DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)
O árbitro António Pragal Colaço, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral, decide o seguinte:
I. Relatório
III.2.11 O Requerente A..., S.A., Pessoa Coletiva n.º..., com sede no ..., (adiante designado por “Requerente”), apresentou em 3/9/2018, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e no artigo 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, a constituição de Tribunal Arbitral pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa, nos termos do disposto na al. a), n.º 2 do artigo 6.º do referido diploma, pedido de pronúncia arbitral tendo em vista, a anulação da liquidação Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“AIMI”) n.º 2017 ... do ano de 2017, no valor de €57.416,44 (cinquenta e sete mil, quatrocentos e dezasseis euros e quarenta e quatro cêntimos).
2. A pretensão objeto do pedido de pronúncia arbitral consiste, na anulação da liquidação Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“AIMI”) n.º 2017 ... do ano de 2017, no valor de €57.416,44 (cinquenta e sete mil, quatrocentos e dezasseis euros e quarenta e quatro cêntimos), a cujo pagamento havia procedido.
3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 3/9/2018.
3.1.A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico designou o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral Singular, o qual comunicou a aceitação da designação dentro do prazo.
3.2. Em 23/10/2018, as partes foram notificadas da designação do árbitro não tendo arguido qualquer impedimento.
3.2. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral Singular foi constituído em 13/11/2018.
3.3. Nestes termos, o Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objeto do processo.
4. A fundamentar o pedido de pronúncia arbitral a Requerente alega, em síntese, o seguinte:
A Requerente é uma sociedade comercial que desenvolve a sua atividade no setor imobiliário, sendo proprietária do prédio urbano, terreno para construção, sito na Freguesia de ... e inscrito na respectiva matriz sob o n.º U -... .
A Requerente adquiriu o terreno em causa com o fito de nele promover edificações à medida das suas capacidades financeiras e mediante as circunstâncias do mercado. estando assim destinado única e exclusivamente à exploração da Requerente no âmbito da sua atividade económica - nomeadamente para construção e posterior venda ou arrendamento.
Com referência à liquidação adicional de AIMI, imposto que foi criado com a entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2017, estatuído no art.º 135.ºA e seguintes do Código do IMI. entende a Requerente, que o regime padece de ilegalidade – mais concretamente, por violação da Lei Fundamental, sobretudo porque, relativamente aos imóveis essenciais na obtenção de rendimentos no âmbito da atividade económica, carece de sustentação material no plano tributário.
O regime do AIMI viola o princípio da igualdade, concretizado na sua vertente da capacidade contributiva.
O regime do AIMI viola também os mais basilares cânones da proporcionalidade.
5. A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou longa resposta, disposta em 338 artigos e juntou processo instrutor, invocando em síntese, o seguinte:
Como questão prévia, invoca que o valor do pedido objecto do pedido arbitral aqui em análise, consubstancia-se na liquidação de AIMI referente ao ano de 2017, identificada pelo n.º 2017..., no montante de € 82.988,48 e não no valor de € 57.416,44, como erroneamente indica a Requerente.
Assim, o valor da causa deverá, pois, corresponder ao valor do ato impugnado, não sendo o valor assinalado a final de € 91.615,39, o qual deverá ser corrigido em conformidade, tendo como consequência a incompetência relativa do Tribunal Singular, nos termos do n.º 3, do art.º 5.º do RJAT.
A partir do art.º 12.º da sua resposta volta a discorrer sobre o vertido como questão prévia, qualificando o que verteu como excepção.
Afirma que, quanto à primeira liquidação n.º 2017..., de 30/06/2017, no valor de € 25.572,04, teria como termo inicial o último dia do mês de Setembro de 2017 – cf. artigo 135.º-H do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (1), pelo que deveria ser impugnada até ao dia 29/12/2018, o que não sucedeu;
Quanto à liquidação correctiva n.º 2017..., de 18/01/2018, que corresponde ao ato ora posto em crise, teria como termo inicial o último dia do prazo de pagamento voluntário – 30 dias após a notificação para pagamento, cf. artigo 85º, n.º 2 do CPPT.
Deste modo, tendo a Requerente sido notificada a 26/02/2018, o prazo para pagamento voluntário (30 dias) terminaria a 28/03/2018 e os 90 dias, contam-se pois, a partir dessa data, pelo que o prazo para impugnar terminou a 26/06/2018.
O pedido tendente à constituição do Tribunal Arbitral foi apresentado a 31/08/2018, pelo que o mesmo é intempestivo e o Tribunal não pode dele conhecer.
Deve o pedido formulado (conducente à declaração de ilegalidade do acto e, consequentemente à sua anulação proporcional) ser declarado improcedente, por intempestivo e, consequentemente, ser a Entidade Demandada absolvida do pedido – cf. n.ºs 1 e 3 do artigo 576º do Código de Processo Civil vigente, aplicável ex vi artigo 29º, n.º 1, alínea e) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
Quanto à questão factual, a Requerida responde que a liquidação n.º 2017..., de 18/01/2018, no montante de € 82 988,48 incidiu sobre o imóvel - Artigo matricial U ... – Terreno para construção.
A liquidação impugnada(sic) é uma liquidação correctiva, emitida na sequência da actualização do VPT do prédio em causa, tendo substituído a liquidação n.º 2017..., no valor de € 25.572,04, cujo montante pago pela Requerente foi posteriormente tido em conta no apuramento do valor de imposto a pagar que ascendeu a € 57.416,44.
A 01-01-2017 de acordo com o n.º 4 do art.º 8.º, por remissão do n.º 3 do art.º 135.º-A CIMI, a Requerente era proprietária do imóvel identificado, tendo o apuramento do VPT sido realizado de acordo com o inscrito na matriz, conforme n.ºs 1 e 2 do art.º 135.º-C do CIMI.
O imóvel não se encontrava abrangido pelas exclusões previstas no n.º 2 do art.º 135.º-B, nem pelo n.º 3 do art.º 135.º-C do CIMI.
Quanto à questão de fundo em matéria de Direito, explana sobre a introdução do AIMI na ordem jurídica Portuguesa, com especial enfoque no art.º 135.º B, n.º 2 do CIMI, defendendo que
“…o legislador afastou da incidência os prédios urbanos classificados como “industriais, comerciais ou de serviços” e “outros” mas, optou expressamente por manter outros prédios que também integram o activo das empresas, como sejam os classificados como habitacionais ou os terrenos para construção, ao não os incluir na delimitação negativa consagrada.”
Mais argumenta no que concerne à invocação paralela da inconstitucionalidade da verba 28.1 (já revogada) da Tabela Geral do Imposto de Selo que, “as decisões de inconstitucionalidade da Verba 28.1 TGIS relatadas pelo ilustre Conselheiro Jorge de Sousa, enquanto presidente de júri, foram todas revogadas pelo TC…” e que “as decisões citadas, não obstante terem estado publicadas, inexplicável e inenarravelmente, no website do CAAD, quando ainda não tinham transitado em julgado, e estavam pendentes recursos no Tribunal Constitucional interpostos quer pelo Ministério Público, quer pela ora Requerida.”,
Foram todas revogadas, tendo sido decidido no Acórdão do Plenário n.º 378/2018 a) Não julgar inconstitucional a norma constante na Verba 28.1 da TGIS (redacção OE2014), na parte que impõe a tributação anual sobre a propriedade de terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a € 1.000.000,00. b) Conceder provimento ao recurso interposto pela Autoridade Tributária e Aduaneira. c) Revogar o Acórdão 250/2017. (sublinhados nossos).
Conclui que, “…nada na letra da lei autoriza a concluir que a intenção do legislador do AIMI tenha sido a de excluir de tributação os “prédios urbanos que se encontrem afectos ao exercício de uma actividade económica, pois, o único critério relevante para delimitar o âmbito da incidência objectiva é, tão-só, a tipologia de classificação dos prédios urbanos prevista no n.º 1 do artigo 6.º do Código do IMI, para a qual remete expressamente o n.º 2 do artigo 135.º-B.”
Quanto à questão da inconstitucionalidade, não ocorre qualquer vício dessa natureza.
Termina a sua peça processual, (i) Deve a constituição do presente Tribunal ser rectificada, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do art.º 5.º do RJAT, sendo o valor do processo na realidade de € 91.615,39, (ii) Deve esse Tribunal absolver a AT do pedido porquanto deve julgar procedente a excepção peremptória de intempestividade supra invocada, ou, caso assim não se entenda, (iii) Deve o presente pedido de pronúncia arbitral ser julgado improcedente por não provado, e, consequentemente, absolvida a Requerida de todos os pedidos, nos termos acima peticionados, tudo com as devidas e legais consequências.
Ou, caso assim não se entenda: (iv) Requer-se, por apelo ao disposto no artigo 280.º, n.º 3 da CRP e no artigo 72.º, n.º 3 da Lei do Tribunal Constitucional, que seja determinada a notificação ao Ministério Público do douto acórdão arbitral.
6. O presente processo acabou por ter várias vicissitudes, as quais se elencam para melhor conhecimento e transparencia.
Por despacho arbitral de 14/12/2018, foi decidido notificar a Requerente quanto à matéria da excepção do valor da causa invocada, bem como, à excepção de intempestividade da acção arbitral, tudo ao abrigo do princípio do contraditório e da igualdade das partes.
A Requerente respondeu afirmando que “…está em causa uma liquidação adicional de imposto (AIMI) identificada logo no introito da petição inicial – com o n.º 2017..., a que corresponde o acerto de contas n.º 2018... – e relativa ao ano de 2017, com data limite de pagamento a 30.04.2018 , no valor a pagar de €57.416,44, constituindo tal o valor económico da causa e constitui “a importância cuja anulação de pretende”, nos termos do disposto no artigo 97.º -A n.º1 a) do CPPT.”
Mais afirmou que “por manifesto lapso de escrita, a Impugnante fez menção à “anulação de decisão administrativa” – todavia, como é de conhecimento oficioso da própria Fazenda Pública, inexiste qualquer decisão administrativa que tenha incidido sobre a referida liquidação adicional. Outrossim, foi apresentada reclamação graciosa contra a liquidação de AIMI do ano de 2017, com o n.º 2017..., de 30.06.2017 – a qual foi objecto de indeferimento, sendo que ainda se encontra em curso o respectivo prazo de impugnação (o qual termina a 16.01.2019).”
Mais afirma que e ao contrário do que pretende a Fazenda Pública, “a impugnação é perfeitamente tempestiva na medida em que, como ressuma dos autos, a data limite de pagamento da prestação tributária em causa terminou a 30.04.2018 – pelo que o prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º n.º1 a) do RJAT , terminando em férias judiciais (a 29.07.2018) transitaria para o primeiro dia útil seguinte (03.09.2018), tendo o presente processo sido encetado a 31.08.2018, o mesmo é claramente tempestivo.”
Invoca em conclusão que “o erro material (erro de cálculo ou de escrita) revelado no próprio contexto da declaração, é rectificável a todo o tempo – como agora se solicita na medida em que é manifesta a divergência entre a vontade expressa e a que se quis declarar, devendo ser julgada improcedente a excepção invocada pela Fazenda Pública; solicitando-se a rectificação do manifesto erro material supra identificado.”
