Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 210/2019-T
Data da decisão: 2020-01-20  IVA  
Valor do pedido: € 26.809,98
Tema: IVA – artigo 14.º n.º 1 alínea b) do CIVA – documentos comprovativos da exportação.
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DECISÃO ARBITRAL

 

A árbitra Dra. Catarina Belim, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o presente Tribunal Arbitral, constituído em 06.06.2019, decide o seguinte:

 

I.             RELATÓRIO

 

1.            A..., LDA., doravante designada por “Requerente”, número de pessoa coletiva e de identificação fiscal ..., com sede na ..., ..., ...-... ..., distrito de ..., tendo sido notificada do indeferimento expresso da Reclamação Graciosa apresentada contra os atos tributários de liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”), com os ns.º ... (período 2015.12), 2018 ... (período 2016.01), 2018 ... (período 2016.09) e ato tributário de liquidação de juros compensatórios n.º 2018 ... (período 2016.01), emitidos na sequência de uma inspeção tributária em sede de IVA, para os anos de 2015 e 2016, apresentou, em 22.03.2019, pedido de constituição de Tribunal Arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 2 e 10.º, n.º 1, alínea a) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (“RJAT”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, conjugados com o artigo 102.º, n.º 1, alínea b) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), sendo Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”).

 

2.            A Requerente pretende a anulação dos atos de liquidação supra referidos e consequente restituição de quantias pagas, acrescidas dos respetivos juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º da Lei Geral Tributária.

 

3.            Invoca, em sede material, que não existe fundamento legalmente válido que sustente as liquidações, por se encontrar comprovada a exportação dos bens realizadas, em cumprimento do artigo 14.º, n.º 1, alínea b), do Código do IVA (“CIVA”). 

 

4.            Invoca, em sede formal, a insuficiente fundamentação dos atos de liquidação e preterição de formalidade essencial de audição antes da liquidação prevista no artigo 60.º, n.º ,1 alínea a) da LGT. Invoca ainda a incompetência da Diretora-Geral dos Impostos quanto aos atos em causa por caducidade da autorização legislativa constante das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 91.º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro (Orçamento do Estado para o ano de 2008).    

 

5.            De acordo com os artigos 5.º, n.º 2, alíneas a) e b) e 6.º, n.º 1 do RJAT, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem designou como árbitra singular do Tribunal Arbitral a signatária, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

6.            O Tribunal Arbitral foi constituído no CAAD, em 06.06.2019, conforme comunicação do Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD.

 

7.            Notificada para o efeito, em 10.07.2019, a Requerida apresentou resposta e juntou o respetivo processo administrativo (“PA”) tendo-se defendido por impugnação.

 

8.            Em 21.11.2019 realizou-se uma reunião em que foi produzida prova testemunhal.

9.            Na sequência da reunião realizada, foram juntos, em 27.11.2019, documentos adicionais pela Requerente (21 a 24), tendo sido dado contraditório à Requerida para pronúncia sobre os documentos, nada tendo sido requerido.

 

10.          Foi concedido prazo para alegações sucessivas tendo as mesmas sido apresentadas pelas partes que se pronunciaram sobre a prova produzida, desenvolvendo as respetivas posições jurídicas.

                                                                                                                                                            

II.            SANEAMENTO

 

11.          O Tribunal é competente.

 

12.          O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, contado a partir dos factos previstos no artigo 102.º n.º 1, alínea b) do CPPT.

 

13.          O processo não enferma de vícios que o invalidem na totalidade.

 

14.          As partes têm personalidade e capacidade judiciárias e mostram-se legítimas.

 

***

 

15.          Prosseguindo os autos para apreciação da pretensão da Requerente.

 

III.          MATÉRIA DE FACTO

A.     Factos provados

 

41.          Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos que o Tribunal julga provados:

a.            A Requerente é uma sociedade comercial portuguesa com o objeto social de “estudo, desenvolvimento, conceção e comercialização de moldes para a indústria transformadora de matéria plástica, importação e exportação de peças, moldes, acessórios para moldes, máquinas para a indústria de moldes e transformação de matéria plástica e produtos conexos” ao qual corresponde o CAE 46900-R3 (cfr. certidão permanente n.º...– art. 51.º do PPA).

b.            A Requerente está enquadrada, para efeitos de IVA, no regime normal mensal (cfr. pág. 5 do Relatório Final de Inspeção Tributária).

c.            A Requerente foi alvo de uma ação de inspeção tributária de âmbito parcial em sede do Imposto sobre o Valor Acrescentado quanto ao ano de 2015, executada pelos Serviços de Inspeção Tributária, nos termos da ordem de serviço interna n.º OI2018..., iniciada a 05.03.2018 e concluída a 11.06.2018 (cfr. pág. 4, ponto II.1 do Relatório Final de Inspeção Tributária).

d.            Na sequência da inspeção, foi elaborado o Relatório Final de Inspeção, que consta do PA (fls43), em que se refere, além do mais:

 

“I.4 DESCRIÇÃO SUCINTA DAS CONCLUSÕES DA AÇÃO DE INSPEÇÃO

 

II.            OBJETIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA AÇÃO INSPETIVA

 

II.2  Motivo, âmbito e incidência temporal

 

A presente ação de inspeção, de âmbito parcial, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 14.0 do RCPITA, em sede do Imposto sabre o Valor Acrescentado (IVA), e extensão  ao exercício de 2015, foi dirigida a análise interna das condições de isenção de IVA dos valores inscritos pelo sujeito passivo no campo 8 das declarações periódicas de IVA (DP).

