Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 65/2019-T
Data da decisão: 2019-10-11  IRS  
Valor do pedido: € 1.661,35
Tema: IRS - Mais-valias imobiliárias. Não residentes. Reenvio prejudicial ao TJUE.
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DECISÃO ARBITRAL

 

I.             RELATÓRIO

Em 4 de fevereiro de 2019, o contribuinte A..., sujeito passivo com o NIF ..., de nacionalidade espanhola e residente em ..., ..., ...– Bélgica (doravante designado por Requerente), veio, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT) e 1.º e 2.º, da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março (Portaria de vinculação), requerer a constituição de Tribunal Arbitral, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante AT ou Requerida), informando não pretender utilizar a faculdade de designar árbitro.

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exm.º Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT, e, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou a signatária como árbitro do tribunal arbitral singular, encargo aceite no prazo aplicável, sem oposição das Partes.

 

A. Objeto do pedido:

O Requerente pretende a declaração de ilegalidade e a anulação da liquidação de IRS n.º 2018..., da quantia de € 3 151,40 e da liquidação de juros compensatórios n.º 2018... a ela associada, no valor de € 171,29, referentes ao ano de 2016, no montante global de € € 3 322,69, bem como a sua substituição por outra, de valor equivalente a 50% da primeira, atribuindo ao pedido o valor económico de € 1 661,35.

 

Síntese da posição das Partes

a.            Do Requerente:

O Requerente alega, em súmula, que na qualidade de não residente alienou, em 2016, a parte de um imóvel situado em território nacional que integrou o seu quinhão hereditário nas heranças de seus pais, abertas em 2014 e em 2015, respetivamente, tendo a AT calculado as mais-valias tributáveis pela totalidade da diferença entre o valor de aquisição e o valor de realização, com o que se não conforma.

 

Invoca o Requerente o tratamento diferenciado quanto à tributação das mais-valias provenientes da alienação onerosa de imóveis em função da residência fiscal do sujeito passivo, tributando os não residentes de forma diferente dos residentes em Portugal, violador do disposto no artigo 63.º, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, bem como do princípio da não discriminação previsto no artigo 18.º, do mesmo Tratado.

 

Considera o Requerente que mesmo após as alterações introduzidas pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro, com o objetivo de adequar o sistema tributário nacional à decisão proferida pelo Tribunal de Justiça da União Europeia no processo C-443/06, conhecida como Acórdão Hollmann, se mantém o efeito discriminatório decorrente da diferenciação dos regimes aplicáveis a residentes e a não residentes.

 

Termina o Requerente por formular o pedido de anulação da liquidação de IRS do ano de 2016 e a sua substituição por nova liquidação com base em 50% da mais-valia realizada, de que resultará o valor a pagar de € 1 661,35.

 

b.            Da Requerida:

Notificada nos termos e para os efeitos previstos no artigo 17.º, do RJAT, a AT apresentou Resposta na qual veio defender a legalidade e a manutenção do ato de liquidação objeto do presente pedido de pronúncia arbitral.

 

Defende a AT que a desconformidade da legislação nacional ao direito comunitário, assinalada pelo Acórdão C-443/06, do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJUE), de 11.10.2007, foi sanada com as alterações legislativas introduzidas ao artigo 72.º, do Código do IRS, pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12.

 

Que tais alterações, traduzidas no aditamento ao artigo 72.º, do Código do IRS, dos n.ºs 7 e 8 (atuais n.ºs 9 e 10), vieram permitir que os residentes noutro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal, pudessem optar pela tributação dos rendimentos de mais-valias por si auferidos, à taxa que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português, sendo a taxa determinada pelo somatório de todos os rendimentos, incluindo os obtidos fora deste território.

 

Que, em conformidade com aquelas alterações legislativas, a declaração Modelo 3, passou, a partir de 2009, a ter um campo para ser exercida opção pela taxa do artigo 68.º, do Código do IRS.

 

Que, no caso em apreço, o Requerente assinalou no quadro 8 B do Modelo 3 o campo 4 (não residente) e o campo 7 (pretende a tributação pelo regime geral aplicável aos não residentes); caso pretendesse ser tributado pela taxa do artigo 68.º, ou seja, como residente, era necessário ter preenchido os campos 9 (opção pelas taxas do artigo 68.º do Código do IRS) e 11 (total dos rendimentos obtidos no estrangeiro).

 

Que a alteração operada por via da introdução dos atuais n.ºs 9 e 10 do artigo 72.º, do Código do IRS, veio permitir que, tanto residentes como não residentes, beneficiem do regime previsto no artigo 43.º, n.º 2 (consideração do saldo da mais-valia em apenas 50% do seu valor), do mesmo Código, desde que optem pelo englobamento dos rendimentos obtidos tanto em Portugal como fora deste território.

