Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 266/2014-T
Data da decisão: 2014-09-25  Selo  
Valor do pedido: € 132.993,90
Tema: IS – artigo 28º da TGIS
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Decisão Arbitral

 

I.     RELATÓRIO

 

                 1. A, sociedade aberta, com o número único de matrícula e de pessoa colectiva ..., com sede na …, que se encontra na competência geográfica do serviço de finanças do Porto-2,doravante designada por Requerente,  vem, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a), 10.º, n.º 1, alínea a), todos do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT) requerer a CONSTITUIÇÃO DE TRIBUNAL ARBITRAL COLETIVO com vista à declaração de ilegalidade daquele ato tributário.

 

Pede a requerente a anulação dos actos tributários de liquidação de Imposto de Selo (doravante, IS) infra identificados, ao abrigo da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo (doravante, TGIS),  anexa à Lei 150/99, de 11 de Setembro, que aprova o Código do Imposto de Selo (doravante, Código do IS) com a consequente a restituição dos valores pagos com juros indemnizatórios.

 

Fundamenta sinteticamente o pedido, alegando no essencial:

          - O presente pedido de pronúncio arbitral visa a declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de IS ao abrigo da verba 28.1 da TGIS anexa ao Código do Imposto do Selo sobre o terreno para construção com o artigo matricial ..., consubstanciado no Documento de Cobrança n.º 2013 ..., sobre o terreno para construção com o artigo matricial ..., Documento de Cobrança n.º 2013 ..., sobre o terreno para construção com o artigo matricial ..., Documento de Cobrança n.º 2013 ..., e sobre o terreno para construção com o artigo matricial ..., Documento de Cobrança n.º2013 ..., todos de 17/07/2013, em virtude de os terrenos para construção em apreço não integrarem o âmbito de incidência pretendido pela norma de incidência aplicada.

          - À luz do princípio de economia processual e porquanto a apreciação dos actos tributários acima melhor identificados depende essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios e regras de direito, em conformidade com o disposto no número 1 do artigo 3.º do RJAT, requere a apreciação conjunta dos actos tributários em causa.

          - O Requerente é uma instituição de crédito, sujeita à supervisão do Banco de Portugal, que encabeça o Grupo A, grupo financeiro, multi-especializado, centrado na actividade bancária, dotado de uma oferta completa de serviços e produtos financeiros para clientes empresariais, institucionais e particulares.

          - O Requerente é o único proprietário do terreno para construção inscrito na matriz predial urbana de ... sob o artigo matricial ... da Freguesia ..., Concelho e Distrito de ... (actual artigo matricial ... da Freguesia ...), conforme Caderneta Predial Urbana, que junta como Documento n.º1.

          - O Requerente é, igualmente, o único proprietário do terreno para construção inscrito na matriz predial urbana de ... sob o artigo matricial ... da Freguesia ..., Concelho e Distrito de ... (actual artigo matricial ... da Freguesia ...), conforme Caderneta Predial Urbana, que junta como Documento n.º2.

          - O Requerente é ainda o único proprietário do terreno para construção inscrito na matriz predial urbana de ... sob o artigo matricial ... da Freguesia ..., Conselho e Distrito de ... (actual artigo matricial ... da Freguesia ...), conforme Caderneta Predial Urbana, que junta como Documento n.º3.

          -Finalmente, o Requerente é também o único proprietário do terreno para construção inscrito na matriz predial urbana de ... sob o artigo matricial ... da Freguesia ... (actual artigo matricial ... da Freguesia ...)), conforme Caderneta Predial Urbana, que junta como Documento n.º4.

          - Através dos documentos de cobrança identificados o Requerente foi notificado das liquidações de IS ao abrigo da verba 28.1 da TGIS sobre os 4 terrenos para construção acima descritos, perfazendo o total de Imposto de Selo liquidado de € 132.993,90 (Cf. Documento n.º 5).

          - O Requerente não concorda com os termos das referidas liquidações uma vez que estas visam factos tributários referentes à propriedade de prédios urbanos com afectação habitacional, a qual não se pode considerar verificada no caso de terrenos para construção.

-Assim, o Requerente entende que a Autoridade Tributária efectuou uma errada interpretação e aplicação da verba 28.1 da TGIS que conduz à ilegalidade dos actos tributários de liquidação de IS, pelos motivos que fundamenta:

- Efectivamente, a Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro, que introduziu a verba 28.1, introduziu “uma tributação especial sobre propriedades de elevado valor destinadas à habitação” ou noutras palavras “ uma tributação especial que incidirá sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros”, conforme declarado pelo então Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais em declaração sobre a referida lei na Assembleia da República.

- Decorre da redacção da verba 28.1 da TGIS que esta apenas inclui no seu âmbito de sujeição os prédios que satisfaçam cumulativamente os seguintes requisitos:

       i) sejam prédios urbanos;

       ii) tenham um valor patrimonial tributário superior a € 1.00.000,00

       iii) tenham afectação habitacional

- Estarão fora da referida norma de incidência:

       i) os prédios rurais;

       ii) os prédios urbanos com VPT inferior a 1 milhão de euros;

iii) os prédios urbanos destinados a outros fins, nomeadamente comércio, serviços, indústria ou terrenos para construção

- até porque, os terrenos para construção, por lhes ter sido concedida uma licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, têm como destino a cosntrução.

- não existindo assim, por definição, nos terrenos para construção, prédio destinado à habitação, dado não haver qualquer construção!

- Em sede de Imposto Municipal sobre Imóveis, normativo legal para o qual o Código do IS remete a regulação dos demais aspectos relacionados com a incidência, liquidação e cobrança deste novo imposto sobre a propriedade, os prédios dividem-se em prédios rústicos ou urbanos.

- E os prédios urbanos dividem-se em: i) habitacionais; ii) comerciais, industriais ou para serviços; iii) terrenos para construção; iv) outros.

- esta terminologia não coincide com a “afectação habitacional” pretendida pelo legislador do IS.

- A qualificação de um prédio urbano em habitacional, comercial, industrial para serviços ou terrenos para construção depende, regra geral, de um requisito de natureza formal, qual seja, o licenciamento.

- Mas até à conclusão das obras, num terreno para construção, não é possível, por definição, a afectação habitacional.

- Nem o licenciamento é, só de per si, garantia da concretização da construção.

- Acresce que nem a utilização do coeficiente de afectação referente à utilização para habitação, na avaliação dos terrenos para construção, é determinante, uma vez que esse coeficiente só é aplicável para a avaliação do imóvel e determinação do valor de mercado.

 - Esta conclusão fica reforçada pelo facto de, apenas com a alteração introduzida pela Lei nº 83 – C/2013, de 31 de Dezembro, se passar a incluir na verba em apreço, expressamente, a expressão “terrenos para construção”, sem que tenha sido dado a essa alteração qualquer carácter interpretativo.

- Finalmente, o Requerente enuncia jurisprudência tribunal arbitral que sustenta a ilegalidade da liquidação de IS ao abrigo da verba 28.1 da TGIS sobre imóveis classificados como “terrenos para construção”, nomeadamente os processos nºs. 48/2013-T, 49/2013-T, 53-2013-T e 42/2013.

 

Pedido do Requerente

- Os prédios urbanos em apreço, e sobre os quais foi liquidado IS ao abrigo da verba n.º 28.1 da TGIS, são qualificados como terrenos para construção, não estando, à data a que os factos se reportam, nele edificada qualquer construção.

- De onde se retira que a liquidação em crise é ilegal, impondo-se, em consequência, a sua anulação.

- O Requerente procedeu ao pagamento voluntário do imposto apurado na liquidação sub judice .

- Em  consequência dos referidos pagamentos, a procedência do presente requerimento deverá determinar, nos termos da lei, o reembolso ao Requerente dos montantes ora liquidados e indevidamente pagos, acrescido dos respectivos juros indemnizatórios a que se referem os artigos 43.º da LGT e 61.º do CPPT.

 

 

                 Resposta da AT

A Autoridade Tributária veio defender na resposta a manutenção dos ato tributários sindicados, pedindo a absolvição do pedido com reafirmação, no essencial, dos argumentos que fundamentaram a decisão de manutenção desses actos. Em síntese mantém a Requerida os seguintes argumentos:

 

            - Respondeu a AT no sentido de que os prédios objecto das liquidações de IS impugnadas, têm a natureza jurídica de prédios com afectação habitacional, pelo que o ato de liquidação objecto do presente pedido de pronúncia arbitral deve ser mantido por consubstanciar correta interpretação da Verba 28 da Tabela Geral aditada pela Lei 55-A/2012, de 29/12."

            - Após referir, nas suas linhas essenciais, as alterações introduzidas ao Código e Tabela Geral do Imposto do Selo pela referida Lei, diz a requerida que "Na ausência de qualquer definição sobre os conceitos de prédio urbano, terreno para construção afetação habitacional sem sede de IS há que recorrer ao CIMI na procura de uma definição que permita aferir da eventual sujeição a IS de acordo com o previsto no artigo 67.º do n.º 2 do CIS, na redação dada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29/10."

- De acordo com esta norma, as matérias não reguladas no CIS respeitantes à Verba 28 da TGIS aplica-se subsidiariamente o disposto no CIMI.

- Sustenta a Requerida que "A noção de afectação de prédio urbano encontra assento na parte relativa à avaliação dos imóveis, o que bem se compreende porquanto a avaliação do imóvel (finalidade) incorpora valor ao imóvel constituindo um facto de distinção determinante (coeficiente) para efeitos de avaliação."

- Entende, pois, a requerida que, "Conforme resulta da expressão "... valor das edificações autorizadas" constante do art. 45.º, n.º 2, do CIMI, o legislador optou por determinar a aplicação da metodologia de avaliação dos prédios em geral à avaliação de terrenos para construção, sendo-lhes por conseguinte aplicável o coeficiente de afectação previsto no artigo 41.º do CIMI."

- Pelo que, continua alegando que: Para efeitos de determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção é clara a aplicação do coeficiente de afectação em sede de avaliação, pelo que a sua consideração para efeitos de aplicação da verba 28 da TGIS não pode ser ignorada,

- Ao contrário do entendimento da Requerente, " a AT entende que o conceito de "prédios com afectação habitacional" para efeitos do disposto na Verba 28 da TGIS, compreende quer os prédios edificados quer os terrenos para construção, desde logo atendendo ao elemento literal da norma. "

- Por um lado, defende a Requerida, o legislador (da Verba 28 da TGIS) " não refere "prédios destinados a habitação", tendo optado pela noção "afectação habitacional". Expressão diferente e mais ampla cujo sentido há-de ser encontrado na necessidade de integrar outras realidades para além das identificadas no art. 6.º, n.º 1, alínea a), do CIMI."; por outro lado, "a lei fiscal considera como elemento integrante para efeitos de avaliação dos terrenos para construção o valor da área de implantação, a qual varia entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas com base no projecto de urbanização e construção".

- Sendo que, segundo o RJUE, o alvará de licença para a realização de operações urbanísticas deverá conter, entre outros elementos, o número de lotes e a indicação da área de localização, finalidade, área de implantação, área de construção, número de pisos de número de fogos de cada um dos lotes, com especificação dos lotes destinados a habitação social.

- Conclui a Requerida que muito antes da efectiva edificação do prédio, é possível apurar e determinar a afectação do terreno para construção

- Quanto à inconstitucionalidade considera a AT que a previsão da verba 28 da TGIS não consubstancia qualquer violação do princípio da constitucionalidade por se tratar de uma norma geral e abstracta que se aplica de forma indistinta a todos os casos em que se verifiquem os pressupostos de facto e de direito.

- Conclui a Requerida que as liquidações em crise consubstanciam uma correcta

interpretação e aplicação do direito aos factos, não padecendo de vício de violação de lei, seja da CRP ou do CIS, devendo, em consequência, julgar-se improcedente a pretensão aduzida e absolver-se a Entidade Requerida do pedido.

 

       SANEAMENTO

      

Este Tribunal Arbitral colectivo foi regularmente constituído em 23-05-2014, tendo sido os árbitros designados pelo Conselho Deontológico do CAAD, cumpridas as respetivas formalidades legais e regulamentares (cfr artigos 11º-1/a) e b), do RJAT e 6º e 7º, do Código Deontológico do CAAD), e é competente em razão da matéria, em conformidade com o artigo 2.º do RJAT.

 

Por decisão do Tribunal de 14-07-2014, foi dispensada a reunião prevista no artigo 18º do RJAT. As partes não apresentaram alegações.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março). 

      

            Não foram identificadas nulidades no processo

 

II FUNDAMENTAÇÃO

A. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

 

1-      O Requerente é a instituição de crédito, sujeita à supervisão do Banco de Portugal, que encabeça o Grupo A, grupo financeiro, multi-especializado, centrado na actividade bancária, dotado de uma oferta completa de serviços e produtos financeiros para clientes empresariais, institucionais e particulares.

2-      O Requerente é o único proprietário do terreno para construção urbana inscrito na matriz predial urbana de ... sob o artigo matricial ... da Freguesia ... (atual artigo matricial ... da Freguesia ...).

3-      O Requerente é, igualmente, o único proprietário do terreno para construção urbana inscrito na matriz predial urbana de ... sob o artigo matricial ... da Freguesia ... (atual artigo matricial ... da Freguesia ...).

4-      O Requerente é ainda o único proprietário do terreno para construção urbana inscrito na matriz predial urbana de ... sob o artigo matricial ... da Freguesia ... - (atual artigo matricial ... da Freguesia ...).

5-      O Requerente é também o único proprietário do terreno para construção urbana inscrito matriz predial urbana de ... sob o artigo matricial ... da Freguesia ... (atual artigo matricial ... da Freguesia ...).

6-      Através dos seguintes documentos de cobrança, o Requerente foi notificado das liquidações de IS ao abrigo da verba 28.1 da TGIS sobre os 4 terrenos para construção acima referidos, perfazendo o total do imposto do Selo liquidado €132.993,90:

7-      Os referidos documentos de cobrança tinham como prazo limite de pagamento DEZEMBRO/2013.

8-      O Requerente pagou tempestivamente os montantes de IS liquidados.

9-      A presente acção arbitral deu entrada no CAAD no dia 17 de março de 2014.

 

A.2. Factos dados como não provados

Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.

 

A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao atual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, de resto consensualmente reconhecidos e aceites pelas partes.

 

B. DO DIREITO

A Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, aditou a verba 28 à Tabela Geral de Imposto de Selo (TGIS), com a seguinte redacção:

28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1 – Por prédio com afetação habitacional – 1 % (…);

Nas disposições transitórias que constam do artigo 6.º daquela Lei n.º 55-A/2012, estabeleceram-se as seguintes regras:

c) O valor patrimonial tributário a utilizar na liquidação do imposto corresponde ao que resulta das regras previstas no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis por referência ao ano de 2011; (…)

f) As taxas aplicáveis são as seguintes:

i) Prédios com afetação habitacional avaliados nos termos do Código do IMI: 0,5 %;

ii) Prédios com afetação habitacional ainda não avaliados nos termos do Código do IMI: 0,8 %;

Ora, as disposições acima referidas contêm um conceito que não é utilizado em qualquer outra legislação tributária, que é o conceito de “prédio com afetação habitacional”.

No n.º 2 do artigo 6.º do CIMI é utilizada a expressão «prédios habitacionais», definindo-os como abrangendo «os edifícios ou construções» licenciados para fins habitacionais ou que, na falta de licença, tenham como destino normal fins habitacionais.

No entanto, a não coincidência dos termos da expressão utilizada na verba n.º 28.1 da TGIS (“prédio com afectação habitacional”) com a que se extrai do n.º 2 do artigo 6.º do CIMI (“prédios habitacionais”), aponta no sentido de não se ter pretendido utilizar o mesmo conceito.

