Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 188/2017-T
Data da decisão: 2018-02-01  IRS  
Valor do pedido: € 356.588,32
Tema: IRS – Ratificação de ato administrativo (artigo 13.º, n.º 1 do RJAT - artigos 164.º, n.º 5, in fine, e artigo 168.º, n.º 3 do CPA; artigo 64.º, n.º 6 do CPTA).
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                                                                  Decisão Arbitral

 

Os árbitros José Baeta de Queiroz (árbitro presidente), Rui Ferreira Rodrigues e José Rodrigo de Castro (árbitros adjuntos), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formarem o tribunal arbitral, acordam no seguinte:

 

 

1. Relatório

1.1 A… e B… (adiante designados “Requerentes”), casados, respetivamente com os números de contribuinte … e …, com domicílio fiscal na Rua …, n.º …, …, na cidade do Porto, requereram a constituição de tribunal arbitral coletivo, ao abrigo das disposições conjugadas do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) e artigo 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por «RJAT») e artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).

 

1.2 O pedido de pronúncia arbitral, apresentado em 21 de março de 2017, juntamente com 27 documentos e um parecer jurídico da autoria do Professor Doutor C…, tem por objeto a anulação ou declaração de nulidade da liquidação de IRS n.º 2016… relativa ao exercício de 2012; a anulação ou invalidação consequente da liquidação de juros compensatórios n.º 2016…; a condenação da AT a restituir aos Requerentes a quantia de 356 588,32 € correspondente ao valor por eles pagos a título de imposto e de juros compensatórios ao abrigo e por causa das liquidações objeto dos presentes autos; a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios contados, à taxa legal em vigor, sobre a referida quantia desde a data do pagamento (20-12-2016) até à data em que tiver lugar a integral e efetiva restituição aos Requerentes dessa mesma quantia; e ainda a condenação da AT no pagamento das custas do processo arbitral, ordenando-se o reembolso das taxas de arbitragem por eles colocadas a pagamento no âmbito dos presentes autos.

 

1.3 Os Requerentes optaram por não designar árbitro.

 

1.4 O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e notificado à AT em 23 de março de 2017.

 

1.5 Os signatários foram designados pelo Presidente do Conselho Deontológico do CAAD como árbitros do tribunal arbitral coletivo, nos termos do disposto no artigo 6.º do RJAT, e comunicada a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

1.6 Em 17 de maio de 2017, as partes foram notificadas dessas designações, não se tendo oposto às mesmas, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

 

1.7 Assim, em conformidade com o preceituado no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o tribunal arbitral coletivo ficou constituído em 01 de junho de 2017.

 

1.8 A AT foi notificada, por despacho arbitral de 02 de junho de 2017, nos termos do artigo 17.º, n.º 1 do RJAT, para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta, juntar cópia do processo administrativo (PA) e, querendo, solicitar a produção de prova adicional.

 

1.9 Em 28 de junho de 2017, face à dimensão do articulado e complexidade da matéria em causa, a AT requereu a prorrogação, por igual período, do prazo para responder.

 

1.10 O que foi deferido por despacho de 29 de junho de 2017.

 

1.11 Em 21 de setembro de 2017, a AT apresentou a sua resposta, defendendo-se por exceção (ineptidão da petição inicial por ininteligibilidade da causa de pedir) e por impugnação, pugnando, respetivamente, pela absolvição da instância ou, subsidiariamente, pela improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

 

1.11 Por despacho de 02 de outubro de 2017, o tribunal arbitral julgou inverificada a exceção suscitada.

 

1.12 Pelo mesmo despacho, foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e convidadas as Partes a produzirem alegações escritas, no prazo, sucessivo, de dez dias, contando-se o da AT a partir da notificação das alegações dos Requerentes.

 

1.13 Considerando que a AT não juntou o PA, não obstante, na resposta apresentada, ter protestado fazê-lo, os Requerentes, em 03 de outubro de 2017, vieram ao processo requerer a notificação daquela tendo em vista a junção de tal documento, uma vez que o mesmo se configurava como meio de prova essencial na demonstração de vários factos alegados no requerimento de pronúncia arbitral.

 

1.14 Na mesma data responderam à exceção arguida pela AT, pugnando pela sua improcedência, requerendo também a condenação daquela como litigante de má-fé em multa condigna e no pagamento aos Requerentes de indemnização a fixar segundo o prudente arbítrio do tribunal arbitral em montante correspondente a 5% do valor do pedido condenatório.

 

1.15 Ainda na mesma data (03-10-2017) o tribunal determinou a notificação da AT para, em cinco dias, proceder à junção do referido PA.

 

1.16 Os Requerentes, em 03-10-2017, tendo conhecimento da prolação do despacho que julgou improcedente a referida exceção, vieram requerer a desconsideração do articulado respeitante à resposta à mesma.

 

1.17 Em 13 de outubro de 2017, os Requerentes apresentaram alegações e formularam as consequentes conclusões, pugnando pela procedência do pedido de pronúncia arbitral, nos termos constantes do respetivo petitório, e ainda pela condenação da AT como litigante de má-fé em multa e indemnização a fixar pelo tribunal arbitral.

 

1.18 Em 19 de outubro de 2017, a AT juntou aos autos o respetivo PA.

 

1.19 Em 30 de outubro de 2017, a AT apresentou alegações, pugnando, mais uma vez, pela procedência da exceção invocada ou, subsidiariamente, pela improcedência do pedido de pronúncia arbitral e, respondendo ao pedido de condenação como litigante de má-fé, refere a inexistência de qualquer culpa pela alegada exceção de ineptidão da petição inicial, atendendo à sua prolixidade. 

 

1.20 Em 08-11-2017, a AT requereu a junção de um documento (despacho de ratificação do despacho, sem data, previsto no artigo 65.º, n.ºs 4 e 5 do CIRS), com data de 04-05-2017, e que, por lapso, diz, não anexou ao PA.

 

1.21 Na mesma data o Tribunal Arbitral admitiu a junção do referido documento e designou a data de 30 de novembro de 2017 para prolação da decisão arbitral.    

 

1.22 Notificados da junção desse documento, vêm os Requerentes, em 20-11-2017, requerer que o tribunal arbitral o desconsidere e desatenda, porquanto o mesmo:

É juridicamente ineficaz, em virtude de não ter sido objeto de notificação aos seus diretos interessados, cfr. artigo 77.º, n.º 6, da Lei Geral Tributária (LGT); artigo 36.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT); e artigo 66.º, n.º 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS);

A sua tardia apresentação e invocação nos presentes autos viola o princípio da concentração da defesa, em especial na sua dimensão de proibição de invocação de novos meios de defesa após a apresentação da resposta da AT, salvo no caso de meios supervenientes, cfr. artigos 83.º, n.º 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e 573.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 29.º do RJAT;

É ilegal, por intempestivo, em virtude de apenas ter tido lugar após o decurso do prazo limite fixado no artigo 168.º, n.º 3, do Código do Procedimento Administrativo (CPA), aplicável ex vi do artigo 164.º, n.º 1, do mesmo corpo de leis; e

É ilegal, por intempestivo, em virtude não ter sido notificado ao Presidente do CAAD dentro do prazo limite fixado no artigo 13.º, n.º 1, do RJAT.

 

1.23 Consequentemente procedem à ampliação do pedido e da causa de pedir, de modo a que o tribunal arbitral reconheça a ilegalidade daquele ato, relativamente aos efeitos já produzidos, ao abrigo do disposto no artigo 64.º, n.º 6 do CPTA, aplicável por força do artigo 29.º, n.º 1 alínea c) do RJAT. E que a convalidação do ato não valha senão para o futuro, nos termos do artigo 164.º, n.º 4 do CPA, posto que o ato de sanação foi proferido já na pendência do presente processo.

 

1.24 Alterando o petitório nos seguintes termos:

“a. Deverá esse douto Tribunal Arbitral declarar a invalidade originária do Ato de alteração proferido pelo Chefe da Divisão de Inspeção Tributária V em data desconhecida (porque omitida no texto do próprio ato e no da sua notificação), decorrente de vício de incompetência relativa; 

b. Deverá esse douto Tribunal Arbitral anular os efeitos lesivos produzidos medio tempore pelo Ato de Alteração no período que precedeu a prolação do Despacho de Ratificação, nos termos do art. 164.º, n.º 5, in fine, do CPA; e consequentemente,

c. Proceder à anulação da Liquidação Impugnada (i) seja porque esta é, em si mesma, um dos efeitos lesivos medio tempore produzidos pelo Ato de Alteração que devem ser anulados por força do art. 164.º, n.º 5, in fine, do CPA; e (ii) seja porque em consequência da anulação dos efeitos lesivos produzidos medio tempore pelo Ato de Alteração, a Liquidação Impugnada está ferida de vício de violação de lei decorrente erro nos pressupostos de facto, na medida em que teve por base uma circunstância que, na realidade, não se verificava, porquanto à data em que foi proferida a Liquidação Impugna­da inexistia um qualquer título juridicamente válido por via do qual se pudesse considerar estabelecida (por alteração ou correção dos rendimentos declarados pelos Requerentes) a base tributável sobre a qual incidiu a Liquidação Impugnada.

No restante se mantendo o pedido e a causa de pedir relativos às causas de ilegalidade assacadas à Liquidação Impugnada e à Liquidação de Juros Compensatórios no requerimento de pronúncia arbitral e reiteradas nas alegações dos Requerentes”.

Peticionam ainda a condenação da AT por contumaz litigância de má-fé em indemnização condigna aos Requerentes a fixar segundo o prudente arbítrio deste tribunal arbitral.

 

1.25 Por despacho de 21-12-2017 foi admitida a modificação objetiva da instância.

 

1.26 Sendo a Requerida notificada para, no prazo de dez dias, produzir, querendo, alegações complementares restritas à matéria contida na alteração admitida.

 

 

2. Posição das Partes

É a seguinte a causa de pedir, ou seja, os factos que servem de fundamento aos pedidos condenatórios deduzidos pelos Requerentes:

 

Da ilegalidade da liquidação adicional de IRS -

2.1 Ilegalidade decorrente de vício de incompetência relativa;

2.2 Ilegalidade decorrente da caducidade do direito de liquidação;

2.3 Ilegalidade decorrente da caducidade do procedimento tributário;

2.4 Ilegalidade decorrente de vício de procedimento por omissão da notificação da decisão de instauração do procedimento tributário;

2.5 Ilegalidade decorrente de violação do princípio de participação procedimental;

2.6 Ilegalidade decorrente de vício de forma por omissão de notificação do despacho autorizativo do dirigente máximo do serviço;

2.7 Ilegalidade decorrente da nulidade de notificação do ato de alteração do rendimento;

2.8 Ilegalidade decorrente de vício de falta de fundamentação;

2.9 Ilegalidade decorrente de vício de incongruência da fundamentação;

2.10 Ilegalidade decorrente de erro nos pressupostos de facto na aplicação da disposição antiabuso;

2.11 Ilegalidade decorrente de erro nos pressupostos de direito na aplicação da disposição antiabuso;

2.12 Ilegalidade decorrente de violação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade;

2.13 Ilegalidade decorrente de violação do princípio da capacidade contributiva e ilegitimidade procedimental;

 

Da ilegalidade da liquidação de juros compensatórios -

2.14 Ilegalidade consequente da ilegalidade da liquidação adicional de IRS;

2.15 Ilegalidade decorrente de violação do direito de participação procedimental;

2.16 Ilegalidade decorrente de vício de falta de fundamentação;

2.17 Ilegalidade decorrente de erros nos pressupostos de facto e de direito; e

 

2.18 Da responsabilidade no caso de má-fé.

 

***

 

2.1 Ilegalidade decorrente de vício de incompetência

Dos Requerentes (art.s 487 a 592 do requerimento de pronúncia arbitral (r.p.a.), 29 a 34 das alegações e alegações complementares apresentadas em 20-11-2017):

Que, nos termos do n.º 5 do artigo 65.º do CIRS, a competência para a prática dos atos de apuramento, fixação ou alteração referidos neste artigo é exercida pelo diretor de finanças em cuja área se situe o domicílio fiscal dos sujeitos passivos, ou seja, no caso dos autos, o diretor de finanças do Porto.

Porém, o ato de alteração foi praticado pelo funcionário tributário Dr. D…, que exerce o cargo de Chefe de Divisão da Divisão de Inspeção Tributária … da Direção de Finanças do Porto.

Que o diretor de finanças do Porto delegou tal competência na diretora de finanças adjunta Dr.ª E…, que por sua vez a subdelegou no referido chefe de divisão, mas apenas até ao limite de 1 000.000,00, por cada exercício.

Pelo que, considerando que o montante alterado é de 1 500 371,24 €, a referida competência, no caso concreto, não foi delegada nem subdelegada, devendo ser exercida pela entidade competente, ou seja, pelo diretor de finanças do Porto.

Assim o ato de alteração do rendimento líquido, proferido nos termos do artigo 65.º, n.º 4, do CIRS, está ferido de vício de incompetência, na medida em que foi praticado por órgão ou agente que não dispunha de competência própria, delegada ou subdelegada para a sua prolação, gerando a anulabilidade do ato por ela viciado, cfr. artigo 163.º, n.º 1, do CPA.

O vício de incompetência apontado ao ato de alteração gera a sua anulabilidade e, por arrastamento e extensão, por força do princípio da impugnação unitária prevista no artigo 54.º do CPPT, gera a consequente anulabilidade da própria liquidação impugnada.

