DECISÃO ARBITRAL
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Relatório
A - Geral
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A…, sociedade em nome coletivo, pessoa coletiva e contribuinte fiscal n.º…, com sede na Rua …, n.º…, …–…, …-… ... (de ora em diante designada “Requerente”), apresentou no dia 01.09.2017 um pedido de constituição de tribunal arbitral em matéria tributária, que foi aceite, visando, por um lado, em termos imediatos, a anulação da decisão de indeferimento parcial do Recurso Hierárquico n.º …2016…, relativo ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (de ora em diante “IRC”) de 2013, e, mediatamente, a anulação do ato de liquidação adicional de IRC e juros compensatórios, com o n.º 2016…, relativo a 2013, na parte em que reflete correções à matéria coletável de IRC do exercício de 2013, tal como promovidas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, com o consequente reembolso das quantias indevidamente pagas e, por outro, a condenação da Administração Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios por pagamento indevido de prestação tributária.
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Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do art.º 6.º e da alínea b) do n.º 1 do art.º 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, na redação que lhe foi dada pelo art.º 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro (o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, de ora em diante “RJAT”), o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) designou os signatários como árbitros, não tendo as Partes, depois de devidamente notificadas, manifestado oposição a essa designação.
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Por despacho de 27.09.2017, a Autoridade Tributária e Aduaneira (de ora em diante designada “Requerida”) procedeu à designação das Senhoras Dra. B… e Dra. C… para intervirem no presente processo arbitral, em nome e representação da Requerida.
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Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do art.º 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído a 28.11.2017.
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No dia 04.12.2017 foi notificada a Senhora Diretora Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta, juntar cópia do processo administrativo e, querendo, requerer produção de prova adicional.
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No dia 19.01.2018 a Requerida apresentou a sua Resposta e, no dia 23.01.2018, o Processo Administrativo.
B – Posição da Requerente
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A Requerente dedica-se ao comércio de produtos alimentares e de consumo.
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A Requerente foi alvo de procedimento de inspeção tributária ao abrigo da ordem de serviço externa n.º OI2015…, o qual incidiu sobre o período de tributação de 2013.
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A 07.09.2015 a Requerente foi notificada do relatório de inspeção tributária, de que resultaram correções de natureza aritmética à matéria colectável relativa ao exercício de 2013 no montante total de € 512.630,93 (quinhentos e doze mil seiscentos e trinta euros e noventa e três cêntimos).
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As ditas correções respeitam a dois blocos de situações:
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Erro no cálculo das mais-valias fiscais relativas a 29 veículos ligeiros de passageiros ou mistos que integravam o seu ativo fixo tangível, por ter sido deduzido ao valor de aquisição o montante das depreciações consideradas para efeitos fiscais e não o montante das depreciações praticadas (na contabilidade) – no montante de € 230.431,34 (duzentos e trinta mil quatrocentos e trinta e um euros e trinta e quatro cêntimos); e
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Dedução alegadamente indevida a título de benefício fiscal resultante da criação líquida de postos de trabalho (de ora em diante “CLPT”) por violação dos pressupostos exigidos pelo artigo 19.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (de ora em diante “EBF”), que ascende, globalmente a € 282.199,59 (duzentos e oitenta e dois mil cento e noventa e nove euros e cinquenta e nove cêntimos), referente a três situações distintas:
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Ajustamento desfavorável referente a trabalhadores contratados em regime de trabalho a tempo parcial – no valor de € 119.929,64 (cento e dezanove mil novecentos e vinte e nove euros e sessenta e quatro cêntimos);
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Correção desfavorável em virtude do suposto incumprimento dos pressupostos do benefício relativo à CLPT ocorrida em 2010 mas com efeitos em 2013 – no montante de € 13.580,00 (treze mil quinhentos e oitenta euros); e, por último
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Correção desfavorável em virtude do suposto incumprimento dos pressupostos do benefício relativo à CLPT ocorrida em 2012, detetada em inspeção anterior, mas com efeitos em 2013 – no valor de € 148.689,95 (cento e quarenta e oito mil seiscentos e oitenta e nove euros e noventa e cinco cêntimos).
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A 28.01.2016, a Requerente apresentou Reclamação Graciosa da liquidação adicional de IRC de 2013 n.º 2015… e peticionou a sua anulação parcial, por ilegalidade, relativamente a € 230.431,34 respeitante ao apuramento das mais e menos-valias obtidas com a venda de 29 viaturas ligeiras e a € 275.409,59 relativo ao benefício da CLPT, por ter aceite que uma trabalhadora fosse desconsiderada.
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A Reclamação Graciosa foi indeferida pela Unidade dos Grandes Contribuintes.
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Do indeferimento da Reclamação Graciosa apresentou a Requerente recurso hierárquico.
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Na decisão do recurso hierárquico, de indeferimento parcial, entendeu a Requerida manter o ato em matéria tributária sob recurso.
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A Requerente entende que houve preterição de formalidades legais essenciais, a saber: (i) a não suspensão do procedimento do Recurso Hierárquico n.º …2016… e (ii) não ter sido dada a possibilidade à Requerente de exercer o direito de audição no âmbito desse mesmo Recurso Hierárquico.
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A controvérsia em torno do montante do benefício fiscal da CLPT no exercício de 2013 está diretamente relacionada com o litígio relativo ao número de postos de trabalho criados em 2012, também ele objeto de apreciação arbitral. Assim, até ao trânsito em julgado dessa decisão arbitral, atinente ao exercício de 2012, deveria ter sido determinada a suspensão do procedimento de Recurso Hierárquico n.º …2016…, uma vez que a questão apreciada nessoutro processo arbitral – o número de postos de trabalho criados em 2012 – se assume como questão prejudicial.
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A Requerida não poderia ter dispensado o exercício do direito de audição no âmbito do procedimento de Recurso Hierárquico n.º …2016… (IRC de 2013), muito menos com base no teor de instruções administrativas, em concreto, da Circular n.º 13/99, de 8 de julho, da Direção de Serviços de Justiça Tributária. Teria sido possível à Requerente, nessa sede, para além de contestar os fundamentos subjacentes à decisão de indeferimento parcial do aludido Recurso Hierárquico, levar ao conhecimento da Requerida a pendência de um litígio arbitral que deveria impor-lhe a sua suspensão.
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No que respeita ao cálculo das mais-valias fiscais relativas a 29 veículos ligeiros de passageiros ou mistos que integravam o seu ativo fixo tangível, entende a Requerente que deve ser deduzido ao valor de aquisição o montante das depreciações consideradas para efeitos fiscais e não o montante das depreciações praticadas, como pretende a Requerida, porquanto, à data dos factos, o n.º 2 do art.º 46.º do Código do IRC (de ora em diante “CIRC”) contava com a seguinte redação: “as mais-valias e as menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das perdas por imparidade e outras correcções de valor previstas no artigo 35.º, bem como das depreciações ou amortizações aceites fiscalmente, sem prejuízo da parte final do n.º 5 do artigo 30.º”. O entendimento da Requerente foi sufragado pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, em sentença datada de 4 de abril de 2017, no processo de impugnação judicial n.º …/16…BESNT que decidiu um litígio entre as mesmas Partes.
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Deve, assim, ser determinada a anulação da correção à matéria coletável do exercício de 2013, no montante de € 230.431,34, bem como a restituição do imposto indevidamente pago, no montante de € 72.240,23, e respetivos juros compensatórios.
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Quanto às correções correspondentes à CLPT, a Requerente reclama, para o exercício de 2013, um benefício fiscal de € 877.435,30, tendo a Requerida efetuado uma correção ao montante considerado pela Requerente de € 282.199,59, cuja dedução teve por indevida. Já em sede de Recurso Hierárquico, veio a Requerida aceitar a criação de cinco postos de trabalho (ao invés de nenhum, como tinha anteriormente sustentado), reconhecendo, portanto, que “o valor da dedução ao resultado líquido para efeitos de apuramento do lucro tributável do período de tributação de 2013 a título de benefício fiscal pela majoração à criação de emprego ocorrida no período de tributação de 2012 ascende a € 33.385,85”.
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As correções correspondentes à CLPT, como se viu em 1.10. ii) devem-se a três situações distintas.
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Uma diz respeito à CLPT ocorrida em 2010 mas com efeitos em 2013. A questão respeita a um trabalhador que a Requerida veio a reconhecer não constava da listagem de funcionários não elegíveis, mas sem associar à respetiva elegibilidade os efeitos da majoração, bastando-se com a indicação de que no cálculo do benefício fiscal de 2010 efetuado pelos Serviços de Inspeção Tributária o dito trabalhador foi “desconsiderado”, considerando a Requerente que a única fundamentação relevante é a do ato notificado (e não a que está vertida em atos anteriores), encerrando esta uma contradição nos próprios termos, omitindo as razões pelas quais o trabalhador em apreço, sendo considerado “elegível” é simultaneamente dado como “não majorável”.
