Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), Sílvia Oliveira e Clotilde Celorico Palma (Árbitros Vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral, na seguinte
DECISÃO ARBITRAL[1] (consultar versão completa no PDF)
I – RELATÓRIO
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No dia 22 de Agosto de 2017, o Fundo de Gestão de Património Imobiliários A..., NIPC ..., com sede Av. ..., n.º..., ...-... Lisboa (adiante designado por Requerente), apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade do acto de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado nº ... de 2016, e correspondentes demonstrações de liquidação e liquidações de juros, no valor total de €1.204.150,68, conforme o seguinte quadro:
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Para fundamentar o seu pedido alega o Requerente, em síntese, que:
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O imóvel transmitido pelo Requerente à O... constituía, para efeitos fiscais, um “terreno para construção”;
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A tais terrenos aplicam-se unicamente as condições objectivas previstas no artigo 2.º, n.º 1 do Decreto-Lei 21/2007 de 29/01, mas já não as do n.º 2 do mesmo artigo;
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Deste modo, estão preenchidas as condições objectivas, subjectivas e formais de renúncia à isenção de IVA na transmissão do referido terreno, e será o IVA incorrido nos inputs integralmente dedutível;
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As despesas elencadas no Anexo C do contrato de cessão de posição contratual foram utilizadas no desenvolvimento do empreendimento vendido à referida O...;
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A AT não logrou provar ou colocar em dúvida a correspondência entre as referidas despesas e os valores transmitidos a título de benfeitorias na escritura de compra e venda do imóvel, celebrada entre o B... e o Requerente;
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A percentagem de 87% das facturas a que se reportam tais despesas foi objecto de autoliquidação de IVA pelo Requerente, em aplicação da regra da inversão do sujeito passivo.
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No dia 23-08-2017, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT.
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O Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
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Em 31-10-2017, as partes foram notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar qualquer delas.
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Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 21-11-2017.
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No dia 10-01-2018, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se unicamente por impugnação.
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Ao abrigo do disposto nas als. c) e e) do art.º 16.º, e n.º 2 do art.º 29.º, ambos do RJAT, foi dispensada a realização da reunião a que alude o art.º 18.º do RJAT.
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Tendo sido concedido prazo para a apresentação de alegações escritas, foram as mesmas apresentadas pelas partes, pronunciando-se sobre a prova produzida e reiterando e desenvolvendo as respectivas posições jurídicas.
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Foi oportunamente informado que a decisão final seria notificada às partes até ao termo do prazo fixado no artigo 21.º/1 do RJAT.
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O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5º. e 6.º, n.º 1, do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
O processo não enferma de nulidades.
Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.
Tudo visto, cumpre proferir decisão.
II. DECISÃO
A. MATÉRIA DE FACTO
A.1. Factos dados como provados
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O Requerente é um Fundo de Investimento Imobiliário Aberto, constituído nos termos legais.
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A administração, gestão e representação do Requerente cabem, e cabiam em 2016, à C...– Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, S.A.
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O Requerente, até 9 de Outubro de 2012 esteve enquadrado no regime de isenção previsto no artigo 9.º do CIVA.
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Na referida data, o Requerente entregou declaração de alterações, modificando o seu enquadramento para o regime normal de tributação, com periodicidade mensal.
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Naquela declaração o Requerente indicou que realizaria em simultâneo operações sujeitas a IVA que conferem e que não conferem direito à dedução.
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Durante o ano de 2016, o Requerente realizou as seguintes operações:
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Cedência e exploração do Centro Comercial ...;
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Desenvolvimento do projecto “... Shopping” e transmissão do mesmo, incluindo o terreno onde o mesmo estava a ser construído.
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Em 17 de Maio de 2013, o Requerente adquiriu ao B..., S.A., o “Prédio urbano composto por terreno para construção urbana com a área de 33897 metros quadrados, sito na ..., Rua ..., ..., freguesia de ..., concelho de ...” e “as benfeitorias existentes no referido prédio urbano que consistem numa obra já iniciada mas não acabada”.
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Na correspondente caderneta predial o imóvel referido encontrava-se inscrito como “terreno para construção”.
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O preço da aquisição referida foi de €22.400.000,00, compreendendo as seguintes parcelas:
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€14.000,000: valor do terreno;
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€8.400,000: valor das benfeitorias.
