Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 82/2018-T
Data da decisão: 2018-10-10  IRS  
Valor do pedido: € 12.198,30
Tema: IRS – Determinação de Residência Fiscal
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Decisão Arbitral (consultar versão completa no PDF)

 

RELATÓRIO

A -PARTES

A..., com o NIF..., com residência em ... ... e B..., NIF..., com residência na Rua ..., ...-... ..., doravante designada de Requerente ou sujeito passivo.

AUTORIDADE TRIBUTARIA E ADUANEIRA doravante designada por Requerida ou AT.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD, no dia 17-05-2018, para apreciar e decidir o objeto do presente processo, e automaticamente notificado a Autoridade Tributaria e Aduaneira no dia 17-05-2018, conforme consta da respetiva ata.

A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico, designou o Árbitro Paulo Ferreira Alves, tendo a nomeação sido aceite nos termos legalmente previstos.

Em 27-04-2018 as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e dos Artigos 6.º e 7º do Código Deontológico.

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66­B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular fica regularmente constituído em 28-05-2018.

O tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído. É materialmente competente, nos termos dos art.ºs 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

No dia 12-09-2018 as 11h00m, teve lugar no CAAD a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, para inquirição de testemunhas.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas (art.ºs 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de vícios que o invalidem.

 

B – PEDIDO       

  1. O ora Requerente, pretende a declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de 2013 e 2014, números 2017 ... e 2017 ..., no valor total de € 12.198,30.

 

C – CAUSA DE PEDIR

 

  1.  A fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral, os Requerentes alegaram, com vista a declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, já descritos no ponto 1 deste Acórdão, síntese, o seguinte:
    1. Estão em causa duas liquidações adicionais de IRS relativas aos anos de 2013 e 2014, com os números 2017... e 2017..., emitidas na sequência de um procedimento de Inspeção Tributária, a que corresponderam as Demonstrações de Acerto de conta n.º 2017... e n.º 2017..., nos valores globais a pagar de € 6.212,24 e € 5.986,06, respetivamente.
    2. Defende o Requerente que a AT considerou que o Requerente A... devia ser tributado como residente em Portugal, em 2013 e 2014
    3. Sustentando que a AT presumiu que este passou a maior parte do tempo no nosso território (mais de 183 dias), em face das declarações prestadas à GNR, após uma operação de trânsito realizada em final do ano de 2015; E Mesmo admitindo que não passou a maior parte do tempo em Portugal, e nos termos do n.º 2, do artigo 16.º do CIRS, porque «são sempre havidas como residentes em Portugal as pessoas que constituem o agregado familiar, desde que naquela resida qualquer das pessoas a quem incumbe a direção do mesmo»
    4. Os Requerentes nas declarações modelo 3 de IRS referentes aos anos de 2013 e 2014, apenas foram declarados os rendimentos auferidos pela Requerente B..., na medida em que o Requerente A... era não residente em Portugal.
    5. Porém, por manifesto lapso declarativo, no introito da Modelo 3 (i.e., Q.3, automaticamente necessário, dado constarem registados como ‘casados’ no Q.6) o Requerente A... é incluído na ‘composição do agregado familiar’, quando, apesar de juridicamente “casados”, deveria ter sido feita a opção de “separados de facto” para efeitos fiscais.
    6. Sobre as declarações à GNR, nada mais são do que isso mesmo, meras declarações prestadas num outro contexto (operação stop) com vista, designadamente, à aferição de documentação automóvel e respetivos registos (moradas, titularidades, etc…), e que não provam que o REQUERENTE passe a maior parte do tempo em Portugal para que tal possa “atrair”, sem mais, a tributação para o nosso território.
    7. Acresce que tais declarações foram prestadas no final do ano de 2015, e os atos tributários respeitam a 2013 e 2014 Sendo certo que, não sendo nada mais referido ou provado a este respeito pela AT, ter-se-á que dar por não provada nos autos a alegada permanência em Portugal por mais de 183 dias do sujeito passivo B, o Requerente A... .
    8. Alega, que é prova a própria menção feita pela AT de que, em face das declarações de 2015 «presume-se que o sujeito passivo B, quer em 2013, quer em 2014, esteve mais de 183 dias em Portugal».
    9. Para além do exposto, estando sozinho em Espanha, e exercendo funções comerciais, é normal que se deslocasse (e desloque) com toda a regularidade possível a Portugal para visitar a família, que cá manteve a casa de morada de família, dado que a sua esposa e filhos continuaram a residir em Portugal.
    10. Consequentemente, nenhumas dúvidas residem que o Requerente A... continuou e continua a residir e a trabalhar em Espanha, o que resulta inquestionável de toda a prova que se carreou para o procedimento administrativo e que se agora, por necessidade, se repete no âmbito do presente processo.
    11. Alega, que desde 2010 que o REQUERENTE A... é não residente em Portugal, conforme cópia do cadastro da AT, alteração que foi solicitada em 08/06/2010.
    12. O Requerente, estando desempregado em Portugal, mudou-se para Espanha por motivos profissionais, conforme contrato de trabalho, cuja vigência se iniciou em 1/06/2010.
    13. Valore-se ainda que o referido contrato estabelece na cláusula primeira, dúvidas existissem, quanto ao local de trabalho, que: “O local de trabalho situa-se em ... [Valência, Espanha].» e sustenta que quanto ao tempo de trabalho, de 40h00 semanais.
    14. Mais defende que facto ainda comprovado pela declaração, que atesta que o mesmo vive em Valência, num apartamento e os certificados de residência emitidos pelo “Ajuntament de Valencia”
    15. Bem como o integral cumprimento das respetivas obrigações tributárias no país de residência, ou seja, em Espanha, nos referidos anos de 2013 e 2014.
    16. Sustenta o Requerente, que a AT mesmo admitindo que não passou a maior parte do tempo em Portugal, e nos termos do n.º 2, do artigo 16.º do CIRS «são sempre havidas como residentes em território Português as pessoas que constituem o agregado familiar, desde que naquela resida qualquer das pessoas a quem incumbe a direção do mesmo».
    17. Ou seja, importa confirmar se lhe é aplicável o n.º 2 do artigo 16.º do CIRS, enunciado pela AT; A este propósito, saliente-se que estamos perante uma presunção que pode ser ilidida, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, na redação em vigor à data dos factos:
    18. O Requerente A... tem o seu local de trabalho em Espanha, onde trabalha de segunda a sexta-feira (40h00), o que significa, no máximo, que poderia ter vindo a Portugal em fins-de-semana e no período de férias, para estar junto da família.
    19. Logo, sendo esse trabalho em Espanha a única fonte de rendimento do trabalho que aufere desde 2010, fica imediatamente provada «a inexistência de uma ligação entre a maior parte das suas atividades económicas e o território português», prevista na norma, ou seja, fica ilidida, para os devidos efeitos legais, a presunção do n.º 2, invocada pela AT para justificar as correções.
    20. Resulta claro e inequívoco que o ora Requerente A... tem uma habitação permanente e “centro de interesses vitais” (família vs. trabalho) em ambos os Estados, pelo que, o conflito de residência Portugal/Espanha deverá ser resolvido através do critério ‘Estado em que permanecer mais habitualmente’.
    21. Ora, nenhumas dúvidas existem que trabalha em Valência, declara os seus impostos em Espanha, sendo esse o principal centro dos seus interesses económicos determinado na lei portuguesa (artigo 16.º n.º 3 do CIRS) e o local onde permanece mais habitualmente, nos termos da citada Convenção.
    22. Pelo que, nenhumas razões factuais ou legais subsistem para que a AT presuma com legitimidade que este pode ser tributado como residente no nosso território.
    23. Termina a Requerente alegando que, deve o presente Pedido de Pronúncia Arbitral ser declarado procedente, por provado, para todos os devidos efeitos legais e os REQUERENTES reembolsados do montante total de imposto indevidamente pago, acrescido do pagamento de juros indemnizatórios.