(…)

 

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

 

A proposta de análise interna resultou do prévio cruzamento de diversos dados que a AT dispõe, nomeadamente entre valores declarados pelos Sujeitos Passivos no campo 8 das DP de IVA do ano de 2015 e os valores constantes dos certificados de saída das Estâncias Aduaneiras, que evidenciavam que os valores declarados no campo 8 eram superiores aos indicados nos certificados de saída.

(…)

Todos os valores indicados no campo 8 das respetivas Declarações Periódicas (DP) dizem respeito a valores faturados a Sujeitos Passivos extracomunitários.

As divergências nos períodos 2015/05 e 2015/12 dizem respeito a duas faturas emitidas a clientes Russos.

(…)

Relativamente à fatura n.° FT 2015A8/74 de 2015-12-10, no montante de €  114.232,50, para o cliente B..., o Sujeito Passivo não exibiu a respetiva CERTIFICAÇÃO DE SAÍDA devidamente autenticada pela Estância Aduaneira, Documentos Alfandegários apropriados, tal como é exigido no n.º 8 do artigo 29.º do Código do IVA pelo que deveria  ter  procedido  à respetiva  liquidação do  imposto  em falta, nos termos  do n.º 9  do mesmo dispositivo legal, no montante total de € 26.273,48, por aplicação da taxa normal do IVA, prevista no artigo 18.º do respetivo Código.

Falta de liquidação e entrega de IVA no período 2015/12:

 € 114.232,50 X 23% = € 26.273,48.

 

IX.          DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO

 

A)           Notificação do projeto de correções

 

O sujeito passivo foi notificado do projeto de conclusões, para no prazo de 15 dias exercer, querendo, o direito de audição, através de carta registada em 2018-05-09 (RF...3PT).

 

  B)            Resposta obtida

 

Em 2018-05-28 o Sujeito Passivo exerceu o direito de audição por escrito (…) alegando o seguinte:        

“No dia 10 de dezembro de 2015 a A... procedeu à venda de um produto - molde - à sua cliente B..., com sede na Rússia.

 

11.º

Para tal a A... emitiu fatura correspondente ao ato de venda- FT2015A8/74 - com a mesma data acima referida, no montante total de € 114.232,50 (cento e catorze mil duzentos e trinta e dois euros e cinquenta cêntimos) (…)

 

12 .º

Referindo na mesma, no campo de indicação em Taxa, Base de Incidência, Valor do I.V.A, que estava isento ao abrigo do artigo 14.º do CIVA.

 

13.º

Em conformidade, a A... registou e entregou a Declaração Periódica de imposto sobre o Valor Acrescentado, conforme Comprovativo de Entrega Da Declaração - Via Internet (…).

 

14.º

Na referida declaração periódica foi indicado no devido campo de exportações - campo 8 - (vendas isentas-exportações) o valor do bem (€ 114.232,50).

 

 

15.º

Tendo ainda sido registado no anexo a indicação que a exportação foi realizada em EAFTN, isto é, Estância Aduaneira Fora do Território Nacional.

 

 16.º

Ora, refere a alínea b) do n.º 1 do artigo 14.º do C6digo de IVA que estão isentas do imposto as transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade por um adquirente sem residência ou estabelecimento em território nacional ou por um terceira por coma deste [...].

 

17.º

Estamos perante o regime de isenção de IVA nas exportações indiretas.

 

18.º

Sendo este o aplicado ao caso concreto da A..., pois é a empresa sediada na Rússia (B...) que transporta o bem em causa para fora da Comunidade.

 

19.º

Sendo apenas a A... quem entrega o bem na Estância Aduaneira, dentro da Comunidade Europeia e neste caso Polónia, para esse ser transportado pelo Adquirente para fora da Comunidade.

 

20.º

Aplicando-se ao caso concreto - Fatura FT2015A8/74 - a isenção de tributação em sede de IVA.

 

III- Requisitos do documento

 

          21.º

O n.’ 8 do artigo 29.º do Código do IVA dispõe que as transmissões de bens e as prestações de serviços isentas ao abrigo das alíneas a) a j)  [...] do n. 1º do artigo 14.º  [...] devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado.

 

          22.º

Importa em primeiro lugar referir, e de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 161.º do Código Aduaneiro Comunitário (em diante CAC) e n.º 1 do artigo 786.º das Disposições de Aplicação do CAC (em diante DACAC) que a exportação constitui um regime aduaneiro que permite a expedição de mercadorias comunitárias para um destino  fora do território aduaneiro da Comunidade (em diante TAC).

 

                22.º

Assim, e como referido na Circular n.º 8/2015, emitida e publicada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, a sujeição de mercadorias a este regime aduaneiro impõe a aplicação das formalidades previstas para a saída das mercadorias do TAC, nomeadamente a entrega de uma declaração aduaneira [...] (sublinhado e negrito nosso).

