Sumário:
I- “Encargos com a valorização dos bens” a que se refere o artigo 51.º, n.º 1, alínea), do CIRS, para efeito da determinação da mais-valia imobiliária, abrange os encargos incorridos que se encontrem associados à valorização económica do imóvel e não tenham uma estrita finalidade de preservação dos bens.
II – As obras que visam suprir as deficiências de habitabilidade do edifício, por efeito do seu adiantado estado de degradação, são obras de valorização dos bens, para efeito do referido artigo 51.º, n.º 1, alínea), CIRS;
III – A exigência constante do artigo 13.º, n.º 1, alínea d), do CIMI para a apresentação pelo sujeito passivo de declaração destinada à inscrição ou actualização da matriz quando se concluírem obras de “melhoramento” que possam determinar a variação do valor patrimonial tributário do prédio, não constitui critério para a qualificação das obras de valorização dos bens, para efeitos de mais-valias;
IV - A despesa com uma imobiliária constitui uma despesa inerente à alienação e encontra-se abrangida pelo artigo 51.º, n.º 1, alínea), CIRS, e tendo essa despesa ocorrido já na vigência do CIRS, não é limitada pela exclusão da tributação quanto à parte do imóvel adquirido ainda antes da entrada em vigor do Código a que se refere a norma transitória do artigo 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro.
Decisão Arbitral
1. Relatório
A…, NF …, com domicílio na Rua …, Braga e B…, NF … e esposa C…, NF…, residentes na Rua …, Braga, doravante referidos como «Requerentes», vieram, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”) apresentar pedido de pronúncia arbitral (PPA) tendo em vista a declaração de ilegalidade da “decisão de indeferimento da reclamação graciosa que tinha por objeto a demonstração de liquidação de IRS n.º 2020 …, a demonstração de liquidação de juros n.º 2020 … e a demonstração de acerto de contas n.º 2020 … do ano de 2018, notificadas à Requerente A…, e da demonstração de liquidação de IRS n.º 2020 … e a demonstração de acerto de contas n.º 2020 … do ano de 2018, notificadas aos Requerentes B… e C…”.
Terminam pedindo a anulação parcial dos atos de liquidação, referindo que “no caso da Requerente A…, devem ser aceites como dedutíveis, para efeitos do cálculo da mais-valia sujeita a imposto, a despesa com a imobiliária no valor de 42.057,04 € e os encargos por si suportados com a valorização do prédio no valor de 44.782,06 €” e “no caso dos Requerentes B… e esposa, devem ser aceites como dedutíveis os encargos de valorização suportados com o imóvel alienado no valor de 8.956,42 €”. E porque procederam ao pagamento das liquidações de que ora reclamam “requerem que lhes sejam pagos juros indemnizatórios à taxa legal a contar do pagamento, nos termos do art.º 43.º da Lei Geral Tributária”.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 05-01-2021.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo (TAC) os signatários desta decisão, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
As partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados das alíneas a) e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 21-05-2021.
A AT apresentou resposta em 28.06.2021 e juntou na mesma data o PA, não tendo suscitado excepções nem questões prévias, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.
No dia 19.10.2021 foi realizada a reunião de partes do artigo 18º do RJAT, com inquirição de uma testemunha arrolada pelos Requerentes D…, quanto aos factos alegados nos artigos 65º a 67º, 71º, 72º, 74º a 78º, 80º e 87º do PPA.
As partes apresentaram alegações escritas, em 02.11.2021 os Requerentes e em 03.11.2021 a Requerida, mantendo o que já haviam referido em sede de PPA e de Resposta.
A dissonância entre os Requerentes e a Requerida é essencialmente quanto à não aceitação da correcção feita pela AT, desconsiderando despesas de valorização suportadas com o imóvel que foi adquirido na proporção de 1/3 em 1976, defendendo (em contraposição da posição da AT) que “o valor das obras ... de 229.284,36 €, ... permite depreender que não se tratou de meras despesas de conservação ou manutenção do imóvel, e que a intervenção foi mais profunda”, concluindo-se que “mais de 93,75 % do valor das obras dizem respeito a despesas de valorização, o que determina que, pelo menos, 214.954,09 € (229.284,36 € X 93,75%) das despesas a que respeita o referido contrato sejam despesas de valorização com o imóvel em questão, sendo a parte suportada pela Requerente A… neste valor ... de 44.782,06 € e a parte suportada pelo Requerente B… neste valor ... de 8.956,41 €, valores esses suportados nos 12 anos anteriores à venda do imóvel e, assim, dedutíveis”.
Outra divergência entre os Requerentes e a AT tem a ver com uma despesa realizada com uma empresa imobiliária, uma vez que o entendimento da Requerida é de que “... 50% das despesas no valor de 42.057,04 € (parte da Requerente A… na fatura da imobiliária) será inerente à parte não sujeita e 12,5% é que será de aceitar e de declarar no anexo G que corresponde um valor de 5.257,13 €.”
Acrescenta que o legislador “caso os encargos tivessem que ser repartidos pela parte sujeita e não sujeita a imposto, o legislador fiscal teria feito essa menção neste artigo”, pelo que “... os encargos com a valorização dos bens e com a mediação imobiliária, suportados pela Requerente A…, devem ser considerados integralmente no cálculo da mais valia sujeita a imposto, não devendo ser imputado qualquer valor de encargos ao valor da mais-valia não tributável”.
E conclui: “... estando documentalmente comprovados os encargos com a valorização do imóvel alienado no valor de 44.782,06 €, e os encargos com a mediadora no valor de 42.057,04 €, imputáveis à Requerente A…, devem os mesmos ser acrescidos ao valor de aquisição do imóvel, para efeitos do cálculo da parte da mais-valia sujeita a tributação, pelo que
(1) devem ser aceites como despesas na esfera da Requerente A…, no cálculo da mais valia tributável, o valor de 86.839,10 €, valor esse que corresponde à quota parte da Requerente nas despesas de remodelação do imóvel (44.782,06 €), e nas despesas com a imobiliária (42.057,04 €) e
(2) devem ser aceites, na esfera dos Requerentes B… e esposa, o valor de 17.367,82€, que corresponde à sua quota parte nas despesas de remodelação/valorização do imóvel (8.956,41€) e nas despesas com a imobiliária (8.411,41 €)”
A Requerida entende que a liquidação é legal.
Considera que as obras realizadas no imóvel alienado pelos Requerentes “consubstanciaram numa imposição da CML e se destinaram à correcção de más condições de segurança e salubridade tendo em vista a conservação do imóvel, razão pela qual facilmente se conclui que tais obras tinham por escopo a mera preservação do bem/imóvel e não o seu melhoramento. Neste conspecto, é pertinente mencionar, tal como já tinha sido reiterado em sede de procedimento administrativo, que pese embora, o imóvel em causa, tenha gerado rendimentos à ora Requerente A… pelo menos desde o ano de 2003, apenas até ao ano de 2005 foram declarados gastos de manutenção pela impetrante, gastos esses que podem no entanto, não estar relacionados com imóvel em análise, uma vez que nesses mesmos anos foram também declarados rendimentos prediais provenientes de outro imóvel, e tais gastos não se encontram discriminados, razão pela qual não se pode presumir que as despesas se relacionassem com o imóvel que aqui em causa. Todavia, e em benefício da Requerente, podemos afirmar com segurança que pelo menos desde essa data, 2005, não existem registos de despesas efectuadas no imóvel”.