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Sobre o prédio em causa pendia um contrato de locação financeira, celebrado entre o D...– Instituição Financeira de Crédito, S.A, posteriormente incorporado no B..., e a entidade E...– Investimentos e Projectos Imobiliários, S.A., nos termos do qual esta entidade se comprometia a desenvolver obras de construção do ... Shopping no prédio para, posteriormente, o explorar economicamente.
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A construção do ... Shopping, objecto da licença de construção n.º .../2006, aprovada em 6 de Dezembro de 2006, iniciou-se em 2011, e tinha conclusão prevista para 2013.
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A E... revelou, desde o ano de 2012, dificuldades relevantes no cumprimento das suas obrigações no contrato de locação financeira supra-referido.
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A partir de 2012, vários fornecedores da E... viram os seus contratos incumpridos por ausência de pagamento dos mesmos.
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De acordo com estudos de avaliação imobiliária concluídos em Agosto de 2012, o ... Shopping encontrava-se em processo de construção, com cerca de 36,7% da obra concluída.
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Após negociações no sentido da revogação do contrato de locação financeira com a E..., e com os fornecedores desta, no sentido da cessão da posição contratual nos contratos respeitantes ao desenvolvimento do ... Shopping, bem como da correspondente aprovação pela CMVM, o Requerente avançou para a aquisição acima referida em 7.
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A 17 de Maio de 2013, o contrato de locação financeira referido em 10 foi resolvido com efeitos imediatos.
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No mesmo dia foi celebrado com a E... um contrato de cessão da posição contratual de modo ao Requerente assumir a posição daquela nos diversos contratos em vigor para o desenvolvimento do ... Shopping.
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O Requerente assumiu também a posição da E... nos contratos celebrados com o conjunto de lojistas identificados no Anexo B do contrato de cessão da posição contratual.
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No âmbito da mesma operação, o Requerente, enquanto Segunda Outorgante, assumiu a obrigação de “proceder ao pagamento de todos os valores em dívida aos fornecedores e prestadores à presente data de acordo com os contratos e conforme a lista que se anexo como Anexo C”.
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Do mesmo contrato consta ainda que “Para tal os fornecedores irão emitir as competentes facturas à Segunda Outorgante, devendo esta liquidar integralmente as mesmas no prazo máximo de 30 (trinta) dias a contar da presente data”.
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Os valores incluídos no Anexo C do contrato de cessão de posição contratual referido, reportavam-se a fornecimentos de bens e serviços realizados entre Abril de 2012 e Julho de 2013.
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Os estudos imobiliários ao ... Shopping, datados de 1 de Agosto de 2012, e elaborados pelas sociedades F...– Projectos de Engenharia e Consultoria, Ld.ª e G..., Ld.ª, foram encomendados pelo Requerente em data anterior.
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Para desenvolvimento do projecto ... Shopping, entre Abril de 2012 e Maio de 2013, foram adquiridos bens e serviços de construção civil, gestão de projectos e consultoria imobiliária, no montante global de €5.101.846,13, aos seguintes fornecedores:
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H... – Consultoria Imobiliária Unipessoal, Ld.ª;
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I... – Unipessoal, Ld.ª;
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J..., S.A;
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K...;
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L..., Sociedade de Advogados, RL;
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M..., Ld.ª;
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N...– Sociedade de Mediação Imobiliária, Ld.ª.
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O IVA incorrido nas referidas aquisições ascendeu a €954.000,90.
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O IVA associado às facturas emitidas por J..., S.A., no montante de €797.901.98, foi objecto de autoliquidação pelo Requerente, por aplicação da regra de inversão do sujeito passivo relativa à aquisição de serviços de construção civil.
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O IVA associado às facturas emitidas por K..., no montante de €32.200,00, foi objecto de autoliquidação pelo Requerente, por aplicação da regra de inversão do sujeito passivo relativa à aquisição de serviços a sujeitos não estabelecidos.
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Em 25 de Fevereiro de 2016 foi emitido pelo Serviço de Finanças de Lisboa-..., certificado de renúncia à isenção do IVA na operação de venda do terreno para construção do ... Shopping à entidade O...– Investimentos Imobiliários Unipessoal, Ld.ª.
