática e segurança, bem como a duplicação do cais de carga (pontos C e D da matéria de facto).

 

A Requerida sustenta que estamos perante aquisições de equipamentos básicos no âmbito do processo normal de laboração ou que apenas complementam a produção (no caso da segurança, incêndio, aspiração, embalamento e informática), incluindo substituições, reparações e beneficiação de equipamentos preexistentes. No entanto, este argumento não afasta, nem prejudica o aumento de capacidade de produção da Requerente diretamente derivado dessas aquisições, legitimamente alcançado com adições parciais de equipamento (novo), seja ao equipamento preexistente em funcionamento, seja a investimentos em curso, como resulta expressamente do artigo 22.º, n.º 5 do CFI, não sendo indispensável que se materializassem na construção de novos fornos, podendo resultar da beneficiação do funcionamento conjunto com outros ativos. 

 

A única exceção é a do equipamento de substituição/reparações de equipamento que constam de faturas que perfazem o valor total de € 27.713,83 (acrescidas de IVA de € 6.374,18), conforme consta do ponto H da matéria de facto, inadmissível nos termos do disposto no artigo 22.º, n.º 2, alínea a) do CFI. No mais, ficou processualmente consolidada a aquisição, pela Requerente, de ativos tangíveis novos, afetos à exploração, que permitiram o incremento da sua capacidade de produção ou que eram necessários para suportar o acréscimo dessa capacidade, no caso dos investimentos complementares.

 

De assinalar ainda que o pressuposto de extensão da capacidade de um estabelecimento existente tem naturalmente subjacente a finalidade de aumento da produção, ou seja, do número de unidades produzidas, em regra, conducente ao acréscimo do volume de negócios. Contudo, esta finalidade não constitui em si mesma uma condição de aplicação do regime, mas a sua teleologia. Dito por outras palavras, o aumento de capacidade do estabelecimento aponta para o aumento da produção, mas não é imposta uma obrigação de resultado. O aumento efetivo da produção depende de diversos fatores, não controláveis pelos sujeitos passivos, que não constam da previsão legal como pressupostos de aplicação do RFAI.

 

No caso concreto, os indicadores financeiros da Requerente, nomeadamente a evolução do seu volume de negócios nos anos 2015 a 2017 não traduzem qualquer incremento, antes uma contínua diminuição das vendas e serviços prestados. A variação nos inventários da produção em 2016 e 2017 também foi de sinal negativo. Não obstante, tal não significa que a capacidade produtiva da fábrica não tenha sido aumentada, como se provou que foi, sendo este o argumento que se reveste de importância decisiva – o aumento da capacidade do estabelecimento – e não o facto de, por via da diminuição da procura, da contração dos mercados, da concorrência, ou de quaisquer outras causas, a Requerente não ter conseguido, como por certo pretendia, vender (produzindo-os) mais produtos.

 

A natureza agregadora do investimento, por oposição à compra isolada dos ativos, é manifestada, de forma coerente, pela qualificação dada às aquisições efetuadas em 2015 como “ativos fixos tangíveis em curso”, tendo a conclusão do investimento ocorrido no ano seguinte, em 2016, conjuntamente com outras aquisições realizadas neste ano.

 

No tocante às referências feitas pela Requerente para a diversificação e fabricação de novos produtos, a mesma seria relevante no âmbito das tipologias de “investimento inicial” relativas à “diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”. Contudo, o enquadramento nas tipologias antecedentes requer o cumprimento de condições adicionais, contempladas no artigo 3.º da Portaria n.º 297/2015, segundo o qual:

 

“Artigo 3.º

Aplicações relevantes

1 –  Nos casos em que o investimento inicial respeite a uma alteração fundamental do processo de produção, o montante das aplicações relevantes deve exceder o montante das amortizações e depreciações dos ativos associados à atividade a modernizar contabilizadas nos três períodos de tributação anteriores ao do início da realização do projeto de investimento.

2 – Nos casos em que o investimento inicial consista na diversificação da atividade de um estabelecimento existente, as aplicações relevantes devem exceder em, pelo menos, 200 % o valor líquido contabilístico dos ativos que são reutilizados, tal como registado no período de tributação anterior ao do início da realização do investimento.

[…]”

 

O preenchimento das condições previstas neste artigo 3.º não foi alegado nem demonstrado pela Requerente. Deste modo, o único enquadramento dos ativos adquiridos passível de elegibilidade para o RFAI é o de investimento inicial relacionado com a modalidade de extensão de capacidade de um estabelecimento existente.