 

D- DA RESPOSTA DA REQUERIDA

 

  1. A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta na qual, em síntese abreviada, alegou o seguinte:
    1. Importa salientar, no que aos factos diz respeito, que em relação à reclamação graciosa os Requerentes acrescem o documento n.º 5, do qual consta a “información de la presentación de la declaración modelo 100” e “IRPF”, os quais resultam das declarações de rendimentos apresentadas pelo Requerente A... em Espanha referentes aos anos de 2013 e 2014
    2. O Requerente A... não logrou apresentar documento emitido pelas autoridades fiscais espanholas a certificar que, nos anos de 2013 e 2014, era residente fiscal em Espanha nos termos do artigo 4.º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre o Reino de Espanha e Portugal.
    3. Ora, as autoridades fiscais espanholas ao comunicarem à AT os rendimentos auferidos pelo Requerente A..., nomeadamente no âmbito da Troca de Informações, estão a declarar que o consideram, para efeitos fiscais residente em Portugal, conforme se retira do n.º 1 do artigo 26.º da CDT
    4. Para além disso, e sem prejuízo da excepção infra, a AT, no âmbito das correções de rendimentos em crise nos autos, não efetuou qualquer alteração ao estatuto de residência do Requerente A... nas declarações de rendimento – Modelo 3 referentes aos anos de 2013 e 2014
    5. O Requerente A... em momento algum, anterior às correções efetuadas pela AT em 2017, com referência aos anos 2013 e 2014, reclamou e/ou impugnou a sua declaração de residente nas respetivas declarações de rendimento – Modelo 3.
    6. Contrariamente ao que vem sendo alegado pelos Requerentes o alegado manifesto lapso declarativo cf. n. os 9 e 10 do PPA, como casados em vez de separados de facto e, refira-se, como o Requerente A... sendo residente em vez de não residente, trata-se duma prática reiterada desde a DR M3 de 2010 até à de 2016, , que se juntam e se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
    7. A declaração da condição de casados dos Requerentes e de residente em território nacional do Requerente A..., ao logo de 7 exercícios fiscais, salvo melhor opinião, inviabiliza a tese de que se trata dum “manifesto lapso declarativo”.
    8. Acresce a isso o facto de o Requerente A..., conforme alegado no n.º 30 do PPA, ter alterado o seu estatuto para não residente junto da AT, que também obsta à tese de que se trata dum “manifesto lapso declarativo”.
    9. Atente-se ainda que, cf. consta dos referidos docs. 1 a 7, o Requerente A..., com exceção da DR M3 de 2010 em que declarou rendimentos no montante de € 150,00, não declarou rendimentos em nenhum dos anos seguintes, de 2011 a 2016.
    10. Para além de que, de 2010 a 2016 declarou sempre no Anexo H da DR M3, no Quadro 7 – Deduções à colecta e benefícios fiscais e/ou Quadro 8 – Despesas De Saúde E De Educação.
    11. Ora, conforme previsão legal, o sujeito passivo pode provar o contrário, isto é, que a informação prestada pelas autoridades fiscais de Espanha não estava correta, devendo para isso apresentar prova de igual ou superior valor probatório.
    12. Para tanto, bastava ao Requerente A... apresentar uma declaração emitida e certificada pelas autoridades fiscais espanholas, na qual constasse o rendimento efetivamente auferido e o imposto efetivamente pago a final, o que não logrou fazer, isto em relação ao quantum do rendimento e à sujeição a imposto.
    13. Ademais, as autoridades fiscais espanholas ao enviarem informação dos rendimentos auferidos pelo Requerente em Espanha, estão insitamente a declarar que, nos termos do artigo 26.º da CDT, o consideraram residente fiscal em Portugal
    14. Se Espanha entendesse que o Requerente era seu residente fiscal não enviaria a sua informação fiscal a Portugal, porquanto tal iria contra as disposições da Convenção.
    15. Assim como ao Requerente A... competia apresentar um certificado de residência fiscal em Espanha, relativo aos anos em apreço, emitido pelas autoridades fiscais desse Estado que contraditasse a informação prestada por aquela administração tributária ao abrigo da troca de informações prevista na CDT.
    16. Termina a Requerente, sustento que o presente pedido de pronúncia arbitral ser julgado improcedente, mantendo-se na ordem jurídica o ato tributário de liquidação impugnado e absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido, tudo com as devidas e legais consequências.

 

E-        FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

 

  1. Antes de entrar na apreciação destas questões, cumpre apresentar a matéria factual relevante para a respetiva compreensão e decisão, efetuou-se com base na prova documental e testemunhal, e tendo em conta os factos alegados.
  2. No caso específico das testemunhas, considera-se que estas depuseram de forma coerente, sustentada e reveladora de domínio das razões de ciência com relevo para a prestação de informação ao Tribunal.
  3. Em matéria de facto relevante, dá o presente tribunal por assente os seguintes factos:
    1. O Requerente (A...), celebrou um contrato de trabalho a tempo completo e sem termo em 1 de Junho de 2010, correspondente a 40 horas semanais, de segunda a sexta, com a Empresa C..., S.L., com o número de identificação fiscal espanhol..., com sede em Espanha.
    2. Conforme o contrato de trabalho do Requerente (A...), o centro de trabalho localiza-se em Espanha, na ... .
    3. O Requerente (A...), indicou como pais de domicílio no seu contrato de trabalho, Espanha e o município de Valencia.
    4. Conforme, certificado emitido pelo Ajuntament de Valencia, por D..., certifica em 26/05/2010 que o Requerente (A...), possui o domicílio ..., n.º... .
    5. Conforme “Certificado de Empadronamiento”, certifica para efeitos de Segurança Social em 03/10/2013, que o Requerente (A...), possui a sua morada desde 26-05-2010 em ..., n.º..., Valencia.
    6. Conforme “Certificado de Empadronamiento”, certifica para efeitos de Segurança Social em 16/10/2014, que o Requerente (A...), possui a sua morada desde 26-05-2010 em ..., n.º..., Valencia.
    7. O Requerente (A...), possui o número de identificação fiscal espanhol … J.
    8. Em 17-06-2014, com o número de registo 2013..., referente ao ano 2013, o Requerente (A...), entregou em Espanha a sua declaração para efeitos de imposto sobre o rendimento ”Impusto sobre la Renta de las Personas Físicas”.
    9. Nessa declaração declarou como retribuições de trabalho 22.045,32€.
    10. Recorrendo a página www.agenciatributaria.es, indicada no rodapé Declaração de Rendimentos Espanhola, para efeitos de confirmação da veracidade da declaração, (respectivamente a pagina https://www... ....vis.VisualizaSc?COMPLETA=NO&ORIGEN=J), de acordo com o código seguro de validação aposto na declaração submetida pelo sujeito passivo, ..., comprova-se a veracidade da declaração de rendimentos do Requerente (A...) quanto ano 2013, e a respetivo imposto a liquidar pelos rendimentos de trabalho declarados nesse período em Espanha.
    11. Verifica-se igualmente que de acordo com a ..., que a declaração contém como Vivenda Habitual o Território Espanhol, no ano de 2013.
    12. Em 05-06-2015, com o número de registo 2014..., referente ao ano 2014, o Requerente (A...), entregou em Espanha a sua declaração para efeitos de imposto sobre o rendimento ”Impusto sobre la Renta de las Personas Físicas”.
    13. Nessa declaração declarou como retribuições de trabalho 22.046,09€.
    14. Recorrendo a página www.agenciatributaria.es, indicada no rodapé Declaração de Rendimentos Espanhola, para efeitos de confirmação da veracidade da declaração, (respectivamente a pagina https://www2 ... ... ovis.VisualizaSc?COMPLETA=NO&ORIGEN=J de acordo com o código seguro de validação aposto na declaração submetida pelo sujeito passivo, ..., comprova-se a veracidade da declaração de rendimentos do Requerente (A...) quanto ano 2014, e a respetivo imposto a liquidar pelo rendimentos de trabalho declarados nesse período em Espanha.
    15. Verifica-se igualmente que de acordo com a ..., que a declaração contém como Vivenda Habitual o Território Espanhol, no ano de 2014.
    16. Os Requerentes são casados entre si, e possuem dois filhos.
    17. A Requerente (B...), residente na Rua ... ...-... ..., Portugal, com os seus dois filhos.
    18. A Requerente (B...), declarou no Modelo 3 para efeitos de declaração de IRS, para os anos 2013 e 2014, registou na composição do agregado familiar, como casados.
    19. O Requerente A..., com exceção da DR M3 de 2010 em que declarou rendimentos no montante de € 150,00, não declarou rendimentos em nenhum dos anos seguintes, nos anos 2013 a 2014, e entre o período de 2011 a 2016.
    20. Por ofício n.º ... de 19-10-2017 (carta registada RD...PT), a AT notificou o reclamante, ora Requerente, para exercício de audição prévia relativamente à proposta de decisão exarada na informação seguinte, no processo n.º ...2017... .
    21. A 09-11-2017, os Requerentes exerceram o direito de audição prévia.
    22. Por ofício n.º ... de 30-11-2017 (carta simples) e ofício n.º ... de 30-11-2017 (carta regista com A/R – RD ...), respetivamente, o Requerente e a sua mandatária, foram notificados da decisão final de indeferimento relativamente à reclamação graciosa
    23. Em 2013, o Requerente A... permaneceu, mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em Espanha.
    24. Em 2014, o Requerente A... permaneceu, mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em Espanha.
    25.  
  4. F-  FACTOS NÃO PROVADOS
  5. Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. artigos 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
  6. Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 