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A 3 de Março de 2016 o Requerente vendeu à referida O...“o prédio urbano, terreno para construção, com a área de trinta e três mil oitocentos e setenta e nova metros quadrados, com as benfeitorias existentes no mesmo e que consistem numa obra iniciada mas não acabada, sito na Herdade ..., Rua..., ..., freguesia de..., concelho de...”, tendo liquidado IVA na referida operação.
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O Requerente, na declaração do correspondente período, procedeu à dedução do IVA que entendeu incorrido no desenvolvimento e construção do imóvel vendido à O..., tendo inserido no campo 20 daquela declaração, o montante de imposto de €860.505,58 e, no campo 24, o montante de imposto de €374.104,13, num total de imposto a deduzir de €1.195.823,70.
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Na declaração periódica de Setembro de 2016, o Requerente solicitou o reembolso do montante de €999.766,31, tendo a AT, na sequência de tal declaração, iniciado um procedimento de inspecção tributária de âmbito externo.
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Subsequentemente, a AT emitiu projecto de Relatório de Inspecção, relativamente ao qual o Requerente exerceu o seu direito de audição.
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A AT não acolheu os argumentos do Requerente e emitiu Relatório final, mantendo as correcções propostas, do qual consta, para além do mais, o seguinte:
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Mais consta do referido Relatório que:
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Em Maio de 2017, a AT notificou o Requerente do Relatório de Inspecção Tributária (RIT), que fundamentou as liquidações objecto da presente acção arbitral.
A.2. Factos dados como não provados
Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.
A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13[2], “o valor probatório do relatório da inspecção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.
Não se deram como provadas, nem como não provadas, as alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.
B. DO DIREITO
Conforme decorre de forma meridianamente clara do Relatório de Inspecção, as correcções operadas, e contra as quais o Requerente se insurge, assentam nos entendimentos de que:
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a transacção do imóvel relativo ao empreendimento ... Shopping não preenche os pressupostos do artigo 2.º, n.º 2 do Decreto-Lei 21/2007 de 29/01; e
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as facturas a que se refere o Anexo C do contrato de cessão da posição contratual entre o Requerente e a E..., reportam-se a operações ocorridas entre Abril de 2012 e Maio de 2013, em data anterior, portanto, à outorga da escritura pública de aquisição do imóvel referido, bem como daquele contrato de cessão da posição contratual.
Vejamos cada um deles.
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Dispõe o artigo 2.º/2 do Decreto-Lei 21/2007 de 29/01, na redacção aplicável, que:
“2 - Verificadas as condições previstas no número anterior, a renúncia só é permitida quando o bem imóvel se encontre numa das seguintes circunstâncias:
a) Esteja em causa a primeira transmissão ou locação do imóvel ocorrida após a construção, quando tenha sido deduzido ou ainda seja possível deduzir, no todo ou em parte, o IVA nela suportado;
b) Esteja em causa a primeira transmissão ou locação do imóvel após ter sido objecto de grandes obras de transformação ou renovação, de que tenha resultado uma alteração superior a 30% do valor patrimonial tributável para efeito do imposto municipal sobre imóveis, quando ainda seja possível proceder à dedução, no todo ou em parte, do IVA suportado nessas obras;
c) Na transmissão ou locação do imóvel subsequente a uma operação efectuada com renúncia à isenção, quando esteja a decorrer o prazo de regularização previsto no n.º 2 do artigo 24.º do Código do IVA relativamente ao imposto suportado nas despesas de construção ou aquisição do imóvel.”
A norma transcrita encarna, juntamente com o n.º 1 do mesmo artigo, os chamados requisitos objectivos do Regime de renúncia à isenção do IVA nas operações relativas a bens imóveis, requisitos esses a que se somam os também chamados requisitos subjectivos e formais, requisitos estes que não foram questionados pela AT nas correcções que operou, ora sindicadas.
Deste modo, e desde logo, não será passível de acolhimento a alegação da Requerida, na sua resposta, segundo a qual “sendo pretensão do Requerente que o tribunal confirme o seu direito à renúncia à isenção, compete-lhe, nos termos do previsto no art.º 74.º da LGT, efectuar prova de que reúne as necessárias condições para tal, entre as quais, as subjectivas, ou seja, no caso, de que se tratava de um sujeito passivo que realizava exclusivamente operações que conferem o direito à dedução (...), ou que não o sendo tinha àquela data (da renúncia), um direito à dedução igual ou superior a 80%”.
