Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 7/2019-T
Data da decisão: 2019-07-26  IVA  
Valor do pedido: € 20.025,86
Tema: IVA – Faturação relativa a prestações de serviços – não enquadramento na previsão da alínea f) da verba 4.2, da Lista I anexa do CIVA.
Versão em PDF

DECISÃO ARBITRAL

 

O Árbitro Alexandre Andrade, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (adiante designado apenas por CAAD) para formar o Tribunal Arbitral Singular, constituído em 18 de Março de 2019, decide no seguinte:

 

1. Relatório

 

A... (adiante designado apenas por Requerente), com sede na Rua ..., n.º..., ...-... ..., NIF..., apresentou um pedido de constituição de Tribunal Arbitral, nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, adiante designado apenas por RJAT), em que é Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (adiante designada apenas por Requerida).

No Pedido de Pronúncia Arbitral, requer, a final, a Requerente, Termos em que: a) Deve ser anulado o ato de indeferimento da Reclamação Graciosa supra identificado, e, consequentemente anuladas as liquidações supra enumeradas, nos termos impugnados, com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei e b) Deve ser determinada a devolução à Requerente do valor de € 20.025,86, imposto por ela pago indevidamente, com o pagamento de juros indemnizatórios a favor da Requerente desde 6/12/2018 até à data de efetiva restituição por parte da AT.

Ou seja, com o Pedido de Pronúncia Arbitral a Requerente pretende, por um lado, a declaração de ilegalidade da decisão da AT (aqui Requerida) na reclamação graciosa n.º...2018...e a consequente anulação das liquidações adicionais de IVA, relativas aos anos de 2013 e 2014, com os números: (i) Liquidação n.º 2017.../ demonstração acerto de contas n.º 2017... e n.º 2017..., no valor de € 642,66; (ii) Liquidação n.º 2017.../ demonstração acerto de contas n.º 2017 ... e n.º 2017..., no valor de € 10.585,24; (iii) Liquidação n.º 2017 .../ demonstração acerto de contas n.º 2017... e n.º 2017..., no valor de € 1.448,61; (iv) Liquidação n.º 2017.../ demonstração acerto de contas n.º 2017 ... e n.º 2017..., no valor de € 2.306,53; (v) Liquidação n.º 2017.../ demonstração acerto de contas n.º 2017... e n.º..., no valor de € 4.638,55; (vi) Liquidação n.º 2017 .../ demonstração acerto de contas n.º 2017..., no valor de € 85,00 e (vii) Liquidação n.º 2017.../ demonstração acerto de contas n.º 2017 ... e n.º..., no valor de € 319,20, no montante global de € 20.025,86, e, por outro, o reembolso do valor do imposto pago - € 20.025,86 -, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal, nos termos do artigo 43.º da Lei Geral Tributária (LGT).

Refere a Requerente no Pedido de Pronúncia Arbitral que As liquidações fundamentam-se em correção efetuada pelos Serviços de Inspeção Tributária (adiante SIT), no âmbito das OI 2015... e 2017... . A correção efetuada fundamentou-se no não enquadramento em sede de IVA da faturação relativa a prestações de serviço prestada pela requerente no ano de 2013 e parte de 2014, designadamente o seu não enquadramento na previsão na alínea f) da verba 4.2, da Lista I anexa do CIVA .

Nas palavras da Requerida, na sua Resposta, O presente pedido de pronúncia arbitral tem por objecto as liquidações adicionais de IVA emitidas no seguimento dos procedimentos de inspecção realizados aos exercícios de 2013 e 2014, a coberto das ordens de serviço n.º OI2015... e OI2017..., cujo relatório (RIT), sendo parte integrante do processo administrativo, se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais. Na referida acção inspectiva, os serviços de inspecção (SIT) concluíram que a Requerente emitiu inúmeras facturas liquidando IVA à taxa reduzida (6%) pois, erradamente, considerou que esses serviços se enquadravam na alínea f) da verba 4.2 da Lista I anexa ao Código do IVA . Por seu turno, entende a Requerente que as liquidações em causa são ilegais, na medida em que a AT fez uma errada interpretação daquela mesma verba. Todavia, a argumentação, de facto e de direito, invocada pela Requerente está, salvo o devido respeito, longe de fundamentar e de sustentar a pretensão formulada, que deve improceder, como de seguida se demostrará.

Diz ainda a Requerida na sua Resposta, Ou seja, parece resultar claro que a Requerente prestou serviços técnicos e não de assistência técnica, uma vez que esses serviços, de acordo com o descritivo constante das facturas, consistem na mera elaboração de candidaturas e na elaboração e/ou acompanhamento de projectos, sem qualquer assistência na aquisição de uma informação tecnológica de que a Requerente disponha . Consequentemente, não assiste razão à Requerente quando pretende incluir os serviços que presta no conceito de assistência técnica e, desse modo, sujeitá-los à taxa reduzida de IVA, devendo as liquidações impugnadas, porque legais, ser mantidas na ordem jurídica.

Pede, a final, a Requerida, o seguinte: Nestes termos, e nos mais de direito, [...], deve o presente pedido de pronúncia arbitral ser julgado improcedente por não provado, e, consequentemente, absolvida a Requerida de todos os pedidos, tudo com as devidas e legais consequências.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 7 de Janeiro de 2019 e posteriormente notificado à Requerida.

Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico do CAAD designou como Árbitro do Tribunal Arbitral Singular o signatário, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 26 de Fevereiro de 2019, foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral Singular foi constituído em 18 de Março de 2019.

Em 19 de Março de 2019, o Tribunal Arbitral Singular proferiu o seguinte Despacho Arbitral: Tendo sido constituído o Tribunal Arbitral, notifique-se, nos termos do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT), o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária para, no prazo de 30 (trinta) dias, apresentar resposta e, caso queira, solicitar a produção de prova adicional, acrescentando que deve ser remetido ao Tribunal Arbitral cópia do processo administrativo dentro do prazo de apresentação da resposta, aplicando-se, na falta de remessa, o disposto no n.º 5 do artigo 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

Em 29 de Abril de 2019 a Requerida apresentou Resposta e juntou o Processo Administrativo.

