DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Dr. Juíz José Poças Falcão (árbitro presidente), Dra. Sofia Ricardo Borges (árbitro vogal relator) e Dra. Raquel Franco (árbitro vogal) designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 20.12.2017, acordam no seguinte:
1. Relatório
A sociedade “A..., SGPS, S.A.”, pessoa coletiva n.º..., com sede na Rua ..., n.º..., ...-..., concelho de Braga, com o capital social de € 500.000,00 (quinhentos mil euros), sociedade dominante do “Grupo Fiscal B...”, doravante também a “Requerente”, apresentou um pedido de constituição de Tribunal Arbitral coletivo, nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 2.º, n.º 1 al. a) e 10.º, n.º 1 al. a) e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante “Requerida” ou “AT”.
Peticiona assim e em síntese: (i) seja declarada a ilegalidade do indeferimento da reclamação graciosa por si interposta na qual requereu a anulação das autoliquidações de IRC do Grupo Fiscal de que é sociedade dominante, relativas aos exercícios de 2014 e 2015, nas partes respeitantes às taxas de tributação autónoma, por não dedução à colecta - destas decorrente - dos créditos disponíveis em sede de Benefícios Fiscais, (ii) seja declarada a ilegalidade do acto de primeiro grau consistente nas referidas autoliquidações, com a consequente anulação nas suas partes correspondentes aos montantes decorrentes das taxas de tributação autónoma, respectivamente de € 108.928,39 (exercício de 2014) e de € 110.905,19 (exercício de 2015), por “afastamento indevido da dedução à colecta” (expressão da Requerente) e condenada a Requerida no reembolso destes montantes, no total de € 219.833,58; (iii) seja a Requerida condenada no pagamento de juros indemnizatórios contados desde 1 de Setembro de 2015 no referente ao montante de € 108.928,39, e de 1 de Setembro de 2016 no referente ao montante de € 110.905,19, até integral reembolso.
Subsidiariamente, para o caso de o Tribunal entender que o art.º 90.º do Código do IRC (doravante “CIRC”) não se aplica às Tributações Autónomas, pede ainda a Requerente seja declarada a ilegalidade das respectivas liquidações, com a consequente anulação das identificadas autoliquidações nas partes a elas correspondentes por, segundo invoca, ausência de base legal para a respectiva efetivação e tendo em conta o disposto nos art.ºs 8.º, n.º 2, al. a), da LGT e 103.º, n.º 3, da Constituição (doravante também “CRP”). Peticiona aqui também o consequente reembolso dos mesmos montantes supra e, ainda, juros indemnizatórios contabilizados, respectivamente, das mesmas datas supra.
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e notificado à AT em 13.10.2017.
Nos termos do disposto na al. a) do n.º 2 do art.º 6.º e da al. b) do n.º 1 do art.º 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros do Tribunal Arbitral coletivo os signatários, que atempadamente comunicaram a aceitação do encargo.
Em 28.11.2017 as Partes foram notificadas da referida designação não tendo manifestado intenção de a recusar (cfr. art.º 11.º, n.º 1, al.s a) e b) do RJAT e art.ºs 6.º e 7.º do Código Deontológico).
Em conformidade com o preceituado na al. c) do n.º 1 do art.º 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 20.12.2017.
Notificada para o efeito, a AT não apresentou resposta no prazo legal, mas apenas ultrapassado o termo do mesmo.
No dia 09.03.2018 o Tribunal notificou as Partes da dispensa da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e do prazo para produção de alegações escritas.
Em 15.03.2018 a Requerente apresentou um requerimento sustentando a extemporaneidade da Resposta da AT e a consequente desnecessidade de se produzirem alegações escritas. Em resposta, a AT pugnou pela manutenção da Resposta nos autos e, caso assim não se entendesse, pela manutenção, pelo menos, do prazo para apresentação de alegações escritas.
A 26.03.2018 o Tribunal proferiu Despacho no sentido de desconsiderar o teor da Resposta apresentada e determinar o seu desentranhamento, manter a dispensa da reunião prevista no art.º 18.º do RJAT, manter a cópia do processo administrativo (doravante também “PA”) nos autos e, por fim, notificando as Partes para apresentarem alegações finais de facto e de direito em vinte dias.
As Partes apresentaram, ambas, alegações escritas. As posições assumidas nos autos sumariam-se como segue.
A posição da Requerente
O PPA tem por objecto o indeferimento da reclamação graciosa interposta pela Requerente contra as identificadas autoliquidações e, em termos finais, os actos de autoliquidação de IRC do Grupo Fiscal B... relativos aos exercícios de 2014 e de 2015, na medida correspondente à não dedução à parte da colecta produzida pelas taxas de tributação autónoma dos créditos de incentivos fiscais em IRC de que é titular, designadamente apurados no âmbito do Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação e Desenvolvimento Empresarial (“SIFIDE”), Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (“RFAI”), e Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento (“CFEI”).
Sucintamente, o Grupo Fiscal em questão dispõe de créditos, no âmbito de Benefícios Fiscais (doravante também “BFs” e, quando no singular, “BF”), para dedução à colecta de IRC, em valor superior aos montantes das Tributações Autónomas (doravante também “TAs”) apuradas em IRC, tudo nos exercícios de 2014 e de 2015. Créditos aqueles passíveis de serem utilizados, nos referidos exercícios, que são os que estão em causa nos autos, em medida superior aos montantes aí apurados de TAs. Com efeito, as colectas decorrentes das taxas de tributação autónoma ascenderam nesses exercícios, respectivamente, a € 108.928,39 e € 110.905,19, e os créditos de disponíveis utilizáveis em cada um dos ditos exercícios superam largamente estes montantes.
Sustenta a Requerente que a pretendida dedução – que o sistema informático da AT não permite – lhe deve ser permitida fazer. Clarifiquemos nós: pretende-se seja permitida a dedução dos referidos créditos, que se destinam a ser deduzidos à colecta de IRC, às quantias de Tributações Autónomas apuradas em sede de IRC.
E, defende, a mesma dedução deverá ser permitida e processada começando pelos Benefícios Fiscais concedidos há mais tempo, seguindo-se a ordem de dedução prevista na lei.
Assim, a questão que primeiramente se pede seja decidida por este Tribunal refere-se à pretendida possibilidade de a Requerente - enquanto sociedade dominante do Grupo Fiscal B... e responsável pela respectiva autoliquidação em IRC - deduzir os créditos disponíveis no âmbito dos Benefícios Fiscais referidos (também) à colecta resultante da aplicação das taxas de tributação autónoma.
Dito por nós de outro modo, pede-se a este Tribunal que decida se assiste - ou não - à Requerente o direito de deduzir (ao que entende, no montante apurado nos termos do n.º 1 do art.º 90.º do CIRC relativamente ao Grupo) tais créditos aos montantes de imposto a pagar em resultado da aplicação das referidas taxas de tributação autónoma.
Sustenta a Requerente que “a esmagadora jurisprudência arbitral (…) qualifica as tributações autónomas como IRC” e tem entendido “de modo praticamente unânime” que “a colecta de IRC prevista no art.º 45.º, n.º 1, al. a), do CIRC” (em vigor até 31.12.2013) “compreende, sem necessidade de qualquer especificação adicional, a colecta das tributações autónomas em IRC”, pelo que, defende, se deverá também entender que a colecta do IRC prevista “uns metros mais à frente”, no art.º 90.º, n.º 1 do CIRC, e a dedução prevista no n.º 2, al. c) do mesmo artigo (cfr. redacção em vigor desde 01.01.2014), abrange também a colecta das TAs em IRC.
E assim, defende, ao ser-lhe negado o direito à dedução dos créditos no âmbito do SIFIDE, RFAI e CFEI à colecta das TAs em IRC, viola-se a al. c) do n.º 2 do art.º 90.º do CIRC.[1]
Refere ainda a Requerente que não há razão para concluir “ao contrário do que já se viu afirmado pela AT”, que o raciocínio e racional da decisão no Processo arbitral n.º 769/2014-T “(e jurisprudência arbitral que se lhe seguiu)” só se aplicaria ao SIFIDE, e não também necessariamente a outros créditos por BFs, ou a outras deduções à colecta do IRC. Com efeito, explica, se é um facto que o próprio regime do SIFIDE a propósito da previsão do BF de dedução à colecta do IRC menciona “o montante apurado nos termos do art.º 90.º do Código do IRC”, o regime do RFAI faz exactamente a mesma coisa no seu art.º 3.º, n.º 1, al. a), e outro tanto acontece com o regime do CFEI, no seu art.º 3.º, n.º 5, al. a). A diferente forma de expressão, nos regimes do RFAI e CFEI, não é, diz a Requerente, relevante, porque mesmo que o crédito de imposto nestes seja previsto como “dedução à colecta do IRC”, por oposição a “dedução ao montante apurado nos termos do art.º 90.º do CIRC” (no SIFIDE), o resultado prático final “é o mesmo, porquanto o montante apurado nos termos do art.º 90.º do CIRC outro não é senão o IRC”.
A Requerente continua, depois, fazendo uma incursão extensiva por Decisões Arbitrais, que refere adoptarem posição como a sua, comentando-a e insistindo em que se trata de jurisprudência maioritária e que a mesma tem sistematicamente decidido que as TAs são IRC.
Refere ainda que, caso se não entendessem aplicáveis os “artigos 89.º e 90.º (e ss.) do Código do IRC, também às tributações autónomas, estaríamos perante uma lacuna legal insuperável quer pela jurisprudência quer pela doutrina, porquanto (…) está-se perante matéria de reserva de lei, nos termos do artigo 103.º, n.º 3 da Constituição (...)”.
Por fim, e antes de entrar no pedido de juros indemnizatórios, reporta-se também a Requerente à alteração introduzida pela LOE 2016 (cfr. seu art.º 135.º) no art.º 88.º do CIRC, com o aditamento do n.º 21. Defendendo, entre o mais, que este é um preceito novo e não uma verdadeira norma interpretativa. E concluindo “(...) que se estará então perante uma inconstitucionalidade material do referido art.º 135.º da LOE 2016, por violação da proibição de retroactividade em matéria de impostos prevista no art.º 103.º, n.º 3 da Constituição, quer se tenha concluído, quer não (e entende-se que não), estar-se perante uma lei materialmente interpretativa (…), e por violação, também, do princípio da separação de poderes e do princípio da independência do poder judicial. Violação, pois, também, do artigo 2.º (…), do artigo 111.º, n.º 1 (…) e do art.º 203.º (…), todos da Constituição.”
A posição da Requerida
A AT, por seu lado, sustenta que, pese embora se trate de uma colecta em sede de IRC, a colecta das Tributações Autónomas distingue-se por incidir não sobre os lucros mas sobre despesas incorridas pelo Sujeito Passivo ou por terceiros que com ele se relacionem. Dado que são um instrumento fiscal anti-abusivo, esvaziar-se-iam de qualquer conteúdo prático-tributário na eventualidade de se acolher a tese defendida pela Requerente, refere.
Donde resulta que “o montante apurado nos termos da al. a), do n.º 1, do art.º 90.º não tem um carácter unitário”, já que comporta valores calculados segundo regras diferentes, a que estão associadas finalidades também diferenciadas, pelo que as deduções previstas nas alíneas do n.º 2 do mesmo artigo só podem ser efectuadas à parte do apuramento de colecta em IRC com a qual exista uma correspondência directa, por forma a ser mantida a coerência da estrutura conceptual do regime-regra do imposto.
Defende a Requerida que se impõe fazer um exercício interpretativo “em ordem a determinar se o regime das deduções da colecta do IRC, enquanto parte integrante do sistema-regra deste imposto e pré-existente à incorporação no respectivo [Código] das tributações autónomas, também se projecta nas (múltiplas) colectas destas tributações”.
O traço comum a todas as realidades reflectidas nas deduções referidas no n.º 2 do art.º 90.º do CIRC reside, esclarece, no facto de respeitarem a rendimentos ou gastos incorporados na matéria colectável determinada com base no lucro do Sujeito Passivo, ou pagamentos antecipados do imposto, sendo, por isso, inteiramente alheios às realidades que integram os factos geradores das Tributações Autónomas. E também para as deduções à colecta a título de Benefícios Fiscais, o montante ao qual são efectuadas só poderá respeitar ao imposto liquidado com base na matéria colectável, determinada com base nas regras do Capítulo III e das taxas previstas no art.º 87.º, tudo do CIRC.
Segundo a Requerida, a admissibilidade de uma interpretação como a que é defendida pela Requerente permitiria uma inadmissível limitação da liberdade de conformação da iniciativa do legislador, que ao criar as TAs o fez com propósitos evidentes, a saber, (i) luta contra a evasão fiscal, (ii) tributar rendimento de terceiros cujo acréscimo de rendimento, de outra maneira, se subtrairia à tributação, (iii) penalização, pela via fiscal, do pagamento de rendimentos considerados excessivos face à conjuntura de crise económica de que, ainda hoje, existem resquícios.
Em consequência, e no entender da Requerida, não há uma liquidação única de IRC mas, antes, dois apuramentos, dois cálculos distintos que, embora processados nos termos da al. a) do n.º 1 do art.º 90.º do CIRC, nas declarações a que se referem os art.ºs 120.º e 122.º do mesmo Código, são efectuados com base em parâmetros diferentes, pois cada um se materializa na aplicação das suas próprias taxas, previstas ou no art.º 87.º ou no art.º 88.º do CIRC, às respectivas matérias colectáveis, determinadas igualmente de acordo com regras próprias.
Segundo a Requerida, a autonomização que caracteriza as TAs em sede de IRC projecta-se em processos de liquidação que são distintos e no apuramento separado de colectas: “por um lado, a que respeita ao IRC calculado com base na matéria colectável definida no n.º 1 do art.º 15.º do CIRC e, por outro, as diversas colectas apuradas com base nas taxas e nos valores tributáveis enunciados no art.º 88.º do mesmo Código, tendo estas um carácter autónomo relativamente à primeira.”
Defende que a colecta a que se refere o art.º 90.º, quando a liquidação deva ser feita pelo contribuinte, é apurada com base na matéria colectável que conste dessa liquidação/ auto-liquidação – cfr. art.º 90.º, n.º 1 al. a) – e que o crédito em que se traduz o SIFIDE deve ser deduzido apenas à colecta assim apurada, i.e., apurada com base na matéria colectável.
Refere também jurisprudência arbitral na qual se reconhece o carácter não unitário da colecta de IRC, e bem assim, jurisprudência arbitral em que se decidiu pela não dedutibilidade de créditos do SIFIDE à colecta de TAs.
Em defesa da interpretação que faz dos normativos legais pertinentes – e no sentido de que é devido um esforço interpretativo quanto ao que deva entender-se ser a colecta contida no n.º 1 do art.º 90.º na remissão para ali operada pelo n.º 2 do mesmo artigo - invoca, entre outros, o art.º 105.º, n.º 1 em conjugação com o art.º 90.º, n.º 1 (ref. a Pagamentos por Conta) e, ainda, o art.º 90.º, n.º 5 também em conjugação com o n.º 2 do mesmo dispositivo (ref. à imputação de rendimentos aos sócios em sociedades sujeitas ao regime de transparência fiscal), todos do CIRC.
Esclarece, no que respeita à dedução relativa a BFs (art.º 90.º, n.º 2, al. c)), quando se trate de benefícios ao investimento - como é o caso dos SIFIDE, RFAI e CFEI - haver subjacente uma filosofia de que o benefício constitui um prémio cuja amplitude varia com a rendibilidade dos investimentos, pois quanto mais elevado o lucro/matéria colectável do IRC maior será a capacidade para efectuar a dedução à colecta. Pugna pela impossibilidade de se proceder a qualquer dedução dos créditos dali resultantes à colecta produzida pelas taxas de tributações autónomas, sob pena de se subverter toda a teleologia que esteve presente na sua génese.
Defende, pois, que a liquidação a que o legislador se quis referir no art.º 90.º, n.º 2 do CIRC é a que se processa tendo por base a matéria colectável constante do art.º 15.º do mesmo Código.
E aborda, por fim e para concluir sempre no mesmo sentido, o regime dos BFs em causa no que respeita ao seu funcionamento de atribuição de crédito de imposto em relação com a rendibilidade do investimento.
Conclui pela improcedência do PPA.
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O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, nos termos dos art.ºs 2.º, n.º 1, al. a) e 10.º, n.º 1 do RJAT, e é competente.
Em 18.06.2018 o Tribunal proferiu Despacho de prorrogação, à cautela, por estar prestes a perfazer-se o prazo do art.º 21.º, n.º 1 do RJAT (que terminaria a 20 de Junho).
