Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 515/2018-T
Data da decisão: 2019-06-25  IRC  
Valor do pedido: € 900.564,45
Tema: IRC – Especialização de exercícios; Provisões não tributadas.
Versão em PDF

DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)


 

I – RELATÓRIO

 

1.            No dia 15 de Outubro de 2018, A... SA, NIPC..., com sede no ..., ... Madrid, representada por B... Lda., com o número de identificação fiscal..., com sede no... – Rua ... n.º..., ..., ...-..., Lisboa, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade do acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) n.º 2017... do período de tributação de 2013 e demonstração de acerto de contas n.º 2017..., no valor de € 900.564,45, bem como da decisão de indeferimento da reclamação graciosa que teve aquela como objecto.

 

2.            Para fundamentar o seu pedido alega a Requerente, em síntese, que a anulação do reforço de uma perda por imparidade, no valor de € 735.774,87, e a reversão de perdas por imparidade (provisões) tributadas, no valor de € 1.818.646,94, perfazendo um total de € 2.554.421,81, são ilegais, bem com a violação do dever de fundamentação pela AT.

 

3.            No dia 16-10-2018, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT.

 

4.            A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

5.            Em 06-12-2018, as partes foram notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar qualquer delas.

 

6.            Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 27-12-2018.

 

7.            No dia 04-02-2019, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se por impugnação.

 

8.            Ao abrigo do disposto nas als. c) e e) do art.º 16.º, e n.º 2 do art.º 29.º, ambos do RJAT, foi dispensada a realização da reunião a que alude o art.º 18.º do RJAT.

 

9.            Tendo sido concedido prazo para a apresentação de alegações escritas, foram as mesmas apresentadas pelas partes, pronunciando-se sobre a prova produzida e reiterando e desenvolvendo as respectivas posições jurídicas.

 

10.          Foi indicado que a decisão final seria notificada até ao termo do prazo previsto no art.º 21.º/1 do RJAT.

 

11.          O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

O processo não enferma de nulidades.

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.

 

Tudo visto, cumpre proferir:

 

II. DECISÃO

A. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

 

1-            A Requerente tinha por objecto a realização das operações típicas das instituições de crédito, designadamente, a concessão de crédito e prestação de garantias bancárias autónomas.

2-            A A... SA foi constituída, em 2011, através de um acto de concentração projectado em Espanha entre a C..., S.A., a D..., S.A. e outras cinco instituições financeiras residentes em Espanha.

3-            A C... e a D... estavam representadas por sucursais em Portugal até essa data.

4-            A Requerente surgiu através da transferência dos activos e passivos (“entrada de activos”) de ambas as sucursais, tendo beneficiado do regime de neutralidade fiscal.

5-            No dia 30 de dezembro de 2013, a Requerente encerrou a sua actividade em Portugal.

6-            Na sequência da referida cessação de atividade, no dia 17 de Abril de 2014, a Requerente submeteu a declaração periódica de rendimentos Modelo 22 referente ao período de tributação de 2013.

7-            Na sequência de uma acção de inspecção interna realizada ao abrigo da ordem de serviço n.º OI2016..., a Requerente foi notificada, a 9 de Abril de 2017, do projecto de correcções do relatório de inspecção.

8-            A 9 de Maio de 2017, a Requerente recebeu a notificação do relatório final da inspecção tributária acima identificada, onde se confirmava o total das correcções no montante de € 2.554.421,81.

9-            Do referido relatório consta, para além do mais, o seguinte:

10-         A Requerente foi notificada, através da demonstração de acerto de contas n.º 2017..., do montante total a pagar de € 900.564,4, correspondendo € 342.697,49 ao retorno do imposto recebido aquando a submissão da declaração modelo 22 de 2013, € 461.945,37 do acerto de imposto a entregar, e € 95.921,59 de juros compensatórios.

11-         A 9 de Novembro de 2017, a Requerente apresentou reclamação graciosa da referida liquidação de IRC.

12-         A 7 de Maio de 2018, a Requerente foi notificada do projecto de decisão da reclamação graciosa que apresentou.

13-         A Requerente não exerceu direito de audição ao referido projecto de decisão, pelo que o mesmo se converteu em definitivo, conforme notificação recebida a 17 de Julho de 2018.

14-         A perda por imparidade anulada pelas correcções efectuadas pela AT, na sequência do procedimento de inspecção tributária anteriormente referido, foi constituída para fazer face a um crédito com garantia pessoal concedido ao cliente da Requerente “E...”.