 

24.º

Com efeito, e conforme o supra exposto, para que a exportação esteja isenta, além de a empresa ter de cumprir com os requisitos identificados no ponto II, deve igualmente essa isenção ser comprovada através dos documentos alfandegários que confirmem a saída dos bens do TAC.

 

25.º

Ora, assim sendo, a Estância Aduaneira competente para emitir esses documentos comprovativos será a do país membro da comunidade de onde saíram as mercadorias/ bens.

 

 

26.º

Neste caso, em concreto, a Estância Aduaneira da Polónia.

 

 

27.º

Sendo esta a entidade competente para emitir o documento comprovativo de saída das mercadorias, in casu, do molde.

 

 

28.º

Assim, a A... cumpriu com todos os requisitos necessários e a que legalmente estava obrigada no que concerne a entrega de documento comprovativo de saída de mercadorias da TAC, conforme CMR que se junta sob a designação de Doc. n.º 3 e se dá por integralmente produzido.

 

29.º

 

Neste documento podemos observar que foram indicados todos os elementos necessários e comprovativos da saída da mercadoria, nomeadamente:

 

•             Identificação da empresa exportadora (A...);

•             Identificação da empresa adquirente e que realiza o transporte para fora da TAC (B...);

•             Identificação da Fatura associada a essa transação (FT2015A8/74);

•             Identificação da mercadoria;

•             Identificação da instância aduaneira onde ocorre a saída da mercadoria;

•             Carimbos de autenticidade da Estância Aduaneira.

(…)

  C)    Análise da Resposta

 

O sujeito passivo A... efetuou a venda de mercadorias ao seu cliente sediado na Federação Russa (fora do Território Aduaneiro Comunitário), para cuja transmissão  emitiu em 2015-12-10 a Fatura n.° FT 2015A8/74, no montante de € 114.232,50. Nesse documento invocou isenção de IVA ao abrigo do Artigo 14.º do CIVA.

No projeto de correção de que foi notificado, propusemos a liquidação do IVA no montante de € 26.273,48, por aplicação da taxa de 23% sobre € 114.232,50, em virtude de não nos ter sido exibido a respetiva CERTIFICAÇÃO DE SAÍDA, devidamente autenticado pela Estância Aduaneira, Documentos Alfandegários  apropriados,  tal como é exigido no n.º  8 do artigo  29.º  do Código do IVA.

 

Alega o Sujeito Passivo através do seu mandatário, entre outras, que tendo a mercadoria saído do Território Aduaneiro Comunitário (TAC) através da Polónia, faz prova de saída do TAC o CMR (ponto 28.º).

Pela fatura emitida é possível verificar que o transporte da mercadoria vendida foi efetuado por conta do cliente: "Delivery Terms: C...", no entanto, e de harmonia com o explicitado no ponto 1.3 Exportador da Circular N.º  8/2015 a A... é o EXPORTADOR per ser a parte contratante estabelecida na Comunidade:

"...  Nos termos do artigo 788.º,  n.º  1, das DACAC, o exportador é a “pessoa par conta da qual é feita  a declaração de exportação e que,  no momento  da aceitação dessa declaração é proprietária ou· tem um direito similar de dispor das mercadorias em causa".

 

Contudo e por força do disposto no artigo 788.º   n.º   2, das DACAC, "quando a propriedade ou o beneficio de um direito similar de dispor das mercadorias pertencem a  uma  pessoa estabelecida fora da Comunidade nos termos de um contrato no qual se baseia a exportação, considera-se como exportadora parte contratante estabelecida na Comunidade".

                A alínea b) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA prevê a isenção para exportações indiretas:

"transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade por um adquirente sem residência ou estabelecimento em territ6rio nacional ou por um terceiro por conta deste".

A transmissão dos bens em causa não está dispensada da intervenção dos servições aduaneiros, pelo que consideramos prejudicada a utilização dos meios de prova alternativos referidos na segunda parte do n.º 8 do artigo 29.º do CIVA:

"... 8 - As transmissões de bens e as prestações de serviços isentas ao abrigo das alíneas a) a j), p) e q) do n.º 1 do artigo 14.º e das alíneas b), c), d) e e) do n.º 1 do artigo 15.º devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços indicando o destino que lhes irá ser dado."

Compete ao Exportador a comprovação da isenção invocada, nos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 14 do CIVA, na fatura emitida. Essa comprovação, nos termos do artigo 29.º, n.º 8 do CIVA, é feita através dos documentos aduaneiros apropriados, neste caso, pela "Certificação de saída para o expedidor/exportador", tal como é referido no ponto 2.3 da referida Circular N.º 8/2015.

  (…)

 

A certificação de saída tem como efeito confirmar a saída das mercadorias do território aduaneiro da União. É este documento que comprova, para os devidos efeitos, a exportação das mercadorias, nomeadamente para efeitos de comprovação da isenção do IVA nos termos do artigo 29.º n.º 8 do CIVA.

Em todas as declarações aduaneiras processadas através do sistema STADA – Exportação a certificação de saída passa a materializa-se no documento intitulado "Certificado de saída para o expedidor/exportador, tal como é referido no Oficio Circulado N.º 1*5327/2015.

