Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 121/2019-T
Data da decisão: 2019-09-23  IMI  
Valor do pedido: € 8.867,10
Tema: IMI – Declaração de prédios devolutos e majoração de taxa.
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DECISÃO ARBITRAL

 

I – RELATÓRIO

 

A..., pessoa jurídica canónica, titular do cartão de pessoa coletiva n.º..., com sede na ..., ...-... ..., apresentou em 22/02/2019, pedido de constituição de tribunal e de pronúncia arbitral, no qual solicita a apreciação da legalidade do indeferimento da reclamação graciosa  n.º ...2019... e, em termos finais, das liquidações de  Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI)  números 2014..., 2015..., 2016... e 2017..., porquanto entende que as liquidações são ilegais por  falta de fundamentação e erro sobre os pressupostos de facto e de direito, no segmento da majoração da taxa.

 

O Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), designou em 16/04/2019 como árbitro, Francisco Nicolau Domingos.

 

No dia 08/05/2019 ficou constituído o tribunal arbitral.

 

Cumprindo a previsão do artigo 17.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (RJAT) foi a Requerida em 08/05/2019 notificada para, querendo, apresentar resposta, solicitar a produção de prova adicional e juntar o Processo Administrativo (PA) aos autos.

Em 11/06/2019 a Requerida apresentou a sua resposta, na qual invoca a incapacidade judiciária e a ilegitimidade do Requerente; a intempestividade do pedido de pronúncia arbitral; a impropriedade do meio processual e a incompetência do tribunal arbitral quanto: à falta de audição prévia no procedimento de declaração de prédios devolutos  e à falta de fundamentação do ato de indeferimento da reclamação graciosa, pugnando, a final,  pela manutenção das liquidações na ordem jurídica.

O Requerente no dia 24/06/2019 respondeu à matéria de exceção alegada pela Requerida, após despacho com tal objeto.

Considerando que não foi solicitada a produção de qualquer prova, não se vislumbrou necessário convidar as partes a aperfeiçoarem as suas peças processuais e  a matéria de exceção pode ser conhecida na decisão arbitral, o tribunal em 09/07/2019,  determinou, ao abrigo do princípio da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo e na determinação das regras a observar com vista à obtenção, em prazo razoável, de uma pronúncia de mérito sobre as pretensões formuladas (artigo 16.º, al. c) do RJAT), a dispensa de realização da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, concedeu prazo para  que as partes apresentassem alegações finais escritas e fixou data limite para proferir a decisão arbitral.

 

A Requerida, nas alegações finais escritas apresentadas no dia 05/09/2019, manteve a posição que verteu na resposta.

 

POSIÇÃO DAS PARTES

 

O Requerente apresenta o pedido de pronúncia arbitral, pois, no seu juízo, as liquidações de IMI, no segmento da majoração da taxa, padecem do vício de falta de fundamentação e de erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

Assim, em primeiro lugar, advoga que só na decisão da reclamação graciosa a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) veio dizer que a majoração da taxa de 200% de IMI resultava do estado de “devoluto” dos prédios e, por isso, configurava uma verdadeira fundamentação a posteriori.

Para alicerçar essa conclusão observa que não foi notificado de qualquer projeto de decisão ou decisão final, declarando os seus prédios como “devolutos”, nem dos motivos e fundamentos para tal, quando o Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto prevê um procedimento administrativo para a declaração dos prédios como devolutos e uma decisão do município (ato administrativo) declarando-os como tal.

Por isso, alega que: se não foi notificado do ato de declaração do prédio como “devoluto”, de acordo com o procedimento estabelecido na lei, ficou impedido de sindicar a decisão final do município e, assim, fica afetado o seu direito à tutela jurisdicional efetiva.

Acrescenta que o ónus probatório dos pressupostos em que assentam as liquidações é da AT, v.g. a demonstração de que as majorações foram decididas pelos órgãos competentes do município e com observância do procedimento aplicável, destacando-se a notificação ao contribuinte, artigo 74.º da Lei Geral Tributária (LGT).

Em resumo, defende que não tendo sido notificado da proposta de decisão e da decisão final proferida no âmbito do hipotético procedimento tendente à declaração dos prédios como “devolutos”, os atos impugnados são ilegais, por inexistência de facto tributário e de falta de base legal, por erro nos pressupostos e violação dos direitos de defesa e de tutela jurisdicional efetiva.

Em segunda linha, os atos impugnados não se encontram acompanhados de fundamentação suficiente que seja capaz de esclarecer um destinatário normal sobre as razões subjacentes à majoração de IMI, circunstância que é impossível de ser colmatada por qualquer explicação posterior e, por isso, são ilegais.

