DECISÃO ARBITRAL
I - Relatório
1. A A... S.A., pessoa coletiva n.º..., com sede na ... n.º..., ... ..., ...-... Carnaxide (doravante designado por “Requerente”), apresentou, em 29-10-2018, um pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do artigo 2.º n.º 1, alínea a) e do artigo 10.º, n.ºs 1 e 2 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, previsto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66- B/2012, de 31 de Dezembro (doravante abreviadamente designado “RJAT”) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.
2. A Requerente pretende a pronúncia do Tribunal Arbitral com vista a anular o ato de liquidação de Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“AIMI”) n.º 2017..., relativo ao ano de 2017, no valor de €10.726,19 (dez mil setecentos e vinte seis euros e dezanove cêntimos), e, bem assim, o despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças Porto ... que indeferiu a reclamação graciosa n.º ...2018..., em 24-07-2018, sobre o mencionado ato de liquidação.
3. É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante designada por “Requerida”).
4. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira, em 30-10-2018.
5. Nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitro do tribunal arbitral singular o Exmo. Senhor Dr. Olívio Mota Amador que, no prazo aplicável, comunicou a aceitação do encargo.
6. A Requerente foi notificada, em 18-12-2018, da designação do árbitro, não tendo manifestado vontade de recusar a designação, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
7. De acordo com o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral foi constituído em 09-01-2019.
8. A Requerida, devidamente notificada através do despacho arbitral, de 11-01-2019, apresentou, em 12-02-2019, a sua Resposta.
9. O Tribunal Arbitral por despacho, de 13-02-2019, determinou: (i) dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, considerando que não foi invocada matéria de exceção nem existe prova a produzir; (ii) caso as partes pretendam proferir alegações escritas, estas deverão ser produzidas no prazo de 10 dias, com caracter sucessivo, a partir da notificação do presente despacho; (iii) indicar o dia 25 de março de 2019 como prazo limite para a prolação da decisão arbitral.
10. A Requerente e a Requerida não apresentaram alegações.
11. O Tribunal Arbitral através do despacho, de 25-03-2019, alterou para o dia 29-04-2019 o prazo limite para a prolação da decisão arbitral.
12. A posição da Requerente, de harmonia com o disposto no pedido de constituição do Tribunal Arbitral, é, em síntese, a seguinte:
12.1. A Requerente não pode aceitar que a AT, através do ato de liquidação ora controvertido, tenha feito incidir o AIMI sobre o património imobiliário por si detido por resultar evidente que a ratio legis que esteve na génese da regra de exclusão de incidência objetiva, consagrada no n.º 2 do artigo 135.º-B do Código do IMI, assentou, essencialmente, na intenção de não sobrecarregar fiscalmente os sujeitos passivos que, por força das suas atividades económicas, detêm imóveis para a prossecução do respetivo objeto social.
12.2. De facto, tributar estes imóveis significaria tributar diretamente uma “atividade económica” – algo que o legislador expressamente pretendeu evitar ao criar o AIMI. Assim, resulta demonstrado que a liquidação de AIMI sub judice, emitida face ao imóvel detido pela Requerente, afigura-se manifestamente ilegal, por erro nos pressupostos de facto e de direito, devendo a mesma ser prontamente anulada, com todos os efeitos legais.
12.3. A título subsidiário, importa salientar que a liquidação sub judice inclui a tributação de um imóvel que, pela sua natureza, não se pode encontrar abrangido pelo âmbito de incidência objetiva das normas em análise. Efetivamente, para o apuramento do AIMI (alegadamente) devido pela Requerente, a AT contabilizou, para efeitos de determinação do valor tributário deste imposto, o valor patrimonial de um “terreno para construção” destinado à edificação de prédios destinados àqueles fins – o que não pode ser aceite.
12.4. A metodologia de tributação adotada pela AT, no sentido de incluir no valor tributável para efeitos de AIMI os sujeitos passivos detentores de “terrenos para construção” com as finalidades identificadas pelo n.º 2 do artigo 135.º-B do Código do IMI, configura um tratamento discriminatório que atenta contra o princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado nos artigos 13.º e 104.º, n.º 3, da CRP e nos artigos 5.º e 55.º da LGT.
