SUMÁRIO:
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O artigo 7º, n.º 1 e) do Código do Imposto do Selo confere isenção de imposto do selo para empréstimos feitos por entidades do setor financeiro;
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As SGPS’s que não detenham participações financeiras qualificadas em instituições financeiras não são elegíveis para a isenção prevista na norma atrás mencionada.
Decisão Arbitral
Os árbitros Manuel Luís Macaísta Malheiros (árbitro presidente), Vasco Valdez e Jorge Belchior de Campos Laires, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:
I. Relatório
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Tramitação
A..., SGPS, S.A., doravante “Requerente”, com o número de identificação fiscal ... e com sede na Rua..., n.º ..., ..., ..., Lisboa, veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária - “RJAT”) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de maio.
É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por “AT” ou “Requerida”.
A Requerente pretende que seja declarada a ilegalidade do ato de indeferimento, datado de 13 de novembro de 2020, do pedido de revisão oficiosa contra os atos de liquidação de Imposto do Selo n.ºs ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., todas as liquidações compreendidas entre maio de 2015 e junho de 2016
Em 12 de fevereiro de 2021 o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e, de seguida, notificado à AT.
Em conformidade com o disposto nos artigos 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT, o Exmo. Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável. As partes, notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar.
O Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 22 de junho de 2021.
Em 9 de setembro de 2021, a Requerida apresentou a Resposta com defesa por exceção e impugnação e juntou o processo administrativo. Conclui que deve o pedido de pronúncia arbitral ser julgado improcedente.
Por despacho de 10 de setembro de 2021, o Tribunal considerou dispensável a reunião prevista no 18.º do RJAT e convidou a Requerente a pronunciar-se por escrito e no prazo de 10 dias sobre as exceções invocadas pela Requerida, tendo a Requerente apresentado a resposta a 21 de setembro de 2021, concluindo pela improcedência das exceções invocadas pela Requerida.
Por despacho de 27 de setembro de 2021, o Tribunal notificou as partes para apresentarem, querendo, alegações sucessivas, no prazo 10 dias, tendo Requerente e Requerida apresentado alegações, respetivamente, nos dias 11 e 27 de outubro de 2021.
Por despacho de 5 de novembro de 2021, o Tribunal Arbitral fixou o dia 21 de dezembro de 2021 como data para prolação da decisão, com advertência da necessidade de pagamento da taxa arbitral subsequente até essa data.
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Posição das Partes
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Exceções invocadas
Síntese da posição da Requerida
Inidoneidade do pedido de revisão oficiosa quanto às liquidações até maio de 2015 e a partir de 30 de março de 2016
São objeto de pedido de pronúncia do tribunal arbitral o indeferimento do pedido de revisão oficiosa n.º ...2019..., e, consequentemente, os atos de autoliquidação de imposto do selo referentes ao período compreendido entre maio de 2015 e junho de 2016.
O imposto do selo é um imposto de obrigação única, em que cada facto tributário é instantâneo, esgotando-se no momento da sua prática, isto sem prejuízo de nas operações previstas nas verbas 17.1.4 e 17.2.4 da TGIS o apuramento da matéria tributável e a liquidação do respetivo imposto só se realizarem no último dia de cada mês.
O n.º 1 do artigo 78.º da LGT estabelece que “a revisão dos atos tributários pela entidade que os praticou pode ser efetuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços.”
Assim, as autoliquidações de imposto do selo realizadas até 20-05-2015 são intempestivas, dado que o pedido de revisão oficiosa foi apresentado em 20 de maio de 2019, estando assim ultrapassado o prazo de 4 anos previsto na 2.ª parte do artigo 78.º da LGT, por isso a Requerente encontra-se a reivindicar a mais a restituição de € 101.797,60 (€ 46.177,34 referentes a autoliquidações efetuadas pelo B... e € 55.620,26 referentes a autoliquidações efetuadas pelo C...).
Adicionalmente, nos termos da 2.ª parte do n.º 1 do citado artigo 78.º são pressupostos específicos da admissibilidade do pedido de revisão pela entidade que praticou o ato que: (i) tenha havido um erro (material ou de direito) imputável aos serviços; e, que (ii) o mesmo seja apresentado no prazo de quatro anos após a liquidação, ainda que instado pelos contribuintes.
Sendo que, até à revogação do no n.º 2 deste mesmo preceito legal, concretizada pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março (Lei do Orçamento de Estado para 2016), a lei ficcionava que o erro da autoliquidação cometido pelo sujeito passivo era imputável aos serviços, pelo que os sujeitos passivos que cometam erros na autoliquidação deixam de poder beneficiar da ficção legal referida a partir de 30 de março de 2016.
Assim, relativamente às autoliquidações de imposto ocorridas entre 30 de março de 2016, inclusive, e junho de 2016, no valor de € 39.230,88 (€ 31.935,21, realizadas pelo B..., e € 7.295,67, realizadas pelo C...) devem ser igualmente rejeitadas por inidoneidade.
Portanto, no cômputo das duas situações, cujo valor perfaz € 141.028,48 (€ 101.797,60 + € 39.230,88), considera-se precludido o direito da sua contestação na presente ação arbitral.
Inidoneidade do meio processual
A resposta ao pedido de revisão oficiosa, no que concerne à parte referida no ponto anterior, rejeitou a apreciação da legalidade daqueles atos de liquidação com fundamento em intempestividade. Assim, estamos perante um ato administrativo em matéria tributária que, por não apreciar ou discutir a legalidade do ato de liquidação, não pode ser sindicável através de impugnação judicial, nos termos previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º do CPPT, pelo que, consequentemente, também não o poderá ser por via arbitral, meio de resolução de litígios alternativo àquele.
Na decisão arbitral proferida no processo n.º 112/2015-T, refere-se que a apreciação da competência do tribunal arbitral envolve um juízo sobre a adequação ao caso sub judice do meio processual da ação administrativa especial ou do processo de impugnação judicial, em atenção ao disposto no artigo 97.º do CPPT.
Para concretizar tal distinção, como se refere naquela decisão arbitral, constitui orientação jurisprudencial consolidada que “a utilização do processo de impugnação judicial ou do recurso contencioso (atualmente ação administrativa especial, por força do disposto no artigo 191.º do CPTA) depende do conteúdo do ato impugnado: se este comporta a apreciação da legalidade de um ato de liquidação será aplicável o processo de impugnação judicial e se não comporta uma apreciação desse tipo é aplicável o recurso contencioso/ação administrativa especial” (cf. o acórdão do STA de 25.6.2009, proc. n.º 0194/09).
Pelo que o Tribunal Arbitral é materialmente incompetente para apreciar o pedido de pronúncia arbitral quanto às liquidações cujo valor perfaz € 141.028,48, devendo determinar a absolvição, nessa parte, da Requerida da instância, atento o disposto nos artigos 576.º, n.º 1 e 577.º, alínea a) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
Incompetência material e da intempestividade para a impugnação direta de parte dos atos de liquidação
O conhecimento direto da legalidade pelo presente Tribunal Arbitral mostra-se vedado face ao disposto no artigo 2.º do RJAT e do artigo 2°, da Portaria n° 112-A/2011, isto é, a possibilidade de apreciar dos atos de autoliquidação objeto da matéria de exceção, sem que tenha existido prévio " (...) recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131° a 133°, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (...)".
Também por este motivo, é o Tribunal Arbitral materialmente incompetente para apreciar e decidir desta parte do pedido objeto do litígio aqui em causa nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 4.º, n.º 1, ambos do RJAT e dos artigos 1.º e alínea a), da Portaria n.º 112-A/2011, o que consubstancia uma exceção dilatória a qual prejudica o conhecimento do mérito da causa, devendo determinar a absolvição da entidade requerida da instância, atento o disposto nos artigos 576.º, n.º 1 e 577.º, alínea a) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
Da inimpugnabilidade desta parte dos atos de liquidação
Tendo-se demonstrado a extemporaneidade da reclamação relativamente às liquidações efetuadas até maio de 2015 e desde 30 de março de 2016, o ato tributário é inimpugnável, conforme se defende no acórdão do STA de 14-10-2020 (processo n.º 0937/02.2BTLRS 0318/15).
Assim, apenas são suscetíveis de integrar o objeto do presente pedido arbitral as autoliquidações efetuadas entre 20-05-2015 e 30-03- 2016, cujo valor perfaz € 488.956,27.
Síntese da resposta da Requerente
Relativamente às liquidações efetuadas até maio de 2015, que no entender da AT corresponde a um valor de € 46.177,34 referentes a autoliquidações efetuadas pelo B..., o montante de € 23.472,38 não se encontra a ser incluído no pedido arbitral, pelo que não deve ser trazido à colação.
Em relação às autoliquidações remanescentes, que totalizam um montante de € 22.704,96 e de € 55.620,26, para efeitos da contagem do período de 4 anos o que releva é data da entrega da guia e pagamento por parte do Banco, e não a data do registo contabilístico do imposto (conforme se encontra a ser considerada pela AT). Dessa forma, a inclusão desses valores é admissível.
Quanto às liquidações feitas a partir de março de 2016, a revogação da ficção a que se refere a AT apenas veio obrigar o contribuinte a fazer prova de que, nos casos de autoliquidação, o erro é imputável aos serviços. Neste caso, cabia à AT, na função de controlo que lhe pertence, o dever de verificar o apuramento do Imposto do Selo devido, o qual passa, desde logo, por observar os elementos que eram do seu conhecimento.
Com base nos elementos constantes da IES do Requerente, a AT dispunha dos elementos necessários para verificar que os atos de liquidação de Imposto do Selo eram ilegais, pelo que se trata de erro imputável à AT.
Quanto à alegada inidoneidade do meio processual, sendo o pedido de revisão oficiosa equiparável à reclamação graciosa, a exceção dilatória invocada pela AT não procede, existindo jurisprudência, largamente maioritária, que não há quaisquer obstáculos a que a declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação seja obtida, em processo arbitral, através da declaração de ilegalidade de atos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa.
Seria inconcebível, tendo sido consideradas ilegais todas as autoliquidações de Imposto do Selo aqui em análise, que o contribuinte se visse impedido de recorrer à via arbitral apenas porque, de forma errada (tal como a Requerente logrou demonstrar), a AT tenha considerado parte delas intempestivas.
Tendo a AT se pronunciado sobre a legalidade das autoliquidações, ainda que tendo também referido (erroneamente) a sua intempestividade, a decisão de indeferimento não consubstancia um ato em matéria tributária, mas sim um ato misto, pelo que, na parte em que existe pronúncia sobre a ilegalidade das autoliquidações, tem necessariamente que existir também a possibilidade de acesso à via da arbitragem tributária.
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Síntese da posição da Requerente quanto à questão de fundo
No período compreendido entre março de 2015 e junho de 2016, duas instituições de crédito (o B... e o C...) liquidaram e entregaram o Imposto do Selo, com referência às operações de financiamento, ao abrigo da Verba 17 da Tabela Geral do Imposto do Selo (“TGIS”), na qualidade de sujeitos passivos deste imposto, tendo esse imposto sido suportado pela Requerente, enquanto entidade mutuária.
Estas liquidações não se mostram devidos dado que a Requerente, na qualidade de Sociedade Gestora de Participações Sociais (“SGPS”), beneficia da isenção de imposto prevista na alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo.
Efetivamente, determina a referida norma que são isentos deste imposto "Os juros e comissões cobrados, as garantias prestadas e, bem assim, a utilização de crédito concedido por instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras a sociedades de capital de risco, bem como a sociedades ou entidades cuja forma e objeto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária, umas e outras domiciliadas nos Estados membros da União Europeia ou em qualquer Estado, com exceção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado, a definir por portaria do Ministro das Finanças"
O Imposto do Selo em causa foi liquidado tendo por referência o crédito utilizado, bem como os juros e as comissões suportados pela Requerente, sendo que decorrem de créditos concedidos por instituições de crédito domiciliadas num Estado Membro da União Europeia (Portugal) e os juros e as comissões em causa foram pagos por uma sociedade também ela domiciliada num Estado Membro da União Europeia (Portugal), cuja forma e objeto preenche o tipo de instituição financeira previsto na legislação comunitária, nomeadamente, o de SGPS.
Não existindo qualquer delimitação do conceito de instituição financeira à luz do direito nacional e remetendo-se, sem qualquer reserva, para o direito comunitário, apenas deverá relevar para a aferição do âmbito subjetivo da isenção a legislação comunitária, pelo que a remissão da norma que estabelece a isenção de Imposto do Selo é feita para as disposições da Diretiva (UE) 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho (“Diretiva 2013/36”) e do Regulamento (UE) n.º 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho (“Regulamento n.º 575/2013”), ambos de 26 de Junho.
A Diretiva 2013/36, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, mais concretamente no ponto 22) do artigo 3.º, define instituição financeira como “uma instituição financeira na aceção do artigo 4.º, n.º 1, ponto 26), do Regulamento (UE) n.º 575/2013”, e este, por sua vez, define instituição financeira como “uma empresa que não seja uma instituição, cuja atividade principal é a aquisição de participações ou o exercício de uma ou mais das atividades enumeradas no Anexo I, pontos 2 a 12 e 15, da Diretiva 2013/36/UE, incluindo uma companhia financeira, uma companhia financeira mista, uma instituição de pagamento, na aceção da Diretiva 2007/64/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Novembro de 2007, relativa aos serviços de pagamento no mercado interno, e uma sociedade de gestão de ativos, mas excluindo as sociedades gestoras de participações no setor dos seguros e as sociedades gestoras de participações de seguros mistas, na aceção do artigo 212.º, n.º 1, ponto g) da Diretiva 2009/138/CE”.
E na medida em que esta definição abrange empresas cuja atividade principal é a aquisição de participações, a Requerente deve qualificar-se como uma instituição financeira, para efeitos da isenção, tendo em atenção que a sua atividade principal é a de aquisição de participações sociais.
Ao abrigo do artigo 2.º, n.º 2 da Diretiva 2013/34, define-se “participação” como “os direitos no capital de outras empresas, representados ou não por títulos, que, ao estabelecerem uma ligação duradoura com essas empresas, se destinam a contribuir para a atividade da empresa que detém esses direitos. Presume-se que a detenção de uma parte do capital de outra empresa é uma participação quando excede um limiar percentual fixado pelos Estados-Membros, igual ou inferior a 20 %"
Não consta do CIS, nem da legislação comunitária, que a isenção em análise será aplicável exclusivamente a entidades supervisionadas pelo Banco de Portugal ou do Banco Central Europeu.
Para sustentar a sua posição, a Requerente cita o acórdão arbitral proferido no âmbito do processo n.º 911/2019-T, de 5 de setembro de 2020, onde se refere que: “(…) a remissão da norma que estabelece a isenção de imposto do selo é feita para o direito europeu”, pelo que “(…) a definição constante do artigo 2.º-A do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (…) releva para os demais efeitos da regulação das sociedades gestoras de participações sociais, e não para o específico aspeto da isenção de imposto do selo”.
Em face do exposto, pretende que seja declarada, quer a ilegalidade do indeferimento do pedido de revisão oficiosa, quer a ilegalidade dos atos de autoliquidação de Imposto do Selo supra identificados, aos quais corresponde um montante de imposto indevidamente liquidado no valor de € 629.984,75, e que estes sejam consequentemente anulados nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.
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Síntese da Posição da Requerida quanto à questão de fundo
A Requerente não pode ser qualificada como instituição financeira, instituição de crédito ou sociedade financeira para o efeito da referida norma de isenção.
Não contesta que a legislação comunitária de referência seja a Diretiva n.º 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013 (“Diretiva”) e o Regulamento (UE) n.º 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de Junho de 2013 (“Regulamento”).