A Requerida, na sua resposta, começa por se defender por exceção, invocando, em primeiro lugar, que se verifica a falta de capacidade judiciária do Requerente, pois não dispõe de licença prévia do Ordinário da diocese para intervir em juízo, e, por isso, tal consubstancia uma exceção dilatória que deve obstar ao prosseguimento do processo.

Em segundo lugar, defende que há intempestividade do pedido de constituição e de pronúncia arbitral, na medida em que a data limite de pagamento voluntário do imposto inscrito nas liquidações era 31/10/2018 e a ação arbitral apenas foi apresentada em 22/02/2019, ou seja, 114 dias depois e o Requerente não formulou qualquer pedido tendente à anulação daquilo que foi decidido em sede do procedimento de reclamação graciosa.

Em terceiro lugar, sustenta que há ilegitimidade da Requerida, na justa medida em que a causa de pedir está estruturada em vícios atinentes ao procedimento de declaração de prédios devolutos, procedimento esse que não foi encetado pela Requerida e o objeto do pedido atinge interesses pessoais e diretos de uma entidade que não está vinculada ao CAAD, nem está representada em juízo. Ou seja, a Requerida não tem aqui qualquer interesse direto, nem da eventual procedência do pedido de pronúncia arbitral emerge qualquer prejuízo para a esfera jurídica da Requerida.

Em quarto lugar e ainda por exceção, propugna que o tribunal arbitral é incompetente para apreciar a pretensa falta de audição prévia no procedimento de declaração de prédios devolutos, pois tal significaria extravasar as competências atribuídas pela lei.

Neste âmbito acrescenta que o Requerente, ao colocar em causa as decisões de declaração de prédio devoluto por pretensa falta de audição prévia, quer que o tribunal profira decisão sobre o prévio e autónomo procedimento de declaração de prédios devolutos. Contudo, as decisões finais proferidas no âmbito dos prévios e autónomos procedimentos de declaração de prédios devolutos constituem atos imediatamente lesivos dos direitos do contribuinte e, assim, passíveis de impugnação contenciosa através de uma ação administrativa.

Deste modo, na sua visão, o tribunal arbitral é incompetente para apreciar quaisquer questões emergentes do prévio e autónomo procedimento.

Quanto a esta linha conclui que a impropriedade do meio processual e a incompetência do tribunal arbitral para apreciar a legalidade da decisão final do procedimento de declaração de prédios devolutos constituem exceções dilatórias que obstam ao conhecimento do pedido – artigos 278.º, n.º 1, 576.º, n.º 1 e 2 e 577.º, alínea a), todos do Código de Processo Civil (CPC).

Ainda por exceção defende que o tribunal arbitral é incompetente para apreciar a pretensa falta de fundamentação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, porquanto a apreciação de tal matéria extravasa as competências que a lei lhe atribui. Neste âmbito defende que a falta de fundamentação redunda em vício próprio da reclamação graciosa e não das liquidações de IMI, v.g. os atos de 1.º grau.

                A Requerida também se defende por impugnação, quando sustenta que relativamente à falta de audição prévia no procedimento de majoração do IMI, tal não corresponde à verdade, pois a prova constante dos autos conduz a conclusão distinta.

Assim, no que tange ao prédio inscrito na matriz predial sob o artigo U-... (sito na Rua..., n.º...), foi o Requerente notificado do projeto de decisão da declaração de imóvel devoluto (procedimento administrativo n.º .../... /2015 do município de Lisboa) e da decisão final, não tendo exercido o direito de audição ou instaurado a competente ação administrativa.

No que respeita ao prédio inscrito na matriz sob o artigo U-... (proveniente do artigo...) – sito na Rua ..., n.º..., foi o Requerente notificado do projeto de decisão da declaração de imóvel devoluto (procedimento administrativo n.º.../... /... /2007) e da decisão final, não tendo exercido o direito de audição ou apresentado a competente ação administrativa.

Relativamente ao prédio inscrito na matriz sob o artigo U- ... (proveniente do artigo...) – sito na Rua ..., n.º ..., foi o Requerente notificado do projeto de decisão da declaração de imóvel devoluto (procedimento administrativo n.º .../... /.../2007) e da decisão final, não tendo exercido o direito de audição ou apresentado a competente ação administrativa.

Por isso, defende que o Requerente litiga com má-fé, pois todos os projetos de decisão e decisões finais foram enviados para a sua morada, o que deve, no seu juízo, conduzir à sua condenação como litigante de má-fé.

Subsidiariamente, quanto à alegação de falta de fundamentação das liquidações de IMI, observa que tal fundamento apenas surgiu no pedido de pronúncia arbitral, pois não consta da petição de reclamação graciosa. É destituído de sentido invocar o vício nesta sede, quando em sede procedimental não houve qualquer dúvida do Requerente quanto ao discurso fundamentador dos atos em crise.