 

Nas alegações complementares apresentadas em 20-11-2017, os Requerentes referem:

Que o despacho de ratificação é juridicamente ineficaz, em virtude de não ter sido objeto de notificação aos seus diretos interessados, cfr. artigo 77.º, n.º 6, da LGT; artigo 36.º, n.º 1, do CPPT; e artigo 66.º, n.º 1, do CIRS;

A sua tardia apresentação e invocação nos presentes autos viola o princípio da concentração da defesa, em especial na sua dimensão de proibição de invocação de novos meios de defesa após a apresentação da resposta da AT, salvo no caso de meios supervenientes, cfr. artigos 83.º, n.º 4, do CPTA e 573.º, n.º 2, do CPC, ex vi do artigo 29.º do RJAT;

Que o referido despacho é ilegal, por intempestivo, em virtude de apenas ter tido lugar após o decurso do prazo limite fixado no artigo 168.º, n.º 3, do CPA, aplicável ex vi do artigo 164.º, n.º 1, do mesmo código; e

Bem como por não ter sido notificado ao Presidente do CAAD dentro do prazo limite fixado no artigo 13.º, n.º 1, do RJAT.

 

Da Requerida (art.s 50 a 52 das alegações):

Refere que, analisando as fls. 75, 117, 203, 208 e 251 do PA, facilmente é percetível que todos os atos contêm assinatura e a data em que foram praticados.

Pelo que não se entende a falta da formalidade invocada pela Requerente.

*

2.2 Ilegalidade decorrente da caducidade do direito de liquidação

Dos Requerentes (art.s 45 a 141 do r.p.a. e 5 a 9 das alegações):

Que, de acordo com o artigo 45.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT), “(…)o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao sujeito passivo no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro”.

E que, no caso dos impostos periódicos, de acordo com o n.º 4 do mesmo preceito “(…)  o termo inicial do referido prazo de caducidade ocorre com o termo do ano em que se verificou o facto tributário”.

Estando em causa nos presentes autos a liquidação adicional de IRS (imposto periódico), relativa ao ano de 2012, o termo inicial de caducidade teve lugar em 31-12-2012, sendo que o termo final ocorreu em 31-12-2016, já que não se verificou qualquer facto suspensivo ou interruptivo do referido prazo de caducidade.

Que a liquidação deveria ter sido validamente notificada aos Requerentes até esta data, sob pena de ter caducado o direito da AT à liquidação do imposto.

Não sendo um elemento intrínseco do ato de liquidação, e daí não constituir requisito da sua validade, a sua notificação funciona como condição de eficácia e da sua suscetibilidade de produzir efeitos jurídicos, mormente em face do sujeito passivo seu destinatário.

Porém a liquidação impugnada não foi validamente notificada aos Requerentes até ao termo do prazo de caducidade, que terminou no dia 31-12-2016.

É que, em 11-3-2016 os Impugnantes outorgaram procuração a Advogada para os representar no âmbito do procedimento tributário que conduziu à prolação da liquidação impugnada (cfr. Doc. n.º 7), conferindo-lhe “(…) os mais amplos poderes forenses gerais em direito permitidos, incluindo o poder de substabelecer, para em seu nome e representação intervir no âmbito do procedimento tributário que atualmente se encontra pendente na Direção de Finanças do Porto — Serviços de Inspeção Tributária — Divisão … sob o n.º OI 2016…, bem como em todos os seus incidentes e apensos e em todos os processos graciosos, judiciais ou arbitrais que tenham por objeto as decisões que venham a ser proferidas naquele procedimento e nos seus incidentes e apensos”.

A referida procuração foi junta ao requerimento subscrito pela respetiva mandatária (cfr. Doc. n.º 8), no âmbito do direito de audiência exercido pelos Impugnantes relativo ao projeto de relatório da ação de inspeção, tendo sido apresentado em 14-03-2016.

Pelo que, nos termos do artigo 40.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), as notificações aos interessados que tenham constituído mandatário serão feitas na pessoa deste e no seu escritório.

Dispondo o n.º 3 do mesmo artigo que as notificações serão feitas por carta ou aviso registados, dirigidos para o domicílio ou escritório dos notificados, podendo estes ser notificados pelo funcionário competente quando encontrados no edifício do serviço ou tribunal.

Vale isto por dizer que, “(…)  tendo os Impugnantes constituído mandatária, todos os atos do procedimento tributário — e, por maioria de razão, o seu ato final e  horizontalmente definitivo, de resto o único que pode legalmente ser objeto de impugnação (art. 54.º do CPPT) — deveriam ser notificados aos Impugnantes na pessoa da respetiva mandatária e no escritório desta”.

Neste sentido pronunciou-se o Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS) no acórdão de 10-04-2014 (P.º 07443/14): “(…) No caso vertente, o que importa, pois, é indagar se foi efectuada notificação, ao impugnante e na forma legal, dentro do prazo de caducidade da liquidação. (…) Consagra o artº. 40, nº.1, do C.P.P.T., a obrigatoriedade de a notificação dos interessados que tenham constituído mandatário ser feita na pessoa do seu mandatário, sendo que tal normativo se aplica às notificações a mandatários tanto no procedimento tributário como em processos judiciais tributários. “(…) Da exegese do regime acabado de mencionar se deve concluir que tendo sido constituído mandatário judicial no procedimento tributário é obrigatória a notificação deste do acto de liquidação que pôs termo ao mesmo procedimento gracioso, não sendo esta notificação substituível pela notificação do próprio sujeito passivo. “(…) ter-se-á de concluir que a notificação feita somente na pessoa do sujeito passivo é ineficaz, nomeadamente para fazer operar o termo final do prazo de caducidade do direito à liquidação (cfr. ac. S.T.A.-2ª.Secção, 4/5/2011, rec.927/10; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.394 e seg.). “(…)Concluindo, os actos de liquidação em causa não podem produzir efeitos relativamente ao sujeito passivo, sendo, por essa razão, actos ineficazes, o que se declara”.

Tanto mais que “o relatório definitivo da ação de inspeção e o subsequente ato de alteração do rendimento tributável dos Impugnantes foram, e bem, notificados aos Impugnantes na pessoa da mandatária constituída através de ofício expedido por via postal para o escritório desta (cfr. Doc. n.º 9)”, sendo na mesma notificação referido que, “A breve prazo, os Serviços da AT procederão à notificação da liquidação respetiva, a qual conterá os meios de defesa, bem como o prazo de pagamento, se a ele houver lugar”.

No entanto, “Na comunicação dirigida aos Impugnantes (cfr. Doc. n.º 12, através da qual se dava conta de que “...nesta data notificamos o Vosso mandatário [...] do resultado da ação de inspeção...”) não foi feita qualquer referência a uma futura notificação da liquidação, nem aos termos em que ela se procederia”.

Resultando, deste modo, a inelutável conclusão que “o impugnado ato de liquidação não foi validamente notificado aos Impugnantes dentro do prazo de caducidade previsto no art. 45.º, n.º 1, da LGT”, pelo menos até à data da entrada em juízo da petição inicial, não constituindo ato pessoal para efeitos do n.º 2 do artigo 40.º do CPPT.

“Nem tão-pouco se oponha ao que vem dito uma certa construção que tem vindo a fazer escola nalguma doutrina e que aponta no sentido de que o procedimento de liquidação é um procedimento distinto dos anteriores ‘procedimentos’ tributários que cronologicamente antecederam aquele — e, por maioria de razão, da ação de inspeção — e que, portanto, a constituição de mandatário na ação inspetiva já não seria válida para o procedimento de liquidação subsequente”.

Com efeito, o “Procedimento tributário é uma unidade sequencial de atos procedimentais ordenados em vista da prática de um ato de liquidação”, entendendo-se esta, em sentido lato, como “o conjunto de atos, juridicamente enquadrados, que têm por objeto a determinação e quantificação da obrigação tributária, abrangendo quer as atuações da Administração tributária (aplicação de métodos indiretos ou indiciários, aplicação das taxas de imposto, cálculo das deduções devidas, etc.), quer as atuações dos contribuintes ou de terceiros (declarações, por exemplo) nesse sentido”.

“Porquanto por força do princípio da impugnação unitária (cfr. art. 54.º do CPPT) toda a atuação procedimental anterior à prolação do ato de liquidação (i. é, a liquidação em sentido estrito) forma parte de um único procedimento tributário”.

Sendo insustentável afirmar-se que “(…) o precedente (sub)procedimento inspetivo e o subsequente (sub)procedimento de liquidação são totalmente estanques e separados um do outro para, daí, se procurar retirar a conclusão de que o mandatário constituído para intervir em nome do sujeito passivo no primeiro daqueles (sub)procedimentos, já carece de poderes para figurar no segundo deles”.

Assim, “A constituição de mandatário em qualquer fase ou (sub)procedimento do procedimento tributário vale para todo o procedimento tributário, incluindo para o (sub)procedimento de liquidação, em sentido estrito, que lhe põe termo”.

Deste modo “O mandatário constituído pelo sujeito passivo em qualquer fase ou (sub)procedimento do procedimento tributário permanece na plenitude dos seus poderes de representação até ao termo do procedimento tributário — isto é, até à prolação do ato de liquidação”.

Pelo que, “(…) tendo o sujeito passivo constituído mandatário em qualquer momento, fase ou (sub)procedimento do procedimento tributário as subsequentes notificações que àquele tenham de ser feitas devem ser realizadas na pessoa do mandatário constituído”, incluindo também a notificação da liquidação, aliás o último e único ato do procedimento que, de resto, pode ser objeto de impugnação (art. 54.º do CPPT).

Importa ainda ter presente que “(…) o caso dos autos não diz respeito a um normal e típico procedimento de liquidação, em relação ao qual alguma doutrina se tem pronunciado se dever distinguir e separar a fase da ação de inspeção e a fase da liquidação”, mas antes a um procedimento de liquidação de tributos com base na aplicação da disposição antiabuso, previsto e regulado pelo artigo 63.º do CPPT, desencadeado oficiosamente pela AT, e dirigido à liquidação de tributos com base na aplicação do disposto no artigo 38.º, n.º 2, da LGT.

Procedimento esse expressamente regulado na secção relativa a “procedimentos próprios [de liquidação]” (a Secção IV) do capítulo relativo ao “procedimento de liquidação” (Capítulo III) do CPPT e que “(…) compreende uma tramitação que se estende desde a decisão de instauração até à decisão de liquidação, passando pela elaboração de um projeto de decisão, pela audição do sujeito passivo e pela decisão de autorização do dirigente máximo do serviço”.

Pelo exposto conclui que caducou o direito da AT a proceder à liquidação impugnada, uma vez que a mesma não foi validamente notificada aos Impugnantes dentro do prazo de caducidade.

 

Da Requerida (art.s 7 a 17 das alegações):

Os Requerentes constituíram mandatário nos autos e participaram no procedimento de inspeção tributário que tem subjacente o ato de aplicação da Cláusula Geral Antiabuso (CGAA), tendo sido notificados para exercer o direito de audição, e participar na decisão/procedimento, pelo que é manifestamente abusivo e numa clara de situação de venire contra factum proprium vir alegar que afinal nunca foram notificados do ato de liquidação, conforme refere no artigo 79.º do r.p.a..

Refere que os Requerentes foram validamente notificados não só da OI2016… como veio exercer, a 04 de Março de 2016, o direito de audição (vide p.a.) tendo sido notificados através da sua mandatária e adicionalmente nas suas pessoas da conclusão do procedimento e os Requerentes da liquidação do imposto, tudo antes de 31-12-2016.

Pelo que é manifestamente improcedente a alegada caducidade da liquidação invocada.

*

2.3 Ilegalidade decorrente da caducidade do procedimento tributário

Dos Requerentes (art.s 142 a 300 do r.p.a. e 10 a 18 das alegações):

Que a liquidação de tributos com base na disposição antiabuso, constante do n.º 2 do artigo 38.º da LGT, segue os termos do procedimento próprio previsto e regulado no artigo 63.º do CPPT, que é de 1.º grau, desencadeado oficiosamente pelos serviços da AT e tipicamente culmina, a final da sua tramitação, com a prolação de um ato de liquidação de um tributo.

Como nenhum procedimento tributário se pode prolongar eternamente e o legislador não fixou um prazo máximo para a sua duração, há que fazer apelo ao disposto no artigo 57.º, n.º 1, da LGT, nos termos do qual o procedimento tributário, incluindo o regulado no artigo 63.º do CPPT, deve ser concluído no prazo de quatro meses e que se computa nos termos previstos nos termos do artigo 279.º do Código Civil (cfr. artigo 20.º, n.º 1, do CPPT; artigo 57.º, n.º 2, da LGT). Contudo o legislador tributário não indica qual a consequência do incumprimento ou inobservância deste prazo.

Que inexiste no CPPT ou na LGT qualquer norma que discipline ou determine a consequência que deva ter lugar quando a AT exceda o prazo máximo de duração de um procedimento tributário, desencadeado por iniciativa oficiosa dos próprios serviços, pelo que ter-se-á de recorrer à aplicação do direito subsidiário, nos termos regulados no artigo 2.º do CPPT, convocando para o efeito o artigo 128.º, n.º 6, do Código do Procedimento Administrativo (CPA) que refere: “[o]s procedimentos de iniciativa oficiosa, passíveis de conduzir à emissão de uma decisão com efeitos desfavoráveis para os interessados caducam, na ausência de decisão, no prazo de 180 dias.”

Para que esta consequência — a caducidade do procedimento administrativo — se verifique torna-se necessário que estejam reunidos os seguintes requisitos:

  • tratar-se de um procedimento de iniciativa oficiosa;
  • o procedimento ser passível de conduzir à emissão de uma decisão com efeitos desfavoráveis para o interessado;
  • ausência de prolação de decisão no procedimento dentro do prazo de 180 dias.

Para os Requerentes esta norma tem plena aplicação ao caso do procedimento de liquidação de tributos por aplicação da norma antiabuso, previsto e regulado no artigo 63.º do CPPT, no que se refere às consequências da inobservância do prazo máximo de duração daquele tipo de procedimento e não já quanto a estatuição do prazo máximo de duração dos procedimentos de iniciativa oficiosa da Administração.