Analisada pelo Tribunal com profícuo detalhe, segundo se crê, toda a matéria alegada quanto a tal questão, nomeadamente o processo administrativo junto, decidiu o Tribunal Arbitral exarar despacho a 27/1/2019, onde, “Analisados com maior profundidade os elementos constantes do processo, e considerando que a fls. 56 do processo administrativo junto pela ATA, constam três liquidações de AIMI do ano de 2017, liquidação ..., (fls. 57 e 58) que foi substituída em virtude da alteração do VPT, liquidação ..., (fls. 64) e liquidação ... /fls. 59 e 60), sendo esta a última emitida de 11/5/2018, que está mencionada como activa, mas com estado de emissão de nota de cobrança por enviar (fls. 59), sendo antes a liquidação ... a aqui "impugnada", ao abrigo do princípio da colaboração das partes com o Tribunal e princípio da busca da verdade material e do inquisitório, evitando-se decisões inúteis e contraditórias, deverá a ATA em 10 dias, vir informar o Tribunal se a liquidação ..., cujo detalhe consta de fls. 59 e 60, estando a mesma classificada como activa e que substituiu a liquidação anterior, se encontra activa no sistema e em caso afirmativo se foi notificada ao sujeito passivo e também em caso afirmativo se a mesma substituiu a liquidação ... . Mais deverá a ATA informar a razão pela qual a mencionada liquidação não deu origem a nota de cobrança, juntando todos os documentos relevantes e prestando quaisquer outras informações que considere relevantes e que não emerjam dos documentos juntos.”
Veio então a Requerida por requerimento introduzido nos autos a 8/2/2019, informar o Tribunal Arbitral que –
“1.A Liquidação de AIMI n.º... de 2018-01-16, foi substituída pela Liquidação ... de 2018-05-11, estando esta última activa no sistema informático do Adicional de IMI.
2.O valor da colecta apurada na liquidação ... de 2018-05-11 é igual ao valor apurado na liquidação ..., ou seja, tanto numa como na liquidação que a substitui, o valor da colecta é de 82.988,48€.
3.O valor de AIMI apurado na liquidação n.º... de 2018-01-16, foi pago em 30-4-2018.
4.Deste modo, a Liquidação ... de 2018-05-11, não produziu qualquer nota de cobrança, por o valor total da colecta se encontrar pago à data da sua elaboração.”
Por despacho arbitral de 20/2/2019, foi decidido por não haver razões que o justificassem o Tribunal dispensar a realização da primeira reunião prevista no art. 18.º do RJAT, o que fez ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal na condução do processo, relegando-se a decisão sobre a questão prévia arguida para o momento da prolacção da decisão final.
Foram também as partes notificadas para apresentarem alegações escritas e fixado o dia 9/5/2019, para a prolacção e notificação da decisão final.
7. A Requerida apresentou alegações conforme requerimento introduzido nos autos em 14/3/2019, reiterando os argumentos apresentados nas anteriores peças processuais.
Por despachos arbitrais de 8/5/2019 e 10/7/2019, foi prorrogado o prazo para a prolacção da decisão final, ao abrigo do disposto no art.º 21.º, n.º 2, do RJAT.
II. Saneamento
8. 1. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
8.2. O tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído.
8.3.O processo não enferma de nulidades.
8.4. Foram suscitadas pela Requerida a excepção do valor da causa, bem como, a excepção de intempestividade da acção arbitral.
8.5. Não se verificam quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
III. Mérito
III.1. Matéria de facto
9. Factos provados e não provados
Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas, prévias, e de mérito, dão–se como assentes e provados os seguintes factos:
A. Factos dados como provados
9.1 A Requerente é uma sociedade comercial que desenvolve a sua atividade no setor imobiliário, sendo proprietária do prédio urbano, terreno para construção, sito na Freguesia de ... e inscrito na respectiva matriz sob o n.º U -... .
9.2 A Requerente adquiriu o terreno em causa com o fito de nele promover edificações à medida das suas capacidades financeiras e mediante as circunstâncias do mercado. estando assim destinado única e exclusivamente à exploração da Requerente no âmbito da sua atividade económica.
9.3 A Requerente foi notificada da liquidação de AIMI com o n.º 2017..., a que corresponde o acerto de contas n.º 2018..., estornando com a liquidação ... – e relativa ao ano de 2017, com data limite de pagamento a 30.04.2018, no valor a pagar de €57.416,44, cuja nota de liquidação é a seguinte:
E cuja demonstração de acerto de contas é o seguinte:
9.4 A Requerente procedeu ao pagamento da mencionada liquidação em 30/4/2018, com os detalhes que se reproduzem:
9.5 A Liquidação de AIMI n.º... de 2018-01-16, foi substituída pela Liquidação ... de 2018-05-11, estando esta última activa no sistema informático do Adicional de IMI.
9.6 A Liquidação ... de 2018-05-11, não produziu qualquer nota de cobrança, nem foi notificada ao contribuinte, por o valor total da colecta se encontrar pago à data da sua elaboração.”
B. Factos dados como não provados
9.7 Que a liquidação n.º 2017..., de 18/01/2018, seja no montante de € 82 988,48 a pagar.
C. Fundamentação da matéria de facto dada como provada e não provada
Relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor [(cfr. artigos 596.º, n.º 1 e 607.º, números 2 a 4 do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT)] e consignar se a considera provada ou não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2 do CPPT).
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento das pessoas (cfr. artigo 607.º, n.º 5 do CPC). Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g. força probatória plena dos documentos autênticos, cfr. artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º, n.º 7, do CPPT, e a prova documental junta aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.
O facto dado como não provado funda-se na leitura assertiva da liquidação e acerto de contas
liquidação n.º 2017..., de 18/01/2018, cujo montante a pagar é inequivocamente de €57.416,44, conforme documentos números 1 e 2 juntos pela Requerente e documentos do PAT, bem como, tendo sido esse o montante pago, tendo sido também este o montante que a Requerente “demandou” a este Tribunal que fosse anulado.
III.2. Matéria de Direito
III.2.1 QUESTÕES PRÉVIAS
De acordo com o artigo 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea c) do RJAT, “O âmbito da jurisdição administrativa e a competência dos tribunais administrativos, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria.” (negritos nossos).
Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha afirmam que “A atribuição de prioridade absoluta ao conhecimento da questão da competência justifica-se pela consideração de que a única questão para que um Tribunal incompetente é competente é para apreciar a sua incompetência. Verificada essa incompetência, ele fica naturalmente impedido de entrar na apreciação, quer dos restantes pressupostos processuais, quer, obviamente, do mérito da causa.” (cfr. in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 4.ª edição, Almedina, Coimbra, 2017, pág. 147).
É verdade que não estamos perante a arguição por parte da Requerida de nenhuma incompetência absoluta do Tribunal, mas antes, perante a arguição de uma incompetência relativa. No entanto, os pressupostos e as consequências são exactamente as mesmas, pelo que, será apreciada, desde já, a excepção da incompetência relativa emergente do valor da causa colocada pela Requerida, sendo certo que se esta questão for procedente ficará prejudicado, por se tornar inútil, o conhecimento das restantes excepções suscitadas, bem como do mérito da causa.
a) INCOMPETENCIA RELATIVA DO TRIBUNAL SINGULAR
Argui a Requerida na sua resposta que, o pedido que é objecto de pronuncia arbitral é no valor de 2017, identificada pelo n.º 2017..., é no montante de € 82.988,48 e não no valor de € 57.416,44, como erroneamente indica a Requerente.
Mais argui que, sendo o valor do processo na realidade de 91.615,39€, que correspondeu ao valor atribuído pelo requerente no seu requerimento de pedido de pronúncia, a constituição do Tribunal deverá ser rectificada de harmonia com o preceituado no n.º 3, do art.º 5.º, do RJAT, pois no caso do valor da acção ultrapassar duas vezes o valor da alçada do Tribunal Central Administrativo, a constituição do Tribunal deverá ser colectiva.
A Requerente quando notificada para se pronunciar sobre a invocada excepção, veio reiterar que pretende a anulação do montante tributário exigido à Impugnante – o qual materializa o valor económico da causa e constitui “a importância cuja anulação de pretende”, nos termos do disposto no artigo 97.º -A n.º1 a) do CPPT, no montante do valor que pagou de imposto, ou seja, 57.416,44€.
Cumpre decidir:
No caso em análise, e como acima referido e detalhado em sede de “Matéria de Facto”, é pedida a anulação de acto de liquidação de imposto no total de 57.416,44€. É esse o montante que a Requerente pagou, que pediu a pronúncia deste Tribunal, sendo esse o valor da utilidade económica do pedido.
Porque importante para a fundamentação da presente Decisão Arbitral, reproduz-se, aqui, parte do Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, datado de 13 de Março de 2014, no processo n.º 07125/13: Nos termos do artigo 296.º/1, do CPC, «[a] toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido». Dispõe o artigo 297.º/1, do CPC, que «[s]e pela ação se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário; se pela ação se pretende obter um benefício diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse benefício». Por seu turno, determina o artigo 32.º, n.º 1, do CPTA, «[q]uando pela ação se pretenda obter o pagamento de quantia certa, é esse o valor da causa»; nos termos do n.º 2 do preceito, «[q]uando pela ação se pretenda obter um benefício diverso do pagamento de uma quantia, o valor da causa é a quantia equivalente a esse benefício».
Em termos gerais, as regras de determinação do valor do processo, i.e., as regras de fixação do valor da causa nos processos tributários, são as constantes do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (adiante designado apenas por CPPT). Nos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do referido artigo 97.º-A do CPPT, os valores atendíveis, para efeitos de custas ou outros previstos na lei, para as ações que decorram nos tribunais tributários, são os seguintes: a) Quando seja impugnada a liquidação, o da importância cuja anulação se pretende; b) Quando se impugne o ato de fixação da matéria coletável, o valor contestado; [...]. (in. Ibidem)
Como Ensina Jorge Lopes de Sousa, nos processos de arbitragem tributária não há alçada, pelo que, a fixação do valor da causa apenas releva para efeitos de custas e para determinar se o processo é julgado por Tribunal Arbitral singular ou coletivo. O valor da causa deve ser indicado pelo sujeito passivo no pedido de constituição do Tribunal Arbitral, correspondendo à utilidade económica do pedido. Assim, quando são impugnados atos de liquidação [...], o valor da causa é o da importância cuja anulação se pretende, que corresponde à utilidade económica do pedido [...]. Mas, a viabilidade prática de aplicação de uma norma a determinada situação jurídica, constitui, naturalmente, um requisito indispensável da sua utilização, pois a impossibilidade natural é um obstáculo intransponível a tudo, inclusivamente à aplicação de qualquer norma. Por isso, a referida alínea e) do n.º 2 do artigo 10.º tem de ser interpretada restritivamente, com a limitação natural e forçosa de que o valor dos processos arbitrais será a utilidade económica do pedido, quando for possível determinar a utilidade. Há litígios [...] que não têm utilidade económica determinável, pois a sua definição depende de fatores que não são conhecidos no momento da apresentação do pedido de constituição do Tribunal Arbitral, nem mesmo o serão até ao termo do processo. Semelhante inviabilidade de determinação da utilidade económica do litigio ocorre nos pedidos de declaração de ilegalidade de atos de fixação de matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, designadamente por quando a matéria tributável for negativa (prejuízos fiscais), pois os prejuízos apurados poderão mesmo nunca vir a ser relevantes para a prática de qualquer ato de liquidação, já que essa relevância dependerá de em algum ou alguns dos períodos de tributação em que for legalmente admissível fazer o reporte dos prejuízos [...]. Nestas situações em que a utilidade do pedido não é determinável, não contendo o RJAT qualquer critério de determinação do valor dos litígios, haverá que atender à legislação subsidiária, designadamente o artigo 97.º-A do CPPT, que contém regras expressas para a determinação do valor da causa, potencialmente aplicável a todas as situações referidas no artigo 2.º, n.º 1 do RJAT. Nas alíneas b) e [...] estabelece-se que o valor atendível quando se impugne o ato de fixação da matéria coletável é o valor contestado.