As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (art.ºs 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades, nem existe matéria de excepção.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos:
a) A Requerente é uma sociedade de direito português que, nos exercícios de 2014 e de 2015, era a sociedade dominante do Grupo Fiscal B... .
b) Nos exercícios de 2014 e 2015 o Grupo Fiscal B... estava abrangido pelo regime especial de tributação de grupos de sociedades (“RETGS”) em IRC.
c) Em 28 de Maio de 2015 a ora Requerente procedeu à apresentação da declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC do seu Grupo Fiscal referente ao exercício de 2014, identificada com o código 0361-C1280-10, junta aos autos com o PPA e cujo teor se dá por reproduzido.
d) Na Declaração Modelo 22 identificada em c) a Requerente procedeu à autoliquidação de tributações autónomas em IRC do ano de 2014 no montante de € 108.928,39.
e) Em 31 de Maio de 2016, a Requerente entregou declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC do Grupo Fiscal, com referência ao exercício de 2015, identificada com o código ..., junta aos autos com o PPA e cujo teor se dá por reproduzido.
f) Na Declaração Modelo 22 identificada em e) a Requerente procedeu à autoliquidação de tributações autónomas em IRC do ano de 2015 no montante de € 110.905,19.
g) A 30 de Maio de 2016 e a 31 de Maio de 2017 a Requerente apresentou Declarações de substituição relativas, respectivamente, aos exercícios de 2014 e 2015, que não afectam o que se discute nos autos, juntas com o PPA e cujo teor se dá por reproduzido.
h) No Quadro 10 - CÁLCULO DO IMPOSTO - da Declaração Modelo 22 referente ao exercício de 2014, após submissão de Declaração de substituição, o IRC A PAGAR – cfr. Campo 361 - é zero; o IRC A RECUPERAR – cfr. Campo 362 – é de € 411.030,33; o TOTAL A PAGAR - cfr. Campo 367- é zero; o TOTAL A RECUPERAR - cfr. Campo 368 - é de € 260.633,53.
i) No Quadro 10 – CÁLCULO DO IMPOSTO - da Declaração Modelo 22 referente ao exercício de 2015, após submissão de Declaração de substituição, o IRC A PAGAR – cfr. Campo 361 - é zero; o IRC A RECUPERAR – cfr. Campo 362 - é de € 579.435,00; o TOTAL A PAGAR - cfr. Campo 367 - é zero; o TOTAL A RECUPERAR - cfr. Campo 368 - é de € 432.124,19.
j) Os valores do TOTAL A RECUPERAR em conformidade com as Declarações Modelo 22 dos exercícios de 2014 e 2015, nos montantes dali constantes - Campo 368, foram reembolsados ao sujeito passivo.
k) No exercício de 2014 não foi incluído no valor de colecta considerada para efeitos das deduções previstas no n.º 2 do art.º 90.º o montante de € 108.928,39 - apurado a título de Tributações Autónomas no referido período de tributação - para efeitos dos limites de dedução dos créditos disponíveis de SIFIDE, RFAI e CFEI.
l) No exercício de 2015 não foi incluído no valor de colecta considerada para efeitos das deduções previstas no n.º 2 do art.º 90.º o montante de € 110.905,19 - apurado a título de Tributações Autónomas no referido período de tributação - para efeitos dos limites de dedução dos créditos disponíveis de SIFIDE, RFAI e CFEI.
m) O montante de SIFIDE disponível para utilização no final dos exercícios de 2014 e de 2015 ascendia a respectivamente, € 1.304.667,98 (2014) e € 1.078.421,83 (2015), cfr. certificações acompanhadas de Declarações da Comissão Certificadora do SIFIDE juntas aos autos.
n) Em sede de RFAI subsistia um montante acumulado por deduzir à colecta de IRC que ascendia, nos exercícios de 2014 e de 2015, a € 338.417,80.
o) O montante de CFEI disponível nos exercícios de 2014 e de 2015 ascendia a um total de € 555.657,36.
p) O lucro tributável do Grupo Fiscal B... e respectivas empresas integrantes não foi determinado por métodos indirectos.
q) As empresas integrantes do Grupo Fiscal na origem do SIFIDE, do RFAI e do CFEI não eram devedoras ao Estado nem à Segurança Social de quaisquer impostos ou contribuições nas datas a que se referem as Certidões juntas aos autos com o PPA (doc. 14), cujo teor se dá por reproduzido.
r) O sistema informático da AT não permite inscrever o valor relativo às taxas de tributação autónoma em IRC deduzido de montantes de créditos de Benefícios Fiscais (SIFIDE, RFAI e CFEI) para dedução à colecta do IRC .
s) A Requerente apresentou reclamação graciosa das referidas autoliquidações de IRC de 2014 e 2015 em 09.01.2017, alegando em defesa de que deveria ter sido possível deduzir montantes adicionais, correspondentes aos valores das Tributações Autónomas autoliquidadas nos exercícios em causa, por utilização de benefícios fiscais em sede de SIFIDE, e solicitando que (i) fossem corrigidas as autoliquidações na parte correspondente às Tributações Autónomas, (ii) lhe fossem reembolsados os montantes correspondentes às Tributações Autónomas respectivas, no total de € 219.833,58 e (iii) lhe fossem pagos juros indemnizatórios calculados sobre a insuficiência de reembolso de imposto com referência aos períodos de tributação em causa.
t) A reclamação graciosa foi objecto de Despacho de Indeferimento datado de 07.07.2017.
u) Em 11.07.2017 a Requerente foi notificada do Despacho de Indeferimento da reclamação graciosa, no qual se adere ao Projecto de Decisão que consta dos autos como doc. 8 junto com o PPA, cujo teor se dá como reproduzido, e do qual consta, entre o mais:
“(...) a questão essencial e objecto do presente procedimento tributário é porventura a de saber se “parte” dos créditos fiscais acima referidos – e que, nos períodos de tributação de 2014 e 2015 se encontravam disponíveis para dedução, a título de SIFIDE – pode ser deduzida aos montantes das tributações autónomas apuradas nas respectivas Declarações de Rendimento do Grupo fiscal de que a Reclamante é a sociedade dominante. / Com efeito, a A... SGPS vem solicitar a dedução à Colecta total do IRC do referido grupo fiscal (incluindo as tributações autónomas) dos períodos de tributação de 2014 e 2015, de “parte” dos Benefícios fiscais associados ao SIFIDE e que “ficaram ainda por deduzir, por insuficiência de colecta”, em virtude de no valor desta (da colecta) “não ser possível incluir os montantes de € 108.928,39 e € 110.905,19, apurados a título de tributações autónomas nos respectivos períodos de tributação, para efeitos do limite de dedução dos créditos acima referidos.(...)”;
“(...) Com efeito, entende-se que aquelas Tributações Autónomas não deverão ser consideradas para efeitos das deduções previstas na al. c) do n.º 2 do art.º 90.º do CIRC (por referência aos benefícios fiscais aqui em causa), os quais deverão ser deduzidos apenas ao montante apurado nos termos do n.º 1 do art.º 90.º do CIRC, em cuja norma não se compreenderão as tributações autónomas que, de resto, são apuradas “autonomamente”, em relação ao apuramento do IRC.”
“(...) Consequentemente, ao contrário do que defende a Reclamante, entende-se que a “colecta das tributações autónomas” não deverá ser considerada colecta de IRC, logo, não deverá (ela própria) relevar para efeitos de dedução dos créditos fiscais de SIFIDE.”
v) Em 09.10.2017 a Requerente apresentou o PPA que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados
Não há factos relevantes para a decisão da causa que não tenham sido considerados provados.
2.3. Fundamentação da matéria de facto
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com o Pedido e no Processo Administrativo - que se dão, todos, como reproduzidos - bem como nas posições manifestadas pelas Partes nos articulados constantes dos autos, não existindo quanto aos mesmos controvérsia.
Ao Tribunal cabe seleccionar os factos que importam à apreciação e decisão da causa, de acordo com a respectiva pertinência jurídica determinada em função das várias soluções possíveis para a mesma, e discriminar a matéria provada e não provada (v. art.º 16.º, al. e) e art.º 19.º do RJAT e, ainda, art.º 123.º, n.º 2 do CPPT e art.ºs 596.º e 607.º, n.º 3 do CPC[2]).
Prevalece no processo tributário o princípio da descoberta da verdade material, e podem ser considerados pelo Tribunal os factos instrumentais relativos a factos alegados, e a questões de direito suscitadas, tidos por necessários ao apuramento da verdade e factos não alegados relativos a questões suscitadas (v. art.ºs 13.º do CPPT, 99.º da LGT[3] e 411.º do CPC).
3. Matéria de direito
3.1. Questões a decidir
São essencialmente as seguintes as questões a decidir:
A) É ou não possível deduzir à colecta produzida pelas taxas de tributação autónoma em IRC créditos de Benefícios Fiscais disponíveis para dedução à colecta de IRC. No caso, créditos apurados no âmbito do SIFIDE, do RFAI e do CFEI.
B) Em caso de resposta negativa à questão A) com o fundamento de que a liquidação das Tributações Autónomas não está prevista no n.º 1 do art.º 90.º do CIRC[4], encontra-se, ou não, tal liquidação desprovida de base legal.
C) Com referência às questões de inconstitucionalidade suscitadas pela Requerente:
- Se se responder negativamente à questão A) (consequentemente se indeferindo os Pedidos Principais) por recurso à aplicação do art.º 135.º da LOE 2016, há ou não violação da Constituição (i.e., se este Tribunal aplicar o art.º 135.º da LOE 2016, e porque a Requerente invoca a respectiva inconstitucionalidade material, apreciaremos de tal questão);
- Se se vier a responder à questão B) (Pedido Subsidiário), e se se responder em sentido negativo (ou seja, se respondermos no sentido de que, apesar de não prevista no n.º 1 do art.º 90.º, a liquidação das TAs não se encontra desprovida de base legal), há ou não violação da Constituição.
Por fim, dependendo da decisão que vier a ser tomada nas questões A) e/ou B), haverá ou não que decidir quanto a reembolso de quantias e a juros indemnizatórios.
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3.2. Fundamentação
3.2.1. Enquadramento
Dada a relevância da matéria de Direito aqui em apreciação, consideramos particularmente importante um enquadramento prévio da mesma e, assim também, do nosso raciocínio decisório.
Seja pela potencialidade das repercussões que uma decisão em matérias como esta pode revestir, seja pela dissonância entre decisões que vêm sendo proferidas[5], seja pela confusão que se vai, a nosso ver injustificadamente, criando, consideramos dever começar, então, pelo princípio. Como segue.
Vejamos os diversos elementos que para este enquadramento são convocados.
(i) Desde logo um princípio de Unidade do Sistema.
É o próprio legislador Constituinte quem utiliza o conceito de “Sistema Fiscal” – cfr. art.º 103.º da CRP (enquadrado no Título IV, por seu turno intitulado “Sistema financeiro e fiscal”). A expressão utilizada pelo legislador Constituinte contém nela, em nosso entender, uma ideia de necessária coerência do sistema tributário como um todo.
Note-se como no art.º 165.º, n.º 1 al. i) o mesmo legislador não deixou de voltar a utilizar a expressão, referindo-se à competência para legislar sobre a criação não só de impostos e outros tributos mas, expressamente também, à competência para a criação do Sistema Fiscal (“i) Criação de impostos e sistema fiscal (...)”).
O Sistema Fiscal deve, pois, ser concebido como um todo, uno, ainda que, bem o sabemos, a tarefa não seja, por natureza, fácil. Deve, de todo o modo, a necessária coerência do Sistema estar presente, também, aquando da tarefa de interpretação da lei.
No dizer de Ana Paula Dourado, “(...) essa coerência deve ser um objectivo a atingir através da interpretação da ordem jurídica tributária à luz da Constituição e do Direito Europeu. A construção dogmática, tanto quanto possível coerente, do nosso ordenamento fiscal, implica a interpretação da LGT, do CPPT e da restante legislação fiscal tendo em conta os princípios desenvolvidos nesse conjunto legislativo, desde que não sejam contrários à Constituição e ao Direito Europeu.”[6]
Em sintonia com o entendimento que também é o nosso, expressa-se José Casalta Nabais assim[7]: “(...) uma vez que a Constituição, ao falar de sistema fiscal, teve por certo presente o que esse termo significa. (...)”.[8]
Ou, ainda, Saldanha Sanches, assim: “(…) Devemos interpretar o conceito de sistematicidade pressupondo “ser natural que cada trecho de uma lei surja como um momento de um desenrolar lógico de um plano[9]” e apelar também para o reforço dos elementos de sistematicidade e racionalidade dentro do Direito Fiscal.”[10]
(ii) Depois, as regras hermenêuticas aplicáveis em geral e no Direito Tributário e, em particular, na interpretação das normas anti-abuso e das normas criadoras de Benefícios Fiscais.
Diz-nos, ao que aqui mais releva, o n.º 1 do art.º 11.º da LGT assim: “Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e os princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.”
Somos pois, desde logo, remetidos para os critérios gerais de interpretação das leis e, aqui, em especial para o disposto no Código Civil (doravante também “CC”), art.º 9.º. Ora, nos termos do n.º 1 deste artigo “A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.”[11]
Nos números seguintes do mesmo art.º 9.º dispõe-se assim: “2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. / 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”
Sabemos como estas regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis, também vigentes, pois, em Direito Tributário, operam. Ainda assim, façamos-lhes uma breve referência.
A questão subjacente será sempre a de, na fixação do sentido e alcance com que o texto normativo deve valer, escolher um sentido de entre vários possíveis. Sentido esse que terá que ser um que assegure um mínimo de uniformidade de soluções. E para esse efeito se estabelecem, então, critérios orientadores.
Os critérios ou factores interpretativos são essencialmente dois: (i) elemento gramatical, correspondente à letra da lei, ao texto, e (ii) elemento lógico, subdividido este, por sua vez, em três outros, a saber, elemento racional ou teleológico, elemento sistemático, e elemento histórico. Sendo que, a letra e o espírito da lei (elemento gramatical/elemento lógico) devem necessariamente ser utilizados em conjunto.
Correntes hermenêuticas à parte, dizia-nos Manuel de Andrade: “(...) o intérprete (…) tem que partir do pressuposto de que a lei emana de um legislador razoável; e, por isso, terá que perguntar-se como um tal legislador teria pensado e querido a lei ao legislar no condicionalismo do tempo da sua publicação e no ambiente histórico em que foi sancionada a lei.(...)”.[12]
E, como refere Baptista Machado: “(...) último factor ou ponto de referência da interpretação: a unidade do sistema jurídico. Dos três factores interpretativos a que se refere o n.º 1 do art.º 9.º, este é sem dúvida o mais importante.(...)”.[13]
Especificamente quanto à interpretação das leis no Direito Tributário referia-se Saldanha Sanches assim: “(…) A interpretação teleológica pode conduzir, assim, a uma maior sistematicidade no Direito Fiscal, como uma técnica necessariamente estruturante e atribuidora de um sentido àquilo que, de outra forma, será um mero conglomerado de leis, obedecendo cada uma delas a um fim conjuntural, em potencial conflito com todos os outros objectivos e finalidades que levaram à publicação de outras leis igualmente marcadas pela prossecução de interesses conjunturais. A obtenção dessa unidade sistemática, que é uma condição indispensável para evitar o arbítrio na aplicação da lei fiscal, passa necessariamente por uma interpretação que assegure a coerência, como um postulado a obter, na ordenação das consequências do Direito, o mesmo não acontecendo com a mera interpretação literal – na situação actual, esta conduzirá, necessariamente, a uma insegurança sistemática, que é a verdadeira negação da segurança jurídica. Por conseguinte, juntamente com a interpretação literal, podem ser usados no Direito Fiscal as demais técnicas ou cânones interpretativos há muito usados pelo Direito.”[14]
Ainda quanto à interpretação das normas tributárias, e às especificidades aplicáveis, a par dos critérios gerais, à sua interpretação,“(...) as normas tributárias têm mais semelhanças com as normas penais, embora a exigência de tipicidade não vá tão longe, sendo temperada com uma orientação claramente anti-abuso. Assim é, na medida em que a protecção dos direitos e interesses dos contribuintes individualmente considerados tem que ser devidamente ponderada com o interesse público constitucional, que também é da generalidade dos cidadãos, de assegurar a observância dos princípios da universalidade, da igualdade, da justiça e da necessidade tributárias e das orientações de política pública.(…)”.[15]
E“(...) As consequências da interpretação literal ou estrita são ainda piores quando se interpretam desta forma normas que foram introduzidas no sistema com o objectivo específico de evitar um comportamento abusivo do contribuinte num certo sector.”[16]
No que ainda mais especificamente respeita à interpretação das normas criadoras de Benefícios Fiscais, e em conformidade com o disposto no Código Civil quanto à interpretação de normas excepcionais[17], estabelece o art.º 10.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (doravante também “EBF”) que “As normas que estabelecem benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, mas admitem interpretação extensiva.”