Apesar de a decisão de instauração do procedimento tributário não ter sido notificada aos Impugnantes, do relatório definitivo da ação de inspeção resulta que o mesmo se terá iniciado em, ou antes de, 26-01-2016 (cfr. p. 1 do Doc. n.º 9), pelo que o prazo máximo para a sua decisão — quatro meses — terminaria em 27-05-2016 (uma vez que 26-05-2016 foi dia feriado nacional) ou, em 01-07-2016, se a realização da audiência dos interessados teve a virtualidade de suspender a contagem do prazo, por força do disposto no artigo 121.º, n.º 3, do CPA.

Assim, em 01-07-2016, ocorreu a caducidade do procedimento e a consequente extinção da relação jurídica procedimental, pelo que todos os atos proferidos após esta data, nomeadamente o despacho da Diretora-Geral da AT, de 18-10-2016, que terá sido no sentido de autorizar a tributação por aplicação da disposição antiabuso, nos termos e para os efeitos previstos no art. 63.º, n.º 7, do CPPT; o despacho que procedeu à alteração dos rendimentos declarados dos Impugnantes, cuja data se ignora; e a Liquidação n.º 2016…, correspondendo à Liquidação Adicional de IRS relativa ao ano de 2012 (que corresponde à Liquidação Impugnada) efetuada em 10-11-2016, foram proferidos já depois de caducado o procedimento tributário, o que vale por dizer que foram praticados com preterição total do procedimento legalmente exigido, a que corresponde a sanção da nulidade, cfr. artigo 161.º, n.º 2, al. l), do CPA.

Para as ações inspetivas internas — precisamente o tipo de inspeções em causa no procedimento tributário objeto dos presentes autos — não está prevista, nas leis tributárias, qualquer consequência para o incumprimento, pela AT, do prazo máximo (seis meses) fixado para a respetiva duração, pelo que fazendo funcionar, a título supletivo, o regime constante do artigo 128.º, n.º 6, do CPA, e considerando que a referida ação inspetiva se iniciou em, ou antes de, 26-01-2016, o termo do prazo ocorreria em 26-07-2016 ou, em 29-08-2016, se a realização da audiência dos interessados teve a virtualidade de suspender a contagem do prazo, por força do disposto no artigo 121.º, n.º 3, do CPA.

Assim, a partir de uma destas duas datas o procedimento da ação interna de inspeção caducou, sendo nulos os atos posteriormente proferidos pela AT, nomeadamente o relatório definitivo da ação interna de inspeção (datado de 21-10-2016), assim como o despacho de sancionamento que sobre o mesmo recaiu (datado de 31-10-2016), projetando-se tal nulidade na concomitante invalidade consequente da própria Liquidação Impugnada que é, desse modo, igualmente nula.

Mas, mesmo que se entendesse que o artigo 161.º, n.º 2, al. l), do CPA não teria aplicação ao caso presente, sempre se teria de concluir, ainda assim, pela anulabilidade da Liquidação Adicional decorrente da já apontada caducidade do procedimento tributário, na medida em que se estará perante um vício de procedimento gerador de ilegalidade, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do CPA.

 

Da Requerida (art.s 18 a 33 das alegações):

Refere que “o legislador não determina qualquer prazo para o início e conclusão do procedimento, sendo que a própria doutrina e jurisprudência fazem depender aplicação da CGAA apenas da caducidade do início do “last step “do conjunto de actos do esquema abusivo”.

Pelo que “dificilmente um prazo para o procedimento poderia ser inferior ao da acção inspectiva não só porque, estamos perante esquemas complexos, mas também por vezes são plurilocalizados, o que não se compadecem com os prazos gerais normais da acção inspectiva”.

Entende que o prazo é meramente ordenador, implicando apenas que o procedimento seja iniciado e concluído, e a consequente liquidação ocorra dentro da janela temporal dos 4 anos da caducidade.

Que “Seria temerário, implicando a própria inexequibilidade do artigo 38.º, n.º 2 da LGT, impor um prazo de 4 meses para os serviços de inspecção desmontarem esquemas complexos, ardilosos de planeamento fiscal abusivo, que muitas vezes não são facilmente perceptíveis ou desmontáveis, como aliás é o que sucede nos presentes autos”.

Que “(…) tendo o procedimento sido concluído e a Requerente notificada da liquidação antes de 31 de Dezembro de 2016, não releva o prazo da acção inspectiva que in casu sendo interna não suspende o prazo de caducidade”.

Assim, o prazo de quatro meses previsto no artigo 57.º, n.º 1, da LGT, porque referido ao prazo geral para o procedimento administrativo, é inaplicável ao caso.

Pelo que atendendo aos vários motivos supra referenciados improcede a caducidade do procedimento ora invocado e as consequentes nulidades também invocadas.

*

2.4 Ilegalidade decorrente de vício de procedimento por omissão da notificação da decisão de instauração do procedimento tributário

Dos Requerentes (art.s 301 a 327 do r.p.a. e 19 a 20 das alegações):

Que do projeto de relatório notificado aos Impugnantes (cfr. Doc. n.º 5) e do relatório definitivo (cfr. Doc. n.º 9), no âmbito do procedimento a que os presentes autos dizem respeito, foi desencadeada uma ação de inspeção interna contra a Impugnante mulher, com início em 26-01-2016 e termo em 04-02-2016, nos termos e por força de uma pretensa ordem de serviço n.º OI 2016…, que teria como âmbito o IRS relativo ao ano de 2012.

Porém, em momento algum se refere quem emitiu a referida ordem de serviço, qual a motivação subjacente à mesma, a respetiva fundamentação e, bem assim, o seu âmbito e propósitos.

Por outro lado os Impugnantes não foram, em momento algum, notificados da ordem de serviço acima referida e pretensamente proferida, desconhecendo, por isso mesmo, o seu teor e conteúdo, ficando impedidos de participar na fase instrutória do procedimento tributário que conduziu à prolação da Liquidação Impugnada, assim como de conhecer todos os elementos que foram sendo carreados para os autos pela AT.

Que é um princípio geral de direito tributário que o início de todo e qualquer procedimento tributário deve ser notificado aos interessados, conforme resulta do artigo 69.º, n.º 2, da LGT, constituindo a sua omissão em vício do procedimento suscetível de gerar a anulação da decisão que com base nele for tomada.

Refere ainda que, uma interpretação do artigo 51.º, n.º 2, do RCPITA, segundo a qual esta norma afastaria a aplicação do artigo 69.º, n.º 2, da LGT às ações internas de inspeção, seria organicamente inconstitucional, uma vez que o RCPITA foi aprovado pelo Governo ao abrigo da sua competência legislativa concorrencial, enquanto a LGT é um diploma adotado ao abrigo da competência legislativa autorizada.

Daí que, em consequência do assacado vício procedimental decorrente de preterição do princípio da participação procedimental, deverá o Tribunal declarar a anulação da Liquidação Impugnada, com todas as legais consequências.

      

Da Requerida (art.s 34 a 38 das alegações):

Refere que, conforme acórdão do TCASul de 07-10-2012 (Proc. 05292/12) “o procedimento de inspecção interno tem por objecto a análise formal e de coerência dos documentos da escrita do contribuinte, bem como o seu cruzamento com outros elementos recolhidos”, não havendo lugar à credenciação dos funcionários para tal efeito nem de emissão de ordem de serviço com vista à notificação do sujeito passivo, no início do procedimento, aliás como decorre do artigo 49.º, n.º 1, do RCPIT (a contrario).

Pelo que improcede o vício alegado.

*

2.5 Ilegalidade decorrente de vício de forma por violação do princípio de participação procedimental

Dos Requerentes (art.s 328 a 412 do r.p.a. e 21 a 24 das alegações):

As testemunhas arroladas pelos Requerentes foram ouvidas nas instalações da Direção Distrital de Finanças do Porto em 31-03-2016 (três) e em 06-04-2016 (as restantes duas), à porta fechada, apenas na presença dos inspetores tributários sem que a mandatária ou dos Requerentes estivessem presentes.

Posteriormente ao exercício, pelos Impugnantes, do seu direito de audiência prévia, a AT procedeu oficiosamente e por sua própria iniciativa à recolha de novos meios de prova documental, designadamente:

  • Obteve no sítio oficial das publicações societárias do Ministério da Justiça um projeto de fusão relativo a uma sociedade denominada F…, LDA (NIF…), cujo conteúdo é expressamente citado e invocado no relatório definitivo da ação de inspeção (cfr. pp. 61-62 do Doc. n.º 9).
  • Obteve as Declarações de Anuais de Informação Contabilística e Fiscal/IES apresentadas pela sociedade G… SGPS, S.A. durante um período de 16 anos (desde 1999 até 2014), tendo reproduzido (de resto com erros e incorreções) algumas das informações contabilísticas nelas contidas num quadro que consta de p. 63 do relatório definitivo da ação inspetiva e tecendo acerca desses dados várias considerações e conclusões, também incorretas e infundadas, a pp. 60 e 62-64.
  • Obteve as Declarações Anuais de Informação Contabilística e Fiscal/IES apresentadas por uma sociedade denominada  H… LDA (NIF…) relativas aos exercícios de 2012 a 2014, tendo reproduzido (ignora-se se corretamente ou incorretamente) algumas das informações contabilísticas nelas contidas num quadro que consta a p. 64 do relatório definitivo da ação inspetiva e aí tecendo acerca desses dados várias considerações e conclusões.
  • Obteve uma reportagem jornalística publicada no Jornal Público de 15-07-2012 cujo texto reproduziu integralmente a pp. 66 e 67, pretendendo retirar a partir de tal reportagem a pretensa prova de factos instrumentais ao preenchimento da factispécie da norma do art. 38.º, n.º 2, da LGT.

Também os depoimentos de algumas das testemunhas arroladas foram expressamente invocados no relatório definitivo da ação de inspeção (cfr. pp. 27 a 29; e p. 65).

Por conseguinte, após o exercício pelos Impugnantes do seu direito de audição prévia, a AT procedeu à realização de diligências instrutórias complementares que não foram dadas a conhecer aquando da notificação para o exercício do referido direito, não sendo os mesmos confrontados com esses meios de prova nem com a utilização (de resto errónea e incorreta) que deles foi feita pela AT no RIT definitivo, vendo-se deste modo privados de emitir qualquer pronúncia.

A omissão da promoção desta nova audição dos Impugnantes revela-se, em concreto, como violadora do princípio da participação procedimental, consagrado no artigo 60.º da LGT, e que consubstancia a preterição de uma formalidade legal essencial, geradora de vício de procedimento que se projeta na anulabilidade da Liquidação Impugnada, não passível do aproveitamento do ato por estar em causa a tributação por aplicação da disposição geral antiabuso, prevista no artigo 38.º, n.º 2, da LGT, cuja aplicação envolve uma especial “dose de insegurança” decorrente do facto de nela ir implicado um determinado grau de subjetividade por parte dos órgãos da Administração Tributária.

Deste modo não se pode sustentar que, ainda que os Impugnantes tivessem tido a oportunidade de exercer o seu direito de audiência após a realização das diligências instrutórias complementares, a decisão administrativa teria forçosa e necessariamente o mesmo conteúdo.

É que, mesmo assim, por força do disposto no artigo 103.º, n.º 3, da CRP, todas as formalidades estabelecidas no procedimento tributário são formalidades essenciais e a sua preterição tem sempre eficácia invalidante, donde resulta a inaplicabilidade no campo do direito tributário do princípio do aproveitamento do ato, previsto no artigo 163.º, n.º 5, do CPA. Uma eventual interpretação em sentido diferente seria materialmente inconstitucional.

Daí que, em consequência do assacado vício procedimental decorrente de preterição do princípio da participação procedimental, deverá o Tribunal declarar a anulação da Liquidação Impugnada, com todas as legais consequências.

 

Da Requerida (art.s 39 a 41 das alegações):

Refere que “No âmbito do procedimento inspectivo e antes da formação do acto de autorização da CGAA a Requerente participou no procedimento, exercendo o direito de audição, existindo inclusive audição de testemunhas, expondo de facto e de direito as motivações pelo qual não concorda com a aplicação do procedimento de CGAA”.

Pelo que é manifestamente improcedente tal alegação.

*

2.6 Ilegalidade decorrente de vício de forma por omissão de notificação do despacho autorizativo do dirigente máximo do serviço

Dos Requerentes (art.s 413 a 486 do r.p.a. e 25 a 28 das alegações):

Que o ato autorizativo previsto no n.º 7 do artigo 63.º do CPPT não tem efeitos externos, mas puramente internos. Porém, não obstante não se revestir de carácter lesivo ou definitivo, é um ato procedimental que condiciona e serve de pressuposto necessário ao ato decisório final do procedimento, configurando-se como constitutivo de legitimação.

O facto de as autorizações interorgânicas constitutivas de legitimação não terem eficácia externa nem serem imediatamente lesivas não lhes retira a natureza de verdadeiros atos administrativos, internos e procedimentais, que conformam o objeto da relação jurídica procedimental, funcionando como um pressuposto procedimental (e não material) do subsequente ato de liquidação de um tributo por aplicação da disposição geral antiabuso.

Donde resulta que a autorização do dirigente máximo do serviço a que se refere o n.º 7 do artigo 63.º do CPPT não é imediatamente lesiva dos contribuintes, porque não opera, por si própria, qualquer ablação da esfera jurídica dos interessados, mas é suscetível de afetar direitos e interesses legítimos dos contribuintes, tendo deste modo eficácia constitutiva e efeitos inovatórios que se refletem no status destes enquanto sujeitos da relação jurídica procedimental.

