Decisão Arbitral
Os árbitros José Baeta de Queiroz (presidente), Emanuel Augusto Vidal Lima e João Taborda da Gama (vogais), designados pelo Conselho Deontológico de Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral, constituído em 21-06-2017, acordam no seguinte:
I. RELATÓRIO
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A…, Lda., NIF…, com sede na Rua …, n.º…, r/c, dto., …-… … (doravante “Requerente”), apresentou um pedido de pronúncia arbitral e de constituição de Tribunal Arbitral no dia 2 de abril de 2017, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro [Regime Jurídico da Arbitragem Tributária], em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “AT” ou por “Requerida”).
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A Requerente pretende com o pedido de pronúncia arbitral que seja «declarada a ilegalidade e subsequente anulação dos atos de liquidação de IRC e de IVA, relativos a 2015, ordenando-se a restituição (…) dos impostos indevidamente pagos acrescidos de devidos juros indemnizatórios».[1]
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O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD em 3 de abril de 2017 e notificado à Requerida em 19 de abril de 2017.
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A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º do RJAT, os signatários foram designados como árbitros, em 5 de junho de 2017, pelo Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.
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Na mesma data, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados das alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
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Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 21 de junho de 2017, tendo sido proferido despacho arbitral na mesma data no sentido de notificar a Requerida para «em trinta dias responder juntar cópia do processo administrativo e solicitar, querendo, a produção de prova adicional».
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Em 11 de setembro de 2017, a Requerida apresentou a sua resposta, tendo-se defendido por impugnação e concluído a mesma no sentido de que «deverá ser proferida decisão que determine a improcedência do presente pedido de pronúncia arbitral, absolvendo-se a Requerida dos pedidos, com todas as consequências legais».
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Na sua resposta a Requerida começa por defender que a cumulação de impugnações deduzida pela Requerente, que pretende ver apreciados, no mesmo processo arbitral, um ato de liquidação de ITC e outro de IVA, é ilegal, pelo que deve a Requerente ser notificada para optar pela sindicância de um ou outro ato, sob pena de absolvição da instância. Alega que os factos a atender têm relevância díspar conforme os impostos em causa, e que as normas jurídicas ao abrigo de que praticou os dois atos não são as mesmas.
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Em 14 de setembro de 2017, foi proferido despacho arbitral que decidiu o seguinte, a propósito da exceção referida, invocada pela Requerida, sobre a alegada cumulação ilegal de pedidos:
«A propósito de casos como o presente, em que estão em causa um imposto sobre o rendimento e outro sobre o consumo, a jurisprudência do STA entendeu, no passado, que a cumulação de impugnações era impossível. Ela só seria admitida quando os impostos liquidados comungassem da mesma natureza, ou seja, fossem, todos, ou sobre o rendimento, ou sobre o consumo, ou sobre o património.
Essa jurisprudência foi abandonada e, hodiernamente, o STA vem decidindo que não há obstáculo a que se impugnem, no mesmo processo, atos de liquidação de IRC e de IVA. E isto tendo como base a norma do artigo 104.º do CPPT, aparentemente mais exigente do que a que vigora na arbitragem tributária: enquanto que o artigo 104.º do CPPT implica a “identidade da natureza dos tributos”, o RJAT, pelo seu artigo 3.º, n.º 1, satisfaz-se com que a sindicância dos atos dependa da “apreciação das mesmas circunstâncias de facto e (…) interpretação dos mesmos princípios ou regras de direito”.
Sabe-se que a permissão da cumulação de impugnações assenta em razões de economia processual, de celeridade, de facilitação do acesso ao direito a uma tutela jurisdicional, e de evitação de julgados contraditórios.
Todos esses motivos confluem no caso em apreço. Ademais, as circunstâncias de facto são coincidentes, apuradas num único ato inspetivo, e os princípios e regras de direito, não sendo exatamente os mesmos, são próximos e interdependentes. Uma exigência excessiva, no tocante ao pressuposto relativo aos princípios e regras de direito a considerar, levaria a que raras vezes pudesse ser admitida a cumulação, mesmo em casos que, como o que nos ocupa, se está perante uma única atividade da AT da qual nasce, apurados os factos, uma pluralidade de atos tributários de liquidação.
Pode dizer-se que o que pretende a Requerente é sindicar a atuação da AT fincada numa única ação inspetiva e assente nos factos então apurados, pelo que mal se entenderia que, para o fazer, se lhe impusesse intentar vários processos arbitrais. A “relevância díspar” dos factos, face aos diversos impostos, invocada pela AT, não se afigura relevante perante o RJAT, que não exige mais do que a identidade das circunstâncias de facto.
A jurisprudência do STA a que se fez referência consta, designadamente, das decisões proferidas em 24/10/2012 e 22/03/2017 nos processos 747/12 e 36/17, respetivamente.
No sentido ora propugnado pode ver-se, do CAAD, o acórdão proferido no processo 209/2015-T em 27/04/2016.
Nos termos e pelos fundamentos expostos, indefere-se a pretensão da Autoridade Tributária, julgando-se legal a cumulação de impugnações.»
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No mesmo despacho, foi decidido pelo Tribunal Arbitral, em consonância com os princípios processuais consignados no artigo 16.º do RJAT, da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo e na determinação das regras a observar [alínea c)], da cooperação e da boa fé processual [alínea f)] e da livre condução do processo consignado nos artigos 19.º e 29.º, n.º 2, do RJAT, tendo ainda em conta o princípio da limitação de atos inúteis previsto no artigo 130.º do Código do Processo Civil (aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT), prescindir da realização da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, « já que não foi requerida a produção de prova adicional nem há outras questões a discutir nessa sede, sendo que o reenvio prejudicial sugerido pela AT se não mostra necessário, ao menos nesta fase do processo.»
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As partes não se pronunciaram relativamente ao teor do despacho arbitral referido no ponto imediatamente supra.
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Em 19 de setembro, a Requerida remeteu ao CAAD o processo administrativo.
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Tendo-se esgotado o prazo marcado para alegações, sem que as partes o tenham feito, e não tendo sido proferido oportuno despacho a designar a data da decisão foi, por esse motivo, e ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 21.º do RJAT, a mesma prorrogada por dois meses, anunciando-se que tal decisão seria proferida até ao dia 21 de fevereiro de 2017.
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O tribunal foi regularmente constituído e é competente.
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As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março) e estão devidamente representadas.
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O processo não enferma de nulidades.
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Não há obstáculos à apreciação do mérito da causa.