E acrescenta “... o critério utilizado pela AT para a qualificação de obras como sendo de “valorização” encontra-se através das operações de avaliação dos imóveis, efectuadas nos termos dos artigos 40.º e seguintes do CIMI. Para que se actualizasse a avaliação do prédio na matriz, teriam os Requerentes que ter declarado as obras realizadas, no prazo de 60 dias contados a partir da conclusão das obras de melhoramento ou outras alterações que possam determinar variação patrimonial tributário do prédio, tal como estatuído na al. d) do n.º 1 do art.º 13.º do CIMI. Todavia, verificou a Direcção de Finanças de … a que até à venda do imóvel objecto da presente acção, não foi requerida a avaliação para a incorporação de quaisquer benfeitorias ou obras de valorização. Deste modo, temos de concluir, sem conceder e por razões de mero exercício de ordem intelectual, que mesmo que não se tivesse confirmado que as obras se destinaram apenas a conservar/preservar o imóvel, as despesas em causa não podiam ser consideradas como de valorização para efeitos fiscais, pois não foi requerida a inscrição das alterações na matriz”.
Quanto às despesas com a imobiliária considera que “uma vez que parte da mais valia foi excluída de tributação (dos 62,5% que lhe couberam da meação e herança, a requerente só foi tributada pela mais-valia correspondente a 12,5%), apenas foi aceite como despesa, a comissão na quota correspondente de 12,5%.”, por força da “exclusão tributária regulamentada no artigo 5º do Decreto-Lei nº 442-A/88 de 30.11”.
Por outro lado, considera ainda a AT, quanto às despesas tituladas pelas facturas em dissídio com a mera designação “... “Diversos, Conforme contrato de empreitada, 1.ª prestação de 20%”, “Diversos, Conforme Auto de medição n.º 1 em anexo”, “Diversos, Conforme Auto de medição n.º 2 em Anexo, Acerto Correcção do valor do Auto nº 1”, Diversos Relativo aos trabalhos executados entre os meses de Janeiro e Fevereiro”, “Diversos, Referente a trabalhos executados, de finalização de empreitada”, não preenchem ... os requisitos contemplados no art.º 35.º do CIVA, mormente, a alínea b), visto que não indicam de forma suficientemente detalhada a natureza dos serviços em causa, tendo como principal consequência, no que no caso nos interessa, impossibilitar a identificação dos serviços concretamente prestados”.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º, e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT.
As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
Consideram-se provados os seguintes factos, com relevo para a decisão:
A) A Requerente A…, viúva desde 17-02-1998, foi casada no regime da comunhão geral de bens com E… e adquiriu juntamente com o seu falecido marido, em 29-10-1976, por escritura de partilha, 1/3 do prédio urbano sito na Rua …, números .. a .., freguesia de Alcântara, concelho de Lisboa, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º … – conforme artigos 15º e 16º do PPA e Documento nº 3 em anexo ao PPA;
B) A aquisição em 1976 corresponde, na esfera patrimonial da Requerente A…, a 1/6 do imóvel, em comum com os restantes comproprietários e sem determinação de parte ou direito, e posteriormente, com o óbito do seu marido em 17-02-1998, adquiriu mais 1/24 do imóvel, juntamente com os seus três filhos, que adquiriram, cada um deles, também 1/24 do prédio, em comum e sem determinação de parte ou direito, sendo um dos seus três filhos o Requerente B…, que adquiriu, então, em 17-02-1998, pela morte do seu pai, 1/24 do imóvel acima identificado, em comum e sem determinação de parte ou direito. Em 30-04-2018, os comproprietários do imóvel procederam à sua alienação, pelo valor de 3.282.500€ - conforme artigos 18º a 21º do PPA e Documento 4 em anexo ao PPA;
C) Em 30-04-2018, data da venda da parte do imóvel atrás referido, a Requerente A… era proprietária de 1/6, adquirido em 1976, mais 1/24, adquirido em 1998 e o seu filho, o Requerente B…, era proprietário de 1/24 do imóvel – conforme artigos 22º e 23º do PPA;
Quanto à Requerente A…
D) Em data não apurada a Requerente A… apresentou a sua declaração de rendimentos modelo 3 de 2018, na qual declarou no anexo G a parte da mais-valia tributável obtida com a venda do imóvel (quanto a 1/6 do imóvel adquirido em 1976), e no anexo G1 a parte da mais-valia isenta de tributação (quanto 1/24 do imóvel adquirido em 1998) – conforme artigos 24º a 26º do PPA e Documento nº 5 em anexo ao PPA;
E) Foi notificada em 12-09-2019, pelo Serviço de Finanças de …, da existência da seguinte incorreção na modelo 3 de 2018: “necessidade de comprovação dos valores das despesas e encargos, valor de alienação e data da aquisição do imóvel alienado” indicando a AT a intenção em proceder à correção do valor com despesas declarado de 89.824,62 €, no campo 4001 do quadro 4 do anexo G; em 04.10.2019 apresentou à AT a escritura de venda do imóvel, a certidão de óbito do seu falecido marido e a fatura da despesa com a mediação imobiliária – conforme artigos 6º e 7º da Resposta da AT, artigos 27º e 28º do PPA e Documentos 6 e 7 em anexo ao PPA;
F) Em 30-09-2019, foi novamente notificada da existência de incorreção, com o mesmo texto: “necessidade de comprovação dos valores das despesas e encargos, valor de alienação e data da aquisição do imóvel alienado”, e com a mesma intenção de correção do valor das despesas, tendo em 18-10-2019, respondido à notificação, juntando a escritura de partilha do imóvel, datada de 1976, esclarecendo a quota parte do imóvel que tinha adquirido com essa escritura, referindo existir “um lapso” no valor declarado no anexo G da modelo 3 relativamente ao valor de aquisição do imóvel e que iria proceder à entrega da declaração de substituição onde corrigiria esse valor e entregaria o anexo H em falta. Quanto às despesas e encargos declarados no valor de 89.824,62€, referiu não ter conseguido juntar todos os documentos comprovativos, motivo pelo qual solicitou um prazo adicional de 10 dias para o efeito – conforme artigos 30º e 31º do PPA, Documentos nºs 8 e 9 em anexo ao PPA e artigo 8º da Resposta da AT;
G) Em 08-11-2019 a Requerente foi notificada pela AT do seguinte: “após verificação dos elementos enviados, deve no prazo infra, justificar ou entregar declaração de substituição em conformidade com a informação e despacho que se anexa”, com a seguinte fundamentação “o documento de despesa que anexa com ... valor de 67.291.25 € para a herança a que corresponde a quota parte do SP “62,5%” um montante de 42.057,04 €. Porém, na alínea a) do n.º 1 do artigo 51.º do CIRS refere que as despesas comprovadas, e esta está, conforme Informação Vinculativa 12/2008 com despachos concordantes do Substituto Legal do Senhor Diretor-geral dos Impostos, de 2008-07-14 e 2008-08-12, acrescem ao valor de aquisição, pelo que 50% será inerente à parte não sujeita e 12,50% é que será de aceitar e de declarar no Anexo G que corresponde um valor de 5.257,13€”, indicando a Requerida a intenção de corrigir os seguintes valores declarados pela Requerente na modelo 3 de 2018: (1) valor de aquisição de 295.677,38 € declarado no campo 4001A do quadro 4 do anexo G, que deveria ser, segundo a AT, de 1.207,23 €; (2) valor de despesas de 89.824,62 € declarado no campo 4001D do quadro 4 do anexo G, que deveria ser de 5.257,13 €; (3) valor de realização de 341.927,09 € declarado no quadro 4001R do quadro 4 do anexo G, que deveria ser de 136.770,84 €; (4) inscrição do valor de 547.084,40 € no campo 501 do quadro 5 do anexo G1 – conforme artigos 32º a 34º do PPA, Documento nº 10 em anexo ao PPA e artigo 9º da Resposta da AT;
H) Uma vez que a Requerente concordou com a correção do valor de realização para 136.770,84€ e com a correção do valor de aquisição do imóvel em 1998 de 1.207,23 €, já que este corresponde a 1/24 do valor patrimonial à data, que era de 28.973,57 €, mas não concordou com a correção ao valor das despesas declaradas no campo 4001D do quadro 4 do anexo D da modelo 3 de 2018, enviou à AT, um requerimento em 25.11.2019, em resposta à notificação recebida em 08-11-2019, a juntar as notificações da Câmara de Lisboa que impôs as obras; o contrato de empreitada e as faturas das obras efetuadas no imóvel, prestando esclarecimentos complementares. Em 03-12-2019 apresentou a declaração que havia protestado juntar – artigos 35º a 39º do PPA, Documentos 11 e 12 em anex0 ao PPA e artigo 11º da resposta da AT.