12.5. A título subsidiário e sem prejuízo do quanto foi expendido supra, entende a Requerente que o regime de tributação em AIMI é contrário ao princípio basilar da igualdade, consagrado no artigo 13.º da CRP e, em paralelo, contrário ao princípio da igualdade fiscal e da capacidade contributiva consagrados no artigo 104.º, n.º 3, do mesmo diploma.
12.6. Importa também referir na análise do regime do AIMI que a revogada verba 28 da Tabela Geral de Imposto do Selo (TGIS) e a jurisprudência constitucional proferida sobre a mesma, nomeadamente o Acórdão n.º 250/2017 do Tribunal Constitucional, de 24 de maio de 2017, proferido no processo n.º 156/20. Ora, de acordo com o Tribunal Constitucional a tributação em Imposto do Selo, dos terrenos para construção é violador do princípio da igualdade tributária consagrado nos artigos 13.º e 104.º n.º 3 da CRP. Não obstante estruturalmente distintos, a verdade é que são demais evidentes as semelhanças entre a revogada verba 28 da TGIS e o regime legal do AIMI. Pelo que também nesta perspetiva resulta demonstrado que a aplicação do AIMI aos “terrenos para construção” de entidades que promovam atividades económicas que implicam um tratamento diferenciado e uma desigualdade injustificada entre os contribuintes, em clara violação do princípio da igualdade fiscal e da capacidade contributiva, consagrados nos artigos 13.º e 104.º, n.º 3, da CRP.
12.7. Afigurando-se esta liquidação como manifestamente ilegal deve a Requerente ser integralmente ressarcida do valor do AIMI liquidado com base na mesma, porquanto não devido.
12.8. A Requerente requer igualmente que sejam pagos os respetivos juros indemnizatórios pelo retardamento no recebimento do reembolso solicitado, nos termos previstos nos artigos 43.º e 100.º da LGT.
13. A posição da Requerida, expressa na resposta, pode ser sintetizada no seguinte:
13.1. A tributação consubstanciada no AIMI traduz-se numa imposição específica sobre o património (cf. art.º 4.º, n.º 1 da LGT) e não sobre o rendimento. Como qualquer imposto sobre o património, o AIMI está dissociado de uma eventual realização de lucro com a venda dos bens imóveis, bem como da existência, ou não, de situação líquida negativa ou positiva, relevando, para a economia do imposto, apenas o valor patrimonial dos terrenos.
13.2. Os terrenos para construção não são meramente instrumentais ao exercício da atividade económica, ao contrário, integram o próprio núcleo da atividade económica, com valor económico intrínseco e, normalmente, cotação no mercado imobiliário, i.e., podem ser vendidos, trocados, dados como garantia de obrigações e evidenciam obviamente uma determinada capacidade económica. Efetivamente os terrenos para construção não se reconduzem a meros direitos de construção, de coisas futuras, e todos eles são bens autónomos, que, até, pela sua natural escassez, têm sempre valor económico intrínseco e, normalmente, cotação no mercado imobiliário, i.e., podem ser vendidos, trocados, dados como garantia de obrigações.
13.3. A detenção de património imobiliário de valor elevado, independentemente da afetação ou não a atividade económica, é tendencialmente reveladora de elevada capacidade contributiva. Assim, não se vê que a tributação do património imobiliário da Requerente afronte o princípio da igualdade tributária e da capacidade contributiva apenas porque a titularidade de bens imóveis constitui o próprio objeto da sua atividade económica.
13.4. Em suma, não se afigura, pois, que a incidência de AIMI sobre os imóveis da titularidade de empresas que exercem a sua atividade no setor imobiliário, nomeadamente de terrenos para construção adquiridos com o intuito de neles promover edificações destinadas a venda, seja discriminatória ou que estas empresas devam merecer um tratamento mais vantajoso do que o concedido à generalidade dos proprietários de prédios urbanos.
