SUMÁRIO:
1. No âmbito do atual código do imposto do selo e da Tabela Geral do Imposto do Selo, a tributação passou a recair sobre a utilização do crédito e já não sobre a celebração do respetivo negócio jurídico de concessão.
2. A verba 17.1.4 da T.G.I.S. tributa a utilização de crédito sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou outra, em que o prazo de utilização seja indeterminado ou indeterminável, à taxa de 0,04% sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30.
3. A sujeição a imposto de selo do crédito utilizado, no atual CIS, encontra-se condicionada pela conexão que a situação apresente com o território português, sendo esta conexão determinada pelo local onde se verifica a utilização do crédito, por força da regra da territorialidade, sendo que, quando esteja em causa concessão de crédito no quadro de uma relação de Cash Pooling, apenas será tributada a utilização de fundos consumada em território nacional, podendo a AT exigir o imposto devido, incidente sobre o crédito utilizado em Portugal, diretamente ao titular do interesse económico, ou seja, ao beneficiário de tal crédito.
4. Não se verificando na concessão de crédito os pressupostos da incidência a imposto do selo por força da aplicação da regra da territorialidade, em virtude da utilização do crédito não ocorrer em território nacional, há que concluir que também não se coloca a questão da aplicabilidade das isenções previstas nas alíneas g) e h) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros, o Exm.º Juiz José Poças Falcão (árbitro-Presidente), Dr. Jesuíno Alcântara Martins, e o Dr. Jorge Carita (árbitros vogais), integrando este Tribunal Arbitral por designação das partes [artigos 6º-2/b), 10º-2/g) e 11º-2, do RJAT] e, quanto ao presidente, nomeado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa, para formarem o Tribunal Arbitral coletivo constituído em 21 de janeiro de 2021, acordam no seguinte:
I. RELATÓRIO
1. A sociedade A..., Unipessoal Lda., com o número de identificação fiscal n.º..., com sede em Rua ..., n.º ..., ..., ...-..., ..., Lisboa, doravante designada por “Requerente”, veio, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º e seguintes do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, e nos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, em articulação com o disposto na alínea a) do artigo 99.º e na alínea e) do n.º 1 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aplicáveis ex vi alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do aludido RJAT, requerer a constituição de Tribunal Arbitral coletivo, com vista à anulação de atos de autoliquidação de Imposto do Selo (IS), infra identificados, referentes a períodos de tributação dos anos de 2016 e de 2017.
2. A Requerente é uma sociedade de direito português, a qual prossegue, no âmbito do seu objeto social, a atividade de consultoria e desenvolvimento de empreendimentos de energias renováveis, incluindo a gestão de ativos em operação, e faz parte de um grupo de sociedades sendo o seu capital social detido integralmente pela sociedade B..., S.A, entidade que, para efeitos fiscais, é residente em França – (cfr. Doc. 5 anexo ao ppa).
3. No pedido de pronúncia arbitral (ppa), a Requerente formula pretensão no sentido do Tribunal Arbitral coletivo considerar procedente o seu pedido arbitral e ordenar:
a) A anulação do despacho de indeferimento da reclamação graciosa presentada em 18.02.2019, deduzida com fundamento em ilegalidade dos referidos atos de autoliquidação de Imposto do Selo;
b) A anulação dos atos tributários de autoliquidação efetuados com base na Verba 17.1.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo (Operações Financeiras), a que se referem as guias de retenção na fonte n.ºs..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e..., que totalizam o valor de € 275.786,45 de Imposto do Selo, acrescido de € 14.441,74 de juros compensatórios, com referência aos períodos de tributação de janeiro a dezembro de 2016.
c) A anulação dos atos tributários de autoliquidação efetuados com base na Verba 17.1.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo (Operações Financeiras), a que se referem as guias de retenção na fonte n.ºs..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., que totalizam o valor de € 186.323,04, de Imposto do Selo, acrescido de juros compensatórios no valor de € 4.285,21, com referência aos períodos de tributação de janeiro a outubro de 2017.
d) A condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira a restituir à Requerente as importâncias pagas indevidamente, no valor global de € 480.836,44, referente a € 462.109,49 de Imposto do Selo e de € 18.726,95, relativo a juros compensatórios;
e) A condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira ao pagamento de juros indemnizatórios à taxa legal em vigor, desde 03 de janeiro de 2018, até à restituição à Requerente dos valores de Impostos do Selo e de juros compensatórios indevidamente entregues nos cofres do Estado.
4. Em síntese, A Requerente fundamenta o seu pedido nos termos seguintes:
a) Em 01 de janeiro de 2012, foi celebrado um acordo de gestão de tesouraria entre a ora Requerente e a B..., denominado “Convention Gestion Trésoire”, designado de acordo de gestão de tesouraria – (cfr. Doc. 6 anexo ao ppa).
b) Desde janeiro de 2016 registaram-se saldos positivos no âmbito do acordo de gestão de tesouraria, sendo que os excessos de tesouraria registados pela Requerente foram transferidos para a B...– (cfr. Doc. 7 anexo ao ppa).
c) Em função deste acordo de gestão de tesouraria, em que a Requerente detém a posição de concedente de crédito e a B..., na qualidade de utilizadora dos créditos, assume a posição de devedora.
d) A Requerente considera que não existe norma de incidência que fundamente a sujeição a tributação em sede de Imposto do Selo das operações financeiras de concessão de créditos à B..., tendo a Requerente, na qualidade de concedente do crédito, procedido à autoliquidação do imposto por razões de prudência, porquanto, optou por seguir os fundamentos subjacentes ao princípio solve et repete.
e) A Requerente salienta que na Reclamação Graciosa suscitou a aplicação das isenções previstas nas alíneas g) e h) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo, com o propósito se sublinhar e acentuar a sua posição quanto ao âmbito da territorialidade, porquanto, o Imposto do Selo incide sobre factos ocorridos em território nacional.
f) A propósito do conceito de facto tributário, a Requerente invoca a definição sufragada pelo Tribunal Central Administrativo Sul, no âmbito do Acórdão 05232/11, em que se afirma que “[o] acto tributário tem sempre na sua base uma situação de facto concreta, a qual se encontra prevista abstracta e tipicamente na lei fiscal como geradora do direito ao imposto. Essa situação factual e concreta define-se como facto tributário, o qual só existe desde que se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos para tal. As normas tributárias que contemplam o facto tributário são as relativas à incidência real, as quais definem os seus elementos objectivos. Só com a prática do facto tributário nasce a obrigação de imposto. A existência do facto tributário constitui, pois, uma condição “sine qua non” da fixação da matéria tributável e da liquidação efectuada”.
g) E que quanto à constituição da obrigação tributária, de acordo com a alínea g) do n.º 1 do artigo 5.º do Imposto do Selo, no que diz respeito às operações de crédito, tal ocorre “(…) no momento em que forem realizadas ou, se o crédito for utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outro meio em que o prazo não seja determinado nem determinável, no último dia de cada mês”, ou seja, deve entender-se por realização, o momento da utilização do crédito.
h) A Requerente entende que o conceito de utilização de crédito deverá ser aferido, conjuntamente, com as regras respeitantes ao âmbito territorial do Imposto do Selo, previsto no artigo 4.º do Código do Imposto do Selo.
i) E que, em função do âmbito territorial do imposto do Selo, encontram-se excluídas as operações de crédito em que o concedente tem residência, para efeitos fiscais, em Portugal e o crédito é utilizado por uma entidade, para efeitos fiscais, não residente em Portugal.
j) Na defesa da sua pretensão a Requerente invoca o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, tirado no processo n.º 05232/11, de 22.05.2012, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 0800/17, de 14.03.2018, o Processo Arbitral n.º 61/2019-T, a Circular n.º 15/2000, de 5 de junho, da Direção Geral das Contribuições e Impostos (atual AT), e ainda a Informação vinculativa prestada no âmbito do processo 2019000480-IVE n.º 15404, sancionada por despacho da Diretora-Geral da AT, por despacho de 03.06.2019.
k) A Requerente considera inequívoco que a concessão de crédito por parte de uma entidade residente a uma entidade não residente não configura uma situação sujeita a Imposto do Selo em Portugal.
5. É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), que tendo sido notificada, em 23.01.2021, nos termos e para os efeitos do artigo 17.º do RJAT, apresentou a sua Resposta e juntou aos autos o processo administrativo em 03.05.2021, resposta que aqui se dá por integralmente reproduzida.