I) Em 06-12-2019, a Requerente foi novamente notificada da existência de incorreção na declaração, a qual refere que: “após verificação dos elementos enviados, deve no prazo infra, entregar declaração de substituição em conformidade com a informação e despacho que se anexa”, com a intenção da AT em corrigir o valor das despesas declaradas de 89.824,62 € para 5.257,13 €, no campo 4001 do quadro 4 do anexo G, com a seguinte fundamentação: a) Quanto aos valores de aquisição, de realização e respetivas datas o SP está de acordo com o já oportunamente notificado; b) Quanto à despesa da comissão por intermediação imobiliária apresentada no valor de 67.291,26€, a que corresponde a parte do SP de 62,5%; c) Quanto à despesa da fatura/recibo 1/2010, 4/2010, 5/2010, 1/2011 e 2/2011 na quantia de 45.856,86€, 40.034,61€, 74.802,39€, 40.000,00€ e 28.590,50€ respetivamente, que totalizam 229.284,36€ e não 229.824,36€ como referido no ponto 8 da petição apresentada , sendo que a herança possui 1/3, então a quota parte será de 76.428,12€, correspondendo ao SP 47.767,58€ que o SP pretende deduzir alegando despesa de valorização prevista no n.º 1 do art.º 51º do CIRS, o mesmo não pode ser aceite, dado que, conforme Doc. 1, o Doc. 2 e o Doc. 3 constata-se estar em presença de uma obras de conservação, logo, não passível de dedução, conforme Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte no Proc.º 00542/04.7BEPNF; d) Assim, só pode ser aceite o valor de 42.057,04 € como despesa conforme alínea b) desta informação e alínea g) da informação prestada em 2019-11-07; e e) Contudo, o SP não concorda com a proporcionalidade da sua imputação em face dos momentos aquisitivos, contudo, parece-me que não lhe assiste razão, pois a despesa está associada ao bem, logo, se parte do valor desse bem é a declarar no Anexo G1 e a restante parte no Anexo G, logo, a despesas deve acompanhar essa proporcionalidade, pelo que se deve manter a decisão anterior de declarar no Anexo G o valor de 5.257,13€” – conforme artigos 40 a 42º do PPA e artigo 12º da Resposta da AT;
J) A Requerente respondeu, em 26-12-2019, no exercício do direito de audição, referindo que as obras de valorização a que o imóvel foi sujeito foram impostas pela Câmara Municipal de Lisboa, tendo junto também o relatório de final de obra quanto a todos os trabalhos feitos no imóvel – conforme artigo 43º do PPA, Documento nº 13 em anexo ao PPA e artigo 13º da Resposta da AT;
K) Em 15-01-2020, a Requerente recebeu uma última notificação, referindo que “não foram comprovados os elementos declarados”, e que seria emitida a liquidação e imposto com a correção do valor das despesas de 89.824,62 € para 5.257,13 €.”, com a seguinte fundamentação: Quanto às despesas das faturas/recibos mencionadas na alínea c) da informação de 2019-1205 as mesmas não poderão ser aceites porquanto o imóvel durante vários anos não sofreu as inerentes obras de conservação de modo a manter o bem em condições de habitabilidade (não se verificam registos deste tipo de despesas nas declarações de IRS de 2004 a 21018); Que o imóvel foi objeto de avaliação em 2007-11-01 resultante da primeira transmissão na vigência do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis “CIMI”; Que a decisão arbitral no processo 300/2014-T vem de considerar como despesas os juros contraídos com empréstimos para a reconstrução de um imóvel que não foram aceites pela AT, o que no caso em apreço não se coloca; Se, se considerassem obras de melhoramento, então, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 13.º do CIMI o SP teria que nos 60 dias seguintes à da conclusão das obras, que ocorreram no ano de 2011, ter efetuado a atualização da matriz com a apresentação da correspondente Modelo 1, o que não aconteceu, pois, a única declaração apresentada é a referida em b). Assim, a despesa declarada no valor de 47.767,58€ não pode ser aceite como valorização do imóvel” – conforme artigos 44º e 45º do PPA, Documento nº 14 em anexo ao PPA e artigos 14º e 15º da Resposta da AT;
L) A Requerente foi posteriormente notificada da demonstração de liquidação de IRS n.º 2020 …, da demonstração de liquidação de juros n.º 2020 … e da demonstração de acerto de contas n.º 2020 … do ano de 2018 – conforme artigo 46º do PPA e Documentos 15 a 17 em anexo ao PPA;
Quanto ao Requerente B… e esposa
M) Em data não apurada o Requerente B…, apresentou a sua declaração de rendimentos modelo 3 de 2018, na qual declarou no anexo G a mais-valia tributável obtida com a venda da sua parte do imóvel, que corresponde a 1/24, que detinha em comum e sem determinação de parte ou direito com a sua mãe e as suas duas irmãs – conforme artigo 50º do PPA;
N) Foi notificado pela AT, em 24-01-2020, para corrigir a declaração de IRS do ano de 2018, uma vez que a mesma apresentava o seguinte erro: “entregou o anexo G declarando no quadro 4 na linha 4001 para o prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alcântara, concelho de Lisboa, sob o artigo … que o valor de aquisição foi de 9.093,80 EUR. No entanto, verifica-se que por óbito de E… ocorrido em 1998/02-17 foi transmitido 1/6 do prédio identificado para os respetivos herdeiros, a saber a viúva e 3 filhos, pelo que, na qualidade de descendente, lhe cabe 1/24 conforme disposto no n.º 1 do artigo 2139º do Código Civil. Na sequência do óbito foi instaurado o processo de imposto sucessório n.º … e relacionado o prédio agora alienado com o valor patrimonial à data de 29.973,58 EUR, correspondendo á sua quota parte o valor de 1.207,23 EUR (29.972,54:12), pelo que, nos termos do artigo 45º do Código do IRS será este o valor de aquisição”, conferindo prazo de 15 dias para efetuar a correção do anexo G da declaração de IRS do ano de 2018 alterando o valor de aquisição de 59.093,80 EUR para 1.207,23 EUR, na linha 4001 – conforme artigos 51º e 52º do PPA, Documento nº 18 anexo ao PPA e artigos 17º, 18º da resposta da AT;