15-         No exercício de 2013, para além do reforço mencionado, foi também efectuada a utilização da perda por imparidade no seu montante total.

16-         O montante de imparidades registado contabilisticamente em 2012 e 2013 pela Requerente, relativo ao crédito referido, foi o seguinte:

 

17-         Quando a C... cessou a sua Sucursal em Portugal em 2011, foi inscrito no campo 752 (campo em branco) da declaração modelo 22 de 2011 o montante de € 2.263.452,37 €.

 

A.2. Factos dados como não provados

1- Que o montante inscrito no campo 752 (campo em branco) da declaração modelo 22 de 2011 da C..., fosse referente ao saldo aceite em anos anteriores relativo à provisão para risco geral de crédito.

2- Que a Requerente haja pago a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) n.º 2017... do período de tributação de 2013 e a correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2017... .

A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13 , “o valor probatório do relatório da inspecção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.

Os factos dados como não provados devem-se à ausência de prova a seu respeito.

Com efeito, e no que diz respeito ao primeiro facto não provado, não obstante a alegação da Requerente, a AT impugna-o, referindo que “desconhece-se a razão que subjaz à inscrição da quantia de €2.263.452,37 numa linha em branco [campo 752] da declaração de rendimentos modelo 22, e a que rubricas respeita a importância acrescida ao lucro tributável, tanto assim que não foi identificada como respeitando a provisões/perdas por imparidade”.

A Requerente não apresentou qualquer prova no sentido de esclarecer qual a razão da inscrição em causa (limitando-se a alegá-la), quando o podia e devia fazer, já que, para além do mais, segundo o Manual de Preenchimento da Declaração de Rendimentos, Modelo 22, Quadro 07, do exercício em questão, sempre que fosse utilizado o campo 752, deveria juntar­se uma nota explicativa ao processo de documentação fiscal – dossier fiscal, previsto no art.º 130.º.

Deste modo, facilmente, através da junção da referida nota explicativa, poderia a Requerente demonstrar que a inscrição em questão fosse referente ao saldo aceite em anos anteriores relativo à provisão para risco geral de crédito, como alegou.

No que diz respeito ao segundo facto dado como não provado, a Requerente não apresentou qualquer comprovativo do pagamento do imposto liquidado.

Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.

 

B. DO DIREITO

 

                Em causa na presente acção de processo arbitral tributário está, essencialmente, a aferição da legalidade das seguintes correcções efectivadas pela AT, e contestadas pela Requerente:

                - a anulação do reforço de uma perda por imparidade, no valor de € 735.774,87;

- a reversão de perdas por imparidade (provisões) tributadas, no valor de € 1.818.646,94.

Para além disso, argui, ainda, a Requerente a falta de fundamentação da decisão da reclamação graciosa por si apresentada.

Vejamos cada uma destas questões.

 

*

i. da anulação do reforço da perda por imparidade

                Conforme resulta expressamente do RIT a correcção ora em apreço assenta, em suma, no entendimento de que “as condições objetivas para o reconhecimento da imparidade a 100%, já se encontravam reunidas em exercícios anteriores”, verificando-se assim a violação do regime de periodização económica, previsto no n.º 1 do art.º 18.º do CIRC aplicável.

                Relativamente a esta questão, para além do mais, a Requerente invoca jurisprudência do STA na matéria, bem como a circunstância – não questionada pela AT – de que o procedimento da Requerente não causou qualquer dano ao Estado, pelo contrário, traduzindo-se na entrega antecipada de IRC dado que a Requerente apresentou lucro tributável em ambos os exercícios em causa.

Efectivamente, tem sido jurisprudência recorrente do STA que:

“III - O princípio da especialização dos exercícios visa tributar a riqueza gerada em cada exercício e daí que os respectivos proveitos e custos sejam contabilizados à medida que sejam obtidos e suportados, e não à medida que o respectivo recebimento ou pagamento ocorram.

IV - Contudo esse princípio deve tendencialmente conformar-se e ser interpretado de acordo com o princípio da justiça, com conformação constitucional e legal (artigos 266.º, n.º 2 da CRP e 55.º da LGT), por forma a permitir a imputação a um exercício de custos referentes a exercícios anteriores, desde que não resulte de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar a transferência de resultados entre exercícios.”          