 

Considerando que o quadro legal em vigor no ano a que respeitam os rendimentos auferidos pelo Requerente já não é aquele que existia à data das situações analisadas pelo TJUE no Acórdão C-443/06, de 11/10/2007 (IRS de 2003) e no C-184/18, de 6/09/2018 (IRS de 2007), vem a AT pedir que, caso subsistam dúvidas sobre a compatibilidade do regime de tributação das mais-valias em que se baseou a liquidação objeto do pedido de pronúncia arbitral com o direito da União Europeia, e proceda ao reenvio prejudicial da questão ao TJUE, nos termos do artigo 267.º, do TFUE.

 

- * - * -

Pelo despacho arbitral de 23.05.2019, foi dispensada a reunião a que se refere o artigo 18.º, do RJAT, considerando-se não justificado o reenvio prejudicial, face às “RECOMENDAÇÕES” do Tribunal de Justiça da União Europeia relativas à apresentação de processos prejudiciais (2012/C 338/01)”, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia C 338/1, de 06.11.2012.

 

Por requerimento de 29.05.2019, veio a AT requerer a suspensão da instância, por se encontrar pendente decisão de reenvio prejudicial em processo com objeto idêntico ao dos autos.

 

No silêncio do Requerente, notificado para se pronunciar sobre o teor do requerimento da Requerida, e no convencimento do tribunal arbitral de não se encontrarem reunidos os pressupostos para suspensão da instância, foi determinado o prosseguimento do processo com alegações escritas, no prazo simultâneo de 20 (vinte) dias, nos termos do artigo 91.º-A, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, sendo fixada a data de 14 de outubro de 2019 para prolação da decisão arbitral.

 

Ambas as Partes produziram alegações escritas, reiterando as posições iniciais.

 

 

II. SANEAMENTO

1.            O tribunal arbitral singular é competente e foi regularmente constituído em 16 de abril de 2019, na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro;

2.            As partes têm personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas;

3.            A AT está legalmente representada, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, aplicando-se ao Requerente, que também usa o nome de B..., o disposto no n.º 2 do artigo 6.º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na redação em vigor à data do pedido, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, tendo a assinatura sido confrontada com a constante do passaporte emitido pelo Reino de Espanha, com o n.º ... – R..., com cópia junta aos autos, que se dá como reproduzida;

4.            O processo não padece de vícios que o invalidem;

5.            Não foram invocadas exceções que ao tribunal arbitral cumpra apreciar e decidir.

 

 

III.          FUNDAMENTAÇÃO

III.1 MATÉRIA DE FACTO

A – Factos provados:

1.            No período a que respeita a produção do facto tributário (2016), o Requerente residia em ..., ..., ...– Bélgica (facto admitido por acordo das Partes);

2.            Em 09.10.2018, o Requerente apresentou a declaração modelo 3 de IRS referente aos rendimentos auferidos em território nacional no ano de 2016, registada sob o n.º..., integrando o rosto, no qual declarou a qualidade de não residente, com residência na “União Europeia ou no Espaço Económico Europeu”, optando pela tributação pelo regime geral (quadro 8 B, campos 04 e 07, respetivamente) e um anexo G (com cópia junta ao pedido de pronúncia arbitral, adiante, p.p.a., que se dá como reproduzida);

3.            No quadro 4 do anexo G à declaração modelo 3 de IRS do ano de 2016, o Requerente declarou (cópia junta ao p.p.a., que se dá como reproduzida):

a.            A alienação, pelo valor de € 49 750,00, de 50% da fração I do prédio urbano inscrito sob o artigo ... da freguesia ..., em maio de 2016;

b.            A aquisição de uma parte do mesmo prédio, em setembro de 2014, pelo valor de € 11 806,66;

c.            A aquisição de outra parte do imóvel identificado, em junho de 2015, pelo valor de € 23 613,34;

d.            Despesas e encargos suportados, da quantia global de € 3 075,00;

4.            Em 12 de outubro de 2018, a AT emitiu em nome do Requerente a liquidação de IRS n.º 2018..., referente aos rendimentos do ano de 2016, pelo valor e € 3 322,69, sendo € 3 151,40 de imposto e € 171,29 de juros compensatórios (cópia de certidão da liquidação, junta ao p.p.a., que se dá como reproduzida);

5.            A referida liquidação resultou da aplicação da taxa de 28% à matéria coletável de € 11 255,00, equivalente à totalidade da mais-valia realizada;

6.            Foi emitida a nota de cobrança n.º 2018..., com data limite de pagamento voluntário em 26.11.2018 (cópia de certidão da liquidação, junta ao p.p.a., que se dá como reproduzida).