Com efeito, para além de assentar num pressuposto incorrecto – o de que a pretensão do Requerente é a de que o tribunal confirme o seu direito à renúncia à isenção, quando, como não podia deixar de ser em sede de processo arbitral tributário, a pretensão daquele é a anulação dos actos de tributários que constituem o objecto de tal processo – o eventual acolhimento da referida alegação da Requerida traduzir-se-ia na manutenção da correcção operada pela AT, e ora contestada, com outros fundamentos de facto e de direito, o que, de acordo com jurisprudência reiterada do STA[3] será inadmissível.
Posto isto, cumpre então aferir se, como entendeu a AT, não se verificam, no caso, os pressupostos do referido n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei 21/2007 de 29/01.
Como refere o Requerente, e não é contestado pela AT quer em sede inspectiva, quer em sede arbitral, aquela norma do n.º 2 do artigo 2.º em causa, não terá aplicabilidade relativamente aos terrenos para construção.
Tal conclusão impõe-se, como evidencia o Requerente, porquanto todas as alíneas de tal n.º 2 pressupõem a existência de uma construção.
Assim, a al. a) daquele n.º reporta-se, expressamente, à “primeira transmissão ou locação do imóvel ocorrida após a construção”.
Já a al. b) subsequente, refere-se a operações após “grandes obras de transformação ou renovação, de que tenha resultado uma alteração superior a 30% do valor patrimonial tributável para efeito do imposto municipal sobre imóveis”.
Ora, a respeito da fixação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção, dispõe o artigo 45.º do CIMI aplicável que:
“1 - O valor patrimonial tributário dos terrenos para construção é o somatório do valor da área de implantação do edifício a construir, que é a situada dentro do perímetro de fixação do edifício ao solo, medida pela parte exterior, adicionado do valor do terreno adjacente à implantação.
2 - O valor da área de implantação varia entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas.
3 - Na fixação da percentagem do valor do terreno de implantação têm-se em consideração as características referidas no n.º 3 do artigo 42.º.
4 - O valor da área adjacente à construção é calculado nos termos do n.º 4 do artigo 40.º.”
Já o n.º 3 do artigo 42.º do CIMI, para o qual remete o n.º 3 daquele artigo 45º, dispõe que:
“3 - Na fixação do coeficiente de localização têm-se em consideração, nomeadamente, as seguintes características:
a) Acessibilidades, considerando-se como tais a qualidade e variedade das vias rodoviárias, ferroviárias, fluviais e marítimas;
b) Proximidade de equipamentos sociais, designadamente escolas, serviços públicos e comércio;
c) Serviços de transportes públicos;
d) Localização em zonas de elevado valor de mercado imobiliário.”
Por fim, o n.º 4 do artigo 40.º do CIMI, para o qual remete o n.º 4 do mesmo artigo 45.º, refere que:
“A área do terreno livre do edifício ou da fracção ou a sua quota-parte resulta da diferença entre a área total do terreno e a área de implantação da construção ou construções e integra jardins, parques, campos de jogos, piscinas, quintais e outros logradouros, aplicando-se-lhe, até ao limite de duas vezes a área de implantação (Ac), o coeficiente de 0,025 e na área excedente ao limite de duas vezes a área de implantação (Ad) o de 0,005.”.
Como se constata do regime do CIMI transcrito, o valor patrimonial tributário dos terrenos para construção, é insusceptível de ser alterado por “grandes obras de transformação” (sendo que, por natureza, as obras de renovação apenas poderão ter por objecto edifícios).
Com efeito, os critérios legais de fixação do VPT dos terrenos para construção não atendem às características intrínsecas do próprio terreno, reportando-se antes às características da construção autorizada ou prevista e às características envolventes do terreno em questão.
Ora, nem a construção autorizada ou prevista, nem as envolventes dos terrenos para construção são susceptíveis de aumentar de valor e função de obras realizadas no próprio terreno para construção.
