Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 24/2014-T
Data da decisão: 2014-11-05  Selo  
Valor do pedido: € 94.549,25
Tema: IS - Verba 17.1.4
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DECISÃO ARBITRAL

 

Requerente: A, sociedade anónima com sede na ..., freguesia de ..., ..., com o número de matrícula e de pessoa colectiva ..., adiante designada por Requerente ou por A

 

Requerida: Administração Tributária e Aduaneira, adiante designada por AT

 

 

 

I. RELATÓRIO

 

1.      A Requerente apresentou, no dia 9 de Janeiro de 2014, um pedido de constituição de tribunal arbitral colectivo em matéria tributária, que foi aceite, visando a declaração de ilegalidade dos actos tributários de liquidação de Imposto do Selo (IS, de ora em diante) dos anos de 2009 e 2010, referentes à aplicação da verba 17.1.2 e 17.1.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo (de ora em diante “TGIS”) a um conjunto de operações financeiras identificadas no Pedido infra, solicitando a anulação das liquidações de IS bem como o pagamento de juros indemnizatórios a seu favor.

2.      Os actos tributários objecto do pedido de pronúncia arbitral são os seguintes:

a.       Liquidação de Imposto de Selo de 2009 nº 2013 ..., notificada por via electrónica à Requerente em 19/08/2013 que fixou o valor do imposto de selo a pagar € 37.168,57 acrescido de juros compensatórios de € 5.455,65;

b.      Liquidação de Imposto de Selo de 2010 nº 2013 ... notificada por via electrónica à Requerente em 19/08/2013 que fixou o valor do imposto de selo a pagar € 57.380,68 acrescido de juros compensatórios de €6.586,27;

3.      Em 17 de Fevereiro de 2014 a Direcção de Finanças de ... veio considerar que, relativamente ao ano de 2009 foi apurado imposto de selo em falta cuja liquidação não foi notificada ao contribuinte dentro do prazo de quatro anos a contar do respectivo facto tributário em harmonia com o disposto no artigo 45º da LGT conjugado com os nº 5 e 39º nº 1 do Código do Imposto de Selo.

4.      Nestes termos decidiu revogar parcialmente o despacho de 26 de Junho de 2013, que sancionou o relatório da Inspecção Tributária e determinou a liquidação de imposto do selo referente aos factos respeitantes ao ano de 2009, anulando imposto de selo, por caducidade do direito de liquidação, nos montantes seguintes:

                                                              i.      Empréstimos à casa mãe com enquadramento na verba 17.1.4 da TGIS - € 7.007,68

                                                            ii.      Empréstimos à C com enquadramento na verba 17.1.2 da TGIS - € 10.500,00

                                                          iii.      Empréstimos à D com enquadramento na Verba 17.1.4 da TGIS  - € 2.322,23.

 

5.      Mantendo as liquidações de imposto de selo relativamente aos empréstimos do ano de 2009 no total de € 17.338,66, discriminadas da seguinte forma:

 

Mês                  B                   C         D         Soma

                                              

Setembro                      3.012,07                               757,25             3.769,32

Outubro                        3.112,47                               782,49             3.894,96

Novembro       3.012,07          1.000,00          757,25              4.769,32

Dezembro       3.122,57          1.000,00          782,49              4.905,06

Total                                      12.259,18        2.000,00          3.079,48          17.338,66

 

 

6.      Bem como as liquidações de imposto de selo notificadas ao contribuinte com referência ao ano de 2010.

7.      A Requerente, notificada da decisão de revogação parcial do acto de liquidação de imposto de selo de 2009, decidiu pronunciar-se sobre a mesma, ao abrigo da parte final do nº 2 do artigo 13º do RJAT, mantendo o interesse no prosseguimento dos autos.

8.      Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do art.º 6.º e da alínea b) do n.º 1 do art.º 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pelo art.º 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa designou como árbitros Jorge Lino Ribeiro Alves de Sousa (árbitro-presidente), António Martins e Ana Teixeira de Sousa, que aceitaram o encargo, não tendo as partes, depois de devidamente notificadas, manifestado oposição a essa designação.

9.      Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do art.º 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pelo art.º 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído a 12 de Março de 2014.

10.  Notificado o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária e Aduaneira (de ora em diante designada por AT ou “Requerida”) para, querendo, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e solicitar produção de prova adicional, foi apresentada resposta em 9 de Abril de 2014, subscrita pelos juristas Senhores Dra. … e …, em nome e representação da Requerida.

11.  A Requerente veio no dia 16 de Abril requerer a junção aos autos dos documentos identificados na petição inicial.

a.       A tradução do Doc. n.º 3 junto ao R.I – contrato entre a empresa C e a Requerente de 24/03/2009 para aquisição à C das acções representativas da totalidade do capital social da empresa D, SARL

b.       O Documento mencionado na alínea s) do artigo 34 do R.I. e a respectiva tradução – contrato de empréstimo outorgado em 31/03/2009, que titula a transferência de um montante de € 1.600.000,00 da B a favor da A;

c.        O Documento mencionado na alínea hh) do artigo 34. do R.I. e a respectiva tradução –  contrato de empréstimo outorgado em 21/07/2009 que titula a transferência da B para a A dos meios financeiros para a A adiantar à C a quantia de € 3.500.000,00 por conta da opção de compra de um imóvel industrial sito em ...  .

12.  O tribunal, por despacho do seu presidente, de 17 de Abril de 2014 notificou a AT da junção dos documentos entregues pela Requerente.

13.  No dia 22 de Abril realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT.

14.  Na reunião ficou acordado que a inquirição de testemunhas seria dispensada.

15.  O tribunal deu um prazo de 10 dias à Requerida para se pronunciar sobre os documentos juntos aos autos pela Requerente em 17 de Abril.

16.  A AT, em 30 de Abril de 2014 apresentou um requerimento a sustentar a rejeição da documentação apresentada pelo Requerente.

17.  O tribunal decidiu que a decisão final seria apresentada até ao dia 17 de Junho sendo que, dada a complexidade da situação, foi a mesma adiada, tendo a data da prolação da decisão sido prorrogada até dia 12 de Setembro.

Por doença do Presidente do Tribunal Arbitral não foi possível proferir a decisão até àquela data.

Mantendo-se aquela situação de doença, por despacho do Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD foi determinada a substituição temporária do Presidente do Tribunal Arbitral pelo Cons. Jorge Lopes de Sousa.

 

18.  O pedido de Pronúncia arbitral

 

     Sintetizando, os fundamentos apresentados pela Requerente são os seguintes:

- A Requerente é uma sociedade que tem por objecto a compra, venda e revenda de imóveis;

 

- A Requerente é detida em relação de domínio pela B (B, de ora em diante), com sede em Hong Kong que detém 99,96% do seu capital social com a qual efectuou diversas operações de natureza financeira;

 

- Fazem parte do mesmo grupo empresarial as seguintes empresas:

i) C;

ii) E;

iii) F;

iv) G;

v) H;

vi) D (esta com sede na Polónia)

 

- Estas empresas têm participações cruzadas sendo detidas directa ou indirectamente pelo Sr. X e família;

 

- Na sequência da abertura de procedimento de inspecção pela AT foi produzido o Relatório da Inspecção Tributária (RIT) comunicado à Requerente pela Direcção de Finanças de ... em 26/06/2013.

 

- As notificações das liquidações impugnadas foram depositadas na caixa de correio electrónico (Via CTT) da Requerente em 19/08/2013 com prazo para pagamento voluntário que terminava em 11/10/2013.

 

- A Requerente efectuou o pagamento do tributo que lhe era exigido, apesar de discordar das liquidações por as considerar ilegais;

 

- A Requerente pagou o valor do IS objecto das liquidações, com o valor de € 37.168,57 (referente a 2009) e € 57.380,68 (referente a 2010) tendo optado por regularizar o pagamento do imposto ao abrigo do Decreto-Lei nº 151-A/2013, de 31 de Outubro, pelo que foi dispensado o pagamento dos juros compensatórios.

 

- A Requerente entende que, tendo as liquidações contestadas sido depositadas na sua caixa postal em 19/08/2013 e não tendo acedido à sua caixa postal nesse dia nem em nenhum dos 25 dias seguintes, a notificação das liquidações se considera efectuada apenas em 13/09/2013, nos termos do disposto nos nºs 9 e 10 do artigo 39º do CPPT, referente á data em que se consideram efectuadas as notificações por transmissão electrónica de dados.

 

- Pelo que, atendendo ao prazo de caducidade do imposto de 4 anos, se deverão considerar nulas todas as liquidações na parte que respeitam a factos tributários ocorridos antes do dia 13/09/2009.

 

- No relatório da inspecção tributária (RIT) as operações financeiras sobre as quais a AT veio liquidar IS operações são agrupadas e analisadas no âmbito do seguinte esquema classificatório:

 

a) Contratação de empréstimos à empresa mãe

b) Celebração de empréstimos com empresas terceiras

                                                  b.1) Acordos com a empresa C

b.2) Acordos coma empresa F e G

c) Empréstimo efetuado à empresa D

d) Empréstimo efetuado à empresa C

 

- No que respeita a “Contratação de Empréstimos à casa mãe” a Requerente, estribando-se em documentos que, com a Petição Inicial (PI), são trazidos ao Processo, alega que a AT, no que respeita a estas operações de “Contratação de empréstimos à empresa mãe”, incorre sempre em erro de qualificação dos factos tributários. Assim seria porque os ditos documentos provariam que as diversas operações em causa – adiante analisadas – e que somariam o valor de € 9.235.516,00, evidenciavam datas determinadas para o seu início e fim, e não seriam por isso qualificáveis em sede do IS como “por tempo indeterminado”.

 

- Efectivamente, o montante do saldo de 2009 de € 7.719.516,00 de que a B (B) era credora da Requerente respeita às seguintes operações:

 

1º - o crédito da B sobre a A, no valor de € 2.888.667,00, resulta de uma cessão de créditos efectuada em 01/03/2009 referente a dois créditos – e respectivos juros – que a B tinha contratado com a C em 14/03/2008 e 01/08/2008 com prazos de vencimento para 20/07/2008 e 31/07/2008.