                Como se escreveu no Ac. do STA de 09-05-2012, proferido no processo 0269/12:

“Constitui igualmente jurisprudência reiterada deste Supremo Tribunal que a rigidez deste princípio tem de ser colmatada ou temperada com a invocação do princípio da justiça, nas situações em que, estando já ultrapassados todos os prazos de revisão do acto tributário e não havendo prejuízo para o Estado, se deve evitar cair numa injustiça não justificada para o administrado.”.

                Sintetizando, o Acórdão de 02-03-2016, proferido no processo 01204/13, também do STA, refere que:

“Importa apreender que:

1) a imputação de um proveito ou de um custo a um determinado exercício obedece a um critério económico e não a um critério financeiro.

e,

2) que o princípio da especialização de exercícios não é rígido antes deve tendencialmente conformar-se e ser interpretado de acordo com o princípio constitucional da Justiça.”.

                Tem-se, assim, por pacífico que o princípio da periodização do lucro tributável, contido no art.º 18.º do CIRC, deve tendencialmente conformar-se e ser interpretado de acordo com o princípio da justiça, com conformação constitucional e legal (artigos 266.º, n.º 2 da CRP e 5.º/2 da LGT), por forma a permitir a imputação a um exercício de custos referentes a exercícios anteriores, desde que não resulte de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar a transferência de resultados entre exercícios.

Acresce que os tribunais em geral, e também os tribunais arbitrais, julga-se, estão vinculados ao dever de ter “em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito.” (art.º 8.º/3 do Código Civil).

                Por outro lado, e nos termos do art.º 25.º/2 do RJAT, “A decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é ainda susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.”.

                Daí que uma decisão, na matéria sub iudice, que vá contra a jurisprudência firmada pelo STA na matéria, verificando-se, como se verifica, identidade dos factos e do direito a aplicar a estes, entre o presente caso e os já julgados quer pelo STA, quer pelos Tribunais Centrais Administrativos, seria, não só susceptível de recurso nos termos do referido art.º 25.º/2 do RJAT, como, com um elevado grau de probabilidade, passível de ser revogada por aquele Alto Tribunal.

                Com efeito, não estando em causa, quaisquer omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar a transferência de resultados entre exercícios, ter-se-á de concluir que a correcção ora em apreço se deu em violação do disposto no art.º 18.º do IRC, interpretado nos termos da jurisprudência citada.

                Assim, e em suma, não se crê que tivesse qualquer utilidade, pelo contrário (daria azo a tramitação processual adicional inútil e desnecessária), este Tribunal concluir de outra forma, no que diz respeito às correcções ora em apreço, relativas ao exercício de 2013, que não a reafirmada recorrentemente pelos Tribunais estaduais superiores na jurisprudência citada, pelo que deverá ser anulada a correcção ora em apreço, procedendo nesta parte o pedido arbitral.

 

*

b. da reversão de perdas por imparidade (provisões) tributadas

                No que diz respeito a esta matéria, e conforme decorre do RIT, a mesma assenta na falta de demonstração de que as provisões em questão hajam sido efectivamente tributadas em períodos anteriores.

                A Requerente, reitera o alegado em sede de relação graciosa, ou seja, e em suma, que a diferença se justifica porquanto quando a C... cessou a sua Sucursal em Portugal em 2011, foi inscrito no campo 752 (campo em branco) da declaração modelo 22 de 2011 o montante de € 2.263.452,37, referente ao saldo aceite em anos anteriores relativo à provisão para risco geral de crédito, sendo que a diferença entre aquele valor, e o valor corrigido pela AT (€ 1.818.646,94), no montante de € 496.831,82, se deveria a uma reposição de provisões tributadas ocorrida em 2005 que deveria ter sido deduzida e não o foi, por lapso da Requerente mas em seu prejuízo.

                Ora, compulsados os factos dados como provados e não provados, verifica-se que a Requerente não logrou provar a circunstância em que funda a sua oposição às correcções operadas pela AT, e ora sindicadas.

                Claudicando os fundamentos de facto do alegado pela Requerente nesta parte, claudicam necessariamente os fundamentos de direito, incluindo as inconstitucionalidades, por aquela arguidas, na mesma matéria.

                Assim sendo, não se poderá concluir de outra forma, que não a improcedência do pedido arbitral, na parte ora em apreço.

 

*

c. Dos vícios relativos à decisão da reclamação graciosa

Alega a Requerente, por fim, diversas circunstâncias relativas a deficiências de forma relativas à decisão da reclamação graciosa, designadamente no que diz respeito à desconsideração de argumentos e elementos novos que aduziu naquela, enquadrando-as como violação do dever de fundamentação da AT, imposto pelo art.º 77.º da LGT.