G- QUESTÕES DECIDENDAS

  1. Atenta as posições das partes assumidas nos argumentos apresentados, constituem questões centrais dirimendas a seguinte, as quais cumpre, pois, apreciar e decidir:
  1. A alegada pela Requerente:
    1. Declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação em sede Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de 2013 e 2014, números 2017 ... e 2017 ..., no valor total de € 12.198,30.
    2. Condenação no pagamento de juros indemnizatórios.
  2. A Alegada pela Requerida:
    1. Exceção da inimpugnabilidade do estatuto de residente fiscal em território português

 

 

H         QUESTÃO PRÉVIA: EXCEÇÃO DA INIMPUGNABILIDADE DO ESTATUTO DE RESIDENTE FISCAL EM TERRITÓRIO PORTUGUÊS

  1. As questões de determinação da competência dos tribunais são de conhecimento prioritário e de conhecimento oficioso, nos termos dos arts.º 13º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e do art.º 578º do Código de Processo Civil (CPC) por aplicação subsidiária do art.º 29º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributaria (RJAT), importa assim face ao exposto apreciar a presente exceção dilatória.
  2. É suscitada por parte da Requerida inimpugnabilidade do acto tributário é uma excepção dilatória que determina a absolvição da Ré da instância ao abrigo dos artigos 89º, nº 4 alínea i) do CPTA e 278º nº 1 alínea e) do CPC, aplicável ex vi art.º 1.º do CPTA
  3. Alega a Requerida que à data das liquidações adicionais de IRS aqui postas em crise, promovida oficiosamente pela AT em 2017, com referência aos períodos de 2013 e 2014, todos os factos declarados pelos Requerentes eram inimpugnáveis, por extemporaneidade.
  4. Assim, não podiam os Requerentes em 2017, quando os prazos de reclamação e de impugnação haviam terminado, pôr em crise um acto tributário que resultou de declarações do próprio.
  5. Assim, entendemos que os actos de liquidação adicional de IRS de 2017, com referência aos anos de 2013 e de 2014, só podem ser impugnados nos segmentos modificados, ou seja, quanto ao rendimento auferido e imposto pago no estrangeiro adicionado nos anexos J, e nunca quanto ao segmento que já se encontrava consolidado e estável na ordem jurídica, nomeadamente, quanto à declaração de residência fiscal em território português do Requerente, nas respetivas DR M3.
  6. A Requerente contra-alegou, pode a AT defender que ja não havia prazo para alegar o erro na indicação da residencia do REQUERENTE, quando tal esta intimamente ligado/fator determinante das liquidações adicionais sub júdice.
  7. E estando as declarações de rendimentos dos anos de 2013 e 2014 postas em crise, não se pode aceitar que os sujeitos passivos não possam por em causa a informação que consta das mesmas, o que apenas seria permitido a AT, emitindo liquidações adicionais, sem que os sujeitos passivos nada pudessem faze
  8. Considerando a AT que nada mais poderá ser discutido além da inclusão/exclusão do rendimento e imposto pago no estrangeiro, esta a limitar o âmbito de reclamação a factos assentes - o rendimento recebido e imposto pago no estrangeiro - coartando o direito do contribuinte a defender-se, por não poder invocar qualquer outra dimensão da relação jurídico-tributaria e da própria modelo 3 de IRS.
  9. Perante a posição assumidas pelas partes, face à exceção invocada, cabe ao presente Tribunal decidir.
  10. É suscitado no presente tribunal arbitral que as presentes liquidações, resultaram das declarações entregues pelos Requerente dos anos de 2013 e 2014, onde se declararam como residentes fiscais em Portugal. Consequentemente, como se declararam residentes fiscais, e tendo o prazo de 120 dias para corrigir as suas declarações (nos termos do artigo 70.º e 102.º do CPPT) decorrido, já não poderiam alterar esse estatuto no âmbito do procedimento de inspeção ou no âmbito do presente pedido de pronúncia arbitral. De acordo com a argumentação da AT, não podendo o Requerente (marido) alterar o seu estado para não residente, e consequentemente não podendo o presente tribunal arbitral faze-lo por se tratar de uma exceção, apenas o pode fazer quanto aos segmentos modificados, ou seja, quanto ao rendimento auferido e imposto pago no estrangeiro adicionado nos anexos J.
  11. Exceção dilatória de inimpugnabilidade do ato impugnado, que não tem provimento, se não vejamos.
  12. As exceções dilatórias são impeditivas do conhecimento do mérito da causa, nos termos do disposto no artigo 576.º, n. 1 e 2 do CPC ex vi artigo 2.º alínea e) do CPPT e artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, o qual obsta ao conhecimento do pedido e a absolvição da instância da AT.
  13. Constitui uma exceção dilatória, a incompetência, quer absoluta, quer relativa, do tribunal arbitral quanto a capacidade material de apreciação dos atos objeto da pretensão arbitral, art.º 577.º do CPC e art.º 2.º do RJAT.
  14. O presente processo arbitral incide sobre as liquidações adicionais Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de 2013 e 2014, números 2017... e 2017..., no valor total de € 12.198,30, que resultaram da aplicação da decisão final do procedimento de inspeção.
  15. Nas liquidações AT pronuncia-se sobre a questão da residência no relatório de inspeção e decidiu sobre a residência fiscal do sujeito passivo, conforme se pode verificar, do excerto retirado do relatório:

“Analisados os fundamentos aduzidos em sede de audição prévia, concluiu-se que os mesmos não são susceptíveis de conduzir a um entendimento diferente do preconizado no projecto de decisão, porquanto:

No âmbito de uma acção de fiscalização de trânsito, em 2015-10-19, o sujeito passivo B declarou a um militar da Guarna Nacional Republicana (GNR) que, embora tenha morada em Espanha e trabalhe para uma empresa espanhola, desempenhando funções de comercial da empresa em Portugal, passa a maior parte do tempo em Portugal, residindo com o seu agregado familiar na Rua ..., ...-... ... .

Por força do que declarou ao militar da GNR, presume-se que o sujeito passivo B, quer em 2013, quer em 2014, esteve mais de 183 dias em Portugal, pelo que deve ser considerado residente em território português, por força do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 16º do Código do IRS (CIRS). 

Mesmo que não se confirme a permanência em Portugal mais de 183 dias em cada um dos anos em causa, o sujeito passivo B não deixaria de ser considerado residente em território português, uma vez que o nº 2 do art.º 16º do CIRS, na redacção em vigor nos anos de 2013 e 2014, determina que são sempre havidas como residentes em território português as pessoas que constituem o agregado familiar, desde que naquele resida qualquer das pessoas a quem incumbe a direcção do mesmo.”

Atendendo a que a argumentação agora invocada havia sido já aduzida e analisada na DSIRS, tendo aquela direcção de serviços promovido a emissão de liquidações oficiosas, constata-se inexistir suporte legal para atender a matéria reclamada.”

  1. É inquestionável que a AT se pronunciou sobre a residência fiscal do Requerente, e submeteu à mesma apreciação da Requerente na notificação do relatório de inspeção e subsequentes atos de liquidação adicional, bem como a Requerente submeteu a Autoridade Tributária e Aduaneira na reclamação graciosa esta questão da ilegalidade da liquidação adicional quanto a residência fiscal, pois ela foi expressamente referida na reclamação.
  2. Assim, tendo a questão sido submetida à apreciação da Autoridade Tributária e Aduaneira e pronunciado sobre a mesma, não se verifica inimpugnabilidade.
  3. Por outro lado, nas situações de liquidação adicional em que é proferida uma decisão expressa, o que fica a subsistir na ordem jurídica é a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira perante o sujeito passivo que é definida pela sua decisão, na parte em que a legalidade da liquidação foi apreciada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
  4. Na verdade, num contencioso de mera legalidade, tem de se aferir da legalidade do acto impugnado tal como ocorreu, com a fundamentação que nele foi utilizada, não sendo relevantes outras possíveis fundamentações que poderiam servir de suporte a outros actos, de conteúdo decisório total ou parcialmente coincidente com o acto praticado. (Processo Arbitral nº 208/2015-T)
  5. Por isso, é à face da fundamentação da decisão do relatório de inspeção que tem de ser apreciada a questão da legalidade ou pelo declarado na declaração de rendimentos de 2013 e 2014 pelo sujeito passivo.
  6. Os atos aqui em apreço, é o ato de liquidação adicional decorrente de um relatório de inspeção. O prazo de 120 dias (nos termos do artigo 70.º e 102.º do CPPT), conta-se a partir do termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte, aqui em apreço.
  7. Atos de liquidação adicional, pronunciaram-se sobre a residência fiscal do sujeito passivo.
  8. Tendo-se pronunciado, o sujeito passivo pode-se defender dos mesmos, de acordo com o princípio do contraditório, previsto no artigo 45.º do CPPT.
  9. Por isso, nada obsta à apreciação da legalidade da liquidação adicional tal como ficou a subsistir na ordem jurídica na sequência da decisão da AT, com os fundamentos nela invocados.
  10. Tendo-se pronunciado e decidido quanto a mesma, nos termos do artigo 576.º, n. 1 e 2 do CPC ex vi artigo 2.º alínea e) do CPPT e artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, não se verifica a inimpugnabilidade da questão da residência fiscal do Requerente fiscal.
  11. Improcede, assim, a excepção suscitada.

