Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 136/2021-T
Data da decisão: 2021-07-28   Outros 
Valor do pedido: € 2.631,73
Tema: Artigo 8º do CISV – Taxas intermédias – Veículos usados provenientes de outros Estados-Membros – Interpretação conforme
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Sumário:

I - A introdução no consumo de um veículo em qualquer Estado-membro da União Europeia deve ser entendida como o facto gerador relevante para efeitos do artigo 5.º do CISV português, no sentido aí constante de «constitui facto gerador do imposto o fabrico, montagem, admissão ou importação dos veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal».

II – O conceito de facto gerador constante do artigo 5.º do CISV deve estar em estreita relação com o princípio da não discriminação constante do artigo 110.º do TFUE e que prevê, que nenhum Estado-Membro fará incidir, direta ou indiretamente, sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, direta ou indiretamente, sobre produtos nacionais similares.

III - E é com base no conceito de facto gerador não discriminatório, decorrente do Direito da União, que devemos aplicar corretamente no tempo a taxa intermédia constante da alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º do CISV: (a) entre 2015 e 2020 para os veículos introduzidos pela primeira vez no consumo em qualquer Estado-membro da União Europeia; (b) a partir de 2021 para os veículos introduzidos pela primeira vez no consumo em qualquer Estado-membro da União Europeia.

 

 

 

O Árbitro Guilherme W. d´Oliveira Martins, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral Singular, decide o seguinte:

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I – RELATÓRIO

 

  1. O Requerente A… solicita a declaração de ilegalidade do ato de liquidação de Imposto Sobre Veículos resultante da introdução no consumo de veículo ligeiro de passageiros equipado com motor híbrido plug-in, através da Declaração Aduaneira de Veículo n.º 2021/..., de 08.02.2021, praticado pela Alfândega ..., nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 2, alínea a), 6.º, n.º 1, e 10.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, todos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT) e do artigo 102.º, n.º 1, alínea d), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), vem requerer declaração de ilegalidade dos identificados atos tributários, nos seguintes termos:
    1. Está em causa no processo a declaração de ilegalidade do ato de liquidação de Imposto Sobre Veículos resultante da introdução no consumo de veículo ligeiro de passageiros equipado com motor híbrido plug-in, através da Declaração Aduaneira de Veículo n.º 2021/..., de 08.02.2021, praticado pela Alfândega ....
    2. O Requerente impugna a liquidação do imposto por entender que a nova redação do artigo 8.º do Código do Imposto sobre Veículos trata de forma desigual um veículo matriculado originalmente noutro Estado-Membro, e que, por essa razão se verifica o desrespeito pelo artigo 110.º do Tratado sobre o Funcionamento de União Europeia.
    3. E pretendendo que o Tribunal esclareça se a liquidação do Imposto sobre Veículos viola ou não o disposto no artigo 110.º do Tratado, “porquanto discrimina negativamente os veículos usados admitidos no espaço português, provenientes de outro Estado-membro, relativamente aos que são matriculados e comercializados em Portugal”, vem, a final, pugnar pela anulação parcial do ato de liquidação de ISV e pela restituição do montante de 2.631,73 € acrescido de juros indemnizatórios.
    4. Conforme resulta dos elementos do Processo Administrativo (PA), que ora se junta, constituído pelo procedimento atinente à introdução no consumo de um veículo automóvel efetuada através da Declaração Aduaneira de Veículo (DAV) n.º 2021/..., de 08.02.2021, com data de aceitação de 05.02.2021, da Alfândega ....
    5. Com o processamento da identificada DAV, por transmissão eletrónica de dados, foi declarado um veículo automóvel ligeiro de passageiros, híbrido plug in, com as características descritas na declaração e nos demais documentos relativos ao veículo em questão, tratando-se de um usado proveniente de outro Estado-membro, com primeira matrícula datada de 27-11-2019, conforme DAV junta.
    6. A liquidação do Imposto Sobre Veículos (ISV) foi efetuada com base nos elementos declarados e características físicas e técnicas do veículo, tendo sido, para o efeito, aplicadas as disposições do Código do Imposto sobre Veículos (CISV) atinentes às taxas em vigor, incidência, facto gerador e exigibilidade do imposto.
    7. Resultando da DAV que se trata de um veículo da marca Mercedes Benz, modelo R1ES, equipado com motor híbrido plug-in, elétrico e combustível (gasóleo), com um valor de Emissão de Gases CO2, de 44 g/km (cf. inscrições do Quadro E da DAV).
    8. Quanto à autonomia no modo elétrico, de acordo com o certificado de conformidade da marca, a mesma é de 45 km e de 48 km, em meio unicamente urbano. 9. Tratando-se de veículo proveniente de outro Estado-membro, foi ainda objeto de atribuição de matrícula nacional (...-...-...), conforme resulta da informação constante da documentação do Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P. (IMT).
    9. O cálculo do imposto foi efetuado com recurso à tabela A, aplicável aos veículos ligeiros de passageiros, e calculado o ISV atendendo à componente cilindrada e à componente ambiental, nos termos do artigo 7.º do CISV, tendo sido, igualmente, aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D do n.º 1 do artigo 11.º do CISV, para os veículos usados, em função do número de anos de uso do veículo, para a componente cilindrada e a componente ambiental (cf. Quadro R da DAV).
    10. E conforme resulta do teor da DAV, quanto ao veículo em questão, para efeitos de aplicação da tabela D prevista no n.º 1 do artigo 11.º do CISV, foi aplicada uma redução de 20% na componente cilindrada e de 10% na componente ambiental, correspondentes a “Mais de 1 a 2 anos” de uso e de “Até 2 anos” de uso, respetivamente.
    11. Dos Quadros T e V da declaração constam, igualmente, a identificação do ato de liquidação (n.º 2021/...), a data da liquidação (05.02.2021), o montante do imposto (3.483,75 €), termo final do prazo de pagamento (que ocorreu em 19.02.2021), data de cobrança e a identificação do autor do ato.
    12. Em 02.03.2021, o Requerente apresentou, junto da Instância Arbitral, o presente pedido de constituição de tribunal arbitral, peticionando a anulação parcial da liquidação de ISV e o reembolso do montante de 2.631,73 € acrescido de juros indemnizatórios.

 

  1. A Autoridade Tributária, na sua resposta, defende a legalidade dos atos tributários praticados e alega, em síntese o seguinte:

 

  1. O regime do imposto sobre veículos encontra-se previsto no Código do Imposto sobre Veículos (CISV), aprovado pela Lei n.º 22-A/2007, de 27 de junho, aplicável à data dos factos em litígio, com as últimas alterações introduzidas pela Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro.
  2. Realçando-se do CISV, o Capítulo I (artigos 1.º a 11.º), relativo aos Princípios e regras gerais atinentes a este tributo, os Capítulos II, III e IV atinentes ao Estatuto dos sujeitos passivos, à Introdução no consumo e Liquidação, pagamento e reembolso, respetivamente (artigos 12.º a 29.º) e o Capítulo V (Secção I) referente aos Regimes suspensivos da admissão e Importação temporária de veículos no território nacional (artigos 30.º a 33.º).
  3. Para o enquadramento legal da questão ora submetida à sindicância do tribunal, releva, particularmente, o artigo 2.º do CISV, relativo à Incidência objectiva do imposto, que dispõe o seguinte:

«1 - Estão sujeitos ao imposto os seguintes veículos: a) Automóveis ligeiros de passageiros, considerando-se como tais os automóveis com peso bruto até 3500 kg e com lotação não superior a nove lugares, incluindo o do condutor, que se destinem ao transporte de pessoas; (…) 2 - Estão excluídos da incidência do imposto os seguintes veículos: a) Veículos não motorizados, bem como os veículos exclusivamente eléctricos ou movidos a energias renováveis não combustíveis; (…)»

  1. Estabelecendo o artigo 3.º do CISV, no que concerne à Incidência subjectiva, que:

«(…) «1 - São sujeitos passivos do imposto os operadores registados, os operadores reconhecidos e os particulares, tal como definidos pelo presente código, que procedam à introdução no consumo dos veículos tributáveis, considerando-se como tais as pessoas em nome de quem seja emitida a declaração aduaneira de veículos.

2 - São ainda sujeitos passivos do imposto as pessoas que, de modo irregular, introduzam no consumo os veículos tributáveis.»

  1. Quanto ao facto gerador de imposto sobre veículos regula o 5.º do CISV de acordo com o qual:

«1 - Constitui facto gerador do imposto o fabrico, montagem, admissão ou importação dos veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal.

2 - Constitui ainda facto gerador do imposto:

a) A atribuição de matrícula definitiva após o cancelamento voluntário da matrícula nacional feito com reembolso de imposto ou qualquer outra vantagem fiscal;

b) A transformação de veículo que implique a sua reclassificação fiscal numa categoria a que corresponda uma taxa de imposto mais elevada ou a sua inclusão na incidência do imposto, a mudança de chassis ou a alteração do motor de que resulte um aumento de cilindrada ou das emissões de dióxido de carbono ou partículas;

c) A cessação ou violação dos pressupostos da isenção de imposto ou o incumprimento dos condicionalismos que lhe estejam associados;

d) A permanência do veículo no território nacional em violação das obrigações previstas no presente código.

3 - Para efeitos do presente código entende-se por:

a) «Admissão», a entrada de um veículo originário ou em livre prática noutro Estado-membro da União Europeia em território nacional;

b) «Importação», a entrada de um veículo originário de país terceiro em território nacional.

4 - Sem prejuízo das obrigações declarativas previstas nos artigos 18.º e 19.º, quando, à entrada em território nacional, os veículos tributáveis forem colocados em regime de suspensão de imposto, considera-se gerado o imposto no momento em que se produza a sua saída desse regime.»

  1. Sendo que, quanto à exigibilidade, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 6.º, com referência ao n.º 1 do artigo 5.º, o imposto torna-se exigível no momento da introdução no consumo, considerando-se esta verificada:

«a) No momento da apresentação do pedido de introdução no consumo pelos operadores registados e reconhecidos;

b) No momento da apresentação da declaração aduaneira de veículos pelos particulares.

2 - Nos casos mencionados no n.º 2 do artigo anterior considera-se verificada a introdução no consumo no momento da ocorrência do facto gerador do imposto ou, sendo este indeterminável, no momento da respectiva constatação.

3 - A taxa de imposto a aplicar é a que estiver em vigor no momento em que este se torna exigível.»

  1. No que concerne às formalidades relativas à Introdução no consumo é de realçar o n.º 1 do artigo 17.º, nos termos do qual, a introdução no consumo e a liquidação do imposto são tituladas pela declaração aduaneira de veículos (DAV)
  2. Acrescendo que, nos termos do n.º 3 do artigo 27.º do CISV, os veículos não podem ser matriculados sem que a AT tenha comunicado ao Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, I. P. ou às direções regionais de transportes terrestres das regiões autónomas, informação comprovativa de que o imposto sobre veículos e, se for o caso, os direitos aduaneiros e o imposto sobre o valor acrescentado, se encontram pagos ou garantidos, ou de que foi reconhecida a sua isenção ou a não sujeição ao imposto sobre veículos.
  3. Quanto às taxas do imposto, releva o artigo 7.º (Taxas normais – automóveis) do CISV, que, nas alíneas a) e b) do n.º 1, consagra a aplicação das taxas previstas na Tabela A, tendo em conta as componentes cilindrada e ambiental, aos veículos automóveis de passageiros, e aos automóveis ligeiros de utilização mista e aos automóveis ligeiros de mercadorias, que não sejam tributados pelas taxas reduzidas nem pela taxa intermédia.
  4. As taxas intermédias estão previstas no artigo 8.º (Taxas intermédias – automóveis), nos seguintes termos:

«1 - É aplicável uma taxa intermédia, correspondente às percentagens a seguir indicadas do imposto resultante da aplicação da tabela A constante do n.º 1 do artigo anterior, aos seguintes veículos:

a) 60%, aos automóveis ligeiros de passageiros que se apresentem equipados com motores híbridos, preparados para o consumo, no seu sistema de propulsão, quer de energia elétrica ou solar quer de gasolina ou de gasóleo, desde que apresentem uma autonomia em modo elétrico superior a 50 km e emissões oficiais inferiores a 50 gCO2/km.

b) 40%, aos automóveis ligeiros de utilização mista, com peso bruto superior a 2500 kg, lotação mínima de sete lugares, incluindo o do condutor, e que não apresentem tração às quatro rodas, permanente ou adaptável;

c) 40%, aos automóveis ligeiros de passageiros que utilizem exclusivamente como combustível gás natural;

d) 25%, aos automóveis ligeiros de passageiros equipados com motores híbridos plug-in, cuja bateria possa ser carregada através de ligação à rede elétrica e que tenham uma autonomia mínima, no modo elétrico, de 50 km e emissões oficiais inferiores a 50 gCO2/km. (Redação dada pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro) (…)»

  1. Referindo-se o artigo 11.º do CISV (Taxas - veículos usados) às taxas aplicáveis aos veículos usados, relevando para o caso em apreço a última redação introduzida pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, (Lei do Orçamento para 2021).
  2. Relativamente à constituição do direito aos benefícios fiscais, nos quais se incluem as “reduções de taxas” previstas no artigo 8.º do CISV, dispõe o artigo 12.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, que o direito aos benefícios fiscais deve reportar-se à data da verificação dos respetivos pressupostos, ainda que esteja dependente de reconhecimento declarativo pela administração fiscal ou de acordo entre esta e a pessoa beneficiada, salvo quando a lei dispuser de outro modo.
  3. Defende o Requerente que a liquidação de ISV é ilegal por entender que deveria ter sido aplicada ao veículo, por se tratar de um veículo híbrido que foi matriculado pela primeira vez, no país de origem, em 2019, a redação anterior da alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º do CISV, que previa a aplicação de uma taxa de 25% para os automóveis com motores híbridos plug-in, com bateria carregada através de ligação à rede elétrica, com uma autonomia mínima, no modo elétrico, de 25 quilómetros.
  4. As taxas intermédias previstas no artigo 8.º, bem como as taxas reduzidas previstas no artigo 9.º do CISV configuram isenções parciais, o que nos remete para o artigo 2.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) relativo ao Conceito de benefício fiscal e de despesa fiscal e respetivo controlo, de acordo com o qual se consideram benefícios fiscais as medidas de carácter excecional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem (n.º 1), incluindo-se neste conceito, as isenções, as reduções de taxas, as deduções à matéria coletável e à coleta, as amortizações e reintegrações aceleradas e outras medidas fiscais que obedeçam às características enunciadas no número anterior (n.º 2).
  5. Nos termos do artigo 10.º do EBF, as normas que estabeleçam benefícios fiscais não são suscetíveis de integração analógica, mas admitem interpretação extensiva, reportando-se o direito aos benefícios fiscais à data da verificação dos respetivos pressupostos, ainda que dependente de reconhecimento declarativo pela administração fiscal ou de acordo entre esta e a pessoa beneficiada, salvo quando a lei dispuser de outro modo (artigo 12.º).
  6. De facto, as taxas intermédias previstas no artigo 8.º, como as taxas reduzidas previstas no artigo 9.º do CISV, configuram isenções parciais/reduções de taxas cuja racionalidade assenta na natureza ambiental ou na natureza económica, pretendendo-se, por um lado, incentivar o uso de veículos menos poluentes que, designadamente, utilizem motores elétricos e emitam valores mais reduzidos de C02, ou, por outro, proteger determinadas atividades económicas, por força da afetação dos veículos a tais atividades (como é o caso do turismo, hotelaria e comércio).
  7. Efetivamente, quanto aos benefícios fiscais consagrados no CISV, encontram-se previstas isenções totais e parciais, bem como reduções de taxas, sendo que, dentro do espectro dos benefícios fiscais, as taxas previstas nos artigos 8.º e 9.º configuram “reduções de taxas”, que se concretizam em percentagens de reduções das taxas resultantes da aplicação da tabela A ou da tabela B.
  8. Sendo que, quanto aos benefícios previstos no artigo 8.º do CISV, e concretamente, no que concerne ao referido na alínea d), do n.º 1, do artigo 8.º, dele beneficiam, exclusivamente, os automóveis ligeiros de passageiros equipados com motores híbridos plug-in, cuja bateria possa ser carregada através de ligação à rede elétrica e que tenham uma autonomia mínima, no modo elétrico, de 50 km e emissões oficiais inferiores a 50 gCO2/km (na redação que resultou do artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro).
  9. E, conforme se retira do Manual de Procedimentos do ISV (versão de 2021), acessível no portal das finanças, na parte relativa aos “Procedimentos aplicáveis a algumas situações de redução de taxas”: Para efeitos de confirmar a autonomia mínima exigida no modo elétrico e as emissões oficiais inferiores a 50 gCO2/km e nessa medida ser aplicável a taxa de 25% da tabela A, deverá ser apresentado à alfândega o documento “Homologação Europeia de Veículo Completo” (Whole Vehicle Type Approval – WVTA) ou a folha de aprovação de modelo/certificado de conformidade, desde que nele constem expressamente os elementos acima referidos.
  10. Deste modo, só os automóveis ligeiros de passageiros equipados com motores híbridos plug-in, cuja bateria possa ser carregada através de ligação à rede elétrica e que tenham uma autonomia mínima, no modo elétrico, 50 quilómetros e emissões oficiais inferiores a 50gCO2/km, beneficiam de uma redução de 75% de ISV.
  11. Ora, importa referir que o veículo em causa nos presentes autos foi objeto de introdução no consumo, através de DAV datada, e com aceitação, em fevereiro de 2021, sendo que, nesta data, já se encontrava em vigor a nova redação do artigo 8.º do CISV que, como se indicou acima, resultou da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro.
  12. E, aplicando-se as normas tributárias aos factos posteriores à sua entrada em vigor, conforme dispõe expressamente o n.º 1 do artigo 12.º da Lei Geral Tributária (LGT), relativo à aplicação da lei tributária no tempo, não se suscita qualquer dúvida de que ao facto tributário em causa se aplica a alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º do CISV atualmente em vigor.
  13. Acrescendo que, na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis (cf. n.º 1 do artigo 11.º da LGT), devendo o intérprete socorrer-se dos elementos lógicos para determinar, designadamente, o espírito da lei, a sua razão de ser/ratio legis, não se admitindo, quanto aos benefícios fiscais, a integração analógica.
  14. Assim, no que concerne à alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º não pode retirar-se desta norma outra interpretação que não seja a de aplicar uma taxa intermédia, ao imposto resultante da aplicação da tabela A constante do n.º 1 do artigo 7.º, de 25%, apenas aos automóveis ligeiros de passageiros equipados com motores híbridos plug-in, cuja bateria possa ser carregada através de ligação à rede elétrica e que tenham uma autonomia mínima, no modo elétrico, de 50 km e emissões oficiais inferiores a 50g CO2/km, constituindo estas condições cumulativas para a aplicação da referida taxa.
  15. A intenção do legislador é clara pois surge evidente que um veículo híbrido plug in com as características indicadas na mesma alínea na redação atualmente em vigor resulta menos poluente que um veículo, não obstante híbrido equipado com motores híbridos plug-in, cuja bateria possa ser carregada através de ligação à rede elétrica e que tenha uma autonomia mínima, no modo elétrico, de 25 quilómetros, conforme resultava da versão anterior.
  16. Assim, no caso concreto, o veículo foi tributado por se verificar um dos factos geradores do imposto previstos no n.º 1 do artigo 5.º, a admissão de veículo no território nacional que está obrigado à matrícula em Portugal, tornando-se o ISV exigível no momento da apresentação da DAV pelo particular, por força da alínea b), do n.º 1, do artigo 6.º do CISV.
  17. Sendo que a taxa do imposto a aplicar, de acordo com o disposto no n.º 3 do artigo 6.º do CISV, é aquela que estiver em vigor no momento em que este se torna exigível.
  18. E, considerando que o particular, ora requerente, solicitou a introdução no consumo do referido veículo em 25.02.2021, através da submissão da DAV nº 2021/..., o imposto liquidado refletiu a taxa em vigor nessa data.
  19. Refere ainda o Requerente que a nova redação dada pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, à alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º do CISV, agravou a liquidação do ISV, limitando a redução do imposto às viaturas que cumulativamente preencham os dois requisitos – autonomia mínima, no modo elétrico, de 50 km e emissões oficiais inferiores a 50 gCO2/km.
  20. Ora, acresce ao já referido, que a alteração da norma em questão, ultrapassa a competência da Requerida AT, porquanto, tendo em consideração o estabelecido no n.º 2 do artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), os impostos e os seus elementos essenciais (incidência, taxa, benefícios fiscais e garantia dos contribuintes) têm obrigatoriamente de ser criados por lei.
  21. Ademais, por outro lado, por força do disposto no n.º 2 do artigo 266.º da CRP, a atuação da AT encontra-se sujeita ao princípio da legalidade tributária, prevista no artigo 8.º da LGT, o que determina a sua vinculação à lei, não podendo a AT contrariar ou desobedecer às normas legais pré-existentes.
  22. Mais afirmando o Requerente que, por ao veículo em causa, que obteve a primeira matrícula, na Alemanha, em 27.11.2019, ter sido aplicada a taxa de 100% da tabela A, não tendo sido considerado qualquer abatimento pelo facto de estar equipado com motor híbrido plug-in e, foi violado o artigo 110.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia.
  23. Defendendo em suma, o Requerente, que, se tivesse adquirido idêntica viatura usada em Portugal, a mesma não seria onerada com a aplicação da taxa de 100% do ISV.
  24. Analisada a DAV verifica-se que ao imposto resultante da aplicação da Tabela A, foram aplicadas as percentagens de redução previstas na Tabela D, anexa ao n.º 1 do artigo 11.º do (CISV), tendo em conta a componente cilindrada e a componente ambiental, as quais estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional e à vida útil média remanescente dos veículos.
  25. Pelo que, a taxa de ISV aplicada ao veículo em causa, foi reduzida, tendo em conta os anos que decorreram entre a data da primeira matrícula (27.11.2019) e a data em que ocorreu a introdução no consumo em Portugal.
  26. Ora, no caso de veículos já matriculados em território nacional, o montante do imposto pago por esse veículo é incorporado no valor do veículo.
  27. Assim, quando um veículo registado em Portugal é vendido como veículo usado no nosso país, o seu valor de mercado, que inclui o montante residual do imposto de registo, será igual a uma percentagem, determinada pela desvalorização desse veículo, do seu valor inicial.
  28. Por conseguinte, só existe uma violação do artigo 110.º do TFUE quando o montante do imposto que incide sobre um veículo usado proveniente de outro Estado-Membro exceda o montante residual do referido imposto incorporado no valor dos veículos usados similares já matriculados no território nacional (conforme decidido em sede arbitral, designadamente na decisão de 15.06.2020, no processo n.º 660/2019-T).
  29. Tal significa que a tributação de veículos usados, provenientes de outros Estados membros, no momento da matrícula desses veículos no Estado-membro de admissão, com vista à sua colocação em circulação, devem fazer refletir o tempo de uso dos veículos, o que equivale a dizer que na tributação de veículos usados provenientes de outro EM devem ser usadas as mesmas componentes de base de tributação dos veículos novos, ajustadas pela componente que reflete o tempo de uso ou a depreciação dos veículos.
  30. No caso em apreço constata-se, que o imposto que Portugal fez incidir no momento da introdução no consumo do veículo em causa, teve como base a tributação nos veículos novos, similares, que foram introduzidos no consumo durante o ano 2021, fazendo refletir no imposto liquidado, o tempo de uso do veículo.
  31. Logo, não asiste razão ao Requerente, porquanto a sua pretensão assenta no pressuposto erróneo de que a taxa aplicada ao veículo, o discrimina negativamente pelo facto de ser proveniente de outro Estado-membro, concluindo-se que a tributação em causa não viola o artigo 110.º do TFUE. 56. Não se verificando, por conseguinte, a invocada violação do artigo 110.º do TFUE quando o que ocorreu foi, tão só, a não aplicação de uma taxa reduzida por o veículo do Requerente não ostentar as características para poder beneficiar da taxa em questão, a qual só se aplica quando estejam reunidas as condições das quais depende a sua atribuição.
  32. Quanto ao cálculo do imposto efetuado pelo Requerente, no pressuposto de que seria aplicada ao caso concreto a redação anterior da alínea d), do n.º 1, do artigo 8.º, e que, consequentemente, beneficiaria de redução do ISV a pagar pela introdução no consumo do veículo supra identificado, sempre se dirá que nunca teria direito ao montante que indicou.
  33. De facto, não tem razão o Requerente quanto ao cálculo efetuado, porquanto a redução prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º é efetuada com referência ao imposto resultante da aplicação da Tabela A prevista no artigo 7.º, não incidindo sobre os valores das reduções aplicáveis nos termos da tabela D do n.º 1 do artigo 11.º.
  34. A fórmula de cálculo do montante peticionado, defendida pelo Requerente, redundaria numa duplicação na medida em que pretende aplicar a percentagem da componente ambiental ainda sobre a componente cilindrada, o que não tem qualquer acolhimento na lei.
  35. Destarte, de acordo com o previsto nos supracitados artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 3.º, n.º 1, 5.º, n.º 1 e n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 1, alínea b), e n.º 3, 7.º, n.º 1, 8.º, n.º 1, alínea d) e 11.º n.º 1, todos do CISV, o veículo foi introduzido no consumo e tributado em sede de imposto sobre veículos, nos termos da lei.
  36. Resultando, assim, comprovados, face à lei aplicável, os pressupostos da tributação e, em concreto, da liquidação de ISV que ora vem impugnada, tendo, consequentemente, o veículo sido tributado de acordo com o regime plasmado no CISV em vigor à data da liquidação.

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi apresentado em 02-03-2021, foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 04-03-2021. Em 27-04-2021, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou com árbitro do Tribunal Arbitral Singular o aqui signatário, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

As Partes foram devidamente notificadas dessa designação, em 03-05-2020, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados das alíneas a) e e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 

O Tribunal Arbitral Singular ficou, assim, constituído em 21-05-2021, tendo sido proferido despacho arbitral em 24-05-2021 em cumprimento do disposto no artigo 17º do RJAT, notificado à AT para, querendo, apresentar resposta.

 

A AT apresentou a sua Resposta, em tempo, em 28-06-2021.

Em 06-07-2021 foi proferido Despacho arbitral com o seguinte teor:

“Tendo sido requerida prova testemunhal pelo Requerente, pretende este Tribunal Arbitral, ao abrigo do princípio da autonomia na condução do processo, previsto no artigo 16.º, alínea c) do RJAT, dispensar a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, por desnecessária, atendendo a que a questão em discussão é apenas de direito, nem foi invocada ou identificada matéria de exceção.

Fixa-se o prazo de 5 (cinco) dias para as partes, querendo, se pronunciarem. Notifiquem-se as partes do presente despacho.”

 

Em 08-07-2021 a requerente veio pedir a dispensa da prova testemunhal.

 

Em 09-07-2021 foi proferido o seguinte Despacho arbitral:

“Dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, por se afigurar desnecessária uma vez que a testemunha da Requerente foi prescindida, notifiquem-se as partes para apresentarem alegações, facultativas e sucessivas, fixando-se o prazo de 10 dias.

A prolação da decisão arbitral ocorrerá até à data limite prevista no artigo 21.º, n.º 1 do RJAT, advertindo-se a Requerente que deve previamente proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, nos termos do n.º 3 do artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e comunicar o mesmo pagamento ao CAAD.

Notifiquem-se as partes do presente despacho.”

 

As partes apresentaram as respetivas alegações.

 

POSTO ISTO:

O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

O processo não enferma de nulidades.

Tudo visto, cumpre decidir.

 

II. DECISÃO

  1. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

 

  1. Está em causa no processo a declaração de ilegalidade do ato de liquidação de Imposto Sobre Veículos resultante da introdução no consumo de veículo ligeiro de passageiros equipado com motor híbrido plug-in, através da Declaração Aduaneira de Veículo n.º 2021/..., de 08.02.2021, praticado pela Alfândega ....
  2. Conforme resulta dos elementos do Processo Administrativo (PA), constituído pelo procedimento atinente à introdução no consumo de um veículo automóvel efetuada através da Declaração Aduaneira de Veículo (DAV) n.º 2021/..., de 08.02.2021, com data de aceitação de 05.02.2021, da Alfândega ....
  3. Com o processamento da identificada DAV, por transmissão eletrónica de dados, foi declarado um veículo automóvel ligeiro de passageiros, híbrido plug in, com as características descritas na declaração e nos demais documentos relativos ao veículo em questão, tratando-se de um usado proveniente de outro Estado-membro.
  4. A liquidação do Imposto Sobre Veículos (ISV) foi efetuada com base na DAV que se trata de um veículo da marca Mercedes Benz, modelo R1ES, equipado com motor híbrido plug-in, elétrico e combustível (gasóleo), com um valor de Emissão de Gases CO2, de 44 g/km (cf. inscrições do Quadro E da DAV).
  5. Quanto à autonomia no modo elétrico, de acordo com o certificado de conformidade da marca, a mesma é de 45 km e de 48 km, em meio unicamente urbano.
  6. Tratando-se de veículo proveniente de outro Estado-membro, foi ainda objeto de atribuição de matrícula nacional (...-...-...), conforme resulta da informação constante da documentação do Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P. (IMT).
  7. O cálculo do imposto foi efetuado com recurso à tabela A, aplicável aos veículos ligeiros de passageiros, e calculado o ISV atendendo à componente cilindrada e à componente ambiental, nos termos do artigo 7.º do CISV, tendo sido, igualmente, aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D do n.º 1 do artigo 11.º do CISV, para os veículos usados, em função do número de anos de uso do veículo, para a componente cilindrada e a componente ambiental (cf. Quadro R da DAV).
  8. E conforme resulta do teor da DAV, quanto ao veículo em questão, para efeitos de aplicação da tabela D prevista no n.º 1 do artigo 11.º do CISV, foi aplicada uma redução de 20% na componente cilindrada e de 10% na componente ambiental, correspondentes a “Mais de 1 a 2 anos” de uso e de “Até 2 anos” de uso, respetivamente.
  9. Dos Quadros T e V da declaração constam, igualmente, a identificação do ato de liquidação (n.º 2021/...), a data da liquidação (05.02.2021), o montante do imposto (3.483,75 €), termo final do prazo de pagamento (que ocorreu em 19.02.2021), data de cobrança e a identificação do autor do ato.

 

 

A.2. Factos dados como não provados

 

Os factos dados como provados são aqueles que o Tribunal considera relevantes, não se considerando factualidade dada como não provada que tenha interesse para a decisão.

 

A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada

 

A matéria de facto foi fixada por este Tribunal Arbitral Singular e a convicção ficou formada com base nas peças processuais e requerimentos apresentados pelas Partes, bem como nos documentos juntos aos autos.

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor, conforme n.º 1 do artigo 596.º e n.os 2 a 4 do artigo 607.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi das alíneas a) e e) do n.º do artigo 29.º do RJAT e consignar se a considera provada ou não provada, conforme n.º 2 do artigo 123.º Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do n.º 7 do artigo 110.º do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13[1], “o valor probatório do relatório da inspeção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a decisão, em relação às provas produzidas, na íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a experiência de vida e conhecimento das pessoas, conforme n.º 5 do artigo 607.º do CPC.

Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g. força probatória plena dos documentos autênticos, conforme artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação. 

 

B. DO DIREITO

 

B.1. QUANTO AO MÉRITO

 

São as seguintes as questões a examinar no presente processo.

- Da ilegalidade da liquidação de ISV;

- Do direito a juros indemnizatórios.

 

Examinar-se-ão assim essas questões:

 

B.1.A DA ILEGALIDADE DA LIQUIDAÇÃO DE ISV

 

1. Conforme resulta do pedido arbitral, o Requerente manifestou a sua inconformidade com o ato de liquidação impugnado, por entender que por entender que a nova redação do artigo 8.º do Código do Imposto sobre Veículos trata de forma desigual um veículo matriculado originalmente noutro Estado-Membro, e que, por essa razão se verifica o desrespeito pelo artigo 110.º do Tratado sobre o Funcionamento de União Europeia. E pretende que o Tribunal esclareça se a liquidação do Imposto sobre Veículos viola ou não o disposto no artigo 110.º do Tratado, “porquanto descrimina negativamente os veículos usados admitidos no espaço português, provenientes de outro Estado-membro, relativamente aos que são matriculados e comercializados em Portugal”, vem, a final, pugnar pela anulação parcial do ato de liquidação de ISV e pela restituição do montante de 2.631,73 € acrescido de juros indemnizatórios.

 

 

2. Releva no caso concreto que de acordo com o disposto no Código do ISV, estão sujeitos ao imposto, designadamente, «os veículos automóveis ligeiros de passageiros», sendo «sujeitos passivos do imposto os operadores registados, os operadores reconhecidos e os particulares (…) que procedam à introdução no consumo dos veículos tributáveis, considerando -se como tais as pessoas em nome de quem seja emitida a declaração aduaneira de veículos» [artigo 2º, n.º 1, alínea a) e 3º, n.º 1]

E que, como estabelece o artigo 5º do mesmo código, «constitui facto gerador do imposto o fabrico, montagem, admissão ou importação dos veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal», sendo que, para este efeito, de acordo com o n.º 3 alínea a) do mesmo artigo, entende-se por «admissão, a entrada de um veículo originário ou em livre prática noutro Estado-Membro da União Europeia em território nacional».

Por sua vez, «a introdução no consumo e a liquidação do imposto são tituladas pela declaração aduaneira de veículos (DAV)», sendo, «para efeitos de matrícula, os veículos automóveis ligeiros (…) são sujeitos ao processamento da DAV» (art. 17º, n.º 1 e 3 do CISV). Assim, no que concerne às formalidades relativas à Introdução no consumo é de realçar o n.º 1 do artigo 17.º, nos termos do qual, a introdução no consumo e a liquidação do imposto são tituladas pela declaração aduaneira de veículos (DAV).

Acrescendo que, nos termos do n.º 3 do artigo 27.º do CISV, os veículos não podem ser matriculados sem que a AT tenha comunicado ao Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, I. P. ou às direções regionais de transportes terrestres das regiões autónomas, informação comprovativa de que o imposto sobre veículos e, se for o caso, os direitos aduaneiros e o imposto sobre o valor acrescentado, se encontram pagos ou garantidos, ou de que foi reconhecida a sua isenção ou a não sujeição ao imposto sobre veículos.

 

 

Quanto às taxas do imposto, releva o artigo 7.º (Taxas normais – automóveis) do CISV, que, nas alíneas a) e b) do n.º 1, consagra a aplicação das taxas previstas na Tabela A, tendo em conta as componentes cilindrada e ambiental, aos veículos automóveis de passageiros, e aos automóveis ligeiros de utilização mista e aos automóveis ligeiros de mercadorias, que não sejam tributados pelas taxas reduzidas nem pela taxa intermédia.

 

 

 

No caso concreto está em causa a aplicação da taxa intermédia, de acordo com pedido do Requerente.

 

Assim, em causa estão duas redações do artigo 8.º, n.º 1, alínea d) do CISV:

 

  1. A introduzida pela Lei n.º 82-D/2014, de 31/12:

«Artigo 8.º

Taxas intermédias – automóveis

1 - É aplicável uma taxa intermédia, correspondente às percentagens a seguir indicadas do imposto resultante da aplicação da tabela A constante do n.º 1 do artigo anterior, aos seguintes veículos:

(…)

d) 25%, aos automóveis ligeiros de passageiros equipados com motores híbridos plug-in, cuja bateria possa ser carregada através de ligação à rede elétrica e que tenham uma autonomia mínima, no modo elétrico, de 25 quilómetros.(…)»

 

  1. A posterior à Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro[2]:

«Artigo 8.º Taxas intermédias – automóveis

1 – É aplicável uma taxa intermédia, correspondente às percentagens a seguir indicadas do imposto resultante da aplicação da tabela A constante do n.º 1 do artigo anterior, aos seguintes veículos:

(…)

d) 25%, aos automóveis ligeiros de passageiros equipados com motores híbridos plug-in, cuja bateria possa ser carregada através de ligação à rede elétrica e que tenham uma autonomia mínima, no modo elétrico, de 50 km e emissões oficiais inferiores a 50 gCO2/km.(…)»

 

Significa isto, considerando o caso sub judice que estes veículos:

  1. Entre 2015 e 2020, eram tributados a 25%, desde que bateria pudesse ser carregada através de ligação à rede elétrica e que tenham uma autonomia mínima, no modo elétrico, de 25 quilómetros. Caso não reunissem um destes requisitos, seriam tributados a 100%.
  2. Em 2021, para serem tributados a 25% passaram a ter que ter uma autonomia em modo elétrico de pelo menos 50km – quando antes era de 25km – e emissões de CO2 menores que 50 g/km. Caso não reúnam um destes requisitos, serão tributados a 100%.

 

Relativamente à constituição do direito aos benefícios fiscais, nos quais se incluem as “reduções de taxas” previstas no artigo 8.º do CISV, dispõe o artigo 12.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, que o direito aos benefícios fiscais deve reportar-se à data da verificação dos respetivos pressupostos, ainda que esteja dependente de reconhecimento declarativo pela administração fiscal ou de acordo entre esta e a pessoa beneficiada, salvo quando a lei dispuser de outro modo.

 

Defende o Requerente que a liquidação de ISV é ilegal por entender que deveria ter sido aplicada ao veículo, por se tratar de um veículo híbrido que foi matriculado pela primeira vez, no país de origem, em 2019, a redação anterior da alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º do CISV, que previa a aplicação de uma taxa de 25% para os automóveis com motores híbridos plug-in, com bateria carregada através de ligação à rede elétrica, com uma autonomia mínima, no modo elétrico, de 25 quilómetros.

 

3. Na verdade, o que está em causa é uma questão de aplicação de lei no tempo conjugada com o conceito de facto gerador constante do artigo 5.º do CISV. Ora, um dos princípios gerais da interpretação das normas jurídicas e “critério de interpretação” é o da interpretação conforme à Constituição (cfr. KARL LARENZ, Metodologia da Ciência do Direito, 3ª.ed., Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, p. 480). Segundo este critério, no caso de o intérprete, mediante a aplicação dos elementos interpretativos, chegar a mais do que um sentido possível a atribuir a um preceito normativo, deve preferir aquele que mais se adeque à Constituição.

No caso concreto, tal regra hermenêutica, mediada por uma interpretação atualista, aponta decisivamente para a interpretação da alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º do Código do ISV, tendo em conta a evolução temporal identificada entre a Lei n.º 82-D/2014, de 31/12 e a Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro e por base o conceito de facto gerador constante do artigo 5.º do CISV.

Assim, numa perspetiva atual, à luz da evolução dos conceitos técnicos operados nas duas normas, assentes na evolução tecnológica dos veículos híbridos, só uma interpretação assente num critério teleológico-objetivo, e em conformidade com a Constituição evita uma contradição de valoração insanável, que não encontra qualquer fundamento razoável e é contrária à unidade do sistema jurídico.

Tudo o que tendo direta aplicação no caso concreto, conduz, necessariamente, a uma interpretação atualista do artigo 5.º, respeitante ao facto gerador do imposto com reflexos na alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º do CISV, de que decorre que se retire do preceito o sentido interpretativo de que o mesmo acolhe que a alteração legislativa efetuada na Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro:

  1. apenas se aplica aos factos geradores verificados na data posterior a 1 de janeiro de 2021;
  2. sendo que o conceito de facto gerador de imposto constante do artigo 5.º do CISV abrange todo o veículo abrangido pela norma de incidência que tenha sido adquirido em espaço europeu.

 

4. Se atentarmos ao conceito de facto gerador constante do artigo 5.º do CISV e articularmos com o direito da União, mais concretamente os artigos 26.º e 28.º a 37.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), que consagram o direito à livre circulação de mercadorias.

Ora, o direito à livre circulação de mercadorias originárias dos Estados-Membros, e de produtos provenientes de países terceiros que se encontrem em livre prática nos Estados-Membros, é um dos princípios fundamentais do Tratado (artigo 28.º do TFUE). Inicialmente, a liberdade de circulação de mercadorias foi considerada um elemento de uma união aduaneira entre os Estados-Membros, envolvendo a eliminação de direitos aduaneiros, restrições quantitativas nas trocas comerciais e medidas de efeito equivalente, bem como o estabelecimento de uma pauta aduaneira comum para a União. Mais tarde, a tónica foi colocada na eliminação de todos os obstáculos subsistentes à livre circulação de mercadorias, tendo em vista a criação do mercado interno.

No caso concreto, a introdução no consumo do veículo na Alemanha deve ser entendida como o facto gerador relevante para efeitos do artigo 5.º do CISV português, no sentido aí constante de «constitui facto gerador do imposto o fabrico, montagem, admissão ou importação dos veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal», sob pena de entendimento contrário, tal como a Requerida assumiu, no sentido de considerar o facto gerador o momento do registo da matrícula em Portugal ser discriminatório.

Assim, o conceito de facto gerador constante do artigo 5.º do CISV deve estar em estreita relação com o princípio da não discriminação constante do artigo 110.º do TFUE e que prevê, que nenhum Estado-Membro fará incidir, direta ou indiretamente, sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, direta ou indiretamente, sobre produtos nacionais similares.

 

Este princípio da não discriminação é reforçado pela liberdade de circulação de mercadorias, que encerra igualmente uma dupla proibição:

  1. Proibição dos encargos de efeito equivalente a direitos aduaneiros: artigo 28.º, n.º 1, e artigo 30.º do TFUE – O Tribunal de Justiça da União Europeia[3] considera que qualquer imposição, independentemente da sua designação ou meio de aplicação, «que, incindindo especificamente sobre o produto importado de um país membro e não sobre o produto nacional similar, [tenha] como resultado, ao alterar o seu preço, ter sobre a livre circulação de produtos a mesma incidência que um direito aduaneiro», pode ser considerada um encargo de efeito equivalente, independentemente da sua forma ou natureza.
  2. Proibição das medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas: artigos 34.º e 35.º do TFUE – O Tribunal de Justiça da União Europeia[4] considera que qualquer regulamentação comercial aplicada pelos Estados-Membros que seja suscetível de entravar, direta ou indiretamente, efetiva ou potencialmente, o comércio intracomunitário deve ser considerado uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa[5]/[6].

 

E é com base no conceito de facto gerador não discriminatório, decorrente do Direito da União, que devemos aplicar corretamente no tempo a taxa intermédia constante da alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º do CISV:

  1. Entre 2015 e 2020 para os veículos introduzidos pela primeira vez no consumo em qualquer Estado-membro da União Europeia;
  2. A partir de 2021 para os veículos introduzidos pela primeira vez no consumo em qualquer Estado-membro da União Europeia.

 

5. No caso concreto, se a primeira matrícula do veículo é datada de 27-11-2019, conforme DAV junta, é esta a data relevante para aplicação do conceito de facto gerador constante do artigo 5.º do CISV e que faz aplicar a taxa intermédia em vigor à data da primeira matrícula constante do alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º do CISV em vigor à data (2019), com a seguinte redação:

 

«Artigo 8.º

Taxas intermédias – automóveis

1 - É aplicável uma taxa intermédia, correspondente às percentagens a seguir indicadas do imposto resultante da aplicação da tabela A constante do n.º 1 do artigo anterior, aos seguintes veículos:

(…)

d) 25%, aos automóveis ligeiros de passageiros equipados com motores híbridos plug-in, cuja bateria possa ser carregada através de ligação à rede elétrica e que tenham uma autonomia mínima, no modo elétrico, de 25 quilómetros(…)»

 

Diga-se aliás que este entendimento alargado de facto gerador decorrente do princípio da não discriminação europeia vem confirmar, por estarmos perante uma taxa intermédia e especial e consequentemente perante um benefício fiscal, que o reconhecimento confere ex lege a sua eficácia declarativa (ex tunc e não ex nunc, o que exige a verificação dos pressupostos no momento da primeira aquisição e não das aquisições derivadas, desde que em espaço europeu) conforme resulta do artigo 5.º, n.º 2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

 

Concluindo-se assim que a liquidação de ISV efetuada pela AT, que aplicou o artigo 8.º do CISV na versão de 2021, e não na versão em vigor entre 2015 e 2020, foi efetuada em desconformidade com a lei nacional e o direito comunitário, incumprindo, designadamente, o disposto nos artigos 110.º do TFUE e o artigo 103.º da Constituição.

Nessa senda diga-se, a talhe de foice, que o reenvio prejudicial para o TJUE só se justifica quando o julgador tenha dúvidas quanto ao sentido e alcance de alguma disposição do direito da União Europeia. Quando tal dúvida não exista, deve o tribunal arbitral limitar-se a aplicar o direito da União Europeia e fazer a interpretação conforme, mesmo que esteja em causa apenas, como é o caso, aplicação de lei no tempo com base na conformação e clarificador do conceito de facto gerador do imposto.

 

Ao decidir em sentido contrário a AT incorreu, desta forma, em ilegalidade, devendo a liquidação ser anulada conforme peticionado e reconhecido o direito à taxa intermédia de 25% constante da alínea d) do n.º 1 do artigo 8.º do CISV na redação dada pela Lei n.º 82-D/2014, de 31/12, com as legais consequências.

 

 

B.1.B. DO DIREITO A JUROS INDEMNIZATÓRIOS.

 

Tendo a Demandante pago a totalidade do imposto liquidado nos atos aqui impugnados, pede ao Tribunal que condene a Demandada, em caso de procedência do seu pedido, à devolução do imposto indevidamente pago e ao pagamento de juros indemnizatórios.

 

De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”.

 

Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão “declaração de ilegalidade” para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira diretriz, que “o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária” (CAAD, proc. nº 277/2020-T; CAAD, proc. nº 220/2020-T).

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de atos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT, que dispõe que “se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea” ”( CAAD, proc. nº 277/2020-T; CAAD, proc. nº 220/2020-T).

 

O n.º 5 do art. 24.º do RJAT, ao dizer que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral” (CAAD, proc. nº 277/2020-T; CAAD, proc. nº 220/2020-T).

Na sequência da anulação parcial do ato impugnado, a Demandante terá direito a ser reembolsada do imposto indevidamente pago, o que é efeito da própria anulação parcial, por força dos artigos 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT.

Quanto ao direito a juros indemnizatórios, dispõe o art. 43º nº 3 LGT que “são também devidos juros indemnizatórios (...) d) em caso de decisão judicial transitada em julgado que declare ou julgue a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa ou regulamentar em que se fundou a liquidação da prestação tributária e que determine a respetiva devolução”.

É o caso dos presentes autos, em que se julga o art. 11º do ISV, no qual se basearam os atos de liquidação impugnados, incompatível com o art. 110º do Tratado da União Europeia.

Pelo que há que concluir que, transitada a presente decisão arbitral em julgado, a Demandada terá direito a ser ressarcida nos termos do art. 43º, nº 3, al. d), através do pagamento de juros indemnizatórios.

 

C. DECISÃO

Nestes termos, decide o Tribunal Arbitral Singular:

  1. Julgar procedente o pedido declaração de ilegalidade parcial do ato de liquidação de Imposto Sobre Veículos n.º 2021/..., resultante da introdução no consumo de veículo ligeiro de passageiros equipado com motor híbrido plug-in, através da Declaração Aduaneira de Veículo n.º 2021/..., de 08.02.2021;

E em consequência:

  1. Ordenar a devolução à requerente do montante peticionado de € 2.631,73, acrescido de juros indemnizatórios, à taxa legal, contados da data do seu pagamento até integral reembolso.

 

D. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em € 2.631,73, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

E. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 612,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerida, uma vez que o pedido foi julgado procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT.

Registe-se e notifique-se.

 

Lisboa, 28 de julho de 2021

 

O Árbitro,

 

(Guilherme W. d’Oliveira Martins)

 

 

 



[1] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.

[2] Redação dada pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro.

[5] Ver processo 8/74 de 11 de julho de 1974 e pontos 63 a 67 do processo C-320/03 de 15 de novembro de 2005.

[6] A argumentação do Tribunal de Justiça foi mais desenvolvida no acórdão Cassis de Dijon, que estabelece o princípio segundo o qual qualquer produto legalmente fabricado e comercializado num Estado-Membro, em observância das suas normas justas e tradicionalmente aceites, e dos processos de fabrico desse país, deve ser admitido no mercado de qualquer outro Estado-Membro. Esta foi a argumentação fundamental subjacente ao debate sobre a definição do princípio de reconhecimento mútuo, aplicável na ausência de harmonização. Por conseguinte, e mesmo na ausência de medidas de harmonização europeias (direito derivado da UE), os Estados-Membros são obrigados a permitir que mercadorias que são legalmente produzidas e comercializadas num Estado-Membro circulem e sejam colocadas nos seus mercados. Um aspeto importante a sublinhar é o facto de o âmbito de aplicação do artigo 34.º do TFUE ser limitado pelo acórdão Keck, nos termos do qual certas modalidades de venda não são abrangidas pelo âmbito de aplicação desse artigo, desde que sejam de caráter não-discriminatório (isto é, se são aplicáveis a todos os operadores que exercem a atividade no território nacional, e afetam da mesma maneira, de direito e de facto, a comercialização de produtos nacionais e de produtos provenientes de outros Estados-Membros).