Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 77/2014-T
Data da decisão: 2014-06-29  IUC  
Valor do pedido: € 184,04
Tema: IUC – Incidência Subjectiva
Versão em PDF

Decisão Arbitral

 

A presente decisão vai proferida de acordo com a ortografia antiga.

 

I – Relatório.

 

1. A..., contribuinte n.º …, residente na Rua ..., …, requereu a constituição do tribunal arbitral em matéria tributária com vista à anulação dos actos de liquidação de Imposto Único de Circulação (IUC) e respectivos juros compensatórios, relativos aos períodos de tributação de 2008, 2009, 2010, 2011 e 2012 e ao veículo com a matrícula ..-..-.., na importância total de € 184,04.

 

2. Como fundamento do pedido alega o Requerente, em síntese, não se qualificar como sujeito passivo da obrigação tributária por não ser proprietário do veículo automóvel acima identificado nos períodos a que se reportam aquelas liquidações, porquanto foi o mesmo vendido em 14 de Janeiro de 2008.

 

Às referidas liquidações, imputa ainda outros vícios, designadamente, a errónea qualificação e quantificação do facto tributário, a ausência da fundamentação legalmente exigida, bem como a preterição de outras formalidades legais que, no entender da Requerente, impedem a sua subsistência na ordem jurídica.

 

3. A Requerida (AT) respondeu suscitando uma questão prévia relativamente ao valor da causa indicado pela Requerente; e pronunciando-se de seguida sobre a incidência subjectiva do tributo em causa concluiu pela improcedência do requerido e, consequentemente, pela manutenção dos questionados actos de liquidação.

 

4. O tribunal arbitral foi regularmente constituído em 02-04-2014 e é materialmente competente à face do preceituado no art. 2.º, n.º 1, al. a), do RJAT.

 

5. As partes prescindiram da reunião do tribunal arbitral prevista no art. 18.º do RJAT.

 

6. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT, e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22/03).

 

7. O processo não enferma de nulidades.

 

II - Matéria de facto.

 

8. Com relevância para a apreciação das questões suscitadas destacam-se os seguintes elementos factuais:

 

8.1. O Requerente, depois de exercido o direito de audição prévia, foi regularmente notificado de liquidações oficiosas de Imposto Único de Circulação (IUC), relativas ao veículo automóvel com a matrícula ..-..-.. e aos anos de 2008, 2009, 2010, 2011 e 2012, conforme documentos de cobrança e valores constantes do quadro seguinte:

 

Ano

Doc.cobrança

Imposto

Juros

Total

2008

2008 …

€ 32,00

€ 5,13

€  37,13

2009

2009 …

€ 32,80

€ 5,07

€  37,87

2010

2010 …

€ 33,10

€ 3,79

€  36,89

2011

2011 …

€ 33,83

€ 2,52

€  36,35

2012

2912 …

€ 34,61

€ 1,19

€ 35,80

 

 

 

 

€ 184,04

 

8.2 Não se conformando com as liquidações acima identificadas, apresentou reclamação graciosa relativamente à respeitante ao período de 2008, a qual foi objecto de indeferimento por despacho de 15-07-2013 do Chefe do competente Serviço de Finanças.

 

8.3. A referida decisão foi objecto de recurso hierárquico, interposto em 08-08-2013, sobre o qual não foi proferida decisão que tenha sido notificada à Requerente até à data da apresentação do presente pedido de pronúncia arbitral.

 

8.4. Relativamente às liquidações respeitantes aos períodos de 2009, 2010, 2011 e 2012, foi igualmente apresentada reclamação graciosa, tendo a mesma sido indeferida por despacho de 31-12-2013 do Chefe do Serviço de Finanças de ….

 

8.5. Como fundamento das aludidas reclamações e recurso hierárquico, o Requerente, alegou, em resumo, não ser proprietário do veículo nos períodos de tributação a que respeitam as liquidações, em virtude de em Janeiro de 2008 o ter vendido à empresa B..., LDA., (adiante também designada apenas por B...) com a entrega dos respectivos documentos acompanhados de declaração de venda por ele assinada para que a compradora o pudesse vender a um terceiro.

 

8.6. As decisões de indeferimento das reclamações supra referidas fundamentam-se, em síntese, na consideração de que o sujeito passivo deste tributo é aferido em função do registo do veículo, que a norma de incidência constante do art. 3.º, n.º 1, do Código do IUC não consagra qualquer presunção susceptível de ilisão e não dispor o referido Código " de norma legal que habilite a AT a liquidar imposto, sobre o mesmo veículo automóvel, com referência a outro ou outros que não as pessoas singulares ou colectivas em nome das quais os mesmos se encontrem registados."

 

8.7. Com o referido fundamento, a Requerida manteve as questionadas liquidações, que constituem o objecto mediato do presente pedido de pronúncia arbitral.

 

8.8. Em suporte do seu pedido de pronúncia arbitral, a Requerente, no essencial, reproduz os mesmos factos e argumentação já desenvolvida naquelas reclamações e recurso hierárquico, ou seja, que não era proprietária do veículo em causa nos períodos a que a respeitam as liquidações por ter o mesmo sido objecto de venda ocorrida em Janeiro de 2008, não sendo, assim, sujeito passivo da obrigação de imposto.

 

8.9. Devidamente notificada para o efeito, a Requerida, apresentou a sua resposta suscitando, desde logo, uma questão prévia relativa ao valor da causa.

 

8.10. Pronunciando-se sobre a substância do pedido alega a Requerida, em síntese, que as liquidações do IUC se operam em face dos elementos constantes das bases de dados do Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres (IMTT) e do Instituto de Registo e Notariado (IRN), determinando-se o sujeito passivo em função das pessoas em nome das quais os veículos se encontrem registados junto desta última entidade.

 

III - Questão prévia.

 

Sintetizados os elementos factuais relevantes e a posição das Partes importa, antes de mais, analisar e decidir a questão prévia suscitada pela Requerida que, como acima foi referido, se prende com a determinação do valor da causa.

 

Do valor da causa

 

9. A Requerida suscita questão prévia relativa ao valor económico de € 2.000,00 atribuído ao processo pela Requerente, no entendimento de que deve este ser reduzido ao montante das liquidações impugnadas de € 184,04.

 

10. Considerando o disposto no art. 97.º-A do CPPT, aplicável ao processo arbitral por força do disposto no art. 29.º, n.º 1, al. a), do RJAT, o tribunal fixa o valor do processo em € 184,04, como, de resto, não deixaria de o fazer nos termos e para os efeitos previstos no art. 12.º, n.º 2, do aludido diploma legal.

 

IV - Cumulação de pedidos.

 

11. Considerando a existência de uma relação directa entre as liquidações tributárias cuja ilegalidade questiona, a Requerente optou por pedir a apreciação conjunta dos actos tributários em causa.

 

12. Considerada a identidade dos factos tributários, do tribunal competente para a decisão e dos fundamentos de facto e de direito invocados, nada obsta, face ao disposto nos arts. 104.º do CPPT e 3-º do RJAT à pretendida cumulação de pedidos.

 

V - Matéria de direito.

 

13. No pedido de pronúncia arbitral a Requerente, para além de outros vícios que imputa às liquidações de IUC, invoca a circunstância de, à data a que se reportam os factos tributários que as originaram, não ser a proprietária do veículo e, consequentemente, não assumir a qualidade do sujeito passivo do imposto que lhe foi liquidado.

 

14. Os restantes vícios invocados no tocante às questionadas liquidações - errónea qualificação e quantificação dos factos tributários, violação do dever de fundamentação e preterição de outras formalidades legais não especificadas - encontram-se prejudicadas face à questão da incidência subjectiva do referido tributo, que se considera de primordial relevância, já que da resposta que à mesma for dada derivará a utilidade, ou não, da apreciação dos restantes vícios invocados.

 

15. Acerca da definição da incidência subjectiva do IUC evidenciam-se, desde logo, posições diametralmente opostas entre a Requerida (AT) e a Requerente (SP): para aquela, o sujeito passivo deste imposto é a pessoa em nome da qual o veículo se encontre registado; enquanto que para esta, a norma de incidência estabelece uma presunção, derivada do registo, ilidível por força do disposto no art. 73.º da LGT.

 

16. Assim, sobre a qualidade de sujeito passivo da obrigação de imposto que lhe é imputada, alega a Requerente que à data da ocorrência dos factos tributários não era proprietária do veículo a que a que se reportam as questionadas liquidações, pois que, em 14-01-2008 tinha o mesmo sido vendido à empresa B... com entrega dos respectivos documentos, incluindo a declaração de venda assinada para que esta pudesse o pudesse vender a um terceiro.

 

17. Na referida data foi emitida pela empresa adquirente a nota de compra n.º ..., a favor da Requerente, nela se identificando, entre outros elementos, as partes intervenientes, o veículo transaccionado e o respectivo preço.

 

18. Todavia, não sendo actualizado o registo do identificado veículo, nele continuou a constar, com proprietário, o Requerente, situação que se viria a manter até 07-10-2013.

 

19. Segundo entendimento da AT, proferido em sede de reclamações graciosas interpostas pelo Requerente, basta que se verifique a inscrição registral do veículo em nome de uma determinada pessoa para que esta se qualifique como sujeito passivo da obrigação tributária do IUC.

 

20. Com efeito, decorre do art. 3.º, n.º 1, do CIUC, que são sujeitos passivos os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas em nome das quais aqueles se encontrem registados.

 

21. Com relevância para a decisão a proferir no presente processo, a questão a analisar centra-se, primeiramente, na interpretação da norma do n.º 1 daquele art. 3.º do CIUC, no sentido de se determinar se a norma de incidência subjectiva nela inscrita admite, ou não, que a pessoa em nome da qual o veículo se encontre registado na Conservatória do Registo Automóvel possa demonstrar, através dos meios de prova admitidos em direito, que não obstante tal facto, não é proprietário do veículo no período a que o tributo respeita e afastar assim a obrigação de imposto que sobre ela recai.

 

22. Em suma, trata-se de saber se tal norma consagra uma presunção legal de incidência tributária, susceptível de ilisão, nos termos gerais, como pretende a Requerente ou se, diversamente, como entende a AT "o legislador tributário ao estabelecer claramente no artigo 3.º, n.º 1, do diploma em apreço, quem são os sujeitos passivos do IUC, determinou expressa e intencionalmente que estes são os proprietários (ou. nas situações previstas no n.º 2, as pessoas aí enunciadas), considerando-se como tais as pessoas em nome das quais os mesmos se encontrem registados."

 

Sendo esta a questão central a decidir no presente pedido de pronúncia arbitral, importa analisar mais detalhadamente as posições em confronto.

 

Posição da Requerente.

 

23. Sobre esta matéria e como fundamento do pedido de pronúncia arbitral, alega o Requerente, em síntese, que:

 

a) Às datas a que se reportam os factos tributários do IUC que originaram as questionadas liquidações não era proprietário do veículo e, consequentemente, não assume a qualidade de sujeito passivo do imposto que lhe foi liquidado;

 

b) Face ao disposto no art. 73.º da LGT, que prevê que as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário, a incidência subjectiva do tributo em causa, fundada na presunção de propriedade derivada do registo, pode ser afastada mediante prova em contrário;

 

c) Não basta, assim, que se verifique a inscrição no registo do veículo em nome de uma determinada pessoa para que esta se qualifique como sujeito passivo da obrigação tributária;

 

d) A norma do n.º 1 do art. 3.º do CIUC admite que a pessoa em nome da qual o veículo se encontre registado na Conservatória possa demonstrar através dos meios de prova admitidos em direito que não é proprietária do veículo no período a que o imposto respeita e afaste assim a obrigação de imposto que sobre ela recai;

 

e) As presunções de incidência tributária podem ser ilididas através de procedimento contraditório previsto no art. 64.º do CPPT ou, em alternativa, pela via da reclamação graciosa ou de impugnação judicial dos actos tributários que nelas se baseiam;

 

f) Assim, dúvidas não existem que não só a Requerente utilizou os meios correctos como também, através dos documentos apresentados, conseguiu ilidir a presunção legal de propriedade.

 

 

 

Posição da Requerida.

 

24. Ao alegado pela Requerente, respondeu a Requerida (AT) no sentido de que tais alegações não podem de todo proceder, sendo que estabelece o n.º 1 do art. 3.º do CIUC que "São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou colectivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados."

 

25. Desenvolvendo a sua posição, diz a Requerida, em síntese, que "O legislador tributário ao estabelecer claramente no artigo 3.º, nº1, do diploma em apreço, quem são os sujeitos passivos do IUC, determinou expressa e intencionalmente que estes são os proprietários (...) considerando-se como tais as pessoas em nome das quais os mesmos se encontrem registados."

 

26. Em defesa deste ponto de vista, acentua a Requerida que "o legislador não usou a expressão "presumem-se" como bem poderia ter feito". Assinala, ainda, a circunstância de " o normativo fiscal estar repleto de previsões análogas à consagrada na parte final do n.º 1 do art. 3.º, em que o legislador fiscal, dentro da sua liberdade de conformação legislativa, expressa e intencionalmente, consagra o que deve considerar-se legalmente para efeitos de incidência, de rendimento, de isenção, de determinação e de periodização do lucro tributável, de residência e de localização, entre muitos outros."

 

27. Como exemplo, entre outros, refere a norma da alínea a) do n.º 2 do art. 2.º do CIMT, em que o legislador tributário não presume que "há lugar a transmissão onerosa para efeitos do n.º 1 do artigo 2.º do CIMT, na outorga de contrato-promessa de aquisição e alienação de bens imóveis em que seja clausulado no contrato ou posteriormente que o promitente adquirente pode ceder a sua posição contratual a terceiro." Neste caso, " o legislador expressa e intencionalmente assimila este contrato a uma transmissão onerosa de bens para efeitos de IMT". Do mesmo modo, no caso do art. 17.º do CIRC, o legislador também não estabelece que os excedentes líquidos das cooperativas se presumem como resultado líquido do período mas que estes se consideram como tal. Depois de referir que grande parte das normas de incidência do IRC têm como ratio subjacente determinar o que deve ser considerado rendimento para efeitos deste imposto ter-se-ia de concluir que ao usar a expressão "considera-se" o legislador fiscal teria consagrado uma presunção em praticamente todas as normas de incidência do IRC que seria afastada precisamente porque a contabilidade prescreve soluções diferentes das do CIRC, sendo exactamente o fim do legislador afastar as regras contabilísticas.

 

28. Na sequência deste raciocínio, conclui a Requerida que "é imperativo concluir que, no caso dos presentes autos de pronúncia arbitral, o legislador estabeleceu expressa e intencionalmente que se consideram como tais (como proprietários...) as pessoas em nome das quais os mesmos (os veículos) se encontrem registados, porquanto é esta a interpretação que preserva a unidade do sistema jurídico-fiscal. Pelo que, "entender que o legislador consagrou aqui uma presunção seria inequivocamente efectuar uma interpretação contra legem.”

 

29. Por outro lado, apelando ao elemento sistemático, entende a Requerida que "a solução propugnada pela Requerente é intolerável não encontrando o entendimento por esta sufragado qualquer apoio na lei." Isto porque, no mesmo sentido do que dispõe o n.º 1 do artigo 3.º do CIUC, " estabelece o artigo 6.º do CIUC, sob a epígrafe "Facto Gerador e Exigibilidade", no seu n.º 1, que "O facto gerador do imposto é constituído pela propriedade do veículo, tal como atestada pela matrícula ou registo em território nacional. Ou seja, "o momento a partir do qual se constitui a obrigação de imposto apresenta uma relação directa com a emissão do certificado de matrícula, no qual devem constar os factos sujeitos a registo .... No mesmo sentido, milita a solução legislativa adoptada pelo legislador fiscal no n.º 2 do artigo 3.° do CIUC, ao fazer coincidir as equiparações ai consagradas com as situações em que o registo automóvel obriga ao respectivo registo".

 

30. Sustenta ainda a Requerida que " Tal posição está ainda patente na circunstância de o Registo Automóvel a que a Administração Tributária tem ou pode ter acesso, e o certificado no qual devem constar os actos sujeitos a registo, cuja exibição poderá ser exigida pela mesma Administração ao interessado, conterem todos os elementos destinados à determinação do Sujeito Passivo, sem necessidade de acesso aos contractos de natureza particular que conferem tais Direitos, enunciados pelo CIUC como constitutivos da Situação Jurídica de Sujeito Passivo deste imposto. Na falta de tal registo, naturalmente, será o Proprietário notificado para cumprir a correspondente obrigação fiscal, pois, a Administração Tributária, tendo em conta a actual configuração do Sistema Jurídico, não terá que proceder à liquidação do Imposto com base em elementos que não constem de registos e documentos públicos e, como tal, autênticos. Nestes termos, a não actualização do registo, nos termos do disposto no artigo 42.º do Regulamento do Registo de Automóveis, será imputável na esfera jurídica do Sujeito Passivo do IUC e não na do Estado, enquanto sujeito activo deste Imposto."

 

31. Para além da fundamentação exposta, considera a Requerida ser ainda de referir que "a interpretação veiculada pela Requerente se mostra contrária à Constituição."

 

32. Defendendo que "O sempre propalado princípio da capacidade contributiva não é o único nem o principal princípio fundamental que enforma o sistema fiscal" e que "Ao lado deste princípio encontramos outros com a mesma dignidade constitucional, como sejam o princípio da confiança e segurança jurídica, o princípio da eficiência do sistema tributário e o princípio da proporcionalidade", considera a Requerida que se impõe, "por isso que na tarefa interpretativa do artigo 3.º do CIUC o princípio da capacidade contributiva seja articulado, ou se se preferir temperado, com aqueloutros princípios."

Daí concluindo que " a interpretação proposta pela Requerente, uma interpretação que no fundo desvaloriza a realidade registral em detrimento de uma "realidade informal" e insusceptível de um controlo mínimo por parte da Requerida, e ofensiva do basilar princípio da confiança e segurança jurídica que deve enformar qualquer relação jurídica, aqui se incluindo a relação tributária."

 

33. Expostas, em síntese e com parcial transcrição, as posições da Requerente e da Requerida, estarão claramente definidas:

 

- para o Requerente, a incidência subjectiva do IUC assenta numa presunção de propriedade, derivada do registo automóvel, susceptível de ilisão nos termos legais; e

 

- para a Requerida, a norma do CIUC não estabelece qualquer presunção, expressando  entendimento no sentido de que o legislador definiu como sujeito passivo deste tributo, expressa e intencionalmente, o proprietário do veículo identificado no respectivo registo.

 

Incidência subjectiva do IUC.

 

34. Com ressalva do disposto no n.º 2, relativamente a situações de venda com reserva de propriedade e locações que assumam natureza de financiamento, estabelece o art. 3.º do CIUC, que são sujeitos passivos deste imposto os proprietários dos veículos, sendo como tal consideradas as pessoas em nome das quais os veículos se encontrem registados.

 

35. O recurso ao registo automóvel como elemento estruturante do sistema de liquidação deste tributo evidencia-se ao longo de todo o Código. Refira-se, designadamente, o seu art. 6.º,relativo à definição do facto gerador da obrigação de imposto, cujo n.º 1 prevê ser constituído pela propriedade do veículo, tal como atestada pela matrícula ou registo em território nacional. Deste preceito decorre que os veículos automóveis que não estejam, nem devam estar, registados em território português, apenas ficam abrangidos pela incidência objectiva deste tributo se no mesmo permanecerem por período superior a 183 dias, conforme dispõe o n.º 2 do mesmo artigo. É, pois, uma norma que, recorrendo ao elemento registral, estabelece, simultaneamente, o facto gerador do imposto e a respectiva conexão fiscal. É, também, dos elementos do registo automóvel que se extrai o momento do início do período de tributação e constituição da obrigação tributária e, de uma maneira geral, todos os elementos necessários à liquidação do imposto em causa, como, de resto, bem acentuado vem na resposta elaborada pela AT.

 

36. Todavia, da dependência do regime de tributação do IUC em relação ao registo automóvel não se pode extrair, como imediata conclusão, que a norma de incidência subjectiva, no segmento em que considera como proprietário a pessoa em nome da qual o veículo se encontre registado, não constitua um presunção de incidência. Haverá, pois, que recorrer a outros elementos interpretativos, com a especial relevância da noção legal de presunção.

 

Noção de presunção.

 

37. Segundo noção vertida no art. 349.º do C. Civil, presunções são as ilações que a lei, ou o julgador, tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido. As presunções constituem meios de prova, tendo esta por função a demonstração da realidade dos factos (art. 341.º do C. Civil). Assim, quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz (art. 350.º, n.º1, do C. Civil). Todavia, as presunções, salvo nos casos em que a lei o proibir, podem ser ilididas, mediante prova em contrário (art. 350.º, n.º 2, do C. Civil). Tratando-se de presunções de incidência tributária, estas são sempre ilidíveis, conforme expressamente dispõe o art. 73.º da LGT.

 

Presunção e ficção.

 

38. A par de presunções, utilizadas no direito tributário principalmente como meio de afastar a possibilidade de fraude e evasão ou por razões de simplificação e de praticabilidade das leis fiscais, o legislador recorre, também com alguma frequência, a ficções. Diversamente da presunção, que parte de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido, a ficção, por seu lado, "traduz-se num processo jurídico que considera uma situação ou um facto como distinto da realidade para lhe atribuir consequências jurídicas" [1] Há, pois, uma assinalável diferença entre um e outra desta figuras, utilizadas, com alguma frequência, nas normas dos códigos e leis tributárias. Essa diferença, que não se encontra assinalada na fundamentação da posição da AT, será particularmente relevante na apreciação do presente caso.

 

39. Tomando como referência a exemplificação apresentada pela Requerida em abono da sua tese, poderemos considerar o caso do n.º 2 do art. 17.º do CIRC, que para efeitos deste imposto, determina que "os excedentes líquidos das cooperativas consideram-se como resultado líquido do exercício.". Não ignorando o legislador do CIRC que as cooperativas, por força dos respectivos princípios e regime legal que lhes é aplicável, não podem ter como escopo a realização do lucro, imputa àqueles excedentes uma natureza distinta da realidade, para lhes atribuir uma consequência jurídica, qual seja a de resultado líquido do exercício para efeitos de aplicação das regras de determinação do lucro tributável das empresas.

 

40. Por outro lado, a existência, em paralelo, de presunções e ficções nas normas legais de incidência tributária é ainda mais notória, por exemplo, no art. 2.º do CIMT, referido na resposta da AT. Segundo o corpo do n.º 3 deste artigo "Considera-se que há também lugar a transmissão onerosa para efeitos do n.º 1 (norma que define a regra geral de incidência deste tributo, consistente na transmissão onerosa do direito de propriedade sobre imóveis) na outorga dos seguintes actos ou contractos:

a) Celebração de contrato-promessa de aquisição e alienação de bens imóveis em que seja clausulado no contrato ou posteriormente que o promitente-adquirente pode ceder a sua posição contratual a terceiro."

e

e) Cedência de posição contratual ou ajuste de revenda, por parte do promitente adquirente num contrato-promessa de aquisição e alienação, vindo o contrato definitivo a ser celebrado entre o primitivo promitente alienante e o terceiro."

 

41. No primeiro dos referidos casos, está-se perante uma ficção, pois que o legislador não ignora que a possibilidade de cedência de posição contratual num contrato de promessa não implica a transmissão do direito de propriedade, objecto da incidência geral do referido imposto municipal. Mas, para efeitos tributários, atribui-lhe as correspondentes consequências. Já no caso segundo - ajuste de revenda, a que se refere a alínea e) do mesmo número - tem-se uma situação algo mais complexa, mas que, segundo a jurisprudência constante dos tribunais superiores, traduz uma presunção.

 

42. Como se chega a esta conclusão, se ambas as normas têm por finalidade e efeitos tributar como transmissões de propriedade de imóveis realidades que o não são ? A resposta está precisamente no recurso ao conceito legal de presunção. A norma da al. e) do n.º 3 do art. 2.º do CIMT, no que respeita ao "ajuste de revenda" encontrava-se já prevista, em idênticos termos, no parágrafo 2.º do art. 2.º do anterior Código da Sisa: o promitente-comprador que ajustasse, com um terceiro, a venda do imóvel que havia prometido adquirir ficaria sujeito ao imposto, com base na presunção de que lhe havia sido entregue o bem objecto do contrato de promessa e que sobre ele havia agido como um proprietário, por via da cedência da sua posição contratual naquele contrato, mas apenas se o contrato translativo se viesse a realizar entre o primitivo promitente vendedor e aquele terceiro. Neste caso, o legislador criou a presunção de transmissão económica (tradição), abrangida pela incidência do imposto, sempre que o promitente adquirente agisse, perante terceiro e com anuência do primitivo promitente vendedor, como um verdadeiro proprietário, ajustando a revenda do bem em causa. É a existência da "tradição jurídica" - entrega do bem objecto do contrato de promessa - que a norma presume, para a tributar. E aqui, também, o legislador parte de factos conhecidos - a posição contratual e a transmissão jurídica do bem para um terceiro - para firmar um facto desconhecido, o ajuste de revenda. Presunção esta ilidível, por força do disposto no art. 73.º da LGT. [2]

 

Presunções explícitas e implícitas.

 

43. Sustenta a Requerida que o legislador fiscal, "dentro da sua liberdade de conformação legislativa" expressa e intencionalmente determina que se considerem como proprietários as pessoas em nome das quais os veículos se encontrem registados, não utilizando a expressão "presumem-se" como tal, como poderia ter feito.

 

44. Com efeito, na definição da incidência subjectiva do ICI, do ICA e do IMV, impostos que o actual IUC veio substituir, foi essa a expressão utilizada pelo legislador. No âmbito dos impostos abolidos, estabelece-se que "o imposto é devido pelos proprietários dos veículos, presumindo-se como tais, até prova em contrário, as pessoas em nome de quem os mesmos se encontrem matriculados ou registados" [3]

 

45. No mesmo sentido, estabelece o art. 3.º, n.º 1, do Regulamento dos Impostos de Circulação e Camionagem, aprovado pelo DL n.º 116/94, de 03/05, que são sujeitos passivos destes tributos "os proprietários dos veículos presumindo-se como tais, até prova em contrário, as pessoas singulares ou colectivas em nome das quais os mesmos se encontrem registados."

 

46. No que ao IUC diz respeito, o legislador optou por utilizar uma formulação diversa da norma de incidência subjectiva. Tal como nos impostos abolidos, continua a atribuir aos proprietários dos veículos a qualidade de sujeitos passivos. Porém, abandona a expressão "presumindo-se como tais, até prova em contrário, as pessoas em nome quem os mesmos se encontrem registados" em favor de "considerando-se como tais as pessoas (...) em nome das quais os mesmos se encontrem registados".

 

47. Diversamente da posição expressa pela AT, entendemos que se está perante uma mera questão semântica, que não altera minimamente o conteúdo da norma em questão e por duas ordens de razões: Para que se esteja perante uma presunção legal, é necessário que a norma que a estabelece se amolde ao respectivo conceito legal, vertido no art. 349.º do C. Civil, sendo para tal irrelevante que a mesma seja explícita, revelada pela utilização da expressão "presumem-se" ou apenas implícita [4][i]; por outro lado, a liberdade de conformação do legislador está limitada por princípios fundamentais consagrados na Constituição da República, de que, com relevância para o presente caso, avulta o princípio da igualdade. No plano tributário, este princípio traduz-se na generalidade e abstracção da norma que cria os elementos essenciais do tributo, de acordo com a capacidade contributiva de cada um. Segundo se extrai do acórdão do TC n.º 343/97, de 29-04-97 " A tributação conforme com o princípio da capacidade contributiva implicará a existência e a manutenção de uma efectiva conexão entre a prestação tributária e o pressuposto económico seleccionado para objecto do imposto, exigindo-se, por isso, um mínimo de coerência lógica das diversas hipóteses concretas de imposto previstas na lei com o correspondente objecto do mesmo".

 

48. É no sentido do conceito legal de presunção e no respeito dos princípios constitucionais da igualdade e da capacidade contributiva que o legislador atribui plena eficácia à presunção derivada do registo automóvel acolhendo-a, como tal, na definição da incidência subjectiva deste tributo estabelecida no n.º 1 do art. 3.º do CIUC.

 

49. Acresce que o DL n.º 54/75, de 12/02, que disciplina o registo de veículos automóveis, não prevendo qualquer norma acerca do carácter constitutivo do registo da propriedade automóvel, estabelece, no n.º 1 do seu art. 1.º que o registo automóvel visa apenas dar publicidade à situação jurídica dos bens. De acordo com o art. 7.º do Código do Registo Predial, supletivamente aplicável ao registo automóvel, por remissão do art. 29.º daquele diploma, determina que o registo apenas "(...) constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define."

 

50. Pronunciando-se sobre esta matéria, o STJ, em acórdão de 19-02-2004, proferido no processo n.º 3B4369, conclui que "(...) o registo não surte eficácia constitutiva, pois que se destina a dar publicidade ao acto registado, funcionando (apenas) como mera presunção, ilidível (presunção "juris tantum") da existência do direito (arts- 1.º, n.º 1, e 7.º, do CRP84 e 350.º, n.º2, do C. Civil) bem como da respectiva titularidade, nos termos dele constantes (...)".

 

51. Assim, acompanhando-se a reiterada jurisprudência arbitral [5] relativa a situações idênticas, não pode deixar de se entender que a expressão "considerando-se como tais" constante da referida norma, configura uma presunção legal, e que esta é ilidível, nos termos gerais, e, em especial, por força do disposto no art. 73.º da LGT que determina que as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário.

 

Ilisão de presunções.

 

52. As presunções de incidência tributária podem ser ilididas através do procedimento contraditório próprio previsto no art. 64.º do CPPT ou, em alternativa, pela via de reclamação graciosa ou de impugnação judicial dos actos tributários que nelas se baseiem.

 

53. No presente caso, o Requerente não utilizou aquele procedimento próprio, tendo antes optado pela apresentação de reclamações graciosas que vieram a ser objecto de indeferimento. Consequentemente, o presente pedido de decisão arbitral é meio próprio para ilidir a presunção de incidência subjectiva do IUC em que se suportam as liquidações tributárias cuja anulação constitui objecto do pedido, pois que se trata de matéria que se situa no âmbito da competência material deste tribunal arbitral (arts. 2.º e 4.º do DL 10/2011).

 

54. Para ilidir a presunção derivada da inscrição do registo automóvel, o Requerente oferece, como prova, uma nota de compra emitida pela B..., COMÉRCIO DE AUTOMÒVEIS; LDA., emitida a seu favor em 14-01-2008, relativa à transacção do veículo automóvel acima identificado.

 

55. Constatando o tribunal que o referido documento não se encontrava assinado pelas partes, foi, em 19-05-2014, proferido despacho, devidamente notificado ao Requerente, para no prazo de 10 dias juntar ao processo o original devidamente assinado ou cópia autenticada. Oportunamente, foi junta cópia do referido documento, devidamente assinada, conforme o original.

 

56. Além da supra referida nota de venda, o Requerente juntou ainda, como prova do alegado, certidão do registo do veículo em causa, efectuado em 07-10-2013 em nome de C..., na Conservatória dos Registos Comercial e Automóvel de …, com base em contrato verbal de compra e venda celebrado em 06-05-2008, em que figuram como vendedor o Requerente e como compradora a pessoa acima identificada.

 

57. A referida transacção consta de declaração, elaborada segundo modelo oficial para efeitos de registo automóvel, devidamente assinada pelas partes, em que, expressamente se declara que "O contraente identificado no requerimento como vendedor declara que em 06.05.2008 efectivamente celebrou nessa qualidade o contrato nele especificado e por isso confirma-o sem quaisquer restrições" (Doc. 17).

 

58. Pronunciando-se sobre a prova documental apresentada, alega a Requerida não ser a mesma, por si só, bastante para efectuar prova concludente da transmissão do veículo em causa, porquanto não obstante o Requerente "alegar que o veículo deixou de ser propriedade sua desde o ano de 2008, não indica um único meio de prova das diligências que por si poderiam e deveriam ter sido realizadas no sentido de garantir e de confirmar o novo registo do veículo em nome da subsequente alegada proprietária do mesmo ... Ou seja, e mesmo após o ano de 2008, o veículo em causa continuou, nos termos do respectivo registo automóvel, a ser propriedade do requerente."

 

59. Se bem se extrai da posição da Requerida quanto à prova produzida, esta seria insuficiente para afastar a incidência tributária definida com base da propriedade, tal como consta do registo que, em coerência com a posição de fundo por ela assumida, apenas seria afastada em função de actualização atempada do próprio registo.

 

60. Não sendo esse o entendimento do tribunal, importa avaliar a prova produzida pelo Requerente no sentido de se determinar se é esta bastante para ilidir a presunção derivada do registo automóvel que, no plano da incidência subjectiva, é acolhida para efeitos do IUC.

 

61. Dos factos alegados pelo Requerente depreende-se não ser este o proprietário do veículo, nos períodos a que o imposto respeita, por ter o mesmo sido objecto de venda a uma empresa de comercialização de automóveis que, por sua vez, utilizando uma declaração de venda por ele subscrita - sem indicação do nome do comprador - o terá vendido a um terceiro.

 

62. Estar-se-á perante um contrato de compra e venda que, relativo a coisa móvel determinada e não estando sujeito a qualquer formalismo especial (art. 219.º do C. Civil), opera a correspondente transferência de direitos reais (art. 408.º, n.º 1, do C. Civil).

 

63. Tratando-se de contrato de compra e venda que envolve a transmissão da propriedade de um bem móvel, mediante o pagamento de um preço, tem este, como efeitos essenciais, entre outros, o de entregar a coisa (arts. 874.º e 879.º do C. Civil).

 

64. No entanto, estando em causa um contrato de compra e venda que tem por objecto um veículo automóvel, em que o registo é obrigatório, o seu cumprimento pontual pressupõe a emissão da declaração de venda necessária à inscrição no registo da corresponde aquisição a favor do comprador, conforme vem sendo entendido pela jurisprudência dos tribunais superiores [6]

 

65. Para efeitos registrais, também não é exigível qualquer formalismo especial, bastando a apresentação à entidade competente de requerimento subscrito pelo comprador e confirmado pelo vendedor que, através de declaração de venda, confirma que a propriedade do veículo foi por aquele adquirida por contrato verbal de compra e venda (vd. art. 25.º, n.º 1, alínea a) do Regulamento do Registo Automóvel).

 

66. Alegando o Requerente que, por contrato verbal, vendeu o veículo à empresa B... COMÉRCIO DE VEÌCULOS, LDA., com entrega dos respectivos documentos e declaração de venda por ele assinada, sem indicação do nome do comprador, para que aquela empresa o pudesse vender a um terceiro, poder-se-á concluir ter o Requerente agido de boa-fé visando o cumprimento pontual do contrato.

 

67. Com efeito, os documentos apresentados confirmam o alegado: a entrega do veículo e respectivos documentos àquela empresa, conforme nota de venda data de 14-01-2008 e declaração, assinada pelo Requerente, na qualidade de vendedor, e pela compradora, em que é confirmada a transferência para esta da propriedade do referido veículo por contrato verbal realizado em 6 de Maio do mesmo ano.

 

68. São, pois, estes os factos que o Requerente pretende provar através dos documentos apresentados, pelo que, face ao exposto, haverá apenas que avaliar a sua força probatória formal, para efeitos de ilisão da presunção de incidência tributária.

 

69. Configuram-se estes como documentos particulares, devidamente assinados pelas partes intervenientes, cujo requisito legal, relevante para os efeitos de lhes atribuir força probatória formal, basta-se com a assinatura do seu autor, considerando-se esta verdadeira quando reconhecida ou não impugnada pela parte contra quem o documento é apresentado (arts. 373.º e 374.º, n.º 1, do C. Civil).

 

70. No presente caso, não tendo sido impugnada a assinatura dos documentos apresentados nem tendo os mesmos sido objecto de arguição e prova de falsidade por parte da Requerida, fazem prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor (art. 376.º, n.º 1, do C. Civil).

 

71. Assim, provada documentalmente a transmissão do direito de propriedade do veículo em causa e que esta ocorreu em 14-01-2008 com a sua entrega à B... COMÉRCIO DE VEÌCULOS, LDA, e atendendo a que a exigibilidade do imposto ocorre em cada um dos aniversários da data da matrícula (atribuída em 30-11-2000), conforme prevê o art. 6.º, n.º3, do CIUC, considera-se ilidida a presunção de propriedade derivada do registo automóvel, acolhida no n.º 1 do art. 3.º do CIUC, relativamente aos períodos a que respeitam as liquidações questionadas.

 

72. Estando o facto plenamente provado por documento, fica afastada a prova testemunhal solicitada pela Requerente (art. 393.º, n.º 3, do C. Civil).

 

VI - Questões prejudicadas.

 

73. Ilidida a presunção de incidência subjectiva em que se fundam as liquidações cuja anulação constitui objecto do presente pedido, considera-se prejudicado, por inutilidade, o conhecimento dos demais vícios às mesmas imputados pela Requerente.

 

VII – Decisão.

 

Nestes termos, e com os fundamentos expostos, o Tribunal Arbitral decide:

 

a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, no que concerne à ilisão da presunção de incidência subjectiva do IUC, determinando a anulação das liquidações de IUC e de juros compensatórios a que se referem os documentos de cobrança referidos no ponto 8.1 da presente decisão.

 

b) Condenar a Requerida no pagamento das custas.

 

Valor do processo: € 184,04.

 

Custas: Ao abrigo do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixo o montante das custas em € 306,00, a cargo da requerida (AT).

 

Lisboa, 29 de Junho de 2014,

O árbitro, Álvaro Caneira.

 


 [1] Vd. Francisco Rodrigues Pardal, "O Uso de Presunções no Direito Tributário", in Ciência e Técnica Fiscal n.º 325-327. pags.20

[2] Neste sentido, vd., entre outros, STA, Acórdãos de 21.4.2010, de 3.11.2010, de 2.5.2012 e de 6.6.2012, Procs. 924/09, 499/10, 895/11 e 903/11, respectivamente.

[3] Vd. artigo 3.º, n.º1 do Regulamento do Imposto Municipal sobre Veículos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 143/78, de 12 de Junho.

[4] Vd. Jorge de Sousa, CPPT, 6.ª Edição, Áreas Editora. Lisboa, 2011, pags. 586 e STA, Acs. de 29.2.2012 e de 2.5.2012, Procs. 441/11 e 381/12.

[5] Vd. Decisões Arbitrais de 19.7.2013, 10.9.2013,15.10.2013,5.12.2013 e 14.2.2014, proferidas, respectivamente, nos Processos 26/2013-T, 27/2013-T, 14/2013-T, 73/2013-T e 170/2013-T. 

[6] Vd. STJ, Acs. de 23.3.2006 e de 12.10.2006, Procs. 06B722 e 06B2620.