DECISÃO ARBITRAL[1]
O árbitro, Dra. Sílvia Oliveira, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral Singular, constituído em 18 de Setembro de 2019, decidiu o seguinte:
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RELATÓRIO
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A..., S.A., pessoa coletiva número..., com sede ..., ..., ..., em ..., (adiante designada por “Requerente”), apresentou pedido de pronúncia arbitral e de constituição de Tribunal Arbitral Singular, no dia 9 de Julho de 2019, ao abrigo do disposto no artigo 2, nº 1, alínea a) e do disposto no artigo 10º do Decreto-lei nº 10/2011, de 20 Janeiro [Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT)], em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “Requerida”).
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A Requerente peticiona no pedido arbitral que seja “considerada inválida a ação inspetiva externa realizado pela AT – Direção de Finanças de ... (…)” identificada no processo, e, em consequência, sejam “(…) anulados os actos de liquidações adicionais em sede de IVA no exercício de 2016 da Requerente” mas “caso assim não se entenda, deve ser fiscalmente aceite, em sede de IVA, o encargo com o combustível para as máquinas alugadas à sociedade B..., S.A. (…) e, em consequência, ser a liquidação adicional em sede de IVA declarada ilegal por ausência de fundamentação”. Adicionalmente, peticiona ainda a Requerente que seja “(…) fiscalmente aceite a transmissão intracomunitária efetuada pela Requerente a favor da C..., S.L, por provada, e ser a liquidação adicional de IVA declarada ilegal” e, “em consequência, deve ser dado sem efeito o processo de contraordenação instaurado com número ...20190..., porquanto não existiu nenhuma omissão ou inexatidão nas declarações ou outros documentos fiscalmente relevantes entregues pela Requerente no exercício de 2016” e “deve ser extinto o processo de execução fiscal nº ...2019... e apensos, porquanto a liquidação adicional em sede de IVA é ilegal por ausência de fundamentação”.
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O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD em 10 de Julho de 2019 e notificado, na mesma data, à Requerida.
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Em 29 de Agosto de 2019, dado que a Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 1 do RJAT, foi a signatária designada como árbitro pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.
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Na mesma data, foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11º nº 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6º e 7º do Código Deontológico.
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Em 18 de Setembro de 2019, em conformidade com o preceituado na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído, tendo sido proferido despacho arbitral na mesma data no sentido de notificar a Requerida para, nos termos do disposto no artigo 17º, nº 1 do RJAT, apresentar Resposta, no prazo máximo de 30 dias e, caso quisesse, solicitar a produção de prova adicional.
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Adicionalmente, foi ainda referido naquele despacho arbitral que a Requerida deveria remeter ao Tribunal Arbitral, dentro do prazo da Resposta, cópia do processo administrativo.
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Dado que a Requerida não apresentou Resposta dentro do prozo concedido para o fazer, nos termos do ponto anterior, foi a Requerente notificada, por despacho arbitral de 12 de Novembro de 2019 (notificado a 13/11), para no prazo de 5 dias manifestar se mantinha ou não o interesse na inquirição das Testemunhas apresentadas no pedido arbitral sendo que, em caso afirmativo, deveria identificar os factos relativamente aos quais pretendia que incidisse a referida prova testemunhal.
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Adicionalmente, no mesmo prazo, deveria a Requerente juntar aos autos procuração em conformidade com a sociedade de advogados que a representa no processo.
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Em 13 de Novembro de 2019, a Requerida apresentou requerimento no sentido de ser admitida a junção aos autos da sua Resposta, “(…) ao abrigo dos princípios da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo, da cooperação e da boa fé processual (artigos 16º, al. c) e f) e 19º, nº2 ambos do RJAT) uma vez que (…) o tribunal arbitral pode permitir a prática de ato omitido (…) tendo em vista o apuramento da verdade material e a igualdade das partes, pois apesar da mesma ter sido feita dentro do prazo para o efeito não foi enviada por lapso (…)”.
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Na mesma data, a Requerida juntou aos autos cópia do processo administrativo.
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Em 19 de Novembro de 2019, a Requerente apresentou requerimento no sentido de informar que mantinha interesse em ouvir duas das testemunhas indicadas no pedido, bem como os factos relativamente aos quais pretendia que fossem inquiridas.
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Adicionalmente, veio ainda referir que, quanto ao requerimento da Requerida para junção fora de prazo da sua Resposta, entende que “esgotado o prazo para a prática de um acto processual tal implica a extinção do direito de o praticar” sem prejuízo da “(…) aplicação subsidiaria do artigo 139 nº 4 do CPC, ou seja, a parte poder praticar o acto processual em caso de justo impedimento, devendo para o efeito tal impedimento ser invocado aquando da prática do acto” o que, segundo a Requerente, não foi invocado pela Requerida. Assim, entende a Requerente que “(…) a resposta em causa não ser considerada (…)” devendo “(…) ser desentranhada do processo”.
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Por despacho arbitral datado de 20 de Novembro de 2019 foi decidido, em síntese, pelo Tribunal Arbitral, em consonância com os princípios processuais consignados no artigo 16º do RJAT, da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo e na determinação das regras a observar [alínea c)] e da livre condução do processo consignado nos artigos 19º e 29º, nº 2 do RJAT:
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Indeferir o requerimento da Requerida de 13 de Novembro de 2019, no sentido de ser admitida a junção aos autos da sua Resposta, nos termos e fundamentos aí indicados;
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Agendar a reunião (a que alude o artigo 18º do RJAT) para o dia 5 de Dezembro de 2019, pelas 11:00, a realizar nas instalações do CAAD, em Lisboa, para efeitos de inquirição das Testemunhas indicadas pela Requerente, relativamente aos factos indicados nos artigos mencionados no requerimento apresentado em 19 de Novembro de 2019;
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Decidir, na referida reunião, da possibilidade de dispensa da apresentação de alegações.
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Por despacho arbitral datado de 28 de Novembro de 2019, foram ambas as Partes notificadas de que, por motivos não imputáveis a este Tribunal Arbitral, a reunião que estava agendada para o dia 5 de Dezembro de 2019, pelas 11:00, no CAAD, em Lisboa (para os efeitos previstos no despacho arbitral de 20 de Novembro de 2019) foi reagendada para o dia 19 de Dezembro de 2019, pelas 11:00 no mesmo local.
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Em 19 de Dezembro de 2019 foi realizada no CAAD, nos termos do disposto no artigo 18º do RJAT, a reunião arbitral agendada para inquirição das Testemunhas apresentadas pela Requerente, com reprodução sonora dos depoimentos prestados e da qual foi lavrada a corresponde acta, que faz parte integrante do presente processo.
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No âmbito da referida reunião, dado que as Partes não prescindiram da apresentação de alegações escritas, o Tribunal notificou a Requerente e a Requerida para apresentarem, de modo sucessivo, alegações escritas no prazo de 10 dias, tendo sido agendada para o dia 5 de Fevereiro de 2020 a prolação da decisão arbitral.
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Por último, o Tribunal advertiu a Requerente que, até à data da prolação da decisão arbitral deveria proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 4º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e comunicar esse pagamento ao CAAD.
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Em 9 de Janeiro de 2020, a Requerente apresentou as suas alegações escritas, no sentido de reiterar a argumentação apresentada no pedido arbitral, concluindo nos mesmos termos do pedido.
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Adicionalmente, a Requerente anexou aos autos nova procuração, em conformidade com o solicitado no despacho arbitral de 12 de Novembro de 2019.
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Em 13 de Janeiro de 2019, a Requerida apresentou as suas alegações escritas, no sentido de referir, em síntese, os seguintes argumentos:
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No que diz respeito à questão da alegada invalidade da ação de inspeção e consequente anulabilidade dos actos de liquidação adicional de IVA, invocada pela Requerente, entende a Requerida que pode concluir-se “(…) que não ocorreu qualquer alteração do fim, do âmbito ou da extensão da ação inspetiva realizada” pelo que, “consequentemente, falece a alegação da Requerente de falta de notificação a efetuar nos termos do disposto no artigo 15° do RCIPTA, da alteração dos fins, âmbito ou extensão do procedimento de inspeção, pois não ocorreu qualquer alteração no decorrer do procedimento inspectivo”, “inexistindo, assim, qualquer ilegalidade”. Reitera a Requerida que “(…) o FIM do procedimento, tal como consta na OI, foi a verificação do cumprimento das correspondentes obrigações tributárias, o seu ÂMBITO – IRC e IVA e a sua EXTENSÃO – o ano económico-fiscal de 2016, tal como, mais uma vez, levados previamente, à realização do procedimento inspetivo, ao conhecimento da Requerente”.
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No que diz respeito à alegada dedução indevida de IVA respeitante aos encargos com os combustíveis relativos a máquinas alugadas e à alegada falta de liquidação de IVA respeitante à transmissão intracomunitária realizada à entidade C..., SL, entende a Requerida que as liquidações de IVA a que aquelas correções respeitam tiveram “(…) na sua base as conclusões do relatório final de inspeção, devidamente fundamentado e legalmente notificado à Requerente, para ele se remetendo, uma vez que continua a merecer inteiro acolhimento. Razão pela qual se entende que, pelos motivos e fundamentos nele explicitados, serão de manter as suas conclusões (…)” porquanto, “(…) de acordo com os elementos probatórios exibidos, para além de ter contabilizado encargos com combustíveis não dedutíveis para efeitos fiscais (…) a Requerente, não demonstrou a verificação dos requisitos de que depende o direito à dedução de IVA que se arroga” (sublinhado nosso).
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Por outro lado, defende a Requerida que “(…) foi aplicada a isenção em operações relacionadas com alegadas transmissões intracomunitárias, sem atestar o cumprimento dos respetivos condicionalismos dos quais depende a aplicação da isenção, conforme o previsto no artº 14º do RITI. (…)” sendo que “a falta dos citados condicionalismos determina a obrigação da tributação destas operações e consequente dever de liquidar o correspondente imposto”.
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Deste modo, segundo alega a Requerida, “(…) atenta a prova produzida no relatório final de inspeção, nomeadamente, a demonstração de que o bem em causa não saiu do território nacional, a AT procedeu, e bem, às devidas correções e, em consequência, à liquidação adicional do IVA considerado em falta” (sublinhado nosso).
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Adicionalmente, “quando à dedução indevida de imposto, contrariando a previsão normativa vertida no artº 20º do CIVA, a Requerente deduziu indevidamente IVA incorrido em encargos que, segundo os serviços inspetivos, não eram dedutíveis para efeitos fiscais, uma vez que, em face do disposto no artº 23º-A do CIRC, não provou que o imposto era suportado em bens pertencentes ao seu ativo imobilizado ou por si utilizados em regime de locação e que não foram ultrapassados os consumos normais”.
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No que diz respeito à prova testemunhal, a Requerida alega que a mesma “(…) resultou em contradição (…)” e “(…) faltou à verdade (…)”.