Em 9 de Maio de 2019, o Tribunal Arbitral Singular proferiu o seguinte Despacho Arbitral: A Requerente apresentou o seu Pedido de Pronúncia Arbitral. A Requerida apresentou a sua Resposta. De harmonia com o Princípio do Contraditório, assegurado, designadamente, através da faculdade conferida às Partes de se pronunciarem sobre quaisquer questões de facto ou de direito suscitadas no processo, e do Principio da Autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo, antes de mais, notifique-se a Requerente para, no prazo de 10 (dez) dias, informar se, face às posições das Partes, assumidas nos Articulados, mantém interesse na inquirição da testemunha por si arrolada, ou se prescinde da mesma. Mantendo-se o interesse da Requerente naquela inquirição, deverá esta, no mesmo prazo, indicar quais os concretos pontos do Requerimento Inicial que serão objeto daquele tipo de prova. Do presente Despacho Arbitral notifiquem-se ambas as Partes. O Requerente nada respondeu.

Em 28 de Maio de 2019, o Tribunal Arbitral Singular proferiu o seguinte Despacho Arbitral: A Requerente apresentou o seu Pedido de Pronúncia Arbitral. A Requerida apresentou a sua Resposta. Em 9 de Maio de 2019, foi a Requerente notificada do seguinte Despacho deste Tribunal Arbitral: De harmonia com o Princípio do Contraditório, assegurado, designadamente, através da faculdade conferida às Partes de se pronunciarem sobre quaisquer questões de facto ou de direito suscitadas no processo, e do Principio da Autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo, antes de mais, notifique-se a Requerente para, no prazo de 10 (dez) dias, informar se, face às posições das Partes, assumidas nos Articulados, mantém interesse na inquirição da testemunha por si arrolada, ou se prescinde da mesma. Mantendo-se o interesse da Requerente naquela inquirição, deverá esta, no mesmo prazo, indicar quais os concretos pontos do Requerimento Inicial que serão objeto daquele tipo de prova. A este Despacho do Tribunal Arbitral, a Requerente nada disse. Não existe matéria de exceção sobre a qual as Partes careçam de se pronunciar. Não se vê utilidade em realizar a reunião prevista no artigo 18.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), pelo que, de harmonia com os Princípios da Autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo, da Celeridade, da Simplificação e Informalidade Processuais (alínea c) do artigo 16.º, n.º 2 do artigo 19.º e n.º 2 do artigo 29.º, todos do RJAT), dispensa-se a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e determina-se que o processo prossiga com alegacões escritas facultativas, por um período de 10 (dez) dias, iniciando-se com a notificação do presente Despacho Arbitral o prazo para alegacões da Requerente e com a notificação da apresentação das alegacões da Requerente, ou com o final desse prazo, na falta de apresentação das mesmas, o prazo para alegações da Requerida. Indica-se o dia 26 de Julho de 2019 como prazo para prolação da Decisão Arbitral. Nos termos do n.º 4 do artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a Requerente deverá efetuar o pagamento da taxa arbitral subsequente, comunicando esse pagamento ao CAAD. Em nome do Princípio da Colaboração das Partes, solicita este Tribunal Arbitral o envio das peças processuais em formato Word. Do presente Despacho Arbitral notifiquem-se ambas as Partes.

As Partes não apresentaram alegações.

Em 15 de Julho de 2019, o Tribunal Arbitral Singular proferiu o seguinte Despacho Arbitral: A Requerente, no Pedido de Pronúncia Arbitral, protestou juntar a Procuração. Não o fez até agora. Notifique-se a Requerente para juntar a Procuração antes da data fixada por este Tribunal Arbitral Singular para prolação da Decisão Arbitral, i.e, antes do dia 26 de Julho de 2019.

Em 24 de Julho de 2019, a Requerente apresentou requerimento requerendo a junção aos autos de procuração forense, com ratificação do processado, a favor do signatário.

O Tribunal Arbitral Singular é competente e foi regularmente constituído.

As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, ambos do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e o pedido foi tempestivamente apresentado. Não se verificam quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

2. Matéria de Facto

2.1 Factos Provados

Analisada a prova produzida no âmbito do presente Processo, o Tribunal Arbitral Singular considera provados, com relevo para esta Decisão Arbitral, os seguintes factos:

A.           A Requerente tem a natureza jurídica de Associação.

B.            A Requerente encontra-se inscrita como sujeito passivo de IVA, tendo iniciado atividade em 1 de Janeiro de 1989, estando enquadrada no regime normal de periodicidade trimestral. A Requerente é, para efeitos de IVA, um sujeito passivo não isento.

C.            A Requerente desenvolve a atividade principal de “Atividades de organizações económicas e patronais”, com o CAE 94110.

D.           A Requerente desenvolve também as atividades secundárias de “Formação profissional”, com o CAE secundário 85591 e de “Outras atividades de consultoria, científicas, técnicas e similares, n.e.”, com o CAE secundário 74900.

E.            No âmbito das suas atividades, a Requerente presta serviços aos seus associados/ membros.

F.            A Requerente prestou serviços relacionados com projetos/ candidaturas a programas de apoio para os seus associados, mais concretamente, relativos a elaboração de projetos/ candidaturas, acompanhamento de projetos/ candidaturas, elaboração de pedidos de pagamento de projetos/ candidaturas.

G.           No seguimento das prestações de serviços referidas em F. do 2.1 dos Factos Provados, a Requerente emitiu (entre outras), entre 2013-02-22 e 2014-03-06, faturas com as seguintes descrições: “Elaboração candidatura PU-AAR”, “Elaboração Pedido Pagamento Projeto”, “Elaboração de projeto proder ação 111”, “Elaboração de IE”, “Elaboração de candidatura PU-Pernes”, “Elaboração de candidatura PU-VFX”, “Elaboração de candidatura Vitis”, “Elaboração de Projeto Intempéries Medida 152”, “Elaboração/ Acompanhamento Projeto PRODER”, “Elaboração Pedido Pagamento Intercalar – Ação 112” e “Primeiro Pedido pagamento – ação 112”.