 

Na data da cessão destes créditos à A, ora Requerente, o prazo de vencimento da primeira operação foi prorrogado de 20/07/2008 para 31/03/2009.

 

A Requerente entende que não poderia ter sido liquidado IS nos termos da Verba 17.1.4 da TGIS, como uma operação de conta corrente por prazo não determinado, mas eventualmente IS nos termos da Verba 17.1.1 da TGIS (cessão de crédito concedido por prazo inferior a 1 ano no caso do primeiro contrato (que junta com a petição inicial) bem como a prorrogação do seu vencimento e, no caso dos valores cedidos referentes ao segundo contrato (que também junta) IS previsto na Verba 17.1.2, relativo a cessão de crédito por prazo superior a 1 ano.

Em qualquer dos casos entende a Requerente que o IS é devido na data da cessão dos créditos e na data da prorrogação do vencimento de um deles ou seja, em 01/03/2009. Sendo que, tendo a liquidação do IS sido notificada à Requerente mais de 4 anos após esta data encontrava-se já caducado o direito da AT a liquidar este imposto.

 

A Requerente juntou à petição inicial os documentos que titulam os contratos de empréstimo/adiantamento celebrados entre a B, a C e a D, bem como as respectivas traduções para língua portuguesa.

 

O crédito no montante de € 741.500,00 da B sobre a Requerente resulta de uma assunção de dívida efectuada pela A como preço/contrapartida dada à E de uma cessão de créditos que esta lhe efectuou em 01/03/2009, referente a dois créditos e respectivos juros que a E tinha sobre a C e sobre a D desde 31/05/2008.

 

Na data da cessão destes créditos à A foram fixados prazos de vencimento para 31/12/2009 (dívida da D) e 31/03/2009 (dívida da C).

 

A Requerente entende que não poderia ter sido liquidado IS nos termos da Verba 17.1.4 da TGIS, como uma operação de conta corrente por prazo não determinado, mas eventualmente IS nos termos da Verba 17.1.1 da TGIS (cessão de crédito concedido por prazo inferior a 1 ano.

 

Entende a Requerente que o IS é devido na data da cessão do crédito ou seja, em 01/03/2009. Tendo a liquidação do IS sido notificada à Requerente mais de 4 anos após esta data encontrava-se já caducado o direito da AT a liquidar este imposto.

 

 3º O montante de € 1.600.000,00 diz respeito a uma transferência da B a favor da A, efectuada em 01/04/2009 com o objectivo de financiar a Requerente para pagamento do preço de aquisição à C das acções representativas da totalidade do capital social da empresa com sede na Polónia, D.

 

A Requerente alega que esta transferência foi efectuada ao abrigo de um contrato de empréstimo de sócio, outorgado pelo prazo de 5 anos, com data prevista de reembolso em 31/03/2014 e protesta juntar cópia do referido contrato.

 

A Requerente entende que não poderia ter sido liquidado IS nos termos da Verba 17.1.4 da TGIS, como uma operação de conta corrente por prazo não determinado, mas eventualmente IS nos termos da Verba 17.1.3 da TGIS (concessão de crédito por prazo superior a 5 anos).

 

Entende a Requerente que o IS é devido na data da concessão do crédito ou seja, em 01/03/2009. Tendo a liquidação do IS sido notificada à Requerente mais de 4 anos após esta data encontrava-se já caducado o direito da AT a liquidar este imposto

 

 

4º Outra parte do saldo de 2009 respeita a três transferências recebidas pela A da B, num total de € 2.500.000,00,da seguinte forma:

i.                    € 1.100.000,00 em 27/07/2009

ii.                  € 1.200.000,00 em 28/08/2009

iii.                € 200.000,00 em 28/12/2009

 

Através o qual a B visou dotar a A dos meios financeiros para esta concretizar um financiamento à C, num montante global de € 3.500.000,00 em que esta recebia o financiamento com opção de compra de um imóvel industrial sito em ....

 

Esta operação de adiantamento da B à A encontra-se titulada por um contrato de empréstimo de sócio com data de 21/07/2009 que prevê a entrega das verbas pela A à C e fixa o prazo de reembolso em 31/07/2011.

 

A Requerente protestou juntar o contrato e respectiva tradução, o que fez subsequentemente em 17 de Abril.

 

A Requerente entende que se trata de uma operação de crédito e que, nos termos da alínea g) do nº 1 do artigo 5º do Código do Imposto de Selo a obrigação tributária se considera “… constituída, nas operações de crédito, no momento em que forem realizadas”.

 

Concluindo a Requerente que “num contrato de mútuo com valor determinado, mesmo que prevendo sucessivas tranches de utilização, o facto tributário nasce com a assinatura do contrato, sendo devido o IS nesse momento, pelo valor máximo de financiamento contratado.

 

A Requerente entende que não poderia ter sido liquidado IS nos termos da Verba 17.1.4 da TGIS, como uma operação de conta corrente por prazo não determinado, mas eventualmente IS nos termos da Verba 17.1.2 da TGIS (concessão de crédito por prazo superior a 1 ano).

 

Entende a Requerente que o IS é devido na data da celebração do contrato de financiamento ou seja, em 21/07/2009. Tendo a liquidação do IS sido notificada à Requerente mais de 4 anos após esta data encontrava-se já caducado o direito da AT a liquidar este imposto.

 

- Em 2010 existe um valor de € 1.520.000,00 de lançamentos a crédito da B efectuados na contabilidade da A justificados pela Requerente da seguinte forma:

 

       1º Dois lançamentos no montante de:

 € 660.000,00 em 04/03/2010 e

 € 340.000,00 em 24/05/2010

      

       Que correspondem às duas últimas utilizações do financiamento obtido junto da B para adiantar à C e que foram efectivamente adiantadas.

 

Tratam-se assim das duas tranches de um financiamento global contratado entre a B e a A em 21/07/2009 e com prazo de reembolso integral em 31/07/2011.

 

A Requerente entende que não poderia ter sido liquidado IS nos termos da Verba 17.1.4 da TGIS, como uma operação de conta corrente por prazo não determinado, mas eventualmente IS nos termos da Verba 17.1.2 da TGIS (concessão de crédito por prazo superior a 1 ano).

                                          

Entende a Requerente que o IS é devido na data da celebração do contrato de financiamento ou seja, em 21/07/2009, data em que se verifica o facto tributário. Tendo a liquidação do IS sido notificada à Requerente mais de 4 anos após esta data encontrava-se já caducado o direito da AT a liquidar este imposto.

 

2º Transferência do valor de € 520.000,00 efectuada em 11/06/2010 pela B a favor da Requerente

 

Esta transferência foi efectuada ao abrigo de um “Shareholder´s Loan Agreement and Authorisation” celebrado entre a B e a Requerente em 09/06/2010 e com um prazo de reembolso fixado para 31/08/2011.

 

Mais uma vez a Requerente entende que não poderia ter sido liquidado IS nos termos da Verba 17.1.4 da TGIS, como uma operação de conta corrente por prazo não determinado, mas eventualmente IS nos termos da Verba 17.1.2 da TGIS (concessão de crédito por prazo superior a 1 ano).

       

Entende a Requerente que o IS é devido na data da celebração do contrato de financiamento ou seja, em 09/06/2010, data em que se verifica o facto tributário, aplicando-se a taxa de 0,5% sobre a totalidade do financiamento comprometido.

 

Pelo que apenas é devido o valor de € 2.600,00 que deveria ter sido liquidado e pago uma única vez, com referência ao dia 09/06.

 

- No que toca aos acordos com a C a Requerente sustenta que o contrato de empréstimo com opção de compra de imóveis que estabeleceu com a C em 24/07/2009 e com prazo de vencimento em 31/07/2011 constitui o facto tributário.

 

- Desta forma, o facto de o empréstimo ser disponibilizado por tranches não deve afectar este enquadramento pelo que o imposto de selo seria devido na data da celebração do contrato.

 

- A AT efectuou a liquidação do imposto de selo com base na verba 17.1.2 da TGIS sobre cada uma das tranches utilizadas.

 

- A liquidação é contestada pela Requerente, alegando que o facto tributário teria nascido em 2009-07-24 (data da contratualização do crédito); estando portanto caducado o direito à liquidação na data da notificação ao contribuinte pelo menos dos valores de imposto calculados referente a 28/07/2009 (€ 5.500,00) e a 02/09/2009 (€ 5.000,00).

 

- No tocante aos “Acordos com a empresa F e G – ..., SA” estes correspondem a deliberações da assembleia geral da F, G e da Requerente, todas elas datadas de 31/03/2010, que demonstram que o móbil da transferência pela A do valor de € 280.000,00 para a F e do valor de € 240.000,00 para a G correspondeu ao pagamento do preço de dois imóveis, a adquirir pela A a cada uma destas empresas, conforme teor das actas das assembleias gerais das três empresas.

 

- Não obstante as escrituras de aquisição destes imóveis, com pagamento antecipado do preço, não terem sido formalizadas, tal não pode converter os direitos de crédito da A em operações de empréstimos.

 

- A Requerente contesta a liquidação do imposto de selo ao abrigo da verba 17.1.4 da TGIS, como uma operação de crédito em conta corrente por tempo indeterminado,  alegando que se trata de adiantamentos por conta de uma verba relativa ao preço estabelecido para a compra dos imóveis, e não uma operação de crédito na qual a  A surja como credora e as outras entidades como devedoras desses fundos.

 

- Relativamente ao alegado empréstimo à empresa polaca D a Requerente entende que não se trata de qualquer operação de financiamento concretizada pela A a favor da D nem se trata de qualquer concessão de crédito em conta corrente.

 

- Como resulta do contrato de compra e vendas das ações da D (junto como documento 3), celebrado em 24/3/2009, entre a A e a C, a primeira destas empresas adquiriu à segunda a totalidade das ações representativas do capital social da D pelo preço de € 3.355.000,00.

- Mas, em conjunto com essas acções, a A ficou também titular de um crédito sobre a D no montante de € 2.095.205,00, que se traduziam no crédito de accionista que a C detinha sobre aquela participada.

 

Não se trata, por isso, de qualquer operação de financiamento concretizada pela A a favor da D, nem se trata de qualquer concessão de crédito em conta corrente.