As liquidações emitidas pelo sistema informático da Requerida não têm de reproduzir o conteúdo das decisões resultantes dos prévios e autónomos procedimentos de declaração de prédios devolutos. As liquidações de IMI foram emitidas nos precisos termos da lei, bem como a fundamentação patente nas liquidações de IMI é clara e suficiente.

                Acrescenta que, se o Requerente demonstra conhecer no seu pedido de pronúncia arbitral (assim como, na petição de reclamação graciosa) o itinerário lógico e cognoscitivo seguido para a prática dos atos de liquidação, a sua pretensão anulatória com fonte no vício de falta de fundamentação tem de improceder.

                Termina referindo que, ainda que assim não fosse, sempre o Requerente devia ter utilizado o mecanismo previsto no artigo 37.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) para ter acesso à respetiva fundamentação.

                Por último e novamente de forma subsidiária, porque o Requerente alega que a decisão de indeferimento da reclamação graciosa também padece do vício de falta de fundamentação, defende que, a proceder, nunca se projetaria nos atos de 1.º grau, ou seja, apenas teria a virtualidade de anular a decisão administrativa da reclamação graciosa.

                Contudo, defende que também que não se verifica o vício em relação à decisão de indeferimento da reclamação graciosa, na justa medida em que o destinatário dos atos ficou a saber as razões de facto e de direito que levaram a Requerida a tomar a decisão em causa.

                Notificado o Requerente para se pronunciar quanto à aludida matéria de exceção, veio dizer o seguinte:

              

i) Incapacidade judiciária do Requerente

 

O Requerente é uma pessoa coletiva que goza de direitos à semelhança de qualquer sujeito de direito, dispondo de personalidade jurídica e capacidade judiciária para tutela dos seus direitos, encontrando-se devidamente representada.

Em segundo lugar, alega que colheu licença prévia por parte do Ordinário da Diocese para comparecer em juízo, quer em audiência presencial, quer por documento escrito, tudo como o cânone 1288 do Código de Direito Canónico exige.

De todo o modo, observa que a falta de autorização ou deliberação para intervir em juízo sempre seria suscetível de sanação – artigo 29.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por força do artigo 29.º, n.º 1, al. e) do RJAT.

 

ii) Intempestividade do pedido de pronúncia arbitral

 

                Apesar de a Requerida sustentar que o pedido do Requerente foi apresentado 114 dias após o termo do prazo para pagamento das liquidações, observa que no pedido de pronúncia arbitral se impugnam os atos de liquidação que estão subjacentes ao ato de indeferimento da reclamação graciosa apresentada, todos bem identificados no aludido pedido.

 

iii) Ilegitimidade da Requerida

 

Defende que no presente processo arbitral estão em causa atos de liquidação de tributos e o indeferimento relativamente à reclamação graciosa apresentada, sendo a causa de pedir formada pela ilegalidade desses atos tributários.

Assim, observa que são apenas as ilegalidades imputadas pelo Requerente a esses atos que estão em causa nestes autos - mesmo que resultantes de vícios procedimentais ocorridos no respetivo procedimento tributário (ou falta deste), por isso, a Requerida é parte legítima.

 

iv) Impropriedade do meio processual e incompetência do tribunal arbitral quanto à falta de audição prévia no procedimento de declaração de prédios devolutos

 

Propugna que ficcionando um objeto da lide e uma causa de pedir diversos do litígio trazido aos autos pelo Requerente, existiria ilegitimidade. Contudo, não existem quaisquer dúvidas que o tribunal é competente para julgar impugnações judiciais em que se aprecie a legalidade dos atos de indeferimento de reclamações graciosas e, em termos finais, das liquidações de IMI.

 

v) Impropriedade do meio processual e incompetência do tribunal arbitral quanto à falta de fundamentação do ato de indeferimento da reclamação graciosa

 

Se a  impugnação arbitral do indeferimento da reclamação graciosa tem por objeto imediato a decisão da reclamação  e por objeto mediato os vícios imputados aos atos de liquidação,  o tribunal é competente para conhecer o indeferimento da reclamação e os vícios imputados aos atos tributários, não se verificando a imputada impropriedade do meio processual ou a incompetência do tribunal arbitral.