 

B – Factos não provados:

Não se provou que o Requerente tivesse procedido ao pagamento da liquidação impugnada.

 

C – Fundamentação da matéria de facto provada e não provada:

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada.

 

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. o artigo 596.º, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 

Os factos dados como provados e como não provados decorreram da análise crítica dos documentos juntos ao pedido de pronúncia arbitral e da posição assumida pelas Partes nos respetivos articulados, uma vez que a AT não juntou processo administrativo, que declarou inexistente.

 

 

III.2 DO DIREITO

1.            A questão decidenda:

A questão a decidir nos presentes autos consiste em saber se o disposto no n.º 2 do artigo 43.º, do Código do IRS, no qual se determinava, à data do facto tributário, que “O saldo referido no número anterior, respeitante às transmissões efetuadas por residentes previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, positivo ou negativo, é apenas considerado em 50 % do seu valor”, é aplicável na determinação dos rendimentos de mais-valias imobiliárias obtidos por não residentes.

 

Trata-se de uma questão largamente tratada pela jurisprudência nacional e comunitária, sobre a qual se pronunciou o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) no âmbito do processo C-443/06, de 11/10/2007 (Acórdão Hollmann), em data anterior às alterações introduzidas ao artigo 72.º, do Código do IRS, pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12 (Orçamento do Estado para 2008), tendo decidido que “O artigo 56.° CE [atual artigo 63.º, TFUE] deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal, que sujeita as maisvalias resultantes da alienação de um bem imóvel situado num EstadoMembro, no caso vertente em Portugal, quando essa alienação é efectuada por um residente noutro EstadoMembro, a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as maisvalias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel. (disponível em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/HTML/?uri=CELEX:62006CJ0443&from=PT).

 

O aditamento dos n.ºs 7 e 8 (atuais n.ºs 9 e 10) ao artigo 72.º, do Código do IRS, pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12, veio, da perspetiva da Requerida, compatibilizar o regime de tributação dos rendimentos de mais-valias auferidos pelos sujeitos passivos não residentes com o direito da União Europeia, não contrariando os princípios da não discriminação e da liberdade de circulação de capitais, a que se referem os artigos 18.º e 63.º, do TFUE, respetivamente.

 

No ano a que respeitam os rendimentos que originaram a liquidação ora impugnada, era a seguinte a redação dos n.ºs 1, alínea a), 9 e 10, do artigo 72.º, do Código do IRS:

 

“Artigo 72.º - Taxas especiais

1 - São tributados à taxa autónoma de 28 %:

a) As mais-valias previstas nas alíneas a) e d) do n.º 1 do artigo 10.º auferidas por não residentes em território português que não sejam imputáveis a estabelecimento estável nele situado;

(…)

9 - Os residentes noutro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal, podem optar, relativamente aos rendimentos referidos nas alíneas a) e b) do n.º 1 e no n.º 2, pela tributação desses rendimentos à taxa que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português.

10 - Para efeitos de determinação da taxa referida no número anterior são tidos em consideração todos os rendimentos, incluindo os obtidos fora deste território, nas mesmas condições que são aplicáveis aos residentes.

(…)”

 

É sobre o regime decorrente da conjugação das normas transcritas com as contidas nos artigos 9.º, n.º 1, alínea b), 10.º, n.º 1, alínea a), 43.º, n.º 2 e 68.º, todos do Código do IRS, na redação em vigor à data dos factos, que a AT pretende a apreciação do TJUE, uma vez que este Tribunal da UE ainda se não pronunciou sobre o mesmo, no atual quadro legislativo.

 

Contudo, tendo em consideração as “RECOMENDAÇÕES” do Tribunal de Justiça da União Europeia à atenção dos órgãos jurisdicionais nacionais, relativas à apresentação de processos prejudiciais (2012/C 338/01)”, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia C 338/1, de 06.11.2012, de que “(…) um órgão jurisdicional cujas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial em direito interno é obrigado a submeter esse pedido ao Tribunal, exceto quando já exista jurisprudência na matéria (e quando o quadro eventualmente novo não suscite nenhuma dúvida real quanto à possibilidade de aplicar essa jurisprudência ao caso concreto) ou quando o modo correto de interpretar a regra jurídica em causa seja inequívoco”, entendeu o tribunal arbitral não se encontrarem reunidos, no caso concreto, os pressupostos de obrigatoriedade de reenvio prejudicial para o TJUE.