 

I - MATÉRIA DE DIREITO

  1. Atendendo às posições das partes assumidas nos articulados apresentados, a questão central a dirimir pelo presente tribunal arbitral consiste em apreciar a legalidade dos atos de liquidação de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de 2013 e 2014, números 2017... e 2017..., no valor total de € 12.198,30., por vício de violação de lei.
  2. A questão decidenda, perante a factualidade dada como provada e as normas legais em vigor à data dos factos, consiste em apreciar se o Requerente (A...), nos anos de 2013 e 2014 preenchia os requisitos para ser considerado residente fiscal português, e consequentemente, ser tributado na totalidade dos seus rendimentos em Portugal.
  3. A decisão final emitida pela AT, que deu origem as liquidações aqui impugnadas, a AT decidiu, que os Requerentes indicaram no seu modelo 3, que eram ambos sujeitos passivos residentes em território Português.
  4. Mais releva o projeto da decisão final emitida pela AT, que o “De acordo com a informação comunicada à Autoridade Tributaria e Aduaneira pelas autoridades espanholas o sujeito passivo auferiu em Espanha, nos anos de 2013 e 2014, os rendimentos discriminados no quadro infra:

  1. Desse quadro resulta, que o Requerente (A...), obteve rendimentos de trabalho dependente em Espanha e suportou em 2013 e 2014 em Espanha um imposto de 3.193,00€ e 3.180,00€.
  2. Valores que foram confirmados com as declarações de Rendimento Espanhola apresentado pelo o Requerente (A...).
  3. Da decisão final do relatório de inspeção e notificado aos Requerentes, resultou o seguinte:

“Analisados os fundamentos aduzidos em sede de audição prévia, concluiu-se que os mesmos não são susceptíveis de conduzir a um entendimento diferente do preconizado no projecto de decisão, porquanto:

No âmbito de uma acção de fiscalização de trânsito, em 2015-10-19, o sujeito passivo B declarou a um militar da Guarna Nacional Republicana (GNR) que, embora tenha morada em Espanha e trabalhe para uma empresa espanhola, desempenhando funções de comercial da empresa em Portugal, passa a maior parte do tempo em Portugal, residindo com o seu agregado familiar na Rua ..., ...-... ... Por força do que declarou ao militar da GNR, presume-se que o sujeito passivo B, quer em 2013, quer em 2014, esteve mais de 183 dias em Portugal, pelo que deve ser considerado residente em território português, por força do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 16º do Código do IRS (CIRS). 

Mesmo que não se confirme a permanência em Portugal mais de 183 dias em cada um dos anos em causa, o sujeito passivo B não deixaria de ser considerado residente em território português, uma vez que o nº 2 do art.º 16º do CIRS, na redacção em vigor nos anos de 2013 e 2014, determina que são sempre havidas como residentes em território português as pessoas que constituem o agregado familiar, desde que naquele resida qualquer das pessoas a quem incumbe a direcção do mesmo.”

Atendendo a que a argumentação agora invocada havia sido já aduzida e analisada na DSIRS, tendo aquela direcção de serviços promovido a emissão de liquidações oficiosas, constata-se inexistir suporte legal para atender a matéria reclamada.”

  1. Conforme matéria de fato assente, o Requerente (A...), possui um contrato de trabalho em vigor em Espanha, e que o seu local de trabalho localiza-se mais concretamente na Cidade de Valencia, onde desempenha a sua atividade laboral de 40 horas semanais de segunda a sexta, e comprovado com os certificados de residência juntos aos autos.
  2. Os Requerentes são casados entre si e possuem dois filhos, possuindo uma habitação em Portugal, onde possui a Requerente B..., o seu domicílio fiscal, juntamente com os seus dois filhos.
  3. O Requerente deslocasse com frequência a Portugal para visitar a sua esposa e os seus filhos. Frequência, que não foi invocada ou impugnada, ou junto prova documental, para demonstrar o número de dias que o Requerente (A...), passou efetivamente em Portugal.
  4. Não foi possível averiguar o exato número de dias que o Requerente (A...) passou em Portugal e em Espanha, nem o mesmo foi alvo do relatório de inspeção da AT.
  5. Contudo resulta evidente, que um contrato a tempo inteiro 40 horas, os dias que permaneceu em Espanha, ultrapassa em larga medida os 183 dias exigidos de pelo artigo 16.º n.1 alínea a).
  6. A AT, alega que o “Requerente A... não logrou apresentar documento emitido pelas autoridades fiscais espanholas a certificar que, nos anos de 2013 e 2014, era residente fiscal em Espanha nos termos do artigo 4.º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre o Reino de Espanha e Portugal”.
  7. Quanto a esta alegação, não tem fundamento, uma vez que o Requerente fez prova da sua Residência fiscal em Espanha, mediante as “información de la presentación de la declaración modelo 100” e “IRPF, dos anos de 2013 e 2014, comprovadas eletronicamente via código seguro de validação aposto na declaração submetida pelo sujeito passivo, ... e ..., no qual ambos os documentos escrevem o seguinte:“COMUNIDAD O CIUDAD AUTÓNOMA DE RESIDENCIA EN 2013: Comunidad Valenciana” e “COMUNIDAD O CIUDAD AUTÓNOMA DE RESIDENCIA EN 2014: Comunidad Valenciana”.
  8. Para que melhor se compreenda a questão sub júdice, cumpre salientar a importância que o conceito de residência assume no Direito Fiscal e, em particular, na tributação do rendimento.
  9. A residência é o critério utilizado para determinar o âmbito de aplicação do imposto previsto no art. 15.º “Sendo as pessoas residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território.”, submetendo a sua determinação ao princípio da tributação universal dos rendimentos, mediante uma ligação forte e estável a um território específico.
  10. A legislação em vigor nos anos na questão sub júdice, 2013 e 2014, elencava mais que um critério de residência fiscal, o artigo 16º na redação dada pela Lei n.º 20/2012, de 14/05, determinando o seguinte:

“1 - São residentes em território português as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos:

a) Hajam nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados;

b) Tendo permanecido por menos tempo, aí disponham, em 31 de Dezembro desse ano, de habitação em condições que façam supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual;

c) Em 31 de Dezembro, sejam tripulantes de navios ou aeronaves, desde que aqueles estejam ao serviço de entidades com residência, sede ou direcção efectiva nesse território;

d) Desempenhem no estrangeiro funções ou comissões de carácter público, ao serviço do Estado Português.

2 - São sempre havidas como residentes em território português as pessoas que constituem o agregado familiar, desde que naquele resida qualquer das pessoas a quem incumbe a direcção do mesmo.

3 - A condição de residente resultante da aplicação do disposto no número anterior pode ser afastada pelo cônjuge que não preencha o critério previsto na alínea a) do n.º 1, desde que efectue prova da inexistência de uma ligação entre a maior parte das suas actividades económicas e o território português, caso em que é sujeito a tributação como não residente relativamente aos rendimentos de que seja titular e que se considerem obtidos em território português nos termos do artigo 18.º

4 - Sendo feita a prova referida no número anterior, o cônjuge residente em território português apresenta uma única declaração dos seus próprios rendimentos, da sua parte nos rendimentos comuns e dos rendimentos dos dependentes a seu cargo segundo o regime aplicável às pessoas na situação de separados de facto nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 59.º”