         

                Deste modo, são estas as questões que o tribunal deve conhecer:

a)            Se o Requerente tem capacidade judiciária;

b)           Se o pedido de pronúncia arbitral é tempestivo;

c)            Se a Requerida é parte ilegítima;

d)           Se o tribunal arbitral é incompetente e se há impropriedade do meio processual;

e)           Se o ato de indeferimento expresso da reclamação graciosa n.º ...2019... que, em termos finais, incide sobre as liquidações de IMI, na parte respeitante à majoração da taxa, números 2014...; 2015..., 2016... e 2017... padece do vício de erro sobre os pressupostos de facto e de direito;

f)            Se o Requerente deve ser condenado como litigante de má-fé;

g)            Se o Requerente tem direito ao reembolso;

h)           Se a AT deve ser condenada no pagamento de juros indemnizatórios.

 

               

QUESTÕES PRÉVIAS E SANEAMENTO

 

i) Questão da capacidade judiciária

 

                Em geral, a personalidade judiciária consiste na suscetibilidade de ser parte em processo judicial e a capacidade judiciária constitui a suscetibilidade de estar, por si, em juízo, como os artigos 11.º, n.º 1 e 15.º, n.º 1 do CPC preveem.

A personalidade tributária consiste na suscetibilidade de ser sujeito de relações jurídicas de natureza tributária, englobando, não só o lado ativo, como o passivo – artigo 15.º da LGT. Embora a personalidade jurídica não seja um requisito para a personalidade tributária, as entidades com personalidade jurídica têm personalidade tributária.

O artigo 3.º do CPPT prevê que: “1-A personalidade judiciária tributária resulta da personalidade tributária. 2 - A capacidade judiciária e para o exercício de quaisquer direitos no procedimento tributário tem por base e por medida a capacidade de exercício dos direitos tributários”.

A capacidade judiciária tributária consiste na suscetibilidade de estar, por si, em processos judiciais de índole tributária e só tem capacidade judiciária tributária quem tem personalidade tributária. Ou, dito de outro modo, a capacidade judiciária tributária depende da personalidade tributária.

                O cânone 1288 do Código de Direito Canónico determina que: “Os administradores não proponham nem contestem nenhuma ação no foro civil em nome da pessoa jurídica pública sem licença prévia do Ordinário próprio, dada por escrito”.

                A Requerida não questiona o facto de o Requerente ser uma pessoa coletiva religiosa e, por isso, titular de personalidade jurídica, mas isso sim, a falta de licença prévia do Ordinário da diocese.

                O Requerente com o articulado de resposta às exceções de 24/06/2019 juntou o aludido documento.

O artigo 6.º, n.º 2 do CPC, aplicável por força do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT determina que: “O juiz providencia oficiosamente pelo suprimento da falta de pressupostos processuais suscetíveis de sanação, determinando a realização dos atos necessários à regularização da instância ou, quando a sanação dependa de ato que deva ser praticado pelas partes, convidando estas a praticá-lo”. Isto é, o tribunal deve diligenciar pelo suprimento das exceções dilatórias sanáveis.

Na presente hipótese, o Requerente veio juntar aos autos o aludido documento, pelo que não se verifica a exceção dilatória invocada pela Requerida.

 

ii) Questão da intempestividade

 

A Requerida propugna que o Requerente apresentou o pedido de constituição de tribunal e de pronúncia arbitral, 114 dias após o termo do prazo de pagamento voluntário das liquidações de IMI.

O Requerente apresentou o aludido pedido sobre o ato de indeferimento expresso da reclamação graciosa n.º ...2019... e, em termos finais, das liquidações de IMI números 2014..., 2015..., 2016... e 2017..., pois tal ato comportou a apreciação da legalidade de atos de liquidação.

Ensina a doutrina, a propósito do campo de aplicação do processo de impugnação judicial: “…nos casos em que o ato a impugnar é um ato de liquidação ou um ato que comporta a apreciação da legalidade de um ato de liquidação (ato de indeferimento de reclamação graciosa   ou de recurso hierárquico interposto da decisão que a aprecie ou ato de apreciação de pedido de revisão oficiosa, nos termos do artigo 78.º da LGT) o meio adequado é o processo de impugnação.” . Ou, dito de outro modo, na parte relevante para o presente processo, a impugnação judicial é o meio processual adequado quando o ato de indeferimento expresso da reclamação graciosa aprecia a legalidade de liquidação.

De outro lado, no processo arbitral poder-se-á questionar: a conclusão vertida no parágrafo anterior também é válida?

A resposta é afirmativa, isto é, o objeto do pedido de pronúncia arbitral é o ato de liquidação e não o ato que decidiu a reclamação graciosa.  Por isso, os atos de segundo grau são arbitráveis quando comportem a apreciação da legalidade do ato de liquidação.

Consequentemente, o objeto do presente processo arbitral são as liquidações de IMI.

