Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 349/2018-T
Data da decisão: 2018-12-05  IVA  
Valor do pedido: € 154.565,20
Tema: IVA – Duplicação de colecta – Inversão do sujeito passivo – Reverse Charge.
Versão em PDF

 

Decisão Arbitral (consultar versão completa no PDF)

 

 

Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr.ª Adelaide Moura e Dr. Marcolino Pisão Pedreiro (árbitros vogais) designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 27-09-2018, acordam no seguinte:

 

 

1. Relatório

 

A..., LDA., com o número de identificação fiscal ... e com sede na Rua ... n.º..., ..., doravante abreviadamente designada por "Requerente", veio, nos termos do disposto nos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral, tendo em vista a anulação da liquidação de IVA n.º 2018..., emitida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, em 11 de Abril de 2018.

A Requerente pede ainda o reembolso do montante de € 154.565,20 que foi indeferido pela Autoridade Tributária e Aduaneira, acrescido de juros indemnizatórios.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 20-07-2018.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 07-09-2018, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 27-09-2018.

A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Por despacho de 05-11-2018 foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas.

Asa Partes apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.

As Partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

 

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

  1. A Requerente é uma sociedade que se dedica à prestação de serviços de construção civil e obras públicas, bem como à comercialização e exploração de empreendimentos turísticos;
  2. No âmbito da sua actividade, no período compreendido entre Novembro de 2014 e Agosto de 2018, a Requerente prestou serviços de construção civil à entidade B..., S.A, no âmbito da empreitada de construção do Terminal Rodoviário de ...;
  3. Nas facturas emitidas pela Requerente no âmbito dos serviços de construção civil acima referidos, esta procedeu, indevidamente, à liquidação de IVA, reportando este imposto nas declarações periódicas de imposto dos períodos de emissão das facturas;
  4. Essas facturas totalizam o montante € 826.587,75, do qual € 154.565,20 respeita a imposto, nos termos do quadro que segue:

  1. Posteriormente à emissão das facturas, a Requerente entendeu que o IVA foi liquidado indevidamente, em virtude do mecanismo de reverse charge ínsito na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA, por competir ao adquirente de serviços de construção civil a auto-liquidação do imposto devido no âmbito da prestação de tais serviços;
  2. A Requerente procedeu à regularização, a seu favor, do montante de IVA que considerou indevidamente liquidado, inscrevendo este montante no campo 40 da declaração periódica do mês de Novembro de 2017;
  3. Com esta regularização, a Requerente procedeu à emissão, em 22 de Novembro de 2017, das notas de crédito n.ºs NC 2017C/3, NC 2017C/4, NC 2017C/5, NC 2017C/6 e NC 2017C/7, anulando todas as facturas inicialmente emitidas com referência à empreitada de construção do Terminal Rodoviário de ... e subsequentemente, procedeu a emissão de novas facturas, conforme o quadro seguinte:

 

  1. No âmbito da declaração periódica de Novembro de 2017, a Requerente pediu o reembolso da globalidade do montante de imposto por si regularizado;
  2. Na sequência desse pedido de reembolso, a Autoridade Tributária e Aduaneira através da Direcção de Finanças de ..., iniciou uma acção inspectiva, com a Ordem de Serviço n.º OI 2018..., com vista à comprovação e análise dos procedimentos de IVA adoptados pela Requerente
  3. Relativamente ao imposto regularizado pela Requerente, a Autoridade Tributária e Aduaneira apenas aceitou as regularizações efectuadas no prazo de 2 anos, no montante de € 2.023,75, e efectuou correcções no valor de € 152.541,44;
  4. No Relatório da Inspecção Tributária elaborado nessa inspecção, que consta do documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, refere-se, além do mais o seguinte:

III.1.1. REGULARIZAÇÕES DE IVA A FAVOR DO S.P. NÃO ACEITES - ARTIGO 78.º CIVA

O Decreto-Lei n.º 21/2007, de 29 de Janeiro, veio introduzir alterações na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, que por força do artigo 6.º desse Decreto-Lei, entraram em vigor no dia 1 de Abril de 2007, passando a redação a referir o seguinte: "j) As pessoas singulares ou colectivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicilio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada."

O Decreto-Lei n.º 21/2007, de 29 de Janeiro, veio adotar, no domínio de algumas prestações de serviços relativas a bens imóveis, nomeadamente nos trabalhos de construção civil realizados por empreiteiros e subempreiteiros, uma faculdade conferida pela Diretiva n.º 2006/69/CE, do Conselho, de 24 de Julho. Assim, por via da inversão do sujeito passivo, passou a caber aos adquirentes ou destinatários daqueles serviços, quando se configurem como sujeitos passivos com direito à dedução total ou parcial do imposto, proceder à liquidação do IVA devido, o qual poderá ser também objeto de dedução nos termos gerais. Esta medida, visou acautelar algumas situações que redundam em prejuízo do erário público, atualmente decorrentes do nascimento do direito à dedução do IVA suportado, sem que esse imposto chegue a ser entregue nos cofres do Estado.

Através do Ofício-Circulado n.º 30101, de 24/05/2007 (que veio revogar o Ofício-Circulado n.º 30100, de 28/03/2007), foram transmitidos esclarecimentos sobre a aplicação da alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA.

O s.p. veio a emitir faturas relativas às prestações de serviços de construção civil efetuadas ao cliente B... S A, NIPC:..., na obra de construção do "Terminal Rodoviário Urbano de  ...", conforme Anexo 1 - Páginas 1 a 16. Nos serviços faturados, o s.p. procedeu à liquidação de IVA, conforme se apura e se resume no quadro seguinte:

 

Importa frisar que, conforme esclarece o n.º 6.1 do Ofício-Circulado n.º 30101, de 24/05/2007, "Para efeitos de verificação do enquadramento em IVA do adquirente, devem os interessados consultar o sistema de declarações electrónicas, através da opção CONTRIBUINTES - CONSULTA - IDENT. CLIENTE/FORNEC."

Sendo que no caso do cliente mencionado, fazendo essa verificação seria obtido o seguinte resultado:

 

O mesmo Oficio-Circulado n.º 30101, de 24/05/2007, esclarece também no n.º 1.6.7. que "Cabe ao adquirente dos serviços, no caso de dúvidas por parte do sujeito passivo prestador, esclarecer e confirmar em que situação (enquadramento) se encontra perante o IVA. No caso de subsistirem dúvidas e sem prejuízo do que se refere no ponto 6, qualquer das partes poderá solicitar informação à Direcção de Serviços do IVA sobre o enquadramento em vigor."

O artigo 36.º do CIVA, o qual versa sobre o prazo de emissão e formalidades das faturas, dispõe no n.º 13 que "Nas situações previstas nas alíneas i), j) e I) do n.º 1 do artigo 2º, bem como nas demais situações em que o destinatário ou adquirente for o devedor do imposto, as faturas emitidas pelo transmitente dos bens ou prestador dos serviços devem conter a expressão 'IVA - autoliquidação'." (Redacção do D.L. nº 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013).