II. MATÉRIA DE FACTO
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Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos:
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A Requerente A…, Lda. é uma sociedade que se dedica à compra e venda de bens imobiliários (CAE 68.100), com o número de identificação fiscal …, e está enquadrada no regime do artigo 9.º do CIVA (isenções nas operações internas) e no regime geral do IRC. Tem sede e domicílio fiscal na Rua…, n.º…, r/c, dto., em …, na área do serviço de finanças de … … (…);
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Em 11 de maio de 2009, através de escritura pública, a Requerente celebrou um contrato com o Município de … de acordo com o qual cedeu a este Município uma parcela de terreno com a área de 134.235 m2, destinada à implantação do “Parque Urbano da Cidade”, obtendo como contrapartida direitos de construção de 100.000 m2, em parcelas adjacentes com a área global de 65.149 m2 (cf. pp. 14 a 22 do PA);
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Os direitos de construção previam que os prédios a construir nessas parcelas sobrantes tivessem uma área bruta de construção de 100.000 m2 acima do solo, destinada a comércio, serviços, habitação e equipamentos, incluindo hotelaria e similares (cf. pp. 14 a 22 do PA);
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Em 5 de junho de 2009, a escritura de cedência referida foi objeto de pequenas retificações no que respeita à descrição dos prédios e respetivas áreas, designadamente no que se refere à parcela de terreno cedida pela Requerente cuja área foi fixada em 133.641 m2 (cf. pp. 24 a 29 do PA);
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Nos termos da cláusula terceira do contrato celebrado entre a Requerente e o Município, a prestação a que se referem as alíneas b) e c) considerava-se não verificada se, até 31 de dezembro de 2010, o planeamento existente não permitisse a construção nas parcelas sobrantes;
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Não tendo o Município viabilizado a alteração do planeamento existente de modo a permitir a referida construção nas parcelas sobrantes até 31 de dezembro de 2010, e porque o terreno cedido antecipadamente ficou definitivamente no património do Município, a Requerente propôs junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga uma ação administrativa comum, que correu termos sob o n.º …/13… BENRG, para reclamar o pagamento da compensação, de € 15.000.000,00, prevista na cláusula oitava do contrato de cedência (pp. 31 a 39 do PA);
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Todavia, a Requerente e o Município acordaram em pôr fim ao referido processo judicial mediante a celebração de transação judicial apresentada em 2015-11-24 e cuja sentença homologatória de 2015-11-31 transitou em julgado em 2016-01-12 (pp. 55 a 59 do PA);
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A referida transação judicial deveu-se ao facto de ter sido celebrado, em 2015-07-08, um contrato de urbanização entre o Município de … e a Requerente, aprovado por visto do Tribunal de Contas de 2015-10-06 (pp. 41 a 53 do PA);
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Com efeito, em 8 de julho de 2015, a Requerente e o Município celebraram um contrato de urbanização em que acordaram que a área de construção passaria a ser apenas de 60.000 m2 em vez dos 100.000 m2 inicialmente previstos. Em consequência, face à redução da capacidade construtiva, o Município assumiu a obrigação de compensar a Requerente no valor global de € 4.900.000,00 (cf. pp. 45 a 48 do PA);
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A AT levou a cabo uma ação inspetiva à Requerente, ao abrigo da ordem de serviço OI2016…, de 2016-07-19, da Direção de Finanças de Braga;
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Nessa ação inspetiva à atividade da Requerente relativa ao ano de 2015, foi elaborado o Relatório da Inspeção Tributária que consta do processo administrativo (pp. 65 a 76), cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:
II.2 Motivo, âmbito e incidência temporal
A presente ação de inspeção, foi efetuada de acordo e nos termos da metodologia da inspeção dirigida aos contribuintes enquadrados no cadastro do acompanhamento permanente.
A Ordem de Serviço é de âmbito parcial em IRC e IVA, para o período de 2015.
III. Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria coletável
Analisada a atividade desenvolvida pelo sujeito passivo, constatamos que no período de 2015 obteve rendimentos decorrentes de um acordo extrajudicial que realizou com o Município de …, relacionado com a cedência de terrenos à Câmara Municipal para a ampliação da zona de implantação do Parque Urbano da Cidade ou da … e o não cumprimento das obrigações por parte do município em que consistia atribuir como contrapartida o direito de construção (urbanização) nas partes sobrantes, sendo para isso necessário a alteração do planeamento existente de loteamento e construção.
III.1. Enquadramento dos factos
Em 2009-05-11 por escritura pública a empresa A… adquire o prédio misto sito na freguesia de …– … (código freguesia…), inscrito na matriz urbana sob os artigos…, …, … e … e na matriz rustica sob o artigo …, denominado “Quinta … ou Quinta …” por 5.000.000,00 EUR, com uma área total de 199.384 metros quadrados, à empresa B…, SA, com o NIPC … .
No mesmo dia foi celebrada a escritura de “Cedência” entre a A… e o Município que se junta como anexo 1, em que a sociedade A… cedeu ao Município uma parcela de terreno atrás referido com a área de 134.235 m2, para exclusiva implantação do Parque Urbano da Cidade, usufruindo como contrapartida o direito de nas duas parcelas restantes com a área total de 65.149 m2, o constante da terceira cláusula – “…TERCEIRA: Os prédios a construir nessas parcelas sobrantes terão de possuir uma área de cem mil metros quadrados acima do solo, destinados a comércio, serviços, habitação e equipamentos, incluindo hotelaria e similares;…”.
Em 2009-06-05 retificaram a escritura de “Cedência” por inexatidões na descrição do prédio cedido à Câmara de … . (Anexo 2)
O terreno cedido foi, resumidamente, desanexado do artigo rústico … com o código de freguesia …, dando origem ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo…, atualmente artigo … com o código de freguesia …, dando origem ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …, atualmente artigo … com o código de freguesia … por força da Reorganização Administrativa do território das freguesias.
Na quinta clausula do contrato de “Cedência” estava estipulado “…”QUINTA: Tem-se por não verificado definitivamente o efeito referido nas cláusulas segunda, terceira e quarta se e impreterivelmente até 31 de Dezembro de 2010, o planeamento existente não permitir construir, nas duas parcelas sobrantes, como se considerou na cláusula terceira;…”.
Passada a data limite, o Município não promoveu a alteração do planeamento existente para que fosse possível o sujeito passivo requerer o licenciamento de área bruta de construção nas já referidas parcelas sobrantes de 100.000 m2, como determinado na terceira cláusula.
Resultado da não alteração do planeamento existente, o sujeito passivo procedeu à entrega de uma Ação Administrativa Comum no Tribunal Administrativo de Braga contra o Município de …, processo n.º …/13… BEBRG (anexo 3), reclamando 15.000.000,00 EUR, fundamentando-se no previsto na cláusula quarta do Contrato, que determina o valor de 150,00 EUR de compensação por m2 de construção que não for licenciado, obtendo-se assim um valor de 15.000.000,00 EUR.
Tendo o Município apresentado contestação à Ação Administrativa Comum e consequente réplica da empresa A…, foi determinado pelo Tribunal o indeferimento da pretensão do Município.
Posteriormente, por despacho de 2015-10-06 do Tribunal de Contas, foi aprovado o “Contrato de Urbanização” celebrado a 8 de julho de 2015 entre o Município e a empresa A…, que se junta cópia ao presente relatório como anexo 4, em que está estipulado vários direitos e obrigações , particularmente a permissão de licenciamento de construção nas parcelas sobrantes de 60.000 m2 e não os 100.000 m2 e por compensação dessa diminuição de capacidade construtiva o valor monetário de 4.900.000,00 EUR (clausula terceira, quarta e quinta). Nesse mesmo “Contrato de Urbanização”, está definido que o vencimento das prestações e dos juros será “…depois da data do trânsito em julgado da transação que será apresentada no processo judicial n.º …/13… BEBRG…”. (clausula sétima)
Em 2015-11-30, o TAF de Braga proferiu a sentença no referido processo judicial, considerando extinta a Ação, em virtude de as partes “…acordaram pôr fim ao processo mediante transação nos termos das clausulas dele constantes…”.
O acordo estabelecido na “Transação” define a redução do pedido da empresa A… de 15.000.000,00 EUR par 600.000 EUR e a taxa de juro anual fixa de 2,5% contados dia a dia sobre o capital que se encontrar em dívida em cada momento. (anexo 5 – Sentença do processo 1278/13.5BEBRG)
III.2.1. Enquadramento fiscal em sede de IRC
Perante os factos ocorridos e analisados os rendimentos declarados no ano de 2015, verificamos que o sujeito passivo considerou o rédito de 600.000,00 EUR referente ao acordo judicial estabelecido pela homologação da “Transação”, mas não reconheceu para efeitos de IRC o montante de 4.900.000,00 EUR referente à compensação obtida pela diminuição da área de construção nas parcelas sobrantes, pelo acordo celebrado no já referido “Contrato de Urbanização” em 2015-07-08, infringindo o estipulado no artigo 20.º n.º 1 alínea i) do Código de IRC.
Do valor global de 4.900.000,00 EUR referido, deverá ser reconhecido para efeitos de tributação em sede de IRC o montante de 3.983.739,84 EUR, uma vez que se considera o valor acordado com IVA incluído, como determinado e justificado na parte final do ponto seguinte referente ao imposto IVA.
Assim, na determinação do lucro tributável do período de 2015, conforme o estipulado no artigo 17.º do CIRC conjugado com o artigo 18.º do mesmo diploma, não foi considerado como rendimento o valor 3.983.739,84 EUR, referente à compensação acordada em 2015-07-08.
De referir que após análise detalhada da situação, constatamos que o sujeito passivo reconheceu como rédito os 600.000,00 EUR em 2015, quando a data do transito em julgado da sentença foi em 2016-01-12, pelo que tal rendimento deverá ser reconhecido no período de 2016 e consequentemente anulado em 2015, como determina o artigo 18.º do CIRC.