Esse documento, na posse do exportador, considera-se devidamente visado pela respetiva estancia aduaneira quando no campo D CONTROLO PELA ESTANCIA ADUANEIRA DE PARTIDA se encontram preenchidas as datas de AUT. SAIDA e C. SAÍDA, conforme exemplo seguinte, constante do referido Oficio-Circulado.

 

 (…)

C)   Conclusão

Face ao exposto, e independentemente da Estância Aduaneira onde a respetiva declaração aduaneira for entregue, nacional ou qualquer outra da comunidade, o Sujeito Passivo que invocou a isenção de IVA nos termos do artigo 14.º do CIVA, tem que a comprovar através do documento Certificação de saída para o expedidor/exportador, devidamente visado pela Estância Aduaneira.

No caso em apreço, o Sujeito Passive exibiu um documento emitido por uma Estância Aduaneira polaca, com o respetivo campo D em branco, ou seja, não visado. Pelo que deveria ter procedido à liquidação do IVA, como está obrigado pelo n.º 9 do artigo  29.º  do Código do IVA.

Sou do parecer que se deve manter a correção proposta e notificada ao Sujeito Passivo:

Falta de liquidação e entrega de IVA no período 2015/12:

€ 114.232,50 X 23% = € 26.273,48.

 

e.            A Requerente emitiu em 10.12.2015 a Fatura n.º 2015A8/74 ao cliente B..., com morada em ..., RÚSSIA (cfr. doc. 6 do PPA).

f.             A fatura contém a menção “Isento Artigo 14.º do CIVA (ou similar)” (cfr. doc. 6 junto com o PPA).

g.            Não foi liquidado IVA na fatura, assinalado como “0,00%” (cfr. doc. 6 junto com o PPA e admitido pela Requerente no artigo 59.º do PPA).

h.            A Fatura n.º 2015A8/74  respeita a transmissão de moldes com a referência M301 e M302, e descrição “FOV42.001...” “Dims: 89x85x106cm, 2.6 KG” e “FOV42.002...” “Dims: 87x76x109cm, 1.310 KG”, respetivamente, com o código de nomenclatura combinada ..., no valor total de € 114.232,50, € 73.616,50 relativos ao molde FOV42.001 ... e € 40.616,00 relativos ao molde  FOV42.002 ...  (cfr. doc. 6 junto com o PPA).

i.             Os moldes transmitidos foram objeto de carga em ..., Portugal, sendo responsabilidade do cliente o transporte dos bens deste local até à Federação Russa (cfr. indicação do local de carga ... e dos termos de entrega como ... na fatura e contrato entre a Requerente e o cliente B... quanto aos moldes em causa, cfr. doc. 6 e 21 juntos com o PPA, e ainda depoimentos das testemunhas D... e E...).

j.             Os moldes transmitidos são objeto do documento CMR identificado com a menção..., assinado e com carimbo retangular da Alfândega de ..., código 10113100, ..., RÚSSIA, com data de 24.12.2015 com a indicação “LIBERAÇÃO PERMITIDA, INSPETOR” (cfr. documento 9 junto ao PPA e respetiva tradução certificada para língua portuguesa junta ao processo, não contradito pela Requerida).

k.            Os moldes transmitidos são objeto da “Declaração de Mercadoria” com a referência ... relativa a uma declaração IM|40, i.e. declaração de importação, com a indicação “LIBERAÇÃO PERMITIDA, INSPETOR” com data de 24.12.2015, assinada e com carimbo retangular do Serviço Federal de Alfândega da Rússia de ..., código ..., em tudo semelhante ao carimbo e assinatura constantes do CMR junto como documento 9 do PPA  (cfr. documento 10 junto ao PPA e respetiva tradução certificada para língua portuguesa junta ao processo, não contradito pela Requerida). A declaração contém as seguintes menções:

•             “Casa 1 – Declaração

IM [importação]| 40 | ED

•             Casa 2 – Remetente/Exportador:

TA..., LDA, PORTUGAL ... ...-... ... LRA

•             Casa 8 – Destinatário:

“B...” S.A., RÚSSIA ... ..., ... .

•             Casa 14 – Declarante:

“B...” S.A., RÚSSIA ... ..., ... .

•             Casa 16 – País de origem:

PT [Portugal]

•             Casa 17 – País de destino:

RU [Rússia]

•             Casa 20 – Condições de entrega:

•             ...

•             Casa 29 – Autoridade de entrada/partida:

... .

•             Casa 30 – Localização do produto:

..., Região de..., Distrito de ..., ver anexo.

•             Casa 31 – Marcação e quantidade – números dos contentores – quantidade e características distintivas:

Moldes de pressão para fluir dos plásticos através do sopro ou por pressão; Fabricante: A....

•             Casa 33 – Código do produto:

•             ...