O s.p. ao ter liquidado indevidamente IVA nas faturas, já que tal ato competia exclusivamente ao adquirente nos termos já referidos e ao não cumprir com a formalidade exigida no n.º 13 do artigo 36.º do CIVA, resultou na emissão de faturas inexatas.

Verificou-se que o s.p. procedeu aos registos contabilísticos das prestações de serviços, conforme exigido pelo artigo 45.º do CIVA, conforme Anexo 2 - Páginas 1 a 8, sendo que estes foram efetuados após a emissão das correspondentes faturas, até à apresentação da declaração periódica de IVA relativa a cada período, conforme se verificou pelos extratos das contas SNC referentes às prestações de serviços e de IVA liquidado: "72113 -Taxa Normal" e "2433113 - Taxa Normal", respetivamente, os quais foram refletidos nos períodos das declarações periódicas de IVA entregues pelo s.p., nas datas que se detalham no quadro seguinte:

Em Novembro de 2017, veio o s.p. a emitir as notas de crédito em Anexo 3 - Páginas 1 a 5, discriminadas no quadro seguinte:

 

 

Conforme esclarece o disposto no Ofício-Circulado n.º 30141/2013 de 04/01/2013, com a publicação do Decreto-Lei n.º 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013, a nova redação do n.º 7 do artigo 29.º do CIVA, dispõe que "quando o valor tributável de uma operação ou o correspondente imposto sejam alterados, por qualquer motivo, incluindo inexatidão, teve ser emitido documento retificativo da fatura", o qual deve conter os elementos referidos na alínea a) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, bem como a referência à fatura a que respeita e a menção dos elementos alterados.

As notas de crédito e as notas de débito são documentos retificativos de fatura, podendo ser emitidos pelos sujeitos passivos adquirentes dos bens ou destinatários dos serviços, desde que observados os seguintes requisitos:

– resultem de acordo entre os sujeitos passivos intervenientes, fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e adquirente ou destinatário dos mesmos;

– sejam processados em cumprimento do disposto no n.º 7 do artigo 29º do CIVA, ou seja, quando o valor tributável de uma operação ou o imposto correspondente sejam alterados por qualquer motivo, incluindo inexatidão;

– contenham os elementos a que se refere o n.º 6 do artigo 36.º do CIVA, dos quais se realça a referência à fatura a que respeitam.

No caso, as notas de crédito emitidas pelo s.p., com vista a retificar faturas emitidas em períodos anteriores ao cliente B... S A, NIPC:..., de entre os elementos a que se refere o n.º 6 do artigo 36.º do CIVA, contêm nomeadamente: números sequenciais, datas de emissão e referência às faturas que alteram, conforme se resume no quadro seguinte:

Com a emissão das notas de crédito referidas, o s.p. emitiu também novas faturas em Anexo 4 - Páginas 1 a 5, nas quais não liquidou IVA e colocou a expressão "IVA - autoliquidação", de acordo com o disposto no n.º 13 do artigo 36.º do CIVA, conforme quadro seguinte:

Em 2018-01-10, o s,p. entregou a Declaração Periódica de IVA relativa ao mês de Novembro de 2017 (201711), tendo apurado na respetiva declaração Imposto a Recuperar no montante de € 155.689,16, tendo efetuado o Pedido de Reembolso na mesma declaração no montante de € 154.565,19, conforme Anexo 5 -Páginas 1 a 4.

O montante do pedido de reembolso de IVA, coincide com o montante declarado no campo 40 da referida declaração periódica, relativo a regularizações de IVA a favor do sujeito passivo.

Consultada a contabilidade do s.p., foram verificadas as contas relativas a regularizações de IVA a favor do s.p., em concreto a conta SNC "243413 - Taxa Normal", tendo sido obtidas cópias dos respetivos documentos de suporte relativas aos lançamentos contabilísticos seguintes:

 

Analisados os respetivos documentos, constatou-se que, a regularização de IVA a favor do s.p., que originou o pedido de reembolso de IVA em apreço, assenta na emissão de notas de crédito pelo s.p., com vista a retificar faturas emitidas em períodos anteriores ao cliente B... SA, NIPC:..., cujo valor tributável foi sujeito a IVA nas faturas inicialmente emitidas, dando posteriormente origem a novas faturas nas quais não liquidou IVA, colocando a expressão "IVA -autoliquidação", conforme disposto no n.º 13 do artigo 36.º do CIVA.

No caso em apreço, o s.p. veio em Novembro de 2017 a:

1. Emitir notas de crédito, no sentido da anulação das faturas anteriormente emitidas com liquidação de IVA (inexatamente emitidas por IVA indevidamente liquidado e falta do formalismo exigido no n.º 13 do artigo 36.º do CIVA):

2. Emitir novas faturas sem liquidação de IVA, contendo a expressão "IVA - autoliquidação", de acordo com o n.º 13 do artigo 36.º do CIVA;

Assim, com esses procedimentos, o s.p. procedeu de acordo com parte do disposto na Informação Vinculativa n.º 8404, com despacho de 24/07/2015, do SDG do IVA, por delegação do Diretor Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, a qual se transcreve:

“I - QUESTÃO(ÕES) SUSCITADA(S)

1 - Tendo emitido 8 faturas (outubro/novembro de 2014) com liquidação de IVA, relativas a material elétrico para aplicação numa obra e, emitindo posteriormente, em 2015, fatura relativa à prestação de serviços e restante material de acordo com a regra de inversão do sujeito passivo, enunciada na alínea j) do n.º 1 do artigo 2." do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), pretende o exponente ser esclarecido quanto à emissão de nota de crédito relativo ao IVA liquidado anteriormente, conforme solicitado pela empresa adquirente.

II - ENQUADRAMENTO FACE AO CÓDIGO DO IVA

2 - Através de consulta ao sistema informático, verifica-se que o sujeito passivo se encontra enquadrado no Regime Normal de Tributação - Periodicidade Trimestral, desde 2011-02-01, para efeitos do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), com o Código de Classificação de Atividade Económica (CAE): "43210 INSTALAÇÃO ELÉTRICA".

III - ANÁLISE DA QUESTÃO SUSCITADA

3 - De harmonia com a alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA (CIVA), são sujeitos passivos de imposto: "As pessoas singulares ou coletivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicilio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada".

4 - Assim, a regra de inversão do sujeito passivo aplica-se quando se verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições:

i) Se esteja na presença de aquisição de serviços de construção civil (englobando todo o conjunto de atos necessários à concretização de uma obra, independentemente do fornecedor ser ou não obrigado a possuir alvará ou título de registo nos termos do DL n.º 12/2004, de 9 de janeiro):

II) O adquirente ser sujeito passivo de IVA, em território nacional e, aqui pratique operações que confiram, total ou parcialmente, o direito à dedução do IVA.

5- O Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9/1, estabelece o regime jurídico aplicável ao exercício da atividade da construção, encontrando-se aí definidos os vários tipos de trabalhos de construção civil, sendo estes agrupados em categorias, pela Portaria n.º 19/2004, de 10 de janeiro.