III.2.2. Enquadramento fiscal em sede de IVA
- Do princípio da aplicação geral do IVA a todas as transações comerciais, qualquer que seja a sua natureza, decorre que, na definição da base de incidência, ou campo de aplicação, se tente apreender a matéria mais ampla possível abarcando toda a atividade económica em geral, sendo que, a contraprestação obtida, no âmbito do exercício de uma atividade económica, está, por princípio sujeita a IVA.
- De acordo com o n.º 1 do art.º 3.º do CIVA, considera-se, em geral, transmissão de bens a transferência onerosa de bens corpóreos por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade.
- Por sua vez, nos termos do n.º 1 do artigo 4.º do CIVA, o conceito de prestação de serviços é definido do seguinte modo: “São consideradas como prestações de serviços as operações efetuadas a título oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens”.
- No código do IVA, o conceito de prestação de serviços é aqui de natureza económica e ultrapassa a definição jurídica dada pelo art. 1154.º do Código Civil, abrangendo a transmissão de direitos, obrigações de conteúdo negativo (não praticar determinado ato) e ainda a prestação de serviços coativa (cf. Artigo 6.º n.º 1 da antiga 6.ª Diretiva, entretanto reformulada, tendo dado origem à atual Diretiva 2006/112/CE, art. 25.º).
- O montante a receber pela sociedade A…, seja ele qualificado como indemnização ou mera compensação, configura-se, na sua essência, como uma contraprestação, que remunera uma operação, ou seja, a redução da capacidade construtiva acordada e dos correspondentes direitos que se lhes encontram associados, no âmbito do exercício de uma atividade económica estando, por via de tal facto, sujeita a IVA e dele não isenta.
O art. 562.º do Código Civil estabelece o princípio geral da obrigação de indemnização, referindo que quem estiver obrigado a repara um dano deve reconstituir a obrigação que existiria, se não tivesse verificado o evento que obriga à reparação.
- Por sua vez o n.º 1 do art. 564.º daquele Código estipula que o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência de lesão (lucros cessantes).
- O devedor que não cumpriu a prestação a que estava contratualmente vinculado vê-se na necessidade de reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, isto é, deve satisfazer o interesse que resultaria do cumprimento perfeito interesse positivo ou de cumprimento. (Mota Pinto, Direito Civil, 1980-158).
- Para enquadramento da questão da sujeição ou não das quantias a título de indemnização ou penalização, há que ter em conta o princípio subjacente do IVA, como imposto sobre o consumo, e que corresponde ao disposto na Diretiva IVA – Diretiva 2006/112/CE, pretendendo tributar a contraprestação de operações tributáveis e não a indemnização de prejuízos que não tenham caráter remuneratório.
- Não obstante, se as indemnizações ou penalizações sancionarem a lesão de qualquer interesse, sem caráter remuneratório, porque não remuneram qualquer operação, antes se destinam a reparar um dano, não são tributáveis em IVA, na medida em que não têm subjacente uma transmissão de bens ou prestação de serviços, o que, manifestamente, não sucede no caso em apreço.
- Ao invés, se a indemnização se destinar a compensar os lucros cessantes, a repor o nível de rendimento que, por força de um dano, o sujeito passivo deixou de obter, já estaremos perante uma operação sujeita a IVA, devendo ser liquidado imposto na sua atribuição.
Tendo presente a situação em apreço, o valor de 4.900.000,00 EUR referente ao acordo sustentado no “Contrato de Urbanização”, como compensação pela diminuição da área de construção permitida nas parcelas sobrantes, no que respeita à sujeição a IVA deste montante, temos o seguinte:
O montante de 4.900.000,00 EUR, constante no “Contrato de Urbanização” visa a compensação de só permitir a construção de uma área de 60.000 m2 nas parcelas sobrantes, quando no momento da cedência do terreno para a implantação do Parque da Cidade, foi celebrado um acordo de 100.000 m2, assim nestes termos estamos perante uma operação que tem como objetivo compensar proveitos que não poderão acontecer em virtude deste novo acordo (lucros cessantes), na medida que tem subjacente a contraprestação de uma operação tributável e por isso de caráter remuneratório, a mesma é passível de tributação em sede de IVA, como decorre do artigo 16.º, conjugado com a alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º e artigo 4.º, todos do Código do IVA, sendo tributada à taxa normal (23%) prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 18.º do mesmo diploma.
Atenta a definição de prestação de serviços de caráter negativo preconizada na alínea b) do artigo 25.º da Diretiva IVA (Diretiva 2006/112/CE de 28.11.2016) enquanto obrigação de não fazer ou de tolerar um ato ou uma situação”, será forçoso considerar que os lucros cessantes se afiguram como uma obrigação de non facere, uma vez que tolerar a redução da capacidade contributiva e prescindir mediante remuneração deste direito, configura-se como numa compensação pelos rendimentos deixados de auferir e, portanto, uma prestação de serviços à luz daquela norma comunitária.
Logo, tendo em consideração que o valor foi determinado pelas partes sem referência ao IVA e o prestador do serviço é o devedor do IVA devido sobre a operação tributada, consideraremos que o valor convencionado já inclui o IVA, pelo que o sujeito passivo deveria ter liquidado IVA como lhe competia, o montante de 916.260,16 EUR (4900.000,00 x 23/123) para o período 2015/07, data do acordo celebrado pelo já referido “Contrato de Urbanização”.
IX. Direito de audição – Fundamentação
[…] Analisada a petição enviada pelo sujeito passivo respeitante ao projeto de relatório, cumpre-nos informar o seguinte:
- Importa referir que no ponto 1. da petição, o sujeito passivo aponta como período proposto para tributação por parte da AT seja 2016, quando está em causa 2015;
- Relativamente à tributação em sede de IRC no período de 2015 do montante 3.983.739,84 EUR, valor acordado em 2015-07-08 como compensação pela diminuição da área de construção, o sujeito passivo alega que os rendimentos a tributar em cada período, deverão ser conforme as prestações de pagamento se vencerem nesse período. Ora, tendo em conta o enquadramento em que o sujeito passivo se encontra e a operação concretizada, tal pretensão não tem suporte legal, contraria sim, a periodização do lucro tributável que está definida no CIRC, no seu artigo 18.º, n.º 1, em que “… Os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica…”.
- Quanto à correção em sede de IVA, o sujeito passivo alega o enquadramento errado por parte da AT da situação em causa, que tal valor se refere a “… um mero caráter reparatório da perda sofrida no valor do seu imóvel…”, e que não estaria sujeito a IVA, não comprovando tal consideração e suporte legal para tal pretensão. Para o efeito temos a reforçar a fundamentação exposta neste relatório, que de facto não estamos perante uma indemnização por reparação de um mero dano, mas sim uma compensação pelo não exercício de um direito, de prescindir de obter rendimentos e por isso a consideração de uma operação tributável em sede de IVA.
Assim sendo, o sujeito passivo não evidencia quaisquer outros elementos que suscitem alterações às correções inicialmente propostas, pelo que as correções manter-se-ão.
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Na sequência da inspeção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu as liquidações, referidas no pedido de pronúncia arbitral (p. 1 do pedido):
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Liquidação de IVA e respetivos juros compensatórios e juros de mora com o n.º 2016…, no valor global de € 961.685,84 (cf. doc. 1 e doc. 2 anexos ao pedido – Modelos 50);
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Liquidação de IRC e respetivos juros compensatórios com o n.º 2016…, no valor global de € 918.960,97 (cf. doc. 3 anexo ao pedido – demonstração de acerto de contas).
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Em 3 de abril de 2017, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral, que deu origem ao presente processo, através do qual pretende, como já se referiu, que seja «declarada a ilegalidade e subsequente anulação dos atos de liquidação de IRC e de IVA, relativos a 2015, ordenando-se a restituição (…) dos impostos indevidamente pagos acrescidos de devidos juros indemnizatórios».
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Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral e nos que fazem parte do processo administrativo.
Não há factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.