Não estamos “sub judicio” perante nenhum pedido de impugnação de actos de fixação de matéria tributável, ou de natureza análoga, mas sim um pedido concreto de anulação.
Dúvidas não restam que o valor económico da causa é a importância cuja anulação se pretende, nos termos do disposto no artigo 97.º -A n.º1 a) do CPPT, no montante do valor que pagou de imposto, ou seja, 57.416,44€.
Donde decorre que este último quantitativo corresponde ao benefício económico a obter com a procedência da presente ação, pelo que o pedido se centra na anulação da liquidação sendo este o valor da ação, nos termos do artigo 97.º-A/1/a), do CPPT.
Como acima referido, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º do RJAT, os tribunais arbitrais funcionam com árbitro singular quando: a) o valor do pedido de pronúncia não ultrapasse duas vezes o valor da alçada do Tribunal Central Administrativo, i.e., quando o valor do pedido de pronúncia não ultrapasse os € 60.000,00.
É então o presente Tribunal Singular competente para apreciar do pedido de pronúncia arbitral.
b) INTEMPESTIVIDADE DA ACÇÃO ARBITRAL
A partir do art.º 12.º da sua resposta, a Requerida volta a invocar outra questão prévia o que qualificou como excepção.
Afirma que, quanto à primeira liquidação n.º 2017..., de 30/06/2017, no valor de € 25.572,04, teria como termo inicial o último dia do mês de Setembro de 2017 – cf. artigo 135.º-H do CIMI, pelo que deveria ser impugnada até ao dia 29/12/2018, o que não sucedeu.
Quanto à liquidação correctiva n.º 2017..., de 18/01/2018, que corresponde ao ato ora impugnado, teria como termo inicial o último dia do prazo de pagamento voluntário – 30 dias após a notificação para pagamento, cf. artigo 85º, n.º 2 do CPPT.
Deste modo, tendo a Requerente sido notificada a 26/02/2018, o prazo para pagamento voluntário (30 dias) terminaria a 28/03/2018 e os 90 dias contar-se-iam pois, a partir dessa data, pelo que o prazo para impugnar terminou a 26/06/2018.
O pedido tendente à constituição do Tribunal Arbitral foi apresentado a 31/08/2018, pelo que o mesmo é intempestivo e o Tribunal não pode dele conhecer.
A Requerente respondeu que, a impugnação é perfeitamente tempestiva na medida em que, como ressuma dos autos, a data limita de pagamento da prestação tributária em causa terminou a 30.04.2018 – pelo que o prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º n.º1 a) do RJAT terminando em férias judiciais (a 29.07.2018), transitaria para o primeiro dia útil seguinte (03.09.2018).
Ora, conforme resulta da matéria de facto dada como provada em 9.3., “A Requerente foi notificada da liquidação de AIMI com o n.º 2017..., a que corresponde o acerto de contas n.º 2018..., estornando com a liquidação ... – e relativa ao ano de 2017, com data limite de pagamento a 30.04.2018, no valor a pagar de €57.416,44.”
O pagamento foi efectuado até esse “terminus” do prazo de pagamento voluntário, pelo que terminando no dia 29/7/2018 (férias judicias) o prazo de 90 dias, o prazo estende-se até ao primeiro dia útil, “in casu” 3/9/2018.
Tendo o pedido de pronúncia arbitral sido interposto em 31/8/2018 é o mesmo tempestivo.
c) OUTRA EVENTUAL QUESTÃO PRÉVIA
Uma última palavra para uma eventual questão prévia.
Afirma a Requerida que a Requerente veio demandar a intervenção do presente Tribunal Arbitral, no sentido de anular a decisão administrativa e a liquidação do AIMI, pelo que não tendo sido mencionado em algum lugar uma hipotética decisão administrativa, não se compreenderia para o que afinal o Requerente veio.
Acontece que imediatamente na sua resposta a Requerida no art.º 16.º da mesma afirma e escreve “ A Requerente, no intróito do ppa, é contundente e directa e refere logo ao que vem: vem deduzir impugnação contra o ato tributário liquidação de Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis n.º 2017... do ano de 2017, no valor que indica ser de € 57.416,44 mas que se depreende ser o valor de € 82 988,00”
Na verdade, é exactamente por compreender de forma plena o que pretende a Requerente que acaba por arguir a excepção da incompetência relativa do Tribunal e a excepção da intempestividade da acção arbitral, as quais foram supra apreciadas.
Entendendo todos em uníssono, partes e Tribunal qual o objectivo claro da Requerente com o presente pedido de pronúncia arbitral, nem necessário será recorrer ao invocado pela Requerente quando “É certo que, por manifesto lapso de escrita, a Impugnante fez menção à “anulação de decisão administrativa”.
É assim competente o presente Tribunal Arbitral para conhecer do pedido de pronuncia arbitral.
III.2.2 A questão central a decidir consiste em saber se a norma de incidência do regime legal do Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis – em concreto, o artigo 135.º.-B, n.º 2, do Código do IMI, norma que determina a incidência objectiva deste Adicional ao IMI, é inconstitucional, quando aplicada a empresas que tem como objecto a actividade económica de compra e venda de imóveis.
Nos termos demonstrados no pedido arbitral, o regime legal do AIMI, em concreto o respectivo artigo 135.º-B do Código do IMI – quando interpretado no sentido de incluir, no âmbito de aplicação subjectiva do imposto, entidades que detêm património imobiliário como consequência inevitável da actividade económica que desenvolvem -, promove um tratamento diferenciado e uma desigualdade injustificada entre os contribuintes, em manifesta violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da CRP e do princípio da igualdade fiscal e da capacidade contributiva, consagrados no artigo 104.º, n.º 3 do mesmo diploma, se bem que estes últimos “refractados” por aquele.
Mais, concretamente, em duas violações.
Uma, a liquidação ora em apreciação viola o princípio da igualdade fiscal previsto no artigo 13.º da CRP e o princípio da capacidade contributiva previsto no artigo 104.º da CRP, na medida em que:
- é baseada numa norma que trata de forma bem diferente contribuintes que se encontrem em situações idênticas, não sendo a medida da diferença aferida pela sua real capacidade contributiva;
- é baseada numa solução legal arbitrária e desprovida de qualquer fundamento material perceptível ou racional;
Outra, em função da finalidade pretendida da norma, mormente quando aponta para a configuração de um imposto complementar ao IMI com o fito de tributar “a acumulação de património imobiliário habitacional de muito elevado valor”, através de “um imposto que recai sobre os detentores de maiores patrimónios imobiliários, reforçando a progressividade global do sistema, implica a violação do princípio da proporcionalidade.
Cumpre apreciar e decidir.
Afirma em primeiro lugar a Requerente, que existe violação do princípio da igualdade fiscal, previsto no art.º 13.º da C.R.P. na vertente do princípio da capacidade contributiva, prevista no art.º 104.º da mesma Lei Fundamental, porque o artigo 135.º B, do CIMI, ao ser interpretado como o foi, é baseado numa norma (interpretação) que trata de forma bem diferente contribuintes que se encontrem em situações idênticas, não sendo a medida da diferença aferida pela sua real capacidade contributiva (parêntesis nossos);
É também baseada numa solução legal arbitrária e desprovida de qualquer fundamento material perceptível ou racional.
Por estarem umbilicalmente ligados estes fundamentos serão tratados em conjunto.
Dir-se-á desde logo que uma realidade é uma empresa ter como actividade económica a detenção de imóveis para revenda em abstracto e outra diferente, é no caso concreto, o imóvel em questão ter uma determinada característica temporalmente provada e fixada. Mas como se verá, esta distinção que a Requerente não fez, acabará por não ser relevante.
Importa então efectuar uma pequena incursão histórica ao que se designou por Adicional ao IMI.
Podemos dizer que a tributação dos bens imóveis, que temos hoje, remonta efectivamente a
1641, com a criação da célebre “décima militar”, nos velhos e cansados tempos da Restauração de Portugal.
Este imposto, era um imposto geral sobre o rendimento que, embora de natureza extraordinária, foi criado com o objectivo de custear as despesas com a Guerra da Restauração, e que se foi mantendo muito para além do fim do conflito em 1668.
De facto, a décima militar incidia, à taxa de 10%, sobre as diversas parcelas ou cédulas do rendimento, ou seja: a parcela dos rendimentos prediais (décima predial), a parcela dos rendimentos de empréstimos de capitais (décima de juros) e a parcela dos rendimentos proporcionados pelas actividades comerciais, industriais ou profissionais (décima de maneio). (2)
As “décimas” foram substituídas em 1845 pelas contribuições, tendo-se instituído a contribuição de maneio, a contribuição pessoal e a contribuição predial, e criado em 1860 a contribuição industrial em substituição das duas primeiras, podemos dizer que a estrutura das décimas se irá manter até à reforma dos anos sessenta do século XX e mesmo surpreende-la nas actuais categorias de rendimento do IRS.
Interessa-nos aqui, todavia, a décima predial, depois designada por contribuição predial, que
foi de todas as décimas aquela que mais fiel se manteve ao figurino inicial, não sendo, por isso, estranho que até à mencionada reforma dos anos sessenta do século passado fosse conhecida simplesmente pela designação de “décima”.
Ora bem, desde 1641 até à reforma fiscal de 1988/89, a tributação relativa aos imóveis tinha por objecto o rendimento dos prédios tanto rústicos como urbanos, muito embora a partir da mencionada reforma fiscal dos anos sessenta, ao lado da contribuição predial, se tenha criado, em 1963, o imposto sobre a indústria agrícola, por necessidades de cobrança de receitas fiscais e de tributação do lucro sobre essa actividade. (3) (4)
Pelo que, a partir dessa reforma, a tributação do rendimento dos imóveis assentava em dois
impostos: a contribuição predial e o então criado imposto sobre a indústria agrícola.
A contribuição predial tinha a seguinte configuração:
‒ A contribuição predial rústica, que incidia sobre a renda fundiária, sendo esta definida como o valor atribuível à utilização produtiva da terra e respectivos melhoramentos, não integrando este o lucro da exploração, pois os lucros das explorações agrícolas, silvícolas ou pecuárias estavam excluídos da contribuição predial;
‒ E a contribuição predial urbana que incidia sobre o rendimento dos prédios urbanos, sendo este, quando os prédios estivessem arrendados, o valor da respectiva renda expressa em moeda corrente, e, quando não estivessem arrendados, a equivalente à utilidade que deles obtivesse ou tivesse a possibilidade de obter quem pudesse usar ou fruir dos prédios.
Por isto, a contribuição predial urbana tinha por base o rendimento real relativamente aos prédios arrendados e um rendimento normal – o rendimento imputado ao correspondente prédio – no respeitante aos prédios não arrendados.
Podemos dizer que coexistiam princípios de rendimento real com rendimento presumido e que a propriedade imobiliária sempre foi taxada de duas formas, estática e dinâmica, sendo que a determinação do valor tributável daquele determinava o valor tributável deste. (5)
O imposto sobre a indústria agrícola incidia sobre os lucros das explorações agrícolas, silvícolas ou pecuárias, desde que estes não caíssem na incidência da contribuição industrial.