                Contudo, a decisão da reclamação graciosa apenas integra o objecto da presente acção arbitral na parte que incide sobre a legalidade da liquidação de imposto que lhes serviu de objecto, e não na parte que se reporte a vícios próprios de tais actos.

                Como explica Carla Castelo Trindade , “Esta é a primeira questão que deve ficar clara: o objecto do processo arbitral é o acto de liquidação (...)”.

                Prossegue a mesma Autora, esclarecendo que “os actos de segundo ou terceiro grau poderão sempre ser arbitráveis, na medida em que comportem, e só nessa medida, eles próprios, a (i)legalidade dos actos de liquidação em causa”.

                Decorrência do quanto se vem de expor, é que “não são arbitráveis os vícios próprios dos actos de indeferimento de reclamações graciosas, de recursos hierárquicos ou de pedidos de revisão do acto tributário porque escapam ao âmbito material da arbitragem tributária.” .

                Como exemplifica ainda a mesma Autora , integram-se nesses vícios próprios dos actos de segundo e terceiro grau, os vícios formais que os inquinem, incluindo a sua falta de fundamentação.

                Ou seja, e em suma, o artigo 2.º do RJAT toma como objecto da competência dos tribunais arbitrais, os actos primários (“actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta”), sendo os actos secundários unicamente relevantes como elementos proporcionadores da tempestividade da pretensão impugnatória, como resulta do artigo 10.º, n.º  1, al. a) daquele Regime, onde se impõe que os pedidos de constituição de tribunal arbitral sejam apresentados no prazo de 90 dias, contado a partir dos factos previstos nos n.º 1 e 2 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

                Daí que, em primeira linha, se esteja no presente processo a sindicar a legalidade do acto de liquidação de IRC da Requerente (objecto directo da competência dos tribunais arbitrais), sendo a legalidade do acto secundário de decisão da reclamação graciosa – cuja função principal no processo arbitral tributário é a de garantir a tempestividade da impugnação arbitral do acto primário – meramente reflexa ou derivada da legalidade daquele.

                Deste modo, e pelo exposto, sendo o objecto da presente acção arbitral o acto de liquidação de IRC, e o acto de decisão da reclamação graciosa apenas e na medida em que incorpore a (i)legalidade daquele primeiro acto, não se incluindo aí, portanto, os vícios próprios de tal actos, incluindo o seu défice de fundamentação, não poderá este Tribunal pronunciar-se sobre esse vício arguido pela Requerente, improcedendo, por isso, o pedido arbitral nessa parte.

 

*

Quanto ao pedido de juros indemnizatórios formulado pelos Requerentes, o artigo 43.º, n.º 1, da LGT estabelece que são devidos juros indemnizatórios quando se determine, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

No caso, não se provou que a Requerente tivesse procedido ao pagamento do montante de imposto liquidado (o que é diferente, note-se, de se ter provado que não pagou).

Deste modo, não poderá proceder o pedido acessório de condenação da Requerida na restituição do imposto indevidamente pago, e dos correspondentes juros indemnizatórios, sem prejuízo, obviamente, da obrigação daquela proceder a tal restituição e ao pagamento dos juros devidos, caso a Requerente demonstre o pagamento do imposto indevidamente liquidado, obrigação essa que a Requerente poderá fazer valer, se necessário, em sede de execução do presente julgado.

 

*

C. DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar parcialmente procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:

a)            Anular parcialmente o acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) n.º 2017... do período de tributação de 2013 e demonstração de acerto de contas n.º 2017..., na parte em que liquidou imposto sobre o reforço da perda por imparidade, no valor de € 735.774,87;

b)           Julgar improcedentes os restantes pedidos arbitrais;

c)            Condenar as partes nas custas do processo, na proporção do respectivo decaimento, fixando-se o montante de € 9.150,00, a cargo da Requerente, e o montante de € 3.702,00 a cargo da Requerida.

 

D. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em € 900.564,45, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

E. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €12.852,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pelas partes na proporção do respectivo decaimento, nos termos acima fixados, uma vez que o pedido foi parcialmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do citado Regulamento.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 25 de Junho de 2019

 

O Árbitro Presidente

(José Pedro Carvalho)

 

O Árbitro Vogal

(Fernando Manuel dos Santos Cardoso)

 

O Árbitro Vogal

(Marcolino Pisão Pedreiro)