13.5. Sobre esta matéria, o Tribunal Arbitral já se pronunciou amplamente, nomeadamente no âmbito dos processos nºs 664/1017-T, 676/2017-T, 678/2017-T, 682/2017-T, 683/2017-T, 684/2017-T 690/2017-T, 6/2018-T, 310/2018-T, 324/2018-T,401/2017-T e 420/2018-T. Em conformidade com a jurisprudência citada, à qual se adere na íntegra, conclui-se, que a titularidade de um património imobiliário de valor elevado por uma pessoa singular ou por pessoa coletiva (seja sociedade imobiliária, fundo imobiliário ou outra) evidencia, como em relação a qualquer proprietário de imóvel destinado a habitação, uma especial capacidade económica para poder contribuir adicionalmente para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, a que está consignada a receita do AIMI.
13.6. Em suma, o AIMI incide sobre o património imobiliário que possua as características indicadas no artigo 135.º-B do Código do IMI, isto é, sujeitando toda e qualquer entidade que seja titular de direitos reais sobre prédios urbanos de acordo com a realidade objetiva e não meramente potencial no momento da verificação do ato tributário.
13.7. Sobre o alegado paralelismo entre a Verba 28.1 da TGIS e o AIMI, impõe-se referir que o entendimento atual do Tribunal Constitucional, constante do Acórdão n.º 378/2018, é contrário ao alegado pela Requerente, porque o Tribunal Constitucional veio entender que não se verifica a inconstitucionalidade da verba 28 da TGIS. Face a esta decisão do Tribunal Constitucional toda a argumentação da Requerente ao querer assacar uma qualquer desconformidade do AIMI com a lei fundamental não tem qualquer sustentação jurídica.
13.8. No que se refere ao pagamento de juros indemnizatórios, previstos no artigo 43.º da LGT, entende-se não enfermarem os atos impugnados de qualquer vício que determina a sua anulação. Resulta assim, em conformidade com a doutrina consolidada dos tribunais superiores que caso venha a decidir-se pela ilegalidade do ato impugnado não são devidos juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT.
II - Saneamento
14. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
15. O tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído.
16. Não foram suscitadas exceções de que cumpra conhecer.
17. Não se verificam nulidades nem quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
18. Nestes termos, o Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objeto do processo.
III - Mérito
III.1. Matéria de facto
19. Factos provados
19.1. Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas dão-se como assentes e provados os seguintes factos:
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A Impugnante é uma sociedade anónima que tem como objeto social a realização de empreendimentos imobiliários, designadamente a compra, a venda, construção civil, reconstrução, urbanização, promoção e arrendamento de imóveis próprios e alheios, incluindo a revenda dos adquiridos para esse fim.
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A Impugnante é proprietária do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo..., descrito na Caderneta Predial Urbana como terreno para construção, com o Valor Patrimonial Tributário de € 2.681.547,15, situado na..., União de freguesias de ..., ... e ..., concelho do Porto.
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A Requerente foi notificada pela AT da liquidação de AIMI, sob o n.º 2017..., referente ao ano de 2017, efetuada em 30-06-2017, relativamente ao prédio identificado na alínea anterior, no montante de €10.726,19.
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A Requerente apresentou, em 26-09-2017, reclamação graciosa contra a liquidação, identificada na alínea anterior, que recebeu o n.º ...2018... .
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A Requerente foi notificada, através de ofício do Serviço de Finanças Porto ..., de 12-02-2018, para exercer o seu direito de audição prévia, nos termos do artigo 60.º, n.º 1, alínea b) da LGT, mas não o fez.
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A reclamação graciosa, identificada na alínea D), foi indeferida por despacho, de 24-07-2018, do Chefe de Serviço de Finanças e notificada à Requerente através do ofício do Serviço de Finanças Porto ..., datado de 30-07-2018.
19.2. Fundamentação da matéria de facto
Relativamente à matéria de facto, atendendo ao disposto no artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e no artigo 607.º, n.º 3, do Código do Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e), do RJAT, o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da matéria não provada.