Pelo que, não se tratando de um ato com eficácia externa no plano da relação substantiva de direito tributário, o ato autorizativo é um ato modificativo da relação jurídica procedimental, reconfigurando o objeto desta de modo a legitimar a AT a proferir um ato tributário lesivo e externo que, de outro modo, não teria legitimidade procedimental para proferir.

Assim, perante esta natureza de ato administrativo procedimental, conformador do objeto da relação jurídica procedimental e que serve de pressuposto do ato de liquidação, a autorização do dirigente máximo do serviço tem de ser notificada aos interessados no procedimento, até por força do disposto no artigo 77.º, n.º 6, da LGT e do artigo 36.º, n.º 1, do CPPT, sob pena de gerar a ineficácia dessa decisão e impedir que possa servir de pressuposto e de condição para a prática do ato autorizado, isto é, do ato de liquidação do tributo por aplicação da disposição geral antiabuso.

Deste modo a falta de notificação aos Impugnantes do despacho a autorizar a tributação por aplicação da disposição geral antiabuso, aparentemente proferido pela Diretora-Geral da AT, em 18-10-2016, gera a sua ineficácia jurídica, uma vez que aqueles desconhecem não apenas se o despacho foi realmente proferido, como desconhecem por completo o seu conteúdo e fundamentos, determinando a anulabilidade da consequente liquidação, i.é, da Liquidação Impugnada, por vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto, assim como de vício de ilegitimidade.

 

Consequentemente, na procedência dos invocados vícios decorrentes da ineficácia jurídica do pretenso despacho autorizativo alegadamente proferido pela Diretora-Geral da AT, a Liquidação Impugnada é anulável e, como tal, deve o Tribunal determinar a sua anulação.

 

Da Requerida (art.s 42 a 49 das alegações):

Refere que, nos termos do artigo 63.º, n.º 7, do CPPT, a aplicação da disposição antiabuso referida no n.º 1 é prévia e obrigatoriamente autorizada, após a audição prévia do contribuinte, prevista no n.º 5, pelo dirigente máximo do serviço ou pelo funcionário em quem ele tiver delegado essa competência.

Que o projeto de aplicação da CGAA, foi validamente notificado aos Requerentes, tendo estes exercido o direito de audição e participado na decisão do despacho de autorização, sabendo os fundamentos de facto e de direito que estão subjacentes ao despacho de autorização da CGAA, sendo consequentemente notificados do relatório final e do despacho de autorização, que assim o integra, atendendo ao princípio da impugnação unitária constante no artigo 54.º do CPPT.

Pelo que é manifestamente improcedente o vício ora imputado, não se vislumbrando igualmente de que forma é que se estará a violar o artigo 103.º, n.º 3 da CRP, que em todo o caso não concretiza a alegada inconstitucionalidade.

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2.7 Ilegalidade decorrente da nulidade de notificação do ato de alteração do rendimento

Dos Requerentes (art.s 593 a 667 do r.p.a. e 35 a 38 das alegações):

Que a notificação do Ato de Alteração padece da nulidade insanável a que se refere o artigo 39.º, n.º 12, do CPPT, uma vez que, em lugar algum do ofício notificativo, se faz qualquer referência quanto à data de prolação do ato notificado, ou seja, não consta da notificação a data em que foi proferido o Ato de Alteração nem na própria nota de fixação/alteração.

Que o quadro 3 da referida nota, destinado à indicação do domicílio fiscal dos sujeitos passivos, está errado, uma vez que os impugnantes nunca tiveram domicílio no endereço aí referido, o qual desconhecem sequer onde fica.

Assim, sendo nula a notificação do Ato de Alteração por vício de violação de lei decorrente de erro nos pressupostos de facto, é o mesmo ato juridicamente ineficaz, cfr. artigo 36.º, n.º 1, do CPPT e artigo 77.º, n.º 6, da LGT, determinando a anulabilidade da consequente liquidação, i.é, da liquidação impugnada, devendo o Tribunal determinar a sua anulação.

 

Da Requerida (art.s 50 a 52 das alegações):

Refere que, analisando as fls. 75, 117, 203, 208 e 251 do PA, facilmente é percetível que todos os atos contêm assinatura e a data em que foram praticados.

Pelo que não se entende a falta da formalidade invocada pela Requerente.

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2.8 Ilegalidade decorrente de vício de falta de fundamentação

Dos Requerentes (art.s 668 a 743 do r.p.a. e 39 a 41 das alegações):

Que, nos termos do artigo 77.º, n.º 1, da LGT, a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, sendo que o ato tributário que não contenha a fundamentação é ineficaz e, consequentemente, anulável.

Porém a lei permite que a fundamentação do ato tributário seja feita por remissão, desde que os fundamentos que o motivam constem de anteriores pareceres, informações ou propostas produzidos no decurso do procedimento a que o ato diz respeito e para os quais o próprio ato remeta expressa e especificadamente, sob pena de se verificar violação do dever de fundamentação e, por consequência, pela verificação de um vício gerador da anulabilidade do ato.

Compulsada a Liquidação Impugnada verifica-se que dela não consta qualquer fundamentação que justifique ou motive a decisão de tributação nele tomada e, em especial, a aparente decisão de desconsiderar para efeitos fiscais certos negócios e operações e consequente tributação de outros negócios ou operações em lugar daqueles.

Assim, não é avançada uma única linha motivadora, um único iter argumentativo, que permita compreender o modo como foi determinada a base tributável que, depois de aplicada uma taxa de tributação autónoma, gerou a liquidação daquele quantitativo de imposto, como também não se indica tão-pouco qual a taxa de imposto aplicada em tal ou tais tributações autónomas.

Nada se afirma na Liquidação Impugnada que pudesse fundamentar ou motivar — que pudesse levar qualquer pessoa média colocada na posição de destinatário a compreender — o resultado a que nela se chega, sendo certo que, como se estatui no artigo 77.º, n.º 2, da LGT, a fundamen­ta­ção do ato tributário deve “sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.”

Donde, também por esta via se terá de concluir pela total ausência de funda­men­tação da Liquidação Impugnada: mesmo se se aceitasse uma fundamentação per relationem implícita, a Liquidação Impugnada não deixaria de estar ferida de um vício de falta de fundamentação. Também por esta via, na procedência do invocado vício de falta de fundamentação, deve a Liquidação Impugnada ser anulada.

 

Da Requerida (art.s 53 a 68 das alegações):

Refere que “No que concerne à alegada falta de fundamentação, o relatório inspectivo e a informação integrante do despacho de autorização de aplicação da CGAA notificado à Requerente está fundamentado de facto e de direito, fazendo referência às normas legais aplicáveis, tendo inclusive ao longo da acção inspectiva e do procedimento a participação da Requerente”.

 O ato tributário foi perfeitamente claro e congruente, permitindo à Requerente conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo prosseguido pela Administração para a determinação do ato, pelo que é manifesto que não se encontram diminuídos os direitos de defesa daquela.

Mas ainda que existisse uma eventual falta de fundamentação, ainda assim a Requerente poderia lançar do meio previsto no artigo 37.º, n.º 1, do CPPT e requerer a notificação dos requisitos de que depende o ato.

Pelo que “é incognoscível que nesta fase processual continue a Requerente alegar a falta de fundamentação, por conveniência, com o pressuposto de pela via formal ou procedimental obter um resultado, que contrarie a verdade material nos presentes autos, cuja prova testemunhal inclusive trazida no procedimento corroborou a legalidade da correcção efectuada pela Administração”.

Deste modo é totalmente improcedente o alegado pela Requerente.

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2.9 Ilegalidade decorrente de vício de incongruência da fundamentação

Dos Requerentes (art.s 744 a 796 do r.p.a. e 42 a 44 das alegações):

Referem a existência de duas incongruências e inconsistência ao nível da fundamentação que inquinam o iter lógico-dedutivo na decisão a que o RIT conduz e, de consequência, fulminam a Liquidação Impugnada de vício gerador da sua invalidade.

Com efeito no relatório inspetivo propõe-se que o rendimento líquido de categoria G seja corrigido, para mais, pelo montante de 1 185 250,00€ e seria sobre este montante de rendimento, assim corrigido, que deveria ter incidido a tributação em sede de IRS efetuada pela Liquidação Impugnada.

Porém, no texto desta liquidação, é referido o montante de 326 148,75€ a título de “imposto relativo a tributações autónomas”, quando nem no relatório inspetivo de 21-10-2016, nem em qualquer outra peça do procedimento tributário, se avançou um único argumento, uma motivação que fosse, que permitisse justificar a circunstância de lhes ter sido liquidado IRS relativo a tributações autónomas.

Assim existe uma clara e evidente contradição entre o discurso do relatório inspetivo e a liquidação de imposto a título de tributações autónomas que é levada a cabo na Liquidação Impugnada.

Além disso, no processo de reconfiguração jurídica em que se traduz a estatuição da disposição geral antiabuso há igualmente uma notória desconformidade entre os fundamentos avançados no relatório inspetivo para a aplicação daquele instrumento jurídico e a concreta requalificação que, nesse mesmo relatório, se propõe seja dada à operação em resultado de aplicação daquela disposição. É que, se por um lado se estabelece no relatório de inspeção que se procederá à "tributação do negócio pretendido pelo sujeito passivo, ou seja, a transmissão, de modo direto, pela [Requerente mulher] à G…, SGPS dessas mesmas ações" (p. 20), por outro lado, o mesmo relatório sustenta que toda a estrutura jurídica contestada configurava uma “forma de distribuir aos acionistas o rendimento obtido pela G…, SGPS com a venda da J…” (p. 13), o que “permite concluir que existia a intenção de distribuir aos acionistas da G…, SGPS parte dos proveitos decorrentes da alienação da totalidade da sua participação na J…, BV” (p. 18).

A ser seguido o iter lógico proposto pela AT no RIT, a operação contestada pela AT não deveria ser requalificada no sentido de traduzir uma mais-valia, enquadrada na categoria “G” de rendimentos, como foi, mas antes como rendimento de capital, traduzido precisamente na alegada distribuição aos acionistas (a Requerente mulher e seus irmãos) dos lucros e reservas acumulados pela Sociedade, enquadrados na categoria “E”.

Esta deficiência de fundamentação vicia, por si só e de modo insuprível, a Liquidação impugnada, em termos necessariamente conducentes à respetiva anulabilidade e, como peticiona a final, à sua anulação.

 

Da Requerida (art.s 53 a 68 das alegações):

Também como no vício invocado anteriormente (3.8), para a Requerida o ato tributário foi perfeitamente claro e congruente, permitindo aos Requerentes conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo prosseguido pela Administração para a determinação do ato, razão pela qual o vício ora invocado é manifestamente improcedente.

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2.10 Ilegalidade decorrente de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto quanto à aplicação da disposição geral antiabuso

Dos Requerentes (art.s 797 a 1 081 do r.p.a. e 45 a 57 das alegações):

Que na esteira da doutrina que atualmente se afigura como dominante, a análise da aplicação do artigo 38.º, n.º 2, da LGT é decomposta em cinco elementos correspondem os primeiros quatro à previsão normativa (resultado; meio; normativo; e intelectual) e o último à estatuição (sancionatório).

 

O elemento resultado, enquanto pressuposto ou condição indispensável para poder ser acionada a aplicação da disposição geral antiabuso “contende com a obtenção de uma vantagem fiscal, em virtude da escolha daquele meio, quando comparada com a carga tributária que resultaria da prática dos atos ou negócios jurídicos ‘normais’ e de efeito económico equivalente”.

Vista a questão à luz de cada um dos sujeitos passivos aqui em causa, é manifesto que nos atos que cada um praticou, mormente os levados a cabo pela Requerente mulher, não é possível vislumbrar que se tenha produzido um resultado fiscalmente vantajoso em termo de poder dar causa ao acionamento da aplicação da disposição geral antiabuso prevista no artigo 38.º, n.º 2, da LGT: na esfera jurídica da Requerente mulher, a doação de ações ou de dinheiro a seu filho — os únicos negócios que eventualmente podem ser equivalentes e entre os quais tinha a possibilidade de optar — configuram dois negócios jurídicos com igual impacto fiscal, ou seja, nenhum.

Que a pp. 13 do relatório definitivo da ação inspetiva é identificado, de um modo claro, que “o negócio pretendido pelos sujeitos passivos consistia na alienação de ações da G… SGPS à própria sociedade, por parte d[a Requerente mulher], como forma de distribuir à acionista o rendimento obtido com a venda da participação da J…” e que para evitar a tributação que daí decorreria foi, num primeiro momento, efetuada a doação das ações ao filho, o qual, num segundo momento, as vendeu à Sociedade.

No entanto, não tendo sido a Requerente mulher quem decidiu vender as ações à Sociedade, não tendo por igual razão instruído, ou sequer aconselhado, o seu filho a fazê-lo, a venda das ações à Sociedade correspondeu a uma decisão exclusiva do filho da Requerente e que as mesmas foram doadas pela Requerente mulher a seu filho sem a imposição de um qualquer ónus ou encargo por força do qual o donatário ficasse constituído na obrigação de vender à Sociedade aquelas ações.

A venda foi efetuada pelo seu filho a quem o preço das ações — 1 196 250,00€ — foi pago, em 21-12-2012, através de transferência bancária. O preço da venda das ações foi, portanto, pago pela Sociedade aquirente diretamente ao alienante-donatário, filho da Requerente — facto que é expressamente aceite e reconhecido pela AT. Depois de ter ingressado no património do filho da Requerente, o preço de venda das ações foi por ele gerido, utilizado e fruído, com plena autonomia e de acordo com o seu livre e exclusivo critério, como se fosse seu proprietário — como efetivamente era, e é, e nunca deixou de ser. Portanto, o filho da Requerente recebeu e fez seu o valor pelo qual vendeu as ações à Sociedade.

Pelo que não poderá deixar de se concluir pela não verificação do elemento resultado.