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Nestes termos, a Requerida concluiu as suas alegações no sentido de que “(…) deverão ser mantidas as correcções adicionais com os fundamentos constantes no RIT, absolvendo, dessa forma, a AT de todos os pedidos da Requerente” (sublinhado nosso).
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CAUSA DE PEDIR
2.1. A Requerente começa por referir que “foi alvo de uma ação inspetiva externa por parte da AT – Direção de Finanças de ..., com o n.º de ordem de serviço OI2018..., tendo sido efetuadas, a final, correções aritméticas em sede de IRC e IVA que determinaram liquidações adicionais com incidência sobre o período de 2016”, sendo objecto deste processo arbitral as liquidações de IVA e juros daí decorrentes.
2.2. Neste âmbito, entende a Requerente que as “(…) correções efetuadas enfermam de uma errada qualificação e quantificação dos factos tributários, com vícios na própria fundamentação”.
Questão prévia - do fim da acção inspectiva externa
2.3. Com efeito, alega a Requerente “a (…) ação inspetiva externa” a que foi sujeita “(…) tinha como objetivo o controlo das aquisições e das transmissões intracomunitárias efetuadas pela sociedade portuguesa A..., S.A à sociedade espanhola C... (…), conforme descrito no relatório final”.
2.4. “Ora, a ação inspetiva é um procedimento que visa observar a realidade tributária de um sujeito passivo (…), sendo determinada inicialmente no seu âmbito e extensão (…)”, sendo que “os fins, o âmbito e a extensão do procedimento de inspeção podem ser alterados durante a sua execução, caso exista um despacho fundamentado da entidade que o tiver ordenado, devendo depois notificar a entidade em questão (…)”.
2.5. “Como resulta do Relatório de Inspeção Tributária, estavam a ser avaliados (1) o reporte de IVA e (2) as operações intracomunitárias efetuadas com um sujeito passivo espanhol, referentes ao exercício de 2016” mas, “(…) a AT debruçou-se sobre os gastos não admitidos com o combustível nas viaturas e máquinas industriais alugadas, não tendo o Relatório mencionado tal alteração com o respetivo despacho fundamento e tampouco foi a Requerente notificada”.
2.6. Assim, entende a Requerente que “a Direção de Finanças de ... não atuou dentro dos limites dos poderes que lhe foram atribuídos, desrespeitando os princípios do procedimento tributário (…)” porquanto, “com a sua atuação, a AT desvirtuou princípios fundamentais do procedimento de inspeção tributária, como sejam o do contraditório e da cooperação (…)”.
2.7. Assim, defende a Requerente que “(…) a ação inspeção tributária externa realizado pela AT – Direção de Finanças de ... a, com o n.º de ordem de serviço OI2018... deve ser considera inválida e, em consequência, serem anulados os actos de liquidações adicionais em sede de IRC e IVA no exercício de 2016 da Requerente”.[2]
Dos encargos não aceites em sede de IVA - dos encargos com combustíveis relativos a máquinas alugadas
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Neste âmbito, refere a Requerente que “a AT desconsiderou os gastos com combustíveis em máquinas alugadas e respetiva dedução do IVA com aquelas compras”, porquanto “a AT colocou do lado da Requerente a obrigação de (…) indicar o tipo de serviço, bem como os locais em que foram utilizados cada um dos veículos por mês, com a indicação das matrículas das respetivas viaturas, o nome dos clientes com a indicação do número de contribuinte, as facturas, os comprovativos dos respetivos meios de pagamento utilizados, em que conta bancária foram depositados os valores dos serviços prestados e listagem com a identificação do percurso e quilometragem do veículo no início e no termo do serviço realizado com referência à factura ou documento que suportou a operação (…)”.
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Prossegue a Requerente referindo que, no âmbito da acção inspectiva, “não foi possível à Requerente juntar a informação requerida [pela Requerida] no tempo disponibilizado, tendo sido a AT informada do sucedido (…)”, dado que “(…) embora adote a figura de sociedade de anónima, possui uma pequena estrutura” reconhecendo que “os procedimentos internos (…) são (…) rudimentares e pouco eficientes, o que poderia ser facilmente verificado pelos funcionários que procederam à inspeção (…)”.
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Segundo entende a Requerente, “a AT não observou o princípio da proporcionalidade da ação inspetiva, não tendo adotado uma atuação proporcional e adequada ao objetivo pretendido – descobrir a verdade material proporcionando à Requerente um período adequado ao requerido”.
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“A AT fundamentou na sua decisão que afigura-se-nos, salvo melhor opinião expressa sobre a temática, que a indicação da entidade nos documentos de suporte, assim como a matrícula da viatura abastecida, serão os únicos meios idóneos para demonstrar a primeira parte da prova (…)” mas, segundo entende a Requerente, tendo em consideração o seu tipo de actividade (que elenca), “a Requerente, (…) utiliza diversos veículos matriculados e máquinas industriais (sem matricula), que são propriedade sua ou alugados”.
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Ora, “no exercício de 2016, a Requerente tinha na sua propriedade algumas máquinas e veículos (alguns com matrícula outros sem matrícula)” e, “porque se dedica sobretudo à valorização de resíduos metálicos e não metálicos, (…) aloca praticamente todos aqueles veículos e máquinas industriais nessa atividade”, “tendo a necessidade de alugar veículos e máquinas a outras entidades quando existam outros serviços contratados”, “como é o caso do aluguer de veículos à sociedade B..., S.A.” questionado pelos Serviços de Inspeção Tributária (SIT).
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Neste âmbito, refere a Requerente que “celebrou com a sociedade B..., S.A. oito contratos de aluguer referentes aos veículos com as matrículas ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... (…)” sendo que “para os referidos alugueres, foram emitidas facturas pela sociedade B..., S.A. à Requerente, facturas essas que foram pagas” pela Requerente.
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Recusa ainda a Requerente aceitar que o facto de ter alugado veículos que anteriormente tinha vendido à sociedade B... releve “(…) para averiguar da efetiva utilização e gasto com os mesmos” porquanto “a venda dos referidos veículos decorreu de uma restruturação financeira operada pela Requerente, que se encontrava com dificuldades financeiras em manter as máquinas e veículos” sendo que “de um ponto de vista estratégico, a Requerente decidiu vender os veículos ficando dotada de meios financeiros para outros compromissos” tendo o negócio sido formalizado e tendo sido “(…) emitidas facturas que se contabilizaram em sede de IRC de ambas as empresas e foi liquidado o respetivo IVA, tudo contabilística e legalmente conforme, tendo sido realizados os respetivos registos junto da Conservatória do Registo Automóvel”.
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Assim, defende a Requerente que “os veículos foram alugados para um fim concreto: a sua utilização na atividade comercial da Requerente” sendo que “a dedução que a AT elabora, de que (…) os gastos com o gasóleo dizem respeito a outras máquinas que não se sabe quais são (…)” e “que estes gastos em gasóleo não são referentes às máquinas que a sociedade B... alugou (…)” à Requerente “(…) é desprovida de qualquer raciocínio lógico e ponderação da atividade da Requerente” porquanto “é bastante difícil para a Requerente, considerando a sua estrutura e tipo de atividade, discriminar em facturas de suporte separadas o combustível de cada um dos veículos abastecidos”.
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Com efeito segundo alega a Requerente que “(…) adquire em média mais de 400 litros de combustível por dia que depois utiliza em todos os veículos e máquinas industriais, quer da sua propriedade, quer os alugados, quer os que têm matricula, quer os que não têm matricula (…)”, atribuindo “(…) um determinado gasto de combustível a cada veículo alugado com base (…)” em critérios que apresenta no pedido arbitral (“quantos quilómetros por ano o veículo efetuou; quantos litros de combustível gasta a cada 100 Km; qual o preço do combustível”).
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Reconhece a Requerente que “a gestão dos gastos com o combustível poderá não ser tão criteriosa e precisa como requerido pela AT”, mas defende que “esta gestão criteriosa e precisa é praticamente impossível considerando a forma de utilização de combustível nas máquinas e veículos e a estrutura da Requerente” porquanto “não adquire combustível apenas para um veículo em concreto, i.e., não se desloca apenas com uma viatura a um posto de combustível, abastece e solicita a emissão da factura com aquela matrícula concreta”.
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Com efeito, alega a Requerente que “(…) o abastecimento é feito por algum dos colaboradores da Requerente, sendo por vezes colocado nas faturas emitidas matriculas que se referem ao veículo que serviu (…) para carregar aquela quantidade de (…) de combustível para as instalações da Requerente ou para os locais onde se encontram as máquinas a trabalhar, admitindo a Requerente “(…) que o valor alocado aos veículos alugados não se encontra correcto, pelo contrário até deveria ser muito superior (…)” mas “certo é que a Requerente consome todo o gasóleo que resulta das facturas que se encontram lançadas na contabilidade”.
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Assim, entende a Requerente que “tendo (…) feito prova de que tais veículos foram utilizados em regime de locação e que não ultrapassam os consumos normais, considera-se que cumpriu as condições elencadas no art. 23.º-A, n.º 1, alínea j) do CIRC, encontrando-se plenamente justificado pelo número de veículos e máquinas e pelo consumo médio de cada um, o gasóleo consumido”, “devendo ser aceite tais gastos com os encargos em combustíveis para efeitos de tributação em sede de IRC e, em consequência, aceite a respetiva dedução do IVA com aquela compra”.[3]
2.20. Assim, entende a Requerente que “(…) deve ser fiscalmente aceite, em sede de IVA, o encargo com o combustível para as máquinas alugadas à sociedade B..., S.A., por ter sido provada a sua utilização a título de locação e o consumo médio normal de cada viatura e, em consequência, ser a liquidação adicional em sede de IVA declarada ilegal por ausência de fundamentação”.
Da transmissão intracomunitária realizada à entidade C..., S.L.
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Neste âmbito, segundo a Requerente, “a AT veio ainda a desconsiderar o beneficio da isenção de IVA na transmissão intracomunitária efetuada à entidade C..., SL., referente à factura n.º 1831, de 30-12-2016”, “concluindo tão só que não nos restam dúvidas que o referido bem não saiu do território nacional, pelo que se terá de proceder à liquidação do respetivo IVA” não obstante ter sido exibido, aos SIT, o respectivo CMR.
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Com efeito, segundo a Requerente, “a AT afirma que é verdade que o sujeito português apresentou o CMR, relativo ao transporte do bem de Portugal para Espanha, mas este só por si não é suficiente para fazer prova de que realmente o bem saiu do território nacional”, sendo “por isso, (…) necessário indagar, junto do sujeito passivo espanhol como foram realizadas essas transmissões intracomunitárias (…)” (sublinhado nosso).
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A Requerente não aceita as conclusões da AT, porquanto entende que esta “(…) voltou a não adoptar no procedimento os meios adequados de acordo com o princípio da proporcionalidade, eficiência, praticabilidade e simplicidade (…)”, “incorrendo, a final, no incumprimento do princípio da verdade material, não alcançando um cenário realista perante a situação da Requerente”.
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Assim, peticiona a Requerente que “deve ser fiscalmente aceite a transmissão intracomunitária efetuada pela Requerente a favor da C..., S.L, por provada, e ser a liquidação adicional de IVA declarada ilegal”.