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Assim, deve ser determinada a anulação da correção à matéria coletável do exercício de 2013, no montante de € 6.790,00, bem como a restituição do imposto indevidamente pago, no montante de € 2.128,67 e respetivos juros compensatórios.
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Outra situação respeita aos trabalhadores contratados em regime de trabalho a tempo parcial. A Requerida entende que o montante máximo da majoração anual por posto de trabalho deve sofrer um ajustamento proporcional sempre que se tratar de um contrato de trabalho em regime de tempo parcial, o que não tem qualquer suporte na letra e no espírito da lei.
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Assim, deve ser determinada a anulação da correção à matéria coletável do exercício de 2013, no montante de € 119.929,64, bem como a restituição do imposto indevidamente pago, no montante de € 37.597,94 e respetivos juros compensatórios.
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A última situação refere-se ao suposto incumprimento dos pressupostos do benefício relativo à CLPT ocorrida em 2012, mas com efeitos em 2013. Naquele ano, entende a Requerente terem sido criados 52 postos de trabalho, enquanto a Requerida reconhece apenas a criação de 5, não havendo dissenso relativamente ao número de entradas de trabalhadores: 226. Não há acordo, porém, quanto ao número de saídas: 221 no parecer da Requerida e 174 no da Requerente, desacordo que foi objecto de pedido de pronúncia arbitral, razão por que a Requerida deveria ter determinado a suspensão do procedimento do Recurso Hierárquico n.º …2016… .
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Ainda assim, em sede de Recurso Hierárquico, a Requerida dispunha de todos os elementos para verificar que os trabalhadores qualificados como “saídas elegíveis” não o poderiam ter sido, uma vez que aqueles trabalhadores possuíam, efetivamente, um vínculo laboral a termo e um dos trabalhadores, então com 19 anos, ao contrário do sustentado pela Requerida, não tinha concluído o ensino secundário, pelo que não pode ser integrado na lista das “saídas elegíveis”.
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Assim, deve ser determinada a anulação da correção à matéria coletável do exercício de 2013, no montante de € 148.689,95, bem como a restituição do imposto indevidamente pago, no montante de € 74.241,71 e respetivos juros compensatórios.
C – Posição da Requerida
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A Requerida sustenta que não podia suspender-se o procedimento do Recurso Hierárquico n.º …2016… (IRC 2013), porque, em matéria tributária, apenas será atribuído efeito suspensivo ao procedimento caso se verifiquem determinados pressupostos, que não se acham preenchidos, como seja, a título de exemplo, a prestação de garantia.
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Quanto à dispensa do exercício do direito de audição no âmbito do Recurso Hierárquico, do pedido de pronúncia arbitral resulta que esse exercício, a ser exercido, nada de novo acrescentaria ao que já havia sido dito aquando da interposição do Recurso Hierárquico, havendo uma legal previsão de dispensa da participação do contribuinte quando ele tenha sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais se não tenha pronunciado, o que não é de todo o caso.
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No que respeita ao cálculo das mais-valias e menos-valias deveriam ter sido consideradas as depreciações contabilísticas, efetivamente praticadas e não as aceites para efeitos fiscais. O n.º 2 do art.º 46.º do CIRC, na parte em que manda atender às “depreciações ou amortizações aceites fiscalmente” não dispensa a análise das instruções contidas no mapa 31, relativas ao apuramento das mais-valias e menos-valias fiscais [coluna (10), alínea d)], as quais referem, que no caso de viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, que não estejam afetas à exploração de serviço público de transportes nem se destinem a ser alugadas no exercício da atividade normal do sujeito passivo, relevam as depreciações efetivamente praticadas, em linha do entendimento consagrado pela Circular n.º 6/2011 da DSIRC.
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Neste aspecto, importa chamar a atenção para a circunstância de terem a al. e) do n.º 1 do art.º 34.º do CIRC, o n.º 1 do art.º 11.º do DR 25/2009, de 14/09 e a Portaria n.º 467/2010, de 07/07, estabelecido uma limitação ao valor fiscalmente depreciável das viaturas ligeiras de passageiros ou mistas (€ 29.928,87 nos períodos anteriores a 2010, € 40.000,00 no período de 2010, € 30.000,00 no período de 2011 e € 25.000,00 nos períodos de 2012 e 2013), pelo que as depreciações calculadas acima dos ditos limites, não concorrem para a determinação do resultado tributável. Se é assim, não faz sentido admitir que, na alienação do bem, se anule aquele escopo normativo, utilizando no cálculo das mais-valias e menos-valias fiscais as depreciações fiscalmente aceites ao invés das praticadas. Para ir ao encontro do objetivo que se depreende da lei, para esse cálculo há-de relevar o custo efetivo de aquisição (e não o valor limite) e o montante das depreciações praticadas na contabilidade (e não o respetivo valor máximo, reconhecido para efeitos fiscais).
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Relativamente à CLPT ocorrida em 2010 mas com efeitos em 2013, a Requerida remete para o Anexo VIII do Relatório de Inspecção de 2010, onde se pode ler que aquele trabalhador foi desconsiderado para efeitos de determinação do benefício fiscal em apreço, fazendo ainda notar que que o dito trabalhador também não passou a ser incluído quando no âmbito de procedimento de reclamação graciosa anterior, razão por que será de manter a decisão então proferida.
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Quanto ao ajustamento relativo a trabalhadores contratados em regime de trabalho a tempo parcial, o nº 3 do art.º 19.º do EBF estabelece que o montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é o correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida, que, nos termos da lei, tem como pressuposto o trabalho a tempo inteiro, que na data que releva para os autos, era de 40 horas semanais. Assim, no que se refere ao apuramento do benefício fiscal, tem de se proceder a um ajustamento, criando uma proporcionalidade entre o benefício total/contrato de trabalho a tempo inteiro e o do benefício “parcial”/contrato de trabalho a tempo parcial. Na verdade, o não ajustamento do montante da retribuição mínima mensal garantida para efeitos do n.º 3 do art.º 19.º do EBF, redundaria num enviesamento do montante do benefício em favor da contratação de trabalhadores a tempo parcial em detrimento da contratação de trabalhadores a tempo completo, o que não pode ter sido o objetivo do legislador.
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No que concerne ao incumprimento dos pressupostos do benefício relativo à CLPT ocorrida em 2012, mas com efeitos em 2013, a Requerida louva-se no resultado da ação inspetiva efetuada ao período de 2012 e entende dever manter-se o ato recorrido.
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Porque o acto recorrido não enferma de nenhum vício, deve ele ser mantido na ordem jurídica, não havendo, consequentemente, lugar ao pagamento de juros.
D – Conclusão do Relatório e Saneamento
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Por despacho do Presidente do Tribunal Arbitral de 27.01.2018, dispensou-se, por desnecessária, a reunião prevista no art.º 18.º do RJAT, oferecendo-se prazo simultâneo de 15 (quinze) para apresentação de alegações escritas, fixando-se o dia 26.4.2018 como data limite para a prolação e notificação da decisão final.
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As Partes apresentaram as suas alegações no dia 16.02.2018, as quais reforçam as posições assumidas por cada uma delas nos articulados apresentados.
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O Tribunal Arbitral é materialmente competente, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, al. a) do RJAT.
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As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade nos termos do art.º 4.º e do n.º 2 do art.º 10.º do RJAT e do art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
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A cumulação de pedidos efectuada no presente pedido de pronúncia arbitral, em homenagem ao princípio da economia processual, justifica-se porquanto o art.º 3.º do RJAT, ao admitir expressamente a possibilidade de “cumulação de pedidos ainda que relativos a diferentes actos”, quando a procedência dos pedidos dependa essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito, acomoda igualmente, sem abuso hermenêutico, a apreciação de um pedido que decorre, em termos necessários, do juízo que o Tribunal Arbitral sufrague quanto à validade da liquidação posta em crise.
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O processo não padece de qualquer nulidade.
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Matéria de facto
2.1. Factos provados
Relevantes para a apreciação do mérito da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
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A Requerente dedica-se ao comércio de produtos alimentares e de consumo (consenso das Partes).
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A Requerente foi alvo de procedimento de inspeção tributária ao abrigo da ordem de serviço externa n.º OI2015…, o qual incidiu sobre o período de tributação de 2013 (consenso das Partes).
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Por ofício de 07.08.2015 a Requerente foi notificada para exercer o seu direito de audição sobre o projeto de correções resultante da análise externa de inspeção tributária referente ao exercício de 2013 (Processo Administrativo I, pág. 62).
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A Requerente exerceu o seu direito de audição por escrito, que deu entrada nos serviços da Requerida a 24.08.2015 e manifestou não pretender contestar a proposta de relatório que lhe foi notificado (Processo Administrativo I, págs. 62-63).
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A 07.09.2015 a Requerente foi notificada do relatório de inspeção tributária (que consta integralmente do Processo Administrativo junto aos autos), de que resultaram correções de natureza aritmética à matéria colectável relativa ao exercício de 2013 no montante total de € 512.630,93 (quinhentos e doze mil seiscentos e trinta euros e noventa e três cêntimos) (consenso das Partes).