Tratava-se de um imposto que, muito embora fosse tido por necessário já na reforma fiscal de 1929, em virtude de diversas vicissitudes, não veio a ter aplicação prática. De facto, criado em 1963, foi suspenso em 1965, modificado e reposto em vigor em 31 de Dezembro de 1975, sendo de novo, suspenso em Maio de 1976.
Autorizado pela LOE/1979 a repô-lo em vigor, o Governo não utilizou a autorização legislativa, e reposto, mais uma vez, em vigor pela LOE/1981, foi o mesmo suspenso para esse ano e anos seguintes.
Com a reforma fiscal da tributação do rendimento de 1988, pôs-se termo ao tradicional sistema de tributação parcelar ou cedular instituindo uma tributação única sobre o rendimento com a criação do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) e o imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC).
No respeitante à tributação antes constante da contribuição predial, foi a mesma desdobrada em duas, em que temos, de um lado, a tributação dos rendimentos prediais no IRS (categoria F) ou no IRC relativamente a rendimentos prediais das pessoas colectivas e, de outro lado, a tributação dos prédios enquanto património na também então criada Contribuição Autárquica.
Pelo que os prédios passaram a ser objecto de um imposto sobre o rendimento – o IRS ou IRC - que incide apenas sobre os prédios arrendados, não tendo lugar, como vimos acontecer na contribuição predial, a tributação dos rendimentos imputados aos prédios urbanos ou rústicos não arrendados.
Há assim aqui uma ablacção quanto a excluir da tributação os rendimentos imputados, muito embora essa opção não tenha sido levada até às últimas consequências, porquanto há a tributação, a título de remunerações acessórias na categoria A do IRS, nos termos do número 4) da alínea b) do n.º 3 do art.º 2.º do Código do IRS, dos rendimentos imputados à utilização por parte do trabalhador da casa de habitação fornecida pela entidade patronal. Uma excepção à exclusão da tributação dos rendimentos imputados que não deixa, a seu modo, de surpreender, porquanto a mesma se reporta à casa de habitação e a uma casa de habitação dos trabalhadores, o que de imediato convoca relevantes direitos fundamentais, como são o direito à habitação e o direito ao trabalho com formulação bem clara e incisiva, respectivamente, no art.º 65.º e no art.º 58.º da Constituição.
De outro lado, os prédios passaram a ser objecto do novo imposto chamado Contribuição Autárquica que vigorou até à criação do IMI, em 2003, e que mais não era do que a contribuição predial com um novo nome, se bem que este nada nos diga quanto à sua natureza de imposto sobre o património, porquanto o valor patrimonial que passou a ser a base do novo imposto mais não era do que a renda fundiária da contribuição predial capitalizada.
Na verdade, nos termos do n.º 1 do art.º 6.º e do n.º 1 do art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 442-C/1988, de 30 de Novembro, que aprovou o Código da Contribuição Autárquica, o valor tributável dos prédios urbanos, era o resultante da capitalização do rendimento colectável através da aplicação do factor 15, e o valor tributável dos prédios rústicos era a resultante da capitalização do rendimento colectável através da aplicação do factor 20.
Refira-se que na vigência da contribuição autárquica se manteve e agravou o sistema extremamente injusto que vinha da contribuição predial, em virtude da enorme desactualização das matrizes prediais que ficaram a aguardar a aprovação do Código das Avaliações que nunca veio a ser aprovado.
Essa desconformidade verificava-se sobretudo relativamente aos prédios urbanos, pois essa falta de actualização, num contexto de elevada inflação como foi a que ocorreu nos anos setenta, oitenta e mesmo noventa do século passado, conduziu a uma diferença abissal entre o valor dos prédios antigos e o valor dos prédios novos. A que acrescia o facto de a fixação do valor dos prédios novos assentar praticamente em critérios desconhecidos e, por conseguinte, subjectivos e arbitrários, que conduzia não raro a que fracções de prédios efectivamente iguais tivessem valores tributários completamente diferentes.
Foi, porém, uma solução integrada numa perspetiva de unificação que veio a ser adoptada pela reforma da tributação do património efectuada pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, diploma que aprovou os novos Códigos do Imposto Municipal sobre Imóveis e do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis e procedeu a alterações de diversa legislação tributária conexa com a mesma reforma.
Nestas destaca se, entre todas, a eliminação do imposto sobre as sucessões e doações com a consequente tributação num novo imposto de selo das transmissões a título gratuito a favor das pessoas singulares e em IRC os incrementos patrimoniais decorrentes das transmissões a título gratuito a favor das pessoas colectivas, ou seja, desdobrou-se o “velhinho” código das sucessões e doacções pelo sempre receptivo imposto de selo e ainda pelo IRC.
Foi, todavia, a criação de um novo sistema de determinação do valor patrimonial dos imóveis, mais precisamente dos prédios urbanos, e a sua aplicação em princípio a todos os impostos em que o mesmo fosse relevante, o aspecto efectivamente essencial da reforma da tributação do património de 2003.
De facto, criou-se a figura do valor patrimonial tributário (V PT).
Assim, o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação, comércio, indústria e serviços resulta, segundo o disposto no art.º 38.º do CIMI, da seguinte expressão: Vt = Vc × A × Ca × Cl × Cq × Cv, em que: Vt - valor patrimonial tributário; Vc - valor base dos prédios edificados; A - área bruta de construção mais a área excedente à área de implantação; Ca - coeficiente de afectação; Cl - coeficiente de localização; Cq - coeficiente de qualidade e conforto; Cv - coeficiente de vetustez.
De notar que vários destes coeficientes são criados por natureza legislativa de forma dinâmica, como é o caso dos coeficientes de localização.
Procedeu-se à reavaliação de todos os prédios urbanos que ainda não haviam sido reavaliados à luz do valor patrimonial tributário apurado em conformidade com a fórmula que acabámos de enunciar, que teve lugar nos anos de 2012 e 2013, em consequência dos compromissos assumidos pelo Estado Português no Programa de Assistência Económica e Financeira, concretizado no Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades da Política Económica assinado com a Troika (CE, BCE e FMI), em 17 de Maio de 2011.
Na verdade, até aí o imóvel apenas era objecto de (re) avaliação aquando da primeira transmissão após o início de vigência da reforma da tributação do património. Pode-se dizer que a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional obrigaram o Estado Português a (re) avaliar à pressa toda a propriedade imobiliária.
Para além das características próprias desse imposto sobre o património imobiliário, como são o seu carácter municipal e periódico, é de fazer alusão a algumas manifestações de pessoalização que se tem vindo a assumir relativamente a certos imóveis bem como dar conta de expressões da sua mobilização extrafiscal. Entre as primeiras, podemos apontar as referentes aos prédios urbanos destinados à habitação própria e não própria bem como as deduções à colecta por dependentes.
Assim, nos termos do art.º 46.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, estão isentos de IMI por
três anos os prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário não exceda € 125.000 e se trate
de prédios ou parte de prédios urbanos habitacionais construídos, ampliados, melhorados ou
adquiridos a título oneroso, destinados à habitação própria e permanente do sujeito passivo
ou do seu agregado familiar, cujo rendimento colectável, para efeitos de IRS, no ano anterior,
não seja superior a € 153.300, e que sejam efectivamente afectos a tal fim, no prazo de seis
meses após a aquisição ou a conclusão da construção, da ampliação ou dos melhoramentos.
Uma isenção que vale também para os prédios ou parte de prédios construídos de novo, ampliados, melhorados ou adquiridos a título oneroso, quando se trate da primeira transmissão, na parte destinada a arrendamento para habitação.
Por seu turno, nos termos do art.º 112.º-A do Código do IMI, os municípios podem fixar uma dedução à colecta do imposto municipal sobre imóveis para vigorar no ano a que respeita o imposto, a aplicar ao prédio ou parte de prédio urbano destinado a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, de € 20, € 40 ou € 70, consoante haja um dependente, dois dependentes ou três ou mais dependentes a cargo.
Em sede das manifestações de extrafiscalidade do IMI, podemos referir o desagravamento relativo a certos imóveis e o agravamento do imposto relativamente a outros imóveis. Entre os primeiros, encontramos: a redução da taxa de 50% ou de 25% como benefício de natureza
ambiental relativo a prédio com elevada eficiência energética, nos termos dos art.ºs 44.º-A e
44.º-B do EBF; a isenção por três anos dos prédios submetidos a operações de reabilitação urbana, nos termos dos art.ºs 45.º e 46.º do EBF; a minoração, a deliberar pela respectiva assembleia municipal, da taxa até 20%, 30% ou 50%, respectivamente, para os prédios objecto de operações de reabilitação, de arrendamento ou de classificação como prédios de interesse público, de valor municipal ou património cultural, conforme o disposto nos n.ºs, 6, 7 e 12 do art.º 112.º do Código do IMI.
Quanto aos agravamentos, temos a majoração a deliberar pela correspondente assembleia municipal, até 30% da taxa aplicável a prédios urbanos degradados, considerando-se como tais os que, face ao seu estado de conservação, não cumpram satisfatoriamente a sua função ou façam perigar a segurança de pessoas e bens, ou até ao dobro a taxa aplicável aos prédios rústicos com áreas florestais que se encontrem em situação de abandono, não podendo da aplicação desta majoração resultar uma colecta de imposto inferior a € 20 por cada prédio abrangido, conforme o dispostos nos n.ºs 8 e 9 do art.º 112.º do Código do IMI.
Estes agravamentos tiveram mais eco recentemente no Decreto Lei 67/2019, de 21 de Maio, o qual aditando o «Artigo 112.º -B ao CIMI; veio introduzir o conceito de Prédios devolutos localizados em zonas de pressão urbanística, como prédios, ou fracções autónomas que se encontrem devolutos há mais de 2 anos quando localizados em zonas de pressão urbanística, como tal definidas em diploma próprio, ficando sujeitos ao agravamento, em substituição do previsto no n.º 3 do artigo 112.º, com taxa que é elevada ao sêxtuplo, agravada, em cada ano subsequente, em mais 10 %.
O agravamento referido tem como limite máximo o valor de 12 vezes a taxa prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 112.º
A sua natureza extrafiscal é expressa através das receitas obtidas pelo agravamento serem afetas pelos municípios ao financiamento das políticas municipais de habitação.»
Penalizações fiscais estas que, como é fácil de ver, se prendem com o não cumprimento dos deveres por parte dos seus proprietários.
Tem sido então linhas marcantes da evolução da tributação do património, as manifestações de pessoalização, e, de outro lado, à sua utilização com intuitos extrafiscais nos domínios da protecção ambiental e da reabilitação urbana e das políticas municipais.
Não devemos esquecer que a “descentralização” das fontes de receita acaba por excluir a necessidade do recurso a receitas orçamentais, o que equivale também por afirmar que estão sempre em causa necessidades de financiamento do Estado, se bem que revestida linguisticamente por outros nomes.
O adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis
E assim chegamos ao adicional ao IMI.
“De jure condito” o adicional ao IMI foi inserido no Capítulo XV do CIMI, dividido por 6 secções, de epígrafes, respectivamente, Incidência, Valor Tributável, Taxa, Liquidação e Pagamento, Disposições relativas a impostos de rendimento e Outras Disposições, pelo art.º 219.º do diploma orçamental, que aditou os artigos 135.º-A a 135.º-K.
Concatenando com o Capítulo I, X, XI e XII do CIMI, facilmente constatamos que temos duas incidências no mesmo código, dois tipos de taxa, dois tipos de liquidação e pagamento. Tudo isso não seria confuso, caso nunca se colocassem necessidades interpretativas de preenchimento de lacunas ou de interpretação hermenêutica, onde tal seja possível em Direito Tributário, nas matérias que se encontram excluídas do princípio da legalidade tributária.