III. MATÉRIA DE DIREITO
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A Requerente fundamenta o seu pedido com os seguintes argumentos:
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Em sede de IVA
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Que não se descortina que lucros cessantes foram indemnizados à Requerente;
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Que a quantia atribuída à requerente não pretendeu compensá-la por qualquer valor que tenha deixado de obter, mas sim pelo facto das cedências a mais que teve de fazer ao Município, no pressuposto que a parcela que manteve na sua propriedade teria determinada capacidade construtiva, o que não veio a acontecer;
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Ou seja, a indemnização pretendeu compensar a requerente pela perda de valor do seu terreno, a que as partes haviam atribuído o montante de € 1.500.000,00, nada mais do que isso;
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Que a indemnização atribuída à requerente não pretendeu “repor-lhe qualquer rendimento que deixou de obter”, mas, tão somente, compensá-la pela perda de valor de um bem que integra o seu património. Efetivamente, a indemnização atribuída não foi determinada em função de nenhum rendimento projetado que a Requerente tenha deixado de auferir, mas apenas compensá-la pelo dano sofrido no seu património;
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Concluindo que é ilegal a liquidação de IVA por inexistência de norma de sujeição;
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Por último, refere que a AT não fundamenta legalmente a liquidação do IVA que efetuou, desconhecendo a requerente em que normal legal se sustentou a inspeção tributária para o efeito, o que constitui uma flagrante situação de inexistência de fundamentação. Na medida em que não permite à requerente avaliar das razões legais da correção efetuada, ou seja, não lhe permite avaliar da qualidade de mérito daquela, se a mesma é conforme à lei, se dela recorrer ou impugnar, ou em que termos.
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Em sede de IRC
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A Requerente começa por referir que não tem quaisquer dúvidas de que o princípio da especialização dos exercícios a que se refere o artigo 18.º do CIRC determina que os rendimentos e os gastos dos sujeitos passivos de IRC são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento;
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Refere ainda que observa escrupulosamente esse princípio a nível contabilístico e fiscal e que também o fez no caso em apreço em que estava em causa a relevação contabilística e fiscal de uma indemnização cujo pagamento, por ser diferido, não coincide com a data de celebração do contrato que dá origem à mesma. Isso resulta do facto de as prestações, a cujo pagamento o Município de … se obrigou, terem um carácter mensal. Isto é, o contrato de que emerge a obrigação de pagamento de indemnização à Requerente é de execução diferida, surgindo o direito à exigência das respetivas prestações na data em que as mesmas se forem vencendo e que só nesse momento ocorre o nascimento do facto tributário. Com efeito, entende que em relação a indemnizações com pagamento em prestações, o contrato em que as mesmas são definidas, integra o facto tributário, mas não o esgota, sendo ainda necessário que ocorra o direito à prestação nele prevista, para que aquele se torne perfeito;
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Ora, em cumprimento do princípio da especialização de exercícios, cada prestação vencida deve integrar a matéria coletável do exercício em que aquele vencimento ocorreu, isto, independentemente do seu efetivo recebimento;
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Concorda que ainda que a prestação não tenha sido paga, tem de ser considerada como ganho do exercício respetivo, assim se dando cumprimento ao imposto pelo artigo 18.º do CIRC.
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Mas, no caso em apreço, nenhuma das prestações indemnizatórias contratualizadas a favor da requerente teve vencimento no exercício de 2015, pelo que considera que nunca poderiam ser consideradas como ganhos desse exercício;
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Conclui referindo que, no caso em análise, o facto gerador do imposto só ocorre na data de vencimento de cada uma das prestações indemnizatórias, pelo que nenhuma correção pode, por isso, ser efetuada à matéria coletável da Requerente relativa ao exercício de 2015.
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Na Resposta a AT refere, em síntese, o seguinte:
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Em sede de IVA
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Que é comum utilizar-se o termo "indemnização" para designar operações como pagamentos pela cedência de posição contratual, pela rescisão antecipada de um contrato ou por revisão de preços, que, regra geral, são operações tributáveis, pelo facto de constituírem contrapartidas de uma transmissão de bens ou prestação de serviços, as quais, na realidade nada têm a ver com uma verdadeira indemnização, no sentido relevante para afastar validamente a sujeição a IVA;
Pois que, nos casos em que a designada “indemnização” tem subjacente uma contrapartida, uma contraprestação, em razão da qual uma determinada entidade obtém ganhos económicos associados ao desenvolvimento de uma atividade económica, não pode afastar-se a sujeição a IVA sem afrontar o sistema comum do IVA.
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Que a compensação efetuada pelo Município apresenta uma evidente conexão com o exercício da atividade económica da Requerente, o que não acontece com a situação invocada pela Requerente, a que se refere o Acórdão do STA proferido no proc. 0144/06, de 18-06-2008, visto que este diz respeito à pura indemnização de danos a particulares;
Com efeito, não se trata de compensar um particular pela redução do valor de um qualquer bem privado. Ao contrário, a Requerente comprou um terreno por determinada quantia, na expectativa de gerar proveitos através da sua pura revenda ou da sua construção para venda, e, mercê do incumprimento contratual do Município, a expectativa de lucro a gerar pelo negócio foi reduzida;
Ora, de facto, a sujeição a tributação em sede de IVA tem subjacente a realização de uma atividade económica e a existência de uma contraprestação. A AT, por sua vez, invoca o disposto no Acórdão do STA proferido no proc. 01158/11, referido também no Relatório da Inspeção Tributária (RIT), que distingue entre:
«a) A indemnização paga pela seguradora, “(…) destinada à compensação do dano causado pela perda do bem”, a mesma deve considerar-se excluída da incidência objetiva de IVA, “na medida em que não assume a natureza de contraprestação pela transmissão de um bem ou prestação de um serviço (arts. 1º n.º 1, 4º n.º 1 e 16 n.º 1 CIVA)”;
«b) As quantias pagas pelo locatário à locadora, sendo pagas “complementarmente à locadora pelos locatários não revestem natureza ressarcitória (porque não se destinam à compensação de perdas e danos) antes radicam no cumprimento de obrigações contratualmente assumidas (em cada uma das categorias de contratos em causa). Tendo estes contratos a natureza de contratos de prestação de serviços, aquelas quantias representam, ainda, contraprestações de operações tributáveis em IVA».
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Que, conforme referido no RIT, no caso de indemnizações (em sentido amplo), o critério a adotar para avaliar da sujeição a tributação em sede de IVA, estará relacionado com a existência de uma reposição de rendimento, uma compensação de um acréscimo patrimonial não verificado na sequência de quebra contratual, isto é, com uma relação com a atividade económica principal;
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Que as quantias em análise somente são compagináveis com o exercício da atividade económica da Requerente, razão pela qual deve ser atribuído um carácter remuneratório à designada “indemnização”, nomeadamente dado que constitui ainda uma contrapartida, um sucedâneo do direito a construir que havia ficado prejudicado, sendo, portanto, tributável;
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Que o que se fez foi avaliar se a indemnização se destina a compensar os lucros cessantes, ou seja, a repor o nível de rendimento que, por força de um incumprimento imputável ao Município, o sujeito passivo deixou de obter;
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Assim, o fim e natureza do pagamento subjacente à “indemnização”, determina a sua classificação como contrapartida remuneratória e não como reparação de um dano causado. Nos casos de indemnizações por incumprimento contratual apenas a análise casuística da substância da operação pode induzir ao entendimento do alcance da indemnização e à contextualização da sua função remuneratória ou ressarcitória, e consequentemente à aferição da sua sujeição ou não a IVA.
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Que a jurisprudência do TJUE tem entendido que estas situações devem seguir o regime do contrato principal. E cita Marta Machado de Almeida[2] a propósito da desistência de pendência judicial, nomeadamente em caso de pedidos de indemnização por cumprimento defeituoso de contratos:
«A par da aceitação do pagamento desse montante, o lesado comprometer-se-á a desistir da ação e a não propor qualquer outra ação com o mesmo objeto, o que configura uma obrigação de carácter negativo (non facere). Neste caso, poder-se-á, com efeito, configurar uma nova operação, concluindo-se pela existência de um carácter oneroso, pelo que importará concluir quanto à incidência (ou não) de IVA.
Não obstante o facto de o montante objeto de pagamento, no seguimento do acordo, poder ser configurado como destinado a ressarcir prejuízos, o certo é que poder-se-á verificar uma interdependência entre a prestação indemnizatória e a prestação que caiba ao lesado efetuar (…) nas situações em que a desistência é formalizada mediante uma transação, sendo tal acordo posteriormente homologado pelo tribunal, não nos parece que a homologação seja suficiente para enquadrar os montantes pagos como uma indemnização declarada judicialmente, na aceção do artigo 16º, número 6, alínea a) do Código do IVA.