H.           As faturas referidas em G. do 2.1 dos Fatos Provados foram emitidas com IVA à taxa reduzida de 6%.

I.             A Requerente, em momentos anteriores e também em momentos posteriores ao período entre 2013-02-22 e 2014-03-06 emitiu, com descritivos idênticos aos indicados em G. do 2.1 dos Fatos Provados, faturas com IVA à taxa normal, i.e., à taxa de 23%.

J.             Ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2015... e da Ordem de Serviço n.º OI2017..., foram desenvolvidos os procedimentos inspetivos externos para os períodos de 2013 e 2014.

K.            Os procedimentos foram motivados pelo facto das Autoridades competentes terem detetado indícios de irregularidades praticadas pela Requerente em sede de IVA.

L.            No seguimento dos procedimentos inspetivos, foram emitidas as seguintes liquidações adicionais: (i) Liquidação: n.º 2017.../ demonstração acerto de contas n.º 2017... e n.º 2017..., no valor de € 642,66, relativa ao período 201303T; (ii) Liquidação n.º 2017.../ demonstração acerto de contas n.º 2017... e n.º 2017..., no valor de € 10.585,24, relativa ao período 201306T; (iii) Liquidação n.º 2017.../ demonstração acerto de contas n.º 2017 ... e n.º 2017..., no valor de € 1.448,61, relativa ao período 201309T; (iv) Liquidação n.º 2017 .../ demonstração acerto de contas n.º 2017... e n.º 2017..., no valor de € 2.306,53, relativa ao período 201312T; (v) Liquidação n.º 2017.../ demonstração acerto de contas n.º 2017... e n.º..., no valor de € 4.638,55, relativa ao período de 210403T; (vi) Liquidação n.º 2017.../ demonstração acerto de contas n.º 2017..., no valor de € 85,00, relativa ao período de 201406T e (vii) Liquidação n.º 2017.../ demonstração acerto de contas n.º 2017 ... e n.º..., no valor de € 319,20, relativa ao período 201412T,

M.          As liquidações adicionais referidas em L. do 2.1 dos Factos Provados, somam, no total, o montante de € 20.025,86.

N.           A Requerente não se conformou com as conclusões dos procedimentos inspetivos, tendo apresentado competente Reclamação Graciosa.

O.           À Reclamação Graciosa apresentada pela Requerente foi dado o n.º ...2018... .

P.            Pelo Ofício datado de 30 de Agosto de 2018, foi a Requerente notificada do projeto de decisão da Reclamação Graciosa, o qual dizia: Face à legislação aplicável corrobora-se o teor da informação infra que, nos termos do artº 77.º da Lei Geral Tributária, fica a fazer parte integrante do presente projeto de despacho como fundamentação, pelo que o pedido irá ser indeferido nos termos propostos. Em conformidade com o disposto na alínea b) do n.º 1 do artº 60º da Lei Geral Tributária, notifique-se para o exercício do direito de audição.

Q.           Notificada a Requerente, esta exerceu o direito de audição.

R.            Pelo Ofício datado de 27 de Setembro de 2018, a Requerente foi notificada da decisão da Reclamação Graciosa, a qual decidiu, Face ao exposto, parece-nos ser de manter o indeferimento do pedido, nos termos propostos na informação que sustenta o projeto de despacho notificado.

S.            A Requerente não se conformou e apresentou Pedido de Pronúncia Arbitral.

T.            No Ponto III – Descrição dos Factos e Fundamentos das Correções Meramente Aritméticas à Matéria Tributável do Relatório de Inspeção Tributária é dito: No decurso da ação inspetiva ao sujeito passivo, em sede de IVA e ao ano de 2013, verificou-se que o mesmo emitiu faturas, datadas de 2013-01-01 e 2013-03-22, com as descrições, entre outras, “Elaboração Projeto Ação 111 do PRODER – finalização do projeto”, “Elaboração projeto PRODER 111” e “Elaboração candidatura PU-AAR”, nas quais liquidou corretamente IVA à taxa de 23% [...]. A partir da fatura n.º 157/20134, também datada de 2013-03-22, a Associação passou a emitir faturas com as descrições, entre outras, “Elaboração candidatura PU-AAR”, “Elaboração Pedido Pagamento Projeto”, “Elaboração de projeto proder ação 111”, “Elaboração de IE”, “Elaboração de candidatura PU-Pernes”, “Elaboração de candidatura PU-VFX”, “Elaboração de candidatura Vitis”, “Elaboração de Projeto Intempéries Medida 152”, “Elaboração/ Acompanhamento Projeto PRODER”, “Elaboração Pedido Pagamento Intercalar – Ação 112” e “Primeiro Pedido pagamento – ação 112”, nas quais liquidou IVA, incorretamente, à taxa de 6% [...]. A Associação manteve esta prática de emissão de faturas, com as descrições acima mencionas, nas quais liquidou IVA incorretamente até à emissão da factura 110/20144, datada de 2014-03-06, com a descrição “Elaboração de candidatura PU-AAR” [...], tendo a fatura n.º 111/20144, de 2014-03-07, igualmente com a descrição “Elaboração candidatura PU-AAR”, sido emitida já com IVA liquidado corretamente à taxa de 23%. [...]. A Associação emitiu assim, entre 2013-03-22 e 2014-03-06, centenas de fatura relativas a prestações de serviços relacionados com projetos/ candidaturas a programas de apoio para os seus associados, mais concretamente relativas a elaboração de projetos/ candidaturas, acompanhamento de projetos/ candidaturas, elaboração de pedidos de pagamento de projetos/ candidaturas, liquidando erradamente IVA à taxa reduzida (6%), por considerar, erradamente, que esses serviços diziam respeito a assistência técnica e tinham enquadramento na alínea f) da verba 4.2 da Lista I anexa ao CIVA. [...].