A remissão do artigo 10.º, n.º 1, al. a) do RJAT para os factos previstos no artigo 102.º, n.º 1 do CPPT permite sustentar que pode ser apresentado pedido de pronúncia arbitral no prazo de 90 dias seguintes aos restantes atos que possam ser objeto de impugnação autónoma nos termos do CPPT – artigo 102.º, n.º 1, alínea e) do CPPT.

Deste modo, se o ato de indeferimento expresso foi notificado à Requerente por ofício datado de 21/01/2019 e o pedido deu entrada no sistema informático do CAAD no dia 22/02/2019, não se verifica a imputada intempestividade.

 

iii) Questão da ilegitimidade da Requerida

               

A Requerida defende que não promoveu a declaração dos prédios aqui em causa como devolutos, pelo que é parte ilegítima.

                O conceito de legitimidade encontra-se definido no artigo 30.º do CPC, consagrando-se que o autor é parte legítima quando tem interesse em demandar, o réu é parte legítima quando tem interesse em contradizer, sendo que o interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa   procedência advenha.

                Quando a lei não disponha de forma diferente, são considerados titulares do interesse relevante para a finalidade em estudo, os sujeitos da relação como é configurada pelo autor, artigo 30.º, n.º 3 do CPC.

                Assim, impende sobre o interessado o ónus de alegar factos que integram a sua legitimidade, que na impugnação de atos de liquidação se limita à sua identificação no ato como sujeito passivo do tributo liquidado .

O artigo 9.º do CPPT prevê que: “1 - Têm legitimidade no procedimento tributário, além da administração tributária, os contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido.2 - A legitimidade dos responsáveis solidários resulta da exigência em relação a eles do cumprimento da obrigação tributária ou de quaisquer deveres tributários, ainda que em conjunto com o devedor principal.3 - A legitimidade dos responsáveis subsidiários resulta de ter sido contra eles ordenada a reversão da execução fiscal ou requerida qualquer providência cautelar de garantia dos créditos tributários.4- Têm legitimidade no processo judicial tributário, além das entidades referidas nos números anteriores, o Ministério Público e o representante da Fazenda Pública”.

                A legitimidade judicial tributária é, por força do referido artigo 9.º, n.º 4, atribuída à “administração tributária”, sendo o seu conceito delimitado pelo artigo 1.º, n.º 3 da LGT, que prevê o seguinte: “Integram a administração tributária, para efeitos do número anterior, a Direcção-Geral dos Impostos, a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, a Direcção-Geral de Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros, as demais entidades públicas legalmente incumbidas da liquidação e cobrança dos tributos, o Ministro das Finanças ou outro membro do Governo competente, quando exerçam competências administrativas no domínio tributário, e os órgãos igualmente competentes dos Governos Regionais e autarquias locais”. Assim, a “administração tributária” tem legitimidade para ocupar o lado passivo da relação processual.

                Os referidos normativos são aplicáveis ao processo arbitral, atenta a previsão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT.

                O artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março determina que: “Pela presente portaria vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam, nos termos do Decreto -Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, no CAAD — Centro de Arbitragem Administrativa os seguintes serviços do Ministério das Finanças e da Administração Pública: a) A Direção-Geral dos Impostos (DGCI); e b) A Direção -Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo (DGAIEC)”.

                A portaria de vinculação estabelece limitações relativamente aos tipos de litígios que podem ser submetidos à arbitragem, pois a AT apenas se vinculou à jurisdição dos tribunais constituídos sobre a égide do CAAD quando a pretensão diga respeito a impostos  e, em segundo lugar, que estes sejam administrados pela atual AT, sucessora da DGCI e DGAIEC.

O que está em causa nestes autos consiste em determinar se as liquidações de IMI, praticadas pela Senhora Diretora Geral da AT, no segmento da majoração, devem ser expurgadas da ordem jurídica por vício de erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

                Deste modo, se assim o é, não se verifica a exceção dilatória de ilegitimidade.

 

iv) Questão da impropriedade do meio processual e incompetência do tribunal arbitral quanto à falta de audição prévia no procedimento de declaração de prédios devolutos e relativamente à falta de fundamentação do ato de indeferimento expresso da reclamação graciosa

 

A Requerida, repete-se, propugna que o tribunal arbitral é incompetente para apreciar a pretensa falta de audição prévia no procedimento de declaração de prédios devolutos, pois tal significaria extravasar as competências atribuídas pela lei ao órgão jurisdicional. Como também, as decisões finais proferidas no âmbito dos prévios e autónomos procedimentos de declaração de prédios devolutos constituem atos imediatamente lesivos dos direitos do contribuinte e, assim, passíveis de impugnação contenciosa através de uma ação administrativa.

A incompetência em razão da matéria verificar-se-á quando for submetida à apreciação de um tribunal da jurisdição fiscal uma questão que não se subsuma às competências que lhe estão atribuídas, na medida em que o conhecimento desta seja dos tribunais comuns ou administrativos .