Daí que, por impossibilidade absoluta, haverá com concluir que também a al. b) do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei 21/2007 de 29/01 será inaplicável aos terrenos para construção.
Por fim, a al c), reporta-se a operações subsequentes “a uma operação efectuada com renúncia à isenção”. Ora, a renúncia à isenção pressupõe, necessariamente, a verificação de uma das condições a que se reportam as alíneas anteriores (a) e (b).
Na medida em que, como se viu, não será possível a aplicação das als. a) e b) do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei 21/2007 de 29/01 aos terrenos para construção, necessariamente que a al. c) não o será também, uma vez que pressupõe a realização anterior de uma operação isenta, que só poderia ocorrer com base nas alíneas anteriores, o que é impossível.
Aqui chegados, uma de duas conclusões se terá de impor, a saber:
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Ou se conclui que não é possível a renúncia à isenção de IVA em operações relativas a terrenos para construção, uma vez que, relativamente a estes, é impossível o preenchimento das condições consagradas nas alíneas do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei 21/2007 de 29/01;
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Ou se conclui que aquele do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei 21/2007 de 29/01 não é aplicável aos terrenos para construção, admitindo-se a renúncia à isenção de IVA, desde que verificados os restantes requisitos exigidos por aquele Decreto-Lei 21/2007 de 29/01.
Ora, atendendo a que é o próprio Decreto-Lei 21/2007 de 29/01 que, no seu artigo 2.º, n.º 1, al. a), refere expressamente a admissibilidade da renúncia à isenção de IVA relativamente aos terrenos para construção, ter-se-á, em ordem a assegurar a coerência normativa do diploma em questão, de concluir pela segunda das hipóteses supra-formuladas, ou seja, pela inaplicabilidade do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei 21/2007 de 29/01 ao terrenos para construção, admitindo-se a renúncia à isenção de IVA, desde que verificados os restantes requisitos exigidos por aquele Decreto-Lei 21/2007 de 29/01.
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Posto isto, há que apurar se, como pretende o Requerente, está em causa uma operação relativa a terreno para construção, tal como pressuposto pelo Regime de renúncia à isenção do IVA nas operações relativas a bens imóveis, ou se, como sustenta a Requerida, tal não acontece.
Ressalvado o respeito devido a outros entendimentos, julga-se que o conceito de “terreno para construção” empregue no referido Regime, se deverá identificar com o conceito correspondente definido no CIMI, sob pena, para além do mais, de se gerarem incongruências, como as que perpassam pelo RIT, de que adiante se dará nota.
É que, tendo o próprio legislador do Regime de renúncia à isenção do IVA nas operações relativas a bens imóveis, optado por conexionar tal regime, para determinados efeitos, ao regime do CIMI, designadamente ao dar relevância, para efeitos do Regime em causa, ao valor patrimonial tributário, dever-se-á, em ordem a assegurar a coerência normativa desse mesmo Regime, manter tal correspondência.
Acresce que não se destrinça no Regime de renúncia à isenção do IVA nas operações relativas a bens imóveis a utilização de conceitos incompatíveis, distintos, ou, sequer, mistos, dos utilizados no CIMI.
Neste contexto, não optar pela correspondência entre o conceito de “terreno para construção” utilizado no Regime ora em causa, e o CIMI, redundaria em situações, como a dos autos, em que um terreno para construção, como tal qualificado e avaliado para efeitos do CIMI, vê o seu VPT diminuído substancialmente, não obstante a realização de construções de valor avultado, devido ao facto de, justamente, o CIMI não atender, na fixação do VPT correspondente, a tais construções, até à qualificação do imóvel como prédio urbano habitacional, comercial, industrial ou para serviços.
Nota-se, por fim, ainda a este respeito, que não se descortina, nem é sugerida pela AT, qualquer tipo de perturbação normativa pelo entendimento exposto, nem que outra solução corresponda à tutela necessária de quaisquer valores jurídicos relevantes que, na matéria haja de acautelar.