U.           No Ponto III – Descrição dos Factos e Fundamentos das Correções Meramente Aritméticas à Matéria Tributável do Relatório de Inspeção Tributária é dito: Relativamente aos serviços respeitantes à elaboração de candidaturas/ projetos relacionados com o investimento, com subsídios ou com projetos agrícolas, tem sido entendimento dos serviços da AT [...] que os mesmos não se enquadram na citada alínea f) do verba 4.2 da Lista I, ou em quaisquer das diferentes verbas das listas anexas ao CIV, sendo consequentemente, tributadas à taxa normal dos 23% de acordo com a alínea c) do n.º 1 do artigo 18.º do CIVA, conclusão a que a Associação também chegou, pois, após ter aplicado erradamente a taxa reduzida de 6% às referidas prestações de serviços, entre 2013-03-22 e 2014-03-06, passou a partir de 2014-03-07 a aplicar corretamente a taxa de 23% às prestações de serviços relativas a elaboração de projetos/ candidaturas, acompanhamento de projetos/ candidaturas, elaboração de pedidos de pagamento/ candidaturas.

V.           Em sede de Direito de Audição – Ponto IX – Direito de Audição – Fundamentação do Relatório de Inspeção Tributária, a aqui Requerente disse: Importa referir que em 2014 a AAR teve conhecimento de entendimentos diversos sobre o enquadramento em termos de IVA de diversas operações, tendo, por razões de cautela, resolvido passar a aplicar aos serviços constantes das faturas o IVA à taxa normal. O que não significa que aceitasse o entendimento expresso na Informação Vinculativa constante no anexo IX, até porque esta apenas obriga a Administração Tributária.

2.2 Factos Não Provados

                Não há factos relevantes para esta Decisão Arbitral que não se tenham provado.

2.3 Fundamentação da Fixação da Matéria de Facto

A matéria de facto foi fixada por este Tribunal Arbitral Singular e a sua convicção ficou formada com base nas peças processuais e requerimentos apresentados pelas Partes e nos documentos juntos pelas Partes ao presente Processo.

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor, conforme n.º 1 do artigo 596.º e n.º 2 a 4 do artigo 607.º, ambos do Código Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi das alíneas a) e e) do n.º do artigo 29.º do RJAT e consignar se a considera provada ou não provada, conforme n.º 2 do artigo 123.º Código do Procedimento e do Processo Tributário (CPPT).

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento das pessoas, conforme n.º 5 do artigo 607.º do CPC. Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g. força probatória plena dos documentos autênticos, conforme artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação. 

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes e a prova documental junta aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

3. Matéria de Direito (fundamentação)

No Pedido de Pronúncia Arbitral, a Requerente Pretende [...] que seja declarada a ilegalidade do acto de indeferimento da Reclamação Graciosa e, consequentemente, dos atos de liquidação de IVA acima identificados, devendo os mesmos ser anulados, [...], por padecerem de vício de violação de lei, [...].

Defende a Requerente no Pedido de Pronúncia Arbitral que A correção efetuada fundamentou-se no não enquadramento em sede de IVA da faturação relativa a prestações de serviços prestadas pela requerente no ano de 2013 e parte de 2014, designadamente o seu não enquadramento na previsão na alínea f) da verba 4.2, da Lista I anexa do CIVA.

Para a Requerente as prestações de serviços prestadas [...] e expressas nas faturas junto aos autos de inspeção, expressam assim assistências técnicas que visam melhorar a produção agrícola . Mais, [...] os serviços prestados [...] integram-se pois no critério de utilização normal na produção agrícola [...]. As assistências técnicas feitas [...] assumem-se assim como decisivas para a realização da produção agrícola dos agricultores a que prestam serviços.

Para a Requerente, este entendimento justifica-se, tal como refere no Pedido de Pronúncia Arbitral, porque: No âmbito da Política Agrícola Comum da União Europeia a atividade agrícola e pecuária desenvolve-se quase totalmente no respeito por compromissos assumidos pelos produtores agrícolas junto das autoridades nacionais, inserindo-se nos objetivos da Política Agrícola Comum da União Europeia a melhoria do desempenho agrícola, silvícola, pecuário e ambiental dos países da União, [...]. Nesse quadro, existem as candidaturas ao Regime Pagamento Base e outros compromissos assumidos pelos produtores agrícolas. As disposições legais da União Europeia preveem, nomeadamente, regras que garantam a observância das obrigações estabelecidas pelas disposições relativas aos pagamentos diretos (incluindo controlos e a aplicação de medidas administrativas e de sanções administrativas em caso de incumprimento), as regras relativas à condicionalidade, como os requisitos legais de gestão, as boas condições agrícolas e ambientais, o acompanhamento e a avaliação das medidas pertinentes e as regras relativas ao pagamento de adiantamentos e à recuperação de pagamentos indevidos. Quando um produtor agrícola se candidata a uma ajuda no âmbito da PAC ou PRODER, ele obriga-se a cumprir com todas as disposições legais da União e nacionais, devendo, designadamente, implementar práticas agrícolas e ambientais que respeitem essa legislação. Com a realização de candidaturas, a requerente obriga-se não só a apresentar a documentação necessária ao pagamento direto ou ao compromisso a que o produtor agrícola se candidata como também a prestar toda a assistência técnica necessária ao produtor agrícola , de modo a que este possa, por um lado, cumprir com as suas obrigações e, por outro, ter uma melhor produção agrícola . A assistência técnica prestada pela requerente aos produtores agrícolas concretiza-se também no apoio e aconselhamento no domínio de boas práticas no âmbito da produção integrada, agricultura biológica, uso eficiente da água, atividade pecuária  (…). Toda a assistência técnica da requerente é efetuada por técnicos seus, com habilitações literárias, técnicas e profissionais para a realizar, designadamente engenheiros agrícolas e agrónomos. Esses técnicos desenvolvem a sua atividade quer na sede da requerente, quer nas explorações dos agricultores. No âmbito da sua atividade, os técnicos da requerente desenvolvem os serviços de assistência técnica supra referidos, aconselhando e verificando, designadamente, o cumprimento das obrigações assumidas com as candidaturas aos diversos projetos a que os produtores agrícolas se candidatem, as condições em que se desenvolvem as suas explorações, aconselhando sobre os melhores métodos de produção . Assegurando aos produtores agrícolas práticas produtivas que tenham em consideração a condicionalidade relacionada com a agricultura, tais como, a diversificação das culturas, a manutenção de prados permanentes, incluindo pomares tradicionais onde árvores de fruta são cultivadas em reduzida densidade em prados, e a criação de superfícies de interesse ecológico . Possibilitando melhorias significativas nas produções agrícolas, fazendo também com que os consumidores tenham uma oferta estável de alimentos a preços acessíveis.