6. De entre os argumentos invocados pela Requerente no pedido de pronúncia arbitral, a Requerida identifica como pontos relevantes a síntese infra enunciada:
• A carência de fundamentação adequada da decisão da reclamação graciosa;
• A não sujeição dos fluxos financeiros de concessão/utilização de crédito realizados pela Requerente, no âmbito do Acordo de Gestão de Tesouraria em que participa, a Imposto do Selo;
• Que a sujeição das referidas operações financeiras a Imposto do Selo, constituiria uma «violação dos princípios de direito fiscal interno», e «do direito da EU», na medida em que tal consubstanciaria uma «restrição incompreensível à liberdade de circulação», tendo em atenção o regime das isenções previstas nas alíneas g) e h) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 7.º do CIS à data dos factos;
• Que a AT aparenta perfilhar uma posição semelhante à sustentada pela Requerente, quanto à territorialidade do Imposto do Selo, conforme resultaria da Informação Vinculativa do processo 2019000480 – IVE 150404,
em relação aos quais, a Requerida faz um profícuo, ponderado e cuidadoso contraditório argumentativo.
7. A Requerida conclui que as operações de concessão de crédito efetuadas pela Requerente à B... estão sujeitas a Imposto do Selo, pelo que os atos de autoliquidação de Imposto do Selo supra identificados não enfermam de qualquer ilegalidade, ao invés, em face das normas de incidência objetiva e subjetiva, bem como das normas de delimitação territorial, são absolutamente legais, e, assim, defende que o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente deve ser considerado improcedente.
8. Em 14.10.2020, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e foi imediatamente (e-mail automático) notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira. A Requerente optou por designar árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 2 e n.º 3 do artigo 6.º e dos n.ºs 5 e 7 do artigo 11.º ambos do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) designou, para integrar o presente Tribunal Arbitral coletivo, os signatários como árbitros, tendo este comunicado a aceitação do encargo no prazo aplicável.
9. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, em 21.01.2021 verificou-se a constituição do Tribunal arbitral, sendo relevante referir que, para efeitos de cômputo do prazo previsto no n.º 1 do artigo 21.º do RJAT, importa considerar a suspensão de prazos ocorrida nos termos do artigo 6.º-B da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação da Lei n.º 4-B/2021, de 01 de fevereiro, e do artigo 4.º desta Lei e do artigo 6.º da Lei n.º 13-B/2021, de 05 de abril, bem como devem ser tidos em consideração os despachos arbitrais de 29.07.2021 e de 30.11.2021 que, nos termos do n.º 2 do artigo 21.º do RJAT, prorrogaram por dois meses o prazo para a prolação da decisão arbitral.
10. Em face do conhecimento emergente das peças processuais apresentadas pelas Partes – pedido de pronúncia arbitral e resposta da Requerida –, que se julga suficiente para a decisão, por despacho de 18.05.2021, o Tribunal arbitral coletivo decidiu que:
a) À luz do disposto nos artigos 16.º, alínea c), do RJAT e do princípio da proibição da prática de atos inúteis, devia ser dispensada a reunião do Tribunal com as partes, considerando que (i) por se tratar, no caso, de processo não passível duma definição de trâmites processuais específicos, diferentes dos comummente seguidos pelo CAAD na generalidade dos processos arbitrais, e (ii) que não tendo sido suscitadas exceções ou questões prévias nem requeridas outras provas adicionais.
b) Encerrada assim a fase instrutória do processo, ambas as partes apresentariam, querendo, no prazo simultâneo de 20 (vinte) dias [(artigos 29.º, do RJAT, 91.º, n.º 5 e 91.º-A, do CPTA, versão republicada em anexo ao Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 02.10)], alegações escritas, de facto (factos essenciais que consideram provados e não provados) e de direito.
c) Devia fixar o dia 15.07.2021, como data limite previsível para a prolação e notificação da decisão arbitral final, prazo este que foi prorrogado sucessivamente, por dois meses, através dos despachos arbitrais de 29.07.2021. e de 30.11.2021.
11. A Requerente apresentou as alegações em 09.06.2021, e a Requerida em 11.06.2021, as quais aqui se dão por integralmente reproduzidas, sendo que as Partes nelas reafirmam as posições enunciadas nas peças processuais iniciais (pedido de pronúncia arbitral e resposta).
II. SANEAMENTO
12. O tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.
13. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, uma vez que foi apresentado no prazo previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT.
14. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas (cfr. art.º 4.º e n.º 2 do art.º 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
15. O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas exceções. Assim, passa-se à apreciação e decisão do mérito da causa.
III. FUNDAMENTAÇÃO
III.1 MATÉRIA DE FACTO
III.1.1 Factos Provados
16. Ao Tribunal incumbe o dever de selecionar os factos que importam à decisão e determinar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada, não tendo a obrigação de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre dos termos conjugados do n.º 2 do artigo 123.º do CPPT e do n.º 3 do artigo 607.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi dos normativos das alíneas a) e e), do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.
17. Os factos relevantes para a decisão da causa que são tidos como provados são os seguintes:
17.1 Em 03.01.2018, a Requerente procedeu à efetivação de atos de autoliquidação de Imposto do Selo, ao abrigo da verba 17.1.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS) – rubrica 317 (Operações Financeiras), o qual foi entregue nos cofres do Estado: i) Em relação aos períodos de tributação de janeiro a dezembro de 2016, através das guias n.ºs..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., que totalizam o valor de € 275.786,45 de Imposto do Selo, acrescido de € 14.441,74 de juros compensatórios. ii) Em relação aos períodos de tributação de janeiro a outubro de 2017, através das guias n.ºs..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., que totalizam o valor de € 186.323,04, de Imposto do Selo, acrescido de juros compensatórios no valor de € 4.285,21 – (cfr. Doc. 8 anexo ao ppa).
17.2 O imposto do selo e respetivos juros compensatórios autoliquidados pela Requerente totalizam o valor total de € 462.109,49, o qual foi entregue nos cofres do Estado no dia 03.01.2018.
17.3 A Requerente é uma sociedade de direito português, a qual prossegue, no âmbito do seu objeto social, a atividade de consultoria e desenvolvimento de empreendimentos de energias renováveis, incluindo a gestão de ativos em operação, e faz parte de um grupo de sociedades sendo o seu capital social detido integralmente pela sociedade B..., S.A., (designada por “B...”), sociedade residente, para efeitos fiscais, em França – (cfr. Doc. 5 anexo ao ppa).
17.4 A Sociedade “B...” é uma sociedade residente para efeitos fiscais em França.
17.5 Em 01 de janeiro de 2012, foi celebrado um acordo de gestão de tesouraria entre a Requerente e a B..., denominado “Convention Gestion Trésoire” (designado de acordo de gestão de tesouraria) – (cfr. Doc. 6 anexo ao ppa).
17.6 Em 18.02.2019, a Requerente deduziu Reclamação Graciosa a invocar a ilegalidade dos atos de autoliquidação, com fundamentos similares aos aduzidos no pedido de pronúncia arbitral – (cfr. Doc. 2 anexo ao ppa).
17.7 Atento o disposto na alínea a) do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, a apresentação de reclamação graciosa constitui pressuposto procedimental necessário à vinculação da Requerida à arbitragem tribuária e à aceitação do pedido de pronúncia arbitral apresentado em 12.10.2020.
17.8 A reclamação graciosa foi Indeferida por despacho de 16.07.2020, proferido, pelo Diretor adjunto de Direção de Finanças de Lisboa, ao abrigo de Subdelegação de competências, notificado à Requerente através de ofício datado de 17.07.2020, processo n.º ...2019... .
17.9 O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado em 12.10.2020, e a constituição do Tribunal Arbitral ocorreu em 21 de janeiro de 2021.
III.1.2 Factos não provados
18. Não existem quaisquer factos não provados que relevem para a decisão da causa.
O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e nos documentos integrados no processo administrativo junto aos autos pela Requerida, e em factos não questionados pelas partes.
IV.2 MATERIA DE DIREITO
19. A questão jurídico-tributária que importa decidir nos presentes autos de arbitragem consiste em determinar se as operações de financiamento realizadas pela Requerente, no decurso dos anos de 2016 e de 2017, destinadas a suprir carências de tesouraria, por um período inferior a um ano, a favor da B... estão sujeitas a imposto do Selo, e no caso das referidas operações de financiamento caírem no âmbito de incidência do imposto do selo, se as mesmas podem, ou não, beneficiar da isenção de Imposto do Selo prevista nas alínea g) e h) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo (CIS).
O Tribunal arbitral vai ter, ainda, de decidir sobre o pedido de pagamento de juros indemnizatórios formulado pela Requerente no pedido de pronúncia arbitral.