Quanto a este “Adicional”, é de começar por assinalar que este novo imposto estático sobre
os prédios urbanos mais não é do que uma das muitas manifestações do que podemos designar por “fiscalidade da necessidade”, em sistemas de matriz económica tendencialmente de Direcção Central, concretizada na criação pelo legislador de diversos tributos que deveriam ter natureza extraordinária, mas que acabam por ter natureza ordinária.
Na verdade, por força do pedido de resgate financeiro feito pelo XVIII Governo e dos consequentes compromissos assumidos por Portugal no referido Programa de Assistência Económica e Financeira, cuja execução haveria de ficar a cargo do XIX Governo, tomando e implementando este um conjunto de medidas de austeridade, em que, para além de diversos e significativos cortes nas despesas públicas, houve a imperiosa necessidade de aumentar as receitas fiscais, agravando a generalidade dos impostos e criando diversos novos tributos com variados nomes.
Agravamentos e novos tributos que foram apresentados como tendo eminente carácter extraordinário, o que no respeitante a alguns dos tributos em causa constava (e ainda consta)
do próprio nome, os quais seriam, por conseguinte, objecto de eliminação logo que a situação
que esteve na base do pedido de resgate financeiro cessasse. O que, todavia, como é sabido por experiência própria da generalidade dos contribuintes, não ocorreu, tendo-se mantido praticamente todos esses agravamentos e novos tributos. (6)
Estamos naturalmente a referirmo-nos ao conhecido por “aumento brutal de impostos” que se traduziu, no respeitante às pessoas singulares, no aumento muito significativo da generalidade das taxas do IRS e da criação, designadamente, de uma sobretaxa, (duas) e, quanto às pessoas colectivas, da instituição do que vimos designando por “IRC paralelo”.
Mas o adicional que terá carácter permanente, constitui receita do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, diz-nos o art.º 1º, nº 2, do CIMI.
O adicional foi criado pela LOE/2017, Lei 42/2016, de 28/12, em substituição de um “IMI” especial criado pelo Decreto-Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, e objecto de alterações pela LOE/2014, que foi integrado no Imposto de Selo (verba 28 da Tabela Geral do Imposto de Selo), o qual incidia à taxa de 1% sobre os prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário fosse igual ou superior a € 1.000.000.
Esse adicional já sofreu várias alterações apesar do seu curto período de “vida”, pela Lei 114/2017 de 29/12, Lei 85/2017 de 18/8 e Lei 71/2018, de 31/12.
Depois, importa assinalar que, do ponto de vista da técnica tributária, não estamos, em rigor,
perante um verdadeiro adicional ao IMI, uma vez que não incide sobre a colecta deste, mas
antes face a um adicionamento, porquanto incide sobre o valor patrimonial tributário do IMI, o qual é, todavia, objecto de uma importante dedução no respeitante às pessoas singulares e colectivas.
Vejamos, então, mais em pormenor o recorte legal deste novo imposto.
Nos termos do Capítulo XV (art.º s 135.º-A a 135.º-K) do Código do IMI são sujeitos passivos do adicional ao IMI, nos termos do art.º 135.º-A, as pessoas singulares ou colectivas que sejam proprietários, usufrutuários ou superficiários de prédios urbanos situados no território português, sendo equiparados a pessoas colectivas quaisquer estruturas ou centros de interesses colectivos sem personalidade jurídica que figurem nas matrizes como sujeitos passivos do IMI, bem como, a herança indivisa representada pelo cabeça de casal. Não são, porém, sujeitos passivos do adicional ao IMI as empresas municipais (redacção inicial) o Estado, as Regiões Autónomas, as autarquias locais e as suas associações e federações de municípios de direito público, bem como qualquer dos seus serviços, estabelecimentos e organismos, ainda que personalizados, incluindo os institutos públicos. (Redação da Lei n.º 51/2018, de 16 de agosto).
Do ponto de vista objectivo, segundo o disposto no art.º 135.º-B, o adicional ao IMI incide
sobre a soma dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos situados em território
português de que o sujeito passivo seja titular. Excluem-se, porém, os prédios urbanos classificados como «comerciais, industriais ou para serviços» e «outros» nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 6.º do Código do IMI.
Nos termos dos art.ºs 135.º-C e 135.º-D, o valor tributável corresponde à soma dos valores
patrimoniais tributários, reportados a 1 de Janeiro do ano a que respeita o adicional ao IMI,
dos prédios que constam das matrizes prediais na titularidade do sujeito passivo, não contando para esse efeito o valor dos prédios que no ano anterior tenham estado isentos ou
não sujeitos a tributação em IMI. A esse valor tributável são deduzidas as seguintes importâncias:
a) € 600 000, quando o sujeito passivo é uma pessoa singular; e
b) € 600 000, quando o sujeito passivo é uma herança indivisa.
Quando os sujeitos passivos estejam casados ou em união de facto para efeitos do artigo 14.º do Código o IRS podem optar pela tributação conjunta deste adicional, somando-se então os valores patrimoniais tributários dos prédios na sua titularidade e multiplicando-se por dois o valor da referida dedução.
Inicialmente a opção carecia de ser “optada” ano a ano o que não se compreendia e na redacção dada pela Lei 114/2017, de 29/12 alterou-se este estado de coisas, determinando-se que, além da opção ter consequências imediatas de inscrição na titularidade na matriz (as matrizes apenas admitem um titular), vigoram até que seja exercida de forma expressa a renúncia da mesma.
Relativamente à taxa, segundo o art.º 135.º-F, ao valor tributável e após aplicação das deduções referidas, é aplicada a taxa de 0,4 % às pessoas colectivas, e de 0,7 % às pessoas singulares e heranças indivisas.
Ao valor tributável, determinado nos termos do n.º 1 do artigo 135.º-C, superior a € 1 000 000, ou a € 2 000 000 quando seja exercida a opção pela tributação conjunta, é aplicada a taxa marginal de 1%, quando o sujeito passivo seja uma pessoa singular.
Pela redacção da Lei 71/2018, de 31 d Dezembro, ao valor tributável, determinado nos termos do n.º 1 do artigo 135.º-C, superior a 2 000 000 (euro), ou a 4.000,000,00 (euro) quando seja exercida a opção pela tributação conjunta, é aplicada a taxa marginal de 1,5 %, quando o sujeito passivo seja uma pessoa singular.
Quando se trate de prédios detidos por pessoas colectivas afectos a uso pessoal dos titulares do respectivo capital, dos membros dos órgãos sociais ou de quaisquer órgãos de administração, direcção, gerência ou fiscalização ou dos respectivos cônjuges, ascendentes e descendentes, fica sujeito à taxa de 0,7%, sendo sujeito à taxa marginal de 1% para a parcela do valor que exceda € 1 000 000. e seja igual ou inferior a 2 000 000 (euro), e à taxa marginal de 1,5 % para a parcela que exceda 2 000 000 (euro).
Sempre que os prédios sejam propriedade de entidades sujeitas a um regime fiscal mais favorável, a que se refere o n.º 1 do artigo 63.º-D da Lei Geral Tributária, a taxa é de 7,5%, não sendo tal agravamento aplicável a pessoas singulares.
Finalmente quanto à liquidação e pagamento, segundo o disposto nos art.ºs 135.º-G e 135.º-H, o adicional ao IMI é liquidado anualmente, pela AT, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 1 de
Janeiro do ano a que respeita, havendo lugar a uma única liquidação quando seja exercida a opção pela tributação conjunta.
A liquidação do adicional ao IMI é efectuada no mês de Junho e o seu pagamento no mês de Setembro do ano a que o imposto respeita.
Descritos sumariamente os momentos da dinâmica do adicional ao IMI, verificamos que se
trata de uma espécie de “imposto geral sobre a fortuna imobiliária urbana”, com uma taxa
progressiva relativamente às pessoas singulares em função do valor patrimonial tributário
(com a taxa 0 até € 600.000, a taxa de 0,7% de + de € 600.000 a € 1.000.000, a taxa 1% para + de € 1.000.000 até 2.000.000,00 e a taxa de 1,5% para + de € 2.000.000,00.
É um imposto que revela, alguma autonomia face ao IMI, relativamente ao qual se apresenta como adicional, sendo um imposto estadual (e não um imposto municipal) e um imposto com a receita consignada, uma vez que, nos termos do n.º 2 do art.º 1.º do Código do IMI, o adicional ao IMI, deduzido dos encargos de cobrança e da previsão de deduções à colecta de IRS e de IRC, constitui receita do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social.
A que acresce a circunstância de a qualidade de sujeito passivo, embora determinada em conformidade com os critérios estabelecidos no Código do IMI, ser feita por referência 1 de Janeiro do ano a que o adicional respeita, e não 31 de Dezembro, como acontece no IMI.
Também o seu pagamento, como vimos, deve ser feito integralmente no mês de Setembro, diferentemente do que acontece no IMI.
A pergunta mais evidente perante todo este cenário é saber-se se o adicional ao IMI, em si mesmo, não será inconstitucional?
Releva especialmente para a presente acção arbitral o preceituado nos artigos 6.º e 135.º-B do Código do IMI, uma vez que o segundo remete expressamente para a tipologia normativa de prédios urbanos, estatuída no primeiro.
Para maior compreensão, importa igualmente ter em atenção o âmbito de incidência subjetiva do AIMI, recortado no artigo 135.º-A, assim como as regras de determinação do valor tributável (artigo 135.º-C). (7)
O texto dos preceitos referidos é o seguinte:
«Artigo 6.º
Espécies de prédios urbanos
1 - Os prédios urbanos dividem-se em:
a) Habitacionais;
b) Comerciais, industriais ou para serviços;
c) Terrenos para construção;
d) Outros.
2 - Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.
3 - Consideram-se terrenos para construção os terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, exceptuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo com os planos municipais de ordenamento do território, estejam afectos a espaços, infra-estruturas ou equipamentos públicos.
4 - Enquadram-se na previsão da alínea d) do n.º 1 os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem se encontrem abrangidos pelo disposto no n.º 2 do artigo 3.º e ainda os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no n.º 2 e ainda os da excepção do n.º 3.»
Artigo 135.º-A
Incidência subjetiva
1 - São sujeitos passivos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis as pessoas singulares ou coletivas que sejam proprietários, usufrutuários ou superficiários de prédios urbanos situados no território português.
2 - Para efeitos do n.º 1, são equiparados a pessoas coletivas quaisquer estruturas ou centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica que figurem nas matrizes como sujeitos passivos do imposto municipal sobre imóveis, bem como a herança indivisa representada pelo cabeça de casal.
3 - A qualidade de sujeito passivo é determinada em conformidade com os critérios estabelecidos no artigo 8.º do presente Código, com as necessárias adaptações, tendo por referência a data de 1 de janeiro do ano a que o adicional ao imposto municipal sobre imóveis respeita.
4 - Não são sujeitos passivos do adicional ao imposto municipal o Estado, as Regiões Autónomas, as autarquias locais e as suas associações e federações de municípios de direito público, bem como qualquer dos seus serviços, estabelecimentos e organismos, ainda que personalizados, incluindo os institutos públicos. (Redação da Lei n.º 51/2018, de 16 de agosto)
Artigo 135.º-B
Incidência objetiva
1 - O adicional ao imposto municipal sobre imóveis incide sobre a soma dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos situados em território português de que o sujeito passivo seja titular.
2 - São excluídos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis os prédios urbanos classificados como «comerciais, industriais ou para serviços» e «outros» nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 6.º deste Código.