6 - Aproveitando este último diploma e, no sentido de um melhor esclarecimento sobre a aplicação da alínea j) do n.º 1 do artigo 2º do CIVA, foi emitido o ofício circulado n.º 30.101/2007-DS/VA, de 24 de maio, cuja leitura deixa entender que:

i) A mera transmissão de bens, sem que lhe esteja associada qualquer prestação de serviços de instalação/montagem ou, as reparações/substituições de quaisquer equipamentos já em funcionamento (por parte ou por conta de quem os forneceu) não se encontra abrangida pela alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA:

ii) A entrega de bens, com montagem/instalação na obra, considera-se abrangida pela regra de inversão do sujeito passivo, referida na alínea j) do n. º 1 do artigo 2.º do CIVA, desde que se trate de entregas no âmbito de trabalhos contemplados pela Portaria n.º 19/2004, de 10 de janeiro, independentemente do fornecedor ser ou não obrigado a possuir alvará/título de registo nos termos do DL. n.º 12/2004, de 9 de janeiro:

iii) Os bens que, de forma inequívoca, sejam considerados bens móveis (ou amovíveis, em sentido lato), isto é, que não estejam ligados materialmente a bem imóvel, com caráter de permanência, encontram-se excluídos da regra da inversão do sujeito passivo, referida na alínea j) do n.º 1 do artigo 2º do CIVA.

7 - Também, de acordo com o ponto 1.4 do citado oficio circulado é referido que: "Sempre que, no âmbito de uma obra, o prestador fatura serviços de construção civil propriamente dita ou quaisquer outros com ela relacionados e necessários é sua realização (...), bem como materiais ou outros bens, entende-se que o valor global de fatura, independentemente de haver ou não discriminação dos vários itens e da faturação ser conjunta ou separada, é abrangido pela regra de inversão do sujeito passivo".

8 - Sempre que, determinada operação reúna as condições cumulativas referidas no n.º 4 da presente informação, bem como, respeite os requisitos enunciados no número anterior, é obrigatório observar o disposto alínea j) do n.º 1 do artigo 2º do CIVA (inversão do sujeito passivo), pelo que, cabe ao adquirente a liquidação e entrega do imposto que se mostre devido, devendo a fatura emitida pelo fornecedor dos bens e/ou prestador do(s) serviço(s), nos termos do n.º 13 do artigo 36.º do CIVA, conter a expressão 'IVA-autoliquidação' (Vd. ofício circulado n.º 30101/2007-DSIVA, de 24 de maio).

9 - O IVA devido pelo adquirente deve ser liquidado na própria fatura recebida do prestador ou, em caso de não recebimento da fatura e, subsistindo a obrigação de autoliquidação, deve esta fazer-se em documento interno, enunciando o n.º 8 do artigo 19.º do CIVA que: "Nos casos em que a obrigação de liquidação e pagamento do imposto compete ao adquirente dos bens e serviços, apenas confere direito a dedução o imposto que for liquidado por força dessa obrigação".

10 - No caso de faturas inexatas, o n.º 3 do artigo 78.º do CIVA refere que: "... a retificação é obrigatória quando houver imposto liquidado a menos, podendo ser efetuada sem qualquer penalidade até ao final do período seguinte àquele a que respeita a fatura a retificar, e é facultativa, quando houver imposto liquidado a mais, mas apenas pode ser efetuada no prazo de dois anos".

11 - Por outro lado, o n.º 5 do artigo 78º do CIVA vem dispor: "Quando o valor tributável de uma operação ou o respetivo imposto sofrerem ratificação para menos, a regularização a favor do sujeito passivo só pode ser efetuada quando este tiver na sua posse prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto, sem o que se considera indevida a respetiva dedução".

IV- CONCLUSÕES

12 - Referindo o exponente que as faturas emitidas em 2014 (outubro/novembro), com liquidação de imposto, relativas a diverso material elétrico se destinavam a obra que se iria realizar e que, posteriormente, foi emitida outra fatura relativa à prestação de serviços e restante material, cuja montagem/instalação na obra foi feita com recurso a serviços de construção civil, deve considerar-se a totalidade da obra abrangida pela regra de inversão do sujeito passivo.

13 - Relativamente às faturas emitidas em outubro/novembro de 2014, tendo em conta a liquidação indevida de imposto, bem como, da obrigatoriedade da menção "IVA-autoliquidação", a retificação deve respeitar o disposto nos n.ºs 3 e 5 do artigo 78º, do seguinte modo:

i) Proceder à emissão de nota(s) de crédito, no sentido da anulação da(s) fatura(s) anteriormente emitida(s) com liquidação do imposto:

ii) Emitir nova fatura sem liquidação de imposto, contendo a expressão "IVA-autoliquidação", de acordo com o n.º13 do artigo 36.º do CIVA:

iii) Proceder a substituição da(s) declaração(ões) periódica(s) anteriormente entregue(s) através da correção (diminuição) dos valores anteriormente apresentados na base tributável e imposto a favor do Estado (Quadro 06 - Campos 3 e 4) e, inscrever o valor da nova fatura no Campo 5, do Quadro 6 ("Isentas ou não tributadas")."

No entanto, não seguiu o descrito no n.º 13 dessa Informação Vinculativa, que refere que a retificação deve respeitar o disposto nos n.º 3 e n.º 5 do artigo 78.º (do CIVA), bem como ao referido na sua alínea iii) "Proceder à substituição da(s) declaração(ões) periódica(s) anteriormente entregue(s) através da correção (diminuição) dos valores anteriormente apresentados na base tributável e imposto a favor do Estado (Quadro 06 - Campos 3 e 4) e, inscrever o valor da nova fatura no Campo 8, do Quadro B ("Isentas ou não tributadas")."

Isto porque, por um lado, em 2018-01-10, o s.p. entregou a Declaração Periódica de IVA relativa ao mês de Novembro de 2017 (201711), em que regulariza a seu favor, o montante declarado no campo 40 da referida declaração periódica (que coincide com a regularização de IVA concretizada pela emissão das notas de crédito referidas), quando deveria ter procedido conforme a alínea iii) do n.º 13 da Informação Vinculativa n.º 8404, de 24/07/2015, ou seja, ter procedido à substituição de todas as declarações periódicas de IVA correspondentes às faturas onde foi indevidamente liquidado IVA.

Por outro lado, embora o s.p. tenha apresentado prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação, conforme o disposto no n.º 5 do artigo 78.º do CIVA, o s.p. não respeitou o prazo disposto no n.º 3 do artigo 78.º do CIVA, senão vejamos:

Está estabelecido no n.º 3 do artigo 78.º do CIVA, que "nos casos de facturas inexactas que já tenham dado lugar ao registo referido no artigo 45º, a rectificação é obrigatória quando houver imposto liquidado a menos, podendo ser efectuada sem qualquer penalidade até ao final do período seguinte àquele a que respeita a factura a rectificar, e é facultativa, quando houver imposto liquidado a mais, mas apenas pode ser efectuada no prazo de dois anos."

Ou seja, por o s.p ter liquidado IVA a mais, vê-se condicionado ao limite do prazo de 2 anos para poder proceder à sua retificação a seu favor.