 

O requisito meio — traduzido na demonstração do abuso de formas jurídicas — impõe que o aplicador da disposição antiabuso demonstre que o conjunto de atos ou negócios jurídicos protagonizados pelo contribuinte foram realizados com recurso a soluções jurídicas inusitadas, improváveis e/ou indiretas.

Assim, há que apurar se a doação das ações, pela Requerente a seu filho, seguida da venda pelo donatário à Sociedade configuram uma situação de abuso de formas jurídicas.

Nenhuma atuação pode ser identificada que pudesse determinar uma conclusão no sentido do abuso de formas jurídicas. A Sociedade cumpria, e sempre cumpriu, os requisitos para que a avaliação das suas ações, nos casos de transmissão gratuita, se fizesse por aplicação da fórmula prevista no artigo 15.º, n.º 3, al. a), do Código do Imposto do Selo (CIS). Não há qualquer comportamento artificioso que se pudesse apontar à Requerente mulher, ou a qualquer dos outros intervenientes, quanto àquele que é o mais importante pressuposto desta operação pretensamente fiscalmente vantajosa e que reside precisamente na natureza de ações não cotadas de que se revestem as participações sociais doadas.

 

Também não é possível vislumbrar qualquer abuso de formas jurídicas no que diz respeito àquele que é o negócio que a AT pretende ver fiscalmente desconsiderado: a doação das ações efetuada pela Requerente mulher a seu filho. É notório que o contrato de doação celebrado entre a Requerente mulher e o seu filho cumpriu a sua função social própria não tendo sido desfuncionalizado.

Que segundo o ensinamento uniforme da doutrina, estruturalmente o contrato de doação comporta três elementos: i) a disposição gratuita de bens ou direitos; ii) a diminuição do património do doador; iii) o espírito de liberalidade.

Quanto ao primeiro desses elementos — disposição gratuita de certos bens ou direitos — é evidente que o mesmo está presente no contrato de doação outorgado entre Requerente e seu filho: não foi convencionada ou estipulada entre ambos qualquer obrigação ou contraprestação por parte do donatário, cuja declaração negocial que se limita à simples aceitação da doação, nem sequer foram apostos à doação quaisquer encargos ou reserva de disponibilidade das ações doadas pela doadora, conforme se permite nos artigos 959.º e 963.º do Código Civil. O donatário não se encontra obrigado a repartir, retornar ou, de qualquer forma, remunerar a doadora em virtude da doação das ações: o bem doado passou a fazer, indiscutivelmente, parte do património do donatário.

Quanto à segunda caraterística — diminuição do património do doador — a sua verificação é também evidente: não só à saída das ações doadas não corresponde uma qualquer contraprestação em favor da doadora Requerente, como a perda da titularidade das ações é real e definitiva. Esta constatação é reforçada pela inexistência de qualquer circularidade no circuito das ações ou do dinheiro correspondente ao preço pelo qual estas foram vendidas à Sociedade. A ausência de qualquer natureza circular nesta operação é amplamente demonstrada pela perda de titularidade jurídica daqueles bens em favor do donatário, sem a substituição por quaisquer outros ou, sequer, por direitos equivalentes. O donatário não esteve sujeito a nenhum dever jurídico face à Requerente sua mãe que passe pela atribuição a esta de ações, do fruto destas ou dos valores monetários pelos quais as mesmas foram substituídas.

No que concerne à última característica — espírito de liberalidade — também esta está reunida. Na verdade, é manifesto que a causa do contrato de doação não é desvirtuada — a sua função social não é anulada ou deturpada — pela doação em concreto do bem a um donatário do qual a doadora era mãe: esse bem não retorna, seja de que forma for, à esfera jurídica da doadora mãe, nem os seus frutos ou os valores obtidos pela sua ulterior venda à Sociedade são repartidos com a doadora. Não existem quaisquer regras, sejam legais ou de fonte contratual, que permitam contestar esta evidência.

Assim sendo, não se vislumbrando qualquer desfuncionalização contratual, nem a minoração ou anulação prática dos efeitos da liberalidade, não é correto falar-se de abuso de formas jurídicas: a forma utilizada no caso a que os presentes autos se referem respeita integralmente a função que lhe é atribuída pelo Código Civil nos artigos 940.º e seguintes.

Pelo que não poderá deixar de se concluir pela não verificação do elemento meio.

 

Quanto ao elemento normativo, traduzido na reprovação normativo-sistemática da vantagem obtida, são os efeitos da estatuição resultante do artigo 15.º, n.º 3, al. a), do CIS que desencadeiam todas as consequências fiscais que, segundo a AT, justificam a decisão de tributação por aplicação da disposição geral antiabuso.

Ora, diante de operações isentas, a remissão realizada pelo artigo 45.º, n.º 1, al. b), do CIRS para o critério de avaliação vertido no artigo 15.º, n.º 3, al. a), do CIS implica a assunção dos efeitos precisamente contrários aos visados pelo legislador: ao invés de incrementar a receita fiscal, a inação do legislador passou a produzir um decréscimo da dita receita nos casos em que o bem objeto da doação isenta seja, posteriormente, alienado. Considerando que a maioria das operações de transmissões gratuitas de bens ocorre entre familiares próximos — precisamente cobertos pela isenção subjetiva (no caso, descendentes) — seria mais do que exigível a consideração da possibilidade de produção deste efeito. O legislador tinha, por isso, a rigorosa obrigação de prever que o efeito catalisador artificialmente provocado por um fator de capitalização indexado à principal taxa de juro do BCE teria implicações numa ulterior transmissão onerosa do bem objeto de uma transmissão gratuita: se uma operação sujeita e não isenta conduzia a uma muito maior receita fiscal, uma operação sujeita mas isenta conduziria à produção do efeito diametralmente oposto.

A não verificação em concreto do elemento normativo-sistemático ressalta ainda de um outro argumento: o do exemplo comparado da doação subjetivamente isenta de imóveis.

Na verdade, olhando à atuação legislativa nesse segmento de incidência muito próximo daquele de que se trata nos presentes autos — o da doação subjetivamente isenta de imóveis — afigura-se que o legislador se apercebeu do efeito produzido pela avaliação fiscal em doações isentas de bens móveis, tendo optado deliberadamente por não intervir. É que, quando se torna patente que o legislador previu expressamente que efeitos semelhantes se pudessem produzir quanto a imóveis, é quase impossível sustentar que um similar raciocínio não tenha sido ponderado pelo legislador quanto a bens móveis. Vislumbrando manifestamente o impacto criado com a remissão feita pelo Código do IRS para o Código do Imposto do Selo no que à fixação de um valor de aquisição para bens recebidos por doação isenta diz respeito, a lei passou a dispor (artigo 45.º, n.º 3, do CIRS): “No caso de direitos reais sobre bens imóveis adquiridos por doação isenta, nos termos da alínea e) do artigo 6.º do Código do Imposto do Selo, considera-se valor de aquisição o valor patrimonial tributário constante da matriz até aos dois anos anteriores à doação.

Quer dizer: o legislador apercebeu-se de que, precisamente no caso de doações subjetivamente isentas por força da proximidade da relação familiar surgiam importantes hipóteses de planeamento fiscal decorrentes da imediata consideração do valor de Imposto de Selo enquanto valor de aquisição para efeitos da determinação das mais-valias em IRS. E, por isso, atuou.

Ora, a opção de não retirar idênticas conclusões para as transmissões gratuitas de ações não cotadas, vertendo assim para estas uma solução de efeitos análogos, não pode deixar de ser valorada. Ela é um intenso sinal de que o legislador acomodou deliberadamente o risco de tais efeitos.

Não é possível vislumbrar qualquer manifestação de fraude à lei — de verificação do requisito normativo da disposição geral antiabuso — diante de tão grande passividade e indiferença legislativa.

Torna-se evidente que, para a AT, a aplicação da disposição geral antiabuso destinou-se a estender analogicamente a sanção normativo-tributária que decorre para as doações de bens imóveis no artigo 45.º, n.º 3, do CIRS às situações de doações de ações isentas de Imposto do Selo. Ora, a analogia assenta na ideia de “tratamento igual de casos semelhantes”, considerando-se que há analogia entre dois casos “quando neles se verifique um conflito de interesses paralelo, isomorfo ou semelhante — de modo a que o critério valorativo adotado pelo legislador para compor esse conflito de interesses num dos casos seja por igual ou maioria de razão aplicável ao outro”.

Sucede, porém, que a integração por analogia das lacunas das normas fiscais incluídas no âmbito da reserva de lei da Assembleia da República está expressamente proibida pelo artigo 11.º, n.º 4, da LGT. Trata-se de uma proibição que está associada e decorre dos “interesses subjacentes ao princípio da igualdade: certeza e segurança”.

Ao admitir-se a integração de lacunas das normas fiscais por via da analogia estar-se-iam entregando de bandeja ao intérprete administrativo amplos poderes jurisgénicos em matéria tributária que a Constituição quis reservar expressamente ao legislador parlamentar: “[c]omo a lei fiscal determina os elementos essenciais dos impostos, a analogia, neste âmbito, permitiria iludir a vontade do legislador”. De resto, no seguimento da lição de CASALTA NABAIS (cfr. Direito Fiscal, 3.ª ed., Almedina, 2005, p. 221), a proibição de integração analógica das lacunas das normas fiscais estende-se, pelas mesmas razões de proteção dos bens jurídico-constitucionais da certeza e da segurança jurídica, a qualquer outro meio de integração de lacunas, posição que tem a adesão da jurisprudência consolidada, segundo a qual “as normas de incidência dos tributos, bem como aquelas que concedem isenções ou exclusões de tributação, devem ser interpretadas nos seus exatos termos, sem o recurso à analogia, tornando prevalente a certeza e a segurança na sua aplicação”.

Pelo que não poderá deixar de se concluir pela não verificação do elemento normativo.

 

Quanto ao elemento intelectual, ou seja a motivação fiscal do contribuinte, mostra-se necessário ter presente que “a prova da motivação terá de ser efetuada com recurso a factos ou elementos que permitam ao intérprete extrair, com razoável segurança e segundo critérios de razoabilidade e normalidade, a conclusão de que o contribuinte atribuiu às formas jurídicas adotadas um preponderante fim fiscal”. Efetivamente, “[n]ão se provando quais as concretas motivações que, no caso, determinaram a realização do ato cuja ineficácia a AT pretende, naturalmente que não se poderá entender que aquele foi realizado por motivações exclusiva ou principalmente ligadas a um ganho fiscal que, posteriormente, se verificou, já que tal demonstração era um ónus que aquela autoridade, enquanto pretendente à aplicação do art. 38.º/2 da LGT, deverá cumprir”. Desse modo, “[é], pois, à Administração Tributária que incumbe a prova do facto constitutivo do seu direito, incumbindo-lhe, assim, o ónus da prova de que a transformação operada teve como fim principal ou essencial a eliminação do imposto”.

Ora, afigura-se manifesto que esse ónus da prova não foi cumprido pela AT no caso objeto dos presentes autos. Aliás, em matéria probatória tudo o que perpassa pelo relatório definitivo são meras confabulações, processos de intenção e exercícios especulativos.

Pelo que, também em relação a este caso último elemento da previsão normativa contida no artigo 38.º, n.º 2, da LGT, se terá de concluir, forçosamente, pela sua não verificação no caso dos presentes autos.

 

Mais referem os Requerentes que a tributação por aplicação da disposição geral antiabuso assenta na verificação de determinados pressupostos, normativamente fixados e a falta de verificação desses pressupostos impede o acionamento da norma e obsta a que, nessa situação concreta, ela possa ser convocada a produzir os efeitos a que se dirige.

Que os factos que a AT erigiu em pressupostos do seu agir não se quadram com a realidade e, por consequência, impedem o acionamento da disposição geral antiabuso.

Pelo que a liquidação impugnada está afetada de vício de violação de lei, decorrente de erro nos pressupostos de facto, gerador da respetiva anulabilidade, em consequência do que, e como se peticiona a final, deverá a mesma ser anulada.

 

Da Requerida (art.s 69 a 99 das alegações):

Tendo em conta os factos apurados em sede inspetiva, o negócio pretendido pelos sujeitos passivos consistia na alienação de ações da “G… SGPS” à própria sociedade, por parte de B…, como forma de distribuir à acionista o rendimento obtido com a venda da participação da “J…”, tendo, para evitar a tributação que da mesma decorreria, sido adotada a seguinte sucessão de atos:

- Em 2/11/2012, a acionista B…, faz uma doação ao seu filho L… de 10% das ações que detinha na G… SGPS”, isenta de Imposto de selo;

- Em 20/12/2012, o donatário transmite as ações à própria sociedade, apurando uma menos-valia, só possível por beneficiar do valor de aquisição das ações, correspondente ao valor tributável que serviria de base à liquidação de Imposto do Selo, caso este fosse devido.

Isto tendo em conta, igualmente, que a doadora é membro do conselho de administração na “G… SGPS”, o que lhe permitiu fazer parte das deliberações, nomeadamente no que respeitou à decisão da sociedade em adquirir ações próprias.

Assim, o que se pretendeu verdadeiramente doar seria o dinheiro resultante da venda das ações e não estas.

Através do esquema atrás descrito, B… obteve rendimentos de mais-valias resultantes da venda de ações, dos quais dispôs antecipadamente mediante a sua doação ao filho, afastando tais rendimentos de tributação através do estipulado no n.º 6 do artigo 12.º do CIRS, conjugado com a alínea e) do art.6.º do CIS.

Assim sendo, considerou-se como comprovada a existência cumulativa dos pressupostos que justificam a aplicação da cláusula antiabuso prevista no nº 2 do artigo 38.º da LGT, determinando a ineficácia dos negócios jurídicos em causa, isto é a desconsideração da doação das ações por B… ao seu filho L… e posterior venda por este à “G… SGPS”.