A este respeito explicava Saldanha Sanches que“(…) a tendência para a criação de regras específicas para a interpretação das leis fiscais tem como eixo uma de duas ideias: (i) ou uma concepção de interesse público prevalecente sobre o interesse dos particulares (…); (ii) ou uma falsa oposição entre interesse público e interesse privado, (…). Esta oposição aparente revela-se, ainda hoje, no princípio da interpretação extensiva das normas que atribuem benefícios, contida no art.º 9.º do EBF, sem atender ao facto de que qualquer benefício fiscal vai sempre implicar a redução da base fiscal e a consequente oneração de outros contribuintes.” E continuava: “(...) admitem interpretação extensiva – não tanto pela necessidade de beneficiar o contribuinte, como parecia pensar ingenuamente o legislador fiscal, mas, sim, porque, consistindo o benefício fiscal numa norma de direito económico destinada a obter um certo efeito económico, deverá ser aplicado levando em conta a teleologia substancial da política económica que corporiza. Isto, porque o interesse público que justifica a isenção – o de estimular um certo comportamento do sujeito passivo – se sobrepõe, aqui, ao da correcta distribuição dos encargos tributários segundo a capacidade contributiva. Neste caso, as regras de interpretação a utilizar são as que podem contribuir para atingir uma dessas finalidades.”[18]
(iii) O “recorte” Constitucional do Direito Tributário deverá também ele estar necessariamente sempre presente.
A ponderação cuidada dos bens jurídico-constitucionais em presença torna-se fundamental. Incluindo no que respeita aos princípios constitucionais em matéria fiscal e, bem assim - estando implicados Benefícios Fiscais - em matéria de política económica e orçamental.
“O apelo à Constituição e aos seus princípios num domínio tão constitucionalmente determinado como é o do Direito Fiscal não pode deixar de constituir uma forma de salvar da inconstitucionalidade certas normas que, aplicadas de forma literal e sem recurso aos princípios ético-jurídicos recebidos da Constituição, deveriam sofrer a censura do Tribunal Constitucional (…).”; (…) Os princípios constitucionais da fiscalidade constituem os valores ordenadores que estruturam as leis fiscais e as dotam de um sistema interno. (...)”[19]
Permitimo-nos ainda fazer uma referência ao comando Constitucional vertido no art.º 81.º, al. f) da CRP: “Incumbe prioritariamente ao Estado no âmbito económico e social: (…) f) Assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir a equilibrada concorrência entre as empresas, (…) e a reprimir (…) outras práticas lesivas do interesse geral.”
(iv) O Princípio da Legalidade no Direito Tributário e as suas vestes na Liquidação.
É unanimemente entendido que o princípio da legalidade, que rege o Direito Tributário, se subdivide em (i) reserva de lei formal e (ii) reserva de lei material ou substancial (também princípio da tipicidade).
Nos termos do art.º 103.º, n.º 2 da CRP: “2. Os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes.”
Ou seja, não só se exige a sua criação por lei formal – cfr. art.º 165.º, n.º 1 al. i) - como se exige também que os elementos essenciais dos impostos sejam por ela (lei formal) determinados. E é nesta última vertente do princípio da legalidade tributária (reserva material), que importa, no caso, atentar em particular, quanto ao que se deva entender aqui abrangido. Com efeito, embora, depois, no n.º 3 do mesmo art.º 103.º, o legislador Constituinte tenha estabelecido “Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei.”, a verdade é que tratou as diferentes situações (as contidas no n.º 2 e as do n.º 3) distintamente e em separado.
Por sua vez, o legislador ordinário ao tratar o princípio da legalidade tributária na LGT – cfr. art.º 8.º, n.ºs 1 e 2 - colocou a liquidação a par de outras realidades, que não juntamente com os elementos essenciais (que colocou no n.º 1).
Parece-nos de questionar se o legislador, em particular o legislador Constituinte, terá pretendido conceder ao acto de liquidação a mesma exigência de lei formal que concedeu aos elementos essenciais dos impostos.
Casalta Nabais, a este respeito, escreve[20]: “(...) Em contrapartida, a reserva de lei decorrente do princípio da legalidade fiscal não abrange qualquer outra matéria fiscal. Designadamente, não abrange a liquidação e cobrança dos impostos, momentos estes cuja disciplina não está assim sujeita ao princípio da legalidade fiscal, mas apenas ao princípio geral da legalidade da administração pública. Isto significa que não aderimos à posição de parte significativa da doutrina, a qual, com base no n.º 3 do art.º 103.º da Constituição, em que se dispõe (…), defende que a disciplina de tais momentos da vida do imposto está constitucionalmente sujeita à reserva de diploma legislativo, isto é, de lei, decreto-lei ou decreto legislativo regional. Efectivamente, nada nos leva a crer que a palavra lei, utilizada no preceito constitucional em causa, tenha o sentido de diploma legislativo e não de norma jurídica”. “(…) Todavia, tendo em conta o disposto na alínea a) do n.º 2 do art.º 8.º da LGT, que veio estender o princípio da legalidade tributária à liquidação e cobrança dos tributos, incluindo os prazos de prescrição e caducidade, temos de concluir que, em virtude dessa exigência legal, a liquidação e cobrança dos impostos (como espécie dos tributos) não podem ter a sua disciplina jurídica em regulamentos, com excepção, claro está, dos regulamentos das autarquias locais (...)”.
(v) As Tributações Autónomas.
As TAs foram introduzidas pelo nosso legislador em 1990, em legislação avulsa[21], confinando-se, à época, às “despesas confidenciais ou não documentadas”, que eram assim “tributadas autonomamente em IRS ou IRC, conforme os casos, a uma taxa de 10%”.[22]
A taxa ali inicialmente estipulada foi aumentando por sucessivas intervenções legislativas: para 25%[23]; para 30%, tendo-se aqui (com a LOE1997) introduzido uma taxa agravada de 40% para o caso de sujeitos passivos total ou parcialmente isentos de IRC; para 32% e 60% (taxas normal e agravada, respectivamente).[24] Só em 2000 (com início de vigência a 01.01.2001)[25], com a reforma da tributação do rendimento, o legislador, revogando o D.L. que então as regia, as “trouxe” para o CIRC e, bem assim, note-se, para o CIRS. Passaram a ficar abrangidas então também – em IRC, tal como em IRS – as despesas de representação e despesas com viaturas. E sucessivamente foram sendo acrescentadas outras.
Se é certo que as situações abrangidas são hoje múltiplas e diversificadas, ainda assim é certo também que estamos, sempre, perante uma tributação sobre despesas, que não sobre rendimentos. Era assim antes de inseridas sistematicamente nos Códigos do IRC e do IRS. Como continuou a ser assim depois. Senão, percorram-se, quanto ao IRC, os números, e alíneas, do art.º 88.º do respectivo Código para tanto se concluir. Note-se que mesmo nas situações em que há uma relação com rendimentos, trata-se de rendimentos de terceiros, que são despesas do Sujeito Passivo (“doravante também “SP”).
E tributação que funciona autonomamente, também tal como antes de inserida nos CIRC e CIRS. Estamos, pois, perante uma tributação distinta da tributação sobre o rendimento. Desde logo pela sua incidência objectiva. Mas também pelo seu funcionamento.
“(...) o STA assumiu diferente posição (…) considerando estar em causa uma tributação sobre a despesa (este imposto é apurado de forma independente relativamente à quantificação da matéria colectável dos impostos sobre o rendimento, existindo a obrigação do seu pagamento mesmo não havendo rendimento positivo), sendo que cada despesa constitui um facto tributário autónomo, instantâneo e de obrigação única, ao qual deve ser aplicada a lei em vigor no momento da sua realização. O que parece correcto!”[26]
E, a este respeito, escrevia Saldanha Sanches[27] assim: “(...) A tributação do rendimento de pessoas singulares ou colectivas de acordo com o princípio do rendimento líquido ou rendimento real (…) tem as chamadas “tributações autónomas” como principal excepção. (…) Neste tipo de tributação, o legislador procura responder à questão reconhecidamente difícil do regime fiscal de despesas que se encontram na zona de intersecção da esfera pessoal e da esfera empresarial(...); (...) o sistema mostra a sua natureza dual, com uma taxa agravada de tributação autónoma para certas situações especiais que se procura desencorajar, como a aquisição de viaturas para fins empresariais ou viaturas em princípio demasiado dispendiosas quando existem prejuízos. Cria-se, aqui, uma espécie de presunção de que estes custos não têm uma causa empresarial, e, por isso, são sujeitos a uma tributação autónoma. Em resumo, o custo é dedutível, mas a tributação autónoma reduz a sua vantagem fiscal, uma vez que, aqui, a base de incidência não é um rendimento líquido, mas, sim, um custo transformado – excepcionalmente – em objecto de tributação.(...)”;“(…) o princípio comum nestes regimes díspares: a taxa de tributação autónoma sobe sempre que a indedutibilidade do custo (porque o sujeito passivo está isento, porque não tem tido lucros) não aumenta a tributação do sujeito passivo (...).”
Pretendeu, pois, o legislador desincentivar o SP de incorrer neste tipo de despesas, dadas as características que às mesmas (o legislador) associa.
(vi) Os Benefícios Fiscais.
Os BF são medidas excepcionais no seio do sistema fiscal, que o legislador adopta porque, e na medida em que, se visa, através deles, alcançar determinados objectivos de política económica e social, incentivando, nesse sentido, determinados comportamentos por parte dos sujeitos passivos.
A sua legitimação deriva dessa fundamentação extrafiscal, que há-de ser devidamente justificada, e que traduz a tutela de interesses públicos constitucionalmente relevantes. Como estabelece o art.º 2.º do EBF, “Consideram-se benefícios fiscais as medidas de caráter excepcional instituídas para a tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem.”
Incluem-se na reserva de lei formal - cfr. 103.º, n,º 2 da CRP e art.º 8.º, n.º 1 da LGT - e constituem desagravamentos fiscais, abrindo excepções às normas de incidência, com o objectivo de alcançar determinadas finalidades extrafiscais.
São considerados despesa fiscal (cfr. também no art.º 2.º, n.º 3 do EBF) e a sua criação está, por isso, sujeita a uma série de condicionalismos. Entre os quais se incluindo a necessidade de uma previsão da despesa fiscal que originam. Desde logo, a Constituição obriga a que a Proposta de Orçamento de Estado inclua um relatório sobre os BFs e a respectiva estimativa de receita cessante (v. art.º 106.º, n.º 3, al. g) da CRP). Estabelece, por seu turno, a LGT (v. art.º 14.º, n.º 3) que “A criação dos benefícios fiscais depende da clara definição dos seus objectivos e da prévia quantificação da despesa fiscal”.
Ao tratar o tema da justificação económica e social da despesa fiscal, Guilherme d' Oliveira Martins[28] delimita o conceito de despesa fiscal assim: “(...) a despesa fiscal apenas subsiste enquanto representar situações que, do ponto de vista do contribuinte, se assumam como reduções excepcionais do quantitativo tributário a que está sujeito e que, do ponto de vista das entidades públicas, representem renúncia a receitas que em condições normais seriam tributadas (…).”
“A matéria dos benefícios fiscais é uma das mais delicadas e, em grande medida, responsáveis pela complexidade tributária. Alguns observadores atentos notam uma tendência geral, neste domínio, que passa pela introdução, pelo legislador, de um determinado incentivo fiscal, seguido da tentativa, por parte dos contribuintes, de ajustarem e manipularem os seus comportamentos de forma a usar e abusar desse incentivo, seguindo-se a adopção pelo legislador, de normas ainda mais complexas e extensas para definir os benefícios fiscais criados com maior precisão. E assim sucessivamente. O resultado final é uma maior complexidade do sistema tributário, acompanhada de uma maior criatividade e sofisticação das técnicas desenvolvidas para contornar as suas disposições e maximizar os benefícios que as mesmas podem proporcionar.”[29]
(vii) O IRC
Nos temos do art.º 1.º do CIRC (Pressuposto do imposto): “O imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) incide sobre os rendimentos obtidos, mesmo quando provenientes de actos ilícitos, no período de tributação, pelos sujeitos passivos, nos termos deste Código.”
O Código[30] define a respectiva incidência pessoal ou subjectiva no art.º 2.º (Sujeitos Passivos) e a incidência real ou objectiva no art.º 3.º (Base do Imposto).
No que para os autos releva, quanto então à incidência real e no que diz respeito às sociedades e outras pessoas colectivas cuja actividade principal seja de natureza empresarial, estabelece o art.º 3.º assim: “1. O IRC incide sobre: a) O lucro das sociedades comerciais (…); “2. Para efeitos do disposto no número anterior, o lucro consiste na diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código”.
A base da tributação em IRC é pois, em casos como o dos autos (i.e., sociedades comerciais como SP), o lucro. Sendo que o Código acolhe para o efeito, cfr. art.º 3.º, n.º 2 supra, um conceito amplo de rendimento-acréscimo.
Estabelece depois o art.º 17.º do CIRC que o lucro tributável “é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do período e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código”.
Ou seja, o IRC incide sobre o lucro – sobre o resultado líquido do exercício apurado na contabilidade e eventualmente corrigido para efeitos fiscais (corrigido nos termos do CIRC e outras disposições legais aplicáveis).
***
Refira-se, aqui, abrindo um parêntesis, que o apuramento do Lucro Tributável (e da Matéria Colectável) obedece a uma complexidade de regras e procedimentos, que o legislador consagrou ao longo de todo o Capítulo III do CIRC (art.ºs 15.º a 86.º-B). E, quando se trate de autoliquidação (como em regra no IRC), tal apuramento deverá ser reflectido nas Declarações de modelo oficial aprovado por despacho do membro do Governo responsável pela área das finanças (v. art.º 117.º, n.º 2), em especial na Declaração periódica de rendimentos a que se referem os art.ºs 117.º, n.º 1, al. b) e 120.º. Esta Declaração é a “Declaração – Modelo 22” (à qual fazemos referência ao longo da presente Decisão sempre que nos referimos à denominação ou numeração de qualquer “Quadro” ou “Campo”), aprovada pois, também ela, e como não poderia deixar de ser, pelo mesmo legislador. Tudo em coerência com o princípio da tributação do rendimento real, imperativo constitucional em sede de tributação de pessoas colectivas (v. art.º 104.º, n.º 2 da CRP), na origem do princípio da aproximação da fiscalidade à contabilidade.
***
Num momento posterior, uma vez apurado o Lucro Tributável - caso exista - vão então ser-lhe abatidos certos montantes. Chegando-se, assim, à Matéria Colectável (v. art.º 15.º, n.º 1 al. a) e art.º 52.º do CIRC e Quadro 09 da Modelo 22).
Sendo aí, a partir desse momento, que se está em condições de calcular o imposto. Ou seja, apurada a Matéria Colectável, a ela se vai aplicar a taxa[31] de IRC (v. art.º 87.º do CIRC) obtendo-se, assim, a respectiva Colecta. A esta pode ainda, por fim, acrescer Derrama estadual (cfr. art.º 87.º-A do CIRC) e, aí então, está apurada a Colecta Total.
É a esta Colecta que são depois feitas, se for o caso, Deduções - as Deduções do art.º 90.º, n.º 2 do CIRC (entre elas, a Dedução em causa no presente processo – a da al. c)). Sendo o TOTAL DAS DEDUÇÕES a registar em Campo próprio no Quadro 10 – Campo 357.
Uma vez processadas estas Deduções chegamos, então, ao TOTAL DO IRC LIQUIDADO (Quadro 10 - Campo 358), ou “colecta líquida”, na expressão de Casalta Nabais[32].
A este TOTAL DO IRC LIQUIDADO vão, por fim, abater-se os pagamentos que tenham sido antecipadamente efectuados por conta do imposto (retenções na fonte, pagamentos por conta e pagamentos adicionais por conta).
E assim chegamos ao IRC A PAGAR - cfr. do Quadro 10 - Campo 361. Ou, se for o caso, IRC A RECUPERAR (como no presente processo).
Em nenhum momento, até aqui, se cuida de TAs.
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Feito o enquadramento, passemos a apreciar.
Não sem antes fazermos notar que, independentemente da posição do julgador sobre as opções tomadas pelo legislador, e sobre a técnica legislativa seguida, compete-lhe, como intérprete julgador que é, interpretar a lei vigente aplicável ao caso e, aplicando-a, decidir.
3.2.2. A dedutibilidade ou não à colecta produzida pelas taxas de tributação autónoma em IRC de créditos de benefícios fiscais disponíveis para dedução à colecta de IRC. No caso, créditos apurados no âmbito do SIFIDE, do RFAI e do CFEI.
Entende a Requerente que as autoliquidações em crise se encontram parcialmente feridas de ilegalidade por – defende - não lhe ter sido reconhecido (quando o deveria ter sido) o direito a deduzir também na colecta derivada das taxas de tributação autónoma, nos anos de 2014 e 2015, os créditos de imposto decorrentes de BFs de que nos exercícios de 2014 e 2015 o Grupo Fiscal (do qual, no período relevante, era sociedade dominante) dispunha para abatimento à colecta de IRC.