Logo, o s.p. deveria ter cumprido com o estipulado com a alínea iii) do n.º 13 da Informação Vinculativa n.º 8404 referida anteriormente, mediante a entrega de Declarações Periódicas de IVA de substituição dos períodos a retificar, sendo que deveria tê-lo feito no prazo de 2 anos a contar da data de submissão das Declarações Periódicas de IVA a substituir, conforme a alínea b) do n.º 1 do artigo 8.º do regime jurídico da cobrança do IVA e do pagamento dos reembolsos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 229/95, de 11 de Setembro, com as alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n.ºs 472/99, de 8 de novembro, 160/2003, de 19 de julho, e 124/2005, de 3 de agosto e com as alterações introduzidas pelo artigo 10.º da Lei n.º 64/2012, de 20 de Dezembro.

Assim, apenas pode regularizar o IVA no montante de € 2.023,75, referente ao IVA liquidado nas referidas faturas refletidas em Declarações Periódicas de IVA submetidas entre 2016-01-10 e 2018-01-10 (o qual vem o s.p. regularizar dentro do prazo de 2 anos, embora não o tenha feito com recurso à submissão de Declarações Periódicas de IVA de substituição), conforme se apura no quadro seguinte:

Logo, não pode regularizar o IVA a seu favor o montante de € 152.541,44, referente ao IVA liquidado nas referidas faturas refletidas nas Declarações Periódicas de IVA submetidas entre 2015-01-09 e 2016-01-06 (o qual vem o s.p. regularizar fora do prazo de 2 anos), conforme se demonstra pelo resumo das datas de submissão das Declarações Periódicas de IVA em causa no quadro seguinte, cujo montante resulta da diferença entre o reembolso solicitado e o valor das regularizações de IVA aceites (€ 154.565,19 - € 2.023,75 = €152.541,44):

Reforça-se que, o s.p. não seguiu o descrito na alínea iii) do n.º 13 da Informação Vinculativa n.º 8404, de 24/07/2015, ao entregar em 10/01/2018 a Declaração Periódica de IVA relativa ao mês de Novembro de 2017 (201711), em que regulariza a seu favor, o montante de € 154.565,19, declarado no campo 40 da referida declaração periódica, quando deveria ter procedido à substituição da(s) declaração(ões) periódica(s) anteriormente entregue(s) através da correção (diminuição) dos valores anteriormente apresentados na base tributável e imposto a favor do Estado (Quadro 06 - Campos 3 e 4) e, inscrever o valor da nova fatura no Campo 8, do Quadro 6 ("isentas ou não tributadas").

Idêntica conclusão pode ser retirada da Informação Vinculativa n.º R160 2006082, com despacho de 11/09/2006, do SDG dos Impostos, em substituição do Diretor-Geral, sendo que onde consta o artigo 71.º deve ler-se artigo 78º face à renumeração do Código do IVA efetuada pelo Decreto-Lei n.º102/2008, de 20/06.

Também o esclarecimento no ponto 9.2 do Ofício-Circulado 30082/2005, de 17/11 da DSIVA, refere que as regularizações previstas no n.º 3 do artigo 71.º (agora artigo 78.º) do CIVA, "abrange situações resultantes da rectificação ou substituição de facturas já registadas. Se da correcção a efectuar resultar imposto a favor do sujeito passivo a rectificação é facultativa, mas apenas poderá ser efectuada no prazo de um ano" (agora 2 anos por força da redação dada ao então n.º 3 do artigo 71.º do CIVA (atual artigo 78.º) pela Lei n.º 53-A/2006 de 29/12.

No mesmo sentido já se pronunciou o acórdão do STA, de 27/02/2013, proferido no Processo n.º 01079/12, onde ficou escrito que "resulta, inter alia, do artigo 78, do CIVA, que as disposições dos artigos 36º e seguintes devem ser observadas sempre que, emitida a factura ou documento equivalente, o valor tributável de uma operação ou o respectivo imposto venham a sofrer rectificação por qualquer motivo (n.º 1). E, nos casos de facturas inexactas que já tenham dado lugar ao registo, a rectificação é obrigatória quando houver imposto liquidado a menos, podendo ser efectuada sem qualquer penalidade até ao final do período seguinte àquele a que respeita a factura a rectificar, e é facultativa, quando houver imposto liquidado a mais, mas apenas pode ser efectuada no prazo de dois anos (nº3)". No mesmo acórdão pode ler-se que "O indevido pagamento do IVA por parte da prestadora de serviços poderia ter sido resolvido pela devolução das facturas pela recorrente para serem rectificadas ou solicitando àquela que efectuasse a regularização prevista no artigo 78. º/3 do CIVA".

Convém ainda fazer referência ao seguinte:

Na declaração periódica de IVA do período 201711, na qual o s.p. solicitou o reembolso de IVA, veio este a preencher o quadro de detalhe das regularizações de IVA a favor do s.p. efetuadas no campo 40, sendo que no quadro 1-A, indicou ser o artigo 78.º, n.º 2 do CIVA, o artigo no qual se encontram enquadradas as referidas regularizações.

Ora, o n.º 2 do artigo 78.º do CIVA, refere que "Se, depois de efectuado o registo referido no artigo 45.º, for anulada a operação ou reduzido o seu valor tributável em consequência de invalidade, resolução, rescisão ou redução do contrato, pela devolução de mercadorias ou pela concessão de abatimentos ou descontos, o fornecedor do bem ou prestador do serviço pode efectuar a dedução do correspondente imposto até ao final do período de imposto seguinte àquele em que se ver/ficarem as circunstâncias que determinaram a anulação da liquidação ou a redução do seu valor tributável.".

Como tal, torna-se necessário, por um lado, aferir se e quando foram efetuados os registos contab6.ºticos das prestações de serviços efetuadas pelo s.p. conforme exigido pelo artigo 45." do CIVA, por outro, aferir se existiram circunstâncias que tenham determinado a anulação da liquidação de IVA.

Conforme já mencionado anteriormente, verificou-se que o s.p. procedeu aos registos contab6.ºticos das prestações de serviços, conforme exigido pelo artigo 45 º do CIVA.

Esclarece ainda o Ofício-Circulado n.º 30136 de 19/11/2012, em especial o seu ponto 14.º, nos termos do n.º 7 do artigo 29.º do CIVA, que "quando o valor tributável de uma operação ou o correspondente imposto sejam alterados, por qualquer motivo, incluindo inexatidão, deve ser emitido documento retificativo de fatura (nota de crédito ou débito), o qual deve conter os elementos referidos na alínea a) do n.º 5 do artigo 36.º, bem como a referência à fatura a que respeita e a menção dos elementos alterados.". É esclarecido ainda nesse mesmo ponto do Ofício-circulado n.º 30136, que "não pode, assim, ser emitida nova fatura, como forma de retificação do valor tributável ou do correspondente imposto, sem prejuízo da possibilidade de anulação da fatura inicial e a sua substituição por outra, quando a retificação se deva a outros motivos.".

No entanto, não se encontrou demonstração de ter existido alguma circunstância, das descritas no n.º 2 do Artigo 78.º do CIVA, que determinasse a anulação da liquidação de IVA, pois a operação não foi anulada, nem foi reduzido o seu valor tributável, pois os serviços foram efetuados, conforme contrato estabelecido entre o s.p e o cliente, bem como conforme os autos de medição da obra de construção do "Terminal Rodoviário Urbano de ...", portanto, não serão os termos do n.º 2 do Artigo 78.º do CIVA, que determinam a regularização de IVA feita a favor do s.p., não havendo por isso, nestes termos, necessidade de avaliar o momento até ao qual pode o prestador do serviço efetuar a regularização a seu favor do correspondente imposto.