 

Em relação ao valor de € 144.844,70 de matrizes adquiridas e registadas como investimento no período de 2016, não aceite pela AT por alegadamente respeitar a adiantamentos financeiros de bens a serem fornecidos em 2017, não elegíveis nos termos do disposto no artigo 22.º, n.º 5 do CFI, importa notar que o referido valor corresponde exatamente ao montante faturado total pelo fornecedor relativo à aquisição dos equipamentos em causa em 5 de dezembro de 2016, que tinham sido encomendados em outubro desse ano.

 

O documento comercial relevante que titula a aquisição, a fatura, tem data de 2016 e não indica que se trata de um adiantamento. O único elemento suscetível de indiciar um adiantamento respeita ao reporte da transação pelo fornecedor em setembro do ano seguinte, conforme refletido no VIES.

 

Todavia, apesar de a Requerente não ter conseguido provar o transporte/receção das mercadorias no decurso do período de 2016, também não foi provado o contrário (a receção em 2017) e a encomenda e a fatura do fornecedor reportam-se ao ano 2016, pelo que se suscita uma situação de fundada dúvida que, no caso, e de acordo com o disposto no artigo 100.º, n.º 1 do CPPT, deve ser valorada em benefício da Requerente .

 

Em síntese, no que se refere ao pressuposto de qualificação do investimento como investimento inicial relacionado com a extensão de capacidade de estabelecimento existente, julga-se que o mesmo foi preenchido pela Requerente, com exceção dos investimentos de substituição, reparação e/ou alteração no valor de € 27.713,83, em relação ao qual é improcedente este argumento da Requerente.

 

2.            Sobre a condição de criação e manutenção de postos de trabalho

 

A Requerente rejeita a posição preconizada pela AT de não estar preenchido o requisito legal – previsto no artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do CFI – que condiciona a acessibilidade ao RFAI. Em concreto, considera que foi efetuado investimento relevante que proporcionou a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, in casu, no caso de três anos.

 

A Requerente não contesta que se verificou uma diminuição de postos de trabalho no acumulado dos dois anos do período de investimento. Porém, considera que a lei (v. artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do CFI) apenas exige que o investimento realizado contribua direta e casualmente para a criação de novos postos de trabalho no momento da sua conclusão, independentemente de, no mesmo período, se registarem outras entradas ou saídas de trabalhadores.

 

A questão de direito subjacente não tem tido uma resposta consensual, o que em larga medida se deve ao facto, assinalado pela decisão arbitral de 22 de janeiro de 2021, no processo n.º 82/2020-T, de a legislação em vigor ser bastante omissa quanto aos critérios que devem ser aplicados para elaborar o cálculo da criação de postos de trabalho.

 

Por banda da Requerida, a referência à “criação de postos de trabalho” deve entender-se reportada à “criação líquida de postos de trabalho”. Diversamente, a Requerente entende que o que importa é que o investimento efetuado tenha sido causa direta da criação de postos de trabalho, mesmo que o número total de trabalhadores tenha diminuído, não exigindo a norma citada (o artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do CFI) que se trate de criação “líquida” de postos de trabalho aferida em relação à atividade global da Requerente.

 

As decisões arbitrais proferidas nos processos n.º 565/2018-T, de 20 de novembro de 2019, n.º 82/2020-T e a declaração de voto no processo n.º 307/2019-T, de 9 de março de 2020, propendem para a interpretação de que “a comparação há-de ser feita nos moldes preconizados pela Requerida, i.e., globalmente, pois só assim se pode afirmar que o investimento tenha sido indutor da criação de postos de trabalho, pressuposto que, segundo entendemos, deve ser incremental” – v. decisão arbitral do processo n.º 565/2018-T.

 

Entendimento distinto é o perfilhado nas decisões dos processos n.ºs 488/2019-T, de 17 de fevereiro de 2020 e n.º 307/2019-T.

 

No primeiro, apesar de o ponto de partida ser uma posição próxima à da Requerida, acaba por concluir que: “a aferição global não pode ser tão mecânica e inflexível que, atendendo apenas a resultados finais, desconsidere a natureza das parcelas e se converta num indutor de ineficiência ou mesmo de injustiça”, notando que “a alínea c) do art.º 14.º, 9 do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de Junho, não faz qualquer referência a um «número total de trabalhadores» nem a valores líquidos – e pelo contrário refere-se a «cada posto de trabalho criado através do investimento» para efeitos de preenchimento do requisito de manutenção de postos de trabalho, ou seja para efeitos de comparação inter-temporal relevante. O que reforça o entendimento de que se trata de verificar os requisitos do RFAI, não no total de postos de trabalho de uma empresa, mas somente naqueles que foram criados especificamente pelo investimento.”