•             Casa 42 – Valor do produto:

114.232,50

•             Casa 44 – Informações adicionais/Documentos apresentados:

(…) 04021/1 FT2015A8/74 de 10.12.2015

•             Casa 45 – Peso bruto (kg):

4084.000

•             Anexo:

Produto 1. Campo 31. Descrição dos grupos do produto:

1.            MOLDE PARA A PEÇA FOV42.001 MODELO JARRO – 1 UNIDADE

2.            MOLDE PARA A PEÇA FOV42.002 MODELO FUNIL – 1 UNIDADE”

l.             A cópia desta declaração foi enviada pela Requerente aos Serviços de Inspeção por email de 18.04.2018.

m.          O cliente B... recebeu os bens, pagou os mesmos e tratou das formalidades de transporte e envio dos bens para fora da Comunidade Europeia com destino à sua sede em ... (cfr. documentos 7 e documentos 13 a 18 juntos com o PPA, em particular declaração emitida em 06.08.2018 pela B... e respetiva tradução certificada junta como documento n.º 15, não contraditos pela Requerida, e depoimentos das testemunhas D... e E...).   

n.            Foram pagas, em 01.08.2018, pela Requerente, as quantias de IVA e juros compensatórios objeto do PPA, no total de € 26.809,98 (cfr. documentos 18 e 19 do PPA).

o.            Na sequência da inspeção, foram emitidos pela AT os atos de liquidação de IVA ns.º ... (período 2015.12), 2018 ... (período 2016.01), 2018 ...(período 2016.09), e o ato de liquidação de juros compensatórios n.º 2018 ... (período 2016.01) (cfr. docs. 1 e 2 juntos com o PPA).

p.            A Requerente apresentou, em 24.10.2018, Reclamação Graciosa contra os atos de liquidação referidos acima (cfr. Reclamação Graciosa junta com o PA).

q.            A Reclamação Graciosa tem o n.º ...2018... e foi indeferida, tendo o ato de indeferimento sido notificado à Requerente por carta registada com data de registo dos CTT de 24.10.2018 (cfr.  PA, parte relativa à Reclamação Graciosa). 

r.             A Requerente apresentou ao CAAD, em 22.03.2019, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral que deu origem ao presente processo.

B.            Factos não provados

42.          Não foram provados outros documentos alfandegários ou de suporte de expedição internacional dos bens com relevo para a causa.

C.     Fundamentação da decisão da matéria de facto

43.          Relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

 

44.          Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis das questões de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao atual artigo 596.º, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 

45.          No que se refere aos factos provados, a convicção da Árbitra fundou-se, essencialmente, na análise crítica da prova documental junta aos autos, nas posições assumidas pelas partes, e, sempre que aplicável, nos depoimentos das testemunhas inquiridas, D... e E..., que se revelaram objetivos, consistentes e com conhecimento da operação subjacente às correções em causa. A primeira testemunha, D... era, à data dos factos, colaboradora da Requerente na qualidade de assistente operacional com funções de suporte da área comercial incluindo apoio a propostas comerciais, faturação e expedição. Demonstrou ter conhecimento direto da operação em causa, tendo indicado, com credibilidade, que os moldes em causa foram transmitidos à empresa russa B... e que, desde o início, tinham como destino a Federação Russa, sendo responsabilidade desta empresa todas as formalidades inerentes à saída dos bens de território comunitário  incluindo as formalidades aduaneiras da exportação.  A segunda testemunha E... era, à data dos factos, colaboradora do grupo (F...) em que se insere a Requerente, sendo responsável pelas operações logísticas de carga e descarga dos moldes em causa. Demonstrou ter conhecimento direto da operação, tendo indicado, com credibilidade, que os moldes em causa seguiram para Federação Russa, via Polónia.

 

46.          Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas ou de direito, insuscetíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.

 

IV.          DO DIREITO E DO MÉRITO

 

A.      Ordem de conhecimento de vícios

 

16.          Vieram impugnadas no PPA as liquidações adicionais resultantes da correção à isenção de IVA mencionada na seguinte fatura:

                                                                                                                                                                       Valores em €

Fatura cuja correção é impugnada no PPA

Data      Fatura   Art. CIVA

em causa             Cliente  Valor do IVA liquidado adicionalmente 

10.12.2015          2015A8/74          14.º n.º 1 al. b) B...         € 26.273,48

Total

 

                                                                                                                                                                   

17.          A Requerente pede a anulação das liquidações impugnadas, com base nos seguintes vícios:

•             insuficiente fundamentação dos atos de liquidação em violação do artigo 77.º da LGT;

•             preterição de formalidade essencial de audição antes da liquidação, prevista no artigo 60.º, n.º, 1 alínea a), da LGT;

•             ilegalidade das liquidações por se encontrar comprovada a exportação dos bens realizadas em cumprimento do artigo 14.º, n.º 1, alínea b), do Código do IVA (“CIVA”);

•             incompetência da Diretora-Geral dos Impostos quanto aos atos em causa por caducidade da autorização legislativa constante das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 91.º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro (Orçamento do Estado para o ano de 2008).    

 

18.          O artigo 124.º do CPPT estabelece regras sobre a ordem de conhecimento de vícios em processo de impugnação judicial, que são subsidiariamente aplicáveis ao processo arbitral, por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.

 

19.          No caso de vícios geradores de anulabilidade, a alínea a) do n.º 2 daquele artigo 124.º estabelece que se deve conhecer prioritariamente dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos.