O que, segundo invoca, só não fez por se ter visto disso impossibilitada pelo sistema informático da AT, que tanto não permitiu fosse feito.
Refira-se que a Requerente cumpriu a condição de impugnabilidade que sobre si pendia de previamente recorrer à via administrativa[33], cfr. art.º 131.º do CPPT, tendo a reclamação graciosa que interpôs sido indeferida e vindo agora peticionar, nesta sede, a declaração de ilegalidade do indeferimento da reclamação graciosa (objecto imediato do PPA) e, bem assim, a declaração de ilegalidade (parcial) das autoliquidações (objecto mediato). Refira-se, ainda, que na reclamação graciosa a ora Requerente apenas invocara o reconhecimento do direito à dedução de créditos decorrentes de SIFIDE, enquanto que nos presentes autos invoca, para além desses, créditos decorrentes de RFAI e CFEI[34].
Toda a pretensão da Requerente é apresentada e fundamentada partindo do art.º 90.º do CIRC. Designadamente do respectivo n.º 2 e do que, a seu ver, deverá entender-se significar (sentido e alcance com que se deva entender) a expressão ali contida “montante apurado nos termos do número anterior”.
E, simultaneamente, partindo do entendimento, que defende, de que o n.º 1 do mesmo artigo, para o qual o n.º 2 remete, deverá interpretar-se como contendo em si a operação de liquidação das Tributações Autónomas.
Entendimento este que faz assentar, por sua vez, num outro seu prévio entendimento no sentido de que - assim defende - decorre do disposto no art.º 23.º-A (e, antes, do art.º 45.º, n.º 1, al. a)) que TAs são IRC, que a colecta de IRC inclui as TAs. E que se nesse artigo o legislador assim o consagrou (como defende), então (conclui) também o mesmo se deverá entender o legislador ter consagrado no art.º 90.º.
Donde, ao no n.º 2 do art.º 90.º se remeter para o “montante apurado nos termos do número anterior” se estará a remeter (defende) para a Colecta IRC considerando-se nesta incluídos os montantes de TAs.
Vejamos.
Dispõe o artigo 90.º, cfr. versão em vigor nos períodos relevantes, i.e., 2014 e 2015, assim:
“Artigo 90.º - Procedimento e forma de liquidação
1 – A liquidação do IRC processa-se nos termos seguintes:
a) Quando a liquidação deva ser feita pelo sujeito passivo nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º, tem por base a matéria coletável que delas conste;
b) Na falta de apresentação da declaração a que se refere o artigo 120.º, a liquidação é efetuada até 30 de Novembro do ano seguinte àquele a que respeita ou, no caso previsto no n.º 2 do referido artigo, até ao fim do 6.º mês seguinte ao do termo do prazo para apresentação da declaração aí mencionada e tem por base o valor anual da retribuição mínima mensal ou, quando superior, a totalidade da matéria colectável do exercício mais próximo que se encontre determinada.
c) Na falta de liquidação nos termos das alíneas anteriores, a mesma tem por base os elementos de que a administração fiscal disponha.
2 – Ao montante apurado nos termos do número anterior são efetuadas as seguintes deduções, pela ordem indicada:
a) A correspondente à dupla tributação jurídica internacional;
b) A correspondente à dupla tributação económica internacional;
c) A relativa a benefícios fiscais;
d) A relativa ao pagamento especial por conta a que se refere o artigo 106.º;
e) A relativa a retenções na fonte não suscetíveis de compensação ou reembolso nos termos da legislação aplicável.
3 – (Revogado)
4 – Ao montante apurado nos termos do n.º 1, relativamente às entidades mencionadas no n.º 4 do artigo 120.º, apenas é de efetuar a dedução relativa às retenções na fonte quando estas tenham a natureza de imposto por conta do IRC.
5 – As deduções referidas no n.º 2 respeitantes a entidades a que seja aplicável o regime de transparência fiscal estabelecido no artigo 6.º são imputadas aos respetivos sócios ou membros nos termos estabelecidos no n.º 3 desse artigo e deduzidas ao montante apurado com base na matéria coletável que tenha tido em consideração a imputação prevista no mesmo artigo.
6 – Quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as deduções referidas no n.º 2 relativas a cada uma das sociedades são efetuadas no montante apurado relativamente ao grupo, nos termos do n.º 1.
7 – (Revogado)
8 – Relativamente aos sujeitos passivos abrangidos pelo regime simplificado de determinação da matéria coletável, ao montante apurado nos termos do n.º 1 apenas são de efetuar as deduções previstas nas alíneas a) e e) do n.º 2.
9 – Das deduções efetuadas nos termos das alíneas a) a d) do n.º 2 não pode resultar valor negativo.
10 –Ao montante apurado nos termos das alíneas b) e c) do n.º 1 apenas são feitas as deduções de que a administração fiscal tenha conhecimento e que possam ser efetuadas nos termos dos n.s 2 a 4.
11 – Nos casos em que seja aplicável o disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 79.º, são efetuadas anualmente liquidações com base na matéria coletável determinada com caráter provisório, devendo, face à liquidação correspondente à matéria coletável respeitante a todo o período de liquidação, cobrar-se ou anular-se a diferença apurada.
12 – A liquidação prevista no n.º 1 pode ser corrigida, se for caso disso, dentro do prazo a que se refere o artigo 101.º, cobrando-se ou anulando-se então as diferenças apuradas”
Escuda-se a Requerente numa interpretação literal, como veremos. E literal no sentido em que se afasta dos demais critérios hermenêuticos devidos aplicar, claramente confinando a sua interpretação à letra da lei[35]. O que, como vimos supra[36], não só não está conforme às regras hermenêuticas aplicáveis, como conduz a resultados que contêm em si potencialidade para distorcer – em nosso entender – a Unidade do Sistema Jurídico-tributário.
Não deixaremos, de todo o modo, de notar aqui que, na verdade, até mesmo se nos apoiássemos exclusivamente num critério literal (o que, como é bom de ver, não faríamos) seria possível retirar conclusão oposta àquela que a Requerente retira nos autos (sendo certo que sempre se há-de encontrar um mínimo de correspondência na letra da lei[37]).
Senão, vejamos (sem pretensão de sermos exaustivos) o vertido no texto dos dispositivos que seguem, todos do CIRC (salvo quando referentes ao regime de cada um dos BFs):
1. Artigos que se seguem ao art.º 90.º (e que tratam, sucessivamente, cada uma das deduções estabelecidas nas alíneas do n.º 2 do art.º 90.º):
(i) no art.º 91.º, ao reportar-se no n.º 1 à dedução à colecta da al. a) do n.º 2 do art.º 90.º, o legislador refere que a dedução “é apenas aplicável quando na matéria colectável tenham sido incluídos rendimentos obtidos no estrangeiro (...)”;
(ii) no art.º 91.º-A, reportando-se à dedução à colecta da al. b) do n.º 2 do art.º 90.º, o legislador refere que a dedução “é aplicável (…) quando na matéria colectável deste tenham sido incluídos lucros e reservas, distribuídos por entidades residentes fora do território português (...)”;
(iii) no art.º 92.º, ao reportar-se no n.º 1 à dedução à colecta da al. c) (BFs) do n.º 2 do art.º 90.º, o legislador refere que “o imposto liquidado nos termos do n.º 1 do art.º 90.º, líquido das deduções previstas nas alíneas a) a c) do n.º 2 do mesmo artigo, não pode ser inferior a 90% do montante que seria apurado se o sujeito passivo não usufruísse de benefícios fiscais (...)”. Sendo que – cfr. acabado de percorrer - decorre do texto dos art.ºs 91.º e 91.º-A, n.ºs 1, que “o montante apurado” nos termos do n.º 1 do art.º 90.º - para o qual remetem as duas primeiras alíneas do seu n.º 2 (do art.º 90.º) – respeita a rendimentos, lucros e reservas, e apuramento da matéria colectável. O legislador de forma expressa identifica, pois, a realidade que é passível dessas deduções: uma realidade que decorre de um apuramento que não contém, nem poderia conter, em si, TAs. Remetendo assim para essa previsão (para as excluir do cálculo do limite dos 90%) as deduções decorrentes dos BFs que em seguida identifica. Foi claro o legislador ao colocar a al. c) do n.º 2 do art.º 90.º (BFs) “no mesmo bolo” das al.s a) e b), tudo para efeitos do cálculo a fazer ao abrigo do art.º 92.º, cálculo esse cujo resultado o legislador denomina de “Resultado da liquidação”. Liquidação, portanto, que será a mesma liquidação de que cuida o art.º 90.º, n.º 1. Pelo menos quando o nº 2 do mesmo para ali remete.
E quanto aos artigos que, depois, se referem às alíneas d) e e) do n.º 2 do art.º 90.º (o art.º 93.º quanto aos PECs[38], e os artigos seguintes quanto às retenções na fonte), abstemo-nos de desenvolver aqui argumentos, mesmo porque também relativamente a estas duas últimas realidades é evidente, pelo menos para nós, que o montante apurado nos termos do n.º 1 do art.º 90.º - para que o respectivo n.º 2 remete (ou, pelo menos, quando este para ele remete) - não comporta senão o IRC (e não também TAs).
2. Artigo 120.º, n.º 6, al.s a) e b), em conjugação com os art.ºs 70.º e 90.º, n.º 2 al. c).
Dispõe-se no n.º 6 do art.º 120.º (sob a epígrafe “Declaração periódica de rendimentos”), no que respeita a sociedades abrangidas pelo RETGS, como é o caso dos autos:
“6. Quando for aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades:
a) A sociedade dominante deve enviar a declaração periódica de rendimentos relativa ao lucro tributável do grupo apurado nos termos do art.º 70.º.
E no art.º 70.º, para que ali se remete:
“Relativamente a cada um dos períodos de tributação abrangidos pela aplicação do regime especial, o lucro tributável do grupo é calculado pela sociedade dominante, através da soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados nas declarações periódicas individuais de cada uma das sociedades pertencentes ao grupo, corrigido, sendo caso disso, (…).”
Parece-nos, daqui se retira também que o apuramento a que a sociedade dominante procede é relativo ao IRC, sem inclusão da colecta de TAs. O legislador tratá-lo distintamente (esse apuramento) será porque é dele que se cuida, para todos os efeitos, também neste contexto.
3. O art.º 105.º, n.º 1 do CIRC, ao determinar a base de cálculo dos pagamentos por conta por referência ao art.º 90.º, n.º 1: “Os pagamentos por conta são calculados com base no imposto liquidado nos temos do n.º 1 do art.º 90.º (...)”, sabido como é que o cálculo em causa não pode senão ter por referência o apuramento do IRC baseado nas regras de determinação do lucro tributável e da matéria colectável (do Capítulo III do CIRC) e, nunca, o apuramento feito com base nas regras de incidência das taxas de tributação autónoma (do art.º 88.º do CIRC).
4. Artigos relevantes dos Diplomas que regulam os BFs em questão nos autos. Assim:
(i) ref. SIFIDE[39] - a letra do artigo que trata a dedução (sob a epígrafe “Âmbito da dedução”), na sua versão inicial (Lei n.º 40/2/2005, art.º 4.º) referia “(...) podem deduzir ao montante apurado nos termos do art.º 83.º do Código do IRC (…); entretanto, na versão actualmente em vigor e, aliás, assim já à data do período relevante nos autos (cfr. Código Fiscal do Investimento, doravante “CFI”, art.º 38.º[40]) refere: “(...) podem deduzir ao montante da colecta do IRC apurado nos termos do n.º 1 do art.º 90.º (...)”;
(ii) ref. RFAI[41] - a letra do artigo que trata a dedução, na sua versão inicial (Lei n.º 10/2009, art.º 3.º) referia: “(...) Dedução à colecta de IRC, e até à concorrência de (...)”; na versão actual e, aliás, assim já à data do período relevante nos autos (CFI, art.º 23.º) refere: “(...) Dedução à colecta de IRC apurada nos termos da al. a) do n.º 1 do art.º 90.º do CIRC (...)”;
(iii) ref. CFEI[42] - a letra do artigo que trata a dedução (Lei n.º 49/2013, art.º 3.º) refere: “(...) dedução à colecta de IRC no montante de (...)”.
5. Ainda com referência aos Diplomas que regulam os BFs em causa: em qualquer deles encontramos um artigo a estabelecer obrigações contabilísticas específicas para o SP (“Obrigações acessórias” / “Obrigações contabilísticas”) em decorrência do BF. Exige-se, designadamente, que a contabilidade dos SPs evidencie “o imposto que deixe de ser pago em resultado da dedução (…) mediante menção do valor correspondente no anexo ao balanço e à demonstração de resultados (…)”. Ora, nesta Nota que deverá constar do Anexo às Demonstrações Financeiras, e salvo melhor opinião, constarão, “simplesmente”, os cálculos de apuramento - apuramento do Lucro Tributável e da Matéria Colectável - multiplicados pela taxa de IRC (art.º 87.º)[43]. Apurando-se, assim, o “X” de poupança fiscal alcançado por utilização do crédito do BF. Parece-nos evidente, também pelo vertido no texto destes artigos, cuidar-se de realidade a que as TAs são alheias.
6. No regime do BF CFEI – art.º 3.º, n.º 5 da Lei n.º 49/2013 – expressamente se determina que, caso seja aplicável o RETGS, a dedução à colecta a conceder: “a) Efectua-se ao montante apurado nos termos da al. a) do n.º 1 do art.º 90.º do Código do IRC, com base na matéria colectável do grupo;”
***
Não nos conteremos, porém, numa interpretação literal, seja do preceito onde a Requerente baseia toda a questão (art.º 90.º, n.º 2), seja dos demais preceitos legais implicados.
Avancemos.
A Requerente invoca que o art.º 45.º, n.º 1 al. a) do Código do IRC compreende a colecta de TAs em IRC. Afirma que a Jurisprudência assim o tem entendido “de modo praticamente unânime”. Para depois avançar que, do mesmo modo se há-de também entender que a colecta do IRC prevista no art.º 90.º, n.º 1 e n.º 2 al. c) do Código do IRC abrange a colecta das TAs em IRC.
E daqui retira a consequência da ilegalidade (por violação do art.º 90.º, n.º 2 al. c)) que, em seu entender, a recusa de dedução dos créditos dos BFs SIFIDE, CFEI e RFAI à colecta das TAs traduz.
Ora, não só não é verdade que exista Jurisprudência “praticamente unânime” no sentido de que o art.º 45.º, n.º 1 al. a) continha em si a colecta da TAs, como um tal entendimento deriva, com o devido respeito para com quem o perfilhe, de uma interpretação literal[44] do artigo em causa. E o mesmo se diga também, paralelamente, com referência ao actual art.º 23.º-A, n.º 1 al. a), com a redacção em vigor (introduzida pela Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro).
O art.º 45.º, n.º 1 al. a) (em vigor até 31 de Dezembro de 2013 e que foi revogado pela Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro, a qual introduziu por sua vez o art.º 23.º-A) - dispunha assim:
“Artigo 45.º - Encargos não dedutíveis para efeitos fiscais
1. Não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como gastos do período de tributação:
a) O IRC e quaisquer outros impostos que directa ou indirectamente incidam sobre os lucros; (...)”
Por sua vez, o art.º 23.º-A) (vigente desde 1 de Janeiro de 2014[45]com a redacção que mantém actualmente), dispõe assim:
Artigo 23.º-A – Encargos não dedutíveis para efeitos fiscais
1. Não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como gastos do período de tributação:
a) O IRC, incluindo as tributações autónomas, e quaisquer outros impostos que directa ou indirectamente incidam sobre os lucros; (...)”
A Requerente remete a este respeito ainda para Decisão Arbitral onde se perfilhou o entendimento de que do art.º 23.º-A, n.º 1 al. a) decorre que a colecta das TAs constitui colecta de IRC “estando sujeita à generalidade das normas previstas nos Códigos referidos, potencialmente aplicáveis” [CIRC e CIRS] e de que, quanto a tal conclusão, o referido dispositivo “não deixa margem para qualquer dúvida razoável, corroborando o que já anteriormente resultava do teor literal do artigo 12.º do mesmo Código”[46].
Este último artigo dispõe assim:
“Artigo 12.º – Sociedades e outras entidades abrangidas pelo regime de transparência fiscal
As sociedades e outras entidades a que, nos termos do art.º 6.º, seja aplicável o regime de transparência fiscal não são tributadas em IRC, salvo quanto às tributações autónomas.”
E, escudando-se na mesma Decisão, adere a um entendimento no sentido de que o relevante é saber se a liquidação das TAs é, ou não, feita ao abrigo do art.º 90.º do CIRC, sendo que, se o for, então a colecta proveniente das TAs há que ser tida em consideração para determinação do limite da dedução (do BF, cfr. n.º 2, al. c) do art.º 90.º).