É errado, portanto, o enquadramento que o s.p. faz na declaração periódica de IVA do período 201711, na qual indica no quadro 1-A de detalhe das regularizações de IVA a favor do s.p., efetuadas no campo 40, ser o artigo 78.º, n.º 2 do CIVA, o regime que justifica as referidas regularizações, quando de facto não pode ser esse, pois não foi por consequência de invalidade, resolução, rescisão ou redução do contrato, por devolução de mercadorias ou pela concessão de abatimentos ou descontos, que resultou na anulação da liquidação de IVA.

Por tudo o exposto acima, a regularização de IVA feita a favor do s.p. no montante de € 154.565,19, é parcialmente indevida ao abrigo do prazo estabelecido no n.º 3 do Artigo 78.º do CIVA e consequentemente será corrigida no montante € 152.541,44 ao campo 40 da respetiva Declaração Periódica de IVA a que é imputável o lançamento, no caso a declaração referente a Novembro 2017.

 

III.1.2. APRECIAÇÃO DO PEDIDO DE REEMBOLSO DE IVA

O s.p. entregou a Declaração Periódica de IVA relativa a Novembro 2017 (201711), tendo apurado na respetiva declaração Imposto a Recuperar no montante de € 155.689,16, tendo efetuado o Pedido de Reembolso na mesma declaração no montante de € 154.565,19.

Face às correções anteriormente propostas no montante de € 152.541,44, o reembolso apenas será parcialmente deferido no montante de € 2.023,75, pois é este o valor resultante da diferença entre o reembolso solicitado e o valor das regularizações de IVA aceites.

(...)

IX. DIREITO DE AUDIÇÃO – FUNDAMENTAÇÃO

(...)

Ponto I. - ENQUADRAMENTO FACTUAL E POSIÇÃO DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA

O s.p resume nos parágrafos 1.º a 6.º do direito de audição, as conclusões e propostas apresentadas no projeto de relatório da inspeção tributária, levada a cabo nesta Direção de finanças a coberto da Ordem de Serviço n.º OI2018..., cujo procedimento inspetivo foi originado pelo pedido de reembolso de IVA praticado pelo s.p, na Declaração Periódica de IVA do período de Novembro de 2017 (201711) no montante de € 154.565,19, tendo sido proposto um deferimento parcial no montante de € 2.023,75, resultando portanto numa correção de IVA no montante de € 152.541,44, pelo condicionalismo do prazo de 2 anos para proceder à retificação de IVA a seu favor imposto no disposto no n.º 3 do artigo 78.º do CIVA, a qual deveria ter seguido os moldes definidos na Informação Vinculativa n.º 8404, com despacho de 24/07/2015, do SDG do IVA, por delegação do Diretor Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Ponto II. - POSIÇÃO DA EXPONENTE

O s.p expõe nos parágrafos 7.º a 19.º do direito de audição, a sua posição quanto às conclusões e propostas apresentadas no projeto de relatório da inspeção tributária.

Nesse sentido vem o s.p. concordar com a AT que nas situações em que o valor do imposto seja alterado para menos, deve ser emitida uma nota de crédito a corrigir o valor do imposto, conforme dispõe o n.º 7 do artigo 29.º do CIVA.

Argumenta o s.p.. que na situação subjacente às propostas de correção apresentadas, referente à liquidação indevida de IVA por parte do s.p. em faturas que se referem a serviços de construção civil, aos quais é aplicável o disposto na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, ou seja a inversão do sujeito passivo de IVA, considera o s.p, ter efetuado um erro de enquadramento, e como tal, considera o s.p. que à retificação a seu favor do IVA liquidado indevidamente, é aplicado o prazo de 4 anos previsto no n.º 2 do artigo 98.º do CIVA ao invés do prazo de 2 anos disposto no n.º 3 do artigo 78.º do mesmo Código.

Insiste o s.p., na argumentação que apresenta, de que o que praticou aquando da liquidação de IVA em faturas relativas a serviços de construção civil, se tratou de um erro de enquadramento, afirmando que "porquanto considerou que os serviços a que as mesmas respeitam não se enquadravam no regime de inversão do sujeito passivo previsto na atines j) do número 1 do artigo 2.º do Código do IVA".

Ora, conforme já referido no capítulo III. do Projeto de Relatório da Inspeção tributária, a alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA dispõe o seguinte:

"1 - São sujeitos passivos do imposto:

j) As pessoas singulares ou colectivas referidas na alínea a) que disponham de sede. estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada." (sublinhado nosso)

Assim, carece de razão ao s.p. quando argumenta que "considerou que os serviços a que as mesmas respeitam não se enquadravam no regime de Inversão do sujeito passivo", pois está expressamente previsto na referida alínea j) que aos serviços de construção civil é aplicada a inversão do sujeito passivo de IVA

sob determinadas condições cumulativas, passíveis de serem verificadas pelo s.p., são elas:

1) Se esteja na presença de aquisição de serviços de construção civil (englobando todo o conjunto de atos necessários à concretização de uma obra, independentemente do fornecedor ser ou não obrigado a possuir alvará ou título de registo nos termos do DL. n.º 12/2004, de 9 de janeiro);

2) O adquirente ser sujeito passivo de IVA, em território nacional e, aqui pratique operações que confiram, total ou parcialmente, o direito à dedução do IVA.

Importa igualmente referir que, o prazo referido no n.º 2 do artigo 98.º do CÍVA, se refere ao prazo geral do exercício do direito à dedução, sendo que, nesse mesmo n.º 2, está explicitamente disposto que "Sem prejuízo de disposições especiais, o direito à dedução ou ao reembolso do imposto entregue em excesso só pode ser exercido até ao decurso de quatro anos após o nascimento do direito à dedução ou pagamento em excesso do imposto", havendo portanto que entender o disposto no n.º 3 do artigo 78.º do CIVA como uma dessas disposições especiais, pelo que prevalece este período especial de 2 anos ao geral previsto no n.º 2 do artigo 98.º do CIVA.

Entende o s.p., que as formalidades a cumprir na emissão de faturas se esgotam no previsto no n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, no entanto, todo o artigo 36.º do CIVA versa sobre os prazos de emissão e formalidades das faturas, pelo que, o s.p. ao emitir faturas sem dar cumprimento ao disposto no n.º 13 do artigo 36.º do CIVA, emitiu fatura inexatas, originando a liquidação indevida de IVA sobre serviços de construção civil, aos quais é aplicável o disposto na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, sendo que tais faturas já haviam dado lugar ao registo referido no artigo 45.º do CIVA, cuja ratificação, por ser a favor do s.p., tem de obedecer ao disposto no n.º 3 do artigo 78.º do CIVA, em especial ao cumprimento do prazo de regularização expresso de 2 anos, conforme também refere a Informação Vinculativa n.º 8404, com despacho de 24/07/2015, do SDG do IVA, por delegação do Diretor Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira.