3 - Os sujeitos passivos legalmente autorizados ao exercício da atividade de locação financeira não podem repercutir sobre os locatários financeiros, total ou parcialmente, o adicional ao imposto municipal sobre imóveis quando o valor patrimonial tributário dos imóveis objeto de contrato de locação financeira não exceda a dedução prevista no n.º 2 do artigo 135.º-C. (Aditado pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro)
Artigo 135.º-C
Regras de determinação do valor tributável
1 - O valor tributável corresponde à soma dos valores patrimoniais tributários, reportados a 1 de janeiro do ano a que respeita o adicional ao imposto municipal sobre imóveis, dos prédios que constam nas matrizes prediais na titularidade do sujeito passivo.
2 - Ao valor tributável determinado nos termos do número anterior são deduzidas as seguintes importâncias:
a) (euro) 600 000, quando o sujeito passivo é uma pessoa singular;
b) (euro) 600 000, quando o sujeito passivo é uma herança indivisa.
3 - Não são contabilizados para a soma referida no n.º 1 do artigo 135.º-B: (Redação da Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, tendo natureza interpretativa)
a) O valor dos prédios que no ano anterior tenham estado isentos ou não sujeitos a tributação em IMI; (Redação da Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, tendo natureza interpretativa)
b) O valor dos prédios que se destinem exclusivamente à construção de habitação social ou a custos controlados cujos titulares sejam cooperativas de habitação e construção ou associações de moradores; (Redação da Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, tendo natureza interpretativa)
c) O valor dos prédios ou partes de prédios urbanos cujos titulares sejam condomínios, quando o valor patrimonial tributário de cada prédio ou parte de prédio não exceda 20 vezes o valor anual do indexante de apoios sociais; (Redação da Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, tendo natureza interpretativa)
d) O valor dos prédios ou partes de prédios urbanos cujos titulares sejam cooperativas de habitação e construção e associações de moradores. (Redação da Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, tendo natureza interpretativa).
Transcreveram-se propositadamente os diplomas que consagraram a actual redacção para se ter uma ideia temporal, logo político-legislativa, das mudanças verificadas.
O Adicional ao IMI foi introduzido no ordenamento fiscal pela Lei do Orçamento do Estado para 2017 (Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro), sucedendo ao Imposto do Selo sobre Prédios Urbanos de Elevado Valor Patrimonial (ISPUEV), previsto na verba 28.1. da Tabela Geral do Imposto do Selo, revogado pelo artigo 210.º do diploma orçamental (sobre este imposto, cfr., entre muitos, os Acórdãos n.ºs 590/2015, 620/2015, 586/2016 e 378/2018).
Tem na sua origem a Proposta de Lei n.º 37/XIII/2.ª, sendo a medida caracterizada no Relatório do Orçamento do Estado para 2017 como motivada pela promoção da equidade fiscal na tributação do património imobiliário, com um elemento de progressividade de base pessoal, por via de um limiar de isenção e da exclusão de incidência sobre várias tipologias prediais, assim justificadas: (sublinhado nosso)
«C – Medidas de equidade fiscal
Em 2017 a distribuição da carga fiscal incidirá menos sobre os rendimentos do trabalho por via da eliminação faseada da sobretaxa – sendo a perda da receita parcialmente compensada com medidas fiscais que procuram reforçar a progressividade do sistema (com a tributação progressiva do património) e melhorar a prevenção da evasão e do planeamento fiscal agressivo.
A tributação progressiva do património imobiliário
O adicional ao imposto municipal sobre imóveis introduz na tributação do património imobiliário um elemento progressivo de base pessoal, tributando de forma mais elevada os patrimónios mais avultados, com uma taxa marginal de 0,3% aplicada aos patrimónios que excedam os 600.000€ por sujeito passivo. Para evitar o impacto deste imposto na atividade económica, excluem-se da incidência os prédios rústicos, mistos, industriais e afetos à atividade turística, permitindo-se ainda às empresas a isenção de prédios afetos à sua atividade produtiva até 600.000€. A possibilidade de dedução do montante de imposto pago à coleta relativa ao rendimento predial constitui adicionalmente um incentivo ao arrendamento e utilização produtiva do património. Este imposto substitui o anterior imposto do selo de 1% sobre o valor do imóvel acima de 1 milhão de euros. Com uma taxa muito inferior (0,3%) é também mais justo por ter em conta o valor global do património imobiliário e não, isoladamente, o valor de cada prédio.»
Como também se explicita no referido Relatório, o propósito de equidade fiscal encontra-se associado a uma outra finalidade: o reforço e a diversificação das fontes de financiamento da Segurança Social, por via da consignação das receitas do imposto ao Fundo de Estabilização da Segurança Social: «A consignação da tributação progressiva do património ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social corresponde ao objetivo do programa do Governo de alargar a base de financiamento da Segurança Social, ao mesmo tempo que se introduz um imposto que recai sobre os detentores de maiores patrimónios imobiliários, reforçando a progressividade global do sistema». A medida foi igualmente animada pelo propósito de se afastar da traça do imposto que substituiu, que suscitou elevada litigância.
Importa ter em atenção, porém, que, mantendo-se os propósitos enunciados, no decurso dos trabalhos parlamentares, em particular no que se refere à sujeição das pessoas coletivas e equiparadas, o imposto veio a afastar-se do seu figurino inicial, tido em atenção nos segmentos transcritos do Relatório do Orçamento do Estado para 2017.
Com efeito, na redação no n.º 2 do artigo 135.º-B da Proposta de Lei n.º 37/XIII/2.ª, a norma de exclusão de incidência objetiva do AIMI compreendia «os prédios classificados na espécie “industriais”, bem como os prédios urbanos licenciados para a atividade turística, estes últimos desde que devidamente comprovado o seu destino». Todos os demais prédios urbanos, mesmo aqueles classificados como comerciais ou para serviços, que não comprovadamente afetos a atividade turística, eram sujeitos a tributação. Paralelamente, na mesma Proposta de Lei, o artigo 135.º-C, respeitante às regras de determinação do valor tributável, e à semelhança do estatuído para as pessoas singulares e heranças indivisas, previa a dedução de €600 000,00 ao valor tributável quando o sujeito passivo fosse uma pessoa coletiva com atividade agrícola, industrial ou comercial, e os prédios urbanos estivessem diretamente afetos ao seu funcionamento [n.º 2, al. c)]. Isenção essa que, nos termos do n.º 5 do artigo 135.º-C, era afastada quanto às pessoas coletivas cujo ativo fosse composto em mais de 50% por imóveis não afetos a atividades de natureza agrícola, industrial ou comercial, ou a sua atividade consistisse na compra e venda de bens imóveis. (sublinhado nosso).
A redação do n.º 2 artigo 135.º-B do AIMI que veio a ser aprovada - assim como do artigo 135.º-C, com eliminação das normas aludidas - resulta da votação da Proposta de Substituição n.º 402-C2, apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista no decurso da discussão na Comissão Parlamentar de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa. Sob o título «Exposição de Motivos», lê-se na referida proposta de substituição que através da mesma se procurou introduzir «[a]lterações ao Adicional do IMI decorrentes do debate público desde a apresentação da proposta, assegurando a ausência de impacto na atividade económica, maior progressividade do imposto e o reforço da tributação dos patrimónios imobiliários detidos por entidades residentes em paraísos fiscais».
No seu recorte definitivo, e centrando a atenção na tributação dos entes coletivos, o AIMI passou a tributar todo o património imobiliário do sujeito passivo, sem dedução, ao mesmo tempo que a norma do n.º 2 do preceito passou a atender unicamente à classificação do prédio de acordo com o artigo 6.º do Código do IMI, sem consideração do setor de atividade ou da destinação efetiva. (sublinhado nosso) O que significou a eliminação do elemento de progressividade de base pessoal na tributação das pessoas coletivas ou equiparadas comportado na Proposta de Lei n.º 37/XIII, compensado em certa medida pela redução do âmbito de incidência objetiva do imposto, que passou a sujeitar ao imposto apenas às espécies de prédios urbanos não compreendidas na previsão do n.º 2 do artigo 135.º-B, ou seja, de acordo com divisão operada pelo artigo 6.º, n.º 1, do Código do IMI, os prédios urbanos «habitacionais» e os «terrenos para construção».
O AIMI constitui, então, um novo imposto sobre o património, de alcance parcelar ou analítico – toma a titularidade de património imobiliário e, mesmo dentro deste, tão somente a detenção de algumas tipologias de prédios urbanos – e natureza estática, visando tributar a força económica que se materializa no valor agregado dos prédios urbanos titulados pelo sujeito passivo e, à semelhança de outros tributos sobre o património, como o IMI, independentemente do ganho que produzam. Como refere José Pires, o AIMI «pretende tributar a riqueza de forma progressiva, acima de um determinado valor, quando os titulares são pessoas singulares, e toda a riqueza das pessoas colectivas, independentemente do valor e a uma taxa proporcional» (O Adicional ao IMI e a tributação pessoal do património, Almedina, 2017, p. 7).
Como salienta o mesmo Autor (idem, pp. 39-44), o AIMI afasta-se, na sua estrutura e carateres fundamentais, do ISPUEV: (sublinhado nosso) não se visa mais obter um contributo progressivamente acrescido das entidades com mais elevados índices de riqueza para a satisfação dos encargos públicos em período de crise financeira. O que é particularmente nítido relativamente aos sujeitos passivos a que corresponda a natureza de pessoa coletiva ou equiparada, porquanto, ao tributar todos os valores patrimoniais dos prédios urbanos de que sejam titulares, sem limite mínimo ou dedução, embora limitado aos prédios habitacionais e terrenos para construção, concretiza um momento de aproximação a um «imposto geral sobre a fortuna imobiliária urbana» (Casalta Nabais, «A respeito do Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis», Cadernos de Justiça Tributária, n.º 19, Janeiro-Março, 2018, pp. 32-45, e José Pires, O Adicional ao IMI..., pp. 40 e 44).
Permanece, note-se, tal como acontecia com o ISPUEV, a remissão normativa para a estrutura do IMI, sobre cuja base de incidência é recortada a base de incidência do AIMI, mormente no que respeita à divisão dos prédios urbanos e aos critérios de fixação do valor patrimonial tributário, denotando uma comunhão entre os impostos, o que explica a designação do imposto, embora o AIMI seja, ao contrário do IMI, um tributo pessoal e não um imposto real (assim, José Pires, idem, ibidem).
Da apreciação final
Por tudo o quanto vem sido dito e que constitui o vertido no recente Acórdão do Tribunal Constitucional, Nº 299/2019, Processo n.º 752/2018, Conselheiro Fernando Ventura, tirado em plenário por unanimidade interpretativa e ao qual aderimos sem qualquer reserva, especialmente pelos sublinhados que ao longo da transcrita exposição fomos colocando e que na nossa óptica constituem os pontos essenciais da questão dos presentes autos no que concerne à argumentação da “ratio legis” do regime do AIMI e da sua incidência, encontra-se devidamente integrado e fundamentado, todo o regime normativo que na presente acção arbitral é colocado em crise, quanto ao art.º 135.º B, n.º 2 do CIMI.
A Requerente alicerça o seu entendimento arguindo que o regime padece de ilegalidade – mais concretamente, por violação da Lei Fundamental, sobretudo porque, relativamente aos imóveis essenciais na obtenção de rendimentos no âmbito da atividade económica, carece de sustentação material no plano tributário.
O regime do AIMI viola assim o princípio da igualdade, concretizado na sua vertente da capacidade contributiva.