Ora vejamos como entendemos nós deverem interpretar-se estes normativos.
a) Quanto aos artigos 45.º e 23.º-A e à indedutibilidade das TAs para efeitos de determinação do Lucro Tributável daí se pretendendo retirar que assim sendo elas constituem IRC
No art.º 23.º- A do CIRC (v. supra) o legislador veio expressamente dizer, na al. a) do n.º 1, que entre os encargos não dedutíveis para efeitos fiscais se incluem, também, as tributações autónomas. Sendo que no art.º 45.º no n.º 1, al. a) (v. supra), que o antecedeu, não lhes havia feito menção expressa.
Porém, já então, ao abrigo deste último artigo, 45.º[47], como agora, se não poderia entender de outra forma.
Precisamente por as TAs não serem IRC é que o legislador sentiu necessidade de expressamente referir [48], acrescentando-as entre vírgulas, que também elas não se consideram dedutíveis para efeitos fiscais.
Ou seja, indicando-se já antes (art.º 45.º) não serem dedutíveis para o efeito “O IRC e quaisquer outros impostos que directa ou indirectamente incidam sobre os lucros” o legislador veio, em 2014, de forma expressa, acrescentar (no agora art.º 23.º-A, n.º 1, al. a)), entre vírgulas, as TAs: “O IRC, incluindo as tributações autónomas, e quaisquer outros impostos que directa ou indirectamente incidam sobre os lucros”. Não que já antes se não devesse interpretar estarem elas ali incluídas. Mas sim, e apenas, porque as TAs têm uma natureza distinta do IRC (sendo que não poderiam deixar de se considerar indedutíveis para determinação do lucro tributável). E daí que - na ausência da indicação expressa - tenham surgido conjecturas sobre se as mesmas, sendo diferentes do IRC e não sendo, também por outro lado, impostos sobre o rendimento, deveriam (ou não) ter o mesmo tratamento que o IRC e demais impostos sobre o rendimento para este efeito de apuramento do lucro tributável (doravante também “LT”).
Ou seja, houve quem aventasse a possibilidade de, não sendo elas IRC nem também impostos sobre o rendimento, e o legislador não as tendo afastado expressamente da dedutibilidade ao LT como fazia com aqueles (no art.º 45.º), elas devessem ser dedutíveis ao LT.
Conjecturas essas que, note-se, surgiram na sequência de o Tribunal Constitucional ter vindo rever o seu anterior entendimento, em Acórdão de 2012[49], decidindo que as TAs são um imposto sobre a despesa[50].
E conjecturas que sempre seriam mal fundadas, e às quais facilmente se responderia em sentido de que as TAs deveriam ter o mesmo tratamento que o IRC e os demais impostos sobre o rendimento para efeitos de determinação do LT. Por razões que nos parecem evidentes e que passamos a sintetizar.
As TAs incidem, vimos supra[51], sobre despesas. Despesas em que o SP incorreu e que levou a custos, na sua contabilidade, custos esses que o legislador entendeu aceitar (com excepção, tão só, das despesas não documentadas[52]) como dedutíveis para efeitos fiscais. As despesas em causa foram consideradas para apuramento do LT, portanto.
Num segundo momento, essas mesmas despesas são sujeitas, por opção do legislador, a uma tributação. Autónoma. Calculada autonomamente sobre o valor dessas mesmas despesas.
Ou seja, o legislador entendeu preferível aceitá-las como custos para efeitos fiscais, indo elas abater, assim, ao rendimento e contribuindo, pois, para o apuramento do LT, ficando, se quisermos, “livres” de IRC e, pelo contrário, contribuindo para reduzir o montante que, no exercício em causa, ficará sujeito a IRC. E, depois, porque as considera despesas em que facilmente a esfera privada de sócios ou accionistas e a esfera empresarial se podem confundir e o SP utilizar para fins que não empresariais bens cujos custos deduziu fiscalmente, ou em que pode o SP pagar montantes a terceiros que assim não são tributados por tais rendimentos, como na distribuição camuflada de lucros, despesas a que podem andar associadas práticas de evasão fiscal, entre outras, e porque são situações muitas vezes de difícil comprovação, optou então por - para compensar a vantagem fiscal que por ali lhes concedeu - compensá-la (essa vantagem) com uma tributação sobre essas mesmas despesas. Autónoma, insista-se.
A colecta de TAs, o montante de TAs a pagar, é pois um encargo tributário do SP. Que incide sobre montantes (os valores das despesas) que foram utilizados, estes sim, pelo SP para reduzir o lucro.
A tributação incidente autonomamente sobre estas despesas, que é um ónus fiscal sobre as mesmas despesas, ela (ou melhor, a colecta dela decorrente) não concorre, naturalmente, para a formação do LT. É um raciocínio que nos parece lógico. Trata-se de um ónus que impende sobre o SP de forma independente, autónoma do LT, e que em nada contribui para a determinação, para a formação, deste. Só assim se compreende, aliás, que elas sejam devidas ainda que o SP não tenha apurado Lucro[53].
Aliás, veja-se como as únicas despesas que, de entre as sujeitas a TA, não são aceites como custos fiscais, não concorrendo, pois, para a determinação do LT, estão - as próprias despesas - em separado, na al. b) do n.º 1 do art.º 23.º-A.
É precisamente disso que se trata no art.º 23.º-A: não aceitar como custos para efeitos fiscais. Na al. b) estamos a tratar de despesas que não se aceitam como custos, por razões lógicas: não documentação. Na al. a) estamos a tratar de encargos fiscais do SP, que igualmente não se aceitam como custos, igualmente por razões lógicas: não é por incorrer em tais encargos fiscais que o SP está, através disso, a contribuir para a formação do seu LT. A colecta de TAs é um custo sob a forma de encargo fiscal. Encargo este que não deverá ser considerado na determinação do lucro tributável em IRC já que não contribui para a formação do mesmo. Por outras palavras, diremos, é um encargo que não pode ser considerado como custo do lucro.
Ou seja, o montante de imposto resultante da aplicação das taxas de tributação autónoma não concorre para a formação do LT, logo não é fiscalmente dedutível. Não obstante suportado pelo SP e registado como custo na contabilidade.
Também pela análise do art.º 23.º (“Gastos e Perdas”), aliás, se compreenderia a razão de ser disto mesmo. Com efeito, aí se determina, logo no n.º 1, que “Para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.”
Em coerência, no cálculo do imposto[54] o LT já está há muito apurado quando, num momento praticamente final – de apuramento do TOTAL A PAGAR – as TAs vão acrescer. Só após o apuramento da Matéria Colectável, da Colecta, da Colecta Total, do Total do IRC liquidado, e do IRC a pagar ou a recuperar. Cfr. Modelo 22, Campo 365 (por confronto com os Campos que o antecedem).
E não é de interpretar, como já se viu entender-se, que elas (TAs) são mais um dos “quaisquer outros impostos que directa ou indirectamente incidam sobre os lucros”. É precisamente porque também o não são – nem são IRC, nem são, também, algum dos outros impostos a que o legislador ali se refere – que o legislador expressamente as veio, à cautela, referir. As TAs incidem não sobre rendimento mas sobre despesas. Os outros impostos a que o legislador ali se quis referir são as derramas. Como é entendimento assente.
Com interesse para o assunto, e referindo-se ao então art.º 42.º, n.º 1, al. a)[55], (correspondente ao posterior art.º 45.º, n.º 1 al. a)), escreveu Rui Duarte Morais[56]:“O IRC não é dedutível. O que se compreende, desde logo por razões lógicas (...). / Questão polémica, que deu origem a numerosa doutrina e jurisprudência, foi saber se a derrama era ou não dedutível. Muito embora seja um imposto acessório do IRC, calculado com base na colecta deste, a derrama é um outro imposto e a lei não previa, expressamente, a sua não dedutibilidade. / A questão foi resolvida com a nova redacção dada à al. a) do n.º 1 do art.º 42.[57], ficando claro que não são dedutíveis, para além do IRC, quaisquer outros impostos que directa ou indirectamente incidam sobre os lucros.”
E ainda, mais recentemente, o mesmo Autor, quanto à querela surgida sobre se as TAs seriam ou não dedutíveis ao LT e à posterior expressa menção das TAs no art.º 23.º-A[58]:“(...) o legislador resolveu expressamente a questão com a adição do art.º 23.º-A, que expressamente configura as tributações autónomas como encargos não dedutíveis. Norma que entendemos não ter natureza interpretativa, ou seja, dela não se deverá concluir que, anteriormente, tal dedução era possível.”
A acrescer, pois, ao racional que ficou exposto, de impossibilidade, por natureza, de dedução das TAs ao LT, note-se como também pelo elemento histórico, da evolução destes preceitos, chegamos à mesma e única conclusão.
Por fim, ainda neste ponto e mais uma vez para além do racional que fica exposto e que afasta, só por si, a possibilidade de admitir serem as TAs dedutíveis ao LT (e assim afasta, também, a procedência do raciocínio pugnado pela Requerente ao defender que as TAs, sendo IRC pelo disposto no art.º 23.º-A, igualmente o terão que ser no art.º 90.º, n.º 1) refira-se ainda que outras razões apontariam sempre também em igual sentido. De que TAs não são IRC. E de que, ainda assim e da mesma maneira que o IRC, não são dedutíveis ao LT. Pela razão lógica que vem de se expôr.
Desde logo, veja-se tudo o que referimos no Enquadramento supra, ponto (v).
Embora exigidas no âmbito do respectivo Código, as TAs têm uma natureza distinta do IRC. O IRC é um imposto que incide sobre o lucro, no conceito amplo de rendimento acréscimo (cfr. art.º 3.º do CIRC[59]). As TAs, diferentemente, são devidas por o SP ter realizado determinadas despesas, às quais se aplicam determinadas taxas autonomamente (cfr. art.º 88.º do CIRC). E não mais que isto. Aqui, o facto tributário é a despesa. Sendo que o montante assim apurado a título de TAs vai simplesmente ser adicionado ao Imposto sobre o rendimento a pagar (v. Quadro 10, Campo 361, declaração Modelo 22: “IRC A PAGAR” e, depois, Campo 365, Tributações autónomas), num momento em que o mesmo foi já previamente calculado e apurado de acordo com as regras estabelecidas ao longo do Código (em especial cfr. art.s 15.º a 86.º.º-B, Cap. III - “Determinação da matéria colectável”).
Os valores pagos a título de TAs não chegam a ter qualquer relação directa com a Colecta de IRC. E também só assim se compreende que em caso de inexistência de lucro tributável (ou, simplesmente, de Colecta, cfr. Campos 351/378 da Modelo 22) as TAs continuem a ser devidas. Autonomamente, como a palavra indica. Independentemente de haver ou não “IRC a pagar” (cfr. os próprios termos da declaração Modelo 22).
Mais, insista-se por revelador, tanto é distinta a natureza do IRC - imposto sobre o rendimento - e a das TAs que, no limite, caso o SP tenha prejuízos, não só as TAs continuam a ser devidas, como, mais do que isso, sofrem um agravamento (v. art.º 88.º, n.º 14 do CIRC).
Ainda quanto à diferente natureza entre o IRC e as TAs, são a nosso ver esclarecedores os casos quer das sociedades isentas de IRC, quer das sociedades sujeitas a transparência fiscal. Na primeira situação, cfr. art.º 117.º, n.º 6 do CIRC, estabeleceu o nosso legislador que entidades isentas de IRC (cfr. art.º 9.º) deverão, havendo TAs a pagar, apresentar a Declaração Modelo 22. Ainda que isentas de IRC, sublinhe-se. Como se conjugaria então, num mesmo contribuinte, isenção subjectiva e automática em IRC com sujeição a TAs senão estando perante realidades distintas?
Quanto às sociedades sujeitas ao regime de transparência fiscal (cfr. art.º 6.º do CIRC) determinou o legislador que a sua não tributação em IRC não as desobriga de apresentar, também elas, as Declarações próprias dos sujeitos passivos de IRC caso tenham incorrido em despesas sujeitas a TAs (cfr. art.º 117.º, n.º 9 do CIRC). Assim, não obstante os rendimentos gerados na sociedade serem imputados directamente na esfera dos respectivos sócios[60] (pelo que, em regra, não há sequer obrigação declarativa da sociedade em IRC), caso a sociedade tenha incorrido em despesas sujeitas a TA terá que apresentar as referidas Declarações, liquidando e declarando, assim, as TAs[61], competindo-lhe a ela, entidade enquadrada no regime de transparência fiscal de IRC[62] o pagamento das TAs.
Pelo que o art.º 12.º do CIRC (v. supra) só poderá ser interpretado com o sentido de que a natureza das duas realidades (IRC/TAs) é, precisamente, distinta.
Ou seja, as TAs, sendo apuradas efectivamente em sede de IRC, são-no por questões práticas, de simplicidade e também porque têm como facto tributário, afinal, despesas que (à excepção das não documentadas) são consideradas enquanto custos no cálculo do lucro tributável daquele SP. Sendo que, mesmo esta última relação não imporia, em rigor, que as TAs fossem calculadas juntamente com o IRC.
E do facto de o legislador assim o ter entendido fazer – apurá-las em conjunto com o IRC – não decorre que as mesmas passem a ter uma natureza diferente. Elas continuam a ser autónomas, com uma natureza materialmente distinta da de um imposto sobre o rendimento, e devidas independentemente de ser ou não devido IRC pelo mesmo SP. Precisamente por se reportarem - IRC e TAs - a factos tributários distintos. O próprio funcionamento em concreto sendo, também ele, diferente: as TAs não deixam, em consequência da referida opção do legislador, de continuar a ser um imposto de obrigação única, pago a título definitivo e não sujeito a posteriores acertos, calculado por simples operação aritmética de aplicação de uma taxa ao valor de uma despesa; contrariamente ao IRC, que é periódico e de formação sucessiva, calculado por uma série de operações mais ou menos complexas, conforme reguladas pelo legislador ao longo de cerca de noventa artigos do respectivo Código (até ao Capítulo IV, e em especial no Capítulo III).
Por questões práticas, evitando-se assim também que o SP tivesse que, com uma regularidade mensal ou trimestral ou outra inferior a um ano, liquidá-las constantemente com todas as obrigações declarativas que daí decorreriam. Em vez disso teve o legislador por preferível e mais conveniente liquidá-las no mesmo momento da liquidação do IRC. No fundo, bem vistas as coisas, o legislador associou as TAs ao IRC desta forma, sendo que o que têm afinal em comum é a respectiva liquidação e pagamento coincidirem no tempo.
Mais, não deixamos de reconhecer nas TAs o objectivo do legislador de desincentivar práticas menos verdadeiras de redução do lucro tributável por recurso a despesas que potencialmente se relacionam com outros fins que não os da actividade da empresa. Ou, visto por outro prisma, um objectivo de penalização, pelo menos quanto a algumas despesas, com o mesmo enquadramento. Como facilmente se depreende atentando no regime das TAs desde a sua criação.
E esta simples constatação (independentemente e sem prejuízo do racional que já deixámos exposto supra - encargo tributário do SP que não contribui para a formação do LT) não nos permitiria também ver senão como próprio do respectivo regime que o montante das TAs não pudesse vir depois a ser utilizado para - por essa outra via, e “à custa” das mesmas despesas - reduzir o lucro tributável. Ou seja, que nunca poderiam elas ser consideradas para dedução na determinação do LT, cfr. veio acrescentar expressamente o legislador através do art.º 23.º-A e como, a nosso ver, já decorria[63] do anterior art.º 45.º, n.º 1 al. a), em conjugação com o art.º 23.º, n.º 2, al. f), todos do CIRC, devidamente interpretados.
Em suma, e contrariamente ao que a Requerente pretende fazer valer, a não dedutibilidade das TAs para apuramento do LT, referida hoje expressamente no art.º 23.º-A, n.º 1 al. a), em nada as torna IRC (não obstante o IRC igualmente se caracterizar por essa não dedutibilidade). Muito menos, como vimos, a fórmula textual com que o legislador a elas aí se referiu (“(...), incluindo as tributações autónomas,”).
b) Quanto ao art.º 12.º e à posição a que a Requerente adere de que com o art.º 23.º-A o legislador apenas veio corroborar o que do art.º 12.º já constava
Pode dizer-se que sim, veio reiterar. Mas precisamente com o sentido oposto ao pretendido pela Requerente. Nos termos do art.º 12.º as sociedades sujeitas ao regime de transparência fiscal (art.º 6.º do CIRC) “não são tributadas em IRC, salvo quanto a tributações autónomas”.
Trata-se sempre, afinal, do mesmo. Como já vimos. As TAs foram incluídas no CIRC por opção do legislador. Porém, tendo uma natureza e funcionamento distintos do IRC. Daí que num caso como este – transparência fiscal – precisamente se torne mais evidente o que, por natureza, já o é. As TAs não acompanham a tributação do rendimento. Não seguem para a esfera dos sócios a quem os rendimentos são imputados, neste caso. Mantêm-se na esfera da sociedade, que incorreu nas despesas. A distinção imposto sobre o rendimento / imposto sobre despesas fica muito clara.