O) Em 14-02-2020 o Requerente exerceu o respectivo direito de audição, nada aduzindo em relação à correcção a realizar quanto ao valor de aquisição do imóvel em causa, esgrimindo, no entanto, argumentos relativamente à aceitação das despesas de valorização com o imóvel, juntando para tal vários documentos, v.g. notificação da CML, 5 facturas e recibos, contrato de empreitada, orçamento de obras e documento bancário de penhor de obrigações e esclarecendo a intervenção no imóvel – conforme artigo 20º da resposta da AT, artigo 56º do PPA e Documento nº 20 em anexo ao PPA;
P) No dia 21-02-2020, o Requerente recebeu outra notificação da Requerida que refere “não foram comprovados os elementos declarados pelo que se converte em definitivo a proposta de correções”, com a seguinte fundamentação: “assim, da comissão a imobiliária metade, correspondente à meação, será de imputar à mãe, enquanto o restante 33.645,62EUR será dividido pelos 4 herdeiros, ou seja, corresponde à sua quota parte 8.411,41EUR (33.645,62EUR:4), tal como declarado inicialmente pela requerente. Quanto às despesas, pontos 5 e 6, que a requerente alega de serem de valorização conforme previsto no n.º 1 do artigo 51º do Código do IRS, as mesmas não podem ser aceites pois verifica-se que estamos em presença de uma obra de conservação e não de valorização, logo, não passível de dedução, conforme Acórdão do tribunal Central Administrativo do Norte no processo n.º 00543/07.7BEPN. Em conclusão será de converter em definitiva a alteração do valor de aquisição de 59.093,80EUR para 1.207,23EUR e de manter o valor das despesas e encargos como declarado inicialmente, por corresponder à quota parte do valor dos encargos com a comissão de intermediação imobiliária”. Quanto às despesas com o imóvel, refere a notificação que “as mesmas não podem ser aceites pois verifica-se que estamos na presença de uma obra de conservação e não de valorização (…)” – conforme artigos 53º, 54º e 55º do PPA, documento nº 19 em anexo ao PPA e artigos 21º e 22º da resposta da AT;
Q) Posteriormente, foi o Requerente notificado da demonstração de liquidação de IRS n.º 2020 … e da demonstração de acerto de contas n.º 2020 … do ano de 2018, com valor a pagar de 71.051,80 € - conforme artigo 57º do PPA, Documentos 21 e 22 em anexo ao PPA;
R) Em 09.07.2020 os Requerentes apresentaram reclamação graciosa contra as referidas liquidações. O projecto de decisão de indeferimento foi-lhes notificado em 02.09.2020, tendo exercido o direito de audição em 23.09.2020 e a AT em 24.09.2020 proferiu o despacho final de indeferimento, com o seguinte fundamento:
“A AT entende que os gastos alegadamente efetuados com a valorização dos bens, são na verdade, despesas de conservação ou restauro.
Parece-nos que o entendimento da AT está correto, pelo que os reclamantes não terão razão.
Com efeito, conforme se refere no Acórdão STA de 21/3/2012 (proc. 0587/11), citado pelos reclamantes, “… não pode deixar de concluir-se, desde logo, que o encargo há-de estar ligado à valorização do bem alienado. Ou seja, não estão incluídos encargos que tenham por escopo a mera preservação do valor do bem, mas, tão-só, os que se destinam a aumentar esse valor”
O critério utilizado pela AT (administração tributária) para a qualificação das obras como sendo de “valorização” encontra-se através de operações de avaliação, nos termos do CIMI (Código do IMI), e mais concretamente nos tipos de áreas e coeficientes (artºs 40.º e seguintes do CIMI). Relevante nesta avaliação é que as alterações dos coeficientes devem ser declaradas na matriz, implicando a alteração do valor patrimonial (=valorização) – art.º 13.º, n.º 1, al d), do CIMI.
Da análise ao imóvel aqui em causa, alienado em 2018, verificou-se que não foi requerida a avaliação para a incorporação de quaisquer benfeitorias ou obras de valorização.
Assim, mesmo se não se tivesse confirmado que as obras se destinaram apenas à conservação e manutenção do imóvel, as despesas não seriam de valorização, para efeitos fiscais, por não ter sido requerida a inscrição das alterações na matriz do imóvel.
No entanto, parece-nos suficientemente demonstrado que as despesas devem ser consideradas como despesas de manutenção:
- o prédio tem gerado rendimentos à reclamante A… pelo menos desde 2003, mas apenas até 2005 foram declarados gastos de manutenção, que podem no entanto estar relacionados com outro imóvel (nesses anos foram declarados rendimentos prediais provenientes deste e doutro imóvel, e os gastos não estão discriminados entre os prédios, pelo que não se pode presumir que as despesas se relacionassem com o artigo …), pelo que, pelo menos desde essa data (2005), não há registo de despesas efetuadas no prédio;
- os reclamantes dizem na petição que “… as obras de valorização a que o imóvel foi sujeito foram impostas pela Câmara Municipal de Lisboa, …”. Ora, a notificação da Câmara Municipal para que se fizessem essas obras demonstra precisamente que se tratam de obras de conservação. As câmaras municipais só podem determinar a execução das obras necessárias à correção de más condições de segurança ou de salubridade ou das obras de conservação necessárias à melhoria do arranjo estético (art.º 89.º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação), não possuindo atribuições para impor aos proprietários que façam obras de valorização;
- Donde se conclui que as obras efetuadas pelos reclamantes se destinaram à correção de más condições de segurança ou salubridade ou à conservação – pelo que tinham por escopo “a mera preservação do valor do bem” e não “aumentar esse valor”.
Se, para além dessas obras, os reclamantes fizeram obras com o objetivo de aumentar o valor, então deveriam tê-las declarado como tal, no prazo e local devidos, para que essa valorização fosse deviamente incorporada no valor patrimonial tributário. Não podem fazer obras por imposição legal e reclamar que se tratam de obras de valorização.
Parece seguro afirmar-se que, de acordo com o art.º 13.º, n.º 1, al d), do CIMI, os melhoramentos que possam valorizar o prédio devem ser declarados: a referência a “valorização” do CIRS enquadra-se no “melhoramento” do CIMI.
A “valorização” que um prédio tem com um telhado renovado (utilizando um exemplo que os reclamantes referiram) só se pode considerar “valorização” em linguagem comum, dado que, em sentido técnico-jurídico, trata-se de obra de reparação ou conservação (que em complemento, permite que o prédio seja vendido pelo preço “certo”, e não abaixo do preço). Considere-se um prédio que é vendido com o telhado a deixar entrar água da chuva: se o adquirente fizer obras no telhado, para lá poder viver, está a ter despesas de valorização? Parece óbvio que seriam despesas de reparação. Um critério lato do conceito de valorização significaria que qualquer despesa que pudesse ser relacionada com o bem poderia ser referida como de valorização.
O requisito da declaração das obras na matriz é um critério razoável para se distinguir entre as situações em que ocorre uma verdadeira valorização do imóvel, e aquelas em que o objetivo ou o resultado das obras é menos evidente, ou seja, é um fator de redução da subjetividade, em que as mesmas regras que são utilizadas na avaliação tributária são utilizadas para calcular a valorização objetiva proporcionada pelas obras.
Quanto à despesa com a intermediação imobiliária, do total pago pela reclamante A… e restantes herdeiros coube àquela 62,5%, mas da sua parte apenas se considerou elegível o valor correspondente à parte da mais-valia que foi tributada (12,5%). Ou seja, uma vez que a reclamante A… teve exclusão de tributação de parte da mais-valia (dos 62,5% que lhe couberam da meação e herança só foi tributada pela mais-valia correspondente a 12,5%), apenas se aceitou para essa contribuinte, como despesa, a comissão na quota de 12,5%.
A reclamante entende que é ilegal essa limitação, uma vez que não existe nenhuma norma legal que diga qual a repartição das despesas pela parte sujeita e pela parte não sujeita, e, como o art.º 51.º, n.º 1, al. a) refere expressamente que os encargos fossem repartidos entre a parte sujeita e a parte não sujeita, teria feito constar essa vontade neste artigo.
A reclamante fundamenta este entendimento referindo que “… de acordo com o princípio da capacidade contributiva, é necessário existir uma correspondência entre a mais-valia ou incremento patrimonial e a capacidade contributiva do sujeito passivo, sendo que para tal tem que se ter em consideração para o seu cálculo os encargos e as despesas necessários para obter um aumento patrimonial”.
Parece-nos que a citada frase justifica precisamente o contrário da pretensão da reclamante: que aquela parte da comissão seja excluída das despesas. Na verdade, tendo em conta que o que está aqui em causa é a determinação da mais-valia tributável, e não a mais-valia total, não se encontra qualquer explicação para que, para se determinar a mais-valia correspondente a 12,5% fosse permitido à contribuinte incluir despesas correspondentes a 62,5%.
Quanto à alegação de que o legislador deveria ter inscrito no art.º 51.º que os encargos fossem repartidos pela parte sujeita e a parte não sujeita, a reclamante parece esquecer-se de que a exclusão tributária em causa não se encontra no CIRS, mas sim no art.º 5.º do DL 442-A/88, e que se trata de um regime transitório.
Existe, sim, uma disposição no art.º 22, n.º 2, alínea b), do CIRS, sobre o englobamento dos rendimentos, que nos diz que “… cada titular engloba os rendimentos ilíquidos e as deduções legalmente admitidas, na proporção das respetivas quotas”. Ou seja, se os rendimentos ilíquidos declarados corresponderem a 12,5% do valor total, então as deduções também devem corresponder a 12,5% - não é possível declarar rendimentos na quota de 12,5% e deduções na quota de 62,5%. A dedução de 50% “em falta”, a ser declarada, deveria sê-lo no anexo correspondente ao “rendimento em falta”, no nosso caso, no anexo G1.
Essa inscrição foi dispensada porque as mais-valias declaradas no anexo G1 não são tributadas.
Os reclamantes alegam também a falta de fundamentação. Esse argumento não é válido, uma vez que a correção da declaração (e, em consequência, a nova nota de liquidação) foi precedida de comunicação efetuada com os contribuintes, precisamente com o objetivo de clarificar a natureza e a admissibilidade dos encargos aqui em análise. Os contribuintes não só foram notificados, como cooperaram no procedimento, fornecendo elementos, e foram mantidos ao corrente do andamento do procedimento que culminou com a correção, de tal forma que a sua reclamação demonstra que dispõem, e sempre dispuseram, de toda a informação necessária.
Os reclamantes não podem retirar do contexto a nota de liquidação (ou peças dos processos de divergências) e alegar que, da sua leitura (isolada), o motivo da alteração do rendimento não é percetível a um destinatário normal: é que para esse destinatário específico (os aqui reclamantes) ficou totalmente percetível a razão para a alteração.”
- conforme artigos 58º e 59º do PPA e artigos 23º a 26º da Resposta da AT
S) Os Requerentes em data não apurada, procederam ao pagamento das liquidações de que ora reclamam – conforme artigo 190º do PPA e Documentos 24 e 25 em anexo ao PPA;
T) As facturas apresentadas pelos Requerentes à AT foram emitidas em nome de apenas um dos comproprietários (C…), tendo os encargos nelas documentados sido suportados por todos os comproprietários, conforme declaração do cabeça de casal da herança de F… que refere o seguinte “... o valor de 1/3 que corresponde ao valor de 76.428,12 €, foi suportada pela Sra. D. A…, contribuinte n.º …, residente na Rua …, Braga, e pelos filhos Sr B…, contribuinte n.º …, -residente na Rua Dr. …, Braga, e G…, contribuinte n.º …, residente na Rua …, Porto e H…, contribuinte N.º … residente na Rua …, Braga já que os mesmos são proprietários de 1/3 do Imóvel acima identificado” – conforme artigos 92º e 93º do PPA e Documento nº 20 em anexo ao PPA (Documento 10 em anexo à resposta do Requerente B… à AT) e falta de impugnação especificada da AT apreciada nos termos do nº 7 do artigo 110º do CPPT;
U) I…, representante dos comproprietários do imóvel no contrato de empreitada, declarou que “as despesas referentes ao referido imóvel foram suportadas por todos os comproprietários na respetiva proporção da compropriedade, tendo a Sra. D. A… e filhos B…, G… e H…, suportado um terço das despesas totais, uma vez que os mesmos são proprietários de 1/3 do referido imóvel”, ou seja, A… e os seus três filhos suportaram o valor de 76.428,12 €, o que corresponde a 1/3 do valor total das obras efetuadas no imóvel alienado em 2018 – conforme artigos 94º a 95º do PPA e Documento 11 anexo à resposta enviada em 14/02/2020 pela Requerente B… à AT no Documento 19 em anexo ao PPA e falta de impugnação especificada da AT apreciada nos termos do nº 7 do artigo 110º do CPPT;
V) D…, arquiteto, elaborou um parecer com data de 25 de Maio de 2020, com base nos seguintes elementos fornecidos: (1) notificação da Lisboa Ocidental, SRU – Sociedade de Reabilitação Urbana EEM refª nº ./…/2009 de 21 de Dezembro de 2009; (2) Orçamento e (3) Relatório final da obra, onde referiu:
(1) “... confirma-se que as Obras de Reabilitação levadas a efeito no edifício sito na rua … em Lisboa, se convertem em melhorias significativas na estrutura edificada, conferindo-lhe condições de habitabilidade e conforto, passando a cumprir os requisitos de salubridade, segurança e estética condizentes com os padrões atuais que são significativamente diferentes dos exigidos à época da sua construção.”
(2) “analisando o descrito no orçamento, constata-se que mais de 93,75% dos trabalhos efetuados são melhorias/valorizações pelo que os restantes se consideram trabalhos inerentes á mera conservação”;
(3) o estado de conservação do prédio antes das obras era mau, a estrutura edificada estava degradada, inoperacional e tinha deixado de satisfazer as exigências de desempenho, pelo que “foram obras mais profundas e que visaram grandes melhorias no edifício e frações que o compõem” que foram classificadas como obras de reabilitação pelos responsáveis da Lisboa Ocidental, SRU.
(4) Quanto à análise do enquadramento orçamental dos valores, que entendeu definir cada uma das intervenções no imóvel como obra de melhoria/valorização do mesmo ou obra de conservação (orçamento, as faturas, o contrato de empreitada e o relatório final de obras) conclui que mais de 93,75 % do valor das obras dizem respeito a despesas de valorização.
- conforme artigos 81º a 86º do PPA e Documento 23º em anexo ao PPA e depoimento da testemunha D…;
W) Em 04.01.2021 os Requerentes entregaram no CAAD o presente pedido de pronúncia arbitral – conforme registo no SGP do CAAD.
2.1. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos provados basearam-se nos documentos juntos pelas Partes e nos factos articulados que estão em conformidade, de forma expressa ou implícita, com os factos alegados por ambas. Por cada alínea dos factos provados, são indicados os documentos ou artigos das peças processuais que não mereceram dissentimento especificado entre as partes e que foram considerados relevantes.
Relativamente à prova testemunhal foi valorada na medida em que a testemunha arrolada, D…, arquiteto, foi o autor do Documento nº 23 junto com o PPA, enquanto prova complementar face ao documento apresentado.
Do parecer emitido pela testemunha (Documento 23 junto com o PPA) ressalta que o prédio antes das obras tinha um estado de conservação mau, o que se comprova o que a AT coloca como óbice à classificação das obras realizadas como de “valorização do imóvel” (artigos 53º e 54º e 62º a 65º da Resposta da AT) não se vislumbrando, assim, existirem razões para considerar o que é referido pela AT no artigo 15º das doutas alegações.
Não se provou que as obras em causa neste processo possam não estar relacionadas com o imóvel em análise (artigo 58º da resposta da AT).
Para além do atrás referido, não há outros factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.
3. Matéria de direito
Ordem de conhecimento dos vícios
3.1. A Requerente fundamenta o pedido de anulação contenciosa num vício de falta de fundamentação e em vícios de violação de lei relacionados com a dedutibilidade de despesas com a valorização do imóvel alienado e despesas inerentes à alienação, em aplicação do disposto no artigo 51.º, alínea a), do CIRC.
Conforme dispõe o artigo 124.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, na sentença a proferir no processo de impugnação, o tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do ato impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam à sua anulação (n.º 1), havendo lugar, no primeiro grupo, à apreciação prioritária dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos, e, no segundo grupo, a indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público ou, nos demais casos, a fixada na alínea anterior (n.º 2).
No presente caso, não são arguidos vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do ato impugnado ou outros que resultem do exercício da ação pública, estando apenas em causa vícios que conduzem à anulação do ato administrativo. Por outro lado, a Requerente não indica uma relação de subsidiariedade entre os vícios, pelo que se afigura haver lugar ao conhecimento prioritário dos vícios de violação de lei por serem estes que confere mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos, visto que o vício de falta de fundamentação – a proceder – não impediria que a Administração produzisse, em execução de julgado, um ato de idêntico sentido ainda que devidamente fundamentado.
3.2. Matéria de fundo
As questões centrais em debate reconduzem-se a saber se as obras realizadas pelos Requerentes podem considerar-se como encargos com a valorização dos bens, para efeito do apuramento da mais-valia imobiliária decorrente da alienação de prédio urbano, e se as comissões de intermediação pela venda do imóvel apenas relevam, para esse efeito, em 50% quando haja exclusão de tributação nessa percentagem por efeito do regime transitório do artigo 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro.
Na decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que manteve os actos de liquidação de IRS impugnados, a Autoridade Tributária sustenta que, como encargos de valorização se consideram as despesas, que, pela sua natureza, se mostrem ser indissociáveis do prédio e contribuam efectivamente para o valorizar, não podendo entender-se como tais as despesas de conservação ou de restauro. Nesse sentido apontando, na situação do caso, a circunstância de as obras terem sido realizadas por imposição camarária. Acrescendo que as obras de valorização determinam a actualização da matriz, nos termos do art.º 13.º, n.º 1, alínea d), do CIMI, na medida em que se trata de “melhoramentos”, sendo que este é um critério razoável para distinguir entre os encargos de valorização do imóvel e as meras despesas de conservação ou manutenção.
Quanto às despesas com a intermediação imobiliária imputáveis à primeira Requerente, na quota-parte de 62,5%, a Autoridade Tributária apenas considerou, para efeito da determinação da mais-valia, a percentagem de 12,5%, por entender que, tendo havido exclusão da tributação em mais-valias em 50%, por virtude de o prédio ter sido adquirido em comunhão geral de bens com o cônjuge em 1976, ainda antes da entrada em vigor do CIRS, não podem considerar-se como despesas inerentes à alienação os gastos que correspondem à parte excluída da tributação.
Em contraposição, os Requerentes defendem que as despesas com obras realizadas no prédio alienado correspondem a encargos com a valorização do imóvel e a despesa com a imobiliária suportada pela primeira Requerente é inerente à alienação e a lei não estabelece um critério de repartição das despesas dessa natureza em função da quota-parte sujeita ou não sujeita a tributação.
São estas as questões a dilucidar.
3.3 Qualificação das despesas realizadas com obras como de “valorização do imóvel”
Para determinação das mais-valias sujeitas a imposto, prima facie, as normas relevantes são as dos artigos 10.º, n.º 1, alínea a), e 51.º do Código do IRS. A primeira estipula, na parte que mais interessa considerar, que “constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis”. A segunda, sob a epígrafe de “Despesas e encargos”, prescreve, na sua alínea a), que para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem “os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos, e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, bem como a indemnização comprovadamente paga pela renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a esses bens, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º”.
Como refere PAULA ROSADO PEREIRA (Manual de IRS, 2.ª edição, Coimbra, pág. 246) “nas situações previstas no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do CIRS, a dedução de despesas e encargos, para efeitos do cálculo das mais-valias tributáveis, é efetuada mediante uma técnica de acréscimo, ao valor de aquisição do bem imóvel objeto de alienação onerosa (...). O acréscimo, nos termos do artigo 51.º, alínea a), do CIRS, pode corresponder a:
i) Encargos com a valorização do bem, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos. Estão aqui em causa encargos intrinsecamente ligados ao bem alienado, conducentes a uma valorização, quer material ou física, quer económica, do mesmo. Carecem de relevância os encargos destinados à mera preservação do valor do bem, e não à sua valorização (...);
ii) Despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação dos bens em causa.” (…).