Vem o s.p. concordar com a AT nos parágrafos 14.º a 16.º do direito de audição, quanto ao facto de ao caso não poder ser aplicável o n.º 2 do artigo 78.º do CIVA, porquanto a operação não foi anulada, nem foi reduzido o seu valor tributável.

O s.p. pronunciou-se ainda, não concordando, com o formalismo estipulado no n.º 13 da Informação Vinculativa n.º 8404, com despacho de 24/07/2015, do SDG do IVA, por delegação do Diretor Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, nomeadamente quanto à submissão de Declarações Periódicas de IVA de Substituição com referência aos períodos de imposto nos quais foram emitidas as faturas com liquidação indevida de IVA, o qual refere o seguinte:

13- (...), tendo em conta a liquidação indevida de imposto, bem como, da obrigatoriedade da menção "IVA-autoliquidação", a retificação deve respeitar o disposto nos n.ºs 3 e 5 do artigo 78.º, do seguinte modo:

i) Proceder à emissão de nota(s) de crédito, no sentido da anulação da(s) fatura(s) anteriormente emitida(s) com liquidação do imposto:

n) Emitir nova Mura sem liquidação de imposto, contendo a expressão "IVA-autoliquidação", de acordo com o nº 13 do artigo 36º do CIVA;

iii) Proceder à substituição da(s) declaração(ões) periódica(s) anteriormente entregue(s) através da correção (diminuição) dos valores anteriormente apresentados na base tributável e imposto a favor do Estado (Quadro 06 - Campos 3 e 4) e, inscrever o valor da nova fatura no Campo 8, do Quadro 6 ("Isentas ou não tributadas")."

Ou seja, o s.p. procedeu de acordo com as alíneas i) e ii) do n.º 13 da Informação Vinculativa citada, mas não cumpriu o disposto na alínea iii) desse mesmo n.º 13, nem pretende ver respeitado o corpo desse n.º 13 que refere que "a retificação devo respeitar o disposto nos n.ºs 3 e 5 do artigo 78.º".

Vem ainda o s.p. referir a propósito do formalismo de submissão de Declarações Periódicas de IVA de Substituição com referência aos períodos de imposto nos quais foram emitidas as faturas com liquidação indevida de IVA, no parágrafo 19.º do exercício do direito de audição, a jurisprudência comunitária que considera ser aplicável ao seu caso concreto, fazendo por isso referência ao Acórdão Barlis de 15 de Setembro de 2016, PROCESSO c-515/14, sobre o princípio da neutralidade do IVA.

A este propósito será de referir que não possuem os Serviços de Inspeção Tributária o poder de um tribunal, pelo que a existência de uma jurisprudência poderá afetar o modo pelo qual futuros tribunais decidirão casos abarcados pela mesma.

 

Ponto III. - PEDIDO

Vem o s.p. requerer que o proposto no Projeto de Relatório da Inspeção Tributária não proceda, considerando que o mesmo deve ser anulado para todos os efeitos.

Com base em tudo o exposto pelo s.p. no exercício do direito de audição, tendo sido resumido e analisado acima os fundamentos que se consideraram de maior relevância e face às conclusões retiradas, são de manter todas as correções propostas no projeto de relatório, sendo que o pedido de reembolso de IVA solicitado pelo s.p. na Declaração Periódica de IVA do período de Novembro de 2017 (201711) no montante de € 154.565,19, será deferimento parcialmente no montante de € 2.023,75, resultando portanto numa correção de IVA no montante de € 152 541,44 e será elaborado nesta data o respetivo Documento de Correção para esse período de IVA (201711).

  1. Na sequência da acção inspectiva, Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação de IVA n.º 2018..., datada de 11-04-2018, em que apurou o valor a reembolsar de € 2.023,75;
  2. Relativamente a um pedido de reembolso de IVA apresentado pela entidade B..., S.A., também esta última foi alvo de uma acção inspectiva, por parte da mesma Direcção de Finanças de ...;
  3. Nessa inspecção à B..., S.A. foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL

Foi efetuada uma análise aos documentos que suportam os lançamentos contabilísticos dos anos de 2014, 2015 e 2016, nomeadamente as deduções de IVA efetuadas na aquisição de imobilizado e aquisição de bens e serviços. Nos anos em análise a empresa adquiriu diversos serviços de construção civil prestados pela empresa A... Lda, NIPC ... referente à Construção do Terminal Rodoviário Urbano de ... . Da análise das referidas faturas verificou-se que não ocorreu a correta aplicação de situações de inversão do s.p. (reverse charge) no âmbito da construção civil nos termos da alínea j) n.º 1 artigo 2º do CIVA. Decorrendo desta situação constatou-se que o disposto no n.º 8 do artigo 19.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), aditado pela Lei n.º 66-B/2012-31/12, o qual refere que "nos casos em que a obrigação de liquidação e pagamento do imposto compete ao adquirente dos bens e serviços, apenas confere direito a dedução o imposto que for liquidado por força dessa obrigação", não foi cumprido pelo SP, tendo o mesmo deduzido imposto indevidamente num total de 153.337,11€, respeitante a aquisições de serviços de construção civil sem efetuar a devida autoliquidação do mesmo, conforme se indica no quadro seguinte (a cópia das faturas abaixo assinaladas faz parte do processo de evidência de trabalho):

Iremos proceder à correção do imposto deduzido no respetivo campo 20 nos anos de 2014 e 2015 e campo 24 no ano de 2016 das declarações periódicas de IVA que se discrimina no quadro anterior. Em simultâneo, será liquidado o IVA em falta, nos motivos atrás referidos, por força da sujeição prevista na alínea j) do n.º 1 do artigo 2º do CIVA e a correspondente dedução nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 19.º do mesmo código.

No decurso do direito de audição o s.p. procedeu à correção das omissões acima descritas tendo entregue declarações periódicas de IVA de substituição para os períodos acima mencionados, conforme se descreve no ponto VI do presente relatório.

(...)

VI. REGULARIZAÇÕES EFETUADAS PELO S.P. NO DECURSO DA AÇÃO DE INSPEÇÃO

No decurso do prazo para exercer o direito de audição o s.p. procedeu à entrega das declarações periódicas de IVA de substituição tendo retirado o imposto deduzido no respetivo campo 20 nos anos de 2014 e 2015 e campo 24 no ano de 2016 das declarações periódicas de IVA que se discrimina no quadro seguinte. Em simultâneo, liquidou o IVA em falta, nos motivos atrás referidos, por força da sujeição prevista na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA e a correspondente dedução nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 19.º do mesmo Código. As declarações de substituição foram entregues no dia 24/11/2017 e já estão liquidadas)

(...)

IX. DIREITO DE AUDIÇÃO

No dia 27 de Outubro de 2017 foi enviado para a sede da empresa a notificação prevista no artigo 60º da Lei Geral Tributária e artigo 60º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção para o exercício do direito de audição no prazo de 15 dias. O ofício foi entregue no destinatário. No dia 13 de Novembro de 2017 o sujeito passivo solicitou por escrito a prorrogação para o prazo máximo legalmente previsto de 25 dias para se pronunciar sobre o projeto de relatório. Na mesma data foi enviado ofício para a sede da sociedade a conceder o prazo máximo de 25 dias para o exercício do direito de audição. No decurso do direito de audição o s.p. procedeu às correções propostas no presente relatório e entregou as respetivas declarações de substituição de IVA conforme se descreve no ponto VI do presente relatório. Face ao exposto proponho o encerramento das presentes ordens de serviço.