  1. Sobre os critérios de residência fiscal, a jurisprudência e doutrina já se pronunciaram quanto ao seu entendimento, realçamos as decisões do CAAD Processo nº 332/2016-T, Árbitros Fernanda Maçãs (árbitro presidente), Dr. João Taborda da Gama e Dr. André bacelar Gonçalves, e Acórdão Arbitral Processo nº 214/2017-T, Árbitros José Baeta de Queiroz (Árbitro Presidente), Nuno Cunha Rodrigues e Diogo Leite de Campos.
  2. Verifica-se, assim, que o critério previsto na alínea a) se cinge à presença física (corpus), em Portugal, considerando residentes, de forma automática, os indivíduos que permaneçam 183 dias no território nacional. A al. b), por outro lado, exigindo uma ligação física menos qualificada, impõe uma análise casuística que permita, ainda assim, assegurar que existe uma conexão efetiva com o território. Esta conexão tem-se por verificada através de um elemento subjetivo mediato, a intenção de ser residente (animus), que deve ser analisado de uma perspetiva objetiva, ou seja, através de elementos imediatos que permitam a reconstrução da vontade do indivíduo a partir dos indícios por si revelados. Repare-se que a existência de critérios de residência puramente artificiais, sem que tenham por base uma conexão efetiva com o território, encontram restrições à sua aplicação ou por via do Direito Internacional Público (Cf. Rui Duarte Morais, Imputação de Lucros de Sociedades Não Residentes Sujeitas a um Regime Fiscal Privilegiado, Porto: Publicações Universidade Católica, 2005, p. 35), ou num momento posterior por via de aplicação dos ADTs (Cf. Klaus Vogel, On Double Taxation Conventions, Third Edition, Deventer: Kluwer Law International, 1997, pp. 232-233).
  3. Assim, a al. b) do n.º 1 do art. 16.º do Código do IRS serve duas funções essenciais: em primeiro lugar, considerar residente em Portugal um indivíduo que apenas deslocalize a sua residência para o território nacional, no segundo semestre do ano, de forma a que já não seja possível cumprir com o critério dos 183 dias; e, em segundo lugar, considerar residentes os indivíduos que, apesar da sua ligação ao território, verificada através de um local onde residem habitualmente, possam intencionalmente contornar a regra da permanência (Cf. André Salgado de Matos, Código do Imposto do Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) Anotado, Lisboa: Instituto Superior de Gestão, 1999, pp. 206-207).
  4. Nas palavras de Alberto Xavier “[a] intenção de manter e ocupar a habitação como residência habitual, não é objecto de prova directa, antes resulta de condições objectivas que a façam supor.” (Cf. Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, 2.ª Edição Actualizada, Coimbra: Almedina, 2007, p. 286).
  5. Uma vez que a intenção a demonstrar se refere à manutenção e ocupação de uma residência habitual, importa determinar, como ponto prévio, o que se entende por residência habitual, para que seja claro que deve resultar da intenção do indivíduo. Ora, o conceito de residência habitual deve ser interpretado no contexto em que se insere, ou seja, o art. 16.º deve ser lido como um todo. Tal como referido, tanto a al. a) como a al. b) do n.º 1 do art. 16.º do Código do IRS impõem uma conexão efetiva com o território Português. Se a qualidade de residente, nos termos da al. a) resulta, automaticamente, de um critério fáctico, meramente numérico, a presença em Portugal, a al. b) exige, pela falta de maior presença no território, um elemento adicional de intenção. O referido artigo impõe, assim, a vontade de estar regularmente presente no território nacional, utilizando, para o efeito, uma determinada habitação.
  6. A residência habitual é, assim, igualmente um critério fáctico determinado pela permanência regular (habitual) numa determinada habitação e, onde, como tal se presume ter organizada a sua vida. Como já sustentou o Supremo Tribunal Administrativo, “[é] evidente que, sendo a residência habitual o local onde a pessoa normalmente vive e tem o seu centro de vida, não medeiam grandes diferenças entre o «domicílio fiscal» e a «habitação permanente»: há entre as duas figuras uma relação íntima, que se traduz em ambas pressuporem um lugar com o qual certa pessoa está em ligação, o local onde tem a sua existência organizada e que, como tal, lhe serve de base de vida. (Cf. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 11/23/2011, proferido no processo 0590/11), bem como o Tribunal Central Administrativo Sul, referindo que “[o] conceito de residência habitual (o qual coincide com o conceito de domicílio voluntário), deve buscar-se no direito interno, consubstanciando-se como o local onde uma pessoa singular normalmente vive e de onde se ausenta, em regra, por períodos mais ou menos curtos (cfr.artº.82, do C.Civil).” (Cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 12/11/2012, proferido no processo 05810/12).
  7. Como sustenta Manuel Faustino, o referido critério legal “(…) ao integrar-se na previsão a manutenção e ocupação dessa casa como residência habitual desde logo se excluem da condição de residentes os que dispõem em Portugal de uma simples habitação secundária (desde que nela não permaneçam mais de 183 dias por ano) ou de férias, bem como aqueles que, nomeadamente os emigrantes, dispondo aqui de uma habitação que poderão vir a ocupar como sua residência habitual quando, em definitivo, regressarem a Portugal, apenas a ocupam por ocasião das suas férias ou em deslocações pontuais e fortuitas.” (Cf. Manuel Faustino, “Os residentes…” op. cit., pp. 124-125 e, no /mesmo sentido, Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02/24/2011, proferido no processo 876/10).
  8. Para que exista uma residência habitual deverá resultar claro que a habitação mantida em Portugal, pelas suas características, se destina a uma permanência duradoura e não a uma mera passagem de curta duração (Cf. Alberto Xavier, Direito Tributário…op. cit. 286)” (CAAD Processo nº 332/2016-T, Árbitros Fernanda Maçãs (árbitro presidente), Dr. João Taborda da Gama e Dr. André bacelar Gonçalves).
  9. Cabe verificar se o Requerente A..., preencheu algum dos critérios legais, pressupostos e condições previstos no artigo 16.º do Código do IRS, suscetível de determinar a sua residência fiscal em território português.
  10. Sobre o critério do artigo 16.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRS, cinge-se à presença física (corpus) num território (in casu o território nacional), para imputar o país de residência fiscal, o Requerente A..., teria de ter permanecido mais de 183 em território português, o que não se verificou.
  11. Assim, o Requerente A..., não tendo permanecido mais de 183 em território português, de acordo com o do artigo 16.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRS, não é considerado residente fiscal em Portugal.
  12. Analisando de seguida, o caso da alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º do CIRS, exige-se uma ligação física menos qualificada, o que implica uma análise casuística que permita, ainda assim, assegurar que existe uma conexão efetiva com o território, neste caso Português.
  13. Esta conexão tem-se por verificada através de um elemento subjetivo mediato, a intenção de ser residente (animus), que deve ser analisado de uma perspetiva objetiva, ou seja, através de elementos imediatos que permitam a reconstrução da vontade do indivíduo a partir dos indícios por si revelados.[1]
  14. Assim, a alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º do CIRS serve duas funções essenciais: em primeiro lugar, considerar residente em Portugal um indivíduo que apenas deslocalize a sua residência para o território nacional, no segundo semestre do ano, quando já não é possível cumprir com o critério dos 183 dias; e, em segundo lugar, considerar residentes os indivíduos que, apesar da sua ligação ao território, verificada através de um local onde residem habitualmente, possam intencionalmente contornar a regra da permanência.[2]
  15. Como é referido em termos doutrinais e jurisprudenciais[3], a alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º do Código do IRS impõe três requisitos, de cuja verificação cumulativa depende a qualificação como residente:

i) a permanência em Portugal;

ii) a disposição de uma habitação; e

iii) a verificação de condições que façam supor que a habitação será mantida e ocupada como residência habitual.

Acórdão Arbitral Processo nº 214/2017-T, Árbitros José Baeta de Queiroz (Árbitro Presidente), Nuno Cunha Rodrigues e Diogo Leite de Campos

  1. Verificamos que o Requerente, não preenche o primeiro requisito, ou seja, tendo um contrato de trabalho que presta funções em Valencia de 40 horas semanais, desde logo, não teve uma permanência em Portugal nos anos 2013 e 2014.
  2. Impondo a alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º do Código do IRS três requisitos, de cuja verificação é cumulativa, não se encontrando um deles preenchido, afasta a necessidade de verificação dos restantes.
  3. Pelo exposto o Requerente A..., não é considerado residente fiscal em Portugal com base na alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º do Código do IRS
  4. Continuando a análise dos critérios de residência fiscal, compete a interpretação e aplicação do artigo 16.º, n.º 2, 3 e 4 do Código do IRS, e o recurso da Convenção sobre Dupla Tributação (CDT) entre Portugal e Espanha, aprovada pela Retificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 6/95.
  5. As Convenções sobre Dupla Tributação têm na sua génese o facto dos vários Estados soberanos terem considerado que, a aplicação unilateral das suas normas fiscais consubstanciam uma potencial fonte de conflitos. Deste modo, ao lado das fontes tradicionais da lei fiscal têm surgido instrumentos jurídicos destinados a evitar a dupla tributação e a evasão fiscal internacional e que se integram no Direito Internacional Fiscal (vide Margarida Mesquita, As Convenções sobre Dupla Tributação, Lisboa, 1998)"
  6. Estes acordos de dupla tributação, em que dois Estados soberanos negoceiam formas destinadas a evitar que, um mesmo facto tributário pertencente ao mesmo sujeito passivo e no mesmo período de tempo, seja tributado em duas ou mais jurisdições, implicam uma derrogação bilateral de soberania, norteada pela regra da reciprocidade. Parafraseando José Casalta Nabais (em Estudos de Direito Fiscal, Vol. 1, Almedina), “os acordos de dupla tributação são uma limitação do poder tributário de cada Estado, que mantém o essencial das suas competências em matéria fiscal. Tudo se baseia em cedências mútuas de dois Estados em matérias que dizem respeito principalmente à soberania quanto à legislação fiscal (...) os ADT têm uma eficácia negativa, uma vez que prevalecem sobre a lei interna, e operam uma derrogação parcial desta em certas zonas. Assim, as normas dos ADT remetem para as normas do Direito Fiscal interno, resolvendo os conflitos entre ordenamentos (como pode suceder, por exemplo, quando cada um dos dois ordenamentos considera o mesmo sujeito passivo nele residente...)”
  7. Estabelece a CDT Portugal – Espanha, o seguinte

1 - Para efeitos desta Convenção, a expressão «residente de um Estado Contratante» significa qualquer pessoa que, por virtude da legislação desse Estado, está aí sujeita a imposto, devido ao seu domicílio, à sua residência, ao local de direcção ou a qualquer outro critério de natureza similar. Todavia, esta expressão não inclui qualquer pessoa que está sujeita a imposto nesse Estado apenas relativamente ao rendimento de fontes localizadas nesse Estado.