Para a determinação das sociedades ou entidades contrapartes nas operações previstas na norma de isenção do artigo 7.º, n.º 1, alínea e) do CIS, o legislador indica que as “sociedades ou entidades” abrangidas são aquelas “cuja forma e objeto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária”.
No processo de identificação há que atender à “forma e objeto” das entidades em causa, in casu, das SGPS em geral.
Não basta ser SGPS para ser qualificada como instituição financeira. Confrontando os traços típicos das SGPS que resultam do respetivo quadro legal, nada pareceria obstar a que prima facie pudessem ser equiparadas a “empresas cuja atividade principal é a aquisição de participações”, porém a análise desta matéria exige maior precisão e rigor, imposto desde logo pela determinação do artigo 3.º, n.º 1 da Diretiva e do artigo 4.º do Regulamento de que as definições dos termos e expressões servem os efeitos previstos em cada um destes atos legislativos.
No contexto das disposições da Diretiva, nomeadamente das que regem a autorização do exercício da atividade, a aquisição de participações qualificadas, o exercício da liberdade de estabelecimento e da liberdade de prestação de serviços e a supervisão das instituições de crédito e das empresas de investimento, ao nível individual ou em base consolidada, não se deteta qualquer referência explícita ou implícita a empresas-mãe que se identifiquem com sociedades gestoras de participações em sociedades que não sejam instituições de crédito ou empresas de investimento.
É o caso, a título de exemplo, do artigo 34.º da Diretiva, com a epígrafe “Instituições Financeiras”, inserido no Título V – Disposições relativas à liberdade de estabelecimento e à liberdade de prestação de serviços e do artigo 111. º (inserido no Título VII Capítulo 3) da Diretiva). Nesta norma atribuem-se as competências para o exercício da supervisão em base consolidada à “empresa-mãe”, sendo esta identificada como correspondendo à “Instituição-mãe num Estado-Membro”, “Instituição-mãe na UE”, “Companhia financeira-mãe” ou “Companhia financeira mista-mãe”, qualificativos que não podem ser atribuídos a uma SGPS, como a Requerente pretende, à luz das definições constantes do artigo 4.º, pontos 28), 29), 30) e 31) do Regulamento.
O âmbito da definição “Instituição financeira” na parte referente a “uma empresa que não seja uma instituição, cuja atividade principal é a aquisição de participações” é delimitado pela operatividade das disposições da Diretiva e do Regulamento que regulam domínios específicos ligados sobretudo à supervisão em base consolidada e ao exercício das liberdades de estabelecimento e de prestações de serviços e, nesse sentido, não compreende toda e qualquer SGPS.
E tanto assim é que as matérias reguladas pela Diretiva e pelo Regulamento não são aplicáveis à Requerente.
Na transposição da Diretiva para o direito nacional, o legislador integrou na qualificação de “instituições financeiras” apenas as SGPS que estão sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, o que não é o caso da Requerente.
II. Saneamento
O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria para conhecer da liquidação de imposto do selo (com as legais consequências no ato de segundo grau que sobre esta recaiu), à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, todos do RJAT.
As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (v. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
A ação é tempestiva e não foram suscitadas outras exceções de que cumpra conhecer nem se verificam nulidades.
III. Fundamentação de Facto
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Matéria de facto provada
A Requerente é uma sociedade gestora de participações sociais (“SGPS”), nos termos do Regime Jurídico das SGPS previsto no Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de dezembro, com sede em Portugal.
A Requerente tem por objeto "a gestão de participações sociais de outras sociedades como forma indireta de exercício de atividades económicas."
A Requerente obteve financiamentos junto das instituições de crédito B... e C... .
Estas instituições de crédito liquidaram e entregaram o Imposto do Selo devido, com referência àqueles financiamentos, ao abrigo da verba n.º 17 da TGIS.
As instituições repercutiram o referido Imposto do Selo na esfera da Requerente, pelo que esta suportou integralmente o encargo do referido Imposto do Selo.
No âmbito dos contratos celebrados com o B..., o Imposto do Selo suportado encontra-se discriminado no quadro seguinte (excerto do quadro apresentado no pedido de pronúncia arbitral):
Conforme se alcança dos documentos juntos no pedido de revisão oficiosa (documentos n.ºs 2 e 3), onde na Tabela se identifica como “data de liquidação”, esta diz respeito à data em que o imposto foi pago ao Estado por parte do B... .
Conforme resulta igualmente dos documentos indicados, o valor de € 23.472,38 relativamente a financiamentos do período de março de 2015 (cujo pagamento ao Estado ocorreu em abril de 2015) não se encontra a ser incluído no pedido arbitral, apesar de ter sido incluído no pedido de revisão oficiosa.
No âmbito dos contratos celebrados com o C..., o Imposto do Selo suportado encontra-se discriminado no quadro seguinte (excerto do quadro apresentado no pedido de pronúncia arbitral):
Conforme se alcança dos documentos juntos no pedido de revisão oficiosa (documento n.º 18), nesta Tabela apresentada pela Requerente o termo “data da liquidação”, ao contrário do sentido que tem nas liquidações apresentadas no caso do financiamento do B... (tabela anterior), refere-se ao mês a que o imposto respeita e já não o mês do seu pagamento ao Estado, o qual se processou no mês seguinte.
Resulta provado da análise dos documentos juntos com o pedido de revisão oficiosa que período identificado como maio de 2015 inclui um valor de € 55.620,26 referentes a financiamentos do mês de março (€ 28.268,94) e abril de 2015 (€ 27,351.,32).
A 20 de Maio de 2019 a Requerente apresentou um pedido de revisão oficiosa dos atos tributários de autoliquidação de Imposto do Selo referidos, tendo a 14 de novembro de 2020 sido notificada do indeferimento do pedido.
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Matéria de facto não provada
Não se verificaram quaisquer factos com relevância para a decisão arbitral que não tenham sido provados.
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Fundamentação
O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e no processo administrativo junto pela Autoridade Tributária com a resposta, e em factos não questionados pelas partes.
MATÉRIA DE DIREITO
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Análise das exceções invocadas pela AT
Como se menciona no ponto 2.1 do Relatório (exceções invocadas), as mesmas consistiram na inidoneidade do pedido de revisão do pedido de revisão oficiosa quanto às liquidações até maio de 2015 e a partir de 30 de março de 2016.
A AT, na exceção invocada, alega que as autoliquidações de imposto do selo realizadas até 20-05-2015 são intempestivas, dado que o pedido de revisão oficiosa foi apresentado a 20 de maio de 2019, estando, assim, o prazo de 4 anos previsto na 2ªa parte do artigo 78º da LGT ultrapassado; por isso a Requerente encontra-se a reivindicar a mais a restituição de 101.797,60€ (46.177,34€ referentes a autoliquidações efetuadas pelo B... e 55.620,26€, referentes a autoliquidações efetuadas pelo C...).
A Requerente contrapõe que relativamente às liquidações efetuadas até maio de 2015, que no entender da AT corresponde a um valor de 46.177,34€, referentes a autoliquidações efetuadas pelo B..., o montante de 23.472,38€ não se encontra a ser incluído no pedido arbitral, pelo que essa parte não deve, desde logo, ser trazida à colação. Olhando para o pedido e para a documentação que o acompanha, confirma-se que a Requerente tem razão, porquanto esse valor não está incluído no pedido.
Em relação às autoliquidações remanescentes, que totalizam um montante de 22.704,96€ e de 55.620,26€, a Requerente alega que, para efeitos de contagem do período de 4 anos, o que releva é a data da entrega da guia e pagamento por parte do Banco e não a data do registo contabilístico do imposto.
Ora, a Requerente chama-lhe “registo contabilístico”, mas na verdade trata-se da data do nascimento da obrigação tributária nos termos do artigo 5º do Código do Imposto do Selo (ou seja, no último dia do mês no caso de crédito por conta-corrente e quando há cobrança, no caso de juros e comissões). O pagamento ao Estado é para ser feito no mês seguinte (artigo 44º, nº 2 do CIS). Por exemplo, crédito utilizado no mês de abril, o Banco deveria liquidar o imposto no final de abril e pagar até 20 de maio.
Ora, de facto, a AT tem razão no sentido de que aqueles valores (de 22.704,96€ e de 55.620,26€) dizem respeito a meses anteriores a maio de 2015, pese embora o pagamento tenha ocorrido em maio de 2015.
Quando se atenta para o artigo 78º da LGT, efetivamente refere-se que o prazo é de quatro anos “após a liquidação”, que é o argumento da AT. A Requerente entende que o prazo de quatro anos deve contar-se a partir do pagamento, mas a verdade é que a lei distingue entre liquidação e pagamento, pelo que o Tribunal considera não assistir, neste particular, razão à Requerente, no que concerne aos valores de 22.704,96€ e de 55.620,26€.
Em seguida a AT alega idinoneidade do meio processual alegando, para o efeito, que em relação às situações acabadas de descrever no item anterior se invocou a intempestividade da impugnação, sendo certo que há jurisprudência firmada de que, quando estamos perante um ato administrativo em matéria tributária, o meio apropriado para o atacar é a ação administrativa especial e não a impugnação e somente quando se trata de apreciação de um ato de liquidação é que poderá lançar-se mão da ação de impugnação.
Salvo melhor opinião, e conforme resulta do documento nº 6 da petição de constituição do tribunal arbitral, entendemos que, conforme é mencionado pela AT, e também é corroborado por Jorge Lopes de Sousa citado por Serena Cabrita Neto e Carla Trindade (“Contencioso Tributário”, Almedina, 2017, volume I, pgs 608/609) quando se está perante a eventual liquidação em prazo ou fora dele de molde a permitir a revisão oficiosa, a ação apropriada para discutir a matéria é a administrativa e não a impugnação- nesse sentido também o acórdão do TCAN de 12-5-2016, tirado no âmbito do processo nº 01886/09.9.
Por consequência, também aqui em relação aos valores indicados no item anterior e pelas razões aduzidas, a Requerente não tem razão porquanto trouxe para a matéria de impugnação matérias que deveriam ter sido discutidas noutra sede judicial. Em toda a restante matéria, o Tribunal entende que a ação sub judice é o meio apropriado para dirimir o litígio em apreço.