O art.º 12.º releva pois no sentido da indiscutível distinção entre as duas realidades. E no mesmo sentido releva, também, o art.º 23.º-A, n.º 1 al. a) (como vimos já). É apenas nesta medida que este pode ser visto como corroborando aquele.
Rui Duarte Morais entende mesmo que no caso destas sociedades aquilo de que se trata não é de uma verdadeira isenção, mas sim de uma não sujeição.“A obrigação de pagamento de imposto existe, só que ocorre em IRS, na esfera jurídica dos sócios.”[64] Ora, concluímos nós, num tal entendimento, teremos que a sociedade não é sequer sujeito passivo de IRC – e, não obstante, é sujeito passivo de TAs.
Tudo pois, sempre, num único e mesmo sentido. O de que TAs e IRC são realidades distintas.
c) Quanto ao art.º 90.º, n.º 1 e ao estar ou não ali prevista a liquidação das TAs
Do que vem de se expôr se percebe que a liquidação das TAs é feita, por opção do legislador, no âmbito do CIRC. Não vemos que haja qualquer questão quanto a que assim é efectivamente. I.e., que ela é processada no âmbito do CIRC, nas respectivas Declarações para que o mesmo remete. Vimos já ser a Declaração Modelo 22 a relevante para o efeito, e nesta tratar-se a matéria das TAs cfr. supra aflorado[65].
A Declaração, vimos também já, é aprovada nos termos estabelecidos pelo legislador no n.º 2 do art.º 117.º do CIRC – ou seja, pelo mesmo legislador.
As TAs, vimos[66], não constam em nenhum momento do processo de apuramento do LT. Nem do apuramento da Matéria Colectável. Ou sequer do Cálculo do Imposto senão num momento praticamente final deste. Ou seja, entram no Cálculo do Imposto (Quadro 10) mas tão só depois de estar tudo - salvo o total a pagar - já apurado: Colecta, Colecta Total, Total das Deduções (note-se), Total do IRC liquidado, IRC a pagar ou a recuperar.
É só após este último apuramento (IRC a pagar, Campo 361, ou IRC a recuperar, Campo 362) que as TAs vão entrar, a acrescer (Campo 365). Vão entrar como montante a acrescer, porque devido pagar pelo SP[67].
E depois das TAs, logo a seguir às mesmas, já só entram, para o cálculo do TOTAL A PAGAR (ou do Total a recuperar, consoante o caso) os juros compensatórios e os juros de mora (Campos 366 e 369).
Por fim, no Quadro 13 (Tributações Autónomas) vêm identificadas, ao longo de uma série de Campos próprios, todos as despesas sujeitas a taxas de tributação autónoma (cfr. art.º 88.º do CIRC), onde o SP deverá introduzir os respectivos valores.
A liquidação das TAs, para além do que se acaba de referir, vem contida no próprio CIRC. Admitimos que no art.º 90.º, n.º 1. Embora não exclusivamente.
Mas questão diferente desta será, depois, pretender entender-se que o n.º 2 do mesmo art.º 90.º - e, portanto, as Deduções que aí se prevêem à Colecta - valem indistintamente para o conteúdo do todo cujo cálculo seguiu os trâmites do CIRC. Ou seja, e no que ao caso do presente processo respeita, pretender entender-se que os montantes de crédito por BFs ao investimento de que o SP é titular, disponíveis para Dedução à Colecta de IRC (v. art.º 90.º, n.º 2, al. c)) podem vir a ser deduzidos, também, àquela parte do todo a pagar (do “TOTAL A PAGAR”, Campo 367) constituída pelo montante de TAs. E que, portanto, para efeitos de cálculo do limite da Dedução deverão incluir-se os montantes de TAs.
Aqui chegados, vejamos.
Quanto ao art.º 90.º, n.º 1.
Aceitemos que a liquidação das TAs seja feita conforme a al. a) do n.º 1 do art.º 90.º Ainda assim, tal não faz - do montante de TA apurado - Colecta no sentido de “Colecta” do Campo 351[68] da Declaração relevante para que aquelas normas (art.º 90.º, n.º 1 al. a) e art.º 120.º) remetem. A Colecta que vai levar ao apuramento do IRC A PAGAR (cfr. Campo 361) não inclui, de facto, as TAs (Campo 365), as quais só depois vêm a ser adicionadas.
Nem procederá, em nosso entender, um argumento no sentido de que há um só procedimento de liquidação, neste contexto e, por isso, uma única colecta. Com efeito, liquidação é, simplesmente, a operação aritmética de aplicação de uma taxa à matéria colectável apurada ou ao facto tributário, para determinação do quantitativo exacto de imposto a pagar pelo SP. Ou seja, se é certo que a obrigação de imposto nasce com a verificação do facto tributário, ela apenas se torna líquida mediante um acto procedimental – o acto tributário de liquidação. Ora, a “colecta” de TAs (o montante de TAs a pagar juntamente com o IRC a pagar) é apurada pela soma dos valores resultantes da aplicação das diversas taxas constantes do respectivo artigo (art.º 88.º do CIRC) às despesas que estiverem em causa. Valores que, aliás, serão descriminados na Modelo 22, mais adiante, nos campos 13 ou 13-A[69] . Assim sendo, de que tratamos aqui senão de uma liquidação?
E assim se chega à colecta. A colecta das TAs é apenas “chamada” à declaração, aquando do cálculo do imposto, num momento final, como um “mais” que vai somar-se ao valor de IRC (IRC A PAGAR), já apurado. Mas que se distingue, pois, da Colecta de IRC (Campo 351).
Assim, não só a natureza das TAs é distinta, como, coerentemente, a respectiva colecta é, também ela, distinta. Distinta, pois, da Colecta para que o legislador pretendeu remeter no n.º 2 do art.º 90.º. Nem outro entendimento seria possível, com tudo o que vimos.
De onde também, em nosso entender, os créditos por BFs – as Deduções dos mesmos ao abrigo do art.º 90.º, n.º 2, al. c) - não são passíveis de abatimento às TAs.
Voltando ao caso das entidades sujeitas ao regime de transparência fiscal, por elucidativo, note-se como as deduções à colecta do art.º 90.º, n.º 2 acompanham a matéria colectável, sendo efectuadas na esfera dos sócios por referência à respectiva imputação dos rendimentos (cfr. art.º 90.º, n.º 5), permanecendo a colecta das TAs à parte, na esfera daquelas entidades e sem sujeição a quaisquer acertos posteriores.
A interpretação a fazer da expressão contida no n.º 2 do art.º 90.º - “ao montante apurado nos termos do número anterior” - não pode pois senão, aplicados todos os factores hermenêuticos a considerar,[70] ser no sentido de que o legislador ali está a remeter para a Colecta do IRC apurada como vimos supra - nos termos do Capítulo III do CIRC, art.ºs 15.º a 86.º-B[71]. Sem nela estarem contidas as TAs - que constam do Capítulo IV, art.º 88.º do CIRC.
Se quisermos, trata-se de, como resultado desta interpretação, chegar à denominada interpretação restritiva em que o factor decisivo é a ratio legis, restringindo-se o alcance aparente do texto em termos de o tornar compatível com o pensamento legislativo.[72]
Isto se se entender, sem mais, que a liquidação das TAs está contida no n.º 1 do art.º 90.º.
Porém, tudo ponderado, consideramos que o art.º 88.º (Taxas de tributação autónoma), conjugado com o art.º 89.º (Competência para a liquidação), contêm, em si, a previsão da liquidação das TAs. Com efeito, do art.º 88.º constam todas as despesas que constituem factos tributários de TAs e respectivas taxas aplicáveis. Por sua vez, no art.º 89.º dispõe-se quem é competente para a liquidação, assim:
“Artigo 89.º – Competência para a liquidação
A liquidação de IRC é efectuada: a) Pelo próprio sujeito passivo, nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º; b) Pela Autoridade Tributária e Aduaneira, nos restantes casos.”
Não vemos, pois, o que o art.º 90.º, n.º 1, venha acrescentar à liquidação das TAs, que não se encontre já nos dois artigos referidos. As taxas aplicáveis aos factos tributários constam do art.º 88.º, que identifica em simultâneo os factos tributários. A competência e forma de processamento constam do art.º 89.º, que, no caso de autoliquidação, remete para as mesmas Declarações de modelo oficial a que nos referimos supra – artigos 120.º e 122.º.
Nem a inexistência de uma alínea correspondente à al. c) do n.º 1 do art.º 90.º no art.º 89.º nos afasta de assim entendermos, pois que não vemos que essa alínea seja necessária a que assim suceda no caso das TAs – ou seja, a que na falta de liquidação pelo SP a mesma seja feita com base nos elementos de que a AT disponha. Responde, parece-nos, a al. b) do art.º 89.º (v. supra). E, ainda, o art.º 99.º (Liquidação adicional).
Se quisermos, diremos que neste caso, aplicados os factores hermenêuticos como entendemos adequado,[73] chegaríamos a uma interpretação extensiva do contido no art.º 89.º, no sentido de que onde o legislador escreveu “A liquidação do IRC é efectuada: (...)” queria ter dito “A liquidação em IRC, incluindo das tributações autónomas, é efectuada: (...)” (paralelamente à redacção do art.º 23.º-A, n.º 1, al. a) e, tal como aí, fazendo-se a expressa menção por serem distintas realidades). Dando-se assim ao texto um alcance conforme ao pensamento legislativo.[74]
Veja-se, aliás, a este propósito, como na nova redacção conferida ao art.º 90.º, n.º 1, pela LOE 2018[75] deixou de constar a al. c) (que foi revogada).
E, ainda, como na LOE 2016, pelo aditamento do n.º 21 ao art.º 88.º o legislador veio a este respeito expressamente verter no texto do artigo que a liquidação das tributações autónomas em IRC “é efectuada nos termos previstos no art.º 89.º e tem por base os valores e as taxas que resultem dos números anteriores (...)”.
Norma esta a que o legislador (v. art.º 135.º da LOE 2016) atribuiu natureza interpretativa. Sendo nosso entendimento o de que tudo o que dela consta decorria já antes da devida conjugação de todas as normas aplicáveis, devidamente interpretadas. Como vimos de analisar.
Aliás, notemos ainda, a própria redacção da parte final da al. a) do n.º 1 do art.º 90.º parece remeter para o apuramento do IRC nos termos do Capítulo III do Código, não abrangendo as TAs, ao referir que a liquidação “tem por base a matéria colectável que delas [Declarações dos art.ºs 120.º e 122.º] conste”. Ora, vimos já em que consiste a Matéria Colectável constante das Declarações. E que coincide, afinal, com o constante do art.º 15.º do CIRC. Não incluindo, pois, TAs.
Como nem poderia por natureza incluir. Com efeito, parece-nos também claro, no caso das TAs não há sequer uma Matéria Colectável a apurar. Temos um facto tributário, que é a despesa no valor de “X”, ao qual é aplicada a taxa de “Y”. Ou vários factos tributários - várias despesas - tudo assim se processando, sendo que as taxas nem sofrem qualquer alteração em função do montante das despesas. É disto, tão só, que se trata. Como vimos.
Não vamos, pois, ao ponto de necessitar aferir se sairia ferida a Constituição caso a previsão da liquidação das TAs não constasse do CIRC. É para nós claro que consta. E que o art.º 88.º, em conjugação com o 89.º e art.ºs 120.º e 122.º, todos do CIRC, contêm, em si, o respectivo procedimento.
A propósito das TAs, e da distinção entre apuramento e liquidação de IRC, por um lado, e liquidação de TAs, por outro - no mesmo sentido em que também nós entendemos consagrado pelo legislador - veja-se, entre outros, o Acórdão do Tribunal Constitucional N.º 617/2012, de 19 de Dezembro, proferido no processo n.º 150/12:[76]“(…) Contrariamente ao que acontece na tributação dos rendimentos em sede de IRS e IRC, em que se tributa o conjunto dos rendimentos auferidos num determinado ano (o que implica que só no final do mesmo se possa apurar a taxa de imposto (...), no caso tributa-se cada despesa efetuada, em si mesma considerada, e sujeita a determinada taxa, sendo a tributação autónoma apurada de forma independente do IRC que é devido em cada exercício, por não estar diretamente relacionada com a obtenção de um resultado positivo, e por isso, passível de tributação.(...)
(...) Na tributação autónoma o facto tributário que dá origem ao imposto é instantâneo: esgota-se no acto de realização de determinada despesa que está sujeita a tributação (embora, o apuramento do montante do imposto, resultante da aplicação das diversas taxas de tributação aos diversos atos de realização de despesa considerados, se venha a efectuar no fim de um determinado período tributário). Mas o facto de a liquidação do imposto ser efetuada no fim de um determinado período não transforma o mesmo num imposto periódico, de formação sucessiva ou de caráter duradouro. Essa operação de liquidação traduz-se apenas na agregação, para efeito de cobrança, do conjunto de operações sujeitas a essa tributação autónoma, cuja taxa é aplicada a cada despesa, não havendo qualquer influência do volume das despesas efetuadas na determinação da taxa. (…) Neste caso estamos perante um tributo de obrigação única, incidindo sobre operações que se produzem e esgotam de modo instantâneo, em que o facto gerador do tributo surge isolado no tempo, originando, para o contribuinte, uma obrigação de pagamento com carácter avulso. Ou seja, as taxas de tributação autónoma aqui em análise não se referem a um período de tempo, mas a um momento: o da operação isolada sujeita à taxa, sem prejuízo de o apuramento do montante devido pelos agentes económicos sujeitos à referida “taxa” ser efetuado periodicamente, num determinado momento, conjuntamente com outras operações similares, sem que a liquidação conjunta influa no seu resultado.(...)”
d) Quanto aos Benefícios Fiscais SIFIDE, RFAI e CFEI e à pretendida Dedução à colecta proveniente de TAs
Por fim, passemos a apreciar a questão dos Benefícios Fiscais e da pretendida dedução de créditos de imposto deles decorrentes aos montantes de TAs. Para aferir, afinal, se algum outro enquadramento jurídico (que não o que já analisámos) permitiria aceitar a pretendida dedutibilidade. E uma vez que o julgador não se encontra vinculado ao enquadramento normativo invocado pelas Partes.
Antecipemos desde já que a nossa resposta é negativa. Mas vejamos.
Referimos já que:
1) É nosso entendimento que a liquidação das TAs se encontra prevista nos art.ºs 88.º e 89.º do CIRC; e que
2) Ainda que se entendesse que a liquidação das TAs está contida na previsão do art.º 90.º, n.º 1 - ou seja, admitindo que, sendo este um dos sentidos possíveis, seria o por nós considerado como traduzindo a melhor interpretação da lei - sempre a expressão com que no n. 2 do art.º 90.º se remete para o n.º 1 teria que ser interpretada restritivamente, considerando-se a remissão feita tão só para a Colecta de IRC (que não das TAs).
Assim, as Deduções previstas no n.º 2 do art.º 90.º não se aplicam às colectas de TAs em IRC, qualquer que seja o entendimento quanto ao(s) dispositivo(s) do CIRC onde o legislador previu a liquidação das TAs.
E permitiria desde logo o Princípio da Unidade do Sistema outra solução? Ou seja – seria admissível, de iure condendo, e para o que ao caso dos autos releva, permitir que os Benefícios Fiscais concedidos ao SP fossem utilizáveis para abater ao montante devido pelo mesmo SP a título de TAs?
A Requerente tinha créditos disponíveis para utilização nos exercícios em causa nos autos, decorrentes de tais BFs. Estamos perante BFs que funcionam por dedução à colecta, a inscrever pelos SP no Quadro 10 – Campo 355. Após apuramento da Colecta Total e “a caminho” do apuramento do Total do IRC liquidado (como vimos[77]). Após o que se abaterão os pagamentos antecipadamente efectuados por conta do mesmo IRC e se apurará o IRC a pagar (Campo 361) ou o IRC a recuperar (Campo 362).
E só depois de apurados estes últimos (IRC a pagar / ou o IRC a recuperar), sim, acrescendo então aí os montantes - a pagar pelo SP - indicados nos Campos seguintes (posteriores) da Modelo 22, TAs incluídas, até chegarmos ao apuramento do Total a pagar ou do Total a recuperar.
A Requerente apurou, nos exercícios em causa, IRC a recuperar. E é esse IRC a recuperar que, em seu entender, deveria ter sido em montante mais elevado, por abatimento de créditos de imposto, derivados dos BFs, não só à Colecta Total, mas, ainda, aos montantes de TAs que foram por si devidos (e pagos) com referência aos mesmos exercícios. Ou, visto por outro prisma, entende a Requerente que no cálculo do limite da Dedução à Colecta de IRC (Colecta Total, no caso) por BFs, deveriam ter sido considerados os referidos montantes de TAs (elevando-se, assim, o limite da Dedução nessa proporção).