2 - Quando, por virtude do disposto no n.º 1, uma pessoa singular for residente de ambos os Estados Contratantes, a situação será resolvida como segue:

      a)Será considerada residente do Estado Contratante em que tenha uma habitação permanente à sua disposição. Se tiver uma habitação permanente à sua disposição em ambos os Estados, será considerada residente do Estado com o qual sejam mais estreitas as suas relações pessoais e económicas (centro de interesses vitais);

      b)Se o Estado em que tem o centro de interesses vitais não puder ser determinado, ou se não tiver uma habitação permanente à sua disposição em nenhum dos Estados, será considerada residente do Estado Contratante em que permaneça habitualmente;

      c)Se permanecer habitualmente em ambos os Estados, ou se não permanecer habitualmente em nenhum deles, será considerada residente do Estado de que for nacional; d)Se for nacional de ambos os Estados, ou se não for nacional de nenhum deles, as autoridades competentes de ambos os Estados resolverão o caso de comum acordo.

  1. A este propósito, que a apreciação do conceito subjacente ao artigo 16.º, n.º 2 do CIRS – “residência por dependência” – é contrária à interpretação das Convenções sobre Dupla Tributação, uma vez que, como recordou o Supremo Tribunal Administrativo no acórdão 068/09, de 28/03/2009, acórdão de 08/07/2009 (Proc. n.° 382/09), acórdão 0461/10 de 08/09/2010, acordão 0462/10 de 27/10/2010, “O conceito de residência (fiscal) para efeitos de direito interno será plenamente aplicável nas situações que apenas apresentem conexão com a ordem jurídica nacional ou nas situações em que, havendo embora conexão com outra ordem Jurídica, não há vinculação por via convencional do Estado Português com o Estado com o qual essa conexão se verifica. Não é esse o caso da Alemanha, como se sabe, que celebrou com Portugal Convenção contra a Dupla Tributação. Assim, nas relações entre Portugal e a Alemanha em matéria de impostos sobre o rendimento e sobre o capital é o conceito convencional de residência que deve prevalecer, por via da supremacia do direito internacional sobre o direito interno ordinário(artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa; Cfr. JOSÉ CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 5.ª ed., Coimbra, Almedina, 2009, p. 104).

Embora os conceitos de residência (fiscal) para efeitos convencionais e para efeitos fiscais internos não se confundam, a CDT Portugal/Alemanha, seguindo o Modelo de Convenção da OCDE (art. 4.º, n.° 1 do MCOCDE), remete a definição do conceito convencional de residência para a legislação interna dos Estados contratantes. Esta remissão, não significa contudo, como esclarece a melhor doutrina (cfr. ALBERTO XAVIER, Direito Tributário Internacional, 2.ª ed, Coimbra, Almedina, 2007, p. 291), uma remissão incondicional.
Desde logo, pressupõe que a análise da questão da residência seja feita individualmente, pessoa a pessoa, abstraindo da situação familiar do sujeito em causa. Escreve a propósito ALBERTO XAVIER, op. cit., nota 61 a pp. 291, que «A análise da residência deve ser feita pessoa por pessoa, ainda que casadas, pelo que é frequente a existência de «casais mistos», sendo um dos membros considerado residente num país e o outro, noutro. (...). As Convenções sobrepõem-se portanto aos regimes internos que eventualmente consagrem, por ficção, a «residência» por «dependência» de uma pessoa no país de residência de qualquer dos outros membros do agregado familiar».

No mesmo sentido, Maria Margarida Cordeiro Mesquita, “As Convenções sobre Dupla Tributação”, Lisboa, 1998, p. 85, onde se lê: «Relativamente às pessoas singulares, o teste da residência é efectuado contribuinte a contribuinte, independentemente da sua situação conjugal. O conceito convencional de residência sobrepõe-se aos regimes internos que, como o português, consagram a “residência por dependência” de uma pessoa no país da residência de outro membro do seu agregado familiar - cfr. Código do IRS, artigo 16.°, n.° 2».”