Assim, de acordo com o disposto no artigo 596.º do Código do Processo Civil (CPC), aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual foi estabelecida tendo em conta as questões de Direito suscitadas.
Tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º, n.º 7, do CPPT, a prova documental e o Processo Administrativo, juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.
III.2. Matéria de Direito
20. As questões principais suscitadas pela Requerente nos presentes autos são: i) Os terrenos para construção afetos a uma atividade económica estão ou não abrangidos pela norma de exclusão do n.º 2 do artigo 135.º-B do Código do IMI; ii) O AIMI é ou não contrário aos princípios constitucionais da igualdade e da capacidade contributiva: iii) A inclusão dos terrenos para construção no âmbito de aplicação do AIMI contraria ou não o princípio da igualdade constitucionalmente estabelecido; iv) A aplicação do AIMI, caso inclua entidades que desenvolvam uma atividade imobiliária, promove ou não um tratamento diferenciado e uma desigualdade injustificada entre contribuintes em manifesta violação dos princípios da igualdade fiscal e da capacidade contributiva estabelecidos na Constituição.
Cumpre apreciar.
21. Importa começar por referir que a Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, Lei do Orçamento do Estado para 2017, introduziu o Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“AIMI”), que entrou em vigor na data da referida lei, ou seja, a 1 de janeiro de 2017.
A regulamentação do AIMI foi aditada ao Código do IMI através do capítulo XV, tendo por epígrafe “Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis”, compreendendo os artigos 135.º-A a 135.º-K[1].
Os n.ºs 1 e 3 do artigo 135.º-A do Código do IMI estabelecem que são sujeitos passivos do AIMI “as pessoas singulares ou coletivas que sejam proprietários, usufrutuários ou superficiários de prédios urbanos situados no território português” a 1 de Janeiro do ano a que o referido Adicional diz respeito.
O n.º 2 do mesmo artigo dispõe que: “são equiparados a pessoas coletivas quaisquer estruturas ou centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica que figurem nas matrizes como sujeitos passivos do imposto municipal sobre imóveis, bem como a herança indivisa representada pela cabeça de casal”.
O AIMI incide, de acordo com o n.º 1 do artigo 135.º-B do Código do IMI, “sobre a soma dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos situados em território português de que o sujeito passivo seja titular” – sendo que, a esta soma, deverá ser deduzida a quantia de € 600.000 sempre que o sujeito passivo seja uma pessoa singular ou uma herança indivisa.
Foram excluídos da incidência objetiva do AIMI “os prédios urbanos classificados como “comerciais, industriais ou para serviços” e “outros” nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 6.º deste Código”, conforme disposto no n.º 2 do artigo 135.º-B do Código do IMI.
A taxa aplicável é de 0,4% para pessoas coletivas e de 0,7% para pessoas singulares e heranças indivisas, sempre que o valor tributável não seja superior a € 1.000.000, nos termos do n.º 1 do artigo 135.º-F do Código do IMI, sendo que, nos casos em que o valor tributável seja superior a € 1.000.000, é aplicável uma taxa de 1%, quando o sujeito passivo seja uma pessoa singular.
Nos termos do n.º 1 do artigo 135.º-G e do artigo 135.º-H, do Código do IMI, o AIMI é liquidado anualmente, no mês de Junho, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios sujeitos a imposto e em relação aos sujeitos passivos que constem nas matrizes em 1 de Janeiro de cada ano, devendo o mesmo ser pago até ao final do mês de Setembro.
22. O legislador na delimitação negativa da incidência do AIMI remete para tipologia de prédios, de acordo com a caracterização que o Código do IMI lhe atribui.
A este respeito, é útil citar a Decisão Arbitral, de 04-05-2018, proferida no processo n.º 675/2017-T, com a qual concordamos, ao afirmar:
“Se tivesse sido mantida, na redação final do Orçamento, a intenção legislativa de afastar a incidência sobre os imóveis diretamente afetos ao funcionamento das pessoas coletivas, decerto teria sido mantida a referência a esta afetação que constava da proposta e que expressava claramente essa opção legislativa. Assim, tendo sido suprimida essa alusão à afectação dos imóveis, não há suporte legal para concluir que os prédios habitacionais e os terrenos para construção afectos ao funcionamento das pessoas colectivas não relevem para a incidência do AIMI. “. E acrescenta “(…) em face do afastamento da redacção proposta em que se dava relevância à afectação dos imóveis, não há razão para concluir que o legislador não soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, como tem de se presumir, por força do disposto no artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil.”