Sobre as formalidades das faturas, estipula a alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do Código do IVA (CIVA) o seguinte: as faturas [...] devem conter os seguintes elementos: [...] b) a quantidade e denominação usual [...] dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável . O n.º 6 do artigo 226.º da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, estipula, [...] as únicas menções que devem obrigatoriamente figurar, para efeitos do IVA, nas faturas emitidas [...] são [...] a extensão e natureza dos serviços prestados .

Como ensina Emanuel Vidal Lima in IVA – Imposto sobre o Valor Acrescentado, Comentado e Anotado, 9.ª Edição, 2003, Porto Editora, No n.º 5 do artigo 35.º  do CIVA encontram-se descritos quais os elementos que obrigatoriamente deverão constar das faturas, ficando ao critério do contribuinte a forma e a apresentação desses elementos . Mais ensina o mesmo Autor, no mesmo livro, a faturação das prestações de serviços deverá sempre quantificar e especificar as operações , não podendo aceitar-se, por exemplo, a mera indicação de “serviços prestados”.

No seguimento dos serviços prestados, a Requerente emitiu, entre 22 de Março de 2013 e 6 de Março de 2014, diversas faturas, com as seguintes descrições: “Elaboração candidatura PU-AAR”, “Elaboração Pedido Pagamento Projeto”, “Elaboração de projeto proder ação 111”, “Elaboração de IE”, “Elaboração de candidatura PU-Pernes”, “Elaboração de candidatura PU-VFX”, “Elaboração de candidatura Vitis”, “Elaboração de Projeto Intempéries Medida 152”, “Elaboração/ Acompanhamento Projeto PRODER”, “Elaboração Pedido Pagamento Intercalar – Ação 112” e “Primeiro Pedido pagamento – ação 112”.

Das faturas juntas aos Autos, nada mais consta da “descrição”.

Tal como é referido no Relatório de Inspeção Tributária (ponto T. do 2.1 dos Fatos Provados), A partir da fatura n.º 157/20134, também datada de 2013-03-22, a Associação  passou  a emitir faturas com as descrições , entre outras, “Elaboração candidatura PU-AAR”, “Elaboração Pedido Pagamento Projeto”, “Elaboração de projeto proder ação 111”, “Elaboração de IE”, “Elaboração de candidatura PU-Pernes”, “Elaboração de candidatura PU-VFX”, “Elaboração de candidatura Vitis”, “Elaboração de Projeto Intempéries Medida 152”, “Elaboração/ Acompanhamento Projeto PRODER”, “Elaboração Pedido Pagamento Intercalar – Ação 112” e “Primeiro Pedido pagamento – ação 112”. Tais serviços, prestados pela Requerente aos seus associados/ membros, caracterizam-se, tal como afirmado no Relatório de Inspeção Tributária (ponto T. do 2.1 dos Fatos Provados), como prestações de serviços relacionados com projetos/ candidaturas a programas de apoio para os seus associados, mais concretamente relativas a elaboração de projetos/ candidaturas, acompanhamento de projetos/ candidaturas, elaboração de pedidos de pagamento de projetos/ candidaturas.

De referir, ainda, o seguinte que consta do Relatório de Inspeção Tributária, [...] apesar de em momentos anteriores e também posteriormente, a Requerente ter emitido facturas, com descritivos de serviços semelhantes, nas quais a taxa de IVA liquidado era de 23%, ie, a taxa correcta.

Por um lado, defende a Requerente, que as prestações de serviços prestadas [...] e expressas nas faturas junto aos autos de inspeção, expressam assim assistências técnicas que visam melhorar a produção agrícola , por outro, a defende a Requerida que [...] A Associação emitiu assim, entre 2013-03-22 e 2014-03-06, centenas de faturas relativas a prestações de serviços relacionados com projetos/ candidaturas a programas de apoio para os seus associados, mais concretamente relativas a elaboração de projetos/ candidaturas, acompanhamento de projetos/ candidaturas, elaboração de pedidos de pagamento de projetos/ candidaturas , liquidando erradamente IVA à taxa reduzida (6%), por considerar, erradamente, que esses serviços diziam respeito a assistência técnica e tinham enquadramento na alínea f) da verba 4.2 da Lista I anexa ao CIVA.(...)”.

Ou seja, para a Requerida, na Resposta, parece resultar claro que a Requerente prestou serviços técnicos e não de assistência técnica, uma vez que esses serviços, de acordo com o descritivo constante das facturas, consistem na mera elaboração de candidaturas e na elaboração e/ou acompanhamento de projectos , sem qualquer assistência na aquisição de uma informação tecnológica de que a Requerente disponha. Consequentemente, não assiste razão à Requerente quando pretende incluir os serviços que presta no conceito de assistência técnica e, desse modo, sujeitá-los à taxa reduzida de IVA, [...].

Tem sido entendimento da Autoridade Tributária, aqui Requerida, não enquadrar na alínea f)  da verba 4.2 da Lista I (ou em quaisquer das diferentes verbas das listas anexas ao citado diploma), sendo, consequentemente, tributados à taxa normal em vigor (23%) de acordo com a alínea c) do n.º 1 do artigo 18.º do CIVA, os serviços respeitantes à preparação de candidaturas de projetos relacionados, nomeadamente, com o investimento, subsídios, ou projetos agrícolas . Veja-se o que argumenta a Requerida na Resposta, [...] as prestações de serviços que se traduzam na preparação de candidaturas a projectos de investimento, subsídios ou projectos agrícolas estão excluídas da verba 4.2 porquanto não se tratam de serviços directamente relacionados com a produção agrícola, entendida em sentido literal . E isso é tanto mais relevante porquanto não podemos esquecer que a norma em causa determina a aplicação da taxa reduzida às operações que aí se enquadrem, e, conforme resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), as disposições que permitem a aplicação de uma taxa reduzida de IVA, por constituírem derrogações ao princípio de que é aplicável a taxa normal, devem ser objeto de interpretação estrita.