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As ditas correções respeitam a dois blocos de situações: (i) erro no cálculo das mais-valias fiscais relativas a 29 veículos ligeiros de passageiros ou mistos que integravam o ativo fixo tangível da Requerente e alienados em 2013, no montante de € 230.431,34 (duzentos e trinta mil quatrocentos e trinta e um euros e trinta e quatro cêntimos); e (ii) dedução indevida a título de benefício fiscal resultante da CLPT por violação dos pressupostos exigidos pelo artigo 19.º do EBF, no valor global de € 282.199,59 (duzentos e oitenta e dois mil cento e noventa e nove euros e cinquenta e nove cêntimos) (consenso das Partes).
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No exercício de 2013, a Requerente alienou 29 veículos ligeiros de passageiros ou mistos que integravam o seu ativo fixo tangível (consenso das Partes)
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Os veículos ligeiros de passageiros ou mistos que integravam o ativo fixo tangível da Requerente e alineados em 2013 são os que constam da folha 37 do Anexo 1 do relatório de inspeção relativo ao IRC 2013 (Processo Administrativo I – pág. 99).
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A Requerente, no cálculo das mais-valias e menos-valias, deduziu ao custo de aquisição dos veículos ligeiros de passageiros ou mistos que integravam o seu ativo fixo tangível alienados em 2013 o montante das depreciações consideradas para efeitos fiscais, tendo apurado uma menos-valia de € 21.455,72 (vinte e um mil quatrocentos e cinquenta e cinco euros e setenta e dois cêntimos) (consenso das Partes).
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Caso a Requerente tivesse, no cálculo das mais-valias e menos-valias, deduzido ao custo de aquisição dos veículos ligeiros de passageiros ou mistos que integravam o seu ativo fixo tangível alienados em 2013 o montante das depreciações contabilisticamente praticadas teria apurado uma mais-valia de € 208.975,62 (consenso das Partes).
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A correção à matéria coletável respeitante às mais-valias fiscais relativas a 29 veículos ligeiros de passageiros ou mistos que integravam o ativo fixo tangível da Requerente e alienados em 2013, implicou que a Requerente pagasse, a título de imposto, o montante de € 72.240,23 (art.º 142.º do pedido de pronúncia arbitral).
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A Requerida entendeu que existiam 2 trabalhadores (D… e E…) que, por terem sido considerados inelegíveis no âmbito da ação inspetiva ao período de 2010, não poderiam ser considerados para efeitos da CLPT no exercício de 2012 (consenso das Partes).
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A Requerente aceitou a inelegibilidade da trabalhadora D… (art.º 29.º do pedido de pronúncia arbitral).
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No que se refere ao trabalhador E… a, a Requerida considera-o “elegível”, mas dá-o como “não majorável” (págs. 20 e 21 do doc. 1, junto aos autos com o pedido de pronúncia arbitral).
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O ajustamento aos benefícios decorrente da desconsideração do trabalhador E…, implicou que a Requerente pagasse, a título de imposto, o montante de € 2.128,67 (art.º 165.º do pedido de pronúncia arbitral).
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A Requerida corrigiu o montante do benefício fiscal da CLPT, do exercício de 2013, referente a trabalhadores contratados em regime de trabalho a tempo parcial, procedendo a um ajustamento, estabelecendo uma proporcionalidade entre o benefício total/contrato de trabalho a tempo inteiro e o do benefício “parcial”/contrato de trabalho a tempo parcial (págs. 21 a 24 do doc. 1, junto aos autos com o pedido de pronúncia arbitral e art.º 52.º da Resposta).
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A correção do montante dos benefícios decorrente do ajustamento proporcional entre o benefício total/contrato de trabalho a tempo inteiro e o do benefício “parcial”/contrato de trabalho a tempo parcial, implicou que a Requerente pagasse, a título de imposto, o montante de € 37.597,94 (art.º 186.º do pedido de pronúncia arbitral).
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A Requerida promoveu a correcção do montante do benefício relativo à CLPT, por suposto incumprimento dos pressupostos do benefício relativo à CLPT ocorrida em 2012, detetada em inspeção anterior, mas com efeitos em 2013 (consenso das Partes)
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A Requerente suscitou a intervenção de um tribunal arbitral para dirimir o conflito referido em 2.1.16., o que deu origem ao Processo n.º 68/2017-T, que correu termos no CAAD (e não o 174/2017-T, como por lapso refere a Requerente no pedido de pronúncia arbitral).
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A correção referida em 2.1.16., implicou que a Requerente pagasse, a título de imposto, o montante de € 74.241,71 (art.º 231.º do pedido de pronúncia arbitral).
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A 14.09.2015 foi emitida pela Requerida a liquidação n.º 2015… referente ao período 2013, com correções à matéria coletável e à coleta, juros compensatórios e juros de mora, resultando no valor a pagar de 229.838,85.
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A Requerida emitiu a demonstração de acerto de contas relativa à liquidação n.º 2015…, onde apurou o valor a pagar de € 153.737,21, tendo o dia 13.11.2015 como data limite de pagamento (Processo Administrativo I, pág. 44).
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A Requerente procedeu ao pagamento do valor exigido, no montante de € 153.737,21 a 30.11.2015 (Processo Administrativo I, pág. 44).
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No dia 28.01.2016, a Requerente apresentou Reclamação Graciosa da liquidação adicional de IRC de 2013 n.º 2015… e peticionou a sua anulação parcial, por ilegalidade, relativamente a € 230.431,34 respeitante ao apuramento das mais e menos-valias obtidas com a venda de 29 viaturas ligeiras e a € 275.409,59 relativo ao benefício da CLPT (Processo Administrativo I, págs. 7-186).
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A 24.02.2016, no âmbito da Reclamação Graciosa referida em 2.1.24, foi determinada a notificação da Requerente para exercer o seu direito de audição prévia relativamente ao projeto de decisão (Processo Administrativo I, pág. 187)
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A Reclamação Graciosa mencionada em 2.1.24. foi indeferida por despacho de 17.03.2016, que foi notificado à Requerente por ofício de 18.03.2016 (Processo Administrativo II, pág. 224).
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A 19.04.2016 a Requerente interpôs recurso hierárquico contra o indeferimento da reclamação graciosa que havia apresentado (Processo Administrativo II, págs. 232 e segs.).
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Na decisão do recurso hierárquico foi determinada a 26.04.2016 a não revogação do ato recorrido, o que foi notificado à Requerente por ofício de 26.05.2017 (Processo Administrativo II, págs. 444 e segs.).
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Na decisão do recurso hierárquico fez-se referência à dispensa de audição da Requerente por ter esse direito já sido exercido quanto aos mesmos factos (Processo Administrativo II, pág. 485).
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Em 2012, registaram-se 226 entradas elegíveis (consenso das Partes).
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A Requerida aceita terem sido registadas, em 2012, 221 saídas elegíveis.
2.2. Factos não provados
Não está demonstrada a razão pela qual o trabalhador E..., sendo considerado pela Requerente como elegível, deve ser tido para efeitos legais como “não majorável”. Não há outros factos relevantes para a apreciação do mérito da causa que tenham sido dados como não provados.
2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos aos autos pelas Partes e nas posições por elas assumidas nos articulados que apresentaram.
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Matéria de direito
3.1. Questões a decidir
Resulta do que acima se deixou dito que, no fundo, são estas as questões a apreciar:
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A de saber se houve preterição de formalidades legais essenciais:
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Por não ter sido determinada a suspensão do procedimento do Recurso Hierárquico n.º …2016…; e
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Por não ter sido dada a possibilidade à Requerente de exercer o direito de audição no âmbito desse mesmo Recurso Hierárquico.
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A de esclarecer se a Requerente, no cálculo das mais-valias fiscais relativas à alienação em 2013 dos 29 veículos ligeiros de passageiros ou mistos que integravam o seu ativo fixo tangível podia ter deduzido ao valor de aquisição o montante das depreciações consideradas para efeitos fiscais e não o montante das depreciações praticadas (na contabilidade).
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A de determinar se o trabalhador E... deve relevar para efeitos da CLPT ocorrida em 2010 mas com efeitos em 2013.
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A de dilucidar se o montante máximo da majoração anual por posto de trabalho deve sofrer um ajustamento proporcional quando se trate de um contrato de trabalho em regime de tempo parcial.
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A de apurar se foram incumpridos os pressupostos do benefício relativo à CLPT ocorrida em 2012, mas com efeitos em 2013.
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Por último, a de esclarecer se, caso se julgue procedente, ainda que parcialmente, o pedido de declaração de ilegalidade e consequente anulação da liquidação ora posta em crise, a Requerente, no âmbito do presente processo arbitral, poderá obter a condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios.