 

20.          Se for julgado procedente algum vício que assegure estável e eficaz tutela dos interesses a Requerente, ficará prejudicado o conhecimento dos restantes vícios, como está ínsito no estabelecimento de uma ordem de conhecimento (caso contrário, se fosse sempre necessário conhecer de todos seria indiferente a ordem do seu conhecimento).

 

B.            Do ónus da prova

 

47.          Dispõe o artigo 74.º da LGT que “O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.”.

 

48.          Tendo presente que está em causa um direito da Requerente à isenção de IVA, o ónus da prova dos pressupostos de direito que pretende exercer recairão sobre si.

 

C.            Delimitação da questão decidenda

 

49.          Na presente ação arbitral a Requerente contesta essencialmente as correções efetuadas à aplicação, na fatura 2015A8/74, da isenção de IVA a uma exportação indireta, i.e. em que é o cliente da Requerente que transporta para fora da Comunidade os bens objeto de transmissão.

 

50.          Para a AT, a correção é devida na medida em que não foi “exibido a respetiva CERTIFICAÇÃO DE SAÍDA, devidamente autenticado pela Estância Aduaneira, Documentos Alfandegários  apropriados,  tal como é exigido no n.º  8 do artigo  29.º  do Código do IVA.”

 

51.          Para a Requerente, a atuação da Requerida é ilegal, na medida em que se verificam cumpridas as condições de aplicação da isenção de IVA na exportação nos termos do artigo 14.º, n.º 1, alínea b) do CIVA.

 

52.          Quanto a estas correções, a questão material é uma só e transversal: estão ou não preenchidos os pressupostos do artigo 29.º n.º 8 do CIVA que dispõe (redação dada pelo DL 102/2008 de 20 de junho) que:

“8 - As transmissões de bens e as prestações de serviços isentas ao abrigo das alíneas a) a j), p) e q) do n.º 1 do artigo 14.º e das alíneas b), c), d) e e) do n.º 1 do artigo 15.º devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado.”.

 

53.          Na falta de comprovação, deve liquidar-se imposto adicionalmente, nos termos do artigo 28.º n.º 9 do CIVA.

Vejamos.

 

Quadro normativo nacional

 

54.          A questão decidenda tem o seu enquadramento legal nos artigos 14.º e 29.º do CIVA os quais dispõem da seguinte forma à data dos factos:

 

“Artigo 14.º do Código do IVA (DL 394-B/84, de 26 de Dezembro)

Isenções nas exportações, operações assimiladas a exportações e transportes internacionais

 

1 - Estão isentas do imposto:

a) As transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste;

(Redação dada pelo DL 290/92 de 28 de Dezembro)

b) As transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade por um adquirente sem residência ou estabelecimento em território nacional ou por um terceiro por conta deste, ainda que, antes da sua expedição ou transporte, sofram no interior do País uma reparação, uma transformação, uma adaptação ou qualquer outro trabalho, efetuados por terceiros agindo por conta do adquirente, com exceção dos bens destinados ao equipamento ou abastecimento de barcos desportivos e de recreio, de aviões de turismo ou de qualquer outro meio de transporte de uso privado e dos bens transportados nas bagagens pessoais dos viajantes com domicílio ou residência habitual em outro Estado membro;

(Redação dada pelo DL 82/94, de 14 de Março)

 

“Artigo 29.º do Código do IVA (DL 394-B/84, de 26 de Dezembro)

 

Obrigações em geral

...

8 - As transmissões de bens e as prestações de serviços isentas ao abrigo das alíneas a) a j), p) e q) do n.º 1 do artigo 14.º e das alíneas b), c), d) e e) do n.º 1 do artigo 15.º devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado.

(Redação dada pelo DL 102/2008, de 20 de Junho)

 

9 - A falta dos documentos comprovativos referidos no número anterior determina a obrigação para o transmitente dos bens ou prestador dos serviços de liquidar o imposto correspondente.

(Redação dada pelo DL 323/98, de 30 de Outubro)”

 

Quadro normativo europeu

 

55.          O regime nacional, em particular o artigo 14.º n.º 1 alíneas b) do CIVA, está balizado pelo artigo 146.º n.º 1 da Diretiva IVA , incluído no capítulo 6 desta Diretiva sob a epígrafe “Isenções na Exportação”. Este artigo determina que:

 

Artigo 146º

“Isenções na Exportação”

1. Os Estados-Membros isentam as seguintes operações:

a) As entregas de bens expedidos ou transportados, pelo vendedor ou por sua conta, para fora da Comunidade;

b) As entregas de bens expedidos ou transportados pelo adquirente não estabelecido no respetivo território, ou por sua conta, para fora da Comunidade, com excepção dos bens transportados pelo próprio adquirente e destinados ao equipamento ou ao abastecimento de embarcações de recreio, aviões de turismo ou qualquer outro meio de transporte para uso privado;”

 

56.          Por sua vez, o artigo 29.º n.º 8 do CIVA está balizado pelos artigos 131.º e 273.º da Diretiva IVA os quais estabelecem:

Artigo 131.º

«As isenções previstas nos capítulos 2 a 9 aplicam se sem prejuízo de outras disposições comunitárias e nas condições fixadas pelos Estados–Membros a fim de assegurar a aplicação correta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso”

 

Artigo 273.º

«Os Estados Membros podem prever outras obrigações que considerem necessárias para garantir a cobrança exata do IVA e para evitar a fraude, sob reserva da observância da igualdade de tratamento das operações internas e das operações efetuadas entre Estados Membros por sujeitos passivos, e na condição de essas obrigações não darem origem, nas trocas comerciais entre Estados Membros, a formalidades relacionadas com a passagem de uma fronteira.”