Em condições normais, isto é, sem a motivação para evitar a tributação, o sujeito passivo B… alienaria 27.500 ações da “G… SGPS” à própria sociedade e a mais-valia obtida na venda destas ações, no valor que a seguir se indica, seria tributada como rendimento da categoria G do IRS:

 

Detentor

Nº ações

Valor aquisição unitário

Valor aquisição

Valor de venda unitário

Valor de venda

Mais valia

B…

27 500

0,40 €

11 000,00 €

43,50 €

1 196 250,00 €

1 185 250,00

 

Assim, os factos recolhidos ao longo do procedimento inspetivo e mencionados no RIT são suficientes para se considerarem verificados os pressupostos para a aplicação da cláusula antiabuso, prevista no n.º 2 do artigo 38º da LGT.

Deste modo não existe qualquer vício a apontar ao procedimento de inspeção tributária, sendo de manter a posição de que o negócio “normal” (equivalente) envolvido é a venda direta das ações à sociedade G… SGPS, SA, por parte do sujeito passivo B…, refletindo-se tal ato na esfera jurídica desta última, que, ao contrário do que a mesma afirma, o impacto fiscal da operação realizada e da operação “normal” (equivalente) são bastante distintos, e a realização da operação nos termos em que foi efetuada visou essencialmente evitar a tributação das mais-valias em sede de IRS.

*

2.11 Ilegalidade decorrente de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito quanto à aplicação da disposição geral antiabuso

Dos Requerentes (art.s 1 082 a 1 139 do r.p.a. e 58 a 59 das alegações):

Que para evitar a elisão fiscal o legislador estabeleceu, entre o mais, uma disposição geral antiabuso contida no artigo 38.º, n.º 2, da LGT, através da qual o legislador teve por fito “conduzir à tributação determinadas realidades que, por força da distorção introduzida pelos contribuintes, produziram uma redução, eliminação ou diferimento temporal dos impostos a entregar ao Estado, se comparadas com aquelas que seriam normalmente praticadas”.

Assim o âmbito de aplicação da disposição geral antiabuso está circunscrito àquelas hipóteses onde exista um “indevido aproveitamento do precário corpo normativo, donde fiquem frustrados os objetivos arrecadatórios do legislador” pois a disposição geral antiabuso respeita “à atitude do sujeito passivo tributário atinente ao aproveitamento abusivo de lacunas do ordenamento jurídico-fiscal”, nela se enquadrando as atuações do sujeito passivo que se situam no campo da chamada elisão fiscal, a qual assenta na existência de negócios que as partes pretenderam validamente realizar (e realizaram) e que apenas são ineficazes de um ponto de vista fiscal por contrariarem os propósitos subjacentes às normas fiscais em questão.

Compulsando o relatório definitivo da ação de inspeção, dele se retira a pretensão da AT fazer atuar a disposição antiabuso prevista no artigo 38.º, n.º 2, da LGT, por considerar que a Requerente mulher, pretendendo vender à Sociedade parte das ações por ela detidas nessa mesma sociedade, procurou eximir-se à tributação das mais-valias que decorreriam daquela transmissão, fazendo, para o efeito, uma doação daquelas ações a seu filho, o qual, posteriormente as alienou à Sociedade.

Assim é referido naquele relatório (RIT):

— que o negócio que foi pretendido realizar consistia na alienação à Sociedade das ações detidas pela Requerente, como forma de lhe ser distribuído o rendimento obtido com a venda da participação na J… BV (p. 13 do relatório definitivo);

— que o efeito económico pretendido se traduzia no encaixe financeiro que a transmissão das ações à G… poderia proporcionar à Requerente (p. 14 do relatório);

— que a Requerente nunca teve, em nenhum momento, a intenção da doar aquelas ações a seu filho L… (p. 15 do relatório definitivo); e

— que o que a Requerente pretendeu doar a seu filho L… foi o dinheiro resultante da venda das ações e não as próprias ações (p. 17 do relatório definitivo).

A p. 18 do RIT conclui-se que “a opção pela doação das ações em detrimento da doação em dinheiro, visou apenas evitar a tributação, em sede de IRS da mais-valia que adviria da alienação direta das ações à G… SGPS”, acrescentando-se ainda, a p. 19, que o que está em causa é “o facto da doadora pretender evitar a tributação a ocorrer na sua esfera, mediante a mera alteração da ordem cronológica das operações realizadas, antecipando a realização da doação”, sendo que “através do esquema atrás descrito, [a Requerente] obteve rendimentos de mais-valias resultantes da venda de ações, dos quais dispôs antecipadamente mediante a sua doação ao filho”.

O simples facto de a AT considerar que a Requerente mulher nunca teve a intenção de doar as ações a seu filho — e de o sustentar de uma forma veemente — é o bastante, mais do que bastante, para tornar impossível a aplicação da disposição geral antiabuso prevista no artigo 38.º, n.º 2, da LGT, fazendo recair a situação sub juditio sob a alçada então do artigo 39.º da LGT que respeita á simulação dos negócios jurídicos. Ou seja: à luz da própria argumentação sufragada pela AT no RIT, há que concluir pela inadmissibilidade do recurso à aplicação da disposição geral antiabuso.

Com efeito, “[o] nosso legislador excluiu (…) do âmbito de incidência do art. 38.º, n.º 2, da LGT as hipóteses de simulação fiscal. Não podemos esquecer que a simulação é em si um ato ilícito (art. 240º do Código Civil), o que significa que estamos no caso, perante uma situação de evasão fiscal e não perante uma situação de elisão fiscal como acontece com as situações abrangidas pela norma agora em análise [art. 38º, nº 2, da LGT]”.

Donde: a factualidade que a AT entende (erradamente) como provada não permite o enquadramento que a AT lhe dá; a norma legal aplicada pela AT — o artigo 38.º, n.º 2, da LGT — não tem aplicação à situação factual a que foi aplicada.

Porém não é suficiente, referem, “que da prática integrada de um conjunto de atos ou negócios jurídicos resulte determinada vantagem fiscal, sendo necessário comprovar que a mesma é alcançada em razão de uma pré-determinação que se encontra na génese de tais atos ou negócios jurídicos”.

Assim, ao aplicar erroneamente a disposição antiabuso contida no artigo 38.º, n.º 2, da LGT a uma situação que não se quadra no âmbito da previsão desta norma, a Liquidação Impugnada padece de ilegalidade decorrente de vício de vio­lação de lei e, como tal, é anulável, devendo a final ser anulada por esse douto Tribunal.

 

Da Requerida (art.s 69 a 99 das alegações):

Que o n.º 2 do artigo 38.º da LGT, na redação introduzida pelo artigo 13.º, n.º 1, da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro, em vigor à data dos factos (2012), encerra em si uma cláusula geral antiabuso, quando refere: “São ineficazes no âmbito tributário os atos ou negócios jurídicos essencial ou principalmente dirigidos, por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas, à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, atos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem utilização desses meios, efetuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas”.

Determinando o n.º 1 do artigo 63º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que: “A liquidação de tributos com base na disposição antiabuso constante do n.º 2 do artigo 38.º da lei geral tributária segue os termos previstos neste artigo”.

Por sua vez, refere o n.º 3 daquele preceito “A fundamentação do projeto e da decisão de aplicação da disposição antiabuso, deve conter necessariamente:

a) A descrição do negócio jurídico celebrado ou do ato jurídico realizado e dos negócios ou atos de idêntico fim económico, bem como a indicação das normas de incidência que se lhes aplicam;

b) A demonstração de que a celebração do negócio jurídico ou prática do ato jurídico foi essencial ou principalmente dirigida à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em caso de negócio ou ato com idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais”.

Assim, como se depreende da lei, a cláusula geral antiabuso tem como requisito a prática utilizada pelo contribuinte de um negócio jurídico artificioso ou com abuso de forma jurídica que tem como fim único ou determinante evitar a tributação que seria devida caso tivesse sido utilizado um negócio ou ato de substância económica equivalente.

Tal previsão consagra cinco condições ou requisitos de aplicação, denominados de elementos, que têm de ser comprovados, correspondendo quatro deles aos requisitos de aplicação e um à respetiva estatuição da norma:

Elemento meio: Corresponde à via escolhida pelo contribuinte para obter o desejado ganho ou vantagem fiscal, ou seja o(s) ato(s) ou negócio(s) jurídico(s) cuja estrutura se encontra determinada em função de um dado resultado fiscal. Os meios de que se vale o contribuinte deverão configurar um abuso de formas jurídicas.

Elemento resultado: Neste elemento, importa demonstrar que o sujeito passivo logrou, pelos seus atos, a verificação de uma certa vantagem fiscal e a equivalência dos efeitos económicos com aqueles do ato normal tributado.

Elemento intelectual: Verifica-se uma motivação fiscal preponderante que se manifesta nas formas adotadas e que faz prevalecer a finalidade fiscal do negócio sobre a finalidade não fiscal.

Elemento normativo: O qual tem a ver com a reprovação normativo-sistemática da estrutura montada e da vantagem obtida, ou seja, o contribuinte atua com manifesto abuso das formas jurídicas.

Elemento sancionatório: Consiste na ineficácia, no âmbito tributário, dos atos ou negócios jurídicos em causa, dependendo da verificação cumulativa dos outros elementos.

 

Assim, quanto ao elemento meio, considerando que o negócio pretendido pelos sujeitos passivos consistia na alienação de ações da “G… SGPS” à própria sociedade, por parte de B…, como forma de distribuir à acionista o rendimento obtido com a venda da participação da “J…”, constata-se que, para evitar a tributação que da mesma decorreria, foi adotada a seguinte sucessão de atos:

- Em 2/11/2012, a acionista B…, faz uma doação isenta de Imposto de selo ao seu filho L… de 10% das ações que detinha na G… SGPS (artigo 6.º, al. e) do CIS);

- Em 20/12/2012, o donatário transmite as ações à própria sociedade, apurando uma menos valia, só possível por beneficiar do valor de aquisição das ações, correspondente ao valor tributável que serviria de base à liquidação de Imposto do Selo caso ela fosse devida (artigo 45.º/1-al. b) do CIRS).

No que se refere ao elemento resultado, torna-se claro que o efeito económico pretendido pela contribuinte residia no encaixe financeiro que a transmissão das ações à sociedade poderia proporcionar a B…, sendo que tal efeito poderia ser obtido pela venda direta das ações ou, como foi planeado, pela precedente doação ao filho das mesmas ações e posterior transmissão do donatário à sociedade.

Tais hipóteses, implicam enquadramentos tributários distintos, ao proporcionar, basicamente, ausência de carga fiscal na situação adotada pelo sujeito passivo e tributação em IRS, como rendimento de mais-valia (Categoria G), em negócio equivalente.

Relativamente ao elemento intelectual, o contribuinte tem a possibilidade de escolher, de entre as várias opções legalmente admissíveis, a opção fiscalmente menos onerosa desde que a poupança fiscal não seja o único ou o principal fim do ato a praticar ou do negócio jurídico a celebrar, como aconteceu neste caso. A motivação fiscal do sujeito passivo assentou no facto dos atos ou negócios praticados serem essencialmente dirigidos à ausência de tributação.

A análise dos contornos das operações realizadas pela contribuinte não permite descortinar a existência de qualquer motivação económica ou outra que justifique a doação de ações. Assim:

- Não existiu qualquer propósito de fazer o filho L… participar no capital da Sociedade, de lhe proporcionar um rendimento futuro a nível de dividendos, porquanto as ações que lhe foram doadas foram, logo de seguida, alienadas.

- Nunca houve intenção de mudar a estrutura acionista da sociedade, isto é que o donatário se tornasse participante da “G… SGPS”, pois na data em que ocorreu a doação - 2 de novembro de 2012 -, já estava prevista a aquisição de ações próprias por parte da Sociedade e porque após esta aquisição, a estrutura acionista (em termos de percentagens de participação no capital) ficou exatamente igual à que existia antes da doação das ações.

Não houve, pois, em qualquer momento a intenção de doar ações ao filho. E, na falta de qualquer tipo de motivação económica ou vantagem de outra ordem, sendo evidentes os benefícios em termos de carga fiscal, não poderão restar dúvidas de que, na forma de negócio adotada, prevalece a finalidade fiscal. O único ou principal objetivo foi evitar a tributação.

Refere ainda que o legislador, prevendo o abuso da figura da doação isenta, criou uma norma antiabuso específica, neste caso relacionada com imóveis, e que consta do artigo 45.º do CIRS, nos seguintes termos: “Para a determinação dos ganhos sujeitos a IRS considera-se o valor de aquisição, no caso de bens ou direitos adquiridos a título gratuito:

3 - No caso de direitos reais sobre bens imóveis adquiridos por doação isenta, nos termos da alínea e) do artigo 6.º do Código do Imposto do Selo, considera-se valor de aquisição o valor patrimonial tributário constante da matriz até aos dois anos anteriores à doação.”

Isto é, o aditamento do n.º 3 do artigo 45.º do Código do IRS visou impedir a erosão da base tributável do imposto, nomeadamente no apuramento de mais-valias, mediante a realização de doação isenta próxima ou imediatamente antes da transmissão de imóvel, visando unicamente o aproveitamento, como valor de aquisição, do valor patrimonial tributário resultante da avaliação do imóvel, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 287/2003 de 2003/11/12. Tratando-se o disposto no n.º 3 do artigo 45º de uma norma antiabuso de carater especifico, fica demonstrado que o legislador considera abusiva a utilização da figura da doação isenta, nos termos da alínea e) do artigo 6.º do Código do Imposto do Selo, com vista apenas ao aproveitamento do valor de aquisição previsto no n.º 1 do artigo 45.º do Código do IRS, quando superior ao valor de aquisição que caberia ao doador.