 

- Mas, ainda que assim fosse, o crédito da A nasce com a sua aquisição, em 24/03/2009, tendo a notificação da liquidação ultrapassado o prazo de caducidade do imposto de selo.

 

 

- Quanto ao “Empréstimo efectuado à empresa C”, a AT considerou que a A era credora, em 2010, de um montante de € 354.081,00 nos quais se incluía uma transferência para a C efectuada em 31/05/2010 no montante de € 340.000,00.

 

- Contesta este entendimento a Requerente, alegando a “(…) transferência não foi mais do que a transferência da última tranche do adiantamento de € 3.500.000,00 feiro pela A à C”.

 

- Mais ainda, refere que “(…) esta verba foi transferida para a conta do adiantamento em 31-12-2011”. Ora, sustentando também a Requerente que tal tranche ou efetiva disponibilização dos fundos não deveria dar origem a tributação, alegando (à semelhança do que se mencionou supra)  que o facto tributário teria nascido em 2009-07-24 (data da contratualização do crédito); então estaria caducado o direito á liquidação na data da notificação ao contribuinte (2003-09-13).dos factos tributários

 

- Concluindo a Requerente que, a liquidação de imposto de selo de 2009 está totalmente comprometida com base na errada qualificação dos factos tributários e com base na caducidade do direito à liquidação de imposto.

 

- E que a liquidação de 2010 se encontra igualmente comprometida com os mesmos fundamentos podendo a requerente concordar com uma imposição de imposto de selo no valor de € 2.600,00 incidente sobre a disponibilização de meios financeiros pela B à A para efeito de pagamento dos imóveis à F e à G ao abrigo da verba 17.1.2 da TGIS.

 

 

19.  Resposta da AT

 

- No tocante à “Contratação de empréstimos à empresa mãe” sustenta-se no RIT que a contabilidade da Requerente evidenciava, em 2009, um montante de suprimentos que ascendia a € 7.719.516,00. Já em 2010 o montante de suprimentos teria atingido € 1.520.000,00. Tal significa, como também se expressa no RIT, que em Dezembro de 2010 o valor acumulado destes suprimentos se elevava a € 9.235.516,00.

 

- O RIT evidencia que, relativamente ao total de € 9.235.516,00, apenas se obteve justificação documental para duas verbas que integram tal quantia global. Fá-lo no seguintes termos:

 

“Relativamente a estas operações estabelecidas entre a B e a A não existe qualquer contrato escrito nem qualquer outro documento equivalente, como por exemplo ata de reunião de conselho de administração onde estejam descritas e definidas as condições para a realização destas operações financeiras, qual o seu objetivo, prazo, condições de reembolso e eventual pagamentos de juros.

Mesmo após nova solicitação efetuada para o mesmo efeito o sujeito passivo persistiu na falta de resposta  à solicitação para o envio do contrato (anexo 3).

Apenas nos foi possível verificar que, dos €9.239.516,OO, os valores de €741.500 e €2.888.667,OO resultam de dois contratos (anexo 4), referentes respetivamente, à cedência de créditos para a A que a empresa E com o NIPC ... detinha no valor de €741.500 sobre as empresas D e C, bem como a cedência de posição que a B efectuou à A por créditos que detinha na empresa C.”

 

- Assim, a AT, alegando que apesar das solicitações à Requerente não obteve informação sobre as condições de realização, objectivos, prazos e condições de reembolso, qualifica a totalidade da verba como suprimentos – pois assim constavam na contabilidade da Requerente - sendo enquadrável na verba 17.1.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), que dispõe:

“17.1.4-Crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30”.

 

- Na Resposta, a AT entende que os documentos juntos pela Requerente com a PI não são susceptíveis de constituir meio de prova, pelo que mantém a qualificação do crédito como por tempo indeterminado.

 

- Quanto aos “Acordos com a empresa C”, consta do RIT que:

“A A estabeleceu em 2009-07-24 um contrato de empréstimo com opção de compra de terrenos e edifícios fabris e obrigação de aluguer (anexo 6) com a empresa C (doravante designada por C). Este contrato previa que a A concedesse um empréstimo de curto prazo á C no máximo de €3.500.000,00 com entregas parcelares respectivamente de €1.1 00000,00 no prazo de duas semanas após a assinatura do acordo, €1.200.000,00 até 2009-09-15 e €1.200.000,00 até 2009-12-31. Apesar de ter sido atribuída esta denominação de " empréstimo de curto prazo", o facto é que o prazo previsto no contrato abrangia um período de tempo superior a um ano, já que a possibilidade de reembolso era dada até 2011-07-31, data que se veio a verificar não ter sido cumprida.

A concessão deste empréstimo previa o pagamento de juros á taxa anual de 3%, tendo Sido convencionado que a data para o reembolso do empréstimo efetuado seria 2011-07-31.”

 

- Até á data de reembolso prevista no contrato de empréstimo celebrado em 24/07/2009, que seria até 31/07/2011, não ocorreu qualquer reembolso do empréstimo.

 

- O facto tributário relevante para a discussão é o da “utilização do crédito”, nascendo a obrigação tributária na data em que ocorre essa utilização ou, quando o prazo não seja determinado nem determinável, no último dia de cada mês.

 

- Assim, a AT liquida IS por via aplicação do artigo 2º, alínea b) do CIS e da verba 17.1.2 do mesmo Código, incidente sobre as tranches de crédito, ou de fundos cedidos, pela Requente à C.

 

No tocante aos “Acordos com a empresa F e G – ..., SA” o RIT sustenta que (p.8):

“Da análise dos elementos contabilísticos da A verifica-se o lançamento na conta 27811 -Outros devedores e credores -devedores diversos -nacionais do montante de €520.000,00, referente a duas operações efectuadas respectivamente com as empresas F (doravante designada F) e G -... SA (doravante designada por G) nos valores de €280.000,00 e €240.000,OO respectivamente.

Em esclarecimentos prestados pela A (anexo 9), constatamos que estes valores resultam de deliberações vertidas em ata de assembleia de accionistas, através das quais são manifestadas intenções reciprocas das duas empresas anteriormente identificadas e a A, de procederem à alienação/aquisição dos imóveis pertencentes àquelas.

(…)

Foi questionada a A (anexo 10), no sentido de esclarecer se existiam outros documentos que materializassem a intenção de compra e venda de Imóveis, nomeadamente contratos promessa de compra e venda ou comprovativos de troca de informações entre as empresas que comprovassem a Intenção de celebração do negócio. Não foi demonstrada a sua existência, muito embora na resposta ao e-mail se refira "segue em anexo", apenas juntou comprovativos das transferências.

Perante esta situação, verifica-se que de facto estamos perante duas situações de financiamento por parte da A às empresas F e G, que lhes permitisse fazer face à necessidade de meios financeiros para honrar os seus compromissos e lhe permitisse efetuar o encerramento da atividade, como aliás está descrito na ata n" 27 da G.”

 

- Assim, a AT liquidou IS, com base na verba 17.1.4 da TGIS, sobre as verbas transferidas da A para as duas entidades em causa.

 

- Quanto ao “Empréstimo efetuado à empresa D” menciona-se no RIT que (p. 10):

“Analisado o balancete analítico da empresa do ano de 2010 e mais concretamente a conta 4113011 Investimentos Financeiros -Empréstimos Concedidos -Empresas do Grupo -D SP. Zo, verifica-se a existência de um saldo devedor de €1.193.130,00.

A empresa D é uma sociedade sedeada na Polónia, sendo detida a 100% pela A.

O saldo apresentado no final de 2010, é o resultado de duas transferências nos valores de € 704925,00 e €2.095.205,00 (totalizando €2.800.130,00) efectuados em Março de 2009, tendo ocorrido um primeiro reembolso no valor de €907.000,00 em 2009-05-20. Em 2010-12-15 foi efectuado novo reembolso no montante €700.000,00, resultando assim um saldo ainda em divida no montante de €1.893.130,00.

Foi solicitado à empresa que nos enviasse cópia do contrato que regulasse a concessão dos empréstimos e comprovativos dos mesmos (anexo 12), não nos tendo sido exibida qualquer informação.

Mais uma vez e à semelhança do descrito nos itens 2.a) e 2.b) estamos perante operações de financiamento sujeitas a tributação em sede de imposto do selo, cujo imposto não foi liquidado e entregue”

 

 - Em função de tal qualificação, a AT liquidou IS, pela verba 17.1.4  da TGIS.

 

- Quanto ao “Empréstimo efetuado à empresa C”, alega-se no RIT (p. 11).

“Na conta 278111 -Outros devedores e credores -devedores diversos -nacional - C -, encontra-se lançado a débito o valor de €354.081,OO, Foram pedidos esclarecimentos sobre a natureza destas operações, nomeadamente, o envio de cópia dos documentos relativos aos empréstimos efetuados bem como comprovativos das transferências efetuadas como materialização de tais empréstimos.

o valor evidenciado no balancete de dezembro de 2010 apresenta o montante de € 354.081,00, que inclui o valor de €340.000,OO (anexo 14) referentes a uma transferência efetuada pela A para a C, em 2010-05-31. O sujeito passivo não justificou a natureza desta operação nem enviou os comprovativos das operações, sendo que no entanto deverá ser considerado realização de operação de financiamento à C, já que entre a C e a A não existe qualquer tipo de relação comercial, a não ser a que decorre do contrato firmado entre ambas e melhor descrito no item 2.a) do presente relatório, e que se considerou como operação de financiamento.”

 

- A AT aplica pois a esta operação a verba 17.1.4 da TGIS.

 

 II. SANEAMENTO

 

20.  O tribunal arbitral é materialmente competente, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, al. a) do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária.

21.  As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade nos termos do art.º 4.º e do n.º 2 do art.º 10.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

22.  O processo não padece de qualquer nulidade nem foram suscitadas pelas partes quaisquer excepções que obstem à apreciação do mérito da causa, pelo que se mostram reunidas as condições para a prolação da decisão arbitral.