3.2. Da preterição de formalidades essenciais
A Requerente sustenta em 65.º do seu requerimento inicial que a Requerida deveria ter determinado a suspensão do recurso hierárquico. Fá-lo nos seguintes termos:
Ora, sabendo a AT que (i) a questão do número de postos de trabalho criados em 2012 era crucial para determinar o montante do benefício fiscal da CLPT dedutível no período de 2013 e que (ii) a mesma fora objeto de impugnação pela Requerente para o tribunal arbitral tributário, deveria ter sido determinada a suspensão do procedimento de Recurso Hierárquico n.º …2016… até ao trânsito em julgado da decisão arbitral,
A Requerente não alega expressamente ter peticionado a suspensão do recurso hierárquico e no pedido que inscreveu no final do respetivo requerimento, no local da praxe, também não consta qualquer referência a essa pretensão. Depreende-se que entende que a questão é meramente jurídica e que deveria ter sido a Requerida, ex officio, a determinar essa suspensão.
Sobre o tema das questões prejudiciais, que devem suspender os processos de decisão da Administração, o artigo 38.º, n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo (“CPA”) regula nos seguintes termos:
1 - Se a decisão final depender da decisão de uma questão que tenha de constituir objeto de procedimento próprio ou específico ou que seja da competência de outro órgão administrativo ou dos tribunais, deve o órgão competente para a decisão final suspender o procedimento administrativo, com explicitação dos fundamentos, até que tenha havido pronúncia sobre a questão prejudicial, salvo se da não resolução imediata do assunto resultarem graves prejuízos para interesses públicos ou privados.
A norma citada estatui efetivamente no sentido de deverem ser suspensos os procedimentos administrativos em determinadas situações. Na previsão da mesma norma é possível identificar com clareza em que situações é que esse efeito deve acontecer e não parece haver dúvidas que se reconduzem a duas hipóteses: (i) que a questão prejudicial tenha de constituir objeto de procedimento próprio ou específico; (ii) que a questão prejudicial seja da competência de outro órgão administrativo ou dos tribunais.
Na tese da Requerente a questão que considera prejudicial é a determinação “do número de postos de trabalho criados em 2012”, pois não concordou com aquela que fora feita pelos Serviços de Inspeção Tributária e impugnou-a.
Ora, esta questão não tem de constituir objeto de procedimento próprio ou específico, pois é tratada através do procedimento comum de liquidação, de reclamação graciosa, de recurso hierárquico e impugnação judicial (ou arbitral)[1]. E também não é da competência de outro órgão da Administração ou dos Tribunais apreciá-la. É à Requerida que cabe fazer a determinação do número de postos de trabalho para efeitos de atribuição de benefícios fiscais, no exercício das suas competências (artigos 81.º e 82.º da LGT), sem prejuízo da possibilidade de impugnação das suas decisões nos Tribunais.
Não se vê que houvesse qualquer dever da Requerida de suspender o recurso hierárquico, pelo que improcede a alegação deste vício pela Requerente.
A Requerente insurge-se também pela falta da sua audiência pela Requerida antes da decisão, que lhe foi desfavorável, no recurso hierárquico que interpôs. Sustenta que “a AT não poderia ter dispensado o exercício do direito de audição no âmbito do procedimento de Recurso Hierárquico n.º …2016… (IRC de 2013)” por não lhe ter sido assegurada a sua participação na formação da sua decisão. Considera ainda que a dispensa da sua audição foi ilegal por se basear numa instrução administrativa, nomeadamente a Circular n.º 13/99 de 08/07/1999, da Direcção de Serviços de Justiça Tributária[2] (artigos 78.º a 97.º do pedido de pronúncia arbitral).
Por seu lado, a Requerida sustenta que “a Requerente foi convidada a pronunciar-se em sede de projecto de indeferimento de reclamação graciosa, não tendo exercido o dito direito” e que o direito de audição no recurso hierárquico podia ser afastado com base nesse evento (artigos 18.º a 26.º da Resposta). Acrescenta que a circular em causa se limita a refletir o regime legal estabelecido no artigo 60.º da LGT, em matéria de audição prévia.
Importa entender se a falta de audição da Requerente constitui neste caso concreto a violação de uma regra que imponha a anulação da decisão impugnada.
Como é sabido o direito de audição ou direito de audiência é consequência do direito de participação dos cidadãos nas decisões da Administração que lhes disserem respeito e tem dignidade constitucional, encontrando-se previsto no artigo 267.º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa (“CRP”). Esta norma da Lei Fundamental comete a lei especial a tarefa de assegurar o exercício desse direito. É nesta linha que a LGT, no seu artigo 60.º[3], consigna o princípio da participação e regula o modo da sua observância pela Administração e concretização através da audição do cidadão e as situações em que esta pode ser dispensada, por se encontrarem satisfeitas garantias suficientes de participação.
Em concreto, a norma do artigo 60.º, n.º 3 da LGT permite a dispensa de audição quando o contribuinte tenha já sido ouvido sobre os factos em apreciação. Note-se que embora esta norma pareça referir-se apenas à audição antes da liquidação, a Lei n.º 16-A/2002, de 31 de Maio, que introduziu esta redação no artigo 60.º da LGT, atribuiu-lhe expressamente carácter interpretativo (artigo 13º, n.º 2). Aliás, no sentido da possibilidade de excluir a audição do cidadão pela Administração que já tenha sido ouvido, pode ver-se a norma do artigo 124.º, n.º 1, al. e) do CPA, que consigna que o responsável pela direção do procedimento em causa pode não proceder à audição do interessado se este já se tiver pronunciado no procedimento sobre as questões que importem à decisão, devendo então indicar, na decisão final, as razões da não realização da audiência (n.º 2 do mesmo artigo).
Face à natureza interpretativa da norma citada, há que entender que sempre que as questões concretas sobre as quais a Administração decide sejam as mesmas, ela pode dispensar a audição do contribuinte. Neste sentido pode ver-se na doutrina Diogo Leite de Campos[4] e na jurisprudência o acórdão do STJ de 29.06.2011[5], em que, no que aqui interessa, se sumariou:
II - O que o legislador pretendeu acautelar foi a audição dos contribuintes em qualquer das fases do procedimento que culmina com a liquidação, não tendo o mesmo que exercer esse direito em cada uma das diferentes fases procedimentais, a não ser que se invoquem factos novos sobre os quais o mesmo se não tenha pronunciado.
Tem sido também exigência da doutrina administrativista[6] que o fundamento da decisão de dispensa de audição seja explicitado, o que se compreende, em atenção à norma do artigo 124.º, n.º 2 do CPA, embora não seja isento de dúvida o acolhimento desta orientação no Direito Fiscal.
Nos procedimentos tributários em apreciação registou-se na matéria assente que (2.1.2) a Requerente foi alvo de procedimento de inspeção tributária; (2.1.3) que por ofício de 07.08.2015 a Requerente foi notificada para exercer o seu direito de audição sobre o projeto de correções resultante da análise externa de inspeção tributária referente ao exercício de 2013; (2.1.4) que a Requerente exerceu o seu direito de audição por escrito, que deu entrada nos serviços da Requerida a 24.08.2015 e manifestou não pretender contestar a proposta de relatório que lhe foi notificado; (2.1.25) que no âmbito da Reclamação Graciosa, a 24.02.2016 foi determinada a notificação à Requerente para exercer o seu direito de audição prévia relativamente ao projeto de decisão; (2.1.29) e que na decisão do recurso hierárquico fez-se referência à dispensa de audição da Requerente por ter esse direito já sido exercido quanto aos mesmos factos.
Não parecem restar dúvidas de que a Requerente foi convidada a exercer o seu direito de audição em dois momentos distintos: na fase de inspeção tributária, ainda antes da emissão da liquidação e mais tarde, no procedimento de reclamação graciosa. Para que fosse exigível a sua audição, de novo, no recurso hierárquico, haveria que se constatar a existência de novos argumentos de facto ou de direito e nem a Requerente alega tê-lo feito. E foi essa a razão pela qual a Requerida se dispensou de voltar a ouvir a Requerente, como de resto referiu na decisão, in fine. Não se vê que a ausência de audição da Requerente, no contexto em que ocorreu, constitua a violação de qualquer norma.
Também não colhe o argumento da Requerente de a dispensa de audição ter sido feita com base em orientação de caráter interno, constante de circular. Mais exatamente a Requerida explicita que a dispensa é feita nos termos da Circular e esta não contém mais do que a interpretação que faz das normas do artigo 60.º da LGT. É claro que essa interpretação não vincula, i.e., não é Direito, mas é inegável que não é nenhum ato ilícito mas apenas o exercício do próprio poder-dever organizativo da Administração Tributária e Aduaneira.
Improcede assim a alegada preterição da preterição do direito de audição da Requerente.
3.3. Da correção às mais-valias fiscais relativas à alienação de viaturas ligeiras de passageiros
Como se viu, no exercício de 2013, a Requerente alienou 29 veículos ligeiros de passageiros ou mistos que integravam o seu ativo fixo tangível, e no apuramento das mais-valias e menos-valias fiscais, deduziu ao custo de aquisição o montante das depreciações consideradas para efeitos fiscais, tendo apurado uma menos-valia de € 21.455,72 (vinte e um mil quatrocentos e cinquenta e cinco euros e setenta e dois cêntimos). Entende a Requerida que no cálculo das mais-valias e menos-valias, deveria ter sido deduzido ao respetivo custo de aquisição o montante das depreciações contabilisticamente praticadas, o que teria resultado no apuramento de uma mais-valia de € 208.975,62 (duzentos e oito mil novecentos e setenta e cinco euros e sessenta e dois cêntimos).