Mas mais,

A Requerida, deixa claro, nos argumentos apresentados na Reclamação Graciosa o seguinte: a reclamante presta serviços de elaboração de candidaturas e acompanhamento de projetos relacionados com o investimento, efetuadas no âmbito do PRODER. Tendo em atenção todo o exposto, para que os serviços prestados pela reclamante sejam considerados de assistência técnica, para efeitos de aplicação da taxa reduzida prevista na alínea f) da verba 4.2 da Lista I do CIVA, não basta que os destinatários sejam produtores agrícolas, ou que os serviços se traduzam na elaboração de candidaturas e acompanhamento de projectos de investimento relacionados com a produção agrícola . É necessário que contribuam directamente e de forma inequívoca para a “produção agrícola“.

Deixando, também, claro, que, para a Requerida, tal não sucede no caso em apreço .

Assim, entende este Tribunal Arbitral Singular que o thema decidenduum reconduz-se a saber se as prestações de serviços prestadas pela Requerente, indicadas e descritas nas faturas juntas a estes Autos expressam assistências técnicas (na forma de prestações de serviços) que contribuíram para a realização da produção agrícola, enquadráveis, para efeitos de aplicação da taxa reduzida de IVA, na alínea f) do 4.2 da verba 4 da Lista I anexa ao CIVA.  

Vejamos, antes de mais, o que diz a Lei.

Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 18.º do Código do IVA (CIVA), As taxas do imposto são as seguintes: a) Para as importações, transmissões de bens e prestações de serviços constantes da lista I anexa a este diploma, a taxa de 6%.

Nos termos da alínea f) do 4.2 da verba 4 da Lista I anexa ao CIVA , são sujeitas à taxa reduzida de imposto, 4.2 - Prestações de serviços que contribuem para a realização da produção agrícola, designadamente as seguintes [...]: f) A assistência técnica.

Chama este Tribunal Arbitral Singular à fundamentação da presente Decisão Arbitral o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), datado de 30 de Abril de 2002, no âmbito do processo n.º 026797, citado pela Requerida na Resposta, onde este diz: É que, bem vistas as coisas , estas normas devem ser interpretadas à letra , como fizeram as instâncias, pois de contrário o intérprete estava a conceder um benefício fiscal lá onde a lei o não concedeu. Aqui, a interpretação tem limites . Mais diz este Acórdão do STA, no caso, no sumário: I - As normas que conferem benefícios fiscais são normas excepcionais, pelo que podem ser interpretadas extensivamente, mas não comportam integração analógica; II - Ainda que as normas excepcionais possam ser interpretadas extensivamente, por regra estão sujeitas a uma interpretação estrita ou mínima , que não tem de ser restritiva.

No seguimento, chama este Tribunal Arbitral Singular, à fundamentação da presente Decisão Arbitral, a Decisão Arbitral n.º 171/2013-T, datada de 6 de Dezembro de 2014, onde esta decisão refere o seguinte: Além do mais, por configurar uma excepção ao princípio geral (que é o da aplicação de uma taxa normal), a aplicação de taxas reduzidas deve ser, de acordo com a jurisprudência comunitária, interpretada de forma estrita , conforme salientado nos Acórdãos proferidos nos processos n.ºs C-83/99  [...] e C-384/01 [...]. No entanto, continua a Decisão n.º 171/2013-T, a este respeito, deve esclarecer-se que interpretação estrita não é equivalente a interpretação restrita ou restritiva. A jurisprudência do TJUE utiliza a palavra “estrita” (em inglês, “strictly”, em francês “de manière stricte” e em castelhano “estrictamente”), cujo significado é “precisa”, “rigorosa”  (Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, Academia das Ciências de Lisboa, Verbo, I Volume, 2001). Assim, o que este Tribunal Europeu preconiza é uma interpretação literal, também denominada de declarativa, [...]. Na realidade, a correspondência literal ou rigorosa com o texto da norma não implica uma restrição do sentido desta, típica da interpretação restritiva assente no pressuposto de que o texto disse mais do que aquilo que se pretendia dizer, mas sim a eleição de um sentido que o texto directa e claramente comporte , por ser esse [sentido] aquele que corresponde ao pensamento legislativo (cf. João Baptista Machado, “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, Almedina, 2010, 18.ª reimpressão, pp. 185 e 186). Na interpretação estrita ou declarativa, “o sentido literal, ou um dos sentidos literais, cobre aquilo que, definitivamente, se apura ser o que ela pretende exprimir” (cf. Oliveira Ascensão, O Direito. Introdução e teoria geral, Almedina, 10.ª ed., 1999, p. 418). [...] Ora, a existir um qualquer princípio especial de interpretação no domínio da aplicação das taxas reduzidas de IVA, tal princípio só pode ser o de integral e rigoroso respeito pelo sentido (ou sentidos) verbal possível das expressões constantes da lei (princípio de interpretação estrita ou declarativa) .

Como salientou a Dra. Manuela Rosário, Consultora da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, in Vida Económica, 10 de Abril de 2015, sobre o tema “assistência técnica – taxa reduzida de IVA”, Sintetizando, enquadram-se na verba 4.2 apenas  as prestações de serviços que contribuem para a realização da produção agrícola do adquirente dos serviços. E são atividades de produção agrícola aquelas que sejam conexas com a exploração da terra ou em que esta tenha um caráter essencial (não acessório) .

Repete-se o que estipula a Lei, nos termos da alínea f) do 4.2 da verba 4 da Lista I anexa ao CIVA , são sujeitas à taxa reduzida de imposto, 4.2 - Prestações de serviços que contribuem para a realização da produção agrícola, designadamente as seguintes [...]: f) A assistência técnica.  Ou seja, a assistência técnica (o serviço prestado) tem de contribuir para a realização da produção agrícola.

Não há, na Lei, um conceito de “assistência técnica”.

Contudo, há uma posição clara da AT, expressa e fundamentada em Informações Vinculativas, como se referiu, no sentido de não enquadrar na alínea f) da verba 4.2 da Lista I os serviços respeitantes à preparação de candidaturas de projetos relacionados, nomeadamente, com o investimento, subsídios, ou projetos agrícolas.