Entende, pois, que deveria ter recuperado um montante (note-se que está afinal em causa o “Total a recuperar” - Campo 368) superior àquele que recuperou, em qualquer um dos exercícios em causa. Precisamente, em relação a cada exercício, o diferencial entre o que recuperou e o que teria recuperado caso as TAs pagas tivessem sido consideradas para efeitos da Dedução por BFs. Ou seja, entende que devia ter recuperado, ainda, o valor correspondente aos montantes que pagou de TAs em cada um desses exercícios.
Vimos já porque surgem Benefícios Fiscais e as restrições a que está sujeita a respectiva criação. No caso, estamos perante Benefícios Fiscais ao investimento produtivo e em investigação e desenvolvimento empresarial.[78] Qualquer deles, pois, criado com objectivos muito específicos que, justificando a sua criação, os legitimam.
As normas que criam BFs, vimos[79], admitem interpretação extensiva. Porém apenas na medida em que através de uma tal interpretação se esteja a contribuir para a prossecução da finalidade de interesse público que justificou em concreto o BF em causa. É essa a razão de ser da respectiva possibilidade de interpretação extensiva.[80] A interpretação nesta sede deve necessariamente ter sobremaneira em conta o elemento teleológico, como bem se compreende, pela especialidade das normas em questão. A correcta interpretação e aplicação exige, neste contexto específico, o ponderação da política económica que a norma traduz e que há-de, sempre e necessariamente, ser prosseguida por esta via.
No caso, uma política pública de estímulo à investigação e desenvolvimento empresarial e ao investimento produtivo. Visou o legislador incentivar os SPs a adoptarem comportamentos que contribuam para estes fins. E é assim que, através destes BFs, se concedem créditos de imposto que são calculados tendo por referência despesas em que o SP incorra e que se consideram elegíveis para os fins do investimento em causa, em investigação e desenvolvimento no caso do SIFIDE, e por referência às aplicações consideradas relevantes e despesas consideradas elegíveis nos investimentos em sede de RFAI e CFEI. E não deixaremos de notar, por revelador em nosso entender, como, nos regimes destes últimos dois BFs inclusivamente o legislador, ao enumerar as despesas elegíveis para os fins do próprio BF, expressamente excepcionou, daquelas, despesas que nos fariam reportar para as susceptíveis de sujeição a taxas de tributação autónoma - tais como despesas com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas e outras.[81] Ou seja, o mesmo legislador, nem sequer permite, afastando-as, que essas despesas (as que ali indicou) se contabilizem para efeitos do montante de investimento a considerar relevante e a partir do qual se calculará o valor do BF a atribuir. Pergunte-se: iria depois o mesmo legislador, que se presume razoável, beneficiar o mesmo SP permitindo que este recorra, por ex., às despesas ali em causa e por esta via - utilização do crédito de imposto decorrente do BF - vá ficar isento das TAs devidas? Não. É o nosso entendimento.
Ainda quanto à política económica e fins extrafiscais prosseguidos através dos BFs em causa nos autos, pode ler-se no Preâmbulo do CFI, entre o mais: “(...) na sequência da reforma do IRC e com o objectivo de intensificar o apoio ao investimento, favorecendo o crescimento sustentável, a criação de emprego, e contribuindo para o reforço da estrutura de capital das empresas (…); relativamente ao Regime Fiscal de Apoio ao Investimento, é também aumentado o limite de crédito de imposto em sede de IRC, (…) incentivando o empreendedorismo, a inovação e favorecendo a criação de empresas com estruturas de capital saudáveis.”
Em contraposição com os objectivos específicos com que o legislador criou os BFs, visando incentivar determinados comportamentos do SP com os objectivos que acabamos de ver, foram criadas pelo mesmo legislador tributações autónomas sobre despesas em que o SP pode incorrer, comportamento este que legislador pretende desincentivar pelas razões que também vimos supra.
Os sentidos das respectivas normas - desagravamento via BFs / agravamento via TAs - são pois antagónicos. Pelas primeiras o legislador visa incentivar comportamentos do SP, pelas segundas visa desincentivar comportamentos do SP. Pelas razões subjacentes que já ficaram expostas. E sendo que a lógica que atravessa todas as situações de sujeição a TAs é a de o legislador querer tributar mais gravosamente a realização dessas despesas pelo SP sempre que o mesmo esteja isento ou apresente prejuízos[82].
Não vemos pois como um legislador, que se deverá presumir ser um legislador razoável e ter consagrado soluções coerentes no Sistema, poderia ter querido beneficiar contribuintes através da afectação de créditos de BFs - destinados a estimular determinados comportamentos por ele (legislador) queridos (com base em fins de tal forma superiores que assim o justificam) - ao desagravamento (e mesmo isenção) de uma tributação por si (legislador) criada com vista a desincentivar o SP de incorrer em determinadas despesas, penalizando-o por nelas incorrer pelas razões subjacentes que vimos.
Por outro lado, não vemos também como o mesmo legislador pudesse ter em vista a dedução de créditos de BFs a montantes de TAs se se pensar que ao legislar quanto aos BFs foi necessário, por imperativo constitucional, estimar a respectiva despesa fiscal causada, como vimos[83]. Não parece de admitir, ainda para mais numa matéria tão delicada como é a da despesa pública, que ao legislador razoável lhe parecesse fazível uma tal quantificação quanto a montantes de TAs, tendo em consideração o tipo de despesas aí em causa.[84]
E nem se diga que a parte final do n.º 21 acrescentada pela LOE 2018[85] ao referir-se a legislação especial se estaria a referir a normas criadoras de BFs[86]. Por um lado, não vemos nas normas criadoras de BFs, pelo menos dos analisados por estarem em causa no presente processo, nada que revele a vontade do legislador nesse sentido. Os fins específicos justificadores dos BFs em causa não são, de todo, compatibilizáveis com - muito menos os mesmos que - os fins visados pelo legislador através das TAs. Os fins visados pelos BFs enquadram-se numa específica política económica, traduzindo-se num incentivo ao investimento que trará por consequência, pretende-se, maior rendibilidade; enquanto que pela tributação de despesas através de taxas de tributação autónoma o legislador visa desencorajar o SP de incorrer em despesas que, tendo associadas as características que vimos, contribuem para a erosão da base tributável. Pelo que, não sendo as mesmas as finalidades prosseguidas, a interpretação extensiva fica necessariamente vedada. Prevalecendo, como sempre teria que ser em sede de BFs, a interpretação teleológica.[87]
Por outro lado, a admitir-se ter sido essa a razão de ser da expressão do legislador (coisa que não nos parece) teria sucedido ter dito mais do que pretendia dizer. Havendo, pois, que - a ser esse o caso - interpretar restritivamente essa parte final do n.º 21 do art.º 88.º
Desde logo pela Unidade do Sistema, pela necessária interpretação eminentemente teleológica das normas criadoras de BF, e por se presumir, como se deve ser o legislador um legislador razoável e que consagrou as soluções mais acertadas[88].
E aqui ainda poderiam chamar-se à colação, bem vistas as coisas, as eventuais implicações que o entendimento contrário poderia ter a nível de Direito da União Europeia, tendo em mente os art.ºs 116.º e 117.º do TFUE, regras de defesa da Concorrência e Auxílios de Estado.
Por coincidente com o entendimento que seguimos, e claríssimo a nosso ver, passamos com a devida vénia, a transcrever parte do Voto de Vencido[89] no Acórdão do TC 267/2017[90], de 31 de Maio de 2017, onde se pode ler:“(...) O Acórdão começa por considerar que «inexistem razões para duvidar do acerto da caracterização como inovadora da solução normativa do artigo 88.º, n.º 21, do CIRC, resultante da alteração feita pelo artigo 133.º da LOE 2016». Tal asserção tem implícito que o “direito certo” ditado pela norma interpretada era no sentido de que as deduções previstas no n.º 2 do artigo 90.º do CIRC (...) podem ser efetuadas à coleta das tributações autónomas. A maioria que vez vencimento não teve qualquer dúvida quanto a esse sentido quando, noutra passagem do Acórdão, afirma que a autonomia das tributações autónomas - quanto à base de incidência, quanto às taxas, e até quanto ao momento de pagamento – não determina a irrelevância da coleta obtida com as tributações autónomas no âmbito do apuramento do próprio IRC, designadamente quanto à integração daqueles nesta última, e «por conseguinte, quanto à admissibilidade de consideração do valor da citada coleta para efeitos de realização das deduções legalmente previstas no artigo 90.º, n.º 2, do CIRC». Ora, no meu ponto de vista, o que acontece é que essa interpretação é errónea, porque só é possível chegar a esse resultado interpretativo numa leitura demasiado rígida dos artigos 89.º e 90.º do CIRC. Numa interpretação puramente literal até se pode concluir que as deduções referidas no n.º 2 do artigo 90.º também podem ser feitas à parte da coleta respeitante às liquidações das tributações autónomas, na medida em que essa parte está integrada na liquidação global do IRC. Mas a interpretação dos respetivos enunciados não pode fazer descaso da “racionalidade” que inspirou o legislador na admissibilidade das deduções à coleta referidas no n.º 2 do artigo 90.º e na criação das tributações autónomas.
As deduções previstas nesse artigo, segundo uma certa ordem de precedência (1.ª – dupla tributação jurídica internacional; 2.ª - dupla tributação económica internacional, 3.ª – benefícios fiscais; 4.ª – pagamento especial por conta; e 5.ª – retenções na fonte, insuscetíveis de compensação ou reembolso), quando aplicadas às tributações autónomas frustram os objetivos por elas visados. Com efeito, se fosse possível deduzir benefícios fiscais ou o PEC à coleta das tributações autónomas neutralizar-se-ia a razão de ser dessas tributações. Através desse tipo de tributos, o legislador visa evitar que os contribuintes utilizem para fins não empresariais bens que geraram custos fiscalmente dedutíveis ou que realizem despesas e encargos que representam ou possam configurar evasão fiscal ilegítima. Ora, o sentido antiabuso das tributações autónomas não seria conseguido se a coleta que delas resulta fosse sujeita àquele tipo de deduções. Se a intenção é penalizar (ou prevenir) certo tipo de despesas que diminuem a matéria tributável do IRC e a respetiva coleta, não faz sentido - e até é contraditório – permitir que a coleta das tributações autónomas se esvazie com deduções que visam direta e exclusivamente o desagravamento fiscal do lucro tributável e da coleta que ao mesmo respeita. É incoerente desincentivar as empresas à realização de despesas que diminuem a medida real do imposto sobre o rendimento, através de um encargo fiscal adicional, e por outro lado, permitir que na coleta daí resultante sejam deduzidas as quantias que incentivam os lucros (benefícios fiscais) ou que pretendam garantir uma coleta mínima de IRC (PEC). A Admissibilidade destas deduções acabaria por impedir que as tributações autónomas realizassem o objetivo para que foram criadas.
Assim, a natureza e a finalidade das tributações autónomas é incompatível com a dedução à correspondente coleta de benefícios fiscais e de pagamentos efetuados por conta do imposto sobre o lucro tributável. De modo que a norma do n.º 2 do artigo 90.º do CIRC, para se tornar compatível com o pensamento legislativo, deve ser interpretada no sentido de apenas permitir deduções à parte da coleta que tem por fonte o lucro tributável.
(…) Desde o nascimento do PEC (…) não foi questionada a não dedutibilidade da quantia adiantada na coleta das tributações autónomas. O próprio programa informático da Administração Tributária de suporte à apresentação das declarações de IRC não possibilitava tal dedução. Portanto, o n.º 2 do artigo 90.º era interpretado e aplicado pela AT – e não consta que haja contribuintes que tenham impugnado nos tribunais tributários tal interpretação – no sentido de que as deduções do PEC (e as demais) não eram deduzidas na coleta das tributações autónomas.” (sublinhados e negritos nossos)
Decide-se, pois, pela não dedutibilidade dos créditos de BF à colecta de TAs em IRC. E pela consequente manutenção na ordem jurídica dos actos de autoliquidação impugnados e do acto de segundo grau (despacho de indeferimento da reclamação graciosa) que os manteve.
3.2.3. Decidindo-se não haver dedutibilidade com fundamento em não se encontrar prevista no n.º 1 do art.º 90.º do CIRC a liquidação das Tributações Autónomas, existe ou não base legal para a liquidação das mesmas
Decidiu-se, supra, pela não dedutibilidade dos créditos por BF à colecta de TAs em IRC por razões que não a de se não encontrar prevista no n.º 1 do art.º 90.º a liquidação das TAs.
Com efeito, admitimos como possível o entendimento de que o art.º 90.º, n.º 1 é aplicável à liquidação das TAs. Porém, tudo ponderado, não parece ser esse o sentido com que a norma deve valer, aquele que garante um mínimo de uniformidade de soluções[91]. Pelas razões que ficaram expostas. Ainda assim, ainda que se entendesse aí prevista tal liquidação, sempre haveria que interpretar-se a remissão do n.º 2 para o n.º 1 como reportada à Colecta de IRC (que não incluídas as TAs). Como vimos.
De todo o modo, somos da opinião de que o art.º 88.º, em conjugação com o art.º 89.º, do CIRC contêm todos os elementos necessários ao procedimento de liquidação das Tributações Autónomas. Aos quais não vem, afinal, o art.º 90.º acrescentar o que já ali não esteja contido para o efeito. Como ficou exposto.
Existe pois, em qualquer caso, base legal, no próprio CIRC, para a liquidação das TAs.
Improcede pois, também, o pedido subsidiário da Requerente.
3.2.4. Questões de inconstitucionalidade suscitadas pela Requerente
Fica prejudicado o conhecimento das questões de inconstitucionalidade suscitadas pela Requerente, conforme resposta dada às questões que antecedem. Sendo que não se aplicou o art.º 135.º da LOE 2016 e que a Liquidação das TAs se encontra prevista no CIRC.
3.2.5. Reembolso de quantias e juros indemnizatórios
Fica prejudicado o conhecimento destes pedidos.
4. Decisão
Termos em que acordam neste Tribunal Arbitral em julgar totalmente improcedente o PPA, como segue:
- improcedente quanto aos pedidos principais, de declaração de ilegalidade do indeferimento da reclamação graciosa e, bem assim, de declaração de ilegalidade parcial das autoliquidações de IRC que aquele indeferimento confirmou, e que são as melhor identificadas nos autos, referentes aos exercícios de 2014 e 2015;
- improcedente quanto ao pedido subsidiário, de declaração de ilegalidade das liquidações de Tributações Autónomas fundamentada em ausência de base legal e, bem assim, da respectiva anulação;
- improcedente quanto aos pedidos de reembolso das quantias pagas e de juros indemnizatórios e, em consequência,
- absolve-se a Requerida dos pedidos.
5. Valor do processo
Nos termos conjugados do disposto nos art.ºs 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, 296.º, n.º 1 e 306.º, n.º 2 do CPC fixa-se o valor do processo em € 219.833,58.
6. Custas
Conforme disposto no art.º 22.º, n.º 4 do RJAT, no art.º 4.º, n.º 4 do Regulamento já referido, e na Tabela I anexa ao mesmo, fixa-se o montante das custas em € 4.284,00, totalmente a cargo da Requerente.
Lisboa, 2 de julho de 2018
Os Árbitros
(José Poças Falcão)
(Sofia Ricardo Borges - Relatora)
(Raquel Franco)
(vencida conforme declaração que se segue)
Declaração de voto
Discordo da tese que fez vencimento pelos seguintes fundamentos:
Para dar resposta às questões colocadas a este Tribunal Arbitral, que se referem aos exercícios de 2014 e de 2015, entendo, desde logo, ser fundamental saber se, independentemente da natureza do imposto a que se referem as tributações autónomas, o respetivo montante é “apurado nos termos do artigo 90.º do CIRC”.
O artigo 90.º do CIRC refere-se às formas de liquidação do IRC, pelo sujeito passivo ou pela AT, aplicando-se ao apuramento do imposto devido em todas as situações previstas no Código. Assim, ele aplica-se também à liquidação do montante das tributações autónomas, uma vez que não existe qualquer outra disposição que preveja termos diferentes para a sua liquidação. A sua autonomia restringe-se, aliás, às taxas aplicáveis e à respetiva matéria tributável – o que não justifica, a nosso ver, que se deva efetuar uma distinção entre a coleta proveniente das tributações autónomas e a restante coleta de IRC.
O argumento de que a natureza anti abuso das tributações autónomas justifica a não dedutibilidade à respetiva coleta não vale, em meu entender, pelo simples, mas decisivo facto de que tal argumento não encontra suporte em qualquer norma do sistema jurídico-tributário português.