  1. O artigo 4.º, n.º 1 da Convenção obriga a que a análise da questão da residência “seja feita individualmente, pessoa a pessoa, abstraindo da situação familiar do sujeito passivo e estabelece limites à natureza das conexões adotadas pelas leis [internas] dos Estados contratantes, impondo-lhes que tais critérios imponham uma ligação [pessoal] efetiva com o território do Estado”.
  2. O conceito de residência por dependência, acolhido no n.° 2 do artigo 16.° do CIRS, não pode sobrepor-se ao conceito convencional de residência, pelo que a residência em Portugal do cônjuge do sujeito passivo é indiferente para a determinação da residência fiscal deste. A qualidade de residente para efeitos da Convenção tem de ser aferida por critérios que “exprimam uma ligação efectiva ao território do Estado, não sendo atendíveis para efeitos convencionais um mero critério de «residência por dependência» como o constante do artigo 16., n.° 2 do CIRS, por não exprimir por si mesmo qualquer conexão efectiva e real da maior parte das suas actividades económicas ao território português.”. (o Supremo Tribunal Administrativo no acórdão 68/09, de 28/03/2009)
  3. A CDT entre Portugal e Espanha, procura, resolver situações de dupla residência, em que alguém tem “contactos prolongados com mais de uma ordem jurídica” (Cf. J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra, 2007, pp. 339-340), através de diversas regras especiais (de desempate) cuja aplicação determinará a residência em apenas um dos Estados que reclamam a residência fiscal de um determinado sujeito passivo.
  4. A regras de desempate, como refere Rui Duarte Morais “[a]s convenções internacionais sobre dupla tributação aceitam tal competência (…) limitando-se a estabelecer regras de «desempate» que permitem qualificar um contribuinte como residente em (apenas) um dos Estados contratantes quando ambos (por força das divergências entre as respetivas leis) o considerem como tal.” (Cf. Rui Duarte Morais, Sobre o IRS, Coimbra: Almedina, 2016, 3.ª Edição, p. 12.).
  5. Escabece o artigo 4º da CDT dizendo que “Se tiver uma habitação permanente à sua disposição em ambos os Estados, será considerada residente apenas do Estado com o qual sejam mais estreitas as suas relações pessoais e económicas (centro de interesses vitais), não sendo possível identificar ou tendo mais que um centro vital, um em Espanha e outro em Portugal, dispõe então a al. b) do n.º 2 do art. 4 da CDT que: Se o Estado em que tem o centro de interesses vitais não puder ser determinado, deverá ser considerada residente apenas do Estado Contratante em que permaneça habitualmente.
  6. Face ao exposto, nos presentes autos ficou demonstrado que o Requerente dispôs de uma habitação permanente tanto em Portugal como em Espanha, mas o Requerente residiu necessariamente mais de 183 dias na Espanha, nos anos respeitantes às liquidações impugnadas, país onde exercia diariamente a sua actividade como trabalhador por conta de outrem.
  7. Por outro lado, a qualidade de residente em Portugal que a AT imputa ao ora impugnante assenta no facto de o Requerente ter prestado declarações a GNR de como passa a maior parte do tempo em Portugal e pelo fato da sua mulher e filhos deste aqui residir.
  8. Contudo, considerando-se, de acordo com o conceito de residência estabelecido pela Convenção, que a análise da qualidade de residente tem de ser feita individualmente, a residência em Portugal da mulher do impugnante é indiferente para efeitos de determinação da residência fiscal convencional deste.
  9. A este respeito, consta ainda da fundamentação dos acórdãos do Supremo, no seguinte: “os critérios atendíveis para efeitos da CDT Portugal - Alemanha para determinar a qualidade de residente convencional do impugnante têm de ser similares aos elencados no n.° 1 do artigo 4.° da CDT Portugal-Alemanha (domicílio, residência, local de direcção), ou seja, têm de ser critérios que exprimam uma ligação efectiva ao território do Estado, não sendo atendível, para efeitos convencionais, um mero critério de “residência por dependência” como o constante do artigo 16.º n.° 2 do CIRS, por não exprimir por si mesmo qualquer conexão efectiva e real da maior parte das suas actividades económicas ao território português”.
  10. Ora, da análise do probatório dos presentes autos, resulta que, o ora Requerente é tributado foi tributado em Espanha, nos anos 2013 e 2014, pelos seus rendimentos do trabalho, não apenas porque na Espanha obtém rendimentos do trabalho dependente (competência do Estado da fonte), mas porque aí tem residência habitual (competência do Estado da residência), sendo essa informação confirmada no relatório de inspeção.
  11. O Requerente residiu, com carácter de permanência, na Espanha pelo tempo correspondente aos períodos a que respeitam os rendimentos em causa, percebidos por virtude do trabalho prestado nesse país.
  12. Podendo, embora, considerar-se como residente em ambos os Estados (Portugal, e Espanha), por esse tempo a que corresponde o rendimento em causa, teve residência efectiva na Espanha, necessariamente por força da realização ou o cumprimento efectivo do contrato de trabalho que nesse país satisfez. 
  13. Existindo dúvidas quanto ao centro vital, enumerado no artigo 4º da CDT, “faz inclinar o prato da balança para o lado do Estado em que permanece com maior frequência. Para este efeito, devem ser tomadas em consideração as estadas efectuadas pelo interessado não apenas na sua habitação permanente no Estado em causa, mas também em qualquer outro ponto dentro do mesmo Estado.”, comentário 17. ao art. 4.º do Modelo de Convenção Fiscal Sobre o Rendimento e o Património.
  14. Durante o ano de 2013 e 2014 o Requerente passou mais tempo em Espanha do que em Portugal, quer por força da data em que mudou efetivamente a sua residência para Portugal, quer por força do seu contrato de trabalho.
  15. Aderindo por inteiro à tese da jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo estamos por este modo a concluir, que o Requerente naõ reside, para efeitos fiscais em Portugal, por aplicação da lei doméstica Portuguesa n.º 1 e n.º 2 , do art. 16.º do Código do IRS), e do artigo 3.º da CDT celebrada entre a República Portuguesa e o Reino da Espanha obstam a que Portugal possa tributar os rendimentos auferidos pelo Requerente, na medida em que resolve o conflito positivo de residências fiscais a favor de Espanha. Ou seja, no ano de 2013 e 2014 o Requerente é considerado residente fiscal em Espanha e não-residente fiscal em Portugal.
  16. É ainda suscitado pela Requerida, pese embora não conste tal fundamentação da sua decisão final do relatório de inspeção que deu lugar as liquidações adicionais de IRS aqui em apreço, que os Requerentes declararam em 2013 e 2014, como ambos residentes fiscais, não tendo o Requerente (marido) declarado qualquer rendimento, contudo tenha efetuado deduções a coleta de despesas suas.
  17. A AT mais alega, que os requerentes deveriam nas respetivas declarações o disposto no artigo 16 n.º 4 estabelece o cônjuge residente em território português apresenta uma única declaração dos seus próprios rendimentos, da sua parte nos rendimentos comuns e dos rendimentos dos dependentes a seu cargo segundo o regime aplicável às pessoas na situação de separados de facto nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 59.º”
  18. Não tendo os Requerentes efetuado a respetiva opção do artigo 16 n.º 4 n.º 2 do artigo 59.º, a mesma não leva a presumir que o Requerente marido seja considerado um residente fiscal português, revela apenas que se encontra incorretamente preenchida quanto a esse ponto, tendo que ser corrigida e emitida a liquidação adicional de IRS, caso assim se verifique.
  19. Contudo, sobre os erros no preenchimento da declaração dos sujeitos passivos, o presente tribunal subscreve a posição assumida na decisão arbitral no Processo nº 194/2016-T, a decidiu no seguinte sentido:

No nosso ordenamento jurídico-fiscal, nomeadamente em sede de IRS, vigora o princípio da declaração do contribuinte no apuramento da matéria tributável, o que significa que é ao sujeito passivo que incumbe o impulso inicial no procedimento de liquidação com a entrega da sua declaração.

Para uma explicação do alcance e das várias vertentes deste princípio da declaração, em sede de IRS, remetemos para o Acórdão do TCAS, no processo n.º 01076/03, que dispõe assim: “No nosso sistema fiscal, vigora o princípio da declaração do contribuinte no apuramento da matéria tributável, o que implica um acréscimo dos deveres de colaboração do sujeito passivo para com a AT, entre os quais o de manter uma contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal e que permita o apuramento e fiscalização do IRS (arts. 78.º do CPT e 38.º, n.º 1, alínea e) do CIRS) e o da entrega da declaração periódica de. Nos n.ºs 1 e 2 do art. 76.º do CPT estabelecia-se: «1. O processo de liquidação instaura-se com as declarações dos contribuintes ou, na falta ou vício destas, com base em todos os elementos de que disponha a entidade competente. 2. O apuramento da matéria tributável far-se-á com base nas declarações dos contribuintes, desde que sejam apresentadas nos termos previstos na lei e sejam fornecidos à administração fiscal os elementos indispensáveis à verificação da sua situação tributária»A tal propósito, consideram ALFREDO JOSÉ DE SOUSA e JOSÉ DA SILVA PAIXÃO, que a declaração é um acto pelo qual o contribuinte leva ao conhecimento da Administração Fiscal a existência da matéria tributável que integra o facto tributário, indicando o seu montante e todos os elementos necessários para o cálculo do imposto (encargos, deduções, etc.). A declaração é exigida pela lei e traduz um acto de colaboração do contribuinte face à natureza pública do imposto justificada peta ideia de que a obrigação tributária não é uma obrigação voluntária, contratual, mas o cumprimento de um dever legal. É um acto obrigatório e se o contribuinte, estando nas condições previstas na lei, não o cumprir, está sujeito a sanções (arts. 31º e 32º do RJIFNA). O sistema fiscal português consagra, pois, o método da declaração do contribuinte no apuramento da matéria tributável (arts. 57.º a 61.º do CIRS, 16.º do CIRC e 28.º a 40.º do CIVA). (…) Portanto, quando a declaração do contribuinte estiver de acordo com os elementos constantes da sua contabilidade ou escrita, esta se mostrar organizada nos termos da lei e não se verificarem erros, inexactidões ou outros indícios fundados de que ela não corresponde à realidade, presume-se que a matéria tributável declarada é a real. E, como resulta do disposto no art. 38.º do CIRS, a AT só poderá rectificar as declarações dos sujeitos passivos e proceder à correspondente liquidação adicional quando fundamentadamente considere que nelas figura um imposto inferior ao devido”[6] [7]

Contudo, ainda que vigore no procedimento de liquidação o princípio da declaração, não é menos verdade que o referido procedimento culmina com a emissão da liquidação ou ato tributário por excelência, o qual compete à AT.

Com efeito, contrariamente aos impostos “auto liquidáveis”, “o IRS é um imposto “heteroliquidável”, competindo a liquidação à DGCI (artigo 75.º)” [8].

Logo, a competência para a liquidação, em sentido estrito, não é do contribuinte, apesar de o procedimento se iniciar com a sua declaração, mas da AT, que tem, entre outras, as faculdades de solicitar esclarecimentos sobre as declarações apresentadas, proceder a correções em caso de erros evidenciados nas mesmas e corrigir as liquidações, na medida do previsto no Código do IRS.

Por seu turno, o n.º 5 do artigo 57.º sob a epígrafe “Declaração de rendimentos”, esclarece que: “Sempre que as declarações não forem consideradas claras ou nelas se verifiquem faltas ou omissões, a Direcção-Geral dos Impostos notifica os sujeitos passivos ou os seus representantes para, por escrito, e no prazo que lhes for fixado, não inferior a 5 nem a superior a 15 dias, prestarem os esclarecimentos indispensáveis.” [9].

E o n.º 4 do Artigo 65.º, sob a epígrafe “Bases para o apuramento, fixação ou alteração dos rendimentos”, prevê que a “A Direcção-Geral dos Impostos procede à alteração dos elementos declarados sempre que, não havendo lugar à fixação a que se refere o n.º 2, devam ser efectuadas correcções decorrentes de erros evidenciados nas próprias declarações, de omissões nelas praticadas ou correcções decorrentes de divergência na qualificação dos actos, factos ou documentos com relevância para a liquidação do imposto.”

(…) No entanto, não só a declaração foi aceite pela AT, como foi dada como certa e foi com base nessa mesma declaração emitida a correspondente liquidação de IRS.