 

Efetivamente, já a jurisprudência judicial e arbitral se pronunciaram sobre situações idênticas à dos autos, ocorridas em momento posterior ao das alterações legislativas aportadas ao artigo 72.º, do Código do IRS, pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12, em sentido contrário ao aqui defendido pela AT.

 

Cite-se, em primeiro lugar, o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo em 20.02.2019, no processo n.º 0901/11.0BEALM 0692/17, disponível em http://www.dgsi.pt/.

 

Versou o referido Acórdão sobre recurso interposto pela AT da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou parcialmente procedente impugnação judicial de liquidação de IRS do ano de 2010, determinando a sua anulação em 50%. Consta do respetivo sumário:

 

“I - Por imperativo constitucional as disposições do Tratado que rege a União Europeia prevalecem sobre as normas de direito ordinário nacional, nos termos definidos pelos órgãos de direito da União, desde que respeitem os princípios fundamentais do Estado de direito democrático. Nos termos do art. 8.º, n.º 4, da CRP «as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático».

II - Tendo Portugal competência para legislar quanto ao imposto sobre o rendimento, por tal não ser matéria de competência exclusiva da UE, não pode incluir nessa regulamentação normas que, em concreto, sejam violadoras dos Tratados, na interpretação que deles faça, como fez, o Tribunal de Justiça da UE.

III - O acto impugnado, que aplicou o referido art. 43.º, n.º 2 do CIRS, incompatível com o referido art. 56.º do Tratado que instituiu a Comunidade Europeia, enferma de vício de violação deste último normativo, o que consubstancia ilegalidade, que justifica a sua anulação (artº 135.º do Código de Procedimento Administrativo).”.

 

Cabe igualmente referir, entre outras, a decisão arbitral proferida em 08.04.2019, no processo n.º 600/2018-T, referente a mais-valias imobiliárias auferidas por não residente, disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes, em cuja fundamentação, para além do mais, se lê o seguinte:

 

“Assim, o que essencialmente releva para este efeito é saber se existe ou não uma discriminação negativa na aplicação aos Requerentes do regime que lhes foi aplicado.

O regime previsto por defeito (na falta de opção) no n.º 1 do artigo 72.º é mais oneroso para os não residentes do que para os residentes, pois enquanto a taxa máxima aplicável às mais-valias realizadas por residentes é de 24% do seu valor (taxa máxima de 48% prevista no artigo 68.º, aplicável a 50% do saldo das mais-valias), a taxa prevista no n.º 1 do artigo 72.º do CIRS é de 28%, aplicável à totalidade do saldo.

(…)

Assim, é seguro que o regime de tributação a taxa liberatória previsto no artigo 72.º do CIRS, na redacção vigente em 2017, é incompatível com o referido artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, pois torna a transferência de capitais menos atractiva para os não residentes e constitui uma restrição aos movimentos de capitais proibida pelo Tratado.

(…)

O facto de actualmente este regime poder ser afastado pelos sujeitos passivos, se manifestarem uma opção, não afasta a discriminação negativa, pois é nele imposta uma obrigação de opção que não é extensiva aos residentes.”.

 

Aderindo à jurisprudência citada, com a qual se está de acordo, também no caso dos autos, ainda que o Requerente não tenha optado pelo regime de tributação a que se referem os n.ºs 9 e 10 do artigo 72.º, do Código do IRS, se conclui pela ilegalidade da liquidação de IRS do ano de 2016, nos termos em que foi efetuada, ou seja, tendo por base a totalidade da mais-valia apurada e não apenas 50% do seu valor, nos termos do n.º 2 do artigo 43.º, do referido Código.

 

Ilegalidade que justifica a anulação parcial da liquidação de IRS n.º 2018..., conforme o artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 29.º, n.º 1, alínea d), do RJAT, em 50% do respetivo montante, com as demais consequências legais.

 

 

IV. DECISÃO

Com base nos fundamentos de facto e de direito acima enunciados e, nos termos do artigo 2.º do RJAT, decide-se em, julgando inteiramente procedente o presente pedido de pronúncia arbitral, declarar a ilegalidade da liquidação de IRS n.º 2018..., referente ao ano de 2016, determinando a sua anulação parcial, em 50% do respetivo valor.

 

VALOR DO PROCESSO: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.ºs 1 e 2, do

CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 1 661,35 (mil, seiscentos e sessenta e um euros e trinta e cinco cêntimos).

 

CUSTAS: Calculadas de acordo com o artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e da Tabela I a ele anexa, no valor de € 306,00 (trezentos e seis euros), a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 11 de outubro de 2019.

 

O Árbitro,

/Mariana Vargas/

 

Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do artigo 131.º do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do DL 10/2011, de 20 de janeiro.

 

A redação da presente decisão rege-se pelo acordo ortográfico de 1990.