Parece-me, a partir da análise do Código do IRC, que, independentemente do entendimento que se tenha quanto à natureza das tributações autónomas em sede de IRC – discussão que não tem que ser suscitada para se dar resposta à questão concreta que aqui se suscita – não se duvida que a quantia arrecadada por via daquelas tributações autónomas o é a título de IRC. Recorrendo ao que se diz, a este propósito, no Acórdão proferido no processo 775/2015-T, “(…) as tributações autónomas são indissociáveis dos sujeitos do imposto sobre o rendimento respetivo, e, mais especificamente, da atividade económica por eles levada a cabo, o que é ainda mais evidente quando se pensa na ligação que, embora tenha variado nas sucessivas alterações legislativas, as tributações autónomas tinham e ainda têm alguma ligação com a dedutibilidade – e a efetiva dedução – das despesas tributadas. Esta circunstância, crê-se, é elucidativa da imbricação existente entre aquelas e o IRC (no caso), e justificativa não só da sua inclusão no CIRC, mas, igualmente, da sua integração, de pleno direito, como parte do regime jurídico do IRC.”
Considerando-se – como se considera - que as tributações autónomas integram o regime do IRC, importa, então, saber o que é dedutível à respetiva coleta. Ora, quanto a este aspeto, de novo se recorre às palavras utilizadas no Acórdão Arbitral proferido no processo 775-2015-T:
“Entendido que é serem as tributações autónomas (parte do) IRC, compreende-se que seja única a liquidação de IRC, incluindo a parte que provém das tributações autónomas.”
Há uma liquidação de IRC única que comporta duas partes: a liquidação das tributações autónomas e a do restante IRC, cada uma com matéria coletável determinada de modo próprio e com taxas de tributação próprias, mas ambas liquidadas nos termos do art.º 90.º do CIRC. Havendo uma liquidação única, conclui-se que a parte da coleta que provém das tributações autónomas é parte integrante da coleta de IRC.
Ao contrário, não se encontra em qualquer outro artigo do CIRC a referência à liquidação das tributações autónomas como processo distinto. Aceitar que não se inclui a coleta das tributações autónomas no art.º 90.º do CIRC, seria aceitar que existe uma lacuna na lei e, sendo esta uma lei fiscal, não permite a integração. E assim, a Autoridade Tributária e Aduaneira terá porventura errado, ao não permitir a dedução dos montantes relativos ao PEC que a Requerente tinha o direito de deduzir à coleta.
Aceitar que a liquidação das tributações autónomas está fora do art.º 90.º n.º 1 do CIRC e, portanto, afastar da sua coleta a dedutibilidade do SIFIDE prevista na alínea c) do n.º 2, seria obrigar o contribuinte a pagar um imposto cuja liquidação se não faz nos termos da lei, contrariando o n.º 3 do art.º 103.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e o princípio da legalidade tributária que a Lei Geral Tributária (LGT), no seu art.º 8º, n.º 2, alínea a), estabelece.
De onde se segue idêntica conclusão: a de que, não havendo norma sobre liquidação das tributações autónomas distinta daquela que regula a liquidação em geral do IRC, tem que se aceitar que a coleta de IRC a engloba, incluindo-se no artigo 90.º, n.º 1 do CIRC e sendo, portanto, dedutíveis, nomeadamente, os incentivos fiscais em causa no presente processo. No mesmo sentido aponta a inexistência de limites à dedutibilidade destas realidades à coleta resultante das tributações autónomas – o que o legislador poderia ter feito, tal como fez ao enunciar várias exceções e limites às regras da dedutibilidade do número 2 do artigo 90.º do CIRC.
Quanto à alteração introduzida pela Lei que aprovou o Orçamento de Estado para 2016 (Lei 7-A/2016, de 30 de Março), em concreto no que respeita à introdução do n.º 21 do artigo 88º do CIRC: foram aditados por esta Lei vários números ao artigo 88.º do CIRC, que se refere às tributações autónomas, entre eles o número 21, segundo o qual “A liquidação das tributações autónomas em IRC é efetuada nos termos previstos no artigo 89.º e tem por base os valores e as taxas que resultem do disposto nos números anteriores, não sendo efetuadas quaisquer deduções ao montante global apurado.” No artigo 135.º dispõe o legislador que “a redação dada pela presente lei ao n.º 6 do artigo 51.º, ao n.º 15 do artigo 83.º, ao n.º 1 do artigo 84.º, aos números 20 e 21 do artigo 88.º e ao n.º 8 do artigo 117.º do Código do IRC tem natureza interpretativa.”
O artigo 90.º não foi alterado, continuando a referir-se à coleta de IRC e, por tudo o que atrás se deixa dito, a coleta que resulta da aplicação das normas do artigo 88.º é coleta de IRC. O que o número 21 do artigo 88.º passou a proibir é que, a esta coleta, se efetuassem quaisquer deduções até ao momento em que, apurada a coleta global de IRC, se efetuam as deduções do artigo 90.º. Quanto ao caráter interpretativo, entendeu o Tribunal Constitucional no acórdão n.º 267/2017, de 31-05-2017 que implica a sua inconstitucionalidade, por retroatividade prejudicial aos contribuintes. No presente caso, estando em causa os períodos de tributação correspondentes aos anos de 2014 e 2015, a alteração introduzida pela Lei do Orçamento do Estado para 2016 não tem, assim, qualquer efeito.
Por fim, recentemente, através da Lei n.º 114/2017, de 29 de Dezembro, o legislador veio reconhecer expressa e inequivocamente, com explícita intenção interpretativa declarada no seu artigo 233.º (constitucionalmente admissível na medida em que não for desfavorável aos contribuintes), que existem normas especiais de que resulta que deveriam ser feitas deduções ao montante apurado com as tributações autónomas. Isto mesmo resulta da nova redação ao n.º 21 do artigo 88.º do CIRC:
“21. A liquidação das tributações autónomas em IRC é efetuada nos termos previstos no artigo 89.º e tem por base os valores e as taxas que resultem do disposto nos números anteriores, não sendo efetuadas quaisquer deduções ao montante global apurado, ainda que essas deduções resultem de legislação especial.”
Assim, se é certo que esta norma esclarece que é intenção legislativa que não sejam feitas deduções ao montante global apurado com as tributações autónomas, também dela decorre que resultava de legislação especial que essas deduções fossem feitas, sendo esse, precisamente, o caso das normas que preveem benefícios fiscais por dedução à coleta de IRC.
Ora, se dessas normas especiais resultava que fossem feitas deduções ao montante global apurado das tributações autónomas, é manifesto que não é compaginável com o princípio constitucional da proibição da retroatividade das normas que criem impostos (artigo 103.º, n.º 3, da CRP) o afastamento desse resultado por uma lei posterior a todos os que, ao abrigo dessas leis especiais em que confiaram, criaram as condições para obter as deduções anunciadas legislativamente como resultado para os seus investimentos.
Por estes motivos, julgaria procedente o pedido de declaração de ilegalidade das autoliquidações em causa, bem como do indeferimento da reclamação graciosa.
Lisboa, 02 de julho de 2018
Raquel Franco
[1] À qual correspondia a al. b) do n.º 2 na redacção que vigorou de 2010 a 31.12.2013; e até 01.01.2010 a al. d), do n.º 2 do art.º 83.º do CIRC.
[2] Estes últimos Diplomas legais aplicáveis ao nosso processo ex vi art.º 29.º, n.º 1 do RJAT (e assim sempre que para eles se remeter na presente Decisão).
[3] Este último Diploma igualmente aplicável ex vi art.º 29.º, n.º 1 do RJAT (e assim sempre que para o mesmo se remeter na presente Decisão).
[4] Anteriormente n.º 1 do art.º 83.º.
[5] E não há, contrariamente ao que invoca a Requerente, uma jurisprudência arbitral pacífica ou esmagadoramente maioritária num ou no outro sentido (seja de que TAs são ou não IRC, seja de que as Deduções do n.º 2 do art.º 90.º são ou não abatíveis aos montantes apurados a título de TAs em IRC).
[6] Ana Paula Dourado, “Direito Fiscal”, Almedina, 2015, p. 25.
[7] (a propósito em concreto da Codificação em Direito Fiscal).
[8] José Casalta Nabais, “Direito Fiscal”, Almedina, 2015, p. 204.
[9] Oliveira Ascenção, “O Direito: Introdução e Teoria Geral”, Coimbra 2001, cfr. citação feita pelo Autor por nós citado e que, propositadamente, assim não colocamos em itálico.
[10] J.L. Saldanha Sanches, “Manual de Direito Fiscal”, Coimbra Editora, 3.ª Ed., 2007, p. 147.
[11] Os sublinhados (e/ou negritos) aqui, como também sempre na citação de textos de Autores, são nossos.
[12] Manuel Andrade, “Sobre a recente evolução do direito privado português”, Bol. da Fac. de Direito de Coimbra, XXII (1946).
[13] Baptista Machado, “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, Almedina, 1999, p. 191.
[14] Saldanha Sanches, op. cit., p. 147.
[15] Jónatas E. M. Machado, Paulo Nogueira da Costa, “Manual de Direito Fiscal”, Almedina, 2016, p. 216
[16] Saldanha Sanches, op. cit., p. 141.
[17] v. art.º 11.º do CC – Normas excepcionais.
[18] Saldanha Sanches, op. cit., p. 135-136.
[19] Saldanha Sanches, op. cit., p. 150-152.
[20] José Casalta Nabais, op. cit., p. 143.
[21] D.L. n.º 192/90, de 9 de Junho.
[22] Cfr, art.º 4.º do D.L. n.º 192/90.
[23] Com a LOE1995 – Lei n.º 3-B/94, de 27 de Dezembro, art.º 29.º.
[24] Com a LOE1999 – Lei n.º 87-B/98, de 31 de Dezembro, art.º 31.º.
[25] Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro.
[26] Rui Duarte Morais, “Sobre o IRS”, 3.ª Ed., Almedina, 2016, p. 171.
[27] Saldanha Sanches, op. cit., p. 406-408.
[28] Guilherme Waldemar d' Oliveira Martins, “A Despesa Fiscal e o Orçamento do Estado no Ordenamento Jurídico Português”, Almedina, 2004, p. 132.
[29] Jónatas E. M. Machado, Paulo Nogueira da Costa, op. cit., p. 465 e ss.
[30] Sempre que nos referirmos a Código, ou a artigos, sem indicação do respectivo Diploma Legal, referimo-nos ao CIRC.
[31] Ou taxas (quanto às PMEs v. art.º 87.º, n.º 2 do CIRC).
[32] Casalta Nabais, op. cit., p. 541.
[33] V. supra, factos provados, al. s) e ss.
[34] O que não condiciona o âmbito admissível de fundamentação do Pedido nos presentes autos. A este respeito pode ver-se, entre outros e com as devidas adaptações, o Acórdão do Pleno do STA de 06/03/2015, no proc.º 0793/14.
[35] Segundo Baptista Machado, op. cit., p. 182, “(...) quando se fala em “interpretação literal” quer-se apenas referir aquela modalidade de interpretação muito cingida ao texto e que extrai das palavras deste o sentido que elas mais naturalmente comportam, fazendo porventura descaso doutros elementos interpretativos.”
[36] V. nosso Enquadramento, ponto (ii).
[37] V. art.º 9.º, n.º 2 do CC.
[38] Quanto à não possibilidade de dedução dos PECs à colecta resultante das taxas de TAs teve a relatora oportunidade de sumariar o respectivo entendimento em Declaração de Voto no Proc.º 384/2017-T (disponível em www.caad.org.pt).
[39] O SIFIDE (Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial) foi criado pela Lei n.º 40/2005, de 3 de Agosto. Depois foi sendo alvo de sucessivas alterações legislativas e consta hoje do Código Fiscal do Investimento - “CFI” - (na sua actual versão, cfr. DL n.º 162/2014, de 31 de Outubro), art.º 35.º e ss., com a denominação de SIFIDE II e destinado a vigorar nos períodos de tributação de 2014 a 2020.
[40] E em conjugação com o art.º 6.º, n.º 2 do mesmo Diploma.
[41] O RFAI (Regime Fiscal de Apoio ao Investimento) foi criado pela Lei n.º 10/2009, de 10 de Março. Actualmente consta do CFI, art.º 22.º e ss.
[42] O CFEI (Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento) foi criado pela Lei n.º 49/2013, de 16 de Julho.
[43] Eventualmente acrescido esse montante pela Derrama municipal.
[45] Cfr. art.º 14.º da Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro (Lei que revogou o art.º 45.º).
[46] Trata-se da Decisão Arbitral no Proc. n.º 769/2014-T.
[47] Em vigor até 31.12.2013.
[48] O que fez, então, pela Lei n.º 2/2014, de 1 de Jan. de 2014 – LOE2014 - com o aditamento do art.º 23.º-A.
[49] Acórdão do TC n.º 310/2012, de 20 de Junho.
[50] Como refere Rui Duarte Morais, op. cit. “Sobre o IRS”, p. 171.
[51] V. nosso Enquadramento, ponto (v).
[52] Como já decorreria, em rigor, do princípio da tributação do rendimento real.
[53] Mais, se houver prejuízo as taxas de TA ainda agravam (cfr. art.º 88.º, n.º 14).
[54] V. supra o nosso Enquadramento, ponto (vii)
[55] Na numeração até 31.12.2009.
[56] Rui Duarte Morais, “Apontamentos ao Imposto Sobre o rendimento das Pessoas Colectivas”, Almedina, 2009, p. 136-137
[57] Redacção a que foi dada, como o Autor citado refere, natureza interpretativa, o que lhe conferiu efeitos “retroactivos” (é o Autor citado que, discordando, coloca as aspas).
[58] Rui Duarte Morais, “Sobre o IRS”, op. cit., p. 171.
[59] que delimita a base do imposto.
[60] A matéria colectável da sociedade é imputada aos sócios no seu rendimento tributável.
[61] Que deverão ser “quantificadas no campo 365” - v. instruções de preenchimento da Modelo 22.
[62] Cujos rendimentos gerados são, na respectiva esfera, “transparentes” para efeitos de IRC.
[63] Até 1 de Janeiro de 2014, portanto.
[64] Rui Duarte Morais, “Apontamentos ao IRC”, op. cit., p. 56.
[65] E nestes mesmos moldes desde que o legislador introduziu as TAs no CIRC em 2000.
[66] V. nosso Enquadramento, ponto (vii).
[67] E sendo feito o acerto de contas (para efeitos do total a pagar/total a recuperar) caso haja IRC a recuperar, reduzindo na respectiva proporção o montante a recuperar. Como sucedeu no caso dos autos.
[68] Ou do 378, caso acresça derrama estadual.
[69] Embora não bem assim na Declaração a apresentar pela sociedade dominante relativa ao Grupo Fiscal, note-se.
[70] V. nosso Enquadramento supra, ponto (ii).
[71] A Colecta ou a Colecta Total na Modelo 22.
[72] V. Baptista Machado, op. cit., p. 186.
[73] V. nosso Enquadramento supra, ponto (ii).
[74] V. Baptista Machado, op. cit., p. 185.
[75] Em vigor, pois, desde 1 de Janeiro de 2018.
[76] Disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos
[77] V. nosso Enquadramento, ponto (vii)
[78] V. nosso Enquadramento, ponto (vi)
[79] V. nosso Enquadramento, ponto (ii e vii)
[80] V. nosso Enquadramento supra, ponto (ii), parte final.
[81] V. quanto ao RFAI o art.º 22.º, n.º 2, al. a) do CFI e quanto ao CFEI o art.º 4.º, n.º 5 da Lei n.º 49/2013, de 16 de Julho.
[82] V. nosso Enquadramento, (v)
[83] V. nosso Enquadramento, (vii)
[84] Para além de que ficaria na liberdade dos SPs – se assim se admitisse – recorrendo livremente a mais ou menos despesas destas, controlar de alguma forma a utilização do crédito de imposto no tempo. Crédito de imposto que, no caso do SIFIDE é utilizável, como vimos, até à concorrência da colecta.
[85] Pelo art.º 233.º da Lei n.º 114/2017, de 29 de Dezembro, a que foi atribuída natureza interpretativa.
[86] A nova redacção do art.º 88.º, n.º 21 em vigor desde 1 de Janeiro de 2018 é a seguinte: “21. A liquidação das tributações autónomas em IRC é efectuada nos termos previstos no art.º 89.º e tem por base os valores e as taxas que resultem do disposto nos números anteriores, não sendo efectuadas quaisquer deduções ao montante global apurado, ainda que essas deduções resultem de legislação especial.” - sendo que o aditamento feito pela LOE 2018 é o que ora sublinhamos.
[87] V. supra nosso Enquadramento, (ii), parte final.
[88] V. art.º 9.º, n.º 3 do CC; V. supra nosso Enquadramento, (ii).
[89] Conselheiro Lino José Batista Rodrigues Ribeiro
[90] O Acórdão versa sobre a natureza interpretativa ou não do art.º 135.º da LOE 2016 (concluindo-se - a nosso ver, e com todo o devido respeito, erradamente - pela sua natureza inovadora).
[91] V. nosso Enquadramento supra, ponto (ii)