 

 Ratio legis das isenções de IVA à exportação e sua delimitação

 

57.          Nesta sede, é entendimento claro da jurisprudência comunitária – a qual já se pronunciou por diversas vezes nos últimos anos sobre a ratio legis das isenções de IVA na exportação – que a isenção de IVA prevista no artigo 146.º n.º 1, alíneas a) e b) da Diretiva IVA:

i.             Visa garantir a tributação das prestações no lugar de destino, ou seja, aquele onde os produtos exportados serão consumidos ;

ii.            Visa a isenção das entregas de bens quando o fornecedor demonstrar que os bens foram expedidos ou transportados para fora da União e quando, na sequência dessa expedição ou transporte, o bem saiu fisicamente do território da União ;

iii.           Apenas pode ser limitada pelos Estados-Membros, no âmbito dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 131.º da Diretiva IVA, no estrito cumprimento do princípio da proporcionalidade, não sendo aqui admitidas medidas que façam depender, no essencial, o direito à dedução do IVA do cumprimento de obrigações formais, sem ter em conta os seus requisitos materiais ou a substância das operações realizadas .

iv.           Apenas pode ser limitada pelos Estados-Membros, no âmbito dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 273.º da Diretiva IVA, com base em incumprimento de requisitos formais, quando estejam em causa situações de fraude fiscal que pôs em perigo o funcionamento do sistema comum do IVA .

 

Aplicação da ratio legis das isenções de IVA em causa às regras nacionais de exportação e sua delimitação

 

58.          Aplicando o acima exposto ao nosso caso concreto – lembrando que o IVA português é sempre balizado pelo sistema harmonizado do IVA comunitário –  resulta que a validação da isenção de IVA aplicada a uma determinada operação como exportação, em situações que não se levantam suspeitas de fraude ou evasão fiscal, depende da prova da saída efetiva dos bens em causa do território da União.

 

59.          Resulta ainda que a exigência do cumprimento de requisitos formais em sede aduaneira não pode ser imposta para negar a isenção de IVA na exportação, quando outros elementos, que decorrem dos próprios documentos alfandegários ou de documentos de suporte da expedição internacional dos bens, demonstram os requisitos materiais da isenção à exportação e a efetiva saída (não fraudulenta) dos bens do território da união.

 

60.          O que equivale a dizer que não pode ser admitida – como pretende a AT no Relatório Final de Inspeção e no ato de indeferimento da Reclamação Graciosa  – que a prova do direito à isenção do IVA aqui em causa se faça apenas mediante a apresentação do documento CERTIFICAÇÃO DE SAÍDA devidamente visado pelos serviços alfandegários com inclusão na casa D “Controlo pela estância aduaneira de partida” da data de “C. Saída”.

 

61.          Este tribunal adere à jurisprudência Arbitral no processo 88/2017-T de 13.12.2017, em que o Tribunal Coletivo Arbitral decidiu:

“Posto isto, e no caso, considera-se que, devidamente interpretada a norma em questão, do n.º 8 do artigo 29.º do CIVA aplicável, não resulta da mesma a imposição de uma prova legal, na forma determinada pela AT, que redunda numa violação do princípio da livre apreciação da prova, tal como formulado no artigo 607.º/5 do Código de Processo Civil, que prescreve que “O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos...”.

Como se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 23-06-2015, proferido no processo 1534/09.7TBFIG.C1, por exemplo, “Em certos casos, a lei impõe ao juiz a conclusão que há-de tirar de certo meio de prova e, portanto, a relevância que deve dar a esse mesmo meio de prova. É nisto que consiste a prova legal ou tarifada.”.

Ora, não é isso que se passa no artigo 29.º/8 do CIVA aplicável.

(…)

Assim, em primeiro lugar, a norma do artigo 29.º/8 do CIVA aplicável, ao falar em “documentos alfandegários apropriados”, permite a leitura de que haja mais do que um tipo de documento alfandegário apto à prova em questão.”

 

62.          Vejamos então se, no caso concreto, foi demonstrado que os bens saíram efetivamente do território comunitário na sequência das respetivas transmissões de bens.