O regime do AIMI viola assim os mais basilares cânones da proporcionalidade e capacidade contributiva.
Está essencialmente em causa o art.º 135.º-B do IMI.
A Requerente sustenta a inconstitucionalidade dessa norma de incidência objetiva do AIMI por infração dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, desenvolvendo a sua argumentação através de dois vetores críticos principais:
(i) A norma em apreço trata de forma bem diferente contribuintes que se encontram em situações idênticas, não sendo a medida da diferença aferida pela sua capacidade contributiva;
(ii) Baseia-se numa solução legal arbitrária e desprovida de qualquer fundamento material perceptível ou racional; (8)
O princípio constitucional da igualdade tributária, como expressão específica e corolário do princípio geral estruturante da igualdade (artigo 13.º da Constituição), encontra concretização «na generalidade e na uniformidade dos impostos.
A generalidade quer dizer que todos os cidadãos estão adstritos ao pagamento de impostos (…); por seu turno, uniformidade quer dizer que a repartição dos impostos pelos cidadãos obedece ao mesmo critério idêntico para todos» (Teixeira Ribeiro, Lições de Finanças Públicas, 5.ª edição, pág. 261).
E tal critério, como sublinha Casalta Nabais, reside no princípio da capacidade contributiva: «Este implica assim igual imposto para os que dispõem de igual capacidade contributiva (igualdade horizontal) e diferente imposto (em termos qualitativos ou quantitativos) para os que dispõem de diferente capacidade contributiva na proporção desta diferença (igualdade vertical)» (Direito Fiscal, 7.ª edição, 2012, pág. 155). Como pressuposto e critério de tributação, o princípio da capacidade contributiva «afasta o legislador fiscal do arbítrio, obrigando-o a que na seleção e articulação dos factos tributários, se atenha a revelações da capacidade contributiva, ou seja, erija em objeto e matéria coletável de cada imposto um determinado pressuposto económico que seja manifestação dessa capacidade e esteja presente nas diversas hipóteses legais do respetivo imposto» (Casalta Nabais, Direito Fiscal, cit., pág. 157). (9)
Para afastar a inconstitucionalidade bastaria a qualificação, ou melhor, o reconhecimento da qualificação da inexistência de um imposto geral sobre o património em Portugal, apesar de tal ter sido ensaiado. (10)
(…) Não obstante o silêncio da Constituição, é entendimento generalizado da doutrina que a “capacidade contributiva” continua a ser um critério básico da nossa “Constituição fiscal” sendo que a ele se pode (ou deve) chegar a partir dos princípios estruturantes do sistema fiscal formulados nos artigos 103º e 104º da CRP (…)».
Acontece que o sistema fiscal não auto-existe por si só, resultando do conjunto homo (heterogéneo) dos factos económicos da vida real que considera passíveis de tributação. Se assim não fosse, seriam totalmente desprovidas de sentido qualificações doutrinais com base na origem da riqueza, ou na fonte do rendimento, como é aquela que distingue entre impostos sobre os rendimentos, o consumo e o património.
Acontece também que, como a dogmática dos direitos fundamentais tem recentemente mostrado, uma única intervenção do texto normativo constitucional não é suficiente para tornar tais direitos plenamente exequíveis. Careceriam então os mesmos, de uma intervenção normativa posterior, de regulação dos mesmos.
É por essa razão que o princípio da capacidade contributiva não dispensa o concurso de outros princípios constitucionais. Como se referiu no Acórdão n.º 711/2006, «é claro que o “princípio da capacidade contributiva” tem de ser compatibilizado com outros princípios com dignidade constitucional, como o princípio do Estado Social, a liberdade de conformação do legislador, e certas exigências de praticabilidade e cognoscibilidade do facto tributário, indispensáveis também para o cumprimento das finalidades do sistema fiscal.
A intervenção normativo-constitucional nesta veste de equilíbrio de direitos fundamentais e regulação dos direitos fundamentais está longe, no entanto, de ser a regra, já que essa é a missão de que normalmente se desincumbe a lei infraconstitucional.
Simplesmente, dado que o sistema de actos legislativos não é monista, cumpre diferenciar entre as intervenções legislativas que se operam no plano das (i) leis reforçadas e as intervenções normativas que se realizam no âmbito dos (ii) actos legislativos comuns.
Ora, em matéria tributária é exemplo da primeira a Lei Geral tributária, que apesar de ter ido para além do princípio da legalidade positivamente constitucionalizado em certas matérias, ficou aquém em outras.
Da concatenação destas premissas resulta que a tributação do património não pode ser vista como mera alternativa ou sucedâneo da tributação do rendimento, pois constitui finalidade autónoma do sistema fiscal, à qual o plano ordenador da Lei Fundamental atribui, a par da função geral financeira, uma específica função redistributiva (artigos 103.º, n.º 1, e 104.º, n.º 3 da Constituição).
Ora, não se vê que a prossecução estatutária de atividades de promoção ou exploração imobiliária permita afastar, quanto a todos os sujeitos cuja atividade nesse ramo implique a detenção de direitos sobre imóveis, a tributação da riqueza predial de que sejam titulares.
Se o legislador quisesse ter efectuado a distinção pelo prisma das actividades e não pelo prisma da natureza dos prédios, tal resultaria evidente da opção que tomou, frontal, expressa e indiscutívelmente com a integração da matéria no art.º 6.º do CIMI.
Levada a interpretação da igualdade ao extremo, teríamos que até as próprias taxas de IRS – com a agravante de aqui estarmos perante imposto sobre o rendimento o qual é mais fortemente protegido em termos constitucionais, seriam inconstitucionais porque o limite do 2º escalão começa em 7.091,00€ e não começa em 7.095,00€.
Argumenta também a Requerente que “…os imóveis detidos…e que estão a ser alvo de tributação em sede de AIMI, são, face ao seu objecto social, essenciais para a obtenção do rendimento no âmbito da sua actividade económica” sendo os mesmos o substrato patrimonial da sua actividade económica.
Argumenta-se assim que o legislador pretende, através do AIMI, tributar o rendimento gerado pelo património imobiliário (o rendimento-produto), quando assim não acontece. Como se disse, a opção político-legislativa de tributação incide sobre a riqueza diretamente revelada pela própria titularidade de um valor patrimonial - na espécie, a riqueza decorrente da titularidade de direitos sobre bens imóveis de uma certa tipologia. O recorte objetivo decorrente da remissão para certas categorias normativamente previstas no artigo 6.º do Código de IMI, não modifica a essência do AIMI, enquanto imposto estático e analítico sobre o património imobiliário urbano, sem relevarem os réditos que esse ativo económico venha a gerar.
Na verdade, a escolha do facto tributário do AIMI recai sobre realidade económica relevante, pois a titularidade de um prédio imóvel urbano constitui, em si mesma, uma manifestação de riqueza - e uma riqueza determinável, por lhe ser social e juridicamente atribuído um valor de mercado -, revelando uma especial pujança económica, superior à da generalidade dos cidadãos, que potencia posição negocial no comércio jurídico em geral, em especial a capacidade de angariar meios de financiamento. Exprime uma abastança, que não se mostra por qualquer forma infirmada pela forma como foi obtida (permanece inalterada caso a titularidade de direitos sobre prédios urbanos seja adquirida por ato oneroso ou gratuito), ou pela sua afetação a uma atividade económica, que pode ou não gerar lucro: como sublinha Sérgio Vasques, «[q]uando se tributa a substância do património não se está a tributar o rendimento pela segunda vez, está-se a tributar algo diferente» («Capacidade Contributiva, Rendimento e Património», Fiscalidade - Revista de Direito e Gestão Fiscal, n.º 23, Coimbra, 2005, p. 39).
Esse tem sido, aliás, o entendimento acolhido pelo Tribunal Constitucional perante problema idêntico.
Efetivamente, a questão de saber se a própria detenção de imóvel é idónea a revelar acrescida capacidade contributiva, independentemente da natureza jurídica do sujeito passivo e da atividade económica por este desenvolvida, mormente a exploração de uma atividade de índole imobiliária, foi já apreciada pela jurisprudência constitucional, com referência ao imposto que o AIMI substituiu. No Acórdão n.º 378/2018, o Plenário apreciou a conformidade constitucional da norma constante da verba 28.1. da Tabela Geral do Imposto do Selo, na parte em que impõe a tributação anual sobre a propriedade de terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a €1.000.00,00. Fê-lo no âmbito de recurso previsto no artigo 79.º-D, por se verificar oposição de julgados entre os Acórdãos n.º 250/2017 e 568/2016, afastando o entendimento de que naquele imposto se desconsiderava a natureza empresarial do sujeito passivo e confundia manifestações de riqueza e fatores de produção dessa mesma riqueza, ao mesmo tempo que se reconheceu que a titularidade do bem imóvel e a sua afetação social constituem índices seguros de capacidade contributiva. Pode ler-se no referido aresto:
«Deve (...) sublinhar-se que o imposto previsto na Verba 28.1., como é próprio dos impostos sobre o património, delimita o seu âmbito de incidência por referência exclusiva à titularidade de determinados valores patrimoniais, “independentemente da função desempenhada por tais activos (capital produtivo, aplicação de fundos ou poupança ou consumo duradouro)” (Decisão Sumária n.º 214/2017). Por outro lado, sendo um imposto sobre o património, também não individualiza nem distingue os respetivos sujeitos passivos por recurso a outro critério que não seja precisamente a titularidade desses valores patrimoniais. Assim, aplica-se indistintamente a pessoas singulares e pessoas coletivas e, dentre desta categoria, a associações, fundações e sociedades comerciais, independentemente do ramo económico em que estas últimas operem e dos específicos riscos comerciais existentes nos respetivos setores de atividade, aliás próprios de toda e qualquer atividade comercial.
A norma em causa parte da ponderação de concretas situações jurídico-patrimoniais, delimitadas em função do valor patrimonial tributário do imóvel e sua afetação social normal, integrando no seu âmbito subjetivo de aplicação um conjunto indeterminado de contribuintes de acordo com um critério uniforme: a titularidade de terrenos para construção de edifícios para habitação de elevado valor patrimonial tributário. Em relação a nenhum deles é valorada a sua concreta situação económico-financeira (rendimentos ou lucros), a sua natureza (singular ou coletiva), estrutura de organização (empresarial ou não empresarial), concreta forma jurídica assumida (sociedade comercial ou outra) e, muito menos, os diversos setores de atividade em que eventualmente atuam os comerciantes abrangidos e os riscos inerentes a cada um desses ramos de atividade.
A mera probabilidade estatística de serem atingidos pela norma em questão sociedades comerciais dedicadas à promoção imobiliária, associada à ponderação de variáveis económicas de verificação incerta, como seja o impacto económico do imposto nesse particular ramo de atividade comercial – cujo valor, aliás, não deixará de ser considerado como custo da atividade -, não constitui razão suficientemente sólida para suportar um juízo de inconstitucionalidade da norma em causa, na específica hipótese em apreciação, considerando, além do mais, o caráter negativo do controlo constitucional ditado pelo princípio da igualdade.
O Requerente confunde detenção de bens imóveis com isenção de imóveis em actividades económicas, pois, conforme já foi abundantemente explicado a exclusão é pela afectação do imóvel e não desse imóvel a uma actividade específica.
O racional da delimitação da incidência do imposto em pauta não decorre da atividade económica exercida pelo sujeito passivo, mas sim, tal como no IMI, da afetação social do prédio urbano.