Conforme referido anteriormente, tendo em consideração que a referida norma teve na sua origem o entendimento que a comprovação judicial seria suficiente para classificar determinadas prestações como indemnizações, na sua aceção jurídica, não nos parece razoável considerar que tal entendimento também se aplique nos casos em que o juiz se limita a homologar o acordo de transação, sem qualquer interferência no valor que será objeto de pagamento, o qual resulta da vontade das partes.»
Ora, na situação em juízo, existe uma transação, posteriormente sujeita a mera homologação pelo juiz, visando a quantia acordada repor o rendimento que seria obtido através da primitiva capacidade construtiva, caso o Município não tivesse quebrado a relação contratual.
E isto num quadro enquadrável somente no quadro do exercício pela Requerente de uma atividade económica, na aceção do sistema comum do IVA.
Do que decorre, com clareza, o carácter remuneratório da quantia, uma vez que se visa repor o mesmo nível de rendimento que seria obtido pela Requerente pelo cumprimento do contrato inicialmente previsto.
Assim, a quantia visa reparar prejuízos na modalidade de lucros cessantes, fixando-se contratualmente uma compensação, meramente homologado pelo juiz e, portanto, não se tratando de indemnização judicialmente declarada;
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Que não pode pretender-se que esta compensação não tenha natureza remuneratória, ao contrário da primeira. Antes, somente é compaginável no quadro de uma relação contratual de natureza sinalagmática, no exercício de uma atividade económica, portanto, sujeita a tributação em sede de IVA.
Pois, a vocação de universalidade do imposto implica que se entenda que qualquer tipo de atribuição patrimonial que não seja uma contrapartida de uma transmissão de bens tenha subjacente uma prestação de serviços tributável;
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Que ainda que a “indemnização” pudesse conter uma parte do seu valor que se destinasse a reparar um prejuízo (dano emergente), não foi o mesmo apresentado ou comprovado pelo sujeito passivo, antes se impondo a qualificação da quantia como tendo natureza de compensação por lucros cessantes, logo, remuneratória;
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Que resulta da jurisprudência do TJUE a necessidade de se efetuar uma análise objetiva do fito e natureza das quantias a pagar por incumprimento contratual, bem como a relevância da assunção de uma obrigação de non facere, como já se citou na síntese de Marta Machado de Almeida.
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Que resulta também da jurisprudência do TJUE que o conceito de «prestação de serviços», na aceção do sistema comum do IVA, deve ser interpretado independentemente dos objetivos e dos resultados das operações em causa, sem que a Administração Fiscal esteja obrigada a proceder à averiguação da intenção do sujeito passivo, atendendo ao seu carácter objetivo - cfr. acórdão Newey e jurisprudência aí referida;
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Que em termos jurídicos, a questão da sujeição é de resolução bastante evidente, pois resulta da decisão do TJUE nos procs. 250 e 289/14 - mas não só - que apenas não deverá ser considerada sujeita a IVA a indemnização que vise o puro ressarcimento de um dano, desligada, portanto, do exercício de uma atividade económica;
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Que em termos de Direito de União, se tem, pois, como bastante evidente a sujeição da quantia transacionada, verdadeira contrapartida pela desistência da ação e compaginável apenas como uma reposição dos lucros cessantes da Requerente;
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Que resulta incontornável a sujeição a IVA da quantia aqui em análise.
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Que, no que se refere à quantificação da correção, que a Requerente considera incorreta, a AT considerou o IVA como uma componente do montante acordado;
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Que o entendimento contrário sobre a quantificação do imposto implicaria que ao montante acordado acresceria IVA, o que resultaria numa liquidação mais gravosa para a Requerente;
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Que, nesta matéria o entendimento expresso no RIT é o seguinte: «tendo em consideração que o valor foi determinado pelas partes sem referência do IVA e o prestador de serviço é o devedor do IVA devido sobre a operação tributada, consideraremos que o valor convencionado já inclui o IVA, pelo que o sujeito passivo deveria ter liquidado IVA como lhe competia, o montante de 916.260,16 EUR (4.900.000,00 X 23 /123) para o período 2015/07, data do acordo celebrado pelo já referido “Contrato de Urbanização”».
Assim, constatou-se que o montante acordado pelas partes não discriminava IVA, não devendo a AT substituir-se às partes no acordo negocial.
No entanto, de acordo com a lei, deveria ter sido liquidado IVA pois que a operação é tributável. Nesse pressuposto, considerou-se que o valor convencionado já incluía IVA, o qual deveria ter liquidado pela Requerente, como lhe competia.
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Pelo que o cálculo explicitado está conforme com a doutrina retirada, v. g., do acórdão Corina-Hrisi Tulica, proferido a 7 de novembro de 2013, no âmbito dos processos apensos C-249/12 e C-250/12 do TJUE:
«A Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, nomeadamente os seus artigos 73.° e 78.°, deve ser interpretada no sentido de que, quando o preço de um bem tenha sido determinado pelas partes sem menção do imposto sobre o valor acrescentado e o fornecedor do referido bem seja o devedor do imposto sobre o valor acrescentado devido sobre a operação tributada, e caso o fornecedor não tenha a possibilidade de recuperar junto do adquirente o imposto sobre o valor acrescentado reclamado pela administração fiscal, se deve considerar que o preço convencionado já inclui o imposto sobre o valor acrescentado.»
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Em sede de IRC
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A AT explica que o Código do IRC plasmou as regras atinentes à determinação do lucro tributável, continuando a adotar o modelo da dependência parcial do direito fiscal face à contabilidade, e procede à citação do enunciado no ponto 10 do Preâmbulo daquele Código:
«10 - Dado que a tributação incide sobre a realidade económica constituída pelo lucro, é natural que a contabilidade, como instrumento de medida e informação dessa realidade, desempenhe um papel essencial como suporte da determinação do lucro tributável.
As relações entre contabilidade e fiscalidade são, no entanto, um domínio que tem sido marcado por uma certa controvérsia e onde, por isso, são possíveis diferentes modos de conceber essas relações. Afastadas uma separação absoluta ou uma identificação total, continua a privilegiar-se uma solução marcada pelo realismo e que, no essencial, consiste em fazer reportar, na origem, o lucro tributável ao resultado contabilístico ao qual se introduzem, extra contabilisticamente, as correções - positivas ou negativas - enunciadas na lei para tomar em consideração os objetivos e condicionalismos próprios da fiscalidade.
Embora para concretizar a noção ampla de lucro tributável acolhida fosse possível adotar como ponto de referência o resultado apurado através da diferença entre os capitais próprios no fim e no início do exercício, mantém-se a metodologia tradicional de reportar o lucro tributável ao resultado líquido do exercício constante da demonstração de resultados líquidos, a que acrescem as variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo e não refletidas naquele resultado.»
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E acentua que as funções da contabilidade e da fiscalidade são distintas. Não obstante visarem ambas a realidade económica das empresas, a primeira, como refere Rogério Fernandes Ferreira, constitui uma “técnica de observação económica muito elaborada com objetivos muito significativos para o desempenho da gestão”[3], enquanto que a segunda tem como objetivo a satisfação das necessidades financeiras do Estado, conforme decorre do artigo 5.º da Lei Geral Tributária.
E, a este propósito, conclui que o legislador consagrou o modelo da dependência parcial do direito fiscal face ao direito da contabilidade, o implica que o ponto de partida para a determinação do lucro fiscal é o resultado contabilístico, desempenhando a contabilidade uma função instrumental, e implicando essa determinação a consideração de correções meramente fiscais decorrentes das regras que o CIRC impõe, como resulta do artigo 17.º deste diploma.