Importa, pois, dilucidar se, para efeitos de apuramento das mais-valias ou menos-valias fiscais para estes 29 veículos, devem ser usadas as amortizações efetuadas na contabilidade, como pretende a Requerida, ou as amortizações consideradas para efeitos fiscais, como advoga a Requerente.
Vejamos o que dispõe a este respeito o n.º 2 do art.º 46.º do CIRC: “as mais-valias e as menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das perdas por imparidade e outras correcções de valor previstas no artigo 35.º, bem como das depreciações ou amortizações aceites fiscalmente, sem prejuízo da parte final do n.º 5 do artigo 30.º”.
Ora, esta disposição legal não parece oferecer qualquer dúvida interpretativa, expressamente reconhecendo que ao valor de aquisição serão deduzidas as depreciações ou amortizações aceites fiscalmente. Serão, portanto, as amortizações aceites fiscalmente, e não as contabilisticamente consideradas, as que relevarão para efeitos de cálculo das mais-valias ou menos-valias fiscais para estes 29 veículos.
Lê-se no Relatório de Inspeção que “contudo, as instruções contidas no mapa 31, relativas ao apuramento das mais-valias e menos-valias fiscais [coluna (10), alínea d)], referem, que no caso de viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, que não estejam afetas à exploração de serviço público de transportes nem se destinem a ser alugadas no exercício da atividade normal do sujeito passivo, relevam as depreciações praticadas”.
Esta conclusão, reiterada pela Requerida na sua Resposta, estriba-se na Circular 6/2011 DSIRC que, no seu ponto 32.1., estabelece o seguinte: “o cálculo da mais-valia ou menos-valia fiscal é efetuado de acordo com o previsto no n.º 2 do artigo 46.º do CIRC, devendo considerar-se, na respectiva fórmula de cálculo, as depreciações praticadas. Face à ratio subjacente à imposição de limites ao reconhecimento de gastos com este tipo de bens quando o respectivo valor de aquisição ou de reavaliação ultrapassa determinado montante, a interpretação mais consentânea com essa ratio é considerar que, para efeitos de determinação das respectivas mais-valias ou menos-valias, o valor das depreciações que releva é o das praticadas na contabilidade”.
É nítida a antinomia entre a letra do n.º 2 do art.º 46.º do CIRC – que expressamente invoca as amortizações fiscalmente aceites – e o ponto 32.1. da Circular 6/2011 DSIRC, acabado de transcrever. A contradição entre o que prescreve a lei e o que dispõe uma Circular terá de ser dirimida em favor da prescrição legal. Apesar da sua generalidade e abstração, as circulares e outros instrumentos administrativos de equivalente vocação, não integram o elenco das fontes de direito, porquanto a sua força vinculativa resulta tão-somente da autoridade hierárquica dos agentes de onde provêm e dos deveres de obediência dos subordinados a quem se dirigem[7]. Na verdade, essas orientações administrativas não têm por destinatários os cidadãos, os contribuintes, razão por que não são vinculativas nem para os particulares nem para os tribunais[8].
Até à reforma do Código do IRC operada pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de julho, o apuramento das mais-valias e menos-valias obedecia ao disposto no n.º 2 do art.º 43.º, que disponha o seguinte: “As mais-valias e as menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das reintegrações ou amortizações praticadas, sem prejuízo do disposto na parte final da alínea a) do n.º 5 do artigo 29º”.
Pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de julho, como se viu, o método de cálculo mudou, passando a ser o que consta do atual n.º 2 do art.º 46.º do CIRC. Assim, a pretensão da Requerida de ver na fórmula de cálculo das mais-valias e menos-valias fiscais as depreciações contabilisticamente praticadas, como se lê no ponto 32.1. da Circular 6/2011 DSIRC, e não as depreciações ou amortizações aceites fiscalmente, como com toda a clareza prescreve o já citado n.º 2 do art.º 46.º do CIRC, carece de qualquer arrimo legal, pelo que não pode ser acolhida.
É, pois, ilegal a correção a favor do Estado efetuada pela Inspeção Tributária quanto às mais-valias fiscais resultantes da alienação dos 29 veículos ligeiros de passageiros ou mistos que integravam o ativo fixo tangível da Requerente no montante de € 230.431,34, sendo consequente ilegal, por erro sobre os pressupostos de direito, a liquidação adicional de IRC nº 2016…, relativo a 2013, na parte que diz respeito a esta mesma correcção, que resultou na exigência do pagamento de imposto, ora tido por indevido, no montante de € 72.240,23.
3.4. Da correcção relativa à criação líquida de postos de trabalho em 2010 mas com efeitos em 2013
Aprecie-se agora a pretensão da Requerente da “anulação da correção à matéria coletável efetuada pela AT e, consequentemente, do montante de imposto, que ascende a € 2.128,67, e juros compensatórios, adicionalmente liquidados e pagos a esse título”, que resultaram da exclusão do benefício da CLPT no período de 2013, relativamente ao trabalhador E..., no montante de € 6.790,00. Reclama da falta de fundamentação da decisão da Requerida, que não esclarece que requisitos da norma do artigo 19.º, n.º 1 e n.º 2 do EBF, que concede o benefício, ficaram por preencher (artigos 148.º a 165.º do pedido de pronúncia arbitral).
Sobre este tema a Requerida sustentou nestes autos que o benefício relativo ao trabalhador em causa tinha fonte na sua admissão em 2010 e que fora já considerado nessa altura que este não reunia os requisitos necessários, pelo que essa apreciação se repercute nos outros exercícios em que o benefício pode produzir efeitos (artigos 35.º a 44.º da Resposta).
A questão remonta ao próprio Relatório de Inspeção Tributária da Requerida, onde esta considerou que a Requerente deduziu indevidamente para efeitos de apuramento do resultado tributável de 2013 o montante de 282.199,58 €, relativo à majoração dos encargos referentes à criação de emprego, em virtude de não ter cumprido todos os requisitos ínsitos no artigo 19.º do EBF (Processo Administrativo I, pág. 51). A Requerida considerou ainda no mesmo documento, que parte do valor indevidamente deduzido para efeitos de apuramento do resultado tributável de 2013, no montante de 21.331,63 €, se referiu à criação líquida de postos de trabalho do exercício de 2010, período que havia sido objeto de ação inspetiva, através da qual resultaram correções à composição da lista de funcionários admitidos naquele período, tendo sido considerados “não elegíveis” para efeitos de aplicação do benefício em causa, aqueles que constavam assinalados com “(a)” em anexo ao Relatório de Inspeção Tributária, que é ilegível na via digitalizada junta aos autos (Processo Administrativo I, págs. 57, 61 e 105).
Neste contexto e pelo que consta da matéria assente, tudo indica que no exercício de 2010 foram admitidos os trabalhadores D… e E… que foram então considerados inelegíveis no âmbito da ação inspetiva a esse período de 2010 (supra, 2.1.12 a 2.1.14), pelo que, no entender da Requerida, não poderiam ser considerados para efeitos da CLPT. Este é o elemento central para resposta à questão colocada.
A análise deste tribunal cinge-se à questão de saber se os custos com o trabalhador E..., admitido em 2010, podem ser majorados para efeitos de cálculo do IRC dos exercícios subsequentes (de 2011 a 2014), quando foram considerados inelegíveis no exercício em que foi admitido. Dito de outro modo: importa saber se a aceitação, pela Requerida, da majoração dos gastos no exercício de admissão é condição para que os gastos com esse trabalhador nos exercícios subsequentes possam também ser majorados em 150 %.
A norma que estabelece o benefício em causa consta do artigo 19.º do EBF, que regula do seguinte modo:
Artigo 19.º
Criação de emprego
1 - Para a determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC e dos sujeitos passivos de IRS com contabilidade organizada, os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado, são considerados em 150 % do respectivo montante, contabilizado como custo do exercício.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se:
a) "Jovens" os trabalhadores com idade superior a 16 e inferior a 35 anos, inclusive, aferida na data da celebração do contrato de trabalho, com excepção dos jovens com menos de 23 anos, que não tenham concluído o ensino secundário, e que não estejam a frequentar uma oferta de educação-formação que permita elevar o nível de escolaridade ou qualificação profissional para assegurar a conclusão desse nível de ensino;
b) "Desempregados de longa duração" os trabalhadores disponíveis para o trabalho, nos termos do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de Novembro, que se encontrem desempregados e inscritos nos centros de emprego há mais de 9 meses, sem prejuízo de terem sido celebrados, durante esse período, contratos a termo por período inferior a 6 meses, cuja duração conjunta não ultrapasse os 12 meses;
c) «Encargos» os montantes suportados pela entidade empregadora com o trabalhador, a título da remuneração fixa e das contribuições para a segurança social a cargo da mesma entidade;
d) «Criação líquida de postos de trabalho» a diferença positiva, num dado exercício económico, entre o número de contratações elegíveis nos termos do n.º 1 e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respectiva admissão, se encontravam nas mesmas condições.