Acresce que, no mesmo artigo, se distingue claramente entre prédios urbanos habitacionais e terrenos para construção.

Seguindo de perto outros acórdãos do CAAD proferidos sobre esta mesma matéria, entendemos que a palavra «afetação», neste contexto de utilização de um prédio, deve significar «acção de destinar alguma coisa a determinado uso». Assim, «prédio com afetação habitacional», não poderá ser um prédio apenas licenciado para habitação ou destinado a esse fim (isto é, não bastará que seja um «prédio habitacional»), tendo de ser um prédio que tenha já efetiva afetação a esse fim.

Assim, ” é de concluir que os elementos interpretativos disponíveis, inclusivamente as «circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada», apontam claramente no sentido de não se ter pretendido abranger no âmbito de incidência da verba n.º 28.1 as situações de prédios que ainda não estão afetos à habitação, nomeadamente os terrenos para construção detidos por empresas”.

Acresce que, com a Lei de Orçamento de Estado para 2014, foi a verba 28.1 TGIS expressamente alterada, de forma a incluir, a partir de 01.01.2014, os prédios para construção, o que reforça a nossa convicção de que tais prédios não eram abrangidos pela redacção vigente até 31.12.2013.

Ora, os prédios do Requerente são terrenos para construção, não se estando, portanto, perante prédios com afetação habitacional atual. Ou seja, não se verifica assim, à data, a afectação a um fim habitacional.

Por este facto, entendemos que as liquidações cuja declaração de ilegalidade é pedida enfermam de vício de violação daquela verba n.º 28.1 TGIS, por erro sobre os pressupostos de direito, o que justifica a declaração da sua ilegalidade e consequente anulação (artigo 135.º do CPA).

Em face do exposto, determina-se:

(a)    A declaração de ilegalidade e de anulação dos actos de liquidação de IS objecto do presente pedido, tudo com as devidas legais consequências;

 

(b)   A devolução do valor de imposto pago pelo Requerente no montante global de €132.993,90; e

 

 

 

(c)    O pagamento de juros indemnizatórios pela Requerida, calculados sobre a quantia de €132.993,90, à taxa legal, até integral pagamento.

 

No que aos juros indemnizatórios respeita, conforme já decidido no Acórdão Arbitral proferido no processo n.º 14/2012-T, de 29 de Junho de 2012, compreendem-se nas competências dos tribunais arbitrais tributários as pronúncias condenatórias que em processo de impugnação judicial são admitidas aos tribunais tributários estaduais, sendo de igual forma admissível o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

 

Em consequência da ilegalidade substantiva das liquidações de IS objecto da presente acção, o Requerente pagou imposto que não era devido, impondo-se não só o respectivo reembolso, nos termos dos artigos 24.º, n.º 1, alínea b) do RJAT e 100.º da LGT, como o pagamento de juros indemnizatórios por se encontrarem reunidas as respectivas condições constitutivas, de acordo com o preceituado nos artigos 43.º da LGT e 61.º do CPPT, calculados sobre a quantia paga em excesso e contados desde as datas dos pagamentos efectuados até integral restituição.

 

 

III DECISÃO

 

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:

a)    Julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, anular o ato tributário impugnado;

b)   Condenar a AT à devolução do imposto pago pela Requerente, acrescido de juros indemnizatórios, calculados nos termos legais.

c)    Condenar a AT nas custas do processo, no montante de €3.060.00.

 

D. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em €132.993,90, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

E. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €3.060.00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela AT, uma vez que o pedido foi integralmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

 

Notifique-se.

 

 

Lisboa

25 de Setembro de 2014

 

 

O Árbitro Presidente

 

 

(José Pedro Carvalho)

 

 

 

O Árbitro Vogal

 

 

 

 

(Ana Teixeira de Sousa)

 

 

O Árbitro Vogal

 

 

 

(Maria Antónia Torres)