E diremos, desde já, que a Requerente tem razão nas restantes exceções invocadas pela AT. Ao contrário do que esta sustenta, a revogação do nº 2 do artigo 78º da LGT, feita pela Lei nº 7-A/2016, de 30 de março (Lei do Orçamento para 2016), teve por efeito extinguir o princípio de que nas autoliquidações o erro era sempre presumido (ou como lhe chama a AT, ficcionado) como sendo desta última, parecendo daqui esta extrair uma conclusão de sentido totalmente oposto, qual seja o de que nas autoliquidações o erro é sempre do sujeito passivo ou do devedor de imposto. Ainda que assim se pudesse entender, a verdade é que o sujeito passivo ou o devedor de imposto podem sempre procurar imputar à AT o erro, pelo que a imputação de não idoneidade para a impugnação de um montante de 39.230,88€ (dos quais 31.935,21€ liquidados pelo B... e de 7.295,67€ liquidados pelo C...) não procede, devendo ser dada razão à Requerente e, consequentemente, considerar improcedente a exceção invocada pela AT, a qual, face às declarações apresentadas e na posse daquelas, teria podido permitir ao Fisco revogar a autoliquidação por considerar ser indevido o imposto do selo em causa, evitando, assim, o erro que lhe está a ser assacado.
Invoca, ainda, a AT a incompetência material e da intempestividade para a impugnação direta dos atos de liquidação fundada no facto de o artigo 2º do RJAT, bem como o artigo 2º da portaria nº 112-A/2011, obrigarem a que o conhecimento da legalidade da autoliquidação passar previamente pelo recurso à via administrativa prevista nos artigos 131º a 133º do CPPT.
Não tem qualquer razão a AT, conforme fica, aliás, demonstrado à saciedade no artigo 69º das alegações da Requerente que cita abundante jurisprudência- que nos escusamos de repetir, remetendo para o citado artigo- que mostra que é possível impugnar a declaração de ilegalidade dos atos de indeferimento da revisão oficiosa.
Aliás, nesta esteira, embora não sendo diretamente aplicável à arbitragem tributária, veja-se o acórdão do STA 0958/12.7BEAVR, de 22-01-2020, onde se diz expressamente que “A reclamação graciosa não constitui condição prévia da revisão do ato tributário, em caso de erro na autoliquidação do imposto, considerado imputável aos serviços (…)”.
Também de forma lapidar, Serena Cabrita Neto e Carla Trindade (op.cit., pg. 611) ensinam que “esses atos de indeferimento [fundados em pedido de revisão ao abrigo do artigo 78º da LGT, seja por erro imputável aos serviços, seja por injustiça grave e notória] serão igualmente arbitráveis, na medida em que o objeto do pedido de constituição de tribunal arbitral será, na verdade, o ato de liquidação- de primeiro grau- que o ato de indeferimento considerou legal”.
Face ao exposto, o Tribunal decide que, nesta parte, a exceção invocada pela AT não procede.
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A questão de fundo
A matéria em apreciação é exclusivamente de Direito e prende-se em saber se a isenção de imposto do selo prevista no artigo 7, nº1 e) do respetivo Código é suscetível de ser aplicada no caso vertente aos empréstimos contraídos pela Requerente junto de instituições de crédito, nos moldes explanados anteriormente.
A dúvida, fundamentalmente, reside em saber se a Requerente é uma instituição financeira, sendo certo que é uma SGPS, ainda que sem participações em instituições financeiras, mas beneficiando da isenção por força da remissão para a legislação comunitária pelo normativo do CIS, que a consideraria, na ótica da Requerente, uma instituição financeira ou, se, pelo contrário, como defende a AT, a mesma não preenche o requisito subjetivo necessário para ser considerada como tal, ou seja, ser considerada uma verdadeira instituição financeira, sujeita aos poderes de supervisão do Banco de Portugal e atuando como tal no mercado, sujeitando-se a todos os requisitos e exigências que uma instituição financeira tem de preencher para atuar no mesmo.
Por outro lado, o Tribunal tem conhecimento de que já foram proferidas diversas decisões arbitrais sobre a matéria em causa (processos arbitrais nº’s 559/2020-T, 3/2020-T, 911/2019-T, 856/2019-T, 669/2018-T, entre vários outros) e encontram-se para apreciação outros casos, sendo certo que a jurisprudência do CAAD se divide sensivelmente metade por metade nas decisões proferidas, umas dando razão ao sujeito passivo e outras à administração tributária, ambas com argumentos de peso, umas de natureza mais literal (os favoráveis aos sujeitos passivos), outras de natureza mais argumentativa e teleológica (as favoráveis à AT).
Impõe-se que, na omissão do legislador que bem poderia suprir as dúvidas que se colocam legitimamente, clarificando legislativamente o normativo em apreço, e não havendo ainda um acórdão de uniformização de jurisprudência do STA, tenhamos de olhar para a lei tal qual ela se colocava à data dos factos sob apreciação, para os argumentos expendidos nas diversas decisões arbitrais e formar o nosso juízo, decidindo a final a questão que nos foi submetida.
Também o Tribunal dirá que face ao acervo muito vasto de argumentário já expendido nas decisões arbitrais anteriores conhecidas e tendo por base dois que podem servir de “farol” em toda esta problemática (Processo nº 856/2019-T, de 2020-11-09 e 91/2019-T, de 2020-09-05), diremos que não seremos particularmente inovadores e que, no essencial, reproduziremos os argumentos expendidos na decisão arbitral que consideramos mais conforme ao caso concreto, sendo certo que, no essencial, a questão de Direito principal em todas estas decisões arbitrais é sempre idêntica.
Nesta ordem de ideias, como antes se disse, o que está em causa é a aplicação ou não da isenção constante da alínea e) do nº 1 do artigo 7º do CIS que prevê:
“e) Os juros e comissões cobrados, as garantias prestadas e, bem assim, a utilização de crédito concedido por instituições de crédito, sociedades financeiras a sociedades de capital de risco, bem como a sociedades financeiras e instituições financeiras, a sociedades de capital de risco, bem como a sociedades ou entidades cuja forma e objeto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária, umas e outras domiciliadas nos Estados membros da União Europeia ou em qualquer Estado, com exceção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado, a definir por portaria do Ministro das Finanças”.
Ora, conforme resulta das peças apresentadas pela Requerente, esta considera que, ao ser uma SGPS. terá de ser considerada como instituição financeira, ao abrigo do artigo 3º, nº 1, ponto 22 da Diretiva 2013/36/EU e do artigo 4º, nº 1, ponto 26 do Regulamento EU nº 575/2013.
Pelo contrário, a AT entende que uma SGPS que não detenha uma participação qualificada numa instituição financeira nunca poderá ser qualificada como instituição financeira e, logo, nunca poderá beneficiar da isenção do artigo 7º do CIS.
Face a esta divergência, como já se disse supra, importa agora decidir. Seguindo de perto o conteúdo da decisão arbitral relativa ao processo nº 856/2019-T, de 2020-11-19 e das remissões que aí são feitas para outras decisões arbitrais (como é o caso da relativa ao processo nº 348/2016-T), aí se aponta que o artigo 7º, nº 1 al. e) do CIS divide-se em duas partes, uma primeira, de natureza objetiva, onde enunciam taxativamente “os juros e comissões cobrados, as garantias prestadas e, bem assim, a utilização de crédito concedido” e uma segunda, de natureza subjetiva, que se subdivide em (i) instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras e (ii) sociedades de capital de risco, bem como a sociedades de ou entidades cuja forma e objeto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras previstas na legislação comunitária, umas e outras domiciliadas nos Estados membros da União Europeia ou em qualquer Estado, com exceção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado, a definir por portaria do Ministro das Finanças”.
Ora, assim sendo, e como sabemos, face ao princípio da tipicidade fechada contemplada no nº 2 do artigo 103º da CRP, os benefícios fiscais só podem ser concedidos se os objetivos que lhes subjazem sejam superiores aos que resultariam da tributação, não sendo, pois, de admitir a aplicação analógica na sua concessão.
Por consequência, a nosso ver, ou a isenção está expressamente prevista ou então não poderá ser concedida. Ora, isto justamente prende-se com saber se a remissão do CIS para o conceito de instituição de crédito, sociedade financeira e instituição financeira contemplada na legislação comunitária cobre ou não as SGPS que não detenham participações qualificadas em instituições financeiras e não atuem no mercado como se de verdadeiras instituições financeiras se tratassem.
Como se menciona na decisão arbitral relativa ao processo nº 856/2019-T, “na lei portuguesa não encontramos uma definição de instituição financeira limitando-se o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), aprovado pelo Decreto- Lei 298/12, de 31/12 a proceder à enumeração das entidades que qualifica casuisticamente como “instituições de crédito” (artigo 3º), “Empresas de investimento” (artigo 4º-A) e “Sociedades Financeiras” (artigo 6º), e no artigo 6º, nº1 alínea b) refere que são instituições financeiras as referidas nas subalíneas ii e iv da alínea z) do artigo 2º-A, nas quais se incluem: i) As sociedades financeiras de crédito; ii) As sociedades de investimento; iii) As sociedades de locação financeira; iv) As sociedades de factoring; v) As sociedades de garantia mútua; vi) As sociedades gestoras de fundos de investimento; vii)As sociedades de desenvolvimento regional; viii) As agências de câmbios; ix) As sociedades gestoras de fundos de titularização de créditos; x)As sociedades financeiras de microcrédito”.
Diga-se, de passagem, que o anteprojeto de Código das Atividades Bancárias, que esteve em processo de auscultação pública, manteve o entendimento de que as SGPS só ficam sujeitas à supervisão bancária desde que possuam uma participação qualificada numa instituição financeira, sendo que as que possuem uma participação numa instituição de seguros ficam sujeitas à supervisão da ASF.
Na esteira do que se disse, a decisão arbitral que vimos seguindo, menciona que da leitura do Regulamento (EU) nº 575/2013 de 26 de junho, entende-se por instituição financeira “uma empresa que não seja uma instituição, cuja atividade principal é a aquisição de participações ou o exercício de uma ou mais atividades enumeradas no Anexo I, pontos 2 a 15 da Diretiva 2013/36/EU, incluindo, entre outras, uma companhia financeira, uma companhia financeira mista, uma instituição de pagamentos e uma sociedade de gestão de ativos, mas excluindo as sociedades gestoras de participações no setor segurador e as sociedades de gestão de participações de seguros mistas.
Por seu turno, no ponto 27) do artigo 4º do Regulamento (EU) nº 575/2013, entende-se por entidade do setor financeiro, entre outras:
-Uma instituição,
-Uma instituição financeira;
-Uma empresa de serviços auxiliares incluída na situação financeira consolidada de uma instituição;
-Uma empresa de seguros:
-Uma empresa de seguros de um país terceiro;
-Uma empresa de resseguros;
-Uma empresa de resseguros de um país terceiro;
- Uma sociedade gestora de participações do setor de seguros.
Ora, para termos uma visão que não se quede unicamente pela literalidade do texto legal, importa compreender de que realidades está o legislador a falar, quando pretende referir-se a instituições financeiras e se estas comportam ou não as SGPS que não detenham participações no âmbito financeiro.
Assim, dos diversos considerandos do Regulamento atrás citado diz-nos, o considerando 5, que o mesmo (Regulamento) deve ler-se conjuntamente com a Diretiva 2013/36/EU, sendo significativo o que dispõe o considerando nº 6 que estabelece que ambos os textos devem conter “as disposições relativas ao acesso à atividade das instituições, às modalidades do seu governo e ao seu quadro de supervisão, tais como as disposições que regem a autorização da atividade, a aquisição de participações qualificadas, o exercício da liberdade de estabelecimento e da liberdade de prestação de serviços, aos poderes dos Estados-Membros de origem e de acolhimento nesta matéria e as disposições que regem o capital inicial e a supervisão das instituições.”
Por seu turno, o considerando 7 refere que “o presente regulamento deverá, nomeadamente, conter os requisitos prudenciais aplicáveis às instituições que estão estritamente relacionadas com o funcionamento do mercado bancário e do mercado dos serviços financeiros e que se destinam a garantir a estabilidade financeira dos operadores nesses mercados, bem como um elevado nível de proteção dos investidores e depositantes”
Tudo isto inculca, a nosso ver, que a Diretiva e o regulamento comunitários manifestamente não são de aplicação para uma vulgar SGPS que não detenha participações em instituições financeiras.
No caso em apreço, evidentemente que o C... ou o B... são entidades financeiras. Todavia, a isenção aqui em análise não é essa, mas sim a da entidade sobre quem recai o encargo do imposto nos termos do artigo 3º do CIS. Significa tal que os bancos contrataram empréstimos a favor de uma SGPS, como se disse supra, tendo autoliquidado imposto do selo que debitaram à entidade que é a que suporta o imposto, justamente por ela não ser uma entidade que possa beneficiar das isenções das instituições financeiras, porque lhe falta esse requisito subjetivo.
Aliás, basta ver o regime jurídico aplicável às SGPS (Decreto-Lei nº 495/88, de 30 de dezembro) e também à ora requerente que não faz depender de nenhuma autorização prévia a ser concedida pelo Banco de Portugal, não cabendo a este regulador a tarefa de supervisionar a sua atividade, o que não poderia deixar de acontecer, caso a mesma fosse considerada uma entidade financeira. Aliás, tal resulta muito claramente do artigo 117º do RGICSF que determina que só ficam sujeitas à supervisão do Banco de Portugal as SGPS “quando as participações detidas, direta ou indiretamente, lhes confiram a maioria dos direitos de voto em uma ou mais instituições de crédito ou sociedades financeiras”
Assim, do nosso ponto de vista, a argumentação de que é com base no Direito comunitário conjugado, por remissão do CIS, que deve ser concedida isenção de imposto do selo à requerente não tem cabimento face aos normativos legais que analisámos ao longo da decisão arbitral.
Diga-se, a finalizar, que, de modo explícito, a Requerente insinua uma ilegalidade na forma como a AT interpreta o CIS. Como foi dito a AT defende que o artigo 7º do CIS não consagra a isenção pretendida pela Requerente por entender que esta somente abarca as SGPS’s que possuam participações em instituições financeiras e, como tal, sejam sujeitas ao controlo e supervisão do Banco de Portugal.
Por seu turno, a Requerente invoca que “as normas de impostos e benefícios fiscais são insuscetíveis de serem modificados casuisticamente por via administrativa ou outra, a pretexto de que, no critério do aplicador da lei, a Assembleia da República deveria ter legislado de forma diferente”.
Ora, desde logo, dir-se-á que não há aqui uma eventual ilegalidade na interpretação da AT até porque, para quem sustenta que a interpretação está correta, como é o caso do Tribunal, não pode deixar-se de dizer que se não descortina que haja uma qualquer ilegalidade na referida interpretação.
DECISÃO
Termos em que este Tribunal decide:
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Negar provimento ao pedido da Requerente de anular o ato de liquidação do imposto do selo que havia sido solicitado;
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Negar, consequentemente, o pedido formulado de condenação da Requerida no pagamento dos juros indemnizatórios;
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Condenar no pagamento da taxa de justiça a Requerente.
VALOR DO PROCESSO
De harmonia com o disposto com o disposto no artigo 97º-A, alínea c) do CPPT e 3º, nº2 do Regulamento de Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se em 629.984,75€ o valor do processo.
CUSTAS
Fixa-se em 9.486,00€ o valor da taxa de arbitragem prevista no Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem, a ser suportada pela Requerente.
Notifique.
Lisboa, 13 de dezembro de 2021
Árbitro Presidente
(Manuel Luís Macaísta Malheiros)
Árbitro vogal
(Vasco Valdez)
Nos termos do artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo Decreto-Lei 20/2020, de 1 de maio, atesto a conformidade do Árbitro presidente, Senhor Desembargador Manuel Luís Macaísta Malheiros, e do Árbitro Vogal, Senhor Dr. Jorge Belchior de Campos Laires
Árbitro vogal
(Jorge Belchior de Campos Laires)