3 - O montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é o correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida.
4 - Para efeitos da determinação da criação líquida de postos de trabalho, não são considerados os trabalhadores que integrem o agregado familiar da respectiva entidade patronal.
5 - A majoração referida no n.º 1 aplica-se durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho, não sendo cumulável, quer com outros benefícios fiscais da mesma natureza, quer com outros incentivos de apoio ao emprego previstos noutros diplomas, quando aplicáveis ao mesmo trabalhador ou posto de trabalho.
6 - O regime previsto no n.º 1 só pode ser concedido uma única vez por trabalhador admitido nessa entidade ou noutra entidade com a qual existam relações especiais nos termos do artigo 63.º do Código do IRC.
Deste regime resulta que o benefício em causa é concedido uma única vez por trabalhador (n.º 6) e perdura durante 5 anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho (n.º 5). Tudo indica que a dinâmica desta medida pressupõe que no ano de admissão é concedido o regime da majoração (n.º 6), que se mantém pelo período de 5 anos, i.e., o benefício ocorre, ou pode ocorrer, no exercício da admissão e nos quatro exercícios subsequentes.
É claro que se pode admitir a possibilidade de a entidade empregadora só beneficiar da majoração em períodos subsequentes à admissão, quando, por exemplo, apenas suscite a aplicação do regime mais tarde, o que poderá acontecer por variadas razões. Não será todavia de admitir a hipótese de determinado contrato de trabalho não reunir objetivamente condições para ser elegível num primeiro exercício e poder depois sê-lo nos exercícios subsequentes. Isto porque os requisitos de que depende o benefício deste incentivo terão de ser escrutinados com referência à data da contratação do trabalhador em causa.
O trabalhador E… foi admitido em 2010 e nesse exercício foi à Requerente recusado o benefício da majoração por ter a Requerida considerado que o dito trabalhador, embora não constasse «da listagem de funcionários “não elegíveis” (…) tal facto não implica que este trabalhador sendo “elegível” tenha sido selecionado e confirmado pelos SIT para efeitos de majoração e determinação do benefício fiscal em apreço». A Requerida, na apreciação a que procedeu relativamente ao exercício de 2010, desconsiderou o trabalhador E… concluindo no sentido de que «não tendo aquele trabalhador sido considerado/selecionado “ab initio” para efeitos de determinação do benefício fiscal em apreço», não será de admitir que dele possa fazer uso nos exercícios seguintes.
Não podemos acompanhar esta entendimento. Não se pode extrair das normas que consagram este benefício a necessidade de ter havido majoração no exercício da contratação, independentemente das razões que a possam ter determinado, seja porque o sujeito passivo não suscitou na altura a aplicação do regime seja por ter a Autoridade Tributária e Aduaneira entendido que os respetivos requisitos não se encontravam reunidos. Ainda que se consolide na ordem jurídica a não aceitação por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira da majoração no ano da contratação, o mesmo é dizer do acto de liquidação que com base nessa decisão é praticado, tal não poderá equivaler à insusceptibilidade de esse benefício ser usufruído nos exercícios seguintes, caso estejam objetivamente verificados os respetivos pressupostos, sempre com referência ao ano da contratação e nunca por um período superior aos cinco anos a contar dele.
Como vimos, cada trabalhador só pode dar origem ao benefício uma única vez relativamente a uma entidade empregadora ou a outra com a qual existam relações especiais nos termos do artigo 63.º do Código do IRC (art.º 19.º, n.º 6 do EBF), durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho (n.º 5 do mesmo preceito). Contudo, se a Requerida considera que um determinado trabalhador não é elegível – como foi o caso do trabalhador E... em 2010 – e se o sujeito passivo se conforma com essa decisão, não fica precludido o direito de se pôr em causa esse juízo em anos subsequentes, ainda que não possa ser estendido o prazo do benefício para além dos 5 anos contados da data da contratação. Portanto, se a Requerente, relativamente ao exercício de 2010, não reagiu contenciosamente contra a decisão da Requerida de não aceitar a dedução majorada dos custos suportados com o trabalhador em causa, a única consequência que pode tirar-se desse facto é a perda desse benefício nesse mesmo exercício e não a sua repercussão nos exercícios posteriores. A não reacção do sujeito passivo faz com que o acto de liquidação referente ao exercício de 2010 (e dos outros exercícios em que tenha procedido de forma idêntica) se consolidem, o que não importa, salvo melhor juízo, a insusceptibilidade de o sujeito passivo poder beneficiar desse incentivo em exercícios posteriores, caso, pudesse dele objetivamente beneficiar com referência ao ano da contratação.
Não resulta dos autos, muito menos da decisão do Recurso Hierárquico, nem a Requerida logrou demonstrá-lo, que o trabalhador em causa, quando foi contratado em 2010, não reunia as condições que permitiam a dedução majorada dos custos com ele suportados pela Requerente. Assim, a correcção efectuada pela Requerida, justificada apenas com uma minimalista referência ao que havia sido a sua decisão relativa a 2010, não está devidamente fundamentada, pelo que deve ser anulada, inquinando consequentemente a liquidação que com base nela é feita.
3.5. Do ajustamento proporcional da majoração anual por posto de trabalho em caso de contratos de trabalho em regime de tempo parcial
A Requerida entende que o montante máximo da majoração anual por posto de trabalho deve sofrer um ajustamento proporcional quando estejamos perante contratos de trabalho em regime de tempo parcial, entendimento que, no dizer da Requerente, não tem um mínimo de suporte na letra e no espírito da lei.
Recordemos o que dispõe a este respeito o art.º 19.º do EBF, no que releva para a apreciação desta questão:
Artigo 19.º
Criação de emprego
1 - Para a determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC e dos sujeitos passivos de IRS com contabilidade organizada, os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado, são considerados em 150 % do respectivo montante, contabilizado como custo do exercício.
3 - O montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é o correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida.
5 - A majoração referida no n.º 1 aplica-se durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho, não sendo cumulável, quer com outros benefícios fiscais da mesma natureza, quer com outros incentivos de apoio ao emprego previstos noutros diplomas, quando aplicáveis ao mesmo trabalhador ou posto de trabalho.
O nº 3 do art.º 19.º do EBF estabelece que o montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é o correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida. Entende a Requerida que este benefício tem como pressuposto o trabalho a tempo inteiro, que na data que releva para os autos, era de 40 horas semanais. Assim, se há trabalhadores contratados em regime de trabalho a tempo parcial, forçoso é proceder-se ao respectivo ajustamento, criando uma proporcionalidade entre o benefício total/contrato de trabalho a tempo inteiro e o do benefício “parcial”/contrato de trabalho a tempo parcial. Mais entende a Requerida que o não ajustamento do montante da retribuição mínima mensal garantida para efeitos do n.º 3 do art.º 19.º do EBF, redundaria num enviesamento do montante do benefício em favor da contratação de trabalhadores a tempo parcial em detrimento da contratação de trabalhadores a tempo completo, o que não pode ter sido o objetivo do legislador.
Importa desde já fixar os pressupostos de que depende a atribuição deste benefício fiscal. Como depreende do n.º 1 do art.º 19.º do EBF é necessário que:
-
haja “criação líquida de postos de trabalho”, ou seja, que no lapso temporal relevante seja superior o número de postos de trabalho criados do que o dos postos de trabalho eliminados;
-
esses postos de trabalho se refiram a jovens e a desempregados de longa duração, conceitos definidos nas alíneas a) e b) do n.º 2 do art.º 19.º do EBF; e
-
os ditos jovens e desempregados de longa duração sejam admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado, ou seja, sem termo.
Para a determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC e dos sujeitos passivos de IRS com contabilidade organizada, os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado, são considerados em 150 % do respectivo montante, contabilizado como custo do exercício, sendo o montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, o correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida.
Como se vê, nada na lei nos pode fazer concluir que o benefício fiscal que vimos tratando depende serem os contratos de trabalho elegíveis a tempo completo. Portanto, também os contratos de trabalho a tempo parcial, conquanto sejam por tempo indeterminado estão contemplados na norma que cria este benefício fiscal, o que não suscita a oposição da Requerida. Na verdade, a Requerida apenas sufraga o entendimento segundo o qual se deve operar um ajustamento proporcional no montante máximo do benefício quando na presença de contratos de trabalho sem termo, mas a tempo parcial.
Percebe-se o ponto de vista da Requerida. Contudo, de iure constituto, não se vê onde possa fundar-se esta conclusão. Convém recordar que os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes (art.º 103.º, n.º 2 da CRP). Teremos de interpretar o art.º 19.º do EBF, sobretudo os números 1 e 3, na certeza de que o legislador, tendo podido fazê-lo, optou por não distinguir os contratos de trabalho a tempo inteiro e os contratos de trabalho a tempo parcial. Portanto, onde o legislador não distingue o intérprete também não deverá distinguir.