Sendo a liquidação, em sentido estrito, o ato tributário por excelência que incumbe à AT, com a referida liquidação a AT aceitou a qualificação e quantificação dos rendimentos constante da declaração apresentada pelo sujeito passivo, respeitante ao exercício de 2014.

Não tendo procedido a qualquer correção no momento da emissão da declaração, nem tendo solicitado qualquer esclarecimento, como lhe competia ao abrigo das citadas disposições do Código do IRS, os serviços conformaram-se com a declaração do contribuinte, transformando-a na liquidação de imposto.

Consequentemente, embora a liquidação em apreço resulte do estritamente autodeclarado pelo Requerente, a mesma revelava erros ou lapsos que poderiam ter sido detetados pela AT, se não na fase da submissão da declaração, pelo menos na fase da emissão da correspondente liquidação, caso tivessem sido utilizadas as prerrogativas decorrentes nomeadamente das disposições supra identificadas previstas no Código do IRS,

Acresce que, mesmo não tendo os erros ou lapsos da declaração sido detetados na fase da submissão da declaração e posterior emissão da liquidação, os mesmos poderiam ter sido detetados no procedimento subsequente à liquidação, ou seja, no procedimento de reclamação graciosa.

Com efeito, perante a liquidação emitida, o Requerente apresentou, desde logo, reclamação graciosa junto do serviço de finanças competente, reiterando a origem dos rendimentos em França e solicitando a aplicação do método de isenção. No entanto, de acordo com a factualidade provada nos autos, a Requerida nada respondeu à reclamação, nem sobre o pedido de estado do processo, nem mesmo quando instada pelo gabinete do Provedor de Justiça, perante uma queixa que lhe foi dirigida pelo Requerente.”

  1. A este respeito, veja-se o recente Acórdão do STA de 18 de janeiro de 2017, que acompanhamos: “Na verdade, como sublinha o Cons. Jorge Lopes de Sousa, «Nas situações em que a prática do acto que define a dívida tributária cabe ao contribuinte (como sucede, nomeadamente, nos referidos casos de autoliquidação, retenção na fonte e pagamentos por conta), bem como naqueles em que o acto é praticado pela Administração Tributária com base em informações erradas prestadas pelo contribuinte e há lugar a impugnação administrativa (reclamação graciosa ou recurso hierárquico), o erro passará a ser imputável à Administração Tributária após o eventual indeferimento da pretensão apresentada pelo contribuinte, isto é, a partir do momento em que, pela primeira vez, a Administração Tributária toma posição sobre a situação do contribuinte, dispondo dos elementos necessários para proferir uma decisão com pressupostos correctos. Será indiferente, para este efeito de imputabilidade do erro, gerador de dívida de juros indemnizatórios, que se trate de caso de impugnação administrativa necessária ou de facultativa, pois, em qualquer dos casos, a decisão da impugnação (reclamação graciosa ou recurso hierárquico) é um acto da autoria da Administração Tributária, pelo que o eventual erro ser-lhe-á imputável, a partir do momento em que o praticou. À prática de acto expresso deverá ser equiparado, para este efeito, o indeferimento tácito, formado pelo decurso do prazo legal de decisão da impugnação administrativa (art. 57.°, n.º 5, da LGT), pois é este o momento em que a Administração Tributária deveria ter proferido um acto legal e, com a sua omissão, manteve a situação de ilegalidade, o que permite imputar-lhe a responsabilidade pela manutenção da situação de erro e pagamento indevido.» (Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, 6ª ed., vol. I, anotação 6) a) 2 ao art. 61º, p. 537). ”
  2. De acordo com o relatório de inspeção que resultou na declarações adicionais de IRS, ora notificadas a Requerente, e sobre as quais se defendeu, a AT, presumiu que o Requerente (A...) passou mais de 183 dias em Portugal, adicionalmente, vem de seguida afastar essa presunção, ao referir que “mesmo que não se confirme a permanência em Portugal por mais de 183 dias”, sempre havidas como residentes em território português.
  3. Conforme fundamentação de direito ora exposta, o artigo 16.º n.º1 alínea a) não resulta de uma aplicação de uma presunção, resulta de fatos, ou seja, passou ou não 183 dias, seguidos ou interpolados em território português.
  4. Conforme se verificou, o sujeito passivou não passou mais de 183 dias, seguidos ou interpolados em território português.
  5. A aplicação do n. 2 do artigo 16, conforme fundamentação de direito ora exposta, critério que não preenche o Requerente (marido).
  6. Por último surge ainda a questão de os Requerentes, terem colocado como residentes em território nacional e essa declaração constituir uma declaração assente de residência fiscal.
  7. Contudo, conforme se explicou, não existe um critério de residência no artigo 16.º e da CDT, que permita a escolha do sujeito passivo ou da AT da sua residência fiscal, terá sempre de se encontrar preenchido um dos critérios de residência fiscal para o mesmo ser considerado residente.
  8. Assim, a declaração do sujeito não determina a sua residência fiscal, quer a mesma tenha sido feita por erro no preenchimento ou intencional.
  9. Um erro declarativo, não é susceptível de transformar uma situação factual subjacente.
  10. Assim sendo, no caso sub judice, a AT poderia ter lançado mão das faculdades previstas no Código do IRS para corrigir os erros da liquidação.
  11. Por conseguinte, procede o pedido efetuado pelo Requerente.
  12. Assim sendo é de considerar ilegal por violação de lei, o ora ato tributário de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares.

 

J - QUESTÕES DE CONHECIMENTO PREJUDICADO

  1. Na sentença, deve o juiz pronunciar-se sobre todas as questões que deva apreciar, abstendo-se de se pronunciar sobre questões de que não deva conhecer (segmento final do n.º 1 do artigo 125.º, do CPPT), sendo que as questões sobre que recaem os poderes de cognição do tribunal, são, de acordo com o n.º 2 do artigo 608.º, do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo arbitral tributário, por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, “as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”.
  2. Em face da solução dada à questão relativa aos pressupostos da tributação do rendimento dos Requerentes pelo regime aplicável aos sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens, fica prejudicado o conhecimento das restantes questões incluídas no pedido de pronúncia arbitral.

 

I - DOS JUROS INDEMNIZATÓRIOS.

  1. Peticiona, ainda, a Requerente o pagamento de juros indemnizatórios.
  2. Perante o exposto, a liquidação do IRS, na parte abrangida pela anulação, que se decretará, resultam de erros de facto e de direito imputáveis exclusivamente à administração fiscal, na medida em que a Requerente cumpriu o seu dever de declaração e foram por aquela cometidos e não poderia a mesma desconhecer entendimentos diferentes.
  3. Na verdade, estando demonstrado que a requerente pagou o imposto impugnado na parte superior ao que é devido, por força do disposto nos art.ºs 61.º do CPPT e 43.º da LGT, tem a Requerente direito aos juros indemnizatórios devidos, juros esses a serem contados desde a data do pagamento do imposto indevido (anulado) até à data da emissão da respetiva nota de crédito, contando-se o prazo para esse pagamento do início do prazo para a execução espontânea da presente decisão (art.º 61.º, n.ºs 2.ºa 5, do CPPTRIB), tudo à taxa apurada de harmonia com o disposto no n.º 4.ºdo artigo 43.º da LGT,do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril.
  4. Dá-se provimento ao pedido da requerente.

 

            L - DECISÃO

Destarte, atento a todo o exposto, o presente Tribunal Arbitral, decide-se:

Julgar procedentes o pedido de declaração de ilegalidade dos atos tributário de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares número 2017 ... e 2017 ..., no valor total de € 12.198,30, por vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a declaração da sua ilegalidade e anulação.

Condenar a Requerida a restituir à Requerente essa quantia indevidamente liquidada e paga no montante de €12.198,30 acrescida do pagamento de juros indemnizatórios já vencidos relativos ao período, a contar desde o pagamento do imposto nos termos dos n.ºs 2.º a 5.º do art.º 61.º do CPPT à taxa apurada de harmonia com o disposto no n.º 4.º do art.º 43.º da LGT até integral e efetivo reembolso.

 

Fixa-se o valor do processo em € 12.198,30 do valor da liquidação atendendo ao valor económico do processo aferido pelo valor das liquidações de imposto impugnadas, e em conformidade fixa-se as custas, no respetivo montante em 918,00 € (novecentos e dezoito euros), a cargo da Requerida de acordo com o artigo 12.º, n.º 2 do Regime de Arbitragem Tributária, do artigo 4.ºdo RCPAT e da Tabela I anexa a este último. – n.º 10 do art.º 35º, e n.º 1, 4 e 5 do art.º 43º da LGT, art.ºs 5.º, n.º, al. a) do RCPT, 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT e 559.º do CPC).

 

Notifique.

Lisboa, 10 de Outubro 2018

O Árbitro

Dr. Paulo Ferreira Alves