 

 

III. FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO

 

 Factos provados

23.  Com base nas peças juntas por Requerente (pedido de pronúncia arbitral, Doc. nº 1 e segs. junto com esse Pedido; Resposta da A.T.), fixa-se a seguinte factualidade:

24.  - A Requerente é uma sociedade que tem por objecto a compra, venda e revenda de imóveis;

25.  A Requerente é detida em relação de domínio pela B (B, de ora em diante), com sede em Hong Kong que detém 99,96% do seu capital social com a qual efectuou diversas operações de natureza financeira;

26.  As notificações das liquidações de IS impugnadas foram depositadas na caixa de correio electrónico (Via CTT) da Requerente em 19/08/2013 com prazo para pagamento voluntário que terminava em 11/10/2013.

27.  A Requerente efectuou o pagamento do tributo que lhe era exigido, com o valor de € 37.168,57 (referente a 2009) e € 57.380,68 (referente a 2010) tendo optado por regularizar o pagamento do imposto ao abrigo do Decreto-Lei nº 151-A/2013, de 31 de Outubro, pelo que foi dispensado o pagamento dos juros compensatórios.

28.  A Requerente não acedeu à sua caixa postal no dia 19/08/2013 nem em nenhum dos 25 dias seguintes.

29.  O crédito da B sobre a A, no valor de € 2.888.667,00, resulta de uma cessão de créditos efectuada em 01/03/2009 referente a dois créditos – e respectivos juros – que a B tinha contratado com a C em 14/03/2008 e 01/08/2008 com prazos de vencimento para 20/07/2008 e 31/07/2008.

30.  Na data da cessão destes créditos à A, ora Requerente, o prazo de vencimento da primeira operação foi prorrogado de 20/07/2008 para 31/03/2009.

31.  O crédito no montante de € 741.500,00 da B sobre a Requerente resulta de uma assunção de dívida efectuada pela A como preço/contrapartida dada à E de uma cessão de créditos que esta lhe efectuou em 01/03/2009, referente a dois créditos e respectivos juros que a E tinha sobre a C e sobre a D desde 31/05/2008.

32.  Na data da cessão destes créditos à A foram fixados prazos de vencimento para 31/12/2009 (dívida da D) e 31/03/2009 (dívida da C).

33.  A empresa D é uma sociedade sedeada na Polónia sendo detida desde Março de 2009 pela A.

 

 Factos não provados e respectiva fundamentação

34.  Não ficou provado que o saldo de € 1.600.000 diga respeito a uma transferência da B a favor da A efectuada em 01/04/2009 com o objectivo de financiar esta empresa para pagamento do preço da aquisição à C das acções representativas da totalidade do capital social da empresa D.

35.   Efectivamente, esta aquisição de acções, bem como o contrato de empréstimo de sócio, da B à A, no montante de € 1.600.000,00, são titulados por um documento – contrato –  é titulada por um documento – contrato – que nem sequer poderiam ter sido considerados na liquidação impugnada pois não foram apresentados durante a inspecção tributária mas apenas com a petição inicial do presente processo.

36.  Acresce que esse documento não consegue só de per si demonstrar que o valor de € 1.600.000,00 foi transferido em 01/04/2009 com o dito objectivo de financiar a aquisição das acções representativas da totalidade do capital social da D.

37.  Não ficou provado o empréstimo de sócio efectuado pela B à A com data de 21/07/2009 que prevê a disponibilização de verbas a serem entregues pela A à C em 2009 e 2010.

38.   Este contrato de empréstimo de sócio, da B à A, no montante máximo de € 3.500.000 apenas foi junto após a entrega da petição inicial, pelo que também não poderia ter sido levado em consideração na liquidação impugnada.

39.  Não ficou comprovado que as transferências efectuadas pela Requerente para a F S.A e para a G, no montante de € 280.000 para a primeira empresa e € 240.000,00 para asegunda cada, correspondesse a uma antecipação do preço de pagamento de dois imóveis, dado o lapso de tempo decorrido entre as deliberações em acta das assembleias gerais e a transferência das importâncias para as duas sociedades, a inexistência de qualquer contrato promessa ou de realização de quaisquer diligências tendo em vista a realização do contrato de compra e venda, entre outros.

40.  Não ficou comprovado que que o saldo devedor da empresa D à Requerente não corresponda a qualquer operação de financiamento ou não se trata de concessão de crédito em conta corrente.

 

Fundamentação de Direito

 

41.  Resulta das posições das Partes que a questão essencial nos presentes autos consiste em saber se as diversas operações financeiras de que é parte a Requerente constituem concessão de crédito para efeitos do Código do Imposto de Selo, nomeadamente para efeitos de aplicação da Verba 17.1 da TGIS e, em caso afirmativo, se se encontra ou não caducado o direito da AT de liquidar o imposto de selo em conformidade com os arts. 45º da LGT e 39º do Código do Imposto de Selo. 

42.  A este respeito são relevantes as disposições do Código do Imposto de Selo seguintes:

Artigo 1.º
Incidência objectiva

1 - O imposto do selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens.

Artigo 2º

Incidência subjectiva

1 - São sujeitos passivos do imposto:

a) …………..

b) Entidades concedentes do crédito e da garantia ou credoras de juros, prémios, comissões e outras contraprestações

Artigo 3.º
Encargo do imposto

1 - O imposto constitui encargo dos titulares do interesse económico nas situações referidas no artigo 1.º
2 - Em caso de interesse económico comum a vários titulares, o encargo do imposto é repartido proporcionalmente por todos eles.
3 - Para efeitos do n.º 1, considera-se titular do interesse económico:

a)

……………………………
f) Na concessão do crédito, o utilizador do crédito;

Artigo 7.º
Outras isenções

1 - São também isentos do imposto:

a) …….
b) …….
c) …….
d) ……….

f) …………………

g) As operações financeiras, incluindo os respetivos juros, por prazo não superior a um ano, desde que exclusivamente destinadas à cobertura de carência de tesouraria e efetuadas por sociedades de capital de risco (SCR) a favor de sociedades em que detenham participações, bem como as efetuadas por outras sociedades a favor de sociedades por elas dominadas ou a sociedades em que detenham uma participação de, pelo menos, 10 % do capital com direito de voto ou cujo valor de aquisição não seja inferior a (euro) 5 000 000, de acordo com o último balanço acordado e, bem assim, efetuadas em benefício de sociedade com a qual se encontre em relação de domínio ou de grupo; (
h) As operações, incluindo os respectivos juros, referidas na alínea anterior, quando realizadas por detentores de capital social a entidades nas quais detenham directamente uma participação no capital não inferior a 10% e desde que esta tenha permanecido na sua titularidade durante um ano consecutivo ou desde a constituição da entidade participada, contanto que, neste último caso, a participação seja mantida durante aquele período;
i) Os empréstimos com características de suprimentos, incluindo os respectivos juros efectuados por sócios à sociedade

43.  Por seu lado, a verba 17 da TGIS estabelece as seguintes regras de tributação das operações financeiras:

 

Operações financeiras:

   

 

 

17.1

 

Pela utilização de crédito, sob a forma de fundos, mercadorias e outros valores, em virtude da concessão de crédito a qualquer título excepto nos casos referidos na verba 17.2, incluindo a cessão de créditos, o factoring e as operações de tesouraria quando envolvam qualquer tipo de financiamento ao cessionário, aderente ou devedor, considerando-se, sempre, como nova concessão de crédito a prorrogação do prazo do contrato - sobre o respectivo valor, em função do prazo:

   
 

17.1.1

 

Crédito de prazo inferior a um ano - por cada mês ou fracção

0,04%

 
 

17.1.2

 

Crédito de prazo igual ou superior a um ano

0,50%

 
 

17.1.3

 

Crédito de prazo igual ou superior a cinco anos

0,60%

 
 

17.1.4

 

Crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30

0,04%

 

44.  A fim de dilucidar a questão em análise, deve começar-se por enquadrar as operações de crédito no IS. Para tal, a lei, a doutrina e decisões arbitrais sobre este mesmo imposto serão muito relevantes. E tal enquadramento deve responder à seguinte questão essencial: da conjugação do artigo 5º, alínea g) do CIS, com o texto da verba 17 (em particular da verba 17.1 da TGIS) que condições devem verificar-se para a sujeição efectiva a IS das operações de crédito?

45.  Como sublinham J. Silvério Mateus e L. Corvelo de Freitas, “Os Impostos sobre o Património. O Imposto do Selo: Anotados e Comentados”, Lisboa, Engifisco, 2005, p.734 “O facto gerador da obrigação tributária é, de acordo com a alínea g) do artigo 5º, a utilização do crédito, não sendo, pois, as aberturas de crédito especialmente tributadas enquanto tal utilização não se verifique.”

46.  Mais sublinham os autores que o texto da verba 17.1, densificando o conceito de utilização de crédito e integrando nele as operações de cessão de créditos, impõe a condição de estas envolverem qualquer tipo de financiamento ao cessionário. Assim, a simples cessão de créditos, se for caracterizada pela mera mudança dos titulares da relação jurídico-obrigacional, não implica a incidência do IS.

47.  Sobre a tributação em IS das operações de crédito, Carlos Batista Lobo, “As operações financeiras no Imposto do Selo: enquadramento constitucional e fiscal”, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, I, 1, p. 86, escreve: “A utilização do crédito, quer por via geral (verba 17), quer por via de títulos de crédito (verba 23) tem um fundamento de legitimação bastante mais dúbio. De facto (…) a tributação da utilização do crédito parece decorrer da pressuposição por parte do legislador de uma “capacidade contributiva virtual ou aparente” decorrente da disponibilização de liquidez para investimento ou despesa. Neste caso (…) o sujeito beneficiário da operação de crédito beneficia de um aumento de liquidez financeira num momento actual…”.

48.  E, mais diante, continua o autor “Ora, nestas condições os fundamentos de legitimação deste tipo tributário estão no limite da constitucionalidade. De facto para existir tributação é necessária a existência de uma realidade económica de base que a sustente (…) Todas estas realidades tributárias – rendimento, consumo, património – têm subjacente uma materialidade que sustenta o pressuposto impositivo(...) Ora, a tributação  da utilização de crédito encontra-se no limiar desta fundamentação(…).”

49.  A questão da tributação das operações de crédito em sede do IS – embora de natureza diversa das que aqui se analisam - foi já objeto de decisão arbitral. No Processo 107/2013-T, expressa-se o seguinte entendimento:

Importa pois apreciar a verificação no caso concreto dos pressupostos tipificados na verba 17.1.4.  Em primeiro lugar tem de constatar-se estarmos perante uma efectiva utilização de crédito, sendo a própria Requerente que assume ter celebrado contratos de mútuo gratuitos com os seus clientes e ter-lhes cedido efectivamente fundos face às suas [dos clientes] carências financeiras.

De facto, independentemente da finalidade visada para os fundos cedidos, ocorreu uma utilização de crédito por parte dos clientes da Requerente (quando da mobilização efectiva dos fundos, materializada por transferência bancária ou por cheque) com base num negócio jurídico típico de concessão de crédito (contrato de mútuo, nos termos previstos nos artigos 1142.º e seguintes do Código Civil[2]) que não é equiparável a outro tipo de situações que caem fora do âmbito da norma e que consistem no mero diferimento temporal do pagamento de bens ou serviços concedido pelo respectivo fornecedor ou prestador.

50.  Com efeito, no caso em apreciação ocorreu uma efectiva transferência de fundos, não se tratando da mera concessão de um prazo alargado de pagamento por parte da Requerente na sua qualidade de prestadora de serviços. Bem além disso, verificou-se um dispêndio financeiro da Requerente que teve de recorrer aos seus fundos próprios e alheios (do banco) para fazer face às obrigações por si assumidas nos contratos de mútuo celebrados com os clientes.

51.  Acresce assinalar que a verba 17.1 abrange a concessão de crédito, qualquer que seja a natureza da entidade concedente e a do utilizador.

52.   Somente no que se refere a juros e comissões financeiras é que a Tabela Geral erige em pressuposto de incidência a realização por, ou com intermediação de, instituições de crédito, sociedades financeiras e quaisquer outras instituições financeiras. No entanto, estamos nesse caso no domínio de aplicação da verba 17.3 (juros e comissões) e não no âmbito da hipótese em apreciação, que se prende com a verba 17.1 (utilização de crédito). Nesta, tal restrição não tem cabimento nem a mínima correspondência na letra da lei (que não procede a qualquer distinção ou restrição) e encontram-se abrangidas, como acima salientado, quaisquer entidades.

53.  Em reforço desta interpretação o Código do Imposto do Selo considera sujeitos passivos do imposto, de forma genérica, as “entidades concedentes do crédito” (cf. art. 2.º, n.º 1, alínea g) do referido Código) sem, novamente, introduzir qualquer distinção ou restrição que possa alicerçar a tese da Requerente.

54.  Esta posição tem acolhimento na Circular n.º 15, de 5 de Julho de 2000, da Direcção de Serviços dos Impostos do Selo e das Transmissões do Património (cf. pontos 14 e 23 da Circular) e é, de igual modo, é sufragada pela doutrina.

55.  Compulsa-se, a este respeito, um excerto ilustrativo da obra de J. SILVÉRIO MATEUS e L. CORVELO DE FREITAS:

2. Sob a epígrafe “operações financeiras”, incluem-se no âmbito da incidência do imposto do selo a concessão do crédito, qualquer que seja a natureza da entidade concedente e do utilizador, a par de um conjunto de operações financeiras, de que resultem juros e comissões, que apenas ficam sujeitas a tributação em imposto do selo se forem realizadas por instituições de crédito, sociedades financeiras, outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras.

            3. Nos termos do n.º 1, a concessão de crédito está sujeita a imposto do selo, qualquer que seja a natureza e forma, relevando, contudo, para o efeito a efectiva utilização do crédito concedido e não o contrato que lhe é subjacente. Pode, assim, ser celebrado um contrato de concessão de crédito sem que tal traduza facto tributário deste imposto, o que ocorrerá sempre que a utilização de crédito não seja imediata ou se não houver utilização efectiva desse contrato. (…)

56.   Salienta-se, contudo, que o facto tributário tipificado nesta verba é a concessão de crédito ou seja, a utilização de crédito com base em negócio jurídico de concessão de crédito, cujos elementos essenciais se traduzem na prestação de um bem presente contra a promessa de restituição futura. Não é, pois, abrangido pela incidência do imposto todo e qualquer financiamento mas tão-somente o que, reunindo as referidas características, se possa qualificar de concessão de crédito. Está, assim, afastado da tributação, por exemplo, o chamado crédito ao consumo, sempre que o financiamento consista em mero diferimento no tempo do pagamento dos bens ou dos serviços adquiridos concedido pelo respectivo vendedor ou prestador” – cf. dos autores citados “Os Impostos sobre o Património Imobiliário, O Imposto do Selo, Anotados e Comentados”, 1ª Edição, 2005, Lisboa, Engifisco, pp. 732 e 733.

57.  Refere também JOSÉ MARIA FERNANDES PIRES:

“É no domínio das operações financeiras, particularmente no crédito, que se operaram as mais relevantes inovações do novo Código do Imposto do Selo na reforma operada no ano 2000. Como veremos adiante, quando tratarmos da tributação do crédito utilizado através de contrato de aberturas de crédito, o novo Código introduz duas inovações fundamentais relativamente ao anterior. Por um lado o imposto passa a incidir sobre as utilizações de crédito e não sobre a celebração dos contratos que lhes dão origem (…). Por outro lado, o tempo de duração da relação creditícia passa a ser determinante para a determinação do imposto a pagar (…).

As operações de crédito são tributadas nos termos da verba nº 17.1 da Tabela Geral.   A lei enuncia alguns tipos contratuais de concessão de crédito, como é o caso da cessão de créditos, o factoring, as operações de tesouraria, a abertura de crédito em conta corrente e o descoberto bancário.

Porém, esta enunciação é meramente exemplificativa, dado que a lei tributa a concessão de crédito independentemente da forma contratual que lhe está subjacente (“a concessão de crédito a qualquer título”, como determina a referida verba da Tabela Geral). Como antes vimos, mais que a forma do contrato que está na base da relação de crédito, o que está sujeito a imposto é a efectiva utilização do crédito pelo beneficiário.” - cf. “Lições de Impostos sobre o Património e do Selo”, 2ª Edição, 2013, Lisboa, Almedina, pp. 443 e 444 (negrito nosso).

58.   O facto de os clientes para contratarem os serviços de formação da Requerente recorrerem a fundos comunitários e de, para receberem a última tranche desses fundos comunitários, terem de demonstrar que haviam pago aos seus prestadores (in casu a Requerente) não altera a ocorrência de uma efectiva concessão de crédito por parte da Requerente, que lhes transferia dinheiro ao abrigo de contratos de mútuo, para que aqueles fizessem face às suas carências financeiras.

59.  Reitera-se que a Requerente não se limitava a diferir o momento do pagamento dos serviços (de formação) prestados até que os seus clientes estivessem em condições de satisfazer esse pagamento, caso em que estaríamos fora do campo de incidência do Imposto do Selo, pois tratar-se-ia simplesmente de uma relação comercial com um regime de pagamento diferido.

60.  Na situação em análise a Requerente entregava efectivamente dinheiro, que transferia da sua conta bancária para que aqueles utilizassem tais importâncias.

61.  Este empréstimo de fundos, ainda que por curtos períodos de tempo, não deixa de configurar uma concessão de crédito autónoma da relação comercial com os clientes, susceptível de preencher os pressupostos do facto gerador da tributação em Imposto do Selo, o que não resulta prejudicado pelo facto de existir uma conexão com a actividade da Requerente e com a dos seus clientes. Acresce que esta concessão de crédito não é, como pretende a Requerente em sede de alegações, reconduzível a uma mera “operação contabilística”.

62.  Num plano interpretativo, que concluir, pois, de tudo quanto se evidenciou neste ponto?

63.  O traço essencial, e que decorre da lei, perpassa em toda a doutrina, de forma bem vincada, e se plasmou já em decisão arbitral, implica que a sujeição a IS de operações de crédito deve assentar na efectiva utilização de fundos. Ou seja, não é a contratação destas operações, ou a sua forma de contabilização, que devem relevar de maneira decisiva.

64.  O que se deve indagar, isso sim, é se tais operações se concretizaram em disponibilização de meios líquidos e em que datas. Isto é, se e quando foi efectivado o uso de meios financeiros que forneçam ao utilizador do crédito liquidez ou disponibilidades financeiras adicionais.

65.  É pois esta uma grelha analítica fundamental para o enquadramento que se segue das questões em apreço.

66.  Antes de prosseguir, contudo, e por ser questão fulcral nos presentes autos, é necessário esclarecer quem está legalmente onerado com o ónus da prova dos pressupostos da norma em questão.

67.  A este respeito, dispõe o artigo 74.º/1 da LGT que:

“O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.”.

68.  Sendo que, nos presentes autos, a Requerida pretende fazer valer o direito a tributar as operações financeiras em causa, por as considerar como operações de concessão de crédito, especificamente tributadas no âmbito da Verba 17.1.4..

69.  A requerente, por seu lado, pretende fazer valer o seu direito à anulação das liquidações por errada qualificação da Requerida ou por se encontrar caducado o direito a liquidar IS.

70.  Daí que, no seguimento da norma da LGT atrás transcrita, a AT incumbirá a prova da existência de uma operação de utilização de crédito tributável em sede de imposto de selo.

71.  Por sua vez, à Requerente incumbirá a prova dos pressupostos de que as operações em causa, ainda que tendo natureza financeira, não constituem operações de concessão de crédito para efeitos do Código do IS ou, noutros casos, se encontra caducado o direito de liquidação de imposto pela AT, ou ainda que se aplica uma isenção de tributação, maxime, por ser isso que nos autos está em causa e resulta da norma do artigo 7.º/1/h) e i) do Código do Imposto de Selo.

72.  Este tem sido, de resto, o entendimento uniforme da jurisprudência do STA em matérias análogas, podendo consultar-se, a tal respeito, o Ac. de 24-04-1991, proferido no processo 013143, o Ac. de 14-01-2005, proferido no processo 01480/03, bem como o Ac. de 29/04/2004, proferido no processo 01680/03, em cujo sumário se pode ler:

I - Na falta de regras especiais, compete à Administração o ónus da prova da  verificação dos pressupostos legais da sua actuação, sobretudo a prova da existência dos factos tributários em que assentou a liquidação adicional impugnada.

II - Assim sendo, tendo a Administração verificado, através do exame à escrita, a existência de inexactidões ou omissões na declaração do impugnante, tem que ter-se por fundada a liquidação adicional, á que àquela apenas cumpria fazer a prova da verificação dos respectivos indícios ou pressupostos da tributação, isto é, dos pressupostos legais da sua actuação.

III - Tendo efectuado uma transacção intracomunitária que beneficia de isenção, cabia à impugnante provar a existência dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito, ou sea, a existência da alegada transmissão intracomunitária.”

73.  Vejamos então em que medida foi cumprido o disposto no artigo 74º, nº 1 da LGT.

 

A - Análise e decisão sobre a sujeição a IS da “Contratação de empréstimos à empresa mãe”

74.  O RIT - páginas 3 e 4- enquadra a verba total de € 9.235.516,00 da seguinte forma:

“Apenas nos foi possível verificar que, dos €9.239.516,OO, os valores de €741.500 e €2.888.667,OO resultam de dois contratos (anexo 4), referentes respetivamente, à cedência de créditos para a A que a empresa E com o NIPC ... detinha no valor de €741.500 sobre as empresas D sp Zoo e C, bem como a cedência de posição que a B efectuou à A por créditos que detinha na empresa C.

75.   Em resumo a A tornou-se credora daquelas empresas sem que tenha efectuado directamente o empréstimo dessas importâncias que o foram, isso sim despendidas pela empresa F -Far East Ltd, tendo em contrapartida evidenciado este valor como suprimentos efectuados pela casa mãe.

76.  A cedência de créditos da E à A e o lançamento destes em conta corrente da casa mãe B, prende-se com o facto de a E ter sido financiada em períodos económicos anteriores, por esta última, para acorrer a uma necessidade de liquidez para a concessão de um empréstimo a uma outra empresa.

77.  Por seu turno a empresa B, efectuou, em 2008, dois empréstimos á empresa C no valor total de € 2.800000,00 no sentido de dotar esta de recursos necessários para que pudesse efectuar um financiamento a uma empresa por si participada. Em 2009-03-01 o crédito que a B detinha na C é cedido à A no valor total de €2.888.667,00 sem que tivesse sido efectuado qualquer pagamento por parte da A á casa mãe, tendo efectuado a evidenciação contabilística como suprimento efectuado por parte da B.

78.  Esta cedência de créditos efectuada pelas duas empresas à A, permitiu que ao mesmo tempo que estas transferiram um direito que possuíam perante uma empresa terceira, também se desonerassem de uma obrigação perante uma outra empresa terceira (obrigação de reembolsar o empréstimo efectuado pela B). Esta situação configura uma cedência de créditos onerada com a obrigação de efectuar o seu reembolso por parte da A à B que na realidade não aconteceu, tendo por isso evidenciado contabilisticamente essa obrigação através do lançamento na conta de suprimentos.

79.   Tal como referido, o sujeito passivo evidenciou na contabilidade todas estas operações como suprimentos”.

80.  Ora, como se depreende do conteúdo do RIT, as operações com a E e com a B não implicaram qualquer efectiva utilização de fundos ou de liquidez pela Requerente. Na verdade, tais operações consistiram na assunção de valores activos (direitos) que, em regra, implicariam um pagamento por parte da Requerente ás entidades (relacionadas) que lhe cederam créditos.

81.  Não se tendo efectuado tal pagamento, a requerente contabilizou essa contrapartida como Suprimentos. Ou seja, à inscrição contabilística dos activos que derivaram dos créditos que lhe foram cedido, correspondeu na Requerente uma inscrição como passivo, em conta de suprimentos.

82.  Ora o artigo 243, nº 1, do Código das Sociedades Comerciais, define suprimento como:

“1 - Considera-se contrato de suprimento o contrato pelo qual o sócio empresta à sociedade dinheiro ou outra coisa fungível, ficando aquela obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade, ou pelo qual o sócio convenciona com a sociedade o diferimento do vencimento de créditos seus sobre ela, desde que, em qualquer dos casos, o crédito fique tendo carácter de permanência.”

83.  Assim, não resulta desta norma que o contrato de suprimento deva ter necessariamente por objecto a entrada de liquidez (a realidade que o IS visa tributar) na empresa que reconhece tais suprimentos. A operação em apreço é disso prova: o que a Requerente reconheceu foram direitos de crédito, e não uma entrada efectiva de fundos.

84.  Para que pudesse existir tributação era necessário que as contrapartidas contabilísticas do registo como suprimentos da verba de € 9.235.516,00 tivessem sido analisadas pela AT e se provasse que tais contrapartidas tinham implicado a entrada de disponibilidades financeiras, de liquidez, ou de uso efectivo de crédito por parte da requerente.

85.  A AT não logra provar esta efectiva utilização de fundos, limitando-se a referir que o valor está contabilizado como suprimentos, daí concluindo, sem mais, que tal é subsumível no facto tributário previsto na verba 17.1  do CIS.

86.  É certo que a AT alega que teve à sua disposição apenas a informação adicional sobre as operações com a E  e a B. E que os contratos juntos com a PI não valerão como prova.

87.  Mas a AT sustenta também na resposta (ponto 24.) que “não releva para o enquadramento jurídico em discussão concluir se aquelas operações financeiras consubstanciam verdadeiros suprimentos”. Continuando, no ponto 25. da resposta, por alegar que “Importa, isso sim, concluir que as operações financeiras consubstanciam verdadeiras concessões de crédito que envolvem um financiamento da Requerente à custa de capitais alheios, o que sucede quando é adiado no tempo o momento em que a Requerente é obrigada a desembolsar determinada quantia”.

88.  Tese que contraria a própria posição que a AT tem expresso e divulgado. A própria Informação do Ministério das Finanças – DSISTP – nº…, de 03.07.2002 esclarece que a cessão de créditos não configura, juridicamente, um contrato de concessão de crédito, pelo que a mesma só fica sujeita a tributação em IS se a mesma envolver um financiamento ao cessionário, e eventualmente ao cedente, conforme as condições da cedência.

89.  Não é suficiente, para a tributação em IS de uma cessão de créditos a natureza financeira da operação, importando que dos termos do contrato resulte uma forma qualquer de financiamento ao cessionário.

90.  No presente caso, não tendo sido negociado o direito de regresso do adquirente (A) perante o credor (B) em caso de incumprimento do devedor (E, C, D) parece faltar um dos elementos essenciais do contrato de concessão de crédito, a obrigação de restituição, pelo que um eventual financiamento não qualifica uma autónoma concessão de crédito.

91.  Porém, o certo é que, em sede de inspecção, a AT poderia e deveria ter analisado as contrapartidas contabilísticas do registo do montante evidenciado como suprimentos e que nesse ponto se trata. Não o fez e poderia tê-lo feito, pois tal dependeria da análise aos suportes contabilísticos da requente.

92.  Assim, não estando provado nos autos que ao registo como suprimentos correspondeu uma efectiva utilização de fundos, a liquidação IS sobre os valores aqui em análise, no montante de € 741.500,00 e € 2.888.667,00€ deverá ser considerada como tendo falta de fundamento legal e anulado o acto liquidação de 2009 nº 2013 ... de IS sobre estes montantes.

93.  Já quanto ao saldo de € 1.600.000, diz o mesmo respeito a uma transferência da B a favor da A efectuada em 01/04/2009 com o objectivo de financiar esta empresa para pagamento do preço da aquisição à C das acções representativas da totalidade do capital social da empresa D.

94.  Esta aquisição de acções é titulada por um documento – contrato – que apenas foi junto pela Requerente na petição inicial e não durante a Inspecção Tributária.

95.  Por seu turno, o valor especificamente mutuado pela B à Requerente, designado por esta como “contrato de empréstimo de sócio”, no montante de € 1.600.000 apenas foi junto após a entrega da petição inicial, nunca sendo disponibilizado durante a acção inspectiva da AT sendo a tradução simples e não legalizada e tendo a AT solicitado o desentranhamento do mesmo dos autos.

96.  O contrato de empréstimo de sócio é outorgado em 31/03/2009 e a transferência do valor da B para a A é efectuada em 01/04/2009.

97.  A efectiva transferência do valor é reconhecida pela Requerente (alínea p. do artigo 34 da PI).

98.  O contrato de empréstimo de sócio refere um prazo de reembolso não superior a 5 anos, tendo esse prazo, aparentemente, um valor indicativo.

99.  Da documentação e argumentação apresentada a Requerente não ficou provado que o financiamento tivesse um prazo determinado ou determinável.

100.   Não tendo a Requerente facultado suficiente evidência sobre as condições de realização, objectivos, prazos e condições de reembolso.

101.   Qualifica-se assim a totalidade da verba como uma concessão de crédito por prazo não determinado ou determinável, sendo enquadrável na verba 17.1.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), que dispõe:

17.1.4-Crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30”.

102.   Sendo de manter o acto de liquidação de IS de 2009 nº 2013 ... sobre os valores do saldo, na parte que não foi objecto da revogação parcial pelo despacho supra referido de 17 de Fevereiro de 2014 da Direcção de Finanças de ....

103.   A restante parte do saldo de 2009 dizia respeito a um empréstimo de sócio efectuado pela B à A com data de 21/07/2009 que prevê a disponibilização a serem entregues pela A à C em 2009 e 2010 para fazer face a necessidades de financiamento ou tesouraria da C.

104.   Este empréstimo originou igualmente a liquidação de IS pela AT, referente ao ano de 2010, liquidação 2010 nº 2013 ..., que incidiu sobre dois lançamentos a crédito da B, efectuados na contabilidade da A no ano de 2010, no montante de € 1.000.000,00.

105.   Este contrato de empréstimo de sócio, da B à A, apenas foi junto após a entrega da petição inicial, nunca sendo disponibilizado durante a acção inspectiva da AT, sendo a tradução simples e não legalizada e tendo a AT solicitado o desentranhamento do mesmo dos autos.