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Em consequência, peticiona a Requerente que “deve ser dado sem efeito o processo de contraordenação instaurado (…)” e “deve ser extinto o processo de execução fiscal nº ...2019... e apensos, porquanto a liquidação adicional em sede de IVA é ilegal por ausência de fundamentação”.
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RESPOSTA DA REQUERIDA
3.1. A Requerida, devidamente notificada para o fazer, nos termos do disposto no artigo 17º, nº 1 do RJAT, não apresentou Resposta no prazo de 30 dias.
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Com efeito, a Requerida veio através de Requerimento, apresentado em 13 de Novembro de 2019, requerer que fosse admitida a junção aos autos da sua Resposta, “(…) ao abrigo dos princípios da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo, da cooperação e da boa fé processual (…) uma vez que (…) o tribunal arbitral pode permitir a prática de ato omitido (…) tendo em vista o apuramento da verdade material e a igualdade das partes, pois apesar da mesma ter sido feita dentro do prazo para o efeito não foi enviada por lapso, tal como o Processo administrativo que agora se junta” mas, por despacho arbitral datado de 20 de Novembro de 2019, e exercido o contraditório pela Requerente quanto ao teor do requerimento da Requerida referido no ponto anterior, este Tribunal Arbitral veio decidir “indeferir o requerimento da Requerida de 13 de Novembro de 2019, no sentido de ser admitida a junção aos autos da sua Resposta” com os fundamentos dele constante e que aqui se consideram integralmente reproduzidos.
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SANEADOR
4.1. O Tribunal é materialmente competente para apreciação do pedido arbitral e encontra-se regularmente constituído, nos termos do artigo 2º, nº 1, alínea a), artigos 5º e 6º, todos do RJAT.
4.2. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo porque apresentado no prazo previsto na alínea a), do nº 1, do artigo 10º do RJAT.
4.3. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral, nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º do RJAT e do artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março, estando devidamente representadas.
4.4. Não foram suscitadas excepções de que cumpra conhecer nem se verificam nulidades.
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MATÉRIA DE FACTO
5.1. Preliminarmente, e no que diz respeito à matéria de facto, importa salientar que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas Partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada [cfr. artigo 123º, nº 2, do CPPT e artigo 607º, nºs 3 e 4, do CPC (aplicáveis ex vi artigo 29º, nº 1, alíneas a) e), do RJAT].
5.2. Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito.
Dos factos provados
5.3. A Requerente é uma sociedade comercial, constituída sob a forma de sociedade anónima, que se dedica á actividade principal de “valorização de resíduos não metálicos” (código CAE 38322).
5.4. No âmbito da sua actividade, para efeitos de IRC, está enquadrada no regime geral e, para efeitos de IVA, encontra-se enquadrada no regime normal com periodicidade mensal (por opção).
5.5. A Requerente foi notificada, através do Ofício nº..., de 26-09-2018 (registo nº RH ... PT), da intenção dos SIT da Direção de Finanças de ... procederam a um procedimento inspectivo, a efectuar em cumprimento do mandado conferido pela Ordem de Serviço nº OI2018..., emitida pela referida Direção Distrital de Finanças, tendo a mesma sido elaborada com base no teor da Proposta de Inspeção nº PI..., de 16-04-2018, dos SIT daquela Direção de Finanças, tendo em consideração os motivos a seguir indicados:
5.5.1. “A sociedade A... (…) referente ao ano 2015, não evidencia quaisquer valores a nível de Transmissão Intracomunitária no VIES. Todavia, na empresa espanhola C... (…) consta o valor de (…) a nível de aquisições intracomunitárias, relativas a bens/prestações de serviços adquiridos ao sujeito passivo português”;
5.5.2. “No que diz respeito ao ano de 2016, ao nível do VIES, a sociedade A... declara ter efetuado Transmissões Intracomunitárias, no valor de 26.500,00. Todavia na empresa espanhola C... (…) consta o valor de 51.550,00 a nível de aquisições intracomunitárias relativas a bens/prestações de serviços adquiridos ao sujeito passivo português”.
5.6. A acção inspectiva identificada teve como objectivo o controlo das aquisições e das transmissões intracomunitárias efectuadas pela Requerente à sociedade espanhola C..., SL, foi de âmbito parcial em sede de IRC e IVA, teve início em 07-11-2018 e foi concluída em 1 de Abril de 2019.
5.7. No âmbito do referido procedimento inspectivo, foram solicitados à Requerente, por escrito, em 15 de Janeiro de 2019 (registo nº RH ... PT), o envio dos seguintes elementos, no prazo máximo de 5 dias:
5.8. A Requerente solicitou ao Inspector Tributário, por email datado de 19 de Janeiro de 2019, que o prazo de 5 dias concedido para a entrega da documentação solicitado no ponto anterior fosse alargado de modo a que pudesse cumprir com a entrega de todos os elementos solicitados (sendo que, por email datado de 26 de Janeiro de 2019, a Requerente confessou que o alargamento do prazo concedido não chegou para cumprir com a obrigação de envio acima referida).
5.9. Os SIT solicitaram, ao abrigo do Convénio Transfronteiriço Hispano/Luso de Intercâmbito Direto de Informação Fiscal, a informação de quais eram os gerentes da sociedade espanhola C..., SL, tendo obtido da Agência Tributária Espanhola, a informação datada de 15 de Fevereiro de 2018, de que o administrador da referida sociedade era D..., com uma participação de 100% no capital da mesma e que a sociedade não possuía estrutura para o exercício da sua actividade.
5.10. Em 26 de Fevereiro de 2019 foi solicitada pelos SIT a seguinte informação à Requerente:
5.11. Em resultado do referido procedimento de inspeção, foram propostas as seguintes correcções em sede de IVA (objecto do pedido), respeitantes ao ano 2016:
FUNDAMENTAÇÃO
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MONTANTE TOTAL
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IVA deduzido indevidamente referente a máquinas alugadas
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4.436,18
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Falta de liquidação de IVA
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500,08
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TOTAL
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4.936,26
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5.12. A Requerente foi notificada do Projecto de Relatório de Inspeção Tributária, através do Ofício nº ..., de 02-04-2019 (registo nº RH ... PT, de 03-04-2019), bem como para de exercer, querendo, no prazo de 15 dias, o direito de audição relativamente às propostas de correção notificadas.
5.13. De acordo com o teor do Projecto de Relatório, os fundamentos para as correcções propostas, em sede de IVA, para 2016, foram os que a seguir se transcrevem:
5.13.1. IVA referente à aquisição de gasóleo de máquinas alugadas
5.13.2. Falta de liquidação de IVA
5.14. A Requerente não exerceu o seu direito de audição relativamente ao Projecto de Relatório acima identificado.
5.15. A Requerente foi notificada, em 3 de Maio de 2019 (registo nº RH ... PT, de 30-04-2019), do teor do Relatório de Inspeção Tributária, nos termos do qual se mantiveram as correções de IVA propostas para o ano 2016.
5.16. Em consequências, foram efectuadas as seguintes liquidações de IVA:
PERÍODO
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LIQUIDAÇÃO Nº
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MONTANTE
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201601
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...
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914,77
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201602
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...
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289,46
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201603
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...
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241,78
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201604
|
...
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395,30
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201606
|
...
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421,67
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201607
|
...
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516,29
|
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201608
|
...
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488,89
|
|
201609
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...
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445,89
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201610
|
...
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270,39
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201611
|
...
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273,20
|
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201612
|
...
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678,81
|
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TOTAL
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4.936,45
|
[4]
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5.17. A Requerente foi ainda notificada da demonstração da liquidação de IVA com o nº 2019 ... de 07-05-2019, no montante de EUR 4.936,25 bem como da demonstração da liquidação de juros nº 2019..., de 07-05-2019, no montante de EUR 471,48, no total de imposto e juros de EUR 5.407,73.
5.18. Em consequência, foi instaurado o processo de contra-ordenação nº ...2019..., de 30-04-2019 (e não o nº ...2019..., de 30-04-2019, como indicado pela Requerente no pedido, porquanto este diz à alegada violação do dever de cooperação pela Requerente, bem como a alegadas omissões e inexactidões nas declarações de IRC ou outros documentos fiscalmente relevantes), por alegadas omissões e inexactidões nas declarações de IVA ou outros documentos fiscalmente relevantes, entregues pela Requerente no ano 2016 (alegada falta de entrega de imposto e alegada falta de entrega de prestação tributária dentro do prazo).
5.19. A data limite para pagamento voluntário do IVA liquidado adicionalmente foi
14-06-2019, o qual não foi pago pela Requerente.
5.20. Em consequência, foi instaurado o processo de execução fiscal nº ...2019... e apensos.
5.21. Por não concordar com os fundamentos das referidas correções em sede de IVA e consequentemente, com as liquidações de IVA e de juros a pagar, a Requerente apresentou pedido de pronúncia arbitral em 9 de Julho de 2019.
Motivação quanto à matéria de facto
-
No tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal Arbitral fundou-se, para além da livre apreciação das posições assumidas pelas Partes (em sede de facto), no teor dos documentos juntos aos autos pelas Partes, incluindo o processo administrativo.
Dos factos não provados
-
Não se verificaram quaisquer outros factos como não provados com relevância para a decisão arbitral.
6. MATÉRIA DE DIREITO
6.1. Encontrando-se fixada a matéria de facto dada como provada, de seguida importa determinar o direito aplicável aos factos subjacentes, de acordo com as questões a decidir.
6.2. Nos autos, o pedido formulado pela Requerente é no sentido de:
6.2.1. Ser “considerada inválida a ação inspetiva externa (…)” identificada no processo, e, em consequência, serem “(…) anulados os actos de liquidações adicionais em sede de IVA no exercício de 2016 da Requerente” porquanto esta entende que “a Direção de Finanças de ... não atuou dentro dos limites dos poderes que lhe foram atribuídos, desrespeitando os princípios do procedimento tributário (…)” e, com esta actuação “(…) a AT desvirtuou princípios fundamentais do procedimento de inspeção tributária, como sejam o do contraditório e da cooperação (…)”, “pelo que, a ação [de] inspeção tributária externa realizada pela AT (…) deve ser considerada inválida e, em consequência, serem anulados os actos de liquidação adicionais em sede de (…) IVA [do] exercício de 2016 (…)”;
6.2.2. Mas “caso assim não se entenda, deve ser fiscalmente aceite, em sede de IVA, o encargo com o combustível para as máquinas alugadas à sociedade B..., S.A. (…) e, em consequência, ser a liquidação adicional em sede de IVA declarada ilegal por ausência de fundamentação”;
6.2.3. Adicionalmente, peticiona ainda a Requerente que seja “(…) fiscalmente aceite a transmissão intracomunitária efetuada pela Requerente a favor da C... a, S.L, por provada, e ser a liquidação adicional de IVA declarada ilegal”.