Assim, não obstante afirmar a Requerida que “no IVA dá-se uma prevalência à realidade material sobre a realidade formal”, o certo é que, por um lado, não concretiza em que é que a materialidade efectiva da situação justifica tratamento distinto daquele que resulta da letra da lei acima interpretada, e, por outro, tal materialidade, confessadamente, consiste em estar em causa um “prédio parcialmente construído”, categoria esta não autonomizada no Regime de renúncia à isenção do IVA nas operações relativas a bens imóveis, e que, face ao CIMI, não deixa de ser qualificável como “terreno para construção”, não adiantando ou sugerindo a Requerida qual o tratamento a dar a tal realidade dentro das possíveis categorias enquadráveis no Regime em causa, nem quais os critérios normativos a seguir para determinar tal tratamento, designadamente, e por exemplo, a partir de que nível (bruto?, percentual?) de construção um “terreno para construção” deixaria de ser qualificável como tal, no quadro do Regime em apreço.
Por fim, e passando já para o assinalar das incongruências atrás aludidas, a posição assumida pela AT em sede inspectiva, e sustentada em sede arbitral, conduz ao paradoxo, expresso no RIT, de não considerar o imóvel em questão como “terreno para construção”, por ter já sido objecto de construção parcial, mas recusar a aplicação da al. a) do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei Lei 21/2007 de 29/01, por o imóvel estar ainda “em fase de construção”...
Deste modo, e face a todo o exposto, conclui-se que, no caso, está em causa uma operação relativa a “terreno para construção”, para efeitos do Regime de renúncia à isenção do IVA nas operações relativas a bens imóveis, e que a tais operações não são aplicáveis os requisitos objectivos plasmados no n.º 2 do artigo 2.º daquele Regime, pelo que será de julgar ilegal o primeiro dos fundamentos dos actos tributários ora contestados pelo Requerente.
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Relativamente ao total de € 954.000,90, abrangido pela correcção operada ao abrigo do fundamento anteriormente analisado, considerou ainda a AT que as facturas a que se refere o Anexo C do contrato de cessão da posição contratual entre o Requerente e a E..., reportam-se a operações ocorridas entre Abril de 2012 e Maio de 2013, em data anterior, portanto, à outorga da escritura pública de aquisição do imóvel em questão nos autos, bem como daquele contrato de cessão da posição contratual.
Face a tal circunstância, entendeu a AT que não estão em causa fornecimentos de bens e serviços efectivamente prestados ao Requerente, e que, por outro lado, tais bens e serviços integram as benfeitorias do imóvel adquirido pelo Requerente ao B..., estando, portanto, incluídos no valor de €8.400.000,00 pagos por aquelas.
Acrescentou-se, ainda, no RIT que “esta emissão e/ou remissão de faturas pelos fornecedores e prestadores de serviços viola as regras básicas de emissão de faturas, designadamente quanto aos prazos de emissão, à identificação do destinatário ou adquirente e à data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente ou os serviços realizados”.
Constata-se, assim, que o fundamento das correcções operadas ora em análise, assenta, essencialmente, em duas ordens de razão, a saber:
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A circunstância de os fornecimentos de bens e serviços prestados terem ocorrido em período anterior à aquisição do imóvel pelo Requerente; e
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A circunstância de os mesmos integrarem as benfeitorias no imóvel adquiridas pelo Requerente pelo valor de €8.400.000,00.
Sempre ressalvado o respeito devido a outros entendimentos, considera-se que nenhuma das circunstâncias referidas é apta a sustentar as consequências jurídicas retiradas pela AT.
Assim, e no que diz respeito à primeira das circunstâncias apontadas, desconsiderou a AT que, como resulta dos factos provados e se encontrava já demonstrado em sede inspectiva, o pagamento pelo Requerente das facturas em questão ocorreu na sequência de um contrato de cessão da posição contratual, pelo qual aquele assumiu a posição da E... nos contratos subjacentes aos fornecimentos de bens e serviços, notando-se que, em momento algum, a AT questionou ou pôs em causa, por qualquer forma, seja a normalidade, necessidade ou efectividade da cessão da posição contratual referida, seja o efectivo fornecimento de bens e serviços subjacentes às facturas em causa, bem como do respectivo pagamento.
Ora, no quadro de tal cessão da posição contratual, estava, inquestionavelmente, o Requerente obrigado a fazer os pagamentos em questão (salientando-se que se está, não perante uma mera assunção de dívida, mas perante uma cessão da posição contratual, que implica, justamente, que o cessionário assuma a posição jurídica do cedente, nos contratos onde se deu a cessão da posição deste) sendo que, de maneira igualmente evidente, estavam os fornecedores de bens e serviços obrigados e emitir factura, nos termos do artigo 29.º/1/b) do CIVA, para receber o respectivo pagamento.