Acrescenta a mesma Autora que, “dado que se trata de encargos e despesas necessários à obtenção do rendimento, a regra prevista no artigo 51.º do CIRS é uma concretização, relativamente ao cálculo das mais-valias, do princípio da capacidade contributiva e, em particular, do princípio da tributação do rendimento líquido objetivo - princípios estruturantes do CIRS.
Na mesma linha de entendimento, o acórdão do STA de 21 de Março de 2012 (Processo n.º 0587/11) consigna que os encargos suportados com a valorização dos bens não se restringem às valorizações materiais ou físicas dos bens, mas abrangem também os encargos efectivamente suportados que os valorizem economicamente, esclarecendo que o encargo há de estar ligado à valorização do bem alienado, ou seja, não estão incluídos encargos que tenham por escopo a mera preservação do valor do bem, mas, tão só os que se destinem a aumentar esse valor.
No mesmo aresto, citando XAVIER DE BASTO (IRS: Incidência real e determinação dos rendimentos líquidos, Coimbra Editora, 2007, págs. 460-465), afirma-se ainda o seguinte. “Se o objectivo da norma fosse atender só às valorizações materiais ou físicas e excluir os demais encargos, tê-lo-ia dito expressamente. Bem ao invés, o uso de uma formulação aberta ― “encargos com a valorização dos bens” ― parece indiciar que se não quis restringir o alcance da norma, como pretende o citado despacho da administração fiscal. Por outro lado, a dedução de encargos ― através, neste caso, da sua adição ao valor de aquisição ― é solução que decorre do princípio da tributação do rendimento líquido. Não prever a dedução de encargos efectivamente suportados que contribuem para a ocorrência do rendimento ― neste caso, para a ocorrência do aumento do valor do imóvel que permitiu realizar mais-valia, na sua alienação ― é violar um princípio económico e técnico da tributação do rendimento, o que só razões muito ponderosas poderiam justificar e haveria, por certo, de ser expressamente reflectido no texto legislativo.”
Em síntese conclusiva, o conceito de “encargos com a valorização dos bens” abrange os encargos incorridos que se encontrem associados à valorização económica do imóvel e não tenham uma estrita finalidade de preservação dos bens.
Revertendo à situação do caso, e com base na matéria de facto dada como assente, constata-se que os proprietários do prédio alienado foram objecto de intimação pela Câmara Municipal de Lisboa para a realização de obras de conservação por virtude de o prédio se encontrar degradado e constituir um foco de insalubridade e risco para a saúde pública. Na sequência, os proprietários celebraram um contrato de empreitada com a empresa K…, Lda, para execução de obras, no valor global de € 229.284,36, e, no âmbito do procedimento tributário, juntaram facturas comprovativas dos pagamentos efectuados. Solicitaram ainda um parecer técnico ao arquitecto D…, que, com base nos elementos fornecidos, incluindo o orçamento e o relatório final da obra, concluiu que as obras realizadas constituem obras de reabilitação que originaram “melhorias significativas na estrutura edificada, conferindo-lhe condições de habitabilidade e conforto” e que se tornaram necessárias por virtude do estado de degradação do prédio que “tinha deixado de satisfazer as exigências de desempenho”. Tendo calculado, através da análise do orçamento, faturas, contrato de empreitada e relatório final de obras, que mais de 93,75 % do valor das obras dizem respeito a despesas de valorização e apenas o restante corresponde a obras de conservação. Essa avaliação técnica foi confirmada em audiência no processo arbitral.
Face a todos estes elementos, não pode deixar de considerar-se que as obras em causa apresentam uma forte componente de valorização, e foram determinadas pelo adiantado estado de degradação do edifício, como é também evidenciado pela expressão dos valores orçamentados envolvidos.
Na definição do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE), “obras de conservação”, são as “obras destinadas a manter uma edificação nas condições existentes à data da sua construção, reconstrução, ampliação ou alteração, designadamente as obras de restauro, reparação ou limpeza” (artigo 2.º, alínea f))). O que significa que se trata de obras de reparação ou manutenção, destinadas a preservar o prédio e manter as suas funcionalidades habitacionais.
E embora a comunicação da Sociedade de Reabilitação Urbana Lisboa Ocidental, de 16 de Fevereiro de 2011, dirigida a um dos proprietários, e relacionada com o acompanhamento do caso, faça referência a “obras de conservação”, isso não implica, por si só, que tais obras devam ser qualificadas tecnicamente como obras dessa natureza, quando existe prova abundante de que se tratou de obras que visaram suprir as deficiências de habitabilidade do edifício.
Por outro lado, não tem cabimento invocar para o efeito, como faz a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, o disposto no artigo 13.º, n.º 1, alínea d), do CIMI. A norma desse artigo 13.º limita-se a descrever os factos a partir dos quais o sujeito passivo deve apresentar declaração relativa à inscrição ou actualização da matriz, e na referida alínea d) enuncia, como um desses factos, a conclusão de “obras de edificação, melhoramento ou outras alterações que possam determinar a variação do valor patrimonial tributário do prédio”.
No entanto, o facto tributário que determina a inscrição ou actualização da matriz nada tem a ver com aqueloutro facto tributário que permite a dedução de encargos para efeito da determinação das mais-valias. E ainda que a realização de obras no prédio alienado pudesse justificar a apresentação da declaração a que se refere o dito artigo 13.º, n.º 1, alínea d), do CIMI, a omissão declarativa apenas poderia determinar as consequências que se encontrem previstas no mesmo Código para essa situação, e não a própria desconsideração das obras de valorização para efeito de mais-valias. Além de que o chefe de finanças, nos termos do artigo 13.º, n.º 3, do CIMI, pode proceder oficiosamente à inscrição ou actualização da matriz quando o sujeito passivo não tenha tomado essa iniciativa, pelo que a omissão declarativa sempre poderia ser suprida ex officio pela própria Administração, não podendo imputar-se ao contribuinte a consequência desvantajosa de não ter sido efectuada oficiosamente a actualização do valor patrimonial do prédio.
Por todo o exposto, nesta parte, o pedido arbitral mostra-se ser procedente, por violação de lei decorrente de erro nos pressupostos de direito.
3.4 Elegibilidade das despesas realizadas com a imobiliária
A segunda questão em análise respeita a saber se as comissões de intermediação pela venda do imóvel pagas pela primeira Requerente apenas relevam em 50% quando esta tenha beneficiado da exclusão de tributação nessa percentagem por efeito do regime transitório do artigo 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, quando tenha adquirido a meação do prédio antes da entrada em vigor do CIRS.
Resulta da matéria de facto dada como assente que a Requerente A… adquiriu em comunhão geral de bens com o cônjuge, em 29-10-1976, 1/3 do prédio urbano alienado e por óbito do cônjuge, em 17-02-1998, adquiriu mais 1/24 do imóvel, juntamente com os seus três filhos, pelo que 50% da mais-valia obtida com a alienação se encontra coberta pela exclusão de tributação a que se refere a falada norma do artigo 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 442-A/88,
O entendimento da Autoridade Tributária é o de que não podem considerar-se como despesas inerentes à alienação os gastos que correspondem à parte excluída da tributação, e, sendo assim, se a despesa com a intermediação imobiliária suportada pela Requerente corresponde a 62,5% do total, mas a mais-valia só foi tributada em 12,5%, por efeito da exclusão da tributação, a dedução das despesas apenas pode corresponder a essa quota-parte.