Mas mesmo que assim não fosse, como se salienta no Acórdão n.º 711/2006, em passo transcrito no Acórdão n.º 590/2015, «[a]veriguar (...) da existência de um particularismo suficientemente distinto para justificar uma desigualdade de regime jurídico, e decidir nessa averiguação, é tarefa que primariamente cabe ao legislador, que detém o primado da concretização dos princípios constitucionais e a correspondente liberdade de conformação. Por isso, o princípio da igualdade se apresenta fundamentalmente, em sede de controlo da constitucionalidade, como um princípio negativo (...) – como proibição do arbítrio».
Por último umas poucas palavras sobre uma eventual objecção dos sujeitos passivos que adquirem prédios urbanos habitacionais para venda ou terrenos para construção de edificações, qualquer que seja a respetiva finalidade, e que fazem disso a sua atividade social, detêm os prédios para um fim último de índole comercial.
Dir-se-á, então, que a diferença a que atende o legislador – excluindo estes prédios do âmbito da norma de desagravamento fiscal - não possui natureza e peso suficientes para justificar um tratamento desigual.
Todavia, a situação fiscal dessas empresas já é considerada no âmbito interno do IMI. Com efeito, nos casos de aquisição de prédios para revenda e de terrenos para construção, prevê-se nas alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 9.º do CIMI a não sujeição ao IMI durante três e quatro anos, respetivamente, e, por força da alínea a) do n.º 3 do artigo 135.º-C do mesmo diploma, a não sujeição ao AIMI, em relação aos sujeitos passivos que estão coletados para o exercício dessa atividade. Durante o período de «não tributação» não há qualquer efeito tributário a considerar em sede de IMI, não sendo o imóvel uma realidade qualificada como prédio para efeitos fiscais. A razão de ser da não consideração tributária encontra-se no facto de o imóvel durante esse lapso de tempo ser compreendido como mercadoria para os demais efeitos fiscais. Como sublinha José Pires (Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 3.ª edição, 2015, p. 415), «o regime fiscal em IMI dos prédios comprados para revenda justifica-se pelo princípio de que este não é um imposto sobre as mercadorias mas sobre a riqueza, pelo que não se aplica a prédios para revenda que sejam considerados mercadorias no ativo de uma empresa que exerce aquela atividade. É por essa razão que o legislador fez questão de colocar sistematicamente este regime no capítulo da incidência do imposto e não no das isenções ou no Estatuto dos Benefícios Fiscais. É também por essa razão que a Lei define que a sujeição desses prédios a imposto só se inicia no final do terceiro ano seguinte àquele em que foram afetos ao ativo permutável das empresas. Por essa razão, e em sentido contrário, antes desse momento em que se inicia a tributação não existe sujeição a imposto».
Em relação a esta espécie de imóveis apenas há diferenciação na estrutura do AIMI após três e quatro anos da detenção dos imóveis para venda ou construção. Todavia, após esse prazo, há motivo razoável bastante para distinguir, à luz do critério normativo em escrutínio, as diferentes espécies de prédios urbanos, pois a função que passaram a desempenhar já os diferencia dos prédios urbanos abrangidos na norma de exclusão tributária, atendendo à finalidade extrafiscal por ela visada.
Quanto aos prédios urbanos explorados para arrendamento, em face do critério do destino enunciado na norma de exclusão tributária, não se encontram na mesma situação de igualdade que os prédios abrangidos por essa norma, já que a locação do prédio integra uma das formas normais de fruição do direito de propriedade sobre eles, o que é bem diferente da realização das atividades económicas pela via da afectação dos prédios que se pretende proteger com o desagravamento fiscal.
E, tal como se concluiu relativamente ao propósito de promoção das estruturas económicas, também a esta luz a nova tributação satisfaz as exigências do princípio da proporcionalidade. Mostra-se adequada à finalidade visada – propicia o aumento de receitas -, é necessária – a diversificação e acréscimo das fontes de financiamento da Segurança Social é condição da sua sustentabilidade – e não se mostra desmedida, seja em função das taxas aplicáveis, designadamente às pessoas coletivas (artigo 135.º-J do CIMI), seja porque o imposto pago é dedutível à matéria tributável em IRC (artigo 135.º-J do CIMI).
Em suma, não surpreende este Tribunal qualquer inconstitucionalidade do artigo 135.º B, do CIMI, não merecendo a tributação do AIMI qualquer censura à luz dos princípios da igualdade, da proporcionalidade e da capacidade contributiva (artigos 13.º, 18.º, n.º 2 e 104.º, n.º 3, da Constituição).
IV. Decisão
Termos em que acorda o presente Tribunal em:
Julgar totalmente improcedente a presente acção arbitral e em consequência:
a) Absolver a Requerida do pedido;
b) Manter na ordem jurídica o acto tributário objecto da presente acção arbitral; e
c) Condenar a Requerente nas custas do processo, no montante abaixo fixado
V. Valor do Processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, e 297.º, n.º 2 do C.P.C., do artigo 97.º-A, n.º 1, al. a) do C.P.P.T. e do artigo 3.º , n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de €57.416,44 (cinquenta e sete mil, quatrocentos e dezasseis euros e quarenta e quatro cêntimos).
VI. Custas
De acordo com o previsto nos artigos 22.º, n.º 4, e 12.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem, no artigo 2.º, no n.º 1 do artigo 3.º e nos n.ºs 1 a 4 do artigo 4.º do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, bem como na Tabela I anexa a este diploma, fixa-se o valor global das custas em 2.142,00€ (dois mil cento e quarenta e dois euros).
Notifique-se
Lisboa, 12 de Setembro de 2019
O árbitro Singular
António Pragal Colaço
(1) De ora em diante abreviadamente designado por CIMI;
(2) O que faz lembrar muito de perto os célebres impostos de natureza cedular, imposto profissional, imposto sobre as mais valias, imposto de capitais, contribuição predial, contribuição industrial, existindo depois um imposto de visão de Águia sobre todos os rendimentos, o Imposto Complementar;
(3) “Sucede hoje o seguinte: tanto nos concelhos que já se encontram em regime de cadastro como naqueles ainda sujeitos ao código de 1913, a contribuição predial rústica incide, ao menos em linha de princípio, sobre a renda fundiária mais o lucro do cultivador. Mas a renda e o lucro são rendimentos que não só respeitam muitas vezes a pessoas diferentes como têm diversa natureza e estabilidade, requerendo cada um o seu tratamento próprio e o seu próprio método de determinação. Basta dizer-se que a renda é a parte do produto atribuível ao capital fundiário, pelo que sofre variações lentas, enquanto o lucro compete ao capital investido na exploração, aumentando ou diminuindo de ano a ano. É um lucro como o das empresas industriais e comerciais, apenas menos definido, menos individualizado que o destas, por virtude das particulares características económicas e sociais da nossa produção agrícola.” In. Preâmbulo do Decreto 45104, de 1/7/1963;
(4) Impunha-se, pois, distinguir sempre as duas tributações: a da renda e a do lucro, sujeitando a renda à contribuição predial rústica e tornando o lucro passível ou do imposto que viesse a incidir sobre o rendimento líquido das demais empresas ou de um imposto próprio que representasse o desdobramento da antiga contribuição predial. Foi-se para a última solução, visto ter-se entendido prematura a inclusão dos lucros agrícolas na contribuição industrial, por não se lhes ajustarem ainda os mesmos métodos de determinação. Criou-se, assim, embora apenas para lucros avultados, o imposto sobre a indústria agrícola. E a circunstância de grande número das disposições relativas à contribuição predial rústica ser aplicável ao novo imposto excluiu a hipótese de distribuir por dois diplomas o que num só mais eficientemente podia ser regulado. Deste modo se facilita o trabalho do intérprete e o melhor entendimento da lei.
(5) Ainda hoje isso é totalmente aplicável, cfr. ex: art.º 12.º, n.º 1 do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis;
(6) A par da criação das designadas contribuições extraordinárias, cujo regime constitucional tem sido levado até ao Tribunal competente, como são a Taxa da Segurança Alimentar Mais, Decreto Lei 119/2012, de 29 de Junho e Portaria 215/2012, de 17 de Julho, Portaria n.º 215/2012, de 17 de Julho, Portaria n.º 200/2013, de 31 de Maio, Portaria n.º 66/2016, de 1 de Abril e Portaria n.º 107-A/2017, de 14 de Março, Portaria 102/2018, de 16 de Abril, Portaria 326/2018, de 14/12, Contribuição sobre o Sector Bancário, Lei 55-A/2010, de 31 de Dezembro, Lei 7-A/2016 de 30/3, Portaria 165-A/2016, de 14 de Junho, Art.º 185.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30/03, Art.º 238.º da Lei n.º 42/2016, de 28/12, Art.º 279.º da Lei n.º 114/2017, de 29/12, Lei 114/2017 de 29/12 e Lei 71/2018, de 31/12, Contribuição Extraordinária sobre o Sector Energético, (CESE) regime aprovado pelo art.º 228.º da Lei n.º 83-c/2013, de 31 de dezembro, prorrogado pelo art.º 237.º da Lei n.º 82-b/2014, de 31 de Dezembro, Lei 33/2015, de 27 de Abril, Portaria n.º 119-b/2015, de 30 de abril, Lei 159-C/2015, de 31 de Dezembro, Lei 114/2017, de 29/12, Lei 71/2018, de 31/12, Contribuição Extraordinária sobre a Indústria Farmacêutica, Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro, artigo 168.º, Portaria 77-A/2015, de 16/3/2015, Lei 159-C/2015, de 31 de Dezembro, Lei 71/2018, de 31/12, as quais vieram para ficar;
(7) Seguimos muito de perto, o recente Acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional, Acórdão Nº 299/2019, Processo n.º 752/2018, Conselheiro Fernando Ventura
(8) O que acaba por constituírem os argumentos citados os argumentos retratados no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 299/2019, onde se lê: i) por um lado, considera desrazoável e sem fundamento material que o legislador não sujeite a tributação os prédios urbanos classificados, de acordo com o regime do IMI, como «comerciais, industriais ou para serviços» e «outros», com o propósito declarado de proteger o tecido empresarial, mas, paralelamente, admita a incidência do novo imposto sobre os prédios que constituam o substrato de uma atividade económica, mormente de atividades de índole imobiliária, cujos resultados económicos – entende – representam o único índice relevante de acrescida capacidade contributiva; (ii) por outro, questiona o facto de o sentido normativo impugnado comportar a tributação de terrenos para construção com afetação estabelecida a fins de comércio, indústria ou serviços, quando a tributação é excluída relativamente aos prédios edificados para essas mesmas finalidades, independentemente da efetiva utilização produtiva.
(9) Acórdão n.º 84/2003 do Tribunal Constitucional;
(10) Em 1997 através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 119/97, publicada no dia 4/7/1997, foram definidos os quadros gerais do futuro sistema fiscal do património adequado à modernização e desenvolvimento de Portugal no limiar do séc. XXI.
Visou-se a criação de um imposto único sobre o património, com os seguintes princípios:
a. Será analítica, real, proporcional, periódica e de cobrança por retenção na fonte, sempre que tecnicamente possível;
b. O imposto único sobre o património, a lançar, incidirá sobre o valor dos bens imóveis e sobre os valores patrimoniais imobiliários a especificar na lei;
c .O imposto incidirá sobre valores reais mas, quando se torne indispensável ou conveniente, tributará os valores normais, devidamente fundamentados;
d. O imposto único sobre o património substituirá a sisa, o imposto sobre as sucessões e doacções e a contribuição autárquica a suprimir na data da sua entrada em vigor