Ora, tal factura, como não pode deixar de ser, haverá de ser emitida em nome do cessionário da posição contratual, e não do cedente. Face a tal emissão, deverão os respectivos emitentes proceder às correcções necessárias relativamente a facturação, dos mesmos bens ou serviços, que hajam emitido a favor do cedente, que não as liquidou, sendo certo que qualquer incorrecção que nesse procedimento se verifique, se repercutirá nas esferas jurídicas e fiscais dos fornecedores e do cedente, e nunca na do cessionário.
De resto, carece de qualquer sentido a decorrência do entendimento seguido pela AT, que é a de que havendo uma cessão da posição contratual, os pagamentos feitos pelo cessionário de dívidas anteriores à cessão hajam de ser facturados ao cedente ... que não as pagou ...
E não se diga, como ocorre no RIT, que são violadas as regras de emissão de facturas, designadamente quanto aos prazos de emissão, à identificação do destinatário ou adquirente e à data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente ou os serviços realizados.
Com efeito, é claro que as facturas a emitir ao cessionário deverão ter todos os elementos legalmente exigidos, correctamente incluídos, sendo que como adquirente deverá figurar aquele (o cessionário), pois por via da cessão da posição contratual, assumiu tal posição, no quadro das relações contratuais objecto de cessão.
Por outro lado, e no que diz respeito às restantes menções obrigatórias indicadas (prazos de emissão, identificação do destinatário ou adquirente e data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente ou os serviços realizados), é o RIT absolutamente omisso na matéria, não indicando quer as menções que constam nas facturas em causa, quer as que deviam constar, nem quais as consequências daí decorrentes, sendo que as incorrecções dos referidos dados não implicam, de um ponto de vista abstracto e necessário, a exclusão do direito à dedução ora em causa.
Do único fundamento de facto invocado no RIT e devidamente comprovado – a circunstância de os bens e serviços terem sido fornecidos em data anterior à aquisição do imóvel pelo Requerente – não se pode retirar, sem mais, como ocorreu, a conclusão de que a facturação emitida está incorrecta.
Também a conclusão de que o valor das despesas pagas pelo Requerente, ora em questão, estará integrado nas benfeitorias no imóvel adquiridas pelo Requerente pelo valor de €8.400.000,00, carece, igualmente, de suporte factual bastante.
Com efeito, o que se apura é que no quadro de relações contratuais complexas, envolvendo o B... e a E..., o Requerente adquiriu ao primeiro o terreno destinado à edificação do ... Shopping e as obras até aí executadas, e, em ordem a tomar para si os direitos sobre o imóvel que na relação contratual anterior existente entre o B... e a E... assistiam a esta, negociou com a mesma a cessação de tal relação contratual, sendo que, no quadro do acordo alcançado, assumiu a posição contratual da E... nos contratos relativos ao desenvolvimento do projecto ... Shopping em curso.
Ora, destas circunstâncias não resulta, para lá de qualquer dúvida razoável, que o preço atribuído às benfeitorias no contrato de compra e venda outorgado pelo Requerente com o B..., inclua os bens e serviços a que se reporta o Anexo C do contrato de cessão de posição contratual outorgado, também pelo Requerente com a E... .
Face aos dados apurados, poderá ser esse o caso, ou poderá não ser, sendo que o mais provável, no caso, será não ser, já que ao B... o Requerente adquiriu o imóvel onerado com o contrato daquele Banco com a E..., pelo que, à luz de um juízo de normalidade, o valor do imóvel vendido pelo B... terá sido descontado de tal ónus, que o Requerente removeu, para além do mais, com o custo da cessão da posição contratual.