O ponto de partida para a análise da questão está na norma transitória do artigo 5.º do diploma preambular do Código do IRS, que, no seu n.º 1, dispõe nos seguintes termos:
Os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias, criado pelo Código aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46673, de 9 de Junho de 1965, bem como os derivados da alienação a título oneroso de prédios rústicos afectos ao exercício de uma actividade agrícola ou da afectação destes a uma actividade comercial ou industrial, exercida pelo respectivo proprietário, só ficam sujeitos a IRS se a aquisição dos bens ou direitos a que respeitam tiver sido efectuada depois da entrada em vigor deste Código.
O imposto de mais-valias, que era regulado pelo Decreto-Lei n.º 46 673, de 9 de Junho de 1965, foi abolido pelo artigo 3.º do diploma preambular do Código do IRS, e esse imposto, na sua vigência, não sujeitava a tributação a transmissão onerosa de ganhos realizados com a alienação de prédios urbanos.
O Código do IRS entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1989 (artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro) e foi nos termos deste Código que as mais-valias passaram a constituir rendimentos da categoria G (artigo 9.º, n.º 1, alínea a)), aí se incluindo, tal como prevê o artigo 10.º, n.º 1, alínea a), os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de “alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis”.
O principal motivo justificativo da criação de um regime transitório para os rendimentos a categoria G consistiu no facto de as regras de incidência do Código do Imposto de Mais-Valias, então revogado, serem consideradas menos abrangentes do que as que passaram a integrar o âmbito de incidência de mais-valias no Código do IRS. E, deste modo, a norma transitória instituída pelo artigo 5.º do diploma que aprovou o Código do IRS, ao consignar, no seu n.º 1, que só ficam sujeitos a IRS a aquisição dos bens ou direitos que tiver sido efectuada depois da entrada em vigor do Código, destina-se a evitar a aplicação retroactiva do novo regime de tributação de mais-valias em relação a situações que não eram contempladas no antigo Código do Imposto de Mais-Valias.
E importa ter presente, por outro lado, que esse regime transitório não constitui uma isenção de imposto, mas uma exclusão do seu âmbito de incidência (neste sentido, PAULA ROSADO PEREIRA, Manual de IRS, Coimbra, 2.ª edição, pág. 224).
No caso vertente, o que está em causa é saber se a despesa se enquadra na previsão do artigo 51.º, n.º 1, alínea a), do CIRS, há pouco transcrito. Como vimos, segundo essa norma, para efeito da determinação das mais-valias sujeitas a imposto, acrescem ao valor de aquisição “os encargos com a valorização dos bens” e as “despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação”.
Como refere o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 14.04.2015 (Processo n.º 06824/13), as despesas inerentes são as que mantêm uma relação intrínseca com a alienação, não bastando que se trate de despesas conexas com a obtenção do rendimento, mas que sejam indissociáveis da própria alienação.
Ora, a despesa com a imobiliária, tendo sido realizada para facilitar, através da intermediação e do contacto com agentes comerciais e potenciais adquirentes, a alienação do prédio, é uma despesa necessária e inerente à própria alienação, visto que corresponde a uma comissão sobre o valor da venda que é efectuada se e quando a venda tiver lugar.
E importa ter presente que a mais-valia imobiliária resulta da diferença positiva entre o valor obtido com a transmissão do imóvel (valor de realização) e o valor pago aquando da aquisição (valor de aquisição) (artigo 10.º, n.º 4, alínea a), do CIRS), e que a mais-valia se considera obtida no momento da prática dos actos que dão origem aos ganhos, e, por conseguinte, na situação do caso, no momento da alienação onerosa de direitos reais sobre imóveis (artigo 10.º, n.º 3, do CIRS).
E, sendo assim, tratando-se de uma despesa inerente à alienação, o facto tributário que determina a dedução para efeitos do cálculo da mais-valia é a própria realização da despesa e tendo essa despesa ocorrido já na vigência do CIRS, nenhum motivo há para a considerar influenciada pela exclusão da tributação à parte do imóvel adquirido ainda antes da entrada em vigor do Código.
O pedido é também procedente, neste ponto, por violação de lei decorrente de erro nos pressupostos de direito.
4. Restituição do indevidamente não reembolsado. Direito a juros indemnizatórios.
Na sequência da ilegalidade do ato de liquidação controvertido, há lugar a reembolso do imposto pago ilegalmente, por força do disposto nos artigos 24º nº 1, alínea b), do RJAT e 100º da LGT, pois tal afigura-se essencial para restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado.
Procede, pois, o pedido de reembolso do imposto indevidamente pago.
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No que concerne a juros indemnizatórios, de harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação, vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».
Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».
O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do artigo 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
O regime substantivo do direito a juros indemnizatórios é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece o seguinte:
Artigo 43.º
Pagamento indevido da prestação tributária
1 - São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
2 - Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.
3 - São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias:
a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos;
b) Em caso de anulação do acto tributário por iniciativa da administração tributária, a partir do 30.º dia posterior à decisão, sem que tenha sido processada a nota de crédito;
c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária.
d) Em caso de decisão judicial transitada em julgado que declare ou julgue a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa ou regulamentar em que se fundou a liquidação da prestação tributária e que determine a respetiva devolução. (Aditada pela Lei n.º 9/2019, de 1 de fevereiro)
4 - A taxa dos juros indemnizatórios é igual à taxa dos juros compensatórios.
5 - No período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas. (Aditado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro).
Revertendo o que se referiu para o caso concreto deste processo, verifica-se que ...
Os juros indemnizatórios são devidos desde a data de cada pagamento, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 3, alínea d), e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, 61.º, n.º 5, do CPPT, 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril, à taxa legal supletiva.
5. Decisão
Nestes termos decide este Tribunal Arbitral:
A) Julgar procedente o pedido arbitral e anular os actos de liquidação de IRS n.º 2020 …, de liquidação de juros n.º 2020 … e demonstração de acerto de contas n.º 2020 …, bem como os actos de liquidação de IRS n.º 2020 … e a demonstração de acerto de contas n.º 2020 …, relativos ao ano de 2018, e bem assim a decisão de indeferimento da reclamação graciosa contra eles deduzida;
B) Condenar a AT no reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido do pagamento de juros indemnizatórios devidos desde a data de cada pagamento, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 3, alínea d), e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, 61.º, n.º 5, do CPPT, 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril, à taxa legal supletiva.
6. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 1, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 100.235,48.
7. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 3.060,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida, por ter decaído na totalidade (artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC e 122.º, n.º 2, do CPPT).
Lisboa, 15 de Janeiro de 2022
Tribunal Arbitral Colectivo
Os Árbitros,
(Carlos Alberto Fernandes Cadilha)
(Ana Teixeira de Sousa)
(Augusto Vieira)