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E a AT reforça esta ideia da dependência parcial do direito fiscal face ao direito da contabilidade, citando Freitas Pereira, que se expressava nestes termos, a propósito do Código da Contribuição Industrial ao qual sucedeu o Código do IRC:
«Esta relevância fiscal do resultado contabilístico implica a projeção para o domínio tributário dos princípios a que obedece a determinação daquele resultado. É que é inerente à própria definição deste a existência de um certo número de princípios a que se faz apelo na sua determinação e que constituem um ponto de referência indispensável para dirimir os problemas específicos que possam surgir. O apelo a esses princípios nem sempre é feito de modo explícito pela lei fiscal, tal como acontece em Portugal (artigo 22º do Código da Contribuição Industrial), mas isso não diminui a sua importância como parâmetros a que obedece a determinação do resultado contabilístico e, por essa via, do lucro tributável. Devem tomar-se como pressupostos que o legislador não podia desconhecer. Pode dizer-se, com efeito, que, na falta de disposição expressa em contrário, o lucro tributável é determinado de acordo com os princípios contabilísticos, às vezes qualificados geralmente aceites ou então, como acontece entre nós, denominados de «sãos princípios de contabilidade», o que explica a importância fundamental de que se reveste o seu conhecimento.
Durante muitos anos os princípios contabilísticos tiveram algo de convencional, no sentido de que a sua aceitação resultava de uma concordância tácita desenvolvida no seio da profissão contabilística face a um certo número de regras básicas, aceitação em cuja consolidação desempenhava um papel muito importante o costume e o uso.
(…)
No entanto, o desenvolvimento da profissão e a criação de organismos internacionais, como o IASC – International Accouting Standards Comittee -, assim como a expansão do direito contabilístico, com destaque para a IV Directiva da CEE sobre contas anuais das sociedades de capitais (Journal officiel des Communautés européennes, nº L 222, de 14 de Agosto de 1978), facilitaram a adoção de uma base contabilística uniforme para a determinação do lucro tributável através da consagração de princípios contabilísticos. É assim que a lei pode remeter, como o faz em Espanha (artigo 37 do Regulamento do Imposto sobre Sociedades), para os princípios estabelecidos na normalização contabilística oficial, que, salvo disposição expressa em contrário de carácter fiscal, são aplicáveis para efeitos de determinação da base tributável. Mas nem se tornava necessário a lei invoca-los expressamente, pois, na fase atual da evolução da contabilidade, eles constituem um pressuposto que a simples remissão para o fundamento contabilístico do lucro tributável torna imediatamente relevantes para efeitos fiscais. É que, atualmente, pode dizer-se até que tal relevância é o corolário lógico da codificação legal em numerosos países dos princípios de contabilidade, que seguem de perto as normas desenvolvidas ao nível internacional pelo IASC.»
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E refere que, face à função instrumental desempenhada pela contabilidade no apuramento do lucro tributável, impõe a alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º do CIRC que a mesma esteja organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo sector de atividade, o que torna obrigatório para a generalidade das empresas a aplicação do SNC, sem prejuízo da observância das disposições previstas no CIRC.
Assim, mercê do disposto no n.º 1 do artigo 18.º do CIRC, os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica.
Tal disposição consagra, no ordenamento fiscal, o princípio da especialização de exercícios, determinando que o resultado líquido do exercício, que constitui o ponto de partida para o resultado fiscal, é apurado, de acordo com a regra da anualidade, numa perspetiva económica e não financeira ou de caixa, em consonância com o princípio contabilístico do acréscimo ou da periodização económica;
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A AT esclarece ainda que face ao estabelecido no CIRC a imputação a um determinado exercício das componentes positivas ou negativas do rédito respeitantes a exercícios anteriores, apenas poderá ser efetuada se as mesmas forem imprevisíveis ou desconhecidas na data do encerramento das contas do exercício anterior a que deveriam ser imputadas;
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E conclui que é claramente vedado a qualquer contribuinte definir a seu bel-prazer ou de harmonia com, por exemplo, a sua estratégia comercial ou de gestão, o timing para manifestar proveitos ou custos e prejuízos decorrentes da sua atividade comercial ou industrial, porquanto a lei lhe impõe limites ou regras para o efeito, designadamente obrigando-o a imputar esses réditos ou custos ao exercício a que digam respeito.
Com o respeito pelo princípio da especialização dos exercícios assegura-se do ponto de vista contabilístico uma imagem verdadeira e apropriada do património ou da situação financeira, do desempenho e das alterações da posição financeira.
Do ponto de vista fiscal a obrigatoriedade de considerar os gastos e os rendimentos no exercício em que são gerados/incorridos impede também que os contribuintes difiram os gastos e os rendimentos com finalidades de gestão fiscal diversas daquelas que o legislador fiscal entendeu privilegiar no sistema fiscal português.
Pois não existe qualquer norma no Código do IRC, ou noutra legislação fiscal complementar, que imponha nesta matéria um tratamento fiscal distinto do regime contabilístico, antes ele é confirmado pelo princípio contido no artigo 18.º do CIRC;
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Ora, no caso em apreço, a factualidade provada demostra que a Requerente, na determinação do resultado contabilístico e, consequentemente, do resultado fiscal, não cumpriu as regras contabilísticas e fiscais, nomeadamente violou a regra da anualidade;
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Donde resulta, indubitavelmente, que a Requerente não logrou contraditar a legalidade das liquidações controvertidas, já que os montantes em causa constituem rendimentos obtidos em consequência da transação efetuada com o Município de … durante o exercício de 2015, de acordo com os artigos 18.º e 20.º do CIRC;
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Pois que o direito ao percebimento do valor acordado pela Requerente e pelo Município de … em compensação pela redução da capacidade construtiva, foi estabelecido por contrato celebrado em julho de 2015, no quadro de uma transação que veio a ser homologada por sentença de novembro desse mesmo ano, inexistindo qualquer incerteza sobre os referidos réditos à data do fecho de contas;
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Pelo que, de acordo com o disposto no artigo 18.º do CIRC, deve ser considerado como rédito do período de tributação de 2015, independentemente da circunstância de ter ou não efetivamente recebido qualquer valor.
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APRECIAÇÃO
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Em sede de IVA
Começa-se por referir que as indemnizações ou penalizações não estão sujeitas a IVA quando não têm subjacente uma transmissão de bens ou uma prestação de serviços, isto é, quando sancionam a lesão de qualquer interesse sem caráter remuneratório, porque não remuneram qualquer operação, destinando-se antes à reparação de danos sofridos e não à sua compensação.
Com efeito, não pode haver sujeição a IVA nos casos em que a entrega de uma indemnização pressupõe por si só a ausência de um nexo sinalagmático e, em consequência, a inexistência de qualquer natureza onerosa, ou seja, nos casos em que não existe qualquer interdependência entre a prestação indemnizatória e uma outra prestação que caiba ao lesado efetuar.
Trata-se de casos em que existe apenas uma prestação a satisfazer, não podendo ser reclamado do lesado o cumprimento de uma obrigação a que ele se encontrasse adstrito[4]. É o que normalmente se passa quando estamos na presença de questões de pura responsabilidade extracontratual[5].
Ora, isto não acontece no caso em apreço, em que se assiste a uma situação de responsabilidade contratual ou negocial[6] que, como o nome indica, pressupõe a violação de obrigações. No caso controvertido, trata-se do incumprimento da obrigação assumida pelo Município, estipulada no contrato de cedência das parcelas de terreno, que permitia à Requerente uma determinada capacidade de construção.
A “indemnização” atribuída à Requerente pela diminuição da área de construção que havia sido inicialmente acordada, representa, assim, uma compensação do “preço” a que a Requerente teve direito, assumindo, deste modo, natureza remuneratória.
Ora, é preciso ter presente, antes de mais, que o IVA é um imposto geral sobre o consumo que pretende tributar as transmissões de bens e as prestações de serviços efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal.
Esse objetivo encontra-se expresso na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º do Código do IVA (CIVA), em que se prevê o seguinte:
«1 – Estão sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado:
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As transmissões de bens e as prestações de serviços efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal;»
Esta disposição legal traduz a transposição para o direito nacional do disposto nas alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva 2006/112/CE (Diretiva IVA) relativa ao sistema comum do IVA:
«1. Estão sujeitas ao IVA as seguintes operações:
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As entregas de bens efetuadas a título oneroso no território de um Estado-Membro por um sujeito passivo agindo nessa qualidade;
[…]
-
As prestações de serviços efetuadas a título oneroso no território de um Estado-Membro por um sujeito passivo agindo nessa qualidade;»
Referindo-se o conceito de transmissão de bens à transferência onerosa de bens corpóreos por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade (artigo 3.º, n.º 1, do CIVA e artigo 14.º, n.º 1, da Diretiva IVA), não restam dúvidas que a operação controvertida se refere à contrapartida de uma prestação de serviços.