6.2.4. “Em consequência, deve ser dado sem efeito o processo de contraordenação instaurado com número ...2019..., porquanto não existiu nenhuma omissão ou inexatidão nas declarações ou outros documentos fiscalmente relevantes entregues pela Requerente no exercício de 2016”;
6.2.5. E, por último, peticiona a Requerente que “deve ser extinto o processo de execução fiscal nº ...2019... e apensos, porquanto a liquidação adicional em sede de IVA é ilegal por ausência de fundamentação”.
6.3. Neste âmbito, recorde-se que a Requerida apresentou a sua Resposta de forma extemporânea pelo que não foi aceite por este Tribunal Arbitral, nos termos do despacho arbitral de 20 de Novembro de 2019 (que aqui se dá por integralmente reproduzido), tendo vindo a pronunciar-se sobre os argumentos apresentados pela Requerente, em sede de alegações, nos seguintes termos:
6.3.1. No que diz respeito à questão da alegada invalidade da acção de inspeção e consequente anulabilidade dos actos de liquidação adicional de IVA, invocada pela Requerente, entende a Requerida “(…) que não ocorreu qualquer alteração do fim, do âmbito ou da extensão da ação inspetiva realizada” pelo que “(…) falece a alegação da Requerente de falta de notificação (…) da alteração dos fins, âmbito ou extensão do procedimento de inspeção, pois não ocorreu qualquer alteração no decorrer do procedimento inspectivo”, “inexistindo, assim, qualquer ilegalidade”.
6.3.2. No que diz respeito à dedução de IVA respeitante aos encargos com os combustíveis relativos a máquinas alugadas bem como quanto à falta de liquidação de IVA na transmissão intracomunitária realizada à entidade C..., SL, entende a Requerida que as liquidações de IVA a que aquelas correções respeitam tiveram “(…) na sua base as conclusões do relatório final de inspeção, devidamente fundamentado e legalmente notificado à Requerente, para ele se remetendo, uma vez que continua a merecer inteiro acolhimento. Razão pela qual se entende que, pelos motivos e fundamentos nele explicitados, serão de manter as suas conclusões (…)” porquanto alega a Requerida que:
6.3.2.1. No que diz respeito aos encargos com combustíveis, “(…) de acordo com os elementos probatórios exibidos, para além de ter contabilizado encargos com combustíveis não dedutíveis para efeitos fiscais (…) a Requerente, não demonstrou a verificação dos requisitos de que depende o direito à dedução de IVA que se arroga” pelo que “(…) contrariando a previsão normativa vertida no artº 20º do CIVA, a Requerente deduziu indevidamente IVA incorrido em encargos que, segundo os serviços inspetivos, não eram dedutíveis para efeitos fiscais, uma vez que (…) não provou que o imposto era suportado em bens pertencentes ao seu ativo imobilizado ou por si utilizados em regime de locação e que não foram ultrapassados os consumos normais”;
6.3.2.2. No que diz respeito à transmissão intracomunitária realizada para a C..., alega a Requerida “(…) foi aplicada a isenção em operações relacionadas com alegadas transmissões intracomunitárias, sem atestar o cumprimento dos respetivos condicionalismos dos quais depende a aplicação da isenção, conforme o previsto no artº 14º do RITI. (…). A falta dos citados condicionalismos determina a obrigação da tributação destas operações e consequente dever de liquidar o correspondente imposto”, concluindo que “(…) atenta a prova produzida no relatório final de inspeção, nomeadamente, a demonstração de que o bem em causa não saiu do território nacional, a AT procedeu (…) às devidas correções e, em consequência, à liquidação adicional do IVA considerado em falta” (sublinhado nosso).
6.3.3. No que diz respeito à prova testemunhal, a Requerida alega que a mesma “(…) resultou em contradição (…)” e que “(…) faltou à verdade (…)”.
6.4. Nestes termos, face às diferentes posições assumidas pelas Partes, no que diz respeito à legalidade das liquidações de IVA e juros objecto do pedido, haverá que analisar os argumentos acima apresentado de modo a dar resposta às seguintes questões:
6.4.1. A Requerida, no âmbito da acção inspectiva externa efectuada na Requerente, da qual resultaram as correcções aritméticas em sede de IVA que deram origem às liquidações de IVA, respeitantes ao ano 2016, objecto do pedido de pronúncia arbitral, alterou ou não o âmbito da referida inspeção tributária, invalidando esta bem como as liquidações adicionais subsequentes, devendo estas, por isso, ser anuladas?
6.4.2. Caso resposta à questão anterior venha a ser negativa, e no que diz respeito aos encargos com combustíveis relativos a máquinas alugadas, a Requerente fez ou não prova de que as mesmas foram utilizadas em regime de locação e que os consumos registados não ultrapassaram os consumos normais, justificando-se assim os montantes de gasóleo consumido e legitimando-se a dedução do IVA efectuada?
6.4.3. No que diz respeito à transmissão intracomunitária realizada à C..., a Requerente efectuou ou não prova suficiente do cumprimento dos requisitos previstos no artigo 14º do Regime das Transmissões Intracomunitárias de Bens (RITI), de modo a beneficiar da isenção de IVA nele consignada no que diz respeito à transmissão de bens efectuada àquela entidade?
Da invalidade da acção de inspeção e consequente anulabilidade dos actos de liquidação adicional de IVA
6.5. Assim, cumpre preliminarmente analisar se, no âmbito do procedimento de inspeção que deu origem às correcções aritméticas que estão na base das liquidações de IVA objecto do pedido, houve ou não uma alteração do âmbito e extensão do procedimento e, em consequência, se houve ou não preterição na fundamentação da alegada alteração porquanto, em caso afirmativo, ocorrerá a invalidade dos actos de liquidação adicional de IVA posteriores que nele se suportaram.
6.6. Em termos gerais, o artigo 12º, nº 1 do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA), dispõem que “o procedimento de inspeção classifica-se, quanto aos fins em: a) Procedimento de comprovação e verificação, visando a confirmação do cumprimento das obrigações dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários; b) Procedimento de informação, visando o cumprimento dos deveres legais de informação ou de parecer dos quais a inspeção tributária seja legalmente incumbida” (sublinhado nosso).
6.7. O artigo 13º do RCPITA refere quanto ao lugar da realização do procedimento de inspeção que este pode classificar-se em “a) interno, quando os atos de inspeção se efetuem exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise formal e de coerência dos documentos por esta detidos ou obtidos no âmbito do referido procedimento; b) externo, quando os actos de inspeção se efectuem, total ou parcialmente, em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso” (sublinhado nosso).
6.8. Já o disposto no artigo nº 1 do 14º do RCPITA prevê, quanto ao âmbito, que o procedimento de inspeção que este pode ser “a) geral ou polivalente, quando tiver por objecto a situação tributária global ou conjunto dos deveres tributários dos sujeitos passivos ou dos demais obrigados tributários; b) parcial ou univalente, quando abranja apenas algum ou alguns tributos ou algum ou alguns deveres dos sujeitos passivos ou dos demais obrigados tributários. 2 - Considera-se ainda procedimento parcial o que se limite à consulta, recolha de documentos ou elementos determinados e à verificação de sistemas informáticos dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários, ou ao controlo de bens em circulação” (sublinhado nosso).
6.9. Já quanto à extensão, o nº 3 do artigo 14º do RCPITA dispõe que “(…) o procedimento pode englobar um ou mais períodos de tributação”.
6.10. No que diz respeito ao disposto no artigo 15º do RCPITA (alteração dos fins, âmbito e extensão do procedimento), está previsto que “os fins, o âmbito e a extensão do procedimento de inspeção podem ser alterados durante a sua execução mediante despacho fundamentado da entidade que o tiver ordenado, devendo ser notificado à entidade inspeccionada”, ou seja, é inequívoca a obrigação de notificação ao contribuinte do despacho de alteração dos fins, do âmbito ou da extensão do procedimento de inspeção “durante a sua execução” (sublinhado nosso).[5]
6.11. Como se refere no Acórdão do STA referido na nota de rodapé do ponto anterior (e também citado pela Requerente no pedido arbitral), “(…) a Administração Tributária não se podia mostrar alheia às consequências práticas e jurídicas de uma ampliação do âmbito e extensão da acção inspectiva a que estava a submeter a Impugnante, negando-lhe, manifesta e intencionalmente, o acesso aos fundamentos que determinaram aquela ampliação, impedindo-a, desde logo, de sobre os mesmos poder emitir qualquer pronúncia ou questionar a sua legalidade, tendo em conta o reflexo que tal despacho teria na sua esfera jurídica.(…). Repare-se que a alínea l) do n.º 3 do art. 59º da LGT determina que a colaboração da Administração Tributária com os contribuintes compreende, designadamente, a comunicação antecipada do início da inspeção da escrita, com a indicação do seu âmbito e extensão e dos direitos e deveres que assistem ao sujeito passivo. (…) Sendo que (…) as notificações no procedimento de inspeção tributária devem ser sempre realizadas em momento anterior ao da prática dos actos de inspeção, podendo ser, o mais tardar, efectuadas no momento da sua prática. Por outro lado, não seria curial, nem apresentaria qualquer coerência lógica e sistemática, o entendimento de que o despacho que determina ab initio o fim, o âmbito e a extensão da acção inspectiva tivesse que ser levado ao conhecimento da entidade a ser inspeccionada – assegurando a lei que tal seria efectuado através de uma notificação prévia para procedimento de inspeção, a efectuar com uma antecedência mínima de cinco dias [cf. art. 49º do RCPIT] –, e que, depois, qualquer alteração desses fins, âmbito e extensão pudesse ser efectuada sem o conhecimento atempado por banda da entidade inspeccionada. Por outro lado, não se perspectivaria qual a utilidade prática da exigência legal de emanação de um despacho fundamentado a determinar a alteração do fim, do âmbito e da extensão da acção inspectiva se o mesmo nunca chegaria ao conhecimento do seu destinatário: a entidade inspeccionada. Ora, se o legislador impôs que a decisão de alteração dos fins, do âmbito e da extensão da acção inspectiva fosse fundamentada, naturalmente que o fez com o objectivo de que o mesmo pudesse ser compreendido, questionado e escrutinado pela entidade inspeccionada. Qualquer outra interpretação, entende o Tribunal, carece de razoabilidade e ofende o princípio geral de notificação das decisões que afecte os direitos e interesses legítimos dos contribuintes” (sublinhado nosso).
6.12. E prossegue o referido Acórdão referindo que “(…) não estando em causa um procedimento de inspeção em que (…) esteja dispensada a notificação prévia do procedimento de inspeção (…)”, as “(…) formalidades previstas na lei como formalidades essenciais, na ausência de disposição legal em contrário, estruturantes do procedimento inspectivo, que uma vez não observadas serão invalidantes dos posteriores termos procedimentais, designadamente da liquidação posterior que neles se suporta, dado não poder concluir-se, face à prova produzida, com um grau de certeza razoável, que o resultado a atingir sempre seria o mesmo, caso a formalidade tivesse sido cumprida, ou que o sujeito passivo prestou a sua colaboração com o acto inspectivo nesse âmbito alargado sem haver colocado em causa a falta de tal despacho” (sublinhado nosso).