Nestes termos, entendemos que a posição segundo a qual o legislador pretendeu excluir os terrenos para construção do âmbito de incidência do AIMI para não sobrecarregar fiscalmente os sujeitos passivos que possuem este tipo de prédios, por efeito do seu objeto social, não tem sustentação na letra da lei.
Para o legislador o critério relevante, no âmbito da sua margem de conformação, foi a classificação dos prédios face ao artigo 6.º do Código do IMI e não a afetação dos mesmos à atividade económica dos contribuintes.
Tendo o legislador definido uma cláusula de exclusão por referência expressa a certas espécies de prédios urbanos, que estão definidos na lei, não é possível efetuar uma interpretação extensiva para abranger outras tipologias que o legislador não contemplou.
Sobre esta questão este Tribunal sufraga a posição adotada na Decisão Arbitral, de 16-07-2018, proferida no processo n.º 676/2017-T, quando afirma:
“A exclusão do imposto abrange, por conseguinte, os prédios classificados como comerciais, industriais ou para serviços, entendendo-se como tais os edifícios ou construções licenciados para esses efeitos ou que tenham como destino normal cada um destes fins. Abarca, para além disso, a espécie residual referida na alínea d) do n.º 1 desse artigo 6.º, aí se incluindo os terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem prédios rústicos e ainda os edifícios e construções que se não enquadrem em qualquer das anteriores classificações. O âmbito de incidência objetiva, por efeito da remissão para aquele artigo 6.º, ficou assim definido não só por referência a uma certa espécie de prédios urbanos, mas também por referência ao procedimento administrativo através do qual foi efetuada a classificação ou, na falta de licença, à normal destinação desses prédios para os fins comerciais, industriais e serviços ou outros.”
Não obstante razões de política fiscal poderem justificar conferir aos terrenos para construção, destinados a edificações para fins comerciais, industriais ou para serviços, o mesmo estatuto dos prédios classificados como “comerciais, industriais ou para serviços”, tal não foi a opção legislativa. Consequentemente, o facto de a Requerente ser proprietária do terreno para construção, identificado nos autos, enquanto substrato da sua atividade económica não afasta a incidência do AIMI.
23. As questões de inconstitucionalidade suscitadas nos presentes autos já foram analisadas por diversas decisões arbitrais em sentido contrário ao defendido pela Requerente, nomeadamente pela decisão arbitral, de 06-09-2018, proferida no processo n.º 690/2017-T, que o árbitro do presente processo subscreveu na qualidade de vogal do Tribunal Arbitral Coletivo.
24. Relativamente à alegada inconstitucionalidade resultante da discriminação contida na norma do n.º 2 do artigo 135.º-B do Código do IMI, quanto aos terrenos de construção relativamente aos prédios classificados como comerciais, industriais ou para serviços, que se encontram excluídos da tributação por força do disposto daquela norma, importa salientar que estamos perante factos tributários diversos que configuram situações diferentes. Sendo possível descortinar um fundamento material suficiente que permite ao legislador distinguir, para efeito da tributação do património, entre esses diferentes factos tributários.
Assim, a lei sujeita a tributação os terrenos urbanizáveis que constituem um ativo económico devido à sua aptidão para a construção. Assim, o terreno para construção tem um valor patrimonial próprio que constitui um indicador de capacidade contributiva independentemente da sua eventual e futura utilização no âmbito da construção.
Enquanto, a lei exclui do imposto o património edificado com uma função instrumental relativamente à atividade produtiva. O património já construído que se encontre classificado como imóvel comercial, industrial ou para serviços tem já uma função instrumental relativamente a uma certa atividade produtiva que o legislador pretendeu salvaguardar, no âmbito da sua margem de livre conformação.