106.   O contrato, na minuta que foi disponibilizada pela Requerente ao tribunal, refere que a B concede à A um empréstimo de accionista, por um montante limitado a € 3.5000.00,00, a ser contabilizado como fundo de accionista e que o prazo de reembolso nunca será posterior a 31/07/2011.

107.   Sendo que esse prazo de reembolso não foi cumprido.

108.   O contrato é assinado em 21/07/2009.

109.   As transferências foram recebidas pela A da B nos seguintes termos:

a.       1.100.000,00 em 27/07/2009

b.      1.200.000,00 em 28/08/2009

c.       200.000,00 em 28/12/2009

d.      660.000,00 em 04/03/2010

e.       340.000,00 em 24/05/2010

110.   Nos termos do Código do IS, e conforme explanado pelo tribunal, reafirmando todo o citado no ponto 3 do número 51 deste acórdão: Nos termos do n.º 1, a concessão de crédito está sujeita a imposto do selo, qualquer que seja a natureza e forma, relevando, contudo, para o efeito a efectiva utilização do crédito concedido e não o contrato que lhe é subjacente. Pode, assim, ser celebrado um contrato de concessão de crédito sem que tal traduza facto tributário deste imposto, o que ocorrerá sempre que a utilização de crédito não seja imediata ou se não houver utilização efectiva desse contrato. (…)

111.   Da documentação e argumentação apresentada a Requerente não logrou provar que o financiamento, feito em diversas tranches, tivesse um prazo determinado ou determinável.

112.   Não tendo a Requerente facultado suficiente evidência sobre as condições de realização, objectivos, prazos e condições de reembolso.

113.   Qualifica-se assim a totalidade da verba como uma concessão de crédito por prazo não determinado ou determinável, sendo enquadrável na verba 17.1.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), que dispõe:

114.   “17.1.4-Crédito utilizado sob a forma de conta corrente, descoberto bancário ou qualquer outra forma em que o prazo de utilização não seja determinado ou determinável, sobre a média mensal obtida através da soma dos saldos em dívida apurados diariamente, durante o mês, divididos por 30”.

115.   Sendo de manter, nesta parte, o acto de liquidação de IS de 2009, nº 2013 ... sobre os valores do saldo, na parte que ainda não foi objecto da revogação parcial pelo despacho supra referido de 17 de Fevereiro de 2014 da Direcção de Finanças de ... bem como o acto de liquidação de IS 2010, n.º 2013 ....

116.   Analisa-se por último uma transferência do valor de € 520.000,00 efectuada em 11/06/2010 pela B a favor da Requerente.

117.   Esta transferência foi efectuada ao abrigo de um “Shareholder´s Loan Agreement and Authorisation” celebrado entre a B e a Requerente em 09/06/2010 e com um prazo de reembolso fixado para 31/08/2011.

118.   Este prazo não foi cumprido pelas partes.

119.   A Requerente não disponibilizou cópia desse contrato pelo que não é possível conhecer as condições, prazo e outros dessa mesma disponibilização de fundos.

120.   Pelo que foi liquidado IS nos termos da Verba 17.1.4 da TGIS, como uma operação de conta corrente por prazo não determinado, mas eventualmente IS nos termos da Verba 17.1.2 da TGIS (concessão de crédito por prazo superior a 1 ano).

121.   Sendo de manter o acto de liquidação de IS 2010, nº 2013 ... sobre os valores do saldo contemplados neste ponto no montante de € 520.000,00.

       

B -Análise e decisão sobre a sujeição a IS dos “Acordos com a empresa C”

 

122.   Está em causa um contrato de empréstimo através do qual a Requerente concedeu à C um empréstimo denominado de “curto prazo” no montante máximo de € 3.500.000,00.

123.   Este contrato é celebrado em 24/07/2009 com possibilidade de reembolso até 31/07/2011.

124.   O empréstimo foi disponibilizado por tranches tendo a totalidade do valor de € 3.500.000,00 sido integralmente transferido para a C até 31.12.2010.

125.   Deve começar por referir-se que, quanto este ponto, a posição da AT – contrastando aliás com a que adoptou relativamente às operações referidas em A - é bem expressa nos pontos 47, 48 e 50 da Resposta, nos quais a efectiva utilização do crédito, e não a data de contratação do mesmo, é erigida em pressuposto de incidência pela AT.

126.   Na PI, a Requerente alega que teria caducado o direito à liquidação do IS, pois o facto tributário teria nascido no dia da celebração contrato e não no momento da efectiva disponibilização dos fundos financeiros que Requente emprestou à C.

127.   Ora, mostra-se no RIT – o que a Requerente não contesta - que a disponibilização da verba contratada como empréstimo da Requerente à C foi efectuada por tranches. Ou seja, a celebração do contrato concretizou-se num certo momento, mas a efectiva disponibilização de fundos é posterior.

128.   Assim, e em face do entendimento que já se desenvolveu neste acórdão, não há dúvida de que o IS é devido pela utilização efectiva de fundos - que aqui existe – e terá de ser referida a esse momento e não ao da simples contratação de tal operação.

129.   Ora, analisando o contrato, que foi junto pela Requerente, verifica-se que o mesmo consigna uma concessão de crédito por prazo igual ou superior a 1 ano, portanto subsumível à verba 17.1.2 da TGIS, conforme liquidação efectuada pela AT.

130.   É pois devido IS sobre as tranches disponibilizadas ao abrigo do presente contrato, durante o ano de 2009 e 2010, à excepção daquelas cujo direito a liquidar IS se encontra caducado por via do art.45º da LGT.

131.   Nota o tribunal que a AT apenas liquidou IS sobre um valor total de crédito concedido e utilizado pela C no montante de € 3.160.000,00.

132.    Não padece pois de ilegalidade a tributação em IS, relativamente à verba total, transferida por tranches, de € 3.160.000, 00 que consta do RIT. Como as liquidações relativas a 28/7/2009 e 2/9/ 2009, cuja caducidade é peticionada pela Requerente, foram já anuladas pela AT, mantém-se válidas as restantes liquidações de 2009 e 2010 supra identificadas, na parte aqui aplicável.

 

C-   Análise e decisão sobre a sujeição a IS dos “Acordos com a empresa F e G – ..., SA

 

133.   A operação em epígrafe caracteriza-se por:

134.   Ter sido aprovada em 31-3-2010, pela Requerente – conforme documento 9 anexo ao RIT - a intenção de adquirir imóveis à F, e também à G.

135.   Ter sido transferida, em 15-6-2010, para estas duas entidades a quantia total de € 520.000,00.

136.   Em 2013, e face à inexistência de contratos de compra e venda dos imóveis no exercício em que a Requerente foi inspeccionada (2013), a AT considerou tais verbas como sendo, em substância, empréstimos e liquidou IS.

137.   A Requerente alega que o móbil das transferências de fundos corresponde a uma antecipação do pagamento do preço dos imóveis, não existindo pois qualquer operação de empréstimo. Em defesa desta posição, refere-se no ponto 80 da PI: “O facto de estes contratos acordados, com pagamento antecipado do preço em relação às correspondentes escrituras, não terem ainda sido formalizados, e eventualmente estarmos perante um incumprimento na perfeição formal das transacções de tais imóveis, não converte os respectivos direitos de crédito da A em operações de empréstimos” subl. no original).

138.   Vejamos, pois.

139.   A decisão a tomar há-de assentar na dilucidação do seguinte ponto essencial: a factualidade, e sobretudo os meios de prova que constam dos autos, permitem aderir à tese da Requerente segundo a qual se trata de um adiantamento de fundos relativos ao preço a pagar pelos imóveis, ou, pelo contrário, à tese da AT, segundo a qual tais transferências de fundos consubstanciam financiamentos da requerente às duas sociedades em questão?

140.   Ora resulta provado que:

- não existe celebração  de contrato promessa ou  da escritura dos imóveis;

- entre a data da decisão de aquisição dos imóveis (21-3 -2010), a data da efectiva transferência de fundos (15-6-2010) e o exercício da inspecção (2013) nenhuma operação existiu para concretizar a efectiva aquisição dos imóveis;

- Como alega a AT, e não é contestado pela requerente, a F, e também à G – ..., SA, cessaram a sua actividade sem concretizar as ditas operações.

- Este encerramento da actividade foi deliberado e aprovado na mesma acta em que se deliberou a alienação dos imóveis à A;

- Em todo este período os fundos transferidos pela requerente (€ 520.000,00.) estiveram ao dispor das duas entidades.

141.   Assim, perante tal cenário, entende o tribunal que as transferências de fundos configuram, em substância, um financiamento da Requerente as duas entidades.

142.   Caso contrário, seríamos levados a considerar existir uma liberalidade da A às duas sociedades, o que não é viável dado estarmos perante entidades comerciais, com fins lucrativos, ainda que todas pertencentes ao mesmo grupo empresarial.

143.    Acresce que, caso se aceitasse a tese da Requerente, então a cedência de fundos, como forma de financiamento entre empresas, poderia escapar ao IS, bastando para tal que se convencionasse que era executada ao abrigo de uma hipotética aquisição, não contratualizada ou materializada, de um activo das empresas beneficiárias, e que que as ditas cedências fariam parte de um pagamento antecipado. Julgamos tal tese demasiado frágil, e até potenciadora de comportamentos evasivos, para poder ser tida em conta como fundamento para a não tributação em IS.

144.   Desta forma e estribado no princípio da prevalência da substância sob a forma, entendemos estar configurada uma operação de concessão de crédito.

145.   Devendo ser mantidas a liquidação do IS ao abrigo da verba 17.1.4, de 201,nº 2013 ... não padecendo a mesma de ilegalidade.

 

D- Análise e decisão sobre a sujeição a IS do Empréstimo efectuado à empresa D

 

146.   Segundo o relatório da AT: “Analisado o balancete analítico da empresa do ano de 2010 e mais concretamente a conta 4113011 Investimentos Financeiros -Empréstimos Concedidos -Empresas do Grupo -D , verifica-se a existência de um saldo devedor de €1.193.130,00.