6.13. Por outro lado, “nos termos do disposto no art.º 135.º do Código do Procedimento Administrativo aprovado pelo DL n.º 442/91, de 15 de Novembro (…), são anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção (…), pelo que a omissão do acto procedimental invalida, por anulabilidade (…), todo o procedimento arrastando necessariamente a validade do acto de liquidação oficiosa [subsequente], que nele obteve os seus fundamentos legais” (sublinhado nosso).[6]
6.14. Com efeito, e como referido no Acórdão do STA nº 01101/15, de 15-06-2016, “na pendência do procedimento de inspeção podem ser alterados os fins e a extensão daquele, posto que tal conste de despacho fundamentado da entidade que o tiver ordenado (…)”, verificando-se “falta de fundamentação da decisão que determinou o alargamento da acção inspectiva quando foi alargado o âmbito da acção inspectiva, sem que disso fosse dado conhecimento ao contribuinte (…)”, sendo “(…) impugnáveis os actos lesivos praticados no procedimento inspectivo, por desconformes com a lei, ofendendo, em consequência disso, os princípios constitucionais da legalidade, da proporcionalidade e da necessidade, ao causar transtornos superiores aos que a realização do direito à tributação implicava, da imparcialidade na aplicação do princípio da proporcionalidade e da garantia do sujeito passivo em ser constrangido a um procedimento inspectivo confinado aos limites fixados na lei” (sublinhado nosso).
6.15. Ora, no caso, a Requerente alega que “a (…) ação inspetiva externa” a que foi sujeita relativamente ao ano 2016 “(…) tinha como objetivo o controlo das aquisições e das transmissões intracomunitárias efetuadas pela sociedade portuguesa A..., S.A à sociedade espanhola C... (…), conforme descrito no relatório final” (e ponto 5.6. da matéria dada como provada) tendo a Requerida alargado o âmbito da acção inspectiva, durante o decurso da mesma, a outras operações praticadas, no ano 2016, em sede de IVA e de IRC, que não estavam relacionadas com o objectivo do procedimento inspectivo, equacionado pelos SIT, de controlo das aquisições e das transmissões intracomunitárias efectuadas pela Requerente à sociedade espanhola C... (sublinhado nosso).
6.16. Não obstante, e como acima ficou descrito, ainda que “a ação inspetiva [seja] um procedimento que visa observar a realidade tributária de um sujeito passivo (…), sendo determinada inicialmente no seu âmbito e extensão (…)”, “os fins, o âmbito e a extensão do procedimento de inspeção podem ser alterados durante a sua execução, caso exista um despacho fundamentado da entidade que o tiver ordenado, devendo depois notificar a entidade em questão (…)” (sublinhado nosso).
6.17. Neste âmbito, e em conformidade com o descrito no Relatório de Inspeção Tributária (RIT):
6.17.1. “O procedimento inspetivo (…) a que se reporta o presente (…) relatório, foi efetuado em cumprimento do mandato conferido pela Ordem de Serviços nº OI2018..., emitida pela Direção de Finanças de...”;
6.17.2. Esta acção teve “(…) como objetivo o controlo das aquisições e das transmissões intracomunitárias efetuadas pela sociedade portuguesas (…) à sociedade espanhola C... (…)”;
6.17.3. “O seu âmbito é parcial/univalente – IRC e IVA, nos termos da alínea b) do nº. 1 do artigo 14º do RCPITA, abrangendo o período de 2016, de acordo com o nº. 3 do mesmo artigo”.
6.18. Ora, atento o normativo do RCPITA acima enunciado, bem como o descrito no RIT (vide ponto anterior), verifica-se que o procedimento inspectivo credenciado pela Ordem de Serviço identificada no ponto 5.5., supra, com fundamento na Proposta de Inspeção referida no mesmo ponto 5.5., supra:
6.18.1. Quanto ao seu fim, o mesmo respeita a um procedimento de comprovação e verificação, visando a confirmação do cumprimento das obrigações da Requerente no que diz respeito às aquisições e transmissões intracomunitárias, efectuadas pela Requerente com a sociedade espanhola C... [artigo 12º, nº 1, alínea a) do RCPITA];
6.18.2. Quanto ao lugar, o procedimento em análise foi de natureza externa, porquanto os actos de inspeção se efectuaram nas instalações da Requerente (artigo 13º do RCPITA);
6.18.3. Quanto ao seu âmbito, o procedimento inspectivo foi parcial ou univalente [artigo 14º, nº 1, alínea b) e nº 2 do RCPITA] abrangendo por isso, de acordo com o legalmente previsto, apenas alguns tributos (IRC e IVA, no caso) e algum ou alguns deveres da Requerente, podendo limitar-se à consulta, recolha de documentos ou elementos determinados;
6.18.3. Quanto à extensão, o referido procedimento englobou apenas um período de tributação, ou seja, 2016 (artigo 14º, nº 3 do RCPITA).
6.19. Adicionalmente, não há no RIT, nem foi reconhecido por qualquer das Partes, que o mandato inicial conferido pela Ordem de Serviço nº OI2018..., emitida pela Direção de Finanças de ... (nos termos acima descritos), tenha sido objecto de alteração quanto ao seu fim, durante o decurso do procedimento de inspeção, de acordo com o disposto no artigo 15º do RCPITA, mediante despacho fundamentado daquela Direção Distrital de Finanças o qual, deveria ainda ter sido notificado à Requerente enquanto entidade inspecionada.
6.20. Nestes termos, não há qualquer evidência de ter havido, na pendência do procedimento inspectivo em análise, qualquer despacho de fundamentação da “decisão” que terá determinado o alargamento da acção inspectiva, por alteração dos fins da mesma, e consequentemente, não há evidência de ter sido a Requerente notificada da mesma.
6.21. Assim, considera-se que há “falta de fundamentação da decisão que determinou o alargamento da acção inspectiva quando foi alargado o âmbito da acção inspectiva, sem que disso fosse dado conhecimento ao contribuinte (…)” porquanto não se perspectivaria qual a utilidade prática da exigência legal de emanação de um despacho fundamentado a determinar a alteração (nomeadamente, do fim da acção inspectiva) se fosse para o mesmo nunca chegar ao conhecimento do seu destinatário, ou seja, a entidade inspecionada (no caso, a Requerente).
6.22. Ora, se o legislador impôs que a decisão de alteração dos fins, para além de ter de ser notificada, fosse fundamentada, naturalmente que o fez com o objectivo de que o teor da mesma pudesse ser compreendido, questionado e escrutinado pela entidade inspecionada (no caso, pela Requerente), de modo a salvaguardar o princípio geral de notificação das decisões que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes.
6.23. E, recorde-se, como referido no Acórdão do STA nº 01460/17, acima já citado, “(…) não estando em causa um procedimento de inspeção em que (…) esteja dispensada a notificação prévia do procedimento de inspeção (…)”, as “(…) formalidades previstas na lei como formalidades essenciais (…) estruturantes do procedimento inspectivo, (…) uma vez não observadas serão invalidantes dos posteriores termos procedimentais, designadamente da liquidação posterior que neles se suporta (…)”.
6.24. Em consequência, deverá considerar-se que a omissão do acto procedimental invalida, por anulabilidade, o procedimento arrastando necessariamente a validade dos actos de liquidação adicional de IVA que nele obtiveram os seus fundamentos legais”.[7] [8]
6.25. Nestes termos, face ao acima exposto, entende este Tribunal Arbitral ser de anular os actos de liquidação de IVA e de juros relativos à dedução de imposto (considerada indevida pela Requerida) referentes à aquisição de gasóleo de máquinas alugadas porquanto estas liquidações resultaram e se fundamentaram em procedimento inspectivo considerado, nessa medida, inválido.
6.26. Assim, será parcialmente afirmativa a resposta a dar à questão formulada no ponto 6.4.1., supra, porquanto, face ao acima analisado, se conclui que, durante a acção inspectiva externa efectuada na Requerente, da qual resultaram as correcções aritméticas em sede de IVA que deram origem a liquidações de imposto e juros, respeitantes ao ano 2016, referidas no ponto anterior, foi alterado o âmbito da referida inspeção tributária devendo, nessa medida, serem anuladas.
Dedução de IVA referente à aquisição de gasóleo de máquinas alugadas
6.27. Tendo em consideração as conclusões apresentadas nos pontos anteriores, a análise da legalidade das liquidações de IVA e de juros respeitante ao ano 2016 e referentes à dedução de imposto respeitante à aquisição de gasóleo de máquinas alugadas pela Requerente fica aqui prejudicada.
Da transmissão intracomunitária realizada à entidade espanhola C..., SL
6.28. Neste âmbito, alega a Requerente no pedido que, em sede de RIT “a AT veio ainda a desconsiderar o beneficio da isenção de IVA na transmissão intracomunitária efetuada à entidade C..., SL., referente à factura n.º 1831, de 30-12-2016”, e respeitante à transmissão de bens (máquina) porquanto, se conclui no procedimento de inspeção que “(…) não (…) restam dúvidas que o referido bem não saiu do território nacional, pelo que se terá de proceder à liquidação do respetivo IVA” apesar de os SIT, no RIT, também afirmarem que “(…) o sujeito português apresentou o CMR, relativo ao transporte do bem de Portugal para Espanha, mas este só por si não é suficiente para fazer prova de que realmente o bem saiu do território nacional”, sendo “por isso, (…) necessário indagar, junto do sujeito passivo espanhol como foram realizadas essas transmissões intracomunitárias (…)”.
6.29. Ora, em conformidade com o descrito no RIT, no âmbito do Convénio Transfronteiriço Hispano/Luso de intercâmbio Direto de Informação Fiscal foi solicitada a informação de quem eram os gerente do sujeito passivo espanhol (C...), tendo sido comunicado pela Agência Tributária – Delegação Especial da C... o nome do administrador (D...), a sua percentagem de participação na sociedade e que a sociedade espanhola não possuía estrutura para o exercício da sua actividade.
6.30. Assim, concluíram os SIT, no RIT, que “assim não nos restam quaisquer dúvidas que o referido bem não saiu do território nacional, pelo que se terá de proceder à liquidação do respetivo IVA” porquanto entenderam que o bem ou foi efetivamente vendido ou foi afeto a uso pessoal”
6.31. Em sede de alegações, a Requerida veio dizer que “(…) foi aplicada a isenção em operações relacionadas com alegadas transmissões intracomunitárias, sem atestar o cumprimento dos respetivos condicionalismos dos quais depende a aplicação da isenção, conforme previsto no artº 14º do RITI”, sendo que “a falta dos citados condicionalismos determina a obrigação da tributação destas operações e consequente dever de liquidar o correspondente imposto” (sublinhado nosso).
6.32. Deste modo, alega a Requerida que “atenta a prova produzida no relatório final da inspeção, nomeadamente a demonstração de que o bem não saiu do território nacional, a AT procedeu (…) às devidas correções e, em consequência, à liquidação adicional do IVA considerado em falta”.