Entende este Tribunal Arbitral Singular que o importante para efeitos desta Decisão Arbitral é, tendo em conta toda a interpretação a fazer, saber se a prestação de serviços realizada pela Requerente, expressa nas faturas juntas aos Autos, além de ser considerada como “de assistência técnica”, “contribuiu para a realização da produção agrícola”. Acrescenta este Tribunal Arbitral Singular, “contribuiu, de forma direta e inequívoca para a realização da produção agrícola”. 

Defende a Requerente no Pedido de Pronúncia Arbitral que, Com realização de candidaturas, a requerente obriga-se não só a apresentar a documentação necessária ao pagamento direto ou ao compromisso a que o produtor agrícola se candidata como também a prestar toda a assistência técnica necessária ao produtor agrícola , de modo a que este possa, por um lado, cumprir com as suas obrigações e, por outro, ter uma melhor produção agrícola . A assistência técnica prestada pela requerente aos produtores agrícolas concretiza-se também no apoio e aconselhamento no domínio de boas práticas no âmbito da produção integrada, agricultura biológica, uso eficiente da água, atividade pecuária .

No entanto, do descritivo das faturas juntas aos Autos, veja-se, “Elaboração candidatura PU-AAR”, “Elaboração Pedido Pagamento Projeto”, “Elaboração de projeto proder ação 111”, “Elaboração de IE”, “Elaboração de candidatura PU-Pernes”, “Elaboração de candidatura PU-VFX”, “Elaboração de candidatura Vitis”, “Elaboração de Projeto Intempéries Medida 152”, “Elaboração/ Acompanhamento Projeto PRODER”, “Elaboração Pedido Pagamento Intercalar – Ação 112” e “Primeiro Pedido pagamento – ação 112”, resulta apenas que os serviços prestados pela Requerente foram realizados no âmbito especifico da “elaboração de candidaturas”, “elaboração de pedidos de pagamento de projeto”, “elaboração de projetos”, “elaboração/ acompanhamento”, i.e., sem mais referências, nomeadamente, sem qualquer referência a serviços de assistência técnica, serviços de aconselhamento, serviços de apoio, produção agrícola ou outros. Ou seja, sem mais especificação, extensão ou natureza dos serviços. 

As faturas juntas aos Autos, limitam-se a “elaboração de candidaturas”, “elaboração de pedidos de pagamento de projeto”, “elaboração de projetos”, “elaboração/ acompanhamento”, sem mais “descrições”.

Repete-se, como ensina Emanuel Vidal Lima , No n.º 5 do artigo 35.º  do CIVA encontram-se descritos quais os elementos que obrigatoriamente deverão constar das faturas, ficando ao critério do contribuinte a forma e a apresentação desses elementos . Mais ensina o mesmo Autor, no mesmo livro , a faturação das prestações de serviços deverá sempre quantificar e especificar as operações  [...].

Afirma a Requerente no Pedido de Pronúncia Arbitral que a requerente obriga-se não só a apresentar a documentação necessária ao pagamento direto ou ao compromisso a que o produtor agrícola se candidata como também a prestar toda a assistência técnica necessária ao produtor agrícola, no entanto, das faturas, apenas resulta, como já se disse, a “elaboração de candidaturas”, “elaboração de pedidos de pagamento de projeto”, “elaboração de projetos”, “elaboração/ acompanhamento”, sem mais “descrições”.

No âmbito da Reclamação Graciosa, é sintetizado pela Requerida, a aplicabilidade da taxa reduzida não abrange todos e quaisquer serviços que contribuam de algum modo para a globalidade da “atividade agrícola” do contribuinte, ainda que eventualmente considerados por este de assistência técnica. De facto, individualiza a Requerida, no âmbito da Reclamação Graciosa, a sua aplicabilidade encontra-se circunscrita aos serviços de assistência técnica que contribuam para a “produção agrícola“, não abrangendo assim, por exemplo, toda uma serie de serviços de gestão financeira e agrícola, tais como serviços respeitantes à preparação de candidaturas de projectos relacionados, nomeadamente, com o investimento, subsídios ou projectos agrícolas  [...]. Em resumo, individualiza a Requerida, no âmbito da Reclamação Graciosa, a reclamante presta serviços de elaboração de candidaturas e acompanhamento de projectos relacionados com o investimento, efectuadas no âmbito do PRODER . Tendo em atenção todo o exposto, para que os serviços prestados pela reclamante sejam considerados de assistência técnica, para efeitos de aplicação da taxa reduzida prevista na alínea f) da verba 4.2 da Lista I do CIVA, não basta que os destinatários sejam produtores agrícolas, ou que os serviços se traduzam na elaboração de candidaturas e acompanhamento de projectos de investimento relacionados com a produção agrícola . É necessário que contribuam directamente e de forma inequívoca para a “produção agrícola“ o que não sucede no caso em apreço . Para a Requerida, De facto, os serviços prestados pela reclamante , muito embora possam contribuir de algum modo para a globalidade da actividade agrícola dos seus clientes , apenas indirectamente contribuem para a produção agrícola propriamente dita .

Ou seja, destaca este Tribunal Arbitral Singular, da posição da Requerida, o seguinte: para que os serviços prestados, no caso, pela Requerente, pudessem ser considerados de assistência técnica - para efeitos de aplicação da taxa reduzida prevista na alínea f) da verba 4.2 da Lista I do CIVA - não bastava que os destinatários fossem produtores agrícolas ou que os serviços se traduzissem na elaboração de candidaturas e acompanhamento de projetos de investimento relacionados com a produção agrícola. Era necessário que esses serviços, contribuíssem diretamente e de forma inequívoca para a “produção agrícola“.

Para a Requerida, os serviços prestados pela Requerente muito embora pudessem contribuir de algum modo para a globalidade da actividade agrícola dos seus clientes, apenas indirectamente contribuem para a produção agrícola propriamente dita.

Tendo em conta a norma legal - Prestações de serviços que contribuem para a realização da produção agrícola – este Tribunal Arbitral Singular acompanha o entendimento da “necessidade dos serviços contribuírem, de forma inequívoca para a produção agrícola”.