147.    O saldo apresentado no final de 2010, é o resultado de duas transferências nos valores de € 704925,00 e €2.095.205,00 (totalizando €2.800.130,00) efectuados em Março de 2009, tendo ocorrido um primeiro reembolso no valor de €907.000,00 em 2009-05-20. Em 2010-12-15 foi efectuado novo reembolso no montante €700.000,00, resultando assim um saldo ainda em divida no montante de €1.893.130,00.

148.   Não foi apresentado qualquer contrato entre as duas partes que titule este saldo credor a favor da A.

149.   Resulta contudo dos documentos apresentados pela Requerente durante a inspecção tributária um contrato “Share Transfer Agreement” entre a C e a A através do qual se a C transfere para a Requerente, em 24 de Março de 2009, por um valor de € 3.355.000,00 a totalidade das acções que detém na empresa D, que passa assim a ser detida pela A.

150.   A Requerida reconhece (ponto 65. da resposta) que a D é uma empresa sedeada na Polónia detida a 100% pela Requerente.

151.   O crédito detido pela A sobre a D, em 2010, corresponde assim a um crédito de accionista.

152.   Ora, está assim configurada a isenção prevista na alínea h) ou na alínea i) do nº 1 do artigo 7º do Código do Imposto de Selo que inclui no âmbito das isenções objectivas a seguinte: h) As operações, incluindo os respectivos juros, referidas na alínea anterior, quando realizadas por detentores de capital social a entidades nas quais detenham directamente uma participação no capital não inferior a 10% e desde que esta tenha permanecido na sua titularidade durante um ano consecutivo ou desde a constituição da entidade participada, contanto que, neste último caso, a participação seja mantida durante aquele período;

i) Os empréstimos com características de suprimentos, incluindo os respectivos juros efectuados por sócios à sociedade

153.   Pelo que neste ponto entende o tribunal que deve ser anulado o acto de liquidação de IS de 2009, nº 2013 sobre os valores do saldo, na parte que ainda não foi objecto da revogação parcial pelo despacho supra referido de 17 de Fevereiro de 2014 da Direcção de Finanças de ... bem como o acto de liquidação de IS 2010, nº 2013 ... .

 

E- Análise e decisão sobre a sujeição a IS do Empréstimo efectuado à empresa C

154.   Nesta operação, a Requerente alega que a verba de € 354.081,00 (que inclui € 340.000,00 de capital e o restante em juros) faria parte do montante global de €3.500.000,00 disponibilizado pela A à C e que já se analisou (vide supra “B- Análise e decisão sobre a sujeição a IS dos “Acordos com a empresa C”).

155.   Assim, o direito à liquidação estaria caducado, pois, sempre segundo a Requerente, o facto tributário teria por referência a data de 24-7-2009.

156.   Ora, a AT considerou, nesse sobredito ponto B, a quantia de € 3.160.000,00. Não contestando a Requerente a efectiva transferência de fundos para a C, o que se deve atender não é à data do contrato – como já se mostrou neste acórdão – mas sim à data da utilização dos fundos. Então, ou se tributaria no âmbito da operação B (supra) ou, como AT individualiza esta parcela, e existindo fundamento para a sua sujeição a IS, ela se deve tributar autonomamente.

157.   A Requerente reconhece (pontos 103. e 104.da PI) que a A era credora em 2010 de € 354.081,00 nos quais se incluía uma transferência para a C efectuada em 31/05/2010 no montante de € 340.000,00.

158.   A Requerente reconhece igualmente que esta transferência não foi mais do que a transferência da última tranche do adiantamento de € 3.500.000,00 feito pela A à C.

159.   O tribunal analisou esta operação e a incidência do IS sobre a mesma na alínea B) supra.

160.   Não procede pois a argumentação da requerente relativamente à caducidade do direito à liquidação. Assim, é de manter a liquidação efectuada de 2010 nº 2013 ....

 

IV. PEDIDO DE JUROS INDEMNIZATÓRIOS

 

161.   A Requerente pagou as liquidações impugnadas, no montante de € 57.380,68 referente a 2010 e € 37.168,57, referente a 2009, em 04/12/2013.

162.   A par da anulação das liquidações, e consequente reembolso das importâncias indevidamente pagas, a Requerente solicitou ainda que lhe seja reconhecido o direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do art. 43.º da LGT.

163.   Com efeito, nos termos da norma do n.º 1 do referido artigo, serão devidos juros

indemnizatórios "quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido."

164.    Para além dos meios referidos na norma que se transcreve, entendemos que, conforme decorre do n.º 5 do art. 24.º do RJAT, o direito aos mencionados juros pode ser reconhecido no processo arbitral e, assim, se conhece do pedido.

165.   O direito a juros indemnizatórios a que alude a norma da LGT supra referida pressupõe que haja sido pago imposto por montante superior ao devido e que tal derive de erro, de facto ou de direito, imputável aos serviços da AT.

166.   No caso dos autos ocorre que a liquidação do imposto de selo de 2009 -liquidação de Imposto do Selo de 2009 n.º 2013 – foi revogada parcialmente pelo montante de € 19.829,91 por Despacho de 26/07/2013 do Director de Finanças de ..., com fundamento na caducidade do direito à liquidação, mantendo-se o remanescente da liquidação no montante de € 17.338,66.

167.   Acresce que o tribunal conclui pela procedência parcial do pedido da Requerente e que, portanto, em relação à liquidação de Imposto do Selo de 2009 n.º 2013 ... e de Imposto do Selo 2010 n.º 2013 ... que foram mantidas pela AT, haverá direito a juros indemnizatórios por referência ao IS que foi pago pela Requerente com base em actos de liquidação que o tribunal considera contrários à lei e afectados por erro sobre os pressupostos de facto ou direito imputável à AT, conforme decisão que decorre dos autos.  

 

Em síntese:

 

a)  Ocorreu a revogação parcial da liquidação de Imposto do Selo de 2009 n.º 2013 ... subsistindo a liquidação;

 

 i. Imposto de Selo na “contratação de empréstimos à empresa mãe” referente aos meses de Setembro a Dezembro de 2009, inclusive, no montante de €12.259,18;

 

 ii. Imposto de Selo na “contratação de empréstimos à empresa C” referente aos meses de Novembro e Dezembro de 2009 no montante de € 2.000,00;

 

iii. Imposto de Selo na “contratação de empréstimos à empresa D” referente aos meses de Setembro a Dezembro de 2009, inclusive, no montante de € 3.079,48;

 

b)  A AT manteve a liquidação de Imposto do Selo 2010 n.º 2013 ...:

 

i. Imposto de Selo na “contratação de empréstimos à empresa mãe” referente aos meses de Janeiro a Dezembro de 2010, inclusive, no montante de €42.506,18

 

 ii. Imposto de Selo na “contratação de empréstimos à empresa C” referente aos meses de Março e Junho a Dezembro de 2010 no montante de € 4.474,65;

 

iii.                                                                               Imposto de Selo na contratação de empréstimos à F e G referente aos meses de Junho a Dezembro de 2010, no montante de € 1386,00, e

 

iv.                                                                               Imposto de Selo na “contratação de empréstimos à empresa D” referente aos meses de Janeiro a Dezembro de 2010, inclusive, no montante de € 9.213,20;

 

 

Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, o tribunal arbitral decide:

 

i) julgar procedente o pedido formulado pela Requerente no que toca à anulação do acto de liquidação de IS de 2009 nº 2013 ..., na parte ainda não revogada pela AT, sobre o montante de € 741.500,00 e € 2.888.667,00€ registado como “contratação de empréstimos à casa mãe”;

 

ii) julgar improcedente o pedido formulado pela Requerente no que toca à anulação do acto de liquidação de IS de 2009 nº 2013 ... sobre o restante montante de € 1.600.000,00 e € 2.500.000,00 imputável a “contratação de empréstimos à casa mãe”;

 

iii) julgar improcedente o pedido formulado pela Requerente no que toca à anulação do acto de liquidação de IS de 2010 nº 2013 ... sobre o montante de € 1.000.000,00 e € 520.000,00 imputável a “contratação de empréstimos à casa mãe” e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira deste pedido;           

 

iv) julgar improcedente o pedido formulado pela Requerente no que toca à anulação do acto de liquidação de IS de 2009 nº 2013 ... e de IS de 2010, nº 2013 ... sobre o montante de € 3.500.000,00 relativo à “contratação de empréstimos com a C” e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira deste pedido;

 

v) julgar improcedente o pedido formulado pela Requerente no que toca à anulação do acto de liquidação de IS de 2010, nº 2013 ... sobre o montante de € 520.000,00 relativo à “contratação de empréstimos com a F e a G” e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira deste pedido;

 

vi) julgar procedente o pedido formulado pela Requerente no que toca à anulação do acto de liquidação de IS de 2009 nº 2013 ..., na parte não revogada pela AT, e de IS de 2010 nº 2013 ...735 sobre o montante de empréstimo concedido à D que originou o saldo devedor em 2010 de € 1.193.130,00;

 

vii) Condenar a Requerida no pagamento de juros indemnizatórios, calculados com base no imposto liquidado pelos actos aqui anulados na medida da respectiva anulação, desde a data de pagamento do imposto até ao integral reembolso pela AT.

 

 

Valor do processo

De harmonia com o disposto no n.º 2 do art.º 315.º do CPC, na alínea a) do n.º1 do art.º 97.º-A do CPPT e ainda do n.º 2 do art.º 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 94.549,25

 

Custas

Para os efeitos do disposto no n.º 2 do art.º 12 e no n.º 4 do art.º 22.º do RJAT e do n.º 4 do art.º 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 2.754,00, nos termos da Tabela I anexa ao dito Regulamento, a suportar pela Requerente e Requerida­ na proporção do respectivo decaimento.

 

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 5 de Novembro de 2014

 

Os Árbitros

 

 

 (Jorge Lopes de Sousa, em substituição de Lino Ribeiro Alves de Sousa)

(Presidente)

 

 

 

 

 (Ana Teixeira de Sousa)

(Relatora)

 

 

 

(António Martins)

 

 

 

 

 [Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, número 5 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do Regime de Arbitragem Tributária. A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia antiga.]