De resto, a Requerida na sua Resposta parece não enquadrar devidamente a factualidade em questão, afirmando que “A partir daquele momento (da aquisição), o Requerente passou a assumir a posição contratual da E... no desenvolvimento do projecto do ... Shopping”. Tal asserção requer correcção, desde logo, na medida em que não é a partir (por força) da aquisição do imóvel, que o Requerente assumiu a posição contratual da E..., mas sim, por força do contrato de cessão da posição contratual celebrado com esta. Por outro lado, a posição contratual que o Requerente assumiu, não foi a que a E... tinha no desenvolvimento do ... Shopping, já que tal posição tinha como contraparte o B..., enquanto proprietário do imóvel, e extinguiu-se com a revogação do contrato de locação financeira celebrado entre aquele banco e a E..., mas a posição contratual desta para com os seus fornecedores, que foi condição, para além do mais, da revogação da referida locação financeira.
Não será assim, ao contrário do afirmado pela Requerida “completamente descabida a assunção de tal responsabilidade perante a E...”, já que tal assunção foi condição da extinção da posição da E... no contrato de locação financeira outorgado com esta pelo B..., cuja posição, por via da aquisição do imóvel, passaria para a Requerente.
Não é igualmente correcta a afirmação, formulada na Resposta da Requerida, segundo a qual “os fornecimentos constantes de tais facturas são efectivamente inputs de uma operação, mas da operação de compra e venda do terreno e respectiva construção ali existente, entre a E... e o Requerente e não entre este e o sucessivo adquirente”, já que a compra e venda do terreno não teve como parte a E..., e o Requerente nada lhe adquiriu, tendo, como se referiu já, unicamente negociado com a mesma a extinção do contrato de locação financeira entre aquela e o B..., que tinha por objecto do imóvel adquirido pelo Requerente, e no qual, não fora a extinção negociada, este sucederia àquele Banco.
Assim, e por todo o exposto, julga-se que o fundamento factual apurado e valorado no RIT, em que se apoiam as correcções ora em apreço, é insuficiente para sustentar a conclusão de que estamos perante uma duplicação de encargos.
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Deste modo, face aos apontados erros de facto e de direito subjacentes às correcções em que assentam as liquidações objecto da presente acção arbitral, deverão as mesmas ser anuladas procedendo integralmente o pedido arbitral.
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No que diz respeito ao pedido de Reenvio Prejudicial para o TJUE, formulado pelo Requerente, a título subsidiário, analisadas as matérias em presença e tendo em consideração as conclusões obtidas, entende este Tribunal Arbitral não ser necessário promover o mesmo, por ter à sua disposição todos os elementos necessários para proferir a presente decisão.
Em consequência, indefere-se o pedido de Reenvio Prejudicial apresentado pela Requerente.
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Quanto ao pedido de juros indemnizatórios formulado pelo Requerente, o artigo 43.º, n.º 1, da LGT estabelece que são devidos juros indemnizatórios quando se determine, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
No caso, os erros que afectam as liquidações anuladas é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira, que praticou o acto de liquidação por sua iniciativa, sem o necessário suporte factual e legal.
Tem, pois, direito a ser reembolsado o Requerente da quantia que pagou (nos termos do disposto nos artigos 100.º da LGT e 24.º, n.º 1, do RJAT) por força dos actos anulados e, ainda, a ser indemnizado pelo pagamento indevido através do pagamento de juros indemnizatórios, pela Requerida, desde a data do pagamento da quantia, até reembolso, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.
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C. DECISÃO
Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar integralmente procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:
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Anular o acto de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado n.º ... de 2016, e correspondentes demonstrações de liquidação e liquidações de juros, no valor total de € 1.204.150,68, conforme o seguinte quadro:
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Condenar a Requerida no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos acima indicados;
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Condenar a Requerida nas custas do processo, no montante de € 16.524,00.
D. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 1.204.150,68, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
E. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 16.524,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela AT, uma vez que o pedido foi totalmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.
Notifique-se.
Lisboa, 14 de Maio de 2018
O Árbitro Presidente
(José Pedro Carvalho)
O Árbitro Vogal
(Sílvia Oliveira)
O Árbitro Vogal
(Clotilde Celorico Palma)
[1] A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto transcrições efectuadas.
[2] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.
[3] Cfr. , nesse sentido, o Ac. do STA de 23-09-2015, proferido no processo 0134/11, onde se pode ler que “É exclusivamente à luz da fundamentação externada pela AT quando da prática da liquidação adicional de IVA que deve aferir-se a legalidade desse acto tributário.”