 

De igual modo, na decisão arbitral relativa ao processo n.º 307/2019-T, é afastado o critério da “criação líquida de emprego”, “porquanto a norma legal em causa não exige a criação líquida de postos de trabalho referindo-se inequivocamente a postos de trabalho”, com a seguinte fundamentação:

 

“Ressalvado o respeito devido a outras opiniões, considera-se que a referência feita na al. f) do n.º 4 do art.º 22.º do CFI, deve ser entendida como reportando-se à criação de postos de trabalho causalmente associáveis ao investimento realizado, independentemente de, sob um ponto de vista global, a empresa ter verificado, ou não, um aumento do número de trabalhadores ao seu serviço.

Com efeito, o regime legal em questão foi criado pela Lei 10/2009, no âmbito da

Iniciativa para o Investimento e o Emprego, designada por Programa IIE, que visou «promover o crescimento económico e o emprego, contribuindo para o reforço da modernização e da competitividade do País, das qualificações dos Portugueses, da independência e da eficiência energética, bem como para a sustentabilidade ambiental e promoção da coesão social».

No âmbito do programa IIE, incluíram-se medidas de «Apoio especial à actividade económica, exportações e pequenas e médias empresas (PME)» e de «Apoio ao emprego e reforço da protecção social» (cfr. als. d) e e) do n.º 1 do art.º 2.º da Lei 10/2009).

No quadro daquele programa, o RFAI 2009 foi criado como «um sistema específico de incentivos fiscais ao investimento», conforme resulta do art.º 1.º do mesmo Regime.

Foi, assim, o regime em questão, expressamente e no que para o caso interessa, formulado como um incentivo ao investimento (gerador de crescimento económico) tendo em  vista o reforço da modernização e da competitividade do País, e das qualificações dos Portugueses, explicando-se dessa forma a al. f) do n.º 4 do art.º 22.º CFI, que radica na al. f) do n.º 3 do art.º 2.º do RFAI 2009, criado pela referida Lei 10/2009.

Neste contexto, a criação de emprego previsto na al. f) do n.º 4 do art.º 22.º CFI, deverá ser entendido como um requisito sine qua non do direito ao benefício fiscal, já que é esse um dos propósitos assumidos pelo legislador e consta expressamente da letra da lei.

Não obstante não se poderá, nem deverá, julga-se, esquecer que o regime em questão visará, à frente daquele propósito, fomentar o investimento, para além da modernização e da competitividade do País, e das qualificações dos Portugueses, sendo essencialmente um regime de apoio ao investimento, e não ao emprego.

Neste quadro, portanto, e na leitura e interpretação do regime em questão, dever-se-á sempre ter presente em primeira linha a ideia do incentivo ao investimento, sendo a criação de emprego uma condição, mas não o fundamento, do direito ao benefício fiscal.

Assim, e tendo presente igualmente as finalidades de modernização e da competitividade do País, e das qualificações dos Portugueses, dever-se-á concluir que o regime em questão visa promover o investimento modernizador, que aumente a competividade do país, e fomente a actualização, ou a aquisição de novas, competências pelos trabalhadores.

Posto isto, sustenta a AT que, na leitura da al. f) do n.º 4 do art.º 22.º do CFI, se deverá lançar mão do enquadramento europeu em matéria de auxílios de Estado com finalidade regional no qual se inscreve o RFAI, constituído, nos termos do n.º 2 do art.º 1.º do CFI, pelo Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de Junho de 2014 , que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.°e 108.° do Tratado.

Sendo, evidentemente, um elemento relevante, crê-se que, antes de mais, se deve recorrer ao Regulamento (CE) N.º 800/2008 da Comissão, de 6 de Agosto de 2008, vigente na altura da implementação do RFAI 2009, que, como se viu, está na génese do RFAI integrado no CFI.

[…]

Aqui chegados será possível, crê-se, verificar que o Regulamento em questão distingue efectivamente, entre dois tipos distintos de apoios às PME, que são os apoios quantificados:

a) com base nos custos do investimento; e

b) nos custos relativos aos postos de trabalho directamente criados por um projecto de investimento.

E é para este último tipo de apoios que é utilizado o conceito, e exigido o aumento

líquido de postos de trabalho por serem, justamente, aqueles em que a utilização de tal conceito se justifica.

O Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, segue, no que para o caso importa, a mesma lógica, referindo no preâmbulo que «A fim de não favorecer o investimento em capital em relação ao investimento nos custos da mão de obra, deve prever-se a possibilidade de quantificar os auxílios regionais ao investimento com base quer nos custos do investimento quer nos custos salariais do emprego diretamente criado por um projeto de investimento.», e dispondo no art.º 17.º que:

«2. Os custos elegíveis devem ser um dos seguintes custos ou ambos:

a) Os custos de investimento em ativos corpóreos e incorpóreos;

b) Os custos salariais estimados do emprego diretamente criado pelo projeto de

investimento, calculados para um período de dois anos.».

No art.º 14.º também se dispõe que:

«4. Os custos elegíveis devem ser os seguintes:

a) Custos de investimento em ativos corpóreos e incorpóreos;

b)           Custos salariais estimados decorrentes da criação de emprego, em virtude de um investimento inicial, calculados ao longo de um período de dois anos; ou

c)            Uma combinação das alíneas a) e b), que não exceda o montante de a) ou b), consoante o que for mais elevado.».

É neste contexto que o n.º 9 do mesmo art.º 14.º, citado pela AT, dispõe que:

«9. Quando os custos elegíveis são calculados por referência aos custos salariais estimados, descritos no n.º 4, alínea b), devem ser preenchidas as seguintes condições:

a)            O projeto de investimento deve conduzir a um aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento em causa, em comparação com a média dos 12 meses anteriores, ou seja, qualquer perda de postos de trabalho deve ser deduzida do número  aparente de postos de trabalho criados nesse período;

b)           Cada posto de trabalho deve ser preenchido no prazo de três anos após a conclusão dos trabalhos; e

c)            Cada posto de trabalho criado através do investimento deve ser mantido na zona em causa durante um período mínimo de cinco anos a contar da data em que a vaga foi preenchida, ou três anos no caso de PME.».

Ora, como se viu já, o RFAI foi sempre um apoio ao investimento, e é calculado com base nos custos de investimento em activos corpóreos e/ou incorpóreos, e não com base nos custos de investimento em postos de trabalho ou em custos salariais estimados.

Daí que não seja fundada, julga-se, a invocação do conceito de criação líquida de postos de trabalho do Regulamento em questão, para a interpretação a fazer da al. f) do n.º 4 do art.º 22.º do CFAI.

De resto, terá sido por ter noção do quanto se expôs que o legislador não utilizou a expressão “criação líquida de emprego”, quando a mesma era utilizada, por exemplo, no art.º 19.º do EBF vigente à data, esse sim, um benefício fiscal que tem por base os custos de investimento em postos de trabalho.

Considerando-se, então, que a al. f) do n.º 4 do art.º 22.º do CFI, não se reporta à criação líquida de postos de trabalho, nos termos em que, por exemplo, o referido art.º 19.º do EBF e as Directivas sobre apoios de Estado o fazem, é ainda necessário densificar qual o sentido e alcance da expressão “criação de postos de trabalho”, ali empregue, tem.

Tendo em conta que, pelos fundamentos expostos, não se deverá equiparar a expressão “criação de postos de trabalho” a “criação líquida de postos de trabalho”, dever-se-á, em obediência ao princípio hermenêutico do legislador razoável, obter um resultado interpretativo que seja coerente com a teleologia do benefício fiscal em questão e que tenha um efectivo conteúdo prático.

Nessa perspectiva, a única interpretação que não se reconduza à “criação líquida de postos de trabalho”, será, julga-se, a de que a “criação de postos de trabalho” pressuposta pelo benefício fiscal em questão se refere à criação de postos de trabalho, e a sua manutenção, causalmente associáveis ao investimento realizado, independentemente de, sob um ponto de vista global, a empresa ter verificado, ou não, um aumento do número de trabalhadores ao seu serviço.

Ou seja: o que está em causa é que o investimento realizado por determinada empresa será elegível para usufruir do benefício fiscal em questão se, e na medida em que, dele resulte, de forma causalmente adequada, a criação de, pelo menos, um posto de trabalho, e a sua manutenção.

Assim, e por exemplo, se uma determinada empresa adquirir um veículo pesado de mercadorias e contratar um motorista habilitado à sua condução, para o conduzir, verificar-se-á o pressuposto da criação de postos de trabalho, pressuposto pela al. f) do n.º 4 do art.º 22.º do CFI.