6.33. Considerou ainda a Requerida que a testemunha inquirida nesta matéria (D...) “(…) faltou à verdade (…)” e entrou em contradição.
6.34. Nestes termos, a questão a esclarecer é a de saber se a Requerente efectuou ou não prova suficiente do cumprimento dos requisitos previstos na alínea a), do artigo 14º do RITI, de modo a que a transmissão de bens titulada pela factura nº 1831, de 30-12-2016, no valor de EUR 26.500, em nome da C..., possa ser qualificada como Transmissão Intracomunitária de Bens (TIB) e, por isso, isenta de IVA em Portugal, sendo que os SIT focaram toda a sua atenção no facto de entenderem que “(…) o bem não saiu do território nacional”.
6.35. Nestes termos, daremos também maior enfoque na análise do referido requisito.[9]
6.36. Em termos gerais, de acordo com o previsto no artigo 3º, nº 1, do Código do IVA “considera-se, em geral, transmissão de bens a transferência onerosa de bens corpóreos por forma correspondente ao direito de propriedade”.
6.37. Assim, para que uma transmissão de bens possa ser qualificada como tal, para efeitos de IVA, é necessário que essa transacção seja considerada:
6.37.1. Uma transferência onerosa, no sentido em que apenas as transmissões efectuadas a título oneroso são sujeitas a IVA ficando, em princípio, excluídas do âmbito deste imposto as transmissões efectuadas a título gratuito;
6.37.2. De bens corpóreos, móveis ou imóveis, ficando excluídas deste conceito as transferências onerosas de bens incorpóreos, as quais serão tributadas como prestações de serviços;
6.37.3. Por forma correspondente ao direito de propriedade, ou seja, ainda que não se proceda à transferência da propriedade jurídica do bem, bastando apenas que a transferência em causa confira ao adquirente o poder (económico) de disposição dos bens em causa, como se, de facto, fosse o proprietário dos mesmos.
6.38. No que diz respeito ao conceito de Transmissão Intracomunitária de Bens (TIB), apesar de este não encontrar definição legal no RITI, este regime define aquilo que deve ser entendido por aquisição intracomunitária de bens (AIB) sendo possível, a partir deste, construir “a contrario” o conceito de TIB.
6.39. Com efeito, nos termos do disposto no artigo 3º do RITI, “considera-se, em geral, AIB a obtenção do poder de dispor, por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade, de um bem móvel corpóreo, cuja expedição ou transporte para território nacional, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, com destino ao adquirente, tenha tido início noutro Estado-membro”.
6.40. Nestes termos, simetricamente, uma TIB corresponderá à transmissão do poder de dispor, por forma correspondente ao direito de propriedade, de um bem móvel corpóreo, cuja expedição ou transporte para o território de outro Estado-membro, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, com destino ao adquirente, tenha tido início no território nacional.
6.41. Tendo em conta o disposto no artigo 7º, nº 1 do RITI, o leque de operações abrangidas pelo conceito de TIB tornar-se-ia demasiado amplo, pelo que o legislador teve a necessidade de excluir determinado tipo de transacções, procedendo assim, no seu nº 2, a uma delimitação negativa da incidência, não sendo deste modo consideradas TIB as transferências de bens aí elencadas.[10] [11]
6.42. Tendo em consideração o princípio da tributação no país de destino e o da neutralidade do imposto, aplicável às transmissões de bens efectuadas entre sujeitos passivos nacionais e sujeitos passivos registados em outros Estados-membros, a principal consequência da qualificação de uma operação como TIB é que esta (à semelhança das operações de exportação) será, em princípio, isenta no Estado-membro de origem (i.e., no Estado-membro onde teve início a expedição ou transporte do bem com destino a um outro Estado-membro).[12]
6.43. Todavia, não basta que uma operação seja, a priori, qualificada como TIB para se assegurar que a mesma possa beneficiar da isenção em matéria de IVA.
6.44. Com efeito, para além de ser necessário que essa operação reúna os pressupostos legais da isenção do imposto [previstos no artigo 14º, alínea a), do RITI], o transmitente deverá ser capaz de evidenciar a verificação desses mesmos pressupostos.
6.45. Na verdade, nos termos do disposto no artigo 14º, alínea a), do RITI, “estão isentas do imposto, as transmissões de bens, efectuadas por um sujeito passivo (…), expedidos ou transportados pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, a partir do território nacional para outro Estado-membro com destino ao adquirente, quando este seja uma pessoa singular ou colectiva registada para efeitos de IVA noutro Estado-membro, que tenha utilizado o respectivo número de identificação para efectuar a aquisição e aí se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens” (sublinhado nosso).
6.46. Assim, de acordo com o artigo transcrito, a isenção de IVA mencionada depende da verificação, cumulativa, de três condições:[13]
6.46.1. Tratar-se de uma transmissão de bens entre um sujeito passivo de IVA em Portugal e um sujeito passivo de IVA noutro Estado-membro;
6.46.2. A transmissão de bens ter como destino o adquirente, sujeito passivo no outro Estado-membro, existindo expedição do bem de Portugal para esse
Estado-membro (negrito e sublinhado nosso);
6.46.3. O adquirente dos bens no outro Estado-membro tenha utilizado o respectivo número de identificação para efectuar a aquisição e aí se encontre abrangido pelo regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens.
6.47. Deste modo, a isenção duma transmissão intracomunitária de bens só se verifica se, para além das condições impostas relativamente ao fornecedor e ao adquirente, ocorrer a saída física dos bens do território nacional, conforme advém da expressão “(…) a partir do território nacional para outro Estado-membro com destino ao adquirente (…)”, condição determinante na qualificação da natureza intracomunitária de uma transmissão, tendo sido esta a única que parece ter tido interesse para os SIT, no RIT, quanto à necessidade de demonstração pela Requerente, não obstante ter exibido aos SIT o respectivo CMR.[14] [15]
6.48. O referido conceito de expedição pressupõe a deslocação física de bens um Estado-membro para outro, condição que estabelece a diferença entre uma operação intracomunitária e a que se realiza no interior de um Estado (operação interna), pois só assim é possível a aplicação do princípio da atribuição da receita fiscal ao Estado-membro onde ocorre o consumo final, ou seja, o princípio da tributação no destino, aplicável ao comércio intracomunitário.
6.49. No que diz respeito ao requisito que impõe que os bens sejam remetidos “com destino ao adquirente”, este coloca a ênfase no lugar de chegada, isto é, o lugar onde termina efectivamente o transporte dos bens [conforme previsto no artigo 1º, nº 2, alínea g), do Código do IVA].
6.50. Outra das condições essenciais (mas que não é referenciada no RIT e por isso entendemos que foi dada como cumprida), para a qualificação de uma operação como TIB é a de que o adquirente seja uma entidade registada, para efeitos de IVA, no Estado-membro de destino (conforme referido no ponto 6.46.3., supra) pelo que, para este efeito, o transmitente dos bens deverá recolher, em momento prévio à consumação da venda dos bens, todas as informações necessárias que lhe permitam confirmar que o registo do adquirente, para efeitos de IVA, se encontra em vigor, solicitando-lhe o seu número de identificação de IVA, impondo-se assim que o adquirente se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, regime que visa garantir que a AIB será tributada no Estado-membro de destino.[16] [17] [18]
6.51. Assim, a demonstração de que houve uma transmissão de bens e que esses bens foram expedidos ou transportados a partir do território nacional pelo vendedor, pelo adquirente ou por sua conta, com destino a um outro Estado-membro assume elevada importância, uma vez que dela depende a correcta não liquidação de imposto, bem como a dedução do imposto suportado a montante por parte do transmitente.
6.52. Uma vez que o conceito de transmissão de bens para efeitos de IVA assenta na transacção da coisa corpórea por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade, a prova do título jurídico de transmissão da propriedade (v.g., o documento que titula o contrato de compra e venda), pode afigurar-se insuficiente, sendo ainda necessário comprovar que o poder económico de disposição do bem (que, normalmente, coincide com a sua posse) foi transferido da esfera do vendedor para a esfera do adquirente.
6.53. Deste modo, a prova da verificação das condições a que se refere o artigo 14º, alínea a) do RITI, com vista à aplicação da isenção aí prevista, incumbe ao sujeito passivo vendedor, o qual deve ser capaz de comprovar todos os elementos exigidos naquele artigo, designadamente o transporte de bens para outro Estado-membro, sob pena da operação ser considerada localizada em território nacional e como tal sujeita internamente a imposto.
6.54. Ainda que no RITI não exista uma norma semelhante à estatuída no nº 8, do artigo 29º do Código do IVA (que impõe a obrigatoriedade de comprovar determinadas isenções referidas no artigo 14º daquele Código), está implícito no artigo 14º do RITI que a transacção só estará isenta se os bens saírem fisicamente do território nacional com destino a outro Estado-membro.[19] [20]
6.55. No âmbito da comprovação dos pressupostos da isenção, o nº 4 do Ofício-Circulado nº 30009, de 10 de Fevereiro de 1999, estabelece que para efeitos de “(…) comprovar a verificação dos pressupostos da isenção (…) será de admitir que a prova da saída dos bens do território nacional possa ser efectuada (…) nomeadamente através das seguintes possibilidades alternativas”:[21]
6.55.1. “Os documentos comprovativos do transporte, os quais, consoante o mesmo seja rodoviário, aéreo ou marítimo, poderão ser, respectivamente, a declaração de expedição (CMR), a carta de porte (AWB) ou o conhecimento de embarque (B/L)”;
6.55.2. “Os contratos de transporte celebrados”;
6.55.3. “As facturas das empresas transportadoras”;
6.55.4. “As guias de remessa”;
6.55.5. “A declaração, no Estado membro de destino dos bens, por parte do respectivo adquirente, de aí ter efectuado a correspondente aquisição intracomunitária”.
6.56. Refira-se que, no que diz respeito às TIB em que o transporte dos bens é efectuado pelo adquirente ou por conta deste, poderão colocar-se problemas específicos no que diz respeito à prova do transporte ou expedição.[22] [23]
6.57. Com efeito, uma guia de transporte ou um documento equivalente apresentado aquando da retirada das mercadorias ou mesmo um compromisso formal subscrito pelo comprador, não estabelecem a realidade do transporte pelo que, nestas condições, os fornecedores exprimem muitas vezes o receio de ver a sua responsabilidade posta em causa e a isenção da transmissão rejeitada por ocasião de um controlo mas, face a esta problemática, parece ser entendimento assente da Requerida que a questão pode ser ultrapassada, devendo para o efeito, o fornecedor solicitar ao adquirente dos bens, uma declaração em que este certifique que o transporte vai ser por si efectuado e qual o destino dos bens, ou qualquer outro documento que considere idóneo para o efeito.[24]
6.58. Assim, quando o bem objecto de transmissão não é expedido ou transportado para outro Estado membro pelo fornecedor, mas pelo adquirente ou por um terceiro por conta deste, em circunstâncias em que o direito de dispor do bem como proprietário é transferido para o adquirente no Estado membro de entrega e cabe a este expedir ou transportar o bem para fora daquele Estado membro, o fornecedor deve assegurar-se que os elementos que detém, recebidos do adquirente, são suficientes para provar a sua intervenção numa transmissão intracomunitária.