Como supra já se disse, o pedido de pronúncia arbitral do Requerente tem por objeto o ato de indeferimento expresso da reclamação graciosa n.º ...2019... que aprecia a (i)legalidade das liquidações de IMI números 2014..., 2015..., 2016... e 2017... no segmento da majoração.

                O legislador, logo na autorização legislativa concedida ao Governo para instituir a arbitragem tributária, enquanto meio alternativo (complementar) da resolução jurisdicional de conflitos em matéria tributária consagrou que: “O processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária” .

                Ora, o processo de impugnação judicial está normativamente gizado enquanto meio processual que tem por objeto um ato em matéria tributária, no qual se determina a sua legalidade e decide-se se deve ser anulado ou declarada a sua inexistência - artigo 124.º do CPPT.

                São arbitráveis, pois incluem-se nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, questões da legalidade de atos de liquidação ou atos de fixação da matéria tributável e os atos de segundo grau que tenham por objeto a apreciação da legalidade de atos daquela natureza, atos esses cuja apreciação também se insere no âmbito da espécie processual – impugnação judicial – artigos 2.º e 10.º do RJAT e artigo 97.º, n.º 1, alíneas a) e d) do CPPT.

                Constituindo os atos de segundo grau, aqueles que têm por objeto a apreciação da legalidade de liquidações e pretendendo o Requerente, com a apresentação do pedido de pronúncia arbitral, o reconhecimento da inexistência de qualquer facto tributário e a anulação das liquidações, forçoso é de concluir que este tribunal arbitral é competente para apreciar o mérito da sua pretensão.

                Neste sentido defende a jurisprudência: “O objeto real da impugnação é o ato de liquidação e não o ato que decidiu a reclamação graciosa, pelo que são os vícios daquela e não deste despacho que estão verdadeiramente em crise” .

                Improcede assim, a exceção dilatória de incompetência absoluta deste tribunal arbitral, devendo, em consequência ser conhecidos os pedidos formulados pelo Requerente.

 

SANEAMENTO

 

                O processo não enferma de nulidades, o tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente para conhecer e decidir os pedidos, verificando-se, consequentemente, as condições para ser proferida a decisão final.

 

II – FUNDAMENTAÇÃO

 MATÉRIA DE FACTO

1. Factos que se consideram provados

1.1. O Requerente era em 31 dezembro de 2014, 2015, 2016 e 2017 proprietário dos prédios urbanos inscritos na matriz predial sob os números ..., ... e ..., todos da freguesia da ..., concelho de Lisboa (PA).

1.2. O Requerente foi notificado em 20/02/2015 para exercer o direito de audição no âmbito do processo n.º .../... /2015 (respeitante ao prédio sito na Rua ... n.º ... e ao artigo matricial urbano n.º...) do município de Lisboa que, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto manifesta a intenção de o declarar devoluto (PA).

1.3. O Requerente em 30/03/2015 foi notificado do ato administrativo que declara devoluto o prédio sito na Rua ..., ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto (PA).

1.4. O Requerente foi notificado, por ofício datado de 02/11/2007, para exercer o direito de audição no âmbito do processo n.º .../... /IMI/2007 (respeitante ao prédio sito na Rua ... n.º ... e ao artigo matricial urbano n.º...) do município de Lisboa que, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto manifesta a intenção de o declarar devoluto (PA).

1.5. O Requerente, por ofício datado de 26/11/2007, foi notificado do ato administrativo que declara devoluto o prédio sito na Rua ... n.º..., ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto (PA).

1.6. O Requerente foi notificado, por ofício datado de 02/11/2007 para exercer o direito de audição no âmbito do processo n.º .../... /... /2007 (respeitante ao prédio sito na Rua ... n.º ... e ao artigo ...) do município de Lisboa que, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto manifesta a intenção de o declarar devoluto (PA).

1.7. O Requerente, por ofício datado de 26/11/2007, foi notificado do ato administrativo que declara devoluto o prédio sito na Rua ... n.º..., ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto (PA).

 

1.8. A liquidação n.º 2014... do ano de 2014, majorou em 200% a taxa de imposto, no que respeita aos prédios urbanos inscritos sob os artigos ... e ..., apurando uma coleta de 811,71 euros e 811,71 euros, respetivamente (PA).

1.9. A liquidação n.º 2015 ... do ano de 2015, majorou em 200% a taxa de imposto, no que respeita aos prédios urbanos inscritos sob os artigos ..., ... e ..., apurando uma coleta de 755,46 euros, 811,71 euros e 811,71 euros, respetivamente (PA).

1.10. A liquidação n.º 2016... do ano de 2016, majorou em 200% a taxa de imposto, no que respeita aos prédios urbanos inscritos sob os artigos ..., ... e ..., apurando uma coleta de 772,46 euros, 829,97 euros e 829,97 euros, respetivamente (PA).

1.11. A liquidação n.º 2017 ... do ano de 2017, majorou em 200% a taxa de imposto, no que respeita aos prédios urbanos inscritos sob os artigos ..., ... e ..., apurando uma coleta de 772,46 euros, 829,97 euros e 829,97 euros, respetivamente (PA).

1.12. O Requerente apresentou, no dia 11/01/2019, reclamação graciosa das aludidas liquidações (documento junto pelo Requerente sob o número cinco).

1.13. Por carta datada de 21/01/2019 foi o Requerente notificado da decisão de indeferimento expresso da reclamação graciosa (documento junto pelo Requerente sob o número seis).

1.14. O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado no dia 22/02/2019 (sistema informático do CAAD).

2. Factos que não se consideram provados

Não existem quaisquer outros factos com relevância para a decisão arbitral que não tenham sido dados como provados.

3. Fundamentação da matéria de facto que se considera provada

 

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis por força do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT.

No que se refere aos factos provados, a convicção do tribunal fundou-se nas posições assumidas pelas partes e na análise crítica da prova documental junta aos autos, cuja autenticidade não foi colocada em causa.

 

MATÉRIA DE DIREITO

 

A questão central destes autos consiste em apurar se as liquidações de IMI, no segmento da majoração, são ilegais e, por isso, devem conduzir à anulação parcial das liquidações em crise.

O Requerente alega, no seu pedido de pronúncia arbitral, que o facto de não ter sido notificado da declaração dos prédios como devolutos pelo município de Lisboa determina a ilegalidade das liquidações.

O legislador define o conceito de prédio devoluto através do Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto, densificando ainda neste a regulação do procedimento de declaração de prédio devoluto e pressupostos para que esta tenha lugar.

Assim, nos termos do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto, considera-se devoluto, para efeitos da aplicação da taxa de IMI: o prédio urbano ou a fração autónoma que durante um ano se encontre desocupado, constituindo indícios desta: a inexistência de contratos em vigor com empresas de telecomunicações e de fornecimento de água, gás e eletricidade, embora com as exceções previstas no artigo 3.º do mesmo diploma.

A declaração de prédio devoluto tem de ser precedida de procedimento da competência dos municípios em que se localizam os prédios urbanos ou as frações autónomas, municípios estes que notificam o sujeito passivo de IMI para o domicílio fiscal, do projeto de declaração, para exercer o direito de audição prévia e da decisão final do procedimento (ato administrativo) – artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto.

A referida formalidade permite que o interessado tenha a possibilidade de participar na decisão administrativa e, não se conformando com a mesma, apresentar ação administrativa.

Deste modo, para que o enquadramento de prédio devoluto produza efeitos em sede de IMI, mormente, majoração da taxa, imperativo é que o município, preliminarmente à liquidação, notifique o proprietário para, querendo, exercer o seu direito de audição e, subsequentemente, da decisão final. Ou seja, o cumprimento das formalidades legais é fundamental para a determinação da taxa de imposto a ser aplicada ao concreto prédio, pois aquelas configuram pressupostos necessários para a majoração da taxa de IMI.

O poder tributário das autarquias locais, no tocante à criação de tributos e de fixação dos seus elementos essenciais concretiza-se na fixação das taxas, dentro dos intervalos fixados na lei, incluindo a sua majoração, apesar de não poderem criar impostos, são titulares da receita do imposto objeto dos autos – IMI.

No conceito de Administração Tributária vertido no artigo 1.º, n.º 3 da LGT cabe, não só a AT, como também os órgãos das autarquias locais que exerçam competências administrativas no domínio tributário, como sucede no presente processo.

Assim, o procedimento orientado para a declaração de um prédio urbano como devoluto insere-se no procedimento tributário, enquanto atividade da Administração Tributária para a declaração de direitos tributários.

A questão assume um papel nuclear nos autos, se o Requerente sustenta no seu pedido de pronúncia arbitral que não foi notificado pelo município de Lisboa para exercer o direito de audição e da subsequente decisão, por outro, a Requerida defende-se, afirmando que as notificações foram realizadas.

E, de facto, a Requerida tem razão, pois do probatório resulta que o Requerente foi notificado ao abrigo do previsto no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto  dos atos administrativos que declararam os prédios em causa nos autos como devolutos. Ou, dito de outro modo, em 31 de dezembro de 2014, 31 de dezembro de 2015, 31 de dezembro de 2016 e 31 de dezembro de 2017, a declaração dos prédios como devolutos já produzia a plenitude de efeitos no domínio tributário.

Ora, se assim o é, improcede a pretensão do Requerente quanto a esta questão.

Sucede que o Requerente ainda imputa aos atos de liquidação o vício de falta de fundamentação.

O artigo 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa (CRP) determina que os atos administrativos carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos e interesses legalmente protegidos. A previsão na Lei Fundamental do dever em estudo justifica-se, enquanto forma de conhecer as razões que determinaram a decisão administrativa, isto é, tem de proporcionar ao destinatário do ato a possibilidade da reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela entidade que o praticou de modo a compreender as razões que conduziram à decisão em determinado sentido e não de forma distinta .

                O legislador ordinário, na concretização da injunção constitucional, positivou no artigo 77.º da LGT, o dever de fundamentação no procedimento tributário, através da exposição das razões de facto e de direito, podendo esta fundamentação consistir na declaração de mera concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas.

                Mais, o artigo 77.º, n.º 2 da LGT legitima a fundamentação sumária dos atos tributários, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.

                Esta exigência de índole constitucional e infraconstitucional permite aos interessados, de forma consciente, pois conhecem os fundamentos da atuação da administração, optarem entre a aceitação da legalidade do ato e a sua impugnação contenciosa . Isto é, a fundamentação constitui o esteio ou suporte do ato de liquidação.

                Assim, em tese, o sujeito passivo de IMI deve ser notificado das razões de facto e de direito que conduziram à declaração do prédio como devoluto, ficando, desta forma, a conhecer o fundamento da liquidação, de molde a, de forma consciente, aceitar o ato ou proceder à sua impugnação administrativa/contenciosa.

Na hipótese sub judice, dúvidas não existem de que o Requerente foi notificado dos atos que qualificaram os prédios como devolutos, tendo-se conformado com estes, pois não apresentou ações administrativas para discutir a sua legalidade.

Para além do mais, é possível vislumbrar nas liquidações/documentos de cobrança, a referência à identificação matricial do prédio inscrito, ao seu valor patrimonial, aos anos do imposto, à data de liquidação, à taxa utilizada para determinar o montante de imposto, à taxa majorada e, por último, ao valor da coleta.

Razão pela qual, entende o tribunal que os atos se encontram suficientemente fundamentados, uma vez que contêm as referências mínimas à matéria de facto e de direito utilizada pela Administração Tributária para a sua prática.

 Até porque, a falta de fundamentação imputada aos atos, não constituiu qualquer obstáculo para o Requerente solicitar a sua anulação em articulado no qual imputa às liquidações um rol de vícios. Em suma, os atos não padecem do vício de falta de fundamentação que o Requerente lhe imputa.

A Requerida ainda solicita a condenação do Requerente como litigante de má-fé, na medida em que alega que não foi notificado para exercer a audição no procedimento de declaração de prédios devolutos ou dos atos administrativos, quando, na verdade o foi, como se alcança da junção do PA.

Relativamente à questão da condenação do Requerente como litigante de má-fé:

O artigo 542.º, n.º 1, do CPC prevê que: “Tendo litigado de má-fé, a parte é condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir».

Para que se considere que a parte litigou de má-fé deve, conforme previsto no artigo 542.º, n.º 2, do CPC, ficar provado que a mesma agiu com dolo ou negligência grave e verificar-se alguma das seguintes circunstâncias: “a) tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; b) tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c) tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; d) tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão”.

No caso sub judice, ainda que se possa admitir que o Requerente tenha, no seu pedido de pronúncia arbitral, produzido afirmações que não correspondem aos factos provados documentalmente, não ficou assente que o tenha feito com dolo ou negligência grave.

Improcede assim o pedido de condenação do Requerente como litigante de má-fé.

Em face do exposto, ficam necessariamente prejudicados os restantes pedidos formulados no pedido de pronúncia arbitral, v.g. direito ao reembolso e condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios.

 

III – DECISÃO

 

Nestes termos e com a fundamentação acima descrita decide julgar-se totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, absolver a Requerida de todos os pedidos formulados, com as devidas consequências legais.

 

 VALOR DO PROCESSO

 

Fixa-se o valor do processo em 8 867,10 euros, nos termos do artigo 97.º - A do CPPT, aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, al. a) do RJAT e do artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

CUSTAS

Custas a suportar integralmente pelo Requerente, no montante de 918 euros, cfr. artigo 22.º, n.º 4 do RJAT e Tabela I anexa ao RCPAT.

 

Notifique.

 

Lisboa, 23 de setembro de 2019

 

 

O árbitro,

 

(Francisco Nicolau Domingos)