Em suma, existe fundamento material suficiente para estabelecer a diferenciação de tratamento, em linha com o regime legalmente consagrado.
No desenvolvimento desta posição a Decisão Arbitral, de 04-05-2018, proferida no processo n.º 675/2017-T refere, de forma pertinente, o seguinte:
“a titularidade de um património imobiliário de valor elevado evidencia, como em relação a qualquer proprietário de imóvel destinado a habitação, uma especial capacidade económica para poder contribuir adicionalmente para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, a que está consignada a receita do AIMI, e que «corresponde ao objetivo do programa do governo de alargar a base de financiamento da Segurança Social» (Relatório do Orçamento para 2017, página 57). Por isso, a imposição à generalidade dos detentores de imóveis habitacionais ou terrenos para construção de prédios habitacionais não se afigura materialmente inconstitucional, à face dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva.”
Afiguram-se, assim, improcedentes os vícios de inconstitucionalidade alegados pela Requerente.
25. A Requerente invoca ainda a semelhança entre a Verba n.º 28 da TGIS e a jurisprudência constitucional proferida sobre a mesma, nomeadamente o Acórdão n.º 250/2017 do Tribunal Constitucional, de 24 de maio de 2017, e a configuração do AIMI. Assim, a Requerente pretende demonstrar que o AIMI padece dos mesmos vícios daquela Verba, sobretudo porque, relativamente aos imóveis essenciais na obtenção de rendimentos, no âmbito da atividade económica, carece de idêntica sustentação material no plano tributário.
Só que o Plenário do Tribunal Constitucional, através do acórdão n.º 378/2018, de 04-07-2018, julgou não inconstitucional a Verba 28.1 da TGIS, aprovada pela Lei n." 55-A/2012, de 29 de outubro, e alterada pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, na parte que impõe a tributação anual sobre a propriedade de terrenos para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação e cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a € l.000.000,00.
Nos termos do artigo 2.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, “as decisões do Tribunal Constitucional são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as dos restantes tribunais e de quaisquer outras autoridades”.
Assim, em função do decidido pelo Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 378/2018, tem de se concluir que as liquidações da Autoridade Tributária e Aduaneira que aplicaram a Verba n.º 28 da TGIS aos terrenos para construção, nas condições referidas, não enfermam dos vícios de inconstitucionalidade que lhes tinham sido imputados.
Deste modo e face ao exposto, julga-se ser de improceder, neste ponto, o alegado pela Requerente.
26. Improcedendo a anulação do ato tributário relativo à liquidação de AIMI respeitante ao prédio supra identificado, ficam igualmente prejudicados os pedidos feitos pela Requerente de anulação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, bem como da devolução da quantia paga e do pagamento de juros indemnizatórios.
IV – Decisão
Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:
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Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral de anulação da liquidação de AIMI, relativo ao exercício de 2017, respeitante ao prédio supra identificado;
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Manter a decisão de indeferimento da reclamação graciosa;
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Julgar improcedente o pedido de reembolso do montante pago pela Requerente acrescido de juros indemnizatórios, porquanto este pedido se encontra prejudicado pela improcedência do pedido arbitral referido em a), absolvendo-se a Requerida do respetivo pedido;
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Condenar a Requerente no pagamento das custas do presente processo.
V - Valor do Processo
Atendendo ao disposto nos artigos 32.º do CPTA, 306.º, n.º 2, do Código do Processo Civil e 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT) fixa-se o valor do processo em €10.726,19 (dez mil setecentos e vinte seis euros e dezanove cêntimos).
VI - Custas
O montante das custas é fixado em € 918,00 (novecentos e dezoito euros) a cargo da Requerente, nos termos da Tabela I do RCPAT, em cumprimento do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, bem como do disposto no artigo 4.º, n.º 4, do RCPAT.
Notifique-se.
Lisboa, Centro de Arbitragem Administrativa, 17 de abril de 2019
O Árbitro
(Olívio Mota Amador)
[1] Posteriormente, a Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, aditou os artigos 135.º-L e 135.º-M.