 

  1. Em 20-07-2018, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.

 

2.2. Factos não provados e fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Não há factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.

Os factos foram dados como provados com base no alegado pela Requerente, nos documentos por ela juntos e o que consta do processo administrativo.

Não há controvérsia sobre os factos provados.

 

 

3. Matéria de direito

           

            A Requerente prestou serviços de construção civil à entidade B..., S.A, no âmbito da empreitada de construção do Terminal Rodoviário de ... .

A Requerente procedeu à liquidação de IVA em facturas que emitiu relativamente a tais serviços, entre Novembro de 2014 e Agosto de 2017.

Em Novembro de 2017, a Requerente concluiu que tal liquidação de IVA foi indevida, por não ter atendido à inversão do sujeito passivo (reverse charge) que resulta da alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, que estabelece que são sujeitos passivos do imposto «as pessoas singulares ou colectivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada».

Após a constatação de tal erro, a Requerente procedeu à regularização, a seu favor, do IVA liquidado no montante de € 154.565,19, emitindo as respectivas notificações de crédito e anulando as facturas em que havia sido efectuada a liquidação indevida e emitindo novas facturas sem liquidação de imposto.

A Requerente inscreveu o montante do imposto indevidamente liquidado no campo 40 da declaração periódica do mês de Novembro de 2017 e pediu o respectivo seu reembolso.

A Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou a regularização quanto que facturas emitidas há mais de dois anos, invocando, em suma, o limite temporal que consta do n.º 3 do artigo 78.º do CIVA e que deveria ter sido efectuada «a entrega de Declarações Periódicas de IVA de substituição dos períodos a retificar, sendo que deveria tê-lo feito no prazo de 2 anos a contar da data de submissão das Declarações Periódicas de IVA a substituir».

Assim, a Autoridade Tributária e Aduaneira apenas aceitou a regularização quanto ao montante de € 2.023,75 (correspondente às facturas emitidas em 2016 e 2017) e efectuou uma correção de IVA no montante de € 152.541,44 (relativamente às facturas emitidas em 2014 e 2015).

Na sequência de tal correcção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação impugnada em que indicou o valor de € 2.023,75 a reembolsar.

Entretanto, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma inspecção à B..., S.A., tendo por fundamento a não liquidação de IVA relativamente às facturas cuja regularização a Requerente tinha efectuado.

No período para exercício de audição sobre o projecto de relatório Tributária elaborado nesta inspecção à B..., S.A, esta empresa «procedeu à entrega das declarações periódicas de IVA de substituição tendo retirado o imposto deduzido no respetivo campo 20 nos anos de 2014 e 2015 e campo 24 no ano de 2016 das declarações periódicas de IVA que se discrimina no quadro seguinte. Em simultâneo, liquidou o IVA em falta, nos motivos atrás referidos, por força da sujeição prevista na alínea j) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA e a correspondente dedução nos lermos da alínea c) do n.º 1 do artigo 19.º do mesmo Código».

O montante de IVA que esta empresa B..., S.A. liquidou foi de € 153.337,11, respeitante às facturas emitidas pela Requerente em, 2014 e 2015 e também as facturas emitidas em 2016.

A Requerente discorda das correções efectuadas imputando-lhes dos seguintes vícios:

 – erro quanto ao prazo para o exercício do direito à regularização do imposto (indevidamente) liquidado por motivo de erro de enquadramento das operações tributáveis dos sujeitos passivos;

– violação do princípio da legalidade pela Autoridade Tributária e Aduaneira quanto ao procedimento declarativo adoptado pela Requerente para reportar a regularização de imposto por si efectuada no mês de Novembro de 2017;

– duplicação de colecta.

 

3.1. Ordem de conhecimento de vícios

 

De harmonia com o disposto no artigo 124.º do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, do RJAT, «na sentença, o tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do acto impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam à sua anulação» e deverá dar-se prioridade aos «vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos».

No caso em apreço, afigura-se que o vício de duplicação de colecta, que é uma ilegalidade a que é dada especial relevância, sendo de conhecimento oficioso como a nulidade (artigo 175.º do CPPT), deverá ser apreciado prioritariamente, pois tem potencialidade para assegurar eficaz e estável tutela dos interesses da Requerente.

 

3.2. Duplicação de colecta

    

A duplicação de colecta está prevista no artigo 205.º do CPPT, como fundamento de oposição à execução fiscal.

De harmonia com o n.º 1 deste artigo 205.º «haverá duplicação de colecta para efeitos do artigo anterior quando, estando pago por inteiro um tributo, se exigir da mesma ou de diferente pessoa um outro de igual natureza, referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo».

A duplicação de colecta é doutrinal e jurisprudencialmente considerada uma «heresia» no nosso sistema fiscal ( [1] ), devendo ser conhecida oficiosamente, pela Autoridade Tributária e Aduaneira ou pelos Tribunais, nos termos o artigo 175.º do mesmo Código.

Sendo proibida por lei a duplicação de colecta, quando ela deriva da emissão de uma nova liquidação e está pago por inteiro tributo liquidado, relativamente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo, constitui ilegalidade dessa nova liquidação, susceptível de ser invocada em processo de impugnação judicial, que pode ter como fundamento «qualquer ilegalidade» (artigo 99.º do CPPT).

Uma confirmação de que a invocação da duplicação de colecta não se restringe ao processo de execução fiscal, encontra-se no n.º 6 do art. 78.º da LGT em que se prevê a possibilidade de revisão do acto tributário com esse fundamento.

Como decorre do n.º 1 do artigo 205.º do CPPT, aplicado às situações em que são impugnados actos de liquidação, haverá duplicação de colecta quando, estando pago por inteiro um tributo, se exigir da mesma ou de diferente pessoa um outro de igual natureza, referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo.

No caso em apreço, é claro que se verifica uma situação deste tipo.

Na verdade, todo o IVA que deveria ser liquidado quanto aos serviços prestados pela Requerente a que se referem as facturas cuja regularização foi recusada à Requerente, foi integralmente pago pela empresa à B..., S.A.. como resulta do Relatório da Inspecção Tributária relativo a esta empresa, que consta do documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, o que não é questionado pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

O facto de não ter sido o Requerente a efectuar o pagamento do IVA é irrelevante, para este efeito, pois expressamente se prevê que existe duplicação de colecta mesmo quando a nova exigência de imposto é feita a diferente pessoa.

Poderia ser obstáculo ao reconhecimento da existência de uma situação de duplicação de colecta a eventualidade de o pagamento efectuado pela B..., S.A. poder ser impugnado.

O regime da duplicação de colecta pressupõe que o primeiro pagamento está consolidado ( [2] ), pois o que justifica a não exigência de novo imposto é o facto de com a dupla aplicação da mesma norma tributária a uma situação concreta se gerar uma situação de enriquecimento injustificado do erário público.