Ainda que não choque, de iure constituendo, a imposição de um ajustamento no caso dos contratos de trabalho a tempo parcial, porquanto, do ponto de vista de política legislativa, não será indiferente a criação de postos de trabalho a tempo parcial ou a tempo inteiro, a redação do art.º 19.º, tal como ela está em vigor, não deixa espaço a esse ajustamento. Até porque, nem se saberia, em rigor, como ele poderia operar, se por via da redução da percentagem de majoração dos encargos – fixada no n.º 1 do art.º 19.º do EBF em 150%[9] – se, talvez mais adequadamente, através da diminuição do montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho – correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo.
Na verdade, “o legislador não plasmou qualquer restrição ao tipo de emprego criado e para além disso, as normas que criam benefícios fiscais têm a natureza de normas excepcionais, como decorre do teor expresso do artigo 2.º, n.º 1, do EBF, pelo que devem ser interpretadas nos seus precisos termos, sem ampliações ou restrições, de forma a abrangerem todos os casos nelas literalmente previstos e apenas esses, como é jurisprudência pacífica”[10].
É, pois, ilegal a correção a favor do Estado efetuada pela Inspeção Tributária quanto ao ajustamento proporcional da majoração anual ao período de trabalho a tempo parcial no montante de € 119.929,64, sendo consequente ilegal, por erro sobre os pressupostos de direito, a liquidação adicional de IRC nº 2016…, relativa a 2013, na parte que diz respeito a esta mesma correcção, que resultou na exigência do pagamento de imposto, ora tido por indevido, no montante de € 37.597,94.
3.6. Da criação líquida de postos de trabalho no exercício de 2012 e o seu impacto no exercício de 2013
É agora o momento de analisar a razoabilidade da impugnação pela Requerente da “correção desfavorável em virtude do suposto incumprimento dos pressupostos do benefício relativo à CLPT ocorrida em 2012, detetada em inspeção anterior, mas com efeitos em 2013”, no valor de € 148.689,95 (art.º 10.º do pedido de pronúncia arbitral).
A Requerente circunstancia a sua posição na seguinte sequência de argumentos: (i) a razão invocada pela Requerida para a correção de € 148.689,95 à matéria coletável do período de 2013 é o incumprimento dos pressupostos do artigo 19.º do EBF no antecedente período de 2012 mas a CLPT apurada pela Requerida não se encontra correta; (ii) o número de “saídas elegíveis” considerado pela Requerida, relativamente a 2012, foi de 221 quando se deveria conter em 174 (artigos 187.º, 189.º e 197.º do pedido de pronúncia arbitral).
Por sua vez a Requerida sustenta que se verificou um número de saídas elegíveis que totalizou 221 e não 171[11], como se concluiu na ação inspetiva efetuada ao período de 2012 (artigos 63.º e 68.º da Resposta). Vejamos como o faz.
No relatório de inspeção tributária fundamentou-se a correção nos seguintes termos (Processo Administrativo I, pág. 60):
No período de 2012, o sujeito passivo considerou existir uma criação líquida de 23 postos de trabalho.
Da ação inspetiva efetuada ao período de 2012 (OI2014...) concluiu-se pela não existência de criação líquida de postos de trabalho, por violação do disposto na alínea d) do nº 2 do artigo 19.º do EBF, pelo que se acresceu, ao rendimento tributável desse período, a majoração dos encargos suportados com os trabalhadores considerados, pelo sujeito passivo, na criação líquida de postos de trabalho.
No período de 2013, o sujeito passivo continuou a majorar, indevidamente, os encargos suportados com trabalhadores considerados na criação líquida de postos de trabalho do período de 2012, no montante de € 148.689,95 (ver coluna “Correção 1” da folha 7 do Anexo 2 do presente relatório).
Nestes termos, será de acrescer, ao resultado tributável do período de 2013, o valor de € 148.689,95, relativo à majoração dos encargos suportados com os trabalhadores considerados, pelo sujeito passivo, na criação líquida de postos de trabalho do período de 2012, uma vez que, de acordo com a inspeção efetuada a esse período, concluiu-se não haver criação líquida de postos de trabalho.
Para descortinar a razão para a recusa na aceitação da majoração por parte da Requerente, visitem-se os factos ou pressupostos e a norma invocada. Quanto aos factos ou pressupostos, a fundamentação acabada de referir não é explícita na sua identificação. Com esforço, pode entender-se que (i) a Requerente majorou os gastos com determinados trabalhadores; (ii) que esses trabalhadores estão identificados na coluna “Correção 1” da folha 7 do Anexo 2 do relatório; (iii) que esses trabalhadores possuíam um vínculo laboral sem termo ou não são jovens, na aceção da norma aplicável [a “alínea a) do nº 2 do artigo 19.º do EBF”][12]; (iv) que a majoração dos encargos com esses trabalhadores já tinha sido considerada indevida “na criação líquida de postos de trabalho do período de 2012”. Não é junta a decisão tomada na invocada inspeção efetuada ao exercício de 2012.
Para apoiar a tarefa de decifrar os pressupostos da decisão tenhamos presente que os requisitos de que depende o benefício em causa, para o que ora importa, são os seguintes:
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Idade - para efeitos da qualificação como jovens nos termos da al. a) do n.º 2 do art.º 19.º do EBF;
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Escolaridade - para efeitos da qualificação como jovens nos termos da al. a) do n.º 2 do art.º 19.º do EBF, quando se trate de trabalhadores jovens com menos de 23 anos.
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Existência de contrato de trabalho sem termo – para efeitos do n.º 1 do art.º 19.º do EBF.
Recorde-se a redação das disposições citadas, artigo 19.º, n.º 1 e n.º 2, al. a):
1 - Para a determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC e dos sujeitos passivos de IRS com contabilidade organizada, os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado, são considerados em 150 % do respectivo montante, contabilizado como custo do exercício
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se:
a) "Jovens" os trabalhadores com idade superior a 16 e inferior a 35 anos, inclusive, aferida na data da celebração do contrato de trabalho, com excepção dos jovens com menos de 23 anos, que não tenham concluído o ensino secundário, e que não estejam a frequentar uma oferta de educação-formação que permita elevar o nível de escolaridade ou qualificação profissional para assegurar a conclusão desse nível de ensino;
Para sustentar o ato da Requerida torna-se necessário verificar antes de mais os factos em que a Requerida fundou a sua conclusão, de os trabalhadores em causa terem sido contratados por tempo indeterminado ou não serem jovens, i.e., há que conhecer os contratos de trabalho dos trabalhadores em causa, as suas datas de nascimento e as suas habilitações académicas.
Não obstante o relatório de inspeção tributária constante do Processo Administrativo dispor efetivamente de um mapa que figura na coleção de anexos, com a referência “7/7” (após a folha 5/7 e antes da folha 6/7) (Processo Administrativo I, pág. 104 na numeração do ficheiro pdf), este é completamente ilegível, não permitindo que este tribunal aprecie a validade dos fundamentos invocados.
A Requerente reconhece que no âmbito da inspeção tributária relativa ao ano 2012 entregou à Requerida uma listagem de saídas onde, “por lapso foram identificadas datas de início de contrato sem termo”, quando, “na realidade, tais trabalhadores possuíam um vínculo laboral a termo” (artigos 191.º e 192.º do pedido de pronúncia arbitral). Alega a Requerente ter oferecido à Requerida “os elementos comprovativos da efetiva existência de contratos de trabalho a termo” (cf. cópia do Recurso Hierárquico apresentado em 13 de novembro de 2015 contra a decisão da Reclamação Graciosa n.º …2015…, relativa ao IRC de 2012, junto aos presentes autos como Doc. 9, em particular o “Doc. 7” [Contratos dos colaboradores elegíveis para efeitos de CLPT à data da sua admissão] e o “Doc. 8” [Apuramento da CLPT de 2012, referente aos trabalhadores elegíveis no cálculo de 2012] desse Recurso Hierárquico).
Apesar destas alegações, a Requerida apresenta como argumento para a correcção posta em crise a recusa por si própria da aceitação da majoração relativamente aos mesmos trabalhadores, no exercício imediatamente anterior, de 2012 mas também aqui, os fundamentos que autorizam essa recusa não se encontram documentado ou demonstrados, impedindo que o tribunal avalie do seu mérito, que teria sempre que passar pela verificação que essa recusa ocorreu e que os fundamentos em que se baseou obedecem aos parâmetros aplicáveis.
Importa perceber como se reparte o ónus da prova. Neste caso cabia à Requerente alegar os factos que sustentavam a sua pretensão de anular o ato e fê-lo, apontando os vícios que lhe imputa. Cabia à Requerida sustentar a fundamentação do ato, o que também fez. Embora nenhuma das partes tenha sido especialmente feliz na forma como apresentou a sua posição, esse ónus foi cumprido. Como as versões apresentadas se opõem, importa perceber a quem cabia o ónus da prova que não foi cumprido, porque os documentos em que os factos estão retratados não constam dos presentes autos ou não são legíveis.