De referir, ainda, o seguinte: na sua Resposta, a Requerida indica que a AT já se pronunciou variadíssimas vezes sobre esta temática, prestando Informações Vinculativas – a título de exemplo, vejam-se as Informações n.º 5228, com despacho de 29.07.2013 [...]. Porque importante para a fundamentação da presente Decisão Arbitral, destaca-se da Informação Vinculativa n.º 5228 , datada de 29 de Julho de 2013, o seguinte: i) A sociedade tem duas áreas principais de atividade, a produção de azeitona e respetiva venda de azeitona ou azeite e a assistência técnica prestada pelo seu único sócio gerente, engenheiro agrónomo com especialidade em olivicultura ; ii) O referido gerente presta serviços de assistência técnica a diversos clientes olivicultores, através de uma avença mensal ou bimensal, mediante a elaboração de pareceres técnicos sobre as suas explorações e mapas de apoio à exploração no que se refere aos tratamentos anuais e trabalhos a realizar no terreno ; iii) As faturas relativas às referidas prestações de serviços têm sido emitidas com IVA à taxa normal, de 23%; iv) Pelo que a requerente pretende saber se as prestações de serviços em causa, uma vez que contribuem para a realização da produção agrícola dos olivicultores, podem ser tributadas à taxa reduzida . [...] 6. A Lista I anexa ao CIVA contempla bens e serviços a que se pode aplicar a taxa reduzida prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 18.º do mesmo diploma. 8. De entre as prestações de serviços mencionadas na verba 4.2 que mais dúvidas tem suscitado relativamente ao enquadramento na citada verba, merece destaque a constante na alínea f) que contempla, prestações de serviços de assistência técnica que, conforme refere a verba, contribuam para a realização da produção agrícola . 9. Assim, as prestações de serviços efetuadas por engenheiros agrónomos no âmbito das produções agrícolas, estão abrangidas nos pressupostos da alínea f)  da verba 4.2 da Lista I anexa ao Código sendo, consequentemente, tributados à taxa reduzida prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 18.º do CIVA. 10. Contudo , no que se refere aos serviços respeitantes à preparação de candidaturas de projetos relacionados, nomeadamente, com o investimento, subsídios, ou projetos agrícolas  (florestação, desmatação, etc.) tem sido entendimento destes Serviços que os mesmos não se enquadram na citada alínea f)  da verba 4.2 da Lista I (ou em quaisquer das diferentes verbas das listas anexas ao citado diploma), sendo, consequentemente, tributados à taxa normal em vigor (23%) de acordo com a alínea c) do n.º 1 do artigo 18.º do CIVA. 11. Assim, em virtude do exposto, as prestações de serviços efetuadas por um engenheiro agrónomo e referidas na alínea ii) do ponto 1 da presente informação, assumindo a natureza de prestação de serviços de assistência técnica, nos termos da alínea f)   da verba 4.2 da Lista I anexa ao Código, são consequentemente, tributadas à taxa reduzida  prevista na alínea a) do n.º 1 Processo: nº 5228 3 do artigo 18.º do CIVA.

Por tudo o que aqui foi exposto, com base nas peças processuais e nos documentos juntos aos Autos pelas Partes, nomeadamente as faturas e o seu descritivo, entende este Tribunal Arbitral Singular que, apesar de terem existido as prestações de serviços por parte da Requerente, expressas nas faturas juntas aos Autos, não ficou demonstrado que essas prestações de serviços tenham contribuído para a produção agrícola propriamente dita. Não ficou demonstrado que as prestações de serviços realizadas pela Requerente tenham contribuído de forma direta e inequívoca para a produção agrícola. Não ficou demonstrado que as prestações de serviços realizadas pela Requerente tenham sido decisivas para a realização da produção agrícola dos agricultores a quem a Requerente prestou os serviços.

Pelo que, estipulando a Lei que as prestações de serviços têm de contribuir para a realização da produção agrícola, não tendo ficado, no caso, demonstrado tal contribuição, entende este Tribunal Arbitral Singular que não existe ilegalidade na tributação nos termos em que foram efetuadas as liquidações adicionais de IVA impugnadas, pelo que, não se justifica a sua anulação.

Nos termos do n.º 2 do artigo 608.º do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 29.º do RJAT, este Tribunal Arbitral Singular não está obrigado a apreciar todos os argumentos das Partes, quando a decisão esteja prejudicada pela solução dada, o que no presente processo se traduz na decisão proferida de ilegalidade da liquidação, ficando, assim, prejudicado o conhecimento das restantes questões carreadas para os autos.

4. Pedido de restituição da quantia paga e juros indemnizatórios

A Requerente formula pedido de restituição das quantias arrecadadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, aqui Requerida, bem como o pagamento de juros indemnizatórios.

Sendo de julgar improcedente o Pedido de Pronúncia Arbitral, não se pode concluir pela existência de pagamentos indevidos e, consequentemente, não se justifica, nem a anulação das liquidações de IVA, nem a restituição das quantias pagas pela Requerente, nem o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT.

5. Decisão Arbitral

Nestes termos, decide este Tribunal Arbitral Singular em:

a)            Julgar improcedente o Pedido de Pronúncia Arbitral.

b)           Absolver a Requerida de todos os pedidos.

c)            Condenar a Requerente nas custas do presente processo.

6. Valor do processo

Nos termos do n.º 2 do artigo 306.º do CPC, alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT e n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o valor do processo é fixado em € 20.025,86.

7. Custas

Entende este Tribunal Arbitral Singular que o valor a considerar para efeitos de determinação das custas no presente Pedido de Pronúncia Arbitral é o valor que motivou a constituição deste Tribunal Arbitral Singular, i.e., o valor de € 20.025,86, correspondente ao valor das liquidações impugnadas e inicialmente indicado pela Requerente no Pedido de Pronúncia Arbitral.

Nos termos do n.º 2 do artigo 12.º e do n.º 4 do artigo 22.º, ambos do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 1.224,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 26 de Julho de 2019

Tribunal Arbitral Singular

O Árbitro,

(Alexandre Andrade)