Mas uma empresa que adquira um veículo pesado de mercadorias, e já dispusesse nos seus quadros de um motorista habilitado à sua condução (que estivesse, por exemplo, afecto à condução de um veículo ligeiro de mercadorias), e contrate um colaborador para a limpeza das suas instalações, que também faça a lavagem e limpeza do veículo adquirido, não preencherá o referido pressuposto de criação de postos de trabalho, já que, embora o referido colaborador possa executar alguns serviços relacionados com o bem adquirido, não se poderá, em princípio, concluir que a sua contratação se relacione de forma causalmente adequada àquela aquisição.

Deverá ser assim este, julga-se, o critério para aferir da criação de postos de trabalho, pressuposto pela al. f) do n.º 4 do art.º 22.º do CFI.”

 

Adere-se a esta última a interpretação pelo mérito dos seus argumentos, que, na ausência de maior explicitação por parte do legislador, devem ser adotados.

 

De qualquer forma, ainda que se entendesse prevalecente a interpretação preconizada pela Requerente, o facto é que esta não logrou provar o preenchimento do requisito em causa, i.e., que tenham criados postos de trabalho e contratados trabalhadores na sequência e em conexão com o investimento realizado elegível para o RFAI, como postula o artigo 22.º, n.º 4, alínea f) do CFI, pelo que é de julgar correta a conclusão da Requerida (embora não se concorde com uma parte dos seus fundamentos), de não estar verificado o pressuposto de acesso ao benefício do RFAI relativo à criação de postos de trabalho. Assim, a dedução à coleta de IRC da Requerente, a esse título, nos anos de 2015 a 2018, deve reputar-se indevida, como decorre do RIT, mantendo-se válidos os atos tributários impugnados na presente ação arbitral.

               

3.            Acerca da violação do princípio do inquisitório

 

O princípio do inquisitório está enunciado no artigo 58.º da LGT que estabelece que “a administração tributária deve, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido”. A Requerente argui que a AT não procurou informação qualitativa relevante, ou seja, não levou a efeito diligências que visassem o esclarecimento das dúvidas suscitadas na análise da informação.

 

Sobre esta alegação relembra-se que, no decurso do procedimento, a Requerente foi notificada para fornecer elementos de informação e foram realizadas diligências. Acresce notar que, em fase de direito de audição, teve a oportunidade de ultrapassar as lacunas na informação anteriormente prestada. Por outro lado, não foram requeridas ou sugeridas pela Requerente quaisquer diligências, devendo os meios de prova a que “o contribuinte tem acesso […] ser oferecidos, no âmbito do seu dever de cooperar com boa-fé na instrução do procedimento, como resulta do teor expresso do n.º 2 do artigo 48.º do CPPT” – v. decisão arbitral n.º 604/2020, de 24 de novembro de 2021.

 

Com perspetiva idêntica, refere a decisão arbitral n.º 14/2021-T, de 21 de novembro de 2021, que:

 

“a Administração Tributária está vinculada, ao nível do procedimento, ao princípio da verdade material, pelo qual lhe cabe o poder-dever de realizar todas as diligências que entenda serem úteis para a descoberta da verdade, sendo nessa iniciativa oficiosa de realização de diligências adequadas e necessárias à preparação da decisão que se traduz no princípio do inquisitório (artigo 58.º da LGT).

No entanto, do princípio do inquisitório não resulta a obrigação, por parte da administração tributária, de realizar todas diligências requeridas pelo contribuinte no decurso do procedimento ou realizar todas aquelas que o interessado venha a entender a posteriori como necessárias face ao conteúdo da decisão final que tenha sido adotada.

O principal efeito jurídico da insuficiência das diligências instrutórias a realizar pela Administração no âmbito do procedimento tributário traduz-se, em sede de impugnação judicial, num non liquet probatório sobre os factos materiais da causa, implicando que o tribunal emita uma pronúncia desfavorável em relação à parte a quem incumbia fazer a prova dos factos, à luz dos critérios de repartição do ónus da prova do artigo 74.º da LGT (Serena Cabrita Neto/Carla Castelo Trindade, Contencioso Tributário, Vol. I, Coimbra, 2017).”

 

Neste contexto, não se demonstram violados os deveres enunciados no artigo 58.º da LGT, nem estes devem ser interpretados no sentido de competir à Requerida colmatar o eventual déficit probatório dos pressupostos dos benefícios fiscais que recai sobre o contribuinte que os invoca.

 

4.            Juros compensatórios

 

No tocante aos juros compensatórios a Requerente invoca a ilegalidade autónoma das respetivas liquidações, por falta de fundamentação do pressuposto de culpa do sujeito passivo, atendendo a que o RIT refere apenas “sobre os impostos resultantes das correções descritas são devidos juros compensatórios, nos termos do artº 35º da Lei Geral Tributária” e as demonstrações de liquidação (de juros compensatórios) contêm apenas a menção singela a “Retardamento da Liquidação (art.s 102.º do CIRC e 35.º da LGT)”.

 

Convém notar que a demonstração de liquidação, apesar de sucinta, contém de forma expressa o seu fundamento – o retardamento da liquidação do imposto – e menciona as normas legais de suporte, do Código do IRC e da LGT. Além disso, menciona com clareza os elementos exigidos pelo artigo 35.º, n.º 9 da LGT: o valor base, os juros, o período de cálculo e a taxa aplicada. Deste modo, não se constata vício (formal) de falta fundamentação.

 

Relativamente à falta de fundamentação substantiva do pressuposto da imputação a título de culpa (configurativa de vício de violação de lei), tem sido entendido pelo Supremo Tribunal Administrativo que a responsabilidade objetiva é excecional, só ocorrendo nos casos especificados na lei (v. artigo 483.º, n.º 2 do Código Civil). Por isso, para efeitos de responsabilidade por juros compensatórios, só se está perante um “facto imputável ao sujeito passivo” quando se possa formular um juízo de censura ao próprio sujeito passivo, pelo que a imputabilidade exigida para responsabilização pelo pagamento de juros compensatórios depende da existência de culpa, por parte do contribuinte.

 

Sem prejuízo do que antecede, considera-se que “quando uma determinada conduta constitui um facto qualificado por lei como ilícito, deverá fazer-se decorrer do preenchimento da hipótese normativa, por ilação lógica, a existência de culpa, na forma pressuposta na previsão do tipo de ilícito respectivo” (v. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 19 de novembro de 2008, processo n.º 0325/2008. Em sentido idêntico, o acórdão, do mesmo Tribunal, de 11 de março de 2009, processo n.º 961/08).

 

No caso, perante a não demonstração do preenchimento de requisitos essenciais à aplicação do benefício fiscal do RFAI (criação de postos de trabalho associada ao investimento elegível), a Requerente não podia deixar de considerar expectável a correção efetuada pela AT. Deste modo, não pode deixar de inferir-se a culpa da Requerente da ilicitude da sua conduta, improcedendo a alegada ilegalidade autónoma e mantendo-se as liquidações de juros compensatórios. 

 

5.            Reembolso das quantias pagas acrescidas de juros indemnizatórios

 

A Requerente, peticiona, como decorrência da invocada anulabilidade dos atos de liquidação de IRC e juros compensatórios, a restituição da importância indevidamente paga, acrescida de juros indemnizatórios, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 43.º da LGT e 61.º do CPPT.

 

Esta disciplina deriva do dever, que recai sobre a AT, de reconstituição imediata e plena da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, como resulta do disposto nos artigos 24.º, n.º 1, alínea b) do RJAT e 100.º da LGT, fazendo este último preceito referência expressa ao pagamento de juros indemnizatórios, compreendido nesse efeito repristinatório do statu quo ante.

 

Dispõe, neste âmbito, o artigo 43.º da LGT que os juros indemnizatórios são devidos “quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”, circunstância que, na presente situação, não se verificou, uma vez que se concluiu pela validade e manutenção dos atos tributários, improcedendo, em consequência, os pedidos dependentes de restituição do imposto pago e de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios.

 

* * *

 

Por fim, importa referir que foram conhecidas e apreciadas as questões relevantes submetidas à apreciação deste Tribunal, não o tendo sido aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras.

 

V.           VALOR DO PROCESSO

 

                Fixa-se ao processo o valor de € 238.697,98, indicado pela Requerente e não impugnado pela Requerida, de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, este último ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

 

VI.          CUSTAS

               

                Custas no montante de € 4.284,00, a suportar pela Requerente, em razão da sucumbência, em conformidade com a Tabela I anexa ao RCPAT, e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT, 4.º, n.º 5 do RCPAT e 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

 

Lisboa, 17 de janeiro de 2022

 

Os árbitros,

 

Alexandra Coelho Martins

(Declaração: revendo posição anterior, adotada no processo n.º 565/2018-T, a respeito da interpretação do requisito de criação de postos de trabalho)

 

Arlindo José Francisco

Eduardo Paz Ferreira