Parece ao tribunal que não dispondo o RJAT de norma que regule a matéria do ónus da prova, deve preferencialmente procurar-se essa disciplina nas normas processuais ou mesmo procedimentais, das leis tributárias, como dispõe a regra do artigo 29.º, n.º 1, al. a) do RJAT.
Sobre o tema do ónus da prova dispõe a regra do artigo 100.º, n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”) que, não obstante estar sistematicamente incorporada na regulação do procedimento tributário, tem sido entendida como também aplicável ao processo judicial[13] e consequentemente ao processo arbitral. De acordo com este dispositivo, sempre que da prova produzida resulte fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o ato tributário ser impugnado. Considera-se que a situação criada é, no limite, justamente essa, de fundada dúvida. A Requerente auto liquidou o imposto majorando os gastos com o pessoal; a Requerida alega que existiram condições para que essa majoração fosse feita relativamente a alguns trabalhadores, mas não existia relativamente a outros, afirmando fundamentar essa sua decisão num documento que até parece existir, mas cujo conteúdo não é legível. A falta de prova idónea deixa o tribunal na dúvida da existência dos requisitos para que seja aplicável a majoração e essa dúvida deve ser resolvida anulando o ato, como dispõe a citada norma do artigo 100.º, n.º 1 do CPPT.
Acresce a circunstância de ter sido submetida a apreciação arbitral a questão da CLPT de 2012[14], tendo o tribunal arbitral considerado que a recusa de aceitação da majoração por parte da Requerida se fundara numa listagem que a Requerente havia oportunamente corrigido, concluindo que “impendia (…) sobre a Requerida [o ónus de] apreciar os elementos de prova juntos e extrair daí as suas conclusões em sede de decisão do recurso hierárquico”, o que a Requerida, no que respeita à liquidação de 2012 não terá feito, razão por que o tribunal julgou que “assiste razão à Requerente incorrendo a Requerida em erro na apreciação dos factos e do direito o que inquina a decisão de indeferimento parcial do recurso hierárquico, com a sua consequente anulação”. Relativamente ao litígio que ora ocupa este tribunal, a Requerida não procedeu de forma diversa e também não logrou demonstrar a bondade da correção que entendeu promover também em 2013.
Procede, pois, também aqui a pretensão da Requerente, havendo que anular a liquidação, também na parte respetiva.
3.7. Dos juros indemnizatórios
A alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º do RJAT dispõe que “a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”.
Não se ignora que a autorização legislativa concedida ao Governo pelo art.º 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, na base da qual foi aprovado o RJAT, determina que o processo arbitral tributário constitua um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária. Ainda que as alíneas a) e b) do n.º 1 do art.º 2.º do RJAT fundem a competência dos tribunais arbitrais em “declarações de ilegalidade”, parece razoável o entendimento segundo o qual se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo certo que nos processos de impugnação judicial, para além da anulação de actos tributários, podem ser apreciados pedidos de indemnização, desde logo relativos a juros indemnizatórios.
Com efeito, o princípio da cognoscibilidade dos pedidos de indemnização, em reclamação graciosa ou em processo judicial, justifica-se sempre que o dano que se pretende ver ressarcido resulte de facto imputável à Administração Tributária e Aduaneira. Encontramos manifestações desse princípio no n.º 1 do art.º 43.º da Lei Geral Tributária e no art.º 61.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Assim, justifica-se a apreciação do pedido de pagamento de juros indemnizatórios feito pela Requerente.
São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, ter havido erro imputável aos serviços do qual resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
Ora, tendo a Requerente pago o tributo que pela liquidação reclamada e ora anulada lhe foi, por erro imputável aos serviços, exigido, tem ela direito não apenas ao reembolso de tudo quanto pagou em excesso, mas ainda a perceber juros indemnizatórios contados desde a data do pagamento do excesso, até ao seu integral reembolso.
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Decisão
Nos termos e com os fundamentos expostos, o Tribunal Arbitral decide:
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Conceder provimento ao pedido da Requerente e anular a liquidação adicional de IRC de 2013 e juros compensatórios n.º 2015…;
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Condenar a Requerida a restituir à Requerente o montante de € 186.208,54, relativo a IRC de 2013 e juros compensatórios indevidamente suportados;
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Condenar a Requerida no pagamento de juros indemnizatórios até que seja efetuada a restituição referida na alínea anterior, calculados sobre o valor de € 186.208,54, à taxa legal em cada momento em vigor.
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Condenar a Requerida no integral pagamento das custas, cujo quantitativo se apura em capítulo subsequente.
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Valor do processo
Nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 306.º do CPC, no art.º 97.º-A do CPPT e ainda do n.º 2 do art.º 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 186.208,54 (cento e oitenta e seis mil duzentos e oito euros e cinquenta e quatro cêntimos).
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Custas
Para os efeitos do disposto no n.º 2 do art.º 12 e no n.º 4 do art.º 22.º do RJAT e do n.º 5 do art.º 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 3.672,00 (três mil seiscentos e dois euros), nos termos da Tabela I anexa ao dito Regulamento, a suportar pela Requerida
Lisboa, 28 de maio de 2018
Os Árbitros,
(José Poças Falcão - Presidente)
(Nuno Pombo)
(Nuno Maldonado Sousa, com declaração de voto anexa)
Declaração de voto (relativa ao ponto 3.4)
Declaração de voto
Votei vencido apenas na deliberação referente ao ponto 3.4 pois nessa situação, entendo que não assistia razão à Requerente.
Creio que o benefício atribuído através do regime do artigo 19º do EBF é concedido por uma única vez (n.º 6) para cada trabalhador e perdura durante 5 anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho (n.º 5). Tudo indica que a dinâmica desta medida pressupõe que no ano de admissão é concedido o regime da majoração (n.º 6), que se mantém pelo período de 5 anos, i.e., o benefício ocorre no exercício da admissão e nos quatro exercícios subsequentes.
Não creio que se as normas do artigo 19º EBF possibilitem que quando no exercício da contratação de trabalhador este seja considerado inelegível em inspeção da AT, que dê lugar a correção à matéria coletável, que não tenha sido impugnada em devido tempo, os gastos com esse contrato possam ser majorados noutro exercício subsequente. Recusado que seja o benefício (através da correção à matéria tributável) no ano da admissão (ou no primeiro ano em que é submetido), duas alternativas restam à entidade empregadora: ou se conforma com esse ato ou o impugna pelas formas próprias. Não impugnando o ato, a conformação resulta do decurso do tempo, que inexoravelmente consolida o não reconhecimento do benefício. É esta a solução que considero adequada.
(Nuno Maldonado Sousa)
Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do art.º 131.º do CPC, aplicável por remissão da al. e) do n.º 1 do art.º 29.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
[1] O que não aconteceria v.g. nos casos de liquidação consequente (62º CPPT), ou de aplicação de disposição anti abuso (63º CPPT), que são procedimentos com regras específicas.
[2] Acessível em <http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/legislacao/instrucoes_administrativas/Documents/circular_13_de_08-07-1999_direccao_de_servicos_de_justica_tributaria.pdf>
[3] Pode ver-se regime próximo, ainda que mais detalhado, nos artigos 121.º a 125.º do CPA, em especial nas normas dos artigos 121.º, n.ºs 1 e 2 e 124.º, n.º 1 al. e).
[4] Diogo Leite de Campos, et al. – Lei Geral Tributária anotada e comentada. 4ª edição. Lisboa, Encontro de Escrita, 2012, pp. 508-511.
[5] Acórdão do STJ de 29-06-2011 (António Calhau), proc. 0497/11, acessível em www.dgsi.pt.
[6] Diogo Leite de Campos, et al, op. cit.. p. 511.
[7] SOARES MARTÍNEZ, Direito Fiscal, 7ª. Ed., Almedina, 1993, pág. 111.
[8] JOSÉ CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 2ª. Ed., Almedina, 2003, pág. 199.
[9] Como parece precipitadamente depreender a decisão arbitral prolatada no Processo n.º 68/2017-T, que correu termos no CAAD.
[10] V. decisão arbitral prolatada no Processo n.º 212/2013-T, que correu termos no CAAD.
[11] Ou melhor, em 174, já que entendeu a Requerente não impugnar arbitralmente a qualificação como saída elegível de 3 trabalhadores (cfr. art.º 143.º do pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao Processo n.º 68/2017-T, junto aos presentes autos como Doc. 4).
[12] Em rigor, parece que esta última questão se resume a um único trabalhador – F…, sendo a de todos os outros a da efectividade do exercício das funções laborais (cfr. cfr. art.º 144.º do pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao Processo n.º 68/2017-T, junto aos presentes autos como Doc. 4).
[13] Neste sentido veja-se Jorge Lopes de Sousa – Código de Procedimento e de Processo Tributário. Vol. II. 6ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2011, págs. 131-136.
[14] Processo n.º 68/2017-T