6.59. Não obstante, no caso, os SIT apenas firmaram que foi exibido o CMR pela Requerente, não tendo tecido considerações sobre quem transportou o bem para Espanha e o depoimento da testemunha inquirida nesta matéria também não foi consistente e, por isso, não é aqui relevado.
6.60. Por outro lado, a indicação do número de identificação fiscal/número de IVA é um elemento fundamental nas transacções efectuadas entre sujeitos passivos de diferentes Estados-membros permitindo, no âmbito do sistema VIES, dar a conhecer à administração fiscal do país de destino dos bens o valor das aquisições intracomunitárias sujeitas a tributação e a identificação dos adquirentes nele registados para efeitos de IVA.[25]
6.61. Tendo em conta que o conceito de sujeito passivo das aquisições intracomunitárias não coincide com o conceito de sujeito passivo do IVA nas transmissões de bens e das prestações de serviços, não bastaria impor a condição do registo para efeitos deste imposto, sendo necessário (de modo a garantir que a não tributação no país de origem corresponde a tributação no país de destino dos bens) que o adquirente se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias.
6.62. Assim, por forma a assegurar que a qualidade do adquirente da TIB não irá obstar à qualificação da operação como isenta, o transmitente deverá (i) obter o número de identificação fiscal/número de IVA do adquirente, (ii) certificar-se de que o referido nº pertence ao país de origem do adquirente e (iii) proceder à validação do número no sistema VIES, comprovando que o adquirente é um sujeito passivo de IVA.[26]
6.63. Sem prejuízo de outras obrigações acessórias gerais, previstas no nº 1 do artigo 29º do Código do IVA, os sujeitos passivos que efectuem TIB devem:
6.63.1. Emitir obrigatoriamente uma factura por cada TIB efectuada a qual, para além dos elementos previstos no artigo 36º, nº 5, do Código do IVA, deve conter (i) o número de identificação fiscal do sujeito passivo do imposto, precedido do prefixo 'PT' e o número de identificação de IVA do destinatário ou adquirente, que deve incluir o prefixo do Estado-membro que o atribuiu, (ii) bem como o local de destino dos bens [artigos 23º, nº 1, alínea b), e 27º, nº 5, do RITI];[27]
6.63.2. Enviar uma declaração recapitulativa das transmissões de bens isentas nos termos do artigo 14º do RITI [artigo 23º, nº 1, alínea c), do RITI)];
6.63.3 Submeter a informação estatística das operações através do Intrastat.
6.64. Ora, nenhuma destas obrigações foi questionada e/ou posta em causa pelos SIT no RIT.
6.65. Em resumo, decorre do acima exposto que as TIB beneficiam de isenção se, cumulativamente:
6.65.1. Os bens forem expedidos ou transportados do território nacional para o Estado membro de destino; e
6.65.2. No Estado-membro de destino, o adquirente (i) for sujeito passivo do imposto [não relevando para o efeito a sua natureza (pessoa singular ou colectiva)], (ii) tenha utilizado o número de identificação de IVA para efectuar a aquisição e (iii) seja abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens.
6.66. Em termos práticos, para que a isenção não seja colocada em causa, será necessário o cruzamento de informações provenientes dos vários documentos exigidos, cabendo, assim, ao transmitente a escolha do método mais apto a fundamentar a isenção mas, sob pena de violação do princípio da proporcionalidade, as administrações fiscais não se encontram legitimadas a sobrecarregar o ónus da prova que incumbe aos sujeitos passivos que efectuam TIB, no sentido em que não é expectável que o transmitente produza mais prova do que aquela que razoavelmente se encontra ao seu alcance no âmbito de uma transacção comercial e é exigida pela legislação aplicável.[28]
6.67. No que diz respeito ao ónus da prova, cite-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no âmbito do processo nº 04132/10, de 29 de Março de 2011, no sentido de que “cabe à AT efectuar a prova para desconsiderar os elementos declarados pelos contribuintes nas respectivas declarações de rendimentos, regular e dentro do respectivo prazo entregues, tendo em conta a presunção de veracidade e de boa-fé das mesmas, e ao contribuinte infirmar os indícios ou factos pela mesma recolhidos e em que faz estear a respectiva liquidação”.
6.68. No caso em análise, em Requerida suportou as correcções efectuadas, neste âmbito, em consequência da inspeção, nas conclusões descritas no relatório de inspeção, acima já identificado (ponto 5.13.2.), nos termos do qual se refere que:
6.69.1. “(…) o Administrador da sociedade espanhola C..., SL, é o Sr. D..., tendo uma participação de 100% no capital da mesma”;
6.69.2. “A sociedade espanhola não possui estrutura para o exercício da sua actividade”;
6.69.3. “Assim, não nos restam quaisquer dúvidas que o referido bem não saiu do território nacional, pelo que se terá de proceder à liquidação do respetivo IVA”;
6.70. Ora, face aos elementos acima descritos, a informação recolhida pela Autoridade Tributária nacional, ao abrigo de instrumento de cooperação transfronteiriça, não é por si só suficiente para concluir que o bem alienado à sociedade espanhola não tenha saído do território nacional porquanto é suficiente para levantar essa suspeição e fazer cair a presunção de veracidade de que gozam os elementos declarados pela Requerente, não tendo os SIT sequer demonstrado que a Requerente sabia, ou devia ter conhecimento, de alegadas irregularidade na sociedade adquirente.
6.71. E, quanto à prova que o sujeito passivo deveria ter fornecido aos SIT, para efeitos de beneficiar da isenção de IVA, compete aos Estados-membros fixar (em conformidade com o disposto no artigo 131° da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro) as condições em que isentam as entregas intracomunitárias para garantir a aplicação correcta e simples das ditas isenções e prevenir eventuais fraudes, evasões e abusos.[29]
6.72. Não obstante, no exercício dos seus poderes, os Estados-membros devem respeitar os princípios gerais de direito que fazem parte da ordem jurídica da União Europeia, entre os quais figuram, designadamente, os princípios da segurança jurídica e da proporcionalidade.
6.73. Por outro lado, e ainda em matéria de análise dos requisitos determinantes da aplicabilidade da isenção, prevista no artigo 14º, alínea a) do RITI, às transmissões de bens de modo a que estas qualifiquem, para efeitos de IVA, como TIB e, nessa medida, possam ser consideradas isentas deste imposto no Estado-membro de origem e de expedição dos bens, verificou-se que, quanto à demonstração da saída efectiva do bem de território nacional (expedição do bem de Portugal para Espanha), que os SIT afirmaram no RIT que “é verdade que o sujeito passivo português apresentou o CMR relativo ao transporte do bem de Portugal para Espanha, mas este só por si não é suficiente para fazer prova de que realmente o bem saiu do território nacional”.
6.74. Em sede arbitral, a Requerida não contestou a alegação pela Requerente e a confirmação pelos SIT da apresentação do referido CMR, limitando-se a referi que “atenta a prova produzida no relatório final de inspeção, nomeadamente, a demonstração de que o bem em causa não saiu do território nacional, a AT procedeu (…) às devidas correções e (…) à liquidação adicional do IVA considerado em falta”.
6.75. Ora, no caso, e atento o acima exposto, não pode ser expectável que a Requerente produza mais prova do que aquela que razoavelmente se encontra ao seu alcance no âmbito de uma transacção comercial e é exigida pela legislação aplicável.
6.76. Nestes termos, face ao acima exposto, e tendo em consideração as conclusões dos SIT, no RIT, de que o bem transmitido não saiu do território nacional, considerando as informações obtidas ao abrigo do Convénio já referido e tendo em consideração que a Requerente apresentou o respectivo CMR em sede de procedimento inspectivo (como prova de saída do referido bem, do território nacional com destino a Espanha), não é legítimo comprometer-se a aplicabilidade da isenção de IVA prevista no artigo 14º do RIT, até porque nenhum dos factos invocados pelos SIT têm de ser, em teoria, do conhecimento da Requerente, não são em si mesmo requisitos do artigo 14º do RIT e não conduzem, de todo, à conclusão de que o bem não saiu do território nacional (como concluíram os SIT).
6.77. Dado que na análise efectuada pelos SIT no RIT mais nenhum dos requisitos previstos no artigo 14º do RITI foi analisado, fica assim limitada a análise deste Tribunal Arbitral quanto ao cumprimento, pela Requerente, dos demais requisitos enunciados no referido artigo do RITI, no que diz respeito à transmissão de bens em análise.
6.78. Assim, será afirmativa a resposta a dar à questão acima formulada nos pontos 6.4.3. e 6.34., no sentido de que a Requerente cumpriu com a totalidade dos requisitos (de natureza cumulativa) previstos na alínea a), do artigo 14º do RITI, pelo que pode a transmissão de bens efectuada para o cliente C..., S.L., em 2016, ser considerada isenta de IVA, devendo por isso ser anuladas as liquidações de imposto e juros incidente sobre a correção em análise, com as consequências daí decorrentes, nomeadamente em sede de processo de contraordenação e em sede de processo de execução fiscal instaurados à Requerente, nos termos do disposto no artigo 24º, nº 1 do RJAT.
Da responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais
6.79. De harmonia com o disposto no artigo 22º, nº 4, do RJAT, “da decisão arbitral proferida pelo tribunal arbitral consta a fixação do montante e a repartição pelas partes das custas directamente resultantes do processo arbitral”.
6.80. Em termos gerais, de acordo com o disposto no artigo 527º, nº 1 do CPC (ex vi 29º, nº 1, alínea e) do RJAT), deve ser estabelecido que será condenada em custas a Parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.
6.81. Neste âmbito, o nº 2 do referido artigo concretiza a expressão “houver dado causa”, segundo o princípio do decaimento, entendendo que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
6.82. Ora, tendo em consideração o acima exposto, a responsabilidade em matéria de custas arbitrais deverá ser imputada exclusivamente à Requerida.
7. DECISÃO
7.1. Nestes termos, decidiu este Tribunal Arbitral Singular:
7.1.1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, anulando-se os actos de liquidação de IVA e juros impugnados, com as consequências daí decorrentes;
7.1.2. Condenar a Requerida no pagamento das custas do processo.
Valor do processo: Tendo em consideração o disposto nos artigos 306º, nº 2 do Código de Processo Civil (CPC), artigo 97º-A, nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em EUR 5.407,73.
Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas do Processo Arbitral em EUR 612,00, a cargo da Requerida, de acordo com o artigo 22º, nº 4 do RJAT.
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Notifique-se.
Lisboa, 5 de Fevereiro de 2020
O Árbitro,
Sílvia Oliveira
[1] A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto transcrições efectuadas.
[2] Neste sentido, cita a Requerente Acórdão do STA (processo nº 01460/17) de 19-09-2018.