No n.º 1 do artigo 4.º do CIVA, o conceito de prestação de serviços é delimitado pela negativa ao afirmar-se que o mesmo compreende «as operações efetuadas a título oneroso que não constituem transmissões de bens […]».
De facto, o artigo 24.º da Diretiva IVA estabelece que «entende-se por prestação de serviços qualquer operação que não constitua uma entrega de bens».
E o artigo 25.º da Diretiva IVA complementa o conceito ao estabelecer que:
«Uma prestação de serviços pode consistir, designadamente, numa das seguintes operações:
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A cessão de um bem incorpóreo representado ou não por um título;
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A obrigação de não fazer ou de tolerar um ato ou uma situação;
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A execução de um serviço em virtude de ato das autoridades públicas ou em seu nome ou por força da lei»
Para determinar se foi prestado um serviço na aceção da Diretiva IVA, é necessário, no entanto, analisar a transação à luz dos objetivos e características do sistema comum do IVA.
O n.º 2 do artigo 1.º da Diretiva IVA tem a seguinte redação:
«O princípio do sistema comum do IVA consiste em aplicar aos bens e serviços um imposto geral sobre o consumo exatamente proporcional ao preço dos bens e serviços, seja qual for o número de operações ocorridas no processo de produção e de distribuição anterior ao estádio de tributação. Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido diretamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço».
A transação no caso vertente corresponde a esta definição. Está-se na presença de um ato de consumo. A Requerente cedeu parcelas de terreno em contrapartida da obtenção de direitos construção. Estes constituem um custo da atividade do Município.
No âmbito do sistema comum do IVA, para efeitos do conceito de prestação de serviços deve ser tida em consideração a natureza do compromisso assumido entre as partes. Com efeito, para se inserir no sistema comum do IVA, esse compromisso deve implicar um consumo, isto é, o serviço deve ser fornecido a um adquirente identificável conferindo uma vantagem suscetível de ser considerada como um elemento constitutivo do custo da atividade de outra pessoa na cadeia comercial.
Nestes termos, a operação controvertida, face aos conceitos desenvolvidos no Código do IVA e na Diretiva IVA, consubstancia-se numa prestação de serviços, sujeita a IVA, no âmbito da qual a “indemnização” atribuída corresponde à contraprestação devida pela realização de uma atividade económica. Isto é, no contrato de urbanização em que ambos acordaram, existe um nexo direto entre a prestação de redução da capacidade construtiva pela Requerente e a prestação efetuada pelo Município de indemnização ou de compensação da Requerente.
O pagamento da “indemnização” por parte do Município constitui assim um facto sinalagmático, existindo uma interdependência entre a prestação indemnizatória e a perda dos direitos de construção, ocorrida com a celebração do contrato de urbanização, pelo que se trata de uma prestação sujeita a IVA.
O valor de € 4.900.000,00 recebido pela Requerente, independentemente da designação que lhe seja atribuída, “indemnização” ou compensação, assume a natureza de contraprestação que remunera uma prestação de serviços, consubstanciada na redução da capacidade construtiva acordada e dos direitos conexos correspondentes, efetuada no âmbito do exercício de uma atividade económica sujeita a IVA e dele não isenta.
O valor daquela “indemnização” corresponde, pois, na realidade, aos rendimentos que a Requerente auferiria caso o contrato vigorasse em conformidade com as condições contratuais inicialmente estabelecidas e acordadas e tem claramente como objetivo repor o rendimento que a Requerente obteria através da cedência que efetuou das parcelas de terreno que lhe pertenciam, caso o Município não tivesse alterado as referidas condições contratuais. Essa indemnização tem, por isso, indubitavelmente, um caráter remuneratório.
Com efeito, os direitos de construção inicialmente garantidos pelo Município, como contraprestação da cedência das parcelas de terreno, viram-se diminuídos em relação ao estabelecido. O valor acordado de € 4.900.000,00 atribuído à Requerente mais não representa que a reposição desses direitos, isto é, a reposição da contraprestação a que a Requerente tinha direito e deixaria de obter em consequência do incumprimento do inicialmente acordado.
O referido valor não se destina a indemnizar um prejuízo eventualmente sofrido pela Requerente, mas constitui uma remuneração devida à Requerente com o objetivo de repor o nível de rendimento que esta deixou de obter face à diminuição dos direitos de construção que tinham sido acordados aquando da prestação individualizável de cedência pela Requerente das parcelas de terreno que ficaram à disposição do Município.
Deste modo, a operação a que se refere a compensação configura uma operação tributável uma vez que o valor recebido pela Requerente tem carácter remuneratório, destinando-se a compensar a diminuição dos seus direitos de construção e consequentemente o nível de rendimento que a Requerente deixou de obter, devendo ser liquidado IVA na atribuição dessa compensação.
No que se refere ao montante do IVA devido, a AT considerou que o valor convencionado entre as partes já incluía IVA, o qual deveria ter sido liquidado e entregue pela Requerente, como lhe competia.
O cálculo do IVA efetuado pela AT está conforme a doutrina que resulta do acórdão de 7 de novembro de 2013, Corina‑Hrisi Tulică, C-249/12 e C-250/12, relativo à determinação do IVA devido quando as partes nada previram, na altura da celebração do contrato, quanto a esse imposto.
Neste processo, foi colocada a título prejudicial a questão de saber se, à luz do disposto nos artigos 73.º e 78.º da Diretiva IVA, no caso de o preço de um bem ter sido determinado pelas partes sem menção do IVA e de o fornecedor do referido bem ser o devedor do IVA sobre a operação tributada, o preço convencionado deveria ser considerado um preço que incluía já o IVA ou como um preço sem IVA, a que devia acrescer esse imposto.
Nos termos do acórdão foi decidido que, «quando o preço de um bem tenha sido determinado pelas partes sem menção do IVA e o fornecedor do referido bem seja o devedor do IVA devido sobre a operação tributada, e caso o fornecedor não tenha a possibilidade de recuperar junto do adquirente o IVA reclamado pela administração fiscal, se deve considerar que o preço convencionado já inclui o IVA».
Ora, esta doutrina pode ser aplicável à operação controvertida na medida em que:
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o montante de € 4.900.000,00 acordado pelas partes não discrimina qualquer valor de IVA,
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o prestador na operação é a Requerente e a esta competia a liquidação do IVA correspondente e, além disso,
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é duvidoso que a Requerente pudesse recuperar o IVA junto do Município.
Acresce que, salvas as devidas diferenças, o Município se comporta na transação referida como um consumidor final, na medida em que não lhe é permitida a recuperação de qualquer montante de IVA que seja suportado a fim de colocar o Parque Urbano à disposição dos munícipes e de outros utentes.
De facto, não é de forma alguma evidente que o Município tenha consentido na operação controvertida nas condições pretendidas agora pela Requerente, dado que o IVA que viesse agora a ser exigido poderia não vir a ser recuperado junto do Município, pois excederia o objeto do contrato e não poderia ser oposto àquele, quer a título de obrigação contratual quer a título de obrigação jurídica extracontratual. A ser assim, no caso de a Requerente não recuperar esse IVA, suportaria um encargo de valor equivalente, efeito que a AT pretendeu evitar. De facto, o IVA não pode constituir encargo da Requerente, na sua qualidade de prestador/fornecedor, dado que é, por natureza, um imposto sobre o consumo que deve ser suportado pelo consumidor final. Com esta opção a AT garantiu que o valor do IVA exigido à Requerente seja um valor que esta efetivamente recebeu do Município.
Constatando que o montante de € 4.900.000,00 não discriminava IVA, a AT entendeu não se substituir às partes no acordo negocial. Todavia, perante a sujeição a imposto da operação controvertida e a consequente obrigação de liquidar o IVA a AT considerou que o valor acordado pelas partes já incluía IVA, que, como é evidente, deveria ter sido liquidado pela Requerente.
Por fim, ao explicitar que “(…) que o valor foi determinado pelas partes sem referência ao IVA e o prestador do serviço é o devedor do IVA devido sobre a operação tributada, consideraremos que o valor convencionado já inclui o IVA, pelo que o sujeito passivo deveria ter liquidado IVA como lhe competia, o montante de 916.260,16 EUR (4900.000,00 x 23/123) para o período 2015/07, data do acordo celebrado pelo já referido “Contrato de Urbanização”, a AT fundamentou suficientemente o ato, nesta vertente, que é a única acusada pela Requerente de vício atinente à fundamentação.
É certo que a AT não invocou, expressamente, a norma legal em que se apoiou, mas enunciou claramente o regime legal que entendeu aplicável, de modo a permitir à Requerente entender as razões da sua atuação – entendimento esse que a própria Requerente demonstra ter atingido, pelo modo como atacou o ato.
Não se reconhece, pelo exposto, o invocado vício de falta de fundamentação.
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Em sede de IRC
O IRC é um imposto periódico que tem por base um facto gerador de caráter duradouro (a atividade da empresa) que é ficcionadamente cindido em períodos para efeitos de apuramento de resultados[7].
O princípio da tributação pelo lucro real não conflitua com o princípio da especialização dos exercícios, pelo contrário, estes princípios estão intimamente relacionados e ambos conexionados com princípio da anualidade, segundo o qual as empresas devem apurar no fim de cada período de tributação, por regra com a duração de um ano, os resultados do exercício da sua atividade durante esse mesmo período e decidir, desde logo, sobre o destino a dar aos mesmos resultados.
No âmbito do IRC, a questão em apreço parece ficar resolvida partindo da leitura dos números 1 e 2 do artigo 18.º do Código do IRC (CIRC) relativos à periodização do lucro tributável, expressão também conhecida por princípio da especialização dos exercícios.
Com efeito, o n.º 1 desta norma legal refere expressamente que:
«Os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica».
E o n.º 2 esclarece que:
«As componentes positivas ou negativas consideradas como respeitando a períodos anteriores só são imputáveis ao período de tributação quando na data de encerramento das contas daquele a que deviam ser imputadas eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas».
A imputação de proveitos a exercícios aos quais esses proveitos não respeitam viola o princípio da especialização dos exercícios bem como o princípio da tributação pelo lucro real, determinando-se, por essa via, resultados que, naturalmente, podem não corresponder ao lucro real desses exercícios.
A vida económica das empresas tem de ser dividida em períodos de tempo medindo-se em cada um deles as alterações ocorridas no seu património.
O direito ao percebimento do valor de € 4.900.000,00 acordado pela Requerente e pelo Município de … para compensação da capacidade construtiva, como atrás já se evidenciou, foi estabelecido por contrato celebrado em julho de 2015, no âmbito de uma transação que veio a ser homologada por sentença de novembro do mesmo ano. Não existia, além disso, à data de 31 de dezembro de 2015, qualquer incerteza quanto à previsibilidade ou conhecimento da obtenção daquele rendimento e do seu montante. Para mais, este contrato tem como devedor um Município, entidade pública a quem, por natureza, nunca faltarão os meios para o cumprimento da prestação (ao contrário de uma pessoa coletiva de direito privado que no limite poderia ser declarada insolvente antes do pagamento completo). Por último, não resulta do contrato de transação nenhum elemento que ponha em causa a certeza do rédito.
Tratando-se de um valor que, à luz dos princípios contabilísticos, deve ser reconhecido como rendimento, e inexistindo qualquer regra fiscal específica que, para efeitos de determinação do lucro tributável, contrarie estes princípios, esse valor deve ser imputável ao lucro tributável do exercício de 2015 na sua integralidade. De facto, o n.º 1 do artigo 17.º do CIRC refere que:
«O lucro tributável das pessoas coletivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do período e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não refletidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código».
Acresce que o artigo 20.º do CIRC esclarece na alínea i) do seu n.º 1 que «as indemnizações auferidas, seja a que título for», consideram-se rendimentos e ganhos.
Não existe qualquer norma no Código do IRC ou outra legislação de natureza fiscal que determine outro enquadramento fiscal diferente do regime contabilístico, pelo contrário, o artigo 18.º do CIRC confirma que o rendimento controvertido deve ter assegurado em matéria de IRC o mesmo tratamento que lhe é conferido para efeitos contabilísticos.
O facto de o pagamento ser feito em prestações não contradiz esta conclusão na medida que o IRC se rege por um princípio de acréscimo e não de caixa. Aliás, é muito relevante que a Requerente tenha citado em abono da sua tese um acórdão relativo ao IRS (31.º do Pedido) o Ac. STA, de 08-09-2010 – Proc. 0339/10, em que se pode ler, na passagem transcrita e realçada pela Requerente, que “nos contratos de execução duradoura ou diferida, como acontece nos casos em que se estabelece o pagamento em prestações de uma indemnização, o facto tributário não é constituído por essa fonte contratual geradora de fluxos financeiros, mas antes pela sucessiva concretização no tempo dos incrementos patrimoniais decorrentes do recebimento das prestações previstas”. Contudo, a Requerente omite que se trata de jurisprudência emanada em sede de IRS. Ora, no IRS vigora para a maior parte dos rendimentos o princípio oposto (há tributação quando os rendimentos são pagos ou colocados à disposição), ou existem regras expressas a remeter para a regra do IRC (como é o caso hoje do artigo 3.º, n.º 6 do Código do IRS, que não existia há altura dos factos subjacente ao acórdão citado, segundo o qual “os rendimentos referidos neste artigo ficam sujeitos a tributação desde o momento em que para efeitos de IVA seja obrigatória a emissão de fatura ou documento equivalente ou, não sendo obrigatória a sua emissão, desde o momento do pagamento ou colocação à disposição dos respetivos titulares, sem prejuízo da aplicação do disposto no artigo 18.º do Código do IRC, sempre que o rendimento seja determinado com base na contabilidade.”). Esta inaplicabilidade de uma regra de caixa a sujeitos passivos de IRS com características empresariais é, aliás, reiterada com maior clareza numa recentíssima decisão do STA que afirma, em sumário, que “para efeitos de IRS (Categoria B), não havendo obrigação de emissão de factura, o momento a atender para determinar a obtenção do rendimento e a consequente sujeição a imposto, corresponde ao do recebimento do valor respectivo (nº 6 do art. 3º do CIRS).” (Ac. STA, de 31-1-2018, P. 118/17) Ora, por esta razão, a doutrina do STA citada, porque emanada no âmbito do IRS, não é transponível para um caso de IRC.
Em conclusão, o valor de € 4.900.000,00 deve ser considerado integralmente como rendimento fiscal do exercício de 2015 para efeitos de determinação do lucro tributável respetivo.
IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar improcedente o pedido anulação das liquidações de IRC, IVA e de juros compensatórios efetuadas pela AT;
b) Julgar improcedente o pedido de juros indemnizatórios, dada a sua dependência do pedido principal;
c) Condenar a Requerente nas custas do processo.
V. VALOR DO PROCESSO
De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º -A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 1.880.646,81.
VI. CUSTAS
Computam-se as custas, de acordo com o artigo 22º nº 4 do RJAT e 4º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e Tabela I anexa, em € 24.786,00.
Notifique-se.
Lisboa, 21 de fevereiro de 2018.
Os Árbitros
(José Baeta de Queiroz)
(Emanuel Augusto Vidal Lima)
(João Taborda da Gama)
[1] As liquidações são de IRC e de IVA, relativas ao ano de 2010, nos montantes de € 3.983.739,84 e de € 916.260,16, respetivamente.
[2] “O IVA nas Indemnizações”. (2013). Almedina. Lisboa. (p. 68).
[3] “Contabilidade para Não Contabilistas”. Cadernos IDEFF, Nº 4, 2ª Edição. Almedina. (pg. 87).
[4] Como referem Afonso Arnaldo e Pedro Vasconcelos e Silva em “O IVA e as Indemnizações”, publicado na Revista FISCO, n.º 107/108, março, 2003, Ano XIV. (p. 88).
[5] A responsabilidade que resulta da violação, ainda que lícita, de deveres de carácter genérico ou condutas (que normalmente protegem direitos absolutos), que causam determinados danos a outrem. O dano causado não está associado à existência prévia de um contrato.
[6] A responsabilidade que está associada à violação de obrigações constantes de contratos, de negócios jurídicos unilaterais ou que resultem da própria lei.
[7] Cfr. Freitas Pereira. “A Periodização do Lucro Tributável”. (1998). Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 349.