Porém, no caso em apreço, em 24-11-2017 foi regularizada a situação pela B..., S.A, sendo apresentadas por esta declarações de substituição e liquidado o IVA em falta, relativo a facturas emitidas entre 07-11-2014 e 11-08-2016, na sequência de correcções propostas pela Autoridade Tributária e Aduaneira aceites por aquela empresa, pelo é de considerar que a situação já se encontra consolidada, pelo decurso do prazo do prazo impugnação. Aliás, trata-se de uma situação em que é manifesto que o imposto pago pela B..., S.A. é devido, o que reforça uma conclusão no sentido da consolidação do pagamento por esta efectuado.

            Por outro lado, quanto à tese defendida pela Autoridade Tributária e Aduaneira nas suas alegações, que se reconduz a que o IVA indevidamente indicado nas facturas relativo a uma prestação de serviços ser devido cumulativamente com o que é liquidado devidamente com base na mesma prestação, para além de ser incompatível do referido artigo 205.º do CPPT, é contrária ao princípio da neutralidade, numa situação em que não é detectável enriquecimento sem causa, nem perda de receitas fiscais, como tem vindo a ser entendido pelo TJUE:

– um Estado-Membro só pode opor-se à restituição ao operador de um imposto cobrado em violação do direito comunitário se se provar que o imposto foi na totalidade suportado por outra pessoa e que a restituição ao referido operador implica para o mesmo um enriquecimento sem causa (acórdão de 14-01-1997, processo n.º C-192/95);

– quando o emitente da factura eliminou por completo, em tempo útil, o risco de perda de receitas fiscais, o princípio da neutralidade do IVA exige que este imposto possa ser corrigido quando é indevidamente facturado, sem que esta regularização possa ser sujeita pelos Estados-Membros à boa fé do emitente da referida factura (v. acórdãos, já referidos, Schmeink & Cofreth e Strobel, n.° 58, bem como Karageorgou e o., n.º 50) (acórdãos de 18-06-2009, processo n.º C-566/07 e de 254-05-2015, processo n.º C-111/14);

– as normas do direito comunitário relativas à repetição do indevido devem ser interpretadas no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional que negue, o que cabe ao órgão jurisdicional nacional verificar, o reembolso de um imposto incompatível com o direito comunitário pelo mero facto de este ter sido repercutido em terceiros, sem exigir a prova da medida do enriquecimento sem causa que o reembolso desse imposto causaria ao sujeito passivo (acórdão de 02-10-2003, processo n.º C-147/01);

– e as medidas que os Estados‑Membros têm a faculdade de adoptar para garantir a cobrança exata do imposto e evitar a fraude não devem exceder o necessário para alcançar esses objetivos. Por conseguinte, não podem ser utilizadas de uma forma que ponha em causa a neutralidade do IVA, que constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA instituído pelo direito da União nesta matéria (acórdão Rusedespred, C‑138/12, EU:C:2013:233, n.ºs 28, 29 e jurisprudência referida) (acórdão de 23-04-2015, processo n.º C-111/14);

– por excepção ao princípio do reembolso dos impostos incompatíveis com o direito da União, a restituição de um imposto indevidamente cobrado pode ser recusada quando conduza a um enriquecimento sem causa dos titulares do direito (acórdão de 06-09-2011, processo n.º C-398/09)

 

            Assim, conclui-se que a liquidação de IVA impugnada, ao consubstanciar, através da recusa de reembolso pedido, exigência à Requerente do IVA que está pago pela B..., S.A., relativamente prestação de serviços efectuada pela Requerente, enferma de vício de duplicação de colecta, que justifica a sua anulação, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

 

3.3. Questões de conhecimento prejudicado

 

Sendo de julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral por vício que assegura eficaz e estável tutela dos interesses da Requerente, fica prejudicado, por ser inútil (artigo 103.º do CPC) o conhecimento dos restantes vícios imputados à liquidação impugnada.

 

4. Restituição de quantia paga em excesso e juros indemnizatórios

 

          A Requerente pede o montante do reembolso por si peticionado, e indeferido pela AT através da emissão do acto de liquidação em crise, no valor de € 154.565,20, acrescido dos correspondentes juros indemnizatórios.

          O montante que foi recusado à Requerente foi de € 152.541,44, pois foi deferida a sua pretensão quanto ao montante de € 2.023,75.

          Por isso, apenas está em causa no presente processo o montante de € 152.541,44.

          De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do artigo 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

Como o pagamento de juros indemnizatórios depende de existir quantia a reembolsar, insere-se no âmbito das competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD apreciar se há direito a reembolso e em que medida.

Cumpre, assim, apreciar os pedidos de reembolso da quantia paga indevidamente acrescida de juros indemnizatórios.

Na sequência da ilegalidade da liquidação, a Requerente tem direito a ser reembolsada das quantias que pagou indevidamente.

No que concerne ao direito a juros indemnizatórios, é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:

 

Artigo 43.º

 Pagamento indevido da prestação tributária

 

1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar da liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

3. São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias:

a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos;

b) Em caso de anulação do acto tributário por iniciativa da administração tributária, a partir do 30.º dia posterior à decisão, sem que tenha sido processada a nota de crédito;

c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária.

 

4. A taxa dos juros indemnizatórios é igual à taxa dos juros compensatórios.

 

No caso em apreço, na sequência da anulação do acto de liquidação, há lugar a reembolso do imposto pago, por força dos referidos arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado».

No que concerne aos juros indemnizatórios, o artigo 43.º, n.ºs 1 e 2, da LGT estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido».

No caso em apreço, foi a Autoridade Tributária e Aduaneira quem efectuou a liquidação impugnada, por sua iniciativa, em momento em que já estava pago pela B..., S.A. o IVA em causa, pelo que o vício de duplicação de colecta que afecta a liquidação impugnada lhe é imputável.

Assim, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios à taxa legal supletiva contados desde 11-04-2018 (data da liquidação) calculados sobre a quantia de € 152.541,44, até integral reembolso, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, 61.º, n.ºs 2, 3, 4 e 5, do CPPT, e art. 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.

 

 

               5. Decisão

 

Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

  1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
  2. Anular a liquidação de IVA n.º 2018... na medida em que recusou à Requerente o reembolso de € 152.541,44;
  3. Condenar à Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar a Requerente da quantia de € 152.541,44;
  4. Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagá-los à Requerente nos termos referidos no ponto 4 deste acórdão.

 

 

 

6. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, não tendo sido questionado o valor indicado pela Requerente, fixa-se ao processo o valor de € 154.565,20.

 

 

7. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 3.672,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

 

Lisboa, 05-12-2018

 

 

Os Árbitros

 

 

 

(Jorge Lopes de Sousa)

 

 

 

 

(Adelaide Moura)

 

 

                                   

(Marcolino Pisão Pedreiro)



[1] TEIXEIRA RIBEIRO, Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 120.º, página 278, e acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 29-11-1989, processo n.º 011877.

[2] Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 19-4-2012, processo n.º 0150/12, e de 27-2-2013, processo n.º 01079/12.