[3] Refira-se, neste âmbito, que a matéria de IRC foi objecto de processo autónomo instaurado também no CAAD.
[4] Verifica-se uma diferença imaterial de EUR 0,20, a mais, relativamente ao montante liquidado referido no ponto 5.17.
[5] Não obstante, a jurisprudência tem entendido que “(…) essa obrigação se impunha de igual forma antes da alteração legislativa verificada em 2005” porquanto se pode concluir “(…) com natural evidência que o legislador impunha já (…) que os actos praticados no procedimento inspectivo, mormente aqueles que determinam a realização da acção inspectiva e que lhe fixam o fim, o âmbito e a extensão, bem como aqueles que respeitam à prática de actos de inspeção, devem ser previamente notificados à entidade que se encontra a ser inspecionada”. Com efeito, como pode ler-se no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), de 19-09-2018, citado pela Requerente (processo nº 01460/17), “(…) a consagração expressa daquela obrigação de notificação introduzida pela Lei n.º 50/2005, de 30 de Agosto, não apresenta verdadeiro carácter inovatório, vindo apenas traduzir em letra de lei aquele que era já o entendimento do legislador que se extraía da lógica e da coerência sistemática do RCPIT, da LGT e da CRP. Assim o era ao abrigo dos princípios da boa-fé [arts. 266º, n.º 2 da CRP e 6.º-A do Código de Procedimento Administrativo (…)] e da colaboração [arts. 55º e 59º da LGT], (…). E mais. Também o próprio princípio da legalidade [arts. 266º, n.º 2 da CRP e 55º da LGT] sempre imporia à Administração Tributária uma actuação bem diferente daquela que empreendeu no presente caso”.
[6] No mesmo sentido, vide Acórdão do STA nº 02243/16.6BEBRG, de 04-12-2019, nos termos do qual se afirma que “a falta de notificação prévia ao sujeito passivo inspeccionado do despacho que determinou o alargamento do âmbito da inspeção, inexistindo motivo legal para diferir esse notificação, constitui violação de formalidade legal essencial, porque estruturante do procedimento inspectivo, a determinar a invalidade dos ulteriores termos procedimentais, designadamente da liquidação que neles se suporta (cfr. art. 163.º do Código de Procedimento Administrativo, aplicável ex vi do art. 4.º do RCPITA)”.
[7] Neste sentido, vide jurisprudência de Tribunais Superiores citada nesta decisão arbitral.
[8] Neste sentido, vide Acórdão do STA nº 01101/15, de 15-06-2016, acima já citado.
[9] Na nossa análise, seguiremos de perto o teor da Decisão Arbitral nº 228/2015-T, de 29 de Novembro, da signatária desta decisão.
[10] O disposto no artigo 7º do RITI (operações assimiladas a transmissões de bens a título oneroso) assume especial importância na delimitação das operações qualificáveis como TIB na medida em que, por um lado, assimila outras operações ao conceito de transmissão intracomunitária de bens e, por outro, procede a uma delimitação negativa de algumas operações não enquadráveis no conceito.
[11] Estas situações consubstanciam simples movimentos de bens que não dão lugar a TIB, podendo, em alguns casos, originar a tributação a título de transmissões de bens internas ou de prestações de serviços.
[12] Não obstante conferir ao transmitente o direito à dedução do IVA suportado a montante para a respectiva realização, evitando-se assim a dupla tributação de uma operação que, do ponto de vista económico, constitui um todo, e garantindo-se a neutralidade do imposto.
[13] Note-se que os SIT não puseram em causa o cumprimento dos requisitos enunciados nos pontos 6.46.1. e 6.46.3. aqui indicados.
[14] Ora, neste âmbito, refira-se que o conceito de expedição contido nesta norma legal não se escontra definido nem na Sexta Directiva (Directiva 77/388/CE do Conselho de 17 de Maio de 1977), nem na na Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro (a qual reformulou a Sexta Directiva), nem no próprio Código do IVA.
[15] Contudo, o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) entendeu, no âmbito do processo Teleos (C-409/04), conforme Acórdão de 27 de Setembro de 2007, que o conceito de expedição deve ser interpretado no sentido de que a aquisição intracomunitária de um bem só se verifica e a isenção da entrega intracomunitária só é aplicável quando (i) o direito de dispor do bem como proprietário tenha sido transferido para o adquirente, (ii) o fornecedor prove que esse bem foi expedido ou transportado para outro Estado-membro e que, na sequência dessa expedição ou desse transporte, o mesmo saiu fisicamente do território do Estado-membro de entrega.
[16] Caso o adquirente não forneça o referido número e o transmitente não o consiga obter por outros meios, este deverá presumir que a entidade não se encontra registada, liquidando o imposto devido, uma vez que a TIB em causa não preenche todas condições para ser isenta. Contudo, pode por vezes suceder que o adquirente se encontre registado, para efeitos de IVA, em mais do que um Estado-membro e, neste caso, o transmitente deverá certificar-se que o número de IVA fornecido pelo adquirente pertence ao Estado-membro de destino da TIB.
[17] Note-se que, no caso da entidade adquirente estar abrangida por uma isenção subjectiva do imposto (v.g., no caso de ser uma pessoa colectiva de direito público que age no exercício dos seus poderes de autoridade), a TIB não será isenta, devendo o transmitente liquidar o respectivo IVA.
[18] Para garantir que a TIB será considerada uma operação isenta, nos termos do disposto no RITI, não basta que essa operação seja, em abstracto, qualificada como TIB, será também necessário que o vendedor seja capaz de provar que os pressupostos de aplicabilidade da isenção se verificaram no caso concreto.
[19] “Assim, perante a falta de norma que na legislação do IVA indique os meios de prova considerados idóneos para comprovar a verificação dos pressupostos da isenção prevista na alínea a) do artigo 14º do RITI, parece ser admissível que tal comprovação possa ser efectuada recorrendo aos meios gerais de prova alternativos, entendimento este que se afigura em consonância com a doutrina administrativa que, nesta matéria (…)”, tem sido divulgada pela Autoridade Tributária.
[20] Nesta matéria vide Informação Vinculativa emitida no âmbito do processo nº 2475, de 29 de Setembro de 2011.
[21] Neste âmbito, refira-se que o TJUE já defendeu ser admissível, para este efeito, qualquer meio de prova considerado idóneo, para além da apresentação do respectivo documento de transporte, posição que a Autoridade Tributária veio também consagrar no âmbito do Ofício-Circulado nº 30009, de 10 de Fevereiro de 2009, acima já referido (sublinhado nosso).
[22] Relevam aqui as situações em que, v.g., o adquirente efectua o levantamento dos bens directamente no estabelecimento do vendedor, com o seu próprio meio de transporte ou contratando um terceiro para o efeito, as transmissões de bens ao abrigo dos Incoterms FOB (“free on board”) e FOT (“free on truck”) e, entre outras, os casos em que os bens, após terem saído das instalações do vendedor, são transportados para uma plataforma logística situada no mesmo território, partindo mais tarde para o Estado-membro de destino sem que o vendedor tenha a possibilidade de confirmar a sua partida do território nacional e chegada ao território de destino (as denominadas transacções “takeaway”).
[23] Nesta matéria, conforme referido no Relatório da Comissão (sobre o funcionamento do regime transitório do IVA), sempre que o comprador toma a seu cargo o transporte pelos seus próprios meios, o vendedor não pode aceitar unicamente a simples indicação que os bens vão efectivamente ser transportados com destino a um outro Estado-membro.
[24] Neste âmbito, conforme referido no Acórdão Euro Tyre Holding BV (C-430/09, de 16 de Dezembro de 2010), no que diz respeito à condição relativa à prova, na medida em que constitui uma das condições da isenção, importa notar que mesmo que incumba ao fornecedor demonstrar que o bem foi expedido ou transportado para outro Estado-membro, em circunstâncias em que o direito de dispor do bem como proprietário é transferido para o adquirente no território do Estado-membro de entrega (e em que cabe a este adquirente expedir ou transportar o bem para fora do Estado-membro de entrega), a prova que o fornecedor pode apresentar às autoridades fiscais depende essencialmente dos elementos que receber do adquirente para esse efeito. Todavia, ainda de acordo com o referido Acórdão, após o fornecedor ter cumprido as suas obrigações declarativas relativas à prova de uma entrega intracomunitária, e não tendo a obrigação contratual de expedição ou de transporte de bens para fora do Estado-membro de entrega sido cumprida pelo adquirente, é este último que deve ser considerado devedor do IVA nesse Estado-membro.
[25] O VIES (Sistema de Intercâmbio de Informações sobre o IVA) consiste num meio electrónico de transmissão de informações relativas ao registo do IVA das empresas registadas na UE. Os sujeitos passivos podem obter a confirmação da validade do número de IVA de um sujeito passivo de outro Estado-membro através daquele sistema, sendo aconselhável o arquivo do comprovativo de consulta da validade do número.
Além disso, as informações relativas às TIB são igualmente transmitidas através do sistema VIES entre as administrações dos Estados-membros.
[26] De notar que sendo o VIES um sistema actualizado pelas administrações fiscais de cada Estado-membro, regista por vezes erros e omissões que podem fazer com que alguns operadores válidos apareçam como inválidos no sistema e vice-versa.
[27] As facturas devem ser emitidas o mais tardar até ao 15º dia do mês seguinte àquele em que os bens foram colocados à disposição do adquirente, pelo valor total das transmissões de bens, ainda que tenham sido efectuados pagamentos ao sujeito passivo anteriormente à data da transmissão dos bens (artigo 27º, nºs 2 e 3, do RITI).
[28] Neste âmbito, cite-se o Acórdão VSTR (C-587/10) no qual o TJUE entendeu que o artigo 28°-C, A, alínea a), primeiro parágrafo, da Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que a Administração Fiscal de um Estado-Membro faça depender a isenção de Imposto sobre o Valor Acrescentado de uma entrega intracomunitária da transmissão, pelo fornecedor, do número de identificação para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado do adquirente, sob reserva, de que a recusa de conceder essa isenção não tenha por único fundamento a circunstância de essa obrigação não ter sido respeitada quando o fornecedor não possa, de boa-fé (e após ter tomado todas as medidas que lhe podem razoavelmente ser exigidas), transmitir esse número de identificação e transmita, por outro lado, indicações susceptíveis de demonstrar suficientemente que o adquirente é um sujeito passivo que age enquanto tal na operação em causa.
[29] O TJUE, através do Acórdão Mecsek-Gabona Kft (C-273/11), entendeu que num contexto de operações fraudulentas, o artigo 138°, n° 1 da referida Directiva 2006/112/CE deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que o direito à isenção de uma entrega intracomunitária seja recusado ao vendedor, caso se conclua, à luz de elementos objectivos, que este não cumpriu as obrigações que lhe incumbem em matéria de prova, ou que sabia ou deveria saber que a operação que efectuou estava implicada numa fraude cometida pelo adquirente e que não tinha tomado todas as medidas razoáveis ao seu alcance para evitar a sua própria participação nesta fraude (sublinhado nosso).