Do mesmo modo, não se compreenderia que o legislador não considerasse abusiva a utilização da mesma doação isenta, quando estão em causa ações de sociedades, visando unicamente o aproveitamento do valor de aquisição que resulta da fórmula prevista na alínea a) do n.º 3 do artigo 15.º do Código do Imposto do Selo. Embora respeitando a bens diferentes, em ambas as situações está em causa o aproveitamento do valor que serve ou serviria de base à liquidação de imposto do selo. Contudo, o âmbito de aplicação do disposto no n.º 3 do artigo 45.º do CIRS restringe-se aos imóveis, pelo que não é aplicável ao caso em apreço, tendo-se que fazer recurso à aplicação da cláusula geral antiabuso, prevista no n.º 2 do artigo 38.º da Lei Geral Tributária.

Deste modo, conclui-se que a realização da doação isenta entre mãe e filho teve unicamente motivações de natureza fiscal, isto é, permitir, por virtude da aplicação da fórmula prevista na alínea a) do n.º 3 do artigo 15º do Código do Imposto do Selo, aumentar o valor de aquisição a utilizar no cálculo da mais-valia obtida com a venda das ações, impedindo a existência de qualquer tributação.

Por outro lado, considerando o efeito combinado da doação de ações com a venda das mesmas ações à “G… SGPS”, conclui-se que, no final, o sujeito passivo L… recebeu a importância de 1 196 250,00 €. Assim sendo, concluir-se-ia que o que se pretendeu verdadeiramente doar seria o dinheiro resultante da venda das ações e não estas, dinheiro que a doadora já dispunha.

Portanto, se a operação de aquisição de ações próprias por parte da “G… SGPS” viria sempre a acontecer e a intenção da doadora era apenas entregar dinheiro ao donatário, dispondo já, à data da doação, do montante necessário à realização da doação, conclui-se, também por aqui, que a razão da opção pela doação das ações em detrimento da doação em dinheiro, visou apenas evitar a tributação, em sede de IRS, da mais-valia que adviria da alienação direta das ações à “G… SGPS”.

Para a Requerida não está em causa a liberdade da doadora dispor dos seus bens como muito bem entender. No entanto, se a operação de aquisição de ações próprias por parte da “G…SGPS” viria sempre a acontecer, e consequentemente, era certo que a doadora iria receber o rendimento originado com a alienação das mesmas ações, então, na prática, a doação realizada equivale a um mero ato de disposição antecipada daquele rendimento. Isto é, a doadora decidiu apenas doar o produto da venda das ações, decidindo antecipadamente o destino a dar ao rendimento de mais-valias por si obtido, sendo que tal antecipação é unicamente motivada por razões de natureza fiscal, nomeadamente, evitar a tributação em sede de mais-valias e maximizar o rendimento a receber, que a doadora decidiu doar ao seu filho. Portanto, está apenas em causa o facto de a doadora pretender evitar que a tributação ocorresse na sua esfera, mediante a mera alteração da ordem cronológica das operações realizadas, antecipando a realização da doação.

Já quanto ao elemento normativo, refere a Requerida que, através do esquema antes descrito, B… obteve rendimentos de mais-valias resultantes da venda de ações, dos quais dispôs antecipadamente mediante a sua doação ao filho, afastando tais rendimentos de tributação através do estipulado no n.º 6 do artigo 12.º do CIRS, conjugado com a alínea e) do artigo 6.º do CIS.

Com efeito, refere aquele normativo: “O IRS não incide sobre os incrementos patrimoniais provenientes de transmissões gratuitas sujeitas a imposto de selo, nem sobre os que se encontrem expressamente previstos em norma de delimitação negativa de incidência deste imposto.

Por outro lado, a alínea e) do artigo 6.º do CIS estipula que, são isentos de imposto de selo o cônjuge ou unido de facto, descendentes e ascendentes, nas transmissões gratuitas sujeitas à verba 1.2 da tabela geral (aquisição gratuita de bens) de que sejam beneficiários.

 

Negócio Jurídico

Doação de ações a descendente

Operação isenta de imposto do selo

Artigo 6.º alínea e) do Código do Imposto do Selo (CIS)

 

Venda das ações à própria sociedade

 

Apurada menos valia, em resultado do custo de aquisição ser o que

serviria de base à liquidação de Imposto de selo

Artigo 45º, n.º 1 alínea b) do Código do IRS e art. 15º n.º 3 alínea a) do CIS

 

 

 

Finalmente quanto ao elemento sancionatório, refere a Requerida que, encontrando-se comprovada a existência cumulativa dos quatro pressupostos, anteriores justifica-se a ineficácia dos negócios jurídicos em causa, isto é a desconsideração da doação das ações por B… ao seu filho L… e posterior venda por estes à “G…  SGPS”, e justifica-se que seja efetuada a tributação do negócio pretendido pelo sujeito passivo, ou seja, a transmissão dessas mesmas ações, de modo direto, pela B… à “ G… SGPS”.

A intervenção do filho da Requerente, na qualidade de donatário é meramente instrumental no esquema elisivo, atendendo à perspetiva global que deverá ser efetuada do conjunto de operações em causa.

Sendo a doação “o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício do outro contraente”, como vem definida no artigo 940.º do Código Civil, não passa nas regras comuns da experiência, colocando-nos na posição de um homem médio ou de um bonus pater familiae, os três acionistas terem doado as participações na sociedade “G… SGPS” no sentido dos supostos donatários (filhos e cônjuge) terem uma ligação com a empresa e de forma surpreendente os três, concertadamente, se terem desligado da sociedade no preciso momento em que recebem a doação, com a venda das participações à sociedade.  

Parece, pois, manifesto à Requerida, que a doação e os consequentes atos ou negócios realizados foram efetuados com um fim exclusivamente (é que aqui nem se pode apelidar de predominantemente) fiscal de obter um determinado efeito económico – fazer entrar na esfera patrimonial dos acionistas um valor igual ao montante que de outro modo seria tributado em sede de mais-valias.

Para a Requerida, o artigo 38.º, n.º 2, da LGT, repercute uma conceção substancialista das operações elisivas que requer muito mais do que a simples avaliação casuística de cada ato ou negócio jurídico. Exige, isso sim, a análise integrada da atuação abusiva, para identificar as relações ou interdependências entre os vários atos ou negócios, a motivação global determinada exclusiva ou predominantemente pela obtenção de vantagem fiscal e o nexo de causalidade entre a articulação de tais atos ou negócios e o fim visado.

Pelo que tais rendimentos auferidos pela Requerente devem ser qualificados em razão da sua substância económica, devendo este incremento patrimonial ser tributado, perante uma evasão fiscal intra legem que não pressupõe sequer a ilicitude dos atos ou negócios jurídicos em causa, nem sequer a qualificação destes como ilícito fiscal, o que é, aliás, fator claro de distinção da CGAA relativamente à fraude fiscal e simulação.

Impõe-se, por isso, reconstituir a situação tributária que existira caso não se tivesse verificado o esquema abusivo, tributando os sócios pela substancia económica e de acordo com a sua real capacidade contributiva, na salvaguarda da prossecução da justa repartição da carga tributária e na prossecução das necessidades financeiras do Estado, tendo em conta a proteção constitucional constante do artigo 103.º, n.º 1, da CRP.

Para a Requerida, o ónus de provar o contrário dos factos alegados pela Requerente é a esta que pertence, nos termos do artigo 74.º, n.º 1 da LGT e artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil, cabendo à Requerida, apenas, por meio de indícios e elementos recolhidos, demonstrar e extrair, com razoável segurança e segundo critérios de razoabilidade e normalidade, a conclusão de que o sujeito passivo atribuiu às formas adotadas um preponderante fim fiscal. Mas nunca factos negativos.

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2.12 Ilegalidade decorrente de violação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade

Dos Requerentes (art.s 1 140 a 1 260 do r.p.a. e 60 a 62 das alegações):

Que o poder para proceder à tributação por aplicação da disposição geral antiabuso prevista no artigo 38.º, n.º 2, da LGT compreende uma margem subjetiva de atuação por parte da Administração, estando em causa um conjunto de conceitos legais indeterminados cujo preenchimento o legislador cometeu à AT.

Tal porém não implica que essa atividade administrativa seja arbitrária, ou mesmo discricionária, sob pena de violação dos princípios constitucionais que disciplinam a atividade administrativa, entre os quais sobressai o princípio da proporcionalidade, previsto no artigo 7.º do CPA, que compreende a adequação, a necessidade (ou proibição de excesso) e a razoabilidade (ou proporcionalidade em sentido estrito), impondo que a conduta da Administração não traduza uma desrazoável ou desequilibrada ponderação entre interesses, custos (ou inconvenientes) e benefícios (ou vantagens) dela resultantes, e o princípio da razoabilidade, ínsito no artigo 8.º do mesmo código, segundo o qual a Administração Pública deve tratar de forma justa todos aqueles que com ela entrem em relação, e rejeitar as soluções manifestamente desrazoáveis ou incompatíveis com a ideia de Direito, nomeadamente em matéria de interpretação das normas jurídicas e das valorações próprias do exercício da função administrativa.

Num domínio, como é o do artigo 38.º, n.º 2, da LGT, em que está em causa a interpretação e aplicação de conceitos indeterminados, com fortes cargas de subjetividade e incerteza jurídica, a necessidade de subordinar o direito tributário aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade cobra a sua maior intensidade. De facto, “mostra-se consensual na melhor doutrina que a utilização de conceitos indeterminados no direito administrativo ou no direito fiscal para balizar determinados interesses públicos e os parâmetros de avaliação pela Administração Pública, norteados por esses interesses — como sucede no presente caso — não afasta o exercício de tais poderes de avaliação, sob a forma de competência vinculada”.

A Liquidação Impugnada é claramente violadora dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, uma vez que a Liquidação Impugnada assenta na construção jurídica de que a doação de ações feita pela Requerente mulher a seu filho é considerada ineficaz para efeitos tributários; que a tributação tem lugar como se a venda das ações à Sociedade tivesse sido efetuada pela própria Requerente; e que a Requerente doou antecipadamente a seu filho o produto da venda futura das ações e não as próprias ações.

O encadeamento de negócios jurídicos que o relatório da ação inspetiva pretende sujeitar a tributação em substituição dos negócios que pretende ver desconsiderados na esfera tributária representa em si mesmo uma solução desrazoável e desproporcionada.

Deste modo a Liquidação Impugnada está ferida de vício de violação de lei, decorrente de erro nos pressupostos de direito por ofensa dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, e gerador da respetiva anulabilidade, devendo a final, na procedência do assacado vício, ser anulada.

 

Da Requerida:

Não se pronunciou.

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2.13 Ilegalidade decorrente de violação do princípio da capacidade contributiva e ilegitimidade procedimental

Dos Requerentes (art.s 1 261 a 1 365 do r.p.a. e 63 a 66 das alegações):

Que a decisão proposta pelo relatório da ação de inspeção tributária consistiu em considerar ineficaz no âmbito tributário a doação de ações que à Requerente mulher fez a seu filho e, na ausência deste negócio, tributar a venda das ações à Sociedade na esfera da Requerente como um rendimento de mais-valias mobiliárias.

Configura-se, assim, um vício de ilegitimidade procedimental, na medida em que o presente procedimento tributário de liquidação por aplicação da disposição geral antiabuso deveria ter tido por destinatário o filho da Requerente e não a própria Requerente.

Como se demonstrou, inexiste na esfera da Requerente mulher qualquer rendimento de mais-valias decorrente da venda das ações à Sociedade. Logo, na sua esfera jurídica inexiste o facto tributário que se pretende tributar. 

De outro modo, a proceder o objetivo visado no relatório definitivo da ação de inspeção, a tributação por aplicação da disposição geral antiabuso na esfera da Requerente mulher é violadora do princípio da capacidade contributiva, consagrado no artigo 104.º, n.º 1, da CRP, segundo o qual, em sede de impostos sobre os rendimentos de pessoas singulares, a tributação deve incidir sobre “os rendimentos do agregado familiar”.

Assim, existe uma clara violação do princípio da capacidade contributiva quando, sendo apuradas pretensas vantagens fiscais indevidas, se venha exigir o pagamento do valor destas a quem delas não beneficiou.

Pelo que, em face da ilegitimidade passiva procedimental da Requerente mulher no procedimento de tributação por aplicação da disposição antiabuso que lhe foi movido, da inexistência de facto tributário na sua esfera e da consequente violação do princípio da capacidade contributiva por parte da decisão de tributação da Requerente por rendimentos de que não auferiu, tem de se concluir pela existência de um vício de violação de lei que afeta a Liquidação Impugnada que é, assim, anulável devendo o Tribunal, a final, determinar a sua anulação.

 

Da Requerida (art. 100 das alegações):

Que a interpretação da CGAA preconizada pela Administração Fiscal não viola, como alegam os Requerentes, qualquer norma legal ou princípio constitucional, mostrando-se, ao invés, absolutamente coincidente com o que prescreve a Lei Fundamental sobre o sistema fiscal.

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Da ilegalidade da liquidação de juros compensatórios -

2.14 Ilegalidade consequente da ilegalidade da liquidação adicional de IRS

Dos Requerentes (art.s 1 366 a 1 370 do r.p.a. e 67 das alegações):

Que anulada que seja a Liquidação Adicional impugnada nos presentes autos, tal terá por efeito a ilegalidade, consequente, da liquidação de juros compen­sa­tó­rios.

Com efeito, inexistindo a obrigação tributária principal, inexiste tam­bém a obrigação tributária acessória de juros compensatórios já que esta assenta no retardamento, por motivo imputável ao sujeito passivo, da liquidação de parte ou da totalidade da obrigação de imposto.