 

Aplicação ao caso concreto - Fatura 2015A8/74

 

63.          Face à matéria de facto provada  - alíneas e) a l) dos Factos Provados da Matéria de Facto -, designadamente a correlação entre a fatura 2015A8/74 datada de 10.12.2015, o Incoterm utilizado ... (que significa que as formalidades de exportação ficaram a cargo do cliente da Requerente), as declarações do cliente da Requerente a atestar que os bens foram recebidos em Portugal e por si transportados até Moscovo (documento 15 do PPA), o documento CMR identificado com a menção..., assinado e com carimbo retangular da Alfândega de ..., código ..., ..., RÚSSIA, com data de 24.12.2015 e indicação “LIBERAÇÃO PERMITIDA, INSPETOR” junto como documento 9 do PPA e a “Declaração de Mercadoria” com a referência ... relativa a uma declaração IM|40, i.e. declaração de importação, com a indicação “LIBERAÇÃO PERMITIDA, INSPETOR” com data de 24.12.2015, assinada e com carimbo retangular do Serviço Federal de Alfândega da Rússia de ..., código ..., junto como documento 10 do PPA, documentos visados pelas autoridades aduaneiras da Federação Russa atestando a entrada dos bens, em Dezembro de 2015, no território da Federação Russa, não restam dúvidas a este Tribunal que as mercadorias subjacentes à transmissão de bens objeto da fatura 2015A8/74 deixaram, em momento subsequente à transmissão, o território comunitário e entraram no território (extracomunitário) da Federação Russa, sendo que nada indica que as mercadorias tivessem sido colocadas em circulação ou consumidas em território nacional, forjando assim o espírito da isenção de IVA na exportação.

 

64.          Por tudo o exposto, verifica-se que foi cumprido o ónus da prova da Requerente de demonstrar os factos constitutivos do seu direito à isenção de IVA, procedendo nesta parte o pedido de anulação das liquidações impugnadas, nos termos do artigo 163.º, n.º 1 do CPPT, subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c) da LGT, por estarem inquinadas de vício de lei ao terem subjacentes erros sobre os pressupostos de facto e de direito em que assentam.

 

Juros compensatórios

 

65.          As liquidações de juros compensatórios têm como pressuposto as liquidações de IVA (artigo 35.º, n.º 8, da LGT), pelo que enfermam dos vícios que afetam estas e justifica-se também a sua anulação.

 

Questões de conhecimento prejudicado

 

66.          Sendo de anular as liquidações impugnadas com fundamento em vício de violação de lei, que assegura eficaz tutela dos interesses da Requerente, fica prejudicado, por ser inútil, o conhecimento dos restantes vícios arguidos [artigos 103.º e 608.º, n.º 2, do CPC, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT].

 

V.           DO PAGAMENTO DE JUROS INDEMNIZATÓRIOS

 

67.          A Requerente pede que a AT seja condenada à restituição de todas as quantias pagas, acrescidas do pagamento de juros indemnizatórios incidentes sobre esse valor.

 

68.          Nos termos do artigo 24.º, n.º 1 e respetiva alínea b) do RJAT (em linha com o artigo 100.º da LGT), a decisão arbitral a favor da pretensão do sujeito passivo, tem por efeito restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado.

 

69.          O artigo 24.º, n.º 5 do RJAT ao dispor que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, permite, em caso de procedência da pretensão do sujeito passivo, o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral, nos termos dos artigos 43.º e 100.º da LGT, aplicáveis ex vi artigo 29.º do RJAT.

 

70.          Dispõe o artigo 43º, nº 1 da Lei Geral Tributária (LGT) que: "São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulta pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

 

71.          No presente caso, ficou provado que a Requerente pagou em 01.08.2018 as liquidações de IVA e juros compensatórios aqui impugnadas, no total de € 26.809,98.

 

72.          Resulta ainda dos elementos juntos aos autos que nessa altura a AT estava, quanto à fatura 2015A8/74, na posse dos documentos apropriados que lhe permitiam concluir pela comprovação da efetiva saída dos bens do território comunitário (e consequente isenção de IVA na exportação) pelo que se considera ter existido, nesta parte, erro nos pressupostos de facto e de direito aplicados pela AT do qual resultou pagamento de dívida tributária em momento superior ao legalmente devido.

 

D.           Procede assim o pagamento de juros indemnizatórios sobre as liquidações adicionais impugnadas, sobre o valor de € 26.809,98, nos termos dos artigos 43.º da LGT e 61.º do CPPT.

 

VI.          DECISÃO

Nestes termos, e com os fundamentos expostos, decide este Tribunal Arbitral julgar procedente o pedido arbitral e:

a)            Anular as liquidações adicionais de IVA n.º ... (período 2015.12), 2018 ... (período 2016.01), 2018... (período 2016.09) e anular a liquidação de juros compensatórios n.º 2018 ... (período 2016.01);

b)           Anular, em consequência, o ato de indeferimento da Reclamação Graciosa n.º ...2018...;

c)            Condenar a Requerida ao pagamento de juros indemnizatórios devidos sobre o montante de € 26.809,98 contados até ao processamento da respetiva nota de crédito, calculados nos termos do disposto nos artigos 43.º da LGT e 61.º do CPPT;

Tudo com as devidas consequências legais, designadamente:

d)           De restituição, pela Requerida à Requerente, do montante de € 26.809,98.

 

* * *

 

VII.         VALOR DO PROCESSO

Fixa-se o valor do processo em € 26.809,98, de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (“CPC”), este último ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

 

VIII.       CUSTAS

O montante das Custas é fixado em € 1.530,00, nos termos da Tabela I anexa ao RCPAT, a cargo da Requerida, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT.

 

Notifique.

 

Lisboa, 20 de janeiro de 2020.

 

(Catarina Belim)