20. As operações financeiras que constituem o objeto de decisão nestes autos estão conexas com o acordo de gestão de tesouraria emergente do instrumento jurídico outorgado, em 01 de janeiro de 2012, entre a sociedade ora Requerente e a B..., ao abrigo do qual, desde janeiro de 2016, a Requerente transferiu os excedentes de tesouraria por si registados a favor da B..., assumindo esta a posição de devedora.
21. As operações financeiras concretizadas entre a sociedade portuguesa (A...), na posição de cedente de crédito, e a sociedade de direito francês (B...), na posição de devedora, consubstancia um contrato de gestão centralizada de tesouraria que os grupos de empresas vêm praticando sob diversas modalidades, internacionalmente designados por contrato de cash pooling.
22. Uma gestão de tesouraria eficiente depende de uma estratégica eficaz de afetação de recursos disponíveis que permita a redução de custos operacionais. Sendo este o objetivo fulcral do sistema de cash pooling, o mesmo torna-se um instrumento de suma importância para os grupos de sociedades, que cada vez mais otimizam os recursos financeiros de que dispõem.
23. Na verdade, no âmbito de uma operação de cash pooling, podem surgir diferentes contas bancárias tituladas por sociedades pertencentes a um mesmo grupo, que são compensadas entre elas, resultando um só saldo positivo ou negativo, situação que se reflete no pagamento de juros devedores, caso se registe saldo negativo (designadas operações de descoberto bancário), a uma taxa geralmente superior àquela de que se beneficiaria em caso de registo de saldo positivo, do qual resultaria o pagamento de juros credores. Ou seja, no sistema de gestão de tesouraria utiliza-se um método de compensação de saldos bancários, resultante da soma dos vários saldos das contas bancárias tituladas pelas sociedades do grupo, que irá estabelecer a taxa de juro aplicável (se taxa de juros devedores, para os casos de contas a descoberto, isto é, que registem saldo negativo, ou se taxa de juros credores para contas que registem saldo positivo).
24. A todas as operações de centralização da gestão de tesouraria é comum a existência de um ou mais contratos, que envolvem três aspetos fulcrais:
i) as diversas sociedades têm de estar em relação de domínio ou de grupo;
ii) O centro de tesouraria, é representado em uma das sociedades ou na que seja dominante, e por fim,
iii) Exige a intervenção de um banco.
O contrato carateriza-se nomeadamente por conter os seguintes requisitos:
i) Cada sociedade do grupo compromete-se a transferir (por transferência real ou virtual) o saldo das suas contas bancárias para uma conta global, a qual é titulada pelo centro de tesouraria;
ii) O banco responsabiliza-se pelo débito ou crédito dos juros resultantes da taxa aplicável sobre o saldo da conta bancária global (titulada pelo centro de tesouraria) e não sobre os saldos das contas bancárias individuais de cada sociedade pertencente ao grupo;
iii) O centro de tesouraria poderá utilizar os fundos disponíveis na conta bancária global para fazer face à necessidade de financiamento de qualquer das empresas do grupo.
25. Estas operações têm um papel essencial na colocação à disposição das entidades intervenientes de meios financeiros em locais e momentos determinados, maximizando os proveitos na disponibilização de excedentes monetários e minimizando os custos financeiros relativos ao eventual encargo com taxas de juro aplicáveis à situação de saldo negativo, e/ou aos relacionados com os riscos cambiais, verificando-se, portanto, que as operações de centralização da gestão de tesouraria não se consubstanciam apenas num acompanhamento de centralização de contas num só saldo global. Sendo de sublinhar que a operação cash pooling se traduz, desta forma, num meio privilegiado de monitorização do desenvolvimento da atividade económica de um grupo de sociedades.
26. Estes instrumentos financeiros, nas definições mais comummente explicitadas nas obras que abordam a questão, visam maximizar as disponibilidades de tesouraria, não através da via do financiamento bancário, mas antes por meio de um mecanismo de compensação entre contas entre os excessos de tesouraria no seio das empresas de um grupo. Deste modo obtém-se uma situação de negociação mais confortável junto das instituições financeiras, diminuem-se os riscos financeiros e cambiais que se verificam muitas vezes nos casos em que não há essa gestão integrada dos recursos existentes dentro dos grupos.
27.Nas palavras de J. Fernando Abreu Rebouta , “os centros de gestão de tesouraria ou a gestão centralizada de tesouraria têm como objetivo a gestão consolidada da tesouraria de diversas empresas de um grupo de sociedades através de uma dessas empresas ou através de uma empresa especificamente constituída ou destinada para o efeito, ou seja, de forma sucinta, permitir relacionar saldos devedores e saldos credores junto de uma instituição financeira. Este tipo de operações permite a compensação do saldo devedor de algumas das empresas pelo saldo credor das restantes, além de que o centro de gestão de tesouraria pode recorrer aos fundos gerados para financiar as empresas do grupo”.
28. No nosso ordenamento jurídico, o enquadramento deste tipo de operações deve ser efetuado em face do Regime Geral das Instituições de crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, e à luz do Código das Sociedades Comerciais (CSC).
29. Assim, a realização de operações de centralização da gestão de tesouraria é permitida entre sociedades que se encontram numa relação de domínio ou de grupo, ainda que não sejam instituições de crédito. Esta peculiaridade resulta da exceção ao princípio da exclusividade das instituições de crédito para o exercício da atividade de receção do público, de depósitos ou outros fundos reembolsáveis, para utilização por conta própria e, bem assim, das instituições de crédito e das sociedades financeiras para realizarem um variado conjunto de operações financeiras entre as quais, operações de crédito - artigo 8.º do RGICSF - que nos termos do artigo 9.º do Regime Geral, afasta este princípio quando estejam em causa operações de tesouraria legalmente permitidas, entre sociedades que se encontrem numa relação de domínio ou de grupo.
30. Nas operações de cash pooling que impliquem uma efetiva movimentação de fundos entre as contas tituladas pelas sociedades do grupo, isto é, operações de zero balance cash pooling (ou cash concentration), verifica-se um maior nível de complexidade jurídico-fiscal, considerando que são efetivas as transferências de montantes entre sociedades do mesmo grupo, podendo originar a equiparação a reais empréstimos.
31. Importa, portanto, reafirmar que o sistema de cash pooling se consubstancia num serviço financeiro que poderá ser utilizado entre contas bancárias de várias sociedades do mesmo grupo, tratando-se de uma gestão conjunta dos capitais que possibilita, não só a diversificação do risco, como permite também otimizar a independência relativamente aos financiamentos de terceiros. Assim sendo, o cash pooling tem por objetivo a gestão conjunta de excedentes de tesouraria que existam de forma dispersa em inúmeras contas e/ou carências de tesouraria noutras contas bancárias. In casu, o que se verificou é que a Requerente transferiu para a B... desde janeiro de 2016 os seus excessos de tesouraria.
32. Feita a caraterização deste tipo de instrumento financeiro, importa proceder ao seu enquadramento em sede de imposto do selo, em ordem a decidir sobre a legalidade ou não dos atos de liquidação (autoliquidações) impugnados.
33. Em face do n.º 1 do artigo 1.º do Código do Imposto do Selo (CIS), “o imposto do selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, livros papéis, e outros factos previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuita de bens”. Deste modo, à luz da verba 17 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), o imposto do selo poderá incidir sobre operações financeiras, nomeadamente sobre utilização de crédito, mas também sobre os juros e comissões cobrados entre as entidades participantes na operação de cash pooling (e desde que operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras), podendo ser aplicáveis algumas isenções em sede deste imposto.
34. Como já se referiu, as operações de cash pooling caraterizam-se por serem operações de transferência efetiva de saldos bancários entre sociedades de um grupo e a entidade centralizadora, correspondendo à realização de operações de tesouraria que poderão configurar concessões de crédito da entidade centralizadora titular de conta bancária às sociedades do grupo. Assim, quando estas operações de transferência de saldos entre as contas bancárias tituladas pelas sociedades do grupo, participantes na operação de cash pooling, residentes em Portugal, e a conta titulada pela entidade centralizadora, consubstanciam financiamentos obtidos ou concedidos através da realização de operações de tesouraria, verificando-se, assim, a chamada utilização de crédito, serão aplicáveis as normas gerais do Código do Imposto do Selo, incluindo as isenções estabelecidas nos artigos 6.º e 7.º do CIS.
35. Em face das normas do artigo 2.º do CIS, em matéria de incidência subjetiva, resulta que, relativamente às operações financeiras, maxime, às operações de tesouraria que envolvam financiamento ao cessionário, aderente ou devedor, é sujeito passivo do imposto, o mutuário ou quem beneficia do crédito – cfr al. d) do n.º 1 do artigo 2.º do CIS.
36. Porém, atenta o disposto no artigo 4.º do CIS, só estão sujeitas a imposto do selo os atos e factos previstos na Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS) ocorridos em território nacional, ressalvadas as situações assinaladas pelo CIS e pela TGIS. Do disposto em 17.1 e 17.4 da TGIS, na redação introduzida pela Lei n.º 12-A/2010, de 30 de junho, extrai-se que “(...) pela utilização de crédito, sob a forma de fundos, mercadorias e outros valores, em virtude da concessão de crédito a qualquer título exceto nos casos referidos na verba 17.2, incluindo a cessão de créditos, o factoring e as operações de tesouraria quando envolvam qualquer tipo de financiamento ao cessionário, aderente ou devedor, considerando-se, sempre, como nova concessão de crédito a prorrogação do prazo do contrato (...)”, se aplica, “(...)sobre o respetivo valor, em função do prazo (...), pelo crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30 (...)”, a taxa de 0,04%.”
37. Em face do normativo da alínea g) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS, na redação vigente à data dos factos, estão isentas de imposto do selo “as operações financeiras, incluindo os respetivos juros, por prazo não superior a um ano, desde que exclusivamente destinadas à cobertura de carência de tesouraria e efetuadas por sociedades de capital de risco (SCR) a favor da sociedade em que tenham participações, bem como as efetuadas por outras sociedades a favor de sociedades por elas dominadas ou a sociedades em que detenham uma participação de, pelo menos, 10% do capital com direito de voto ou cujo valor de aquisição não seja inferior a € 5 000 000, de acordo com o último balanço acordado e, bem assim, efetuadas em benefício de sociedade com a qual se encontre em relação de domínio ou de grupo”.
38. Por sua vez, ao tempo dos factos, a norma da alínea h) do ao n.º 1 do artigo do CIS estabelecia que são isentos de imposto do selo “as operações, incluindo os respetivos juros, referidas na alínea anterior, quando realizadas por detentores de capital social a entidades nas quais detenham diretamente uma participação no capital não inferior a 10% e desde que esta tenha permanecido na sua titularidade durante um ano consecutivo ou desde a constituição da entidade participada, contanto que, neste último caso, a participação seja mantida durante aquele período”.
39. Estas isenções não existem ou não se aplicam no caso de qualquer dos intervenientes (nas operações respetivas) “(...) não tenha sede ou direção efetiva no território nacional, com exceção das situações em que o credor tenha sede ou direção efetiva noutro Estado membro da União Europeia ou num Estado em relação ao qual vigore uma convenção para evitar a dupla tributação sobre o rendimento e o capital acordada com Portugal, caso em que subsiste o direito à isenção, salvo se o credor tiver previamente realizado os financiamentos previstos nas alíneas g) e h), do nº 1 [do artigo 7º, do CIS] através de operações realizadas com instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas no estrangeiro ou com filiais ou sucursais no estrangeiro de instituições de crédito ou sociedades financeiras sediadas em território nacional (...)”.
40. No tocante à constituição ou nascimento da obrigação tributária de imposto do selo, importa atentar na norma da alínea g) do n.º 1 do artigo 5.º do CIS que determina que nas operações de crédito, tal ocorre “(...) no momento em que forem realizadas ou, se o crédito for utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outro meio em que o prazo não seja determinado nem determinável, no último dia de cada mês”.
41. Sobre a incidência do Imposto do Selo nas concessões de crédito, há muito que se tem entendido, quer na jurisprudência quer na doutrina, que o imposto do Selo incide sobre a efetiva utilização do crédito e não sobre o contrato que lhe é subjacente. Neste sentido veja-se o Acórdão do STA, de 14.03.2018, proferido no processo 0800/17, em que se fixou jurisprudência no sentido de que “O Código do Imposto do Selo considera sujeitos passivos do imposto, de forma genérica, as “entidades concedentes do crédito” - art.º 2.º, n.º 1, alínea g) do referido Código. Nos termos do n.º 1, h) a concessão de crédito está sujeita a imposto do selo, qualquer que seja a natureza e forma, relevando, contudo, para o efeito a efetiva utilização do crédito concedido e não o contrato que lhe é subjacente o que significa que, mais que a forma do contrato, importa para a tributação a efetiva relação de crédito, estando sujeito a imposto apenas a efetiva utilização do crédito pelo beneficiário. Assim, teremos que concluir que a mera celebração do contrato de concessão de crédito nem sempre gera facto tributário do imposto. Quando a utilização do crédito for imediata, o facto tributário emerge na data de utilização que coincide com a data de celebração do contrato de concessão de crédito. Quando a utilização do crédito não for imediata, o facto tributário emerge na data de utilização que não coincide com a data de celebração do contrato concessão de crédito. O facto tributário eleito para tributação é, sempre, a concessão de crédito em que uma parte se obriga a realizar uma prestação de valores monetários a outra que, por sua vez, se obriga a restituir aquele montante (em singelo ou acrescido de valor convencionado), no futuro. A utilização de crédito com base em negócio jurídico de concessão de crédito é que torna aparente o contrato de concessão de crédito que o legislador quer tributar. Até que essa utilização se verifique, não há lugar a tributação e esta, quanto à sua taxa, depende muito do valor e periodicidade da utilização.”
42. A este propósito veja-se a posição doutrinária de J. Silvério Mateus e de Corvelo de Freitas expressa em anotações à verba 17 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS) produzidas a páginas 732 a 734 da obra “Os Impostos sobre o Património Imobiliário, O Imposto do Selo, Anotados e Comentados”, 1.ª Edição, 2005, Lisboa, Engifisco, em que se diz que “1. Com significativas alterações, de que se destaca, com especial relevância, o facto de a tributação do crédito passar a efetuar-se em função da sua utilização efetiva e de a taxa ser variável em função do prazo, (…).
2. Sob a epígrafe “operações financeiras”, incluem-se no âmbito da incidência do imposto do selo a concessão do crédito, qualquer que seja a natureza da entidade concedente e do utilizador, a par de um conjunto de operações financeiras, de que resultem juros e comissões, que apenas ficam sujeitas a tributação em imposto do selo se forem realizadas por instituições de crédito, sociedades financeiras, outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras. 3. Nos termos do n.º 1, a concessão de crédito está sujeita a imposto do selo, qualquer que seja a natureza e forma, relevando, contudo, para o efeito a efetiva utilização do crédito concedido e não o contrato que lhe é subjacente. Pode, assim, ser celebrado um contrato de concessão de crédito sem que tal traduza facto tributário deste imposto, o que ocorrerá sempre que a utilização de crédito não seja imediata ou se não houver utilização efetiva desse contrato. (…) Salienta-se, contudo, que o facto tributário tipificado nesta verba é a concessão de crédito ou seja, a utilização de crédito com base em negócio jurídico de concessão de crédito, cujos elementos essenciais se traduzem na prestação de um bem presente contra a promessa de restituição futura. (…) O facto gerador da obrigação tributária é, de acordo com a alínea g) do artigo 5.º do Código, a utilização do crédito, não sendo, pois, as aberturas de crédito especialmente tributadas enquanto tal utilização se não verifique. Independentemente da sujeição ao selo do escrito, a abertura de crédito poderá, pois, não vir sequer a ser tributada em imposto do selo se, com já acima se referiu, não chegar a haver utilização do crédito concedido.”
43. Outrossim, José Maria Pires, nas suas “Lições de Impostos sobre o Património e do Selo”, 2.ª Edição, 2013, Lisboa, Almedina, págs. 443 e 444, refere que “(…) “é no domínio das operações financeiras que o novo Código introduz duas inovações fundamentais relativamente ao anterior. Por um lado, o imposto passa a incidir sobre as utilizações de crédito e não sobre a celebração dos contratos que lhes dão origem (…). Por outro lado, o tempo de duração da relação creditícia passa a ser determinante para a determinação do imposto a pagar (…). As operações de crédito são tributadas nos termos da verba n.º 17.1 da Tabela Geral. A lei enuncia alguns tipos contratuais de concessão de crédito, como é o caso da cessão de créditos, o factoring, as operações de tesouraria, a abertura de crédito em conta corrente e o descoberto bancário. Porém, esta enunciação é meramente exemplificativa, dado que a lei tributa a concessão de crédito independentemente da forma contratual que lhe está subjacente (“a concessão de crédito a qualquer título”, como determina a referida verba da Tabela Geral). Como antes vimos, mais que a forma do contrato que está na base da relação de crédito, o que está sujeito a imposto é a efetiva utilização do crédito pelo beneficiário.”
44. À luz do artigo 1.º do CIS e da verba 17 da TGIS, em função das efetivas utilizações de crédito e do prazo acordado, as operações de tesouraria integrada no n.º 1 do artigo 4.º do CIS, cuja utilização ocorra em território nacional e que envolvam financiamento a uma entidade estarão sujeitas a imposto do selo, às taxas previstas na referida verba da TGIS, e assim sendo quando as utilizações de crédito ocorram no âmbito de operações cash pooling e aquelas não ocorram em território nacional não haverá lugar a liquidação de imposto do selo.
45. A este propósito veja o que foi decidido no acórdão do TCA, de 25.03.2021, proferido no processo n.º 675/03.9BTLRS, em que se “(…). iv) Nos termos das normas supra citadas do anterior CIS o facto tributário que desencadeia a obrigação do pagamento do imposto residia na celebração do negócio jurídico (data da celebração da concessão de crédito/contrato de mútuo), entendida como a obrigação de fornecimento de fundos a outrem (e não a utilização do crédito efetuado tal como definido atualmente na Verba 17.1 da TGIS). v) A sujeição a imposto de selo do crédito utilizado, no atual CIS, encontra-se condicionada pela conexão que a situação apresente com o território português, sendo esta conexão determinada pelo local onde se verifica a utilização do crédito, por força da regra da territorialidade.”
46.Com efeito, atentas as regras de territorialidade previstas na alínea b) do n.º 2 do artigo 4.º do Código do Imposto, será tributada a utilização de crédito de empresa portuguesa proveniente de cedente/entidade não residente, por aplicação da verba 17.1.4 da TGIS. Esta verba tem por finalidade tributar operações de financiamento, cujo crédito será utilizado sob a forma de conta corrente.
47. A liquidação do imposto do selo, se estiver envolvida uma empresa não residente é efetuada pela empresa portuguesa, a quem compete a liquidação e entrega do imposto nos cofres do Estado, quando seja concedente do crédito ou quando seja utilizadora do crédito. Se forem operações entre empresas nacionais, o sujeito passivo de imposto do selo (a quem compete a liquidação e entrega ao Estado) é da empresa concedente do crédito, conforme a alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º do CIS. O encargo do imposto incumbe sempre ao utilizador do crédito, seja empresa não residente ou empresa portuguesa. No caso em análise a entidade utilizadora do crédito não é a Requerente mas sim uma sociedade, com sede fora do território nacional, gestora ou centralizadora dos fundos excedentes de tesouraria que lhe foram disponibilizados pela Requerente.
48. In casu, a entidade financiadora (mutuante) é a Requerente e a entidade financiada é uma entidade com sede em França e utilizadora dos excedentes de tesouraria disponibilizados pela Requerente, que, sendo estrangeira, não está obrigada a imposto do selo à luz do direito português. Nesta medida, não se verificam os pressupostos de incidência subjetiva e geográfica do imposto do selo, em ordem a justificar a manutenção na ordem jurídica dos atos de autoliquidação impugnados.
49. Deste modo, ainda que a tributação em sede de imposto do selo se faça em função do contrato de concessão do crédito, o facto tributário não se formará se não se verificar a efetiva utilização do crédito e atenta a regra da territorialidade prevista no artigo 4.º do CIS, a utilização do crédito ter-se-á que verificar em território nacional, independentemente da entidade cedente do crédito (credora) ser residente ou não residente em território nacional. Ora, in casu, a entidade utilizadora do crédito (devedora) não é residente em território nacional, pelo que não se encontram preenchidos os pressupostos da incidência do imposto do selo e, assim sendo, se não existe lugar a incidência de imposto do selo também não se coloca a questão da aplicação das isenções previstas nas alíneas g) e h) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS.
50. Na situação sub judice, conclui-se que os atos de autoliquidação de Imposto do Selo controvertidos são inválidos por vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito, gerador de anulabilidade. Tendo sido o referido pressuposto extensivo às liquidações de juros compensatórios controvertidas, estas enfermam de idêntico vício invalidante e, por consequência, devem ser anuladas.
Na justa medida em que manteve os atos de autoliquidação controvertidos, a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2019... padece de igual vício invalidante, o que importa a respetiva anulação (artigo 163.º, n.º 1, do CPA ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea d), do RJAT).
IV. JUROS INDEMNIZATÓRIOS
51. Conjuntamente com a anulação do Imposto do selo autoliquidados e respetivos juros compensatórios, referentes a períodos de tributação de janeiro de 2016 a outubro de 2017, a Requerente requer que lhe seja reconhecido o direito a juros indemnizatórios, nos termos previstos no artigo 43.º da LGT.
52. Nos termos da norma do n.º 1 do artigo 43.º da LGT, serão devidos juros indemnizatórios "quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido."
53. Há que referir que, em face da norma do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, o direito aos mencionados juros indemnizatórios pode ser reconhecido no processo arbitral, pelo que, assim, importa conhecer do pedido, sendo que o direito a juros indemnizatórios pressupõe que haja sido pago imposto por montante superior ao devido e que tal pagamento indevido derive de erro, de facto ou de direito, imputável aos serviços da AT.
54. De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”, o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT], o qual estabelece que “a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão”.
55. Embora as alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT utilizem a expressão “declaração de ilegalidade” para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira diretriz, que “o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária”.
56. O processo de impugnação judicial, incluindo por via arbitral, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de atos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do n.º 1 do artigo 43.º da LGT, em que se estabelece que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”. Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT ao dizer que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário” deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
57. In casu, os atos de autoliquidação do imposto do selo e de juros compensatórios foram da iniciativa do sujeito passivo, a ora Requerente, pelo que, neste caso, não é possível imputar qualquer tipo de erro aos serviços da AT na efetivação dos atos de liquidação do imposto do selo alvo do presente pedido arbitral.
58. Porém, na sequência da dedução da reclamação graciosa contra os atos de autoliquidação de imposto do selo e respetivos juros compensatórios supra identificados, e agora objeto do presente processo arbitral, em face das alegações produzidas pela Requerente no procedimento de reclamação graciosa, processo n.º ...2019..., a Autoridade Tributária e Aduaneira teve a oportunidade de proceder à análise e avaliação da matéria controvertida e podia ter efetuado o correto enquadramento jurídico-tributário dos factos e, consequentemente, ter efetuado a plena reconstituição da legalidade dos atos ou da situação objeto do litígio. Assim, não o tendo feito, a partir da data da decisão de indeferimento da reclamação graciosa há lugar à imputação de erro aos serviços da AT.
59. Deste modo, e na linha da jurisprudência constante dos acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo (STA) proferidos no processo n.º 0926/17, de 06.12.2017, e no processo n.º 0250/17, de 03.05.2018, deve, nos termos do artigo 43.º da LGT e artigo 61.º do CPPT, a Autoridade Tributária Aduaneira proceder ao pagamento à Requerente de juros indemnizatórios à taxa legal , em relação a cada um dos atos de autoliquidação de imposto do selo e respetivos juros compensatórios, desde a data do despacho de indeferimento da reclamação graciosa até à data do processamento da respetiva nota de crédito (n.º 5 do art.º 61.º do CPPT).
VI. DECISÃO
Em face das razões expostas, o Tribunal Arbitral decide:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
b) Anular os atos de liquidação de imposto do selo consubstanciados nas autoliquidações de imposto do selo e de juros compensatórios supra identificadas e referentes a períodos de tributação compreendidos entre janeiro de 2016 e outubro de 2017.
c) Anular o despacho de 16.07.2020 que indeferiu a reclamação graciosa, processo n.º ...2019....
d) Julgar procedente os pedidos de restituição de imposto do selo e de juros compensatórios, no valor total de e 480.836,44, e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar à Requerente juros indemnizatórios, à taxa legal, desde a data de indeferimento da reclamação graciosa e até à emissão da nota de crédito.
VII. VALOR DO PROCESSO
Fixa-se o valor do processo em € 480.836,44 (Quatrocentos e oitenta mil oitocentos e trinta e seis euros e quarenta e quatro cêntimos), de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT), artigo 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT e artigo 306.º do Código de Processo Civil (CPC).
Notifique-se.
Lisboa, 17 de janeiro de 2022
O Árbitro Presidente,
José Poças Falcão
O Árbitro Vogal
Jesuíno Alcântara Martins
O Árbitro Vogal
Jorge Carita
Vota vencido conforme declaração anexa
DECLARAÇÃO DE VOTO
A..., Unipessoal Lda, com sede em território nacional (adiante designada sociedade “filha”), pretende a anulação da autoliquidação de imposto do selo e juros compensatórios, tudo no montante de € 462.109,49, correspondente aos meses de janeiro de 2016 a outubro de 2017.
A Requerente é detida integralmente pela “B...”, sociedade residente para efeitos fiscais em França, adiante denominada “casa mãe”.
Factos relevantes, de acordo com a Requerente:
a). A 1 de janeiro de 2012 foi celebrado um acordo de gestão de tesouraria entre a mãe (França) e a filha (Portugal);
b). Em 2016 os excessos de tesouraria da filha, passaram a ser transferidos para a mãe, numa conta bancária em França;
c). Tal operação configura uma concessão de crédito por parte da filha e uma utilização de crédito por parte da mãe;
d). Contudo, a Requerente (por uma questão de prudência), procedeu à liquidação e pagamento do Imposto do Selo, por aplicação da Verba 17.1.4 da TGIS;
e). Foi aplicada a taxa de 0,04%, que incidiu sobre o montante do crédito utilizado;
f). Foi aplicado o artº. 23º. do CIS e calculado o imposto através da multiplicação da taxa aplicável aos excessos de tesouraria existentes, multiplicado por cada mês de utilização do mesmo.
A Requerente entende que o imposto foi mal autoliquidado, porquanto não há “… norma de incidência que fundamente a utilização do imposto” (Vd. artº. 27º. do Requerimento Inicial – “RI”).
A Requerente entende que, “…para efeitos de incidência da Verba 17 da TGIS, o facto tributário é o acesso/utilização do crédito.” (Vd. artº. 33º. do RI).
A Requerente, já em sede de reclamação graciosa, pedia a aplicação das isenções previstas nas alíneas g) e h), do nº. 1 e 2 do artº. 7º. do CIS.
Considera-se como Legislação aplicável, a seguinte:
Artº. 1º. do CIS – “o imposto incide sobre todos os atos, contratos, documentos… previstos na Tabela Geral.”;
Artº. 2º. nº.1, alínea b) - “No âmbito de operações financeiras, máxime operações de tesouraria que envolvam o financiamento, são sujeitos passivos de imposto, as entidades concedentes do crédito…”;
Artº. 4º. do CIS - “Estão sujeitos a imposto do selo, os atos e factos previstos na TGIS ocorridos no território nacional. …”
Verba 17 da TGIS – estão sujeitas a imposto do selo as operações financeiras, pela utilização do crédito;
Verba 17.1.1 – crédito de prazo inferior a um ano – 0.04% por cada mês ou fração.
Analisando a presente Decisão arbitral cumpre desde logo referenciar, o que, em nosso opinião, e com todo o respeito pelo que aí se encontra consignado, deveria o Tribunal ter acrescentado como factos ao Probatório, pelos motivos que também se indicam.
Assim sendo, consideramos como factos relevantes, a acrescer ao probatório, os seguintes:
a). “Em 2016 os excessos de tesouraria da A..., Unipessoal Lda, aqui Requerente, passaram a ser transferidos para numa conta bancária em França, titulada pela “B...”, sociedade que detém a totalidade do capital social da Requerente;”
Facto não contestado pelas partes e que está na origem da existência do crédito (Vd. artº. 19º. do RI). Sem que tal seja dado como provado, não há facto tributário. Não basta dar como provada a celebração do contrato.
b). “Na liquidação do imposto do selo a Requerente aplicou a taxa de 0,04%, que incidiu sobre o montante do crédito utilizado;”
Facto admitido pela própria Requerente e que permite ao Tribunal conhecer o percurso seguido pala Requerente na liquidação do Imposto (Vd. artº. 22º e 23º. do RI).
c). “Na liquidação a Requerente aplicou o artº. 23º. do CIS e o imposto foi calculado através da multiplicação da taxa aplicável aos excessos de tesouraria existentes, multiplicado por cada mês de utilização do mesmo;”
Facto admitido pela própria Requerente e que permite ao Tribunal conhecer o percurso seguido pala Requerente na liquidação do Imposto (Vd. artº. 24º. do RI)
d). “A Requerente concede crédito à “B...”;”
Facto admitido pelas Partes e que permite ao Tribunal apreciar da legalidade da aplicação das normas fiscais em causa (Vd. artº. 20º. do RI).
e). ““B...” utiliza o crédito concedido pela Requerente;”
Facto admitido pelas Partes e que permite ao Tribunal apreciar da legalidade da aplicação das normas fiscais em causa (Vd. artº. 20º. do RI).
f). “O artigo 6º. do Contrato celebrado entre a casa mãe e a Requerente diz o seguinte quanto à “DURAÇÃO DO ACORDO”:
“Este Acordo é celebrado por um período indeterminado com início a 1 de janeiro de 2008;”
Importa salientar esta cláusula do contrato, porquanto é a mesma que permite apurar o prazo de duração do contrato/concessão de crédito e consequentemente apurar da correta aplicação das taxas previstas no artº. 17.1. da TGIS.
g). “O Acordo em causa, para além das necessidades de tesouraria, abrange os instrumentos de cobertura de risco, garantias, avales e fianças e em geral todas as transações financeiras relacionadas com a gestão de tesouraria.”
Importa salientar esta cláusula do contrato, porquanto dela resulta o facto de que as verbas utilizadas não se destinavam apenas às necessidades de tesouraria, elemento que se torna fundamental para interpretação e aplicação das normas de isenção previstas no Código do Imposto do Selo (V. artº. 7º.), como pretende a Requerente (Vd. Artºs 77ª a 88º. do RI).
h). “A Requerente pagou, no dia 3 de janeiro de 2018, o imposto e os respetivos juros compensatórios, tudo no total de € 462.109,49;”
Facto relevante, para que o Tribunal possa apreciar o pedido de fixação de juros indemnizatórios.
Consideramos, igualmente, e com todo o respeito, que o presente Tribunal deveria ter dado como não provados os seguintes factos:
a). “A Requerente não provou que o valor do crédito por si concedido nos anos de 2016 e 2017 foi utilizado fora de Portugal;”
Em determinada altura do processo, coloca-se a questão de saber se também releva para efeitos de apreciação do facto gerador de imposto, entre a concessão e a utilização do crédito, se esses fundos (resultantes do excesso de liquidez) eram ou não utilizado em Portugal e torna-se indiscutível que a prova de que o crédito em questão foi utilizado fora de Portugal não está feita.
b). “A Requerente não logrou demonstrar que o valor do crédito por si concedido nos anos de 2016 e 2017 foi utilizado para colmatar carências de tesouraria da “B...””;
Porque as verbas contratadas não se destinavam apenas a colmatar necessidades de tesouraria, mas muitos outros aspetos (os instrumentos de cobertura de risco, garantias, avales e fianças e em geral todas as transações financeiras relacionadas com a gestão de tesouraria), a aplicação da isenção de imposto do selo carece da prova de que as verbas utilizadas não se destinavam apenas às necessidades de tesouraria, elemento que se torna fundamental para interpretação e aplicação das normas de isenção previstas no Código do Imposto do Selo (Vd. artº. 7º.), como pretende a Requerente (Vd. Artºs 77ª a 88º. do RI).
c). “A Requerente não provou que o valor do crédito por si concedido nos anos de 2016 e 2017 foi utilizado por prazo inferior a um ano;”
A aplicação da isenção de imposto do selo carece da prova de que as verbas utilizadas se destinavam a suprir carências de tesouraria, mas também que a sua utilização teve uma duração inferior a um ano, elemento que se torna fundamental para interpretação e aplicação das normas de isenção previstas no Código do Imposto do Selo (Vd. artº. 7º.), como pretende a Requerente (Vd. Artºs 77ª a 88º. do RI).
Revisto o probatório, importa desde logo salientar, relativamente ao fundo da questão que a Requerente refere, como há muito sufragado na Doutrina e na Jurisprudência que o imposto do selo incide sobre a efetiva utilização do crédito e não sobre o contrato. Questão esta que a presente Decisão também desenvolve.
Mas nisso, as partes estão de acordo e já não é necessário hoje discutir se a obrigação de imposto nasce com a celebração do contrato ou com a utilização do crédito, não havendo dúvidas nem na Doutrina, nem na Jurisprudência.
Contudo, a Requerente conclui que, para estes efeitos, o facto tributário é a utilização do crédito, enquanto que a AT entende que é a concessão de crédito.
Mas, importa ter em atenção que não se está aqui apenas a discutir se é devido ou não imposto sobre esta operação em concreto.
Mas se é ou não devido imposto pelo facto da concedente do crédito ser uma sociedade localizada em Portugal e a suposta utilizadora desses recursos ser uma sociedade localizada em França. Não tendo ficado provado que a casa mãe tenha aí utilizado os recursos financeiros assim obtidos.
Porque se estivessem em causa duas sociedades portuguesas estas dúvidas não se colocavam, mesmo até no caso do crédito vir a ser utilizado lá fora.
Concluindo, a Requerente entende que o facto tributário é a utilização do crédito não existindo outro e quem o utilizou foi a empresa francesa e consequentemente não há imposto em Portugal.
E o presente Acórdão acompanha a Requerente nessa manifestação.
Quanto à territorialidade, a Requerente e o Tribunal entendem que a mesma é aferida em função da localização de quem utiliza o crédito.
Ou seja, todas as sociedades portuguesas passariam a constituir uma sociedade no estrangeiro, as portuguesas seriam as suas financiadoras e nunca haveria imposto.
Mas, se a empresa concedente do crédito estiver sediada no estrangeiro e a utilizadora estiver localizada em Portugal, há imposto (Artº. 4º. nº. 2, alínea b) do CIS)
Só neste caso há imposto e não no caso contrário, defende a Requerente.
E conclui, com ajuda de uma Decisão do CAAD (Procº. 61/2019-T – José Poças Falcão, Adelaide Moura e José Nunes Barata), que:
“…encontram-se excluídas do âmbito territorial do Imposto do Selo as operações de crédito em que o concedente tem residência, para efeitos fiscais, em Portugal e o crédito é utilizado por uma entidade, não residente, para efeitos fiscais, em Portugal.” (Vd. artº. 69º. do RI).
Recorde-se que nesta mesma Decisão do CAAD se conclui que “…há lugar objetivamente a tributação em sede de imposto do selo.” (vd. pág. 22).
Mas vem resolver a questão pelo lado da territorialidade, concluindo pela exclusão desta operação do âmbito territorial de incidência do imposto, concluindo, sem mais, deste modo:
“… a entidade financiadora (mutuante) é a Requerente e a entidade financiada é a entidade com sede em França e gestora dos excedentes de tesouraria das demais empresas do Grupo A… , a B…que, sendo estrangeira, não está obrigada a IS à luz do direito português.” (Vd. pág 23).
Ora excluir sem mais os estrangeiros, evitando desse modo o pagamento de impostos, apenas porque são estrangeiros, sem mais fundamentos, parece uma atitude em si mesma altamente discriminatória, mas para as empresas portuguesas…
Se assim fosse, dizemos nós, colossais receitas de imposto do selo teriam os Cofres do Estado perdido ao longo de décadas de vigência deste secular imposto!!!!
Por fim, conclui a Requerente: “…não existe a utilização do crédito em Portugal, que determine a constituição do facto tributário, conforme impõe o Código do Imposto do Selo”
Mesmo que assim fosse, com o que não concordamos, não há neste processo a mínima prova do local (Portugal, França ou nos EUA) de utilização do dinheiro, ainda para mais dada a sua natureza fungível….
Importa referir que a Requerente, apesar do exposto, acha melhor defender que as operações em causa estão isentas de imposto.
Mas, para isso, tem que admitir que estão sujeitas…..
Mas vejamos, agora, qual a posição da AT quanto à incidência do imposto e aplicação das regras de territorialidade.
Na sua Resposta a Requerida entende que, contrariamente à posição da Requerente, encontram-se preenchidas as normas de incidência subjetiva e objetiva da aplicação do imposto do selo.
A Requerida defende que as “concessões de crédito” em causa foram realizadas em Portugal, apesar da destinatária residir no estrangeiro, pelo que competia à Requerente enquanto tal (concedente do crédito) e sujeito passivo do imposto, liquidar, cobrar e entregar nos Cofres do Estado o imposto que deveria ter repercutido à sua casa mãe.
Defende-se aqui que o facto tributário relevante para efeitos da incidência do imposto não é a utilização do crédito, mas antes a sua concessão.
Entendemos nós que não se pode deixar a determinação de normas de incidência de impostos ficarem dependentes do local de utilização dos recursos financeiros que estiverem em causa.
A certeza e segurança jurídicas impõem que as normas de incidência, quer objetivas, quer subjetivas, não utilizem elementos de incerteza e ainda para mais face à livre circulação dos capitais e à fungibilidade do dinheiro…
Entre outros argumentos utilizados pela Requerida em defesa da sua posição, podemos referir o que está consagrado nos artigos 46º. e 47º. da sua Resposta.
No primeiro, dá conta de que a prorrogação do prazo do contrato é, só por si, geradora de novo imposto, independentemente da utilização ou não de mais crédito.
Se no caso dos autos o imposto do selo em causa fosse este (o da prorrogação do contrato), a Requerente também defenderia que não existindo utilização, não haveria imposto ???
Pensamos que não.
Se fosse uma concessão de crédito, sem conta corrente, por exemplo um empréstimo a 4 anos entre as mesmas empresas, a sua prorrogação sempre seria tributada em Portugal e consequentemente os argumentos da Requerente perdem força.
No artº. 47º. da sua Resposta a AT chama a atenção, com pertinência, para o facto de, em situação inversa, sendo a casa mãe a colocar excesso de tesouraria na filha, o legislador ter visto a necessidade de introduzir uma cláusula de extensão da territorialidade (artº. 4º., nº. 2, alínea b)), que seria redundante se o facto gerador fosse a utilização do crédito.
De salientar a posição defendida no Acórdão do STA, de 28.11.2018 (Procº. nº. 06/11.4BESNT 0436/16), que se debruça sobre uma situação igual à dos presentes autos e conclui pela obrigatoriedade de pagamento de imposto pela sociedade portuguesa que concede crédito e a uma empresa Sueca.
No mesmo sentido, veja-se, a decisão do CAAD tirada no Procº. nº. 452/2018-T, em especial págs. 37 e 38, e a sua anuência à jurisprudência do STA tirada no Acórdão de 2018 supra referenciado.
Se nos abstrairmos do facto tributário, o elemento de conexão relevante para aferir da incidência territorial é o local da concessão do crédito (Procº. nº. 279/2020-T – Carlos Cadilha, Jónatas Machado e Rui Ferreira).
A Requerida defende que não basta que se diga que o utilizador reside fora do território nacional, porque mesmo que se entendesse que o facto tributário é a utilização do crédito, nada se prova no processo que o excesso de tesouraria da filha, que foi transferido para a mãe, foi utilizado fora de Portugal.
E o legislador não iria exigir essa prova diabólica para só depois decidir da incidência do imposto e do respetivo elemento de conexão territorial.
Nada impediria a casa mãe de utilizar tais fundos para investir em Portugal.
E, pelo raciocínio da Requerente, desse modo já haveria imposto em Portugal.
Contudo, importa ainda analisar o que consta do Procº. nº. 279/2020-T que, em nosso entender, coloca verdadeiramente “o dedo na ferida” ao defender que:
“… o que está em causa, no pleito diante deste tribunal, consiste em saber se a operação de crédito em causa ocorreu, ou não, em território nacional….”
No caso de resposta negativa está excluída a incidência do imposto.
No caso de resposta positiva, será aplicável a Verba 17 da TGIS, havendo lugar à liquidação de imposto, salvo ocorrência de alguma isenção.
É a este tema das isenções que agora voltamos, embora o presente acórdão sobre elas não se tenha debruçado, já que respondeu desde logo negativamente à questão acima formulada (a operação ocorreu fora do território nacional).
Como já referimos, tal pressupõe a aplicação das normas de incidência de acordo com a posição defendida pela Requerida.
A Requerente defende que da sua leitura e interpretação do disposto nas alíneas g) e h) do nº. 1 e nº. 2 do artigo 7º. do CIS resulta apenas a aplicação de Imposto do Selo, “…às atividades de financiamento em que figure como mutuário uma entidade residente em território português (que não é o caso)” (Vd. artº. 79º. do RI), e que o contrário consubstanciaria uma violação do Direito Europeu, no que à liberdade de circulação de capitais diz respeito. (em contrário Vd jurisprudência comunitária citada no Procº. nº. 279/2020-T, pontos 41 e 55, pág 19).
Por seu turno a Requerida vem afirmar que a norma contida no “… nº. 2 do artº. 7º. do CIS só vem reforçar a sujeição a imposto do selo das operações financeiras análogas às aqui em apreço.” (Vd. Artº. 68º. da Resposta).
Tendo a concordar com a posição aqui defendida pela AT (artº.s 64º. a 76º. da Resposta) e sufragada jurisprudencialmente, que a aplicação da posição defendida pela Requerente é que geraria uma discriminação entre as sociedades residentes e não residentes, violadora do princípio da igualdade de tratamento, capacidade contributiva, provocando uma distorção de concorrência.
Concluindo a Requerida com toda a justiça:
O CIS não estabelece qualquer diferença de tratamento, equiparando-os, “…garantindo as mesmas condições fiscais entre fluxos financeiros realizados entre sociedades residentes, entre sociedades não residentes e residentes e entre estas e sociedades não residentes…”(Vd. Artº. 74º. da Resposta).
E termina:
“Nesta medida, para efeitos de sujeição, não se descrimina nenhuma entidade, uma vez que estas normas relativas ao imposto do selo são aplicadas indistintamente a todas as operações financeiras legalmente previstas, sem discriminação em função da nacionalidade, território ou tipo societário das entidades nelas envolvidas.” (Vd. Artº. 75º. da Resposta).
Ver também quanto a esta matéria o que muito bem se decidiu no Procº. nº. 279/2020-T, (pontos 39 e 40, pág 19).
E pensamos que conclui bem a Requerida, também quanto a esta matéria.
De referir, quanto à não aplicação da isenção prevista na alínea h), do nº. 1 do artº. 7º. do CIS a estas situação, a bem fundamentada Decisão tirada no Procº. nº. 452/2018-T, já acima referenciada.
Finalmente, gostaríamos de referir que a prevalecer a tese da Requerente, como se faz no presente Acórdão, por exemplo, o crédito a emigrantes nunca seria tributado em Portugal, o que de facto não acontece. Tal crédito é e sempre foi tributado em Portugal. E essa seria talvez uma situação mais justa para que o não fosse.
Apenas mais uma nota para referir que, em primeira linha, a Decisão do CAAD tirada no Procº. nº. 277/2020-T (Jorge Lopes de Sousa, Augusto Vieira e Carla Almeida Cruz), que sustenta a posição maioritária deste Coletivo, no respeito pela melhor jurisprudência do STA, não tem dúvidas em defender que o facto tributário aqui em causa é a concessão de crédito com todas as consequências daí decorrentes. (Vd. ponto 3.1.2, págs. 22 a 27).
Por isso, somos de opinião que também neste Acórdão, tudo se deveria decidir em termos de aplicação ou não das isenções prevista no artº. 7º. do CIS.
Mas ficaria também afastada a aplicação da isenção prevista na alínea i), do nº. 1 do artº. 7º., por não terem a característica de suprimentos os excedentes de tesouraria que estão na base da operação de concessão de crédito.
Resta a alínea g) desse mesmo nº. 1 do artº. 7º. do CIS.
Esta isenção abrange “…as operações financeiras, incluindo os respetivos juros, por prazo não superior a um ano, desde que exclusivamente destinadas à cobertura de carências de tesouraria … efetuadas em benefício de sociedade com a qual se encontre em relação de domínio ou de grupo”
Ora, aquele Tribunal (Procº. nº. 277/2020-T), com todo o respeito, sem explicitar como, conclui que estes requisitos se verificam no caso em apreço, quando nem sequer constam do seu probatório. O crédito foi concedido por vários anos e não apenas um e não consta qualquer prova sobre as carências de tesouraria da utilizadora do crédito. Apenas se sabe e dá como provado que há um excesso de tesouraria, mas, naturalmente, da parte de quem concede o crédito e por isso é que há lugar a imposto. Mas não é isso que a lei impõe. A um excesso deve corresponder uma carência, mas é essa carência que é determinante para a aplicação da isenção.
Mas o Acórdão que vimos acompanhando acaba também por defender que esta isenção também não se aplica, por força do disposto no nº. 2 do artº. 7º. do CIS, que exige que nenhum dos intervenientes tenha sede ou direção efetiva fora do território nacional (a contrario), o que não se verifica naquela caso - utilizadora do crédito tem sede na Suécia.
Do mesmo modo, também não têm aplicação as situações em que seria possível derrogar a exceção, pois o direito à isenção seria “repristinado” apenas quando “…o credor tenha sede ou direção efetiva noutro Estado membro da União Europeia…”, o que não e o caso, porque o credor neste processo, como no nosso, tem sede e direção efetiva em Portugal.
Ou seja, como já vimos:
Esta isenção abrange “…as operações financeiras, incluindo os respetivos juros, por prazo não superior a um ano, desde que exclusivamente destinadas à cobertura de carências de tesouraria … efetuadas em benefício de sociedade com a qual se encontre em relação de domínio ou de grupo”
Apenas podemos admitir, naquele caso, como neste, que está provada a relação de domínio ou de grupo, e ainda assim invertida porque é a filha a financiar a casa mãe.
Mas dos pressupostos de atribuição da isenção, nada mais se encontra provado.
Nem que o crédito foi prestado por um período inferior a um ano.
Nem que o mesmo foi concedido face às carências de tesouraria da utilizadora do crédito – a casa mãe.
Apenas se sabe e dá como provado que há um excesso de tesouraria, mas naturalmente da parte de quem concede o crédito e por isso é que há lugar a imposto.
Uma simples leitura do contrato de gestão de tesouraria junto aos autos, permite perceber com rigor que a Requerente não tem razão.
Como já se deixou consagrado em muita da jurisprudência analisada o contrato teria que dizer exclusivamente respeito às carências de tesouraria.
Ora o contrato em causa, para além dessas necessidades de tesouraria, abrange os instrumentos de cobertura de risco, garantias, avales e fianças e em geral todas as transações financeiras relacionadas com a gestão de tesouraria.
Por outro lado, a isenção que a nossa norma do CIS concede impõe que as operações financeiras tenha um prazo não superior a um ano.
Ora, o artigo 6º. do Contrato celebrado entre a casa mãe e a Requerente diz o seguinte quanto à “DURAÇÃO DO ACORDO”, e transcrevemos:
“Este Acordo é celebrado por um período indeterminado com início a 1 de janeiro de 2008” e as operações que estão em causa no presente processo dizem respeito a 22 meses (janeiro de 2016 a outubro de 2018).
Relativamente às isenções, poderíamos concluir em jeito de sumário, do seguinte modo:
1. As isenções previstas nas alíneas g) e h) do nº. 1 do artº. 7º. do CIS não se aplicam porque um dos intervenientes não tem sede em território português, e a exceção é apenas admitida quando seja o credor que tenha sede num Estado Membro da União Europeia, sendo quem assume essa posição neste processo é o devedor.
2. Mesmo que assim não se entendesse, a isenção prevista na alínea g) do nº. 1 do artº. 7º. não é aplicável ao caso concreto porquanto a mesma apenas abrange “…as operações financeiras, incluindo os respetivos juros, por prazo não superior a um ano, desde que exclusivamente destinadas à cobertura de carências de tesouraria … efetuadas em benefício de sociedade com a qual se encontre em relação de domínio ou de grupo”, e no caso do presente processo o único requisito que se pode dar por verificado é o da existência de uma relação de domínio ou de grupo e nada mais, ou seja o prazo do crédito é manifestamente superior a um ano e teve outros destinos para além de uma não provada carência de tesouraria.
3. A isenção prevista para a alínea h) só funciona em sentido inverso, ou seja financiamento da casa mãe à sua afiliada, o que não se verifica no caso concreto.
Assim sendo, na nossa opinião e com todo o respeito e que é muito por posições contrárias, o pedido formulado no contexto deste processo não pode ser considerado procedente, devendo ser mantida a autoliquidação impugnada.
Naturalmente que os pontos 3 e 4 do sumário, não poderiam ter a redação que lhes foi dada, devendo assumir-se, por exemplo, o seguinte:
4. A sujeição a imposto de selo do crédito utilizado, no atual CIS, encontra-se condicionada pela conexão que a situação apresente com o território português, sendo esta conexão determinada pelo local onde se verifica a concessão do crédito, por força da regra da territorialidade, sendo que, quando esteja em causa concessão de crédito no quadro de uma relação de Cash Pooling, a tributação não é afastada pelo local de utilização de fundos, consumada ou não em território nacional, podendo a AT exigir o imposto devido, incidente sobre o crédito concedido em Portugal, diretamente ao titular do interesse económico, ou seja, ao beneficiário de tal crédito, independentemente da sua localização geográfica.
5. Verificando-se na concessão de crédito os pressupostos da incidência a imposto do selo por força da aplicação da regra da territorialidade, em virtude da concessão do crédito ocorrer em território nacional, ainda se coloca a questão da aplicabilidade das isenções previstas nas alíneas g) e h) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS.
Lisboa, 17 de janeiro de 2022
Jorge Carita