Pelo que se na impugnação contenciosa do ato de liquidação se vier a concluir pela ilegalidade deste ato, forçosamente se terá de concluir pela ilegalidade consequente da liquidação de juros com­pen­satórios.

 

Da Requerida (art. 101 das alegações):

Improcedendo os pedidos anteriores, improcede igualmente o pedido de anulação de juros compensatórios.

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2.15 Ilegalidade decorrente de violação do direito de participação procedimental

Dos Requerentes (art.s 1 371 a 1 397 do r.p.a. e 68 a 69 das alegações):

Que, conforme se dispõe no artigo 35.º, n.º 8, da LGT, “os juros compensatórios integram-se na própria dívida do imposto”, pelo que são um “componente da dívida global de imposto.”

Ou seja, que os juros tributários têm a natureza de um agravamento da dívida de imposto, uma sobretaxa, visando indemnizar o Estado pela perda da disponibilidade da quantia que não foi liquidada no momento em que o deveria ser ou foi indevidamente reembolsada ao contribuinte.

Daí que sejam aplicáveis à liquidação de juros compensatórios os mesmos princípios e a mesma disciplina jurídica que regulam a liquidação de tributos. Desde logo, é igualmente aplicável à liquidação de juros compensatórios o disposto no artigo 60.º, n.º 1, al. a), da LGT: “Direito de audição antes da liquidação”. Assim, para que haja lugar à liquidação de juros compensatórios deve a AT remeter ao contribuinte um projeto de decisão devidamente fundamentado (cfr. artigo 60.º, n.º 5, da LGT), permitindo assim que o contribuinte exerça, face a esse projeto, o seu direito de audiência prévia, o que não sucedeu no caso presente.

Resulta assim que a Liquidação de Juros Compensatórios está autonomamente afetada de um vício de violação de formalidade essencial, consistente na preterição do princípio de participação procedimental, e gerador da respetiva anulabilidade. Consequentemente, na improcedência dos vícios que se assacam à Liquidação Adicional de IRS objeto de impugnação nos presentes autos, deve ainda assim ser anulada a Liquidação de Juros Compensatórios por força deste vício que lhe é próprio e autónomo da liquidação da qual ela depende.

 

Da Requerida:

Não se pronunciou.

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2.16 Ilegalidade decorrente de vício de falta de fundamentação

Dos Requerentes (art.s 1 398 a 1 412 do r.p.a. e 70 das alegações):

Que, conforme se dispõe no artigo 35.º, n.º 1, da LGT, “são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária”.

À luz deste normativo a liquidação de juros compensatórios pressupõe que o contribuinte agiu com culpa, sob a forma de dolo ou de negligência, no retardamento da liquidação ou entrega do imposto que se considere devido.

Deste modo, está a AT constituída no dever de alegar e demonstrar em sede de liquidação de juros compensatórios os factos suscetíveis de preencherem aquele requisito de culpa, cfr. artigos 342.º, n.º 1. e 572.º do Código Civil.

O que não fez, seja no projeto de relatório da ação de inspeção, seja no subsequente relatório definitivo seja, finalmente, na demonstração da Liquidação de Juros Compensatórios.

Assim, a liquidação de juros compensatórios levada a cabo é ilegal, por falta de cabal fundamentação, e assim deve ser anulada.

 

Da Requerida:

Não se pronunciou.

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2.17 Ilegalidade decorrente de erros nos pressupostos de facto e de direito

Dos Requerentes (art.s 1 413 a 1 445 do r.p.a. e 71 a 72 das alegações):

Que a tributação por juros compensatórios assenta numa lógica de reparação devida à AT pela privação de uma quantia pecuniária que deveria ter estado na sua disponibilidade e da qual, por força de uma atuação do sujeito passivo, a AT esteve privada, havendo dois requisitos que, cumulativamente, se têm de preencher para que haja lugar à liquidação de juros compensatórios: conexão entre uma conduta do sujeito passivo e a indisponibilidade, por parte da AT, de uma certa quantia pecuniária; e que a conduta deste seja censurável a título de dolo ou negligência (cfr. artigo 35.º, n.º 1, da LGT e artigo 91.º, n.º 1, do CIRS).

Quanto ao primeiro requisito referem que só a decisão autorizativa do dirigente máximo do serviço, prevista no artigo 63.º do CPPT, habilita a AT a proceder à tributação dos atos e negócios de efeito económico equivalente àqueles que foram declarados ineficazes, pelo que só a partir desse momento é que a liquidação — isto é, a liquidação pretensamente retardada — pode ter lugar.

Enquanto tal decisão autorizativa não tiver tido lugar não podem ser tributados outros factos tributários que não aqueles correspondentes aos atos e negócios realmente celebrados pelo sujeito passivo. Daí que na tributação por aplicação desta disposição geral antiabuso se não possa configurar, em circunstância alguma, a existência retardamento da liquidação, porquanto a liquidação só se pode realizar na sequência de uma decisão da própria AT que habilita a que se possa desconsiderar para fins fiscais certos atos e negócios jurídicos, e nunca antes desse momento.

Quanto ao outro requisito necessário para haver lugar à liquidação de juros compensatórios (que a conduta seja censurável a título de dolo ou negligência), referem os Requerentes que, em face dos atos e negócios jurídicos que efetiva e realmente praticaram, e que eram fiscalmente eficazes até finais de 2016, os mesmos cumpriram pontual e escrupulosamente todas, e cada uma, das obrigações e deveres fiscais que sobre eles impendiam, não se lhes sendo de assacar qualquer censura.

Verifica-se assim, no que se refere à Liquidação de Juros Compensatórios impugnada, um vício de violação de lei decorrente de erro nos pressupostos de facto e de direito, na procedência do qual deverá a referida Liquidação ser anulada.

 

Da Requerida:

Não se pronunciou.

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2.18 Da responsabilidade no caso de má-fé

Dos Requerentes (art.s 42 a 67 do Requerimento de 03-10-2017; 76 das alegações; e art.s 164 a 195 das alegações complementares apresentadas em 20-11-2017):

Que no articulado de resposta veio a AT excecionar a pretensa ineptidão da petição inicial, exceção que foi prontamente julgada improcedente pelo Tribunal Arbitral.

Não desconhecia a AT a total falta de fundamento da questão excetiva que veio deduzir no seu articulado de resposta e, não obstante, deduziu tal questão com o intuito e o propósito de, fazendo do processo um uso manifestamente reprovável, conseguir um objetivo ilegal (a sua absolvição da instância) e, desse modo, entorpecer a ação da justiça e, assim, influenciar ilicitamente a decisão a proferir nos autos e causar prejuízo aos Requerentes.

Prevê-se no artigo 542.º, n.º 1, do CPC, aplicável ao processo arbitral tributário ex vi do artigo 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT, que o litigante de má-fé seja condenado em multa e em indemnização à parte contrária, se esta a pedir, a qual, nos termos do artigo 543.º, n.º 3, do CPC (ex vi do artigo 29.º, n.º 1, al. e), do RJAMT), pode ser fixada no prudente arbítrio do tribunal e que, a final, requer seja fixada, pelo Tribunal Arbitral, em montante correspondente a 5% do valor do pedido condenatório elencado na al. c) do petitório.

 

Da Requerida (art.s 102 a 109 das alegações):

Refere que “(…) a Requerente apresentou uma petição inicial com 1500 artigos e alegações com cerca de 150 páginas, sem ter existido sequer produção de prova adicional”, o que “(…) ultrapassa como aliás o próprio tribunal concluiu, no despacho de prorrogação de prazo, um padrão de razoabilidade”.

Assim, “(…) uma petição inicial com tal dimensão dificulta inexoravelmente todos os agentes, não só a Requerida no exercício do seu direito de defesa, mas também, com a devida vénia e respeito o douto Tribunal”.

Pelo que, face à prolixidade da p.i. e das alegações, deveria ser aplicado um agravamento à taxa de justiça arbitral por aplicação subsidiária do artigo 530.º, n.º 7, alínea a) do CPC.

Mais refere que a má-fé, a existir, será da Requerente, não podendo ser assacada qualquer culpa à Requerida pela alegada exceção de ineptidão da petição inicial atendendo ao articulado em questão.

 

 

3. Saneamento

3.1 A exceção dilatória invocada (ineptidão da petição inicial por ininteligibilidade da causa de pedir) poderia constituir obstáculo ao conhecimento do mérito da causa, dando lugar à absolvição da instância, cfr. artigos 576.º, n.º 2, e 278.º, n.º 1, alínea e) do CPC. Porém a mesma já foi conhecida, por despacho de 02 de outubro de 2017, proferido nos termos do artigo 608.º, n.º 1, do mesmo código, julgando este tribunal arbitral que a mesma não se verifica.

 

3.2 As partes têm personalidade e capacidades judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

3.3 O processo não enferma de quaisquer nulidades.

 

3.4 O tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente para conhecer e decidir o pedido, cfr. artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.

 

3.5 Não se verificam quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

 

 

 4. Fundamentação

4.1 Factos provados

Com relevo para a apreciação e decisão da questão de mérito suscitada, dão-se como assentes e provados os seguintes factos:

 

4.1.1 A “G… SGPS, SA”, (G…SGPS) é uma SGPS, constituída em 01-07-1998, com o capital social inicial de 6 000 000,00 €, representado por 1 200 000 ações com o valor nominal de 5,00 €, sendo o seu objeto a gestão de participações sociais (cfr. pp. 48/54 do PA e 8 do RIT, e que aqui se dão por integralmente reproduzidas). 

 

 

4.1.2 À data da constituição da sociedade eram detentores do capital (cfr. p. 8 do RIT):

 

 

                 Detentores do capital                

N.º de ações

Conselho de Administração

% de capital

I…

275 000

Presidente

22,92

B…

275 000

Vice-Presidente

22,92

M…

275 000

Vogal

22,92

N…

240 000

Vogal

20,00

O…

135 000

Vogal

11,25

Total

1 200 000

--------------------------

100

 

 

4.1.3 Em 21-05-2012, a “G… SGPS” aumentou o capital social de 6 000 000,00 € para 9 000 000,00 €, por incorporação de prémios de emissão (2 992 787,38 €) e por incorporação de reservas (7 212,62 €), no montante de 3 000 000,00 €, passando o valor nominal de cada ação de 5,00 € para 7,50 € (cfr. pp. 48/54 do PA e 8 do RIT).

 

4.1.4 A “G…SGPS” é detentora de 44,03% do capital social da J…BV (J…), principal ativo da sociedade (cfr. p. 9 do RIT).

 

4.1.5 Em 12-06-2012, a J…” é alienada na totalidade pelo preço de 141 577 919,00 €, correspondendo o montante de 61 896 457,74 € à participação da “G…SGPS”, pago em quatro tranches: 54 035 836,50 € em julho/2012; 3 918 317,00 € em abril/2013; 1 959 335,00 € em outubro/2013; e 1 982 969,24 € em abril/2014 (cfr. p. 9 do RIT).

 

4.1.6 Em 08-06-2012 e 14-06-2012 a “G… SGPS” distribuiu dividendos pelos acionistas, no montante de 531 927,30 € (cfr. p. 9 do RIT).

 

4.1.7 Em 24-07-2012 voltou a distribuir dividendos pelos acionistas, no montante de 3 120 000,00 € (cfr. p. 9 do RIT).

 

4.1.8 Em 24-10-2012 é reduzido o capital social da “G… SGPS” em 8 520 000,00 €, passando o mesmo de 9 000 000,00 € para 480 000,00 €, com a direta atribuição aos acionistas da importância libertada, passando o valor nominal de cada ação de 7,50 € para 0,40 € (redução em 7,10 €), (cfr. pp. 48/54 do PA e 9 do RIT).

 

4.1.9 Em 02-11-2012, B…, NIF: …, doou a L…, NIF: …, seu único filho, 27 500 ações ordinárias tituladas e nominativas, das 275 000 que detinha na G… SGPS, com o valor nominal de 0,40 €, representadas por 2 títulos de 10 000 ações (N.ºs 450.001 a 460.000 e 460.001 a 470.000) e 30 títulos de 250 ações (N.ºs 470.001 a 470.250, 470.251 a 470,500, 470.501 a 470.750, 470.751 a 471.000, 471.001 a 471.250, 471.251 a 471.500, 471.501 a 471.750, 471.751 a 472.000, 472.001 a 472.250, 472.251 a 472.500, 472.501 a 472.750, 472.751 a 473.000, 473.001 a 473.250, 473.251 a 473.500, 473.501 a 473.750, 473.751 a 474 000, 474 001 a 474 250, 474 251 a 474.500, 474.501 a 474.750, 474.751 a 475.000, 475.001 a 475.250, 475.251 a 475.500, 475.501 a 475.750, 475.751 a 476.000, 476.001 a 476.250, 476.251 a 476.500, 476.501 a 476.750, 476.751 a 477.000, 477.001 a 477.250, 477.251 a 477.500 (Doc. n.º 1, junto ao r.p.a. e p. 3 do RIT).         

 

4.1.10 Esta doação ficou isenta de imposto do selo, nos termos da alínea e) do artigo 6.º do CIS, sendo as ações avaliadas de acordo com o disposto na alínea a), n.º 3 do artigo 15.º do mesmo código, em 4 266 350,00 € (cfr. p. 4 do RIT).

 

4.1.11 Em 23-11-2012, reunida a assembleia geral da “G…SGPS” (ata n.º 26), foi deliberada a aprovação de balanço especial a 30-09-2012 bem como a aquisição de 27 500 ações próprias ao L…, ao preço correspondente ao seu valor real à data da deliberação, ainda que a aquisição ocorresse em momento posterior (cfr. doc. n.º 26, junto ao r.p.a. e p. 10 do RIT).

 

4.1.12 Em 18-12-2012, a assembleia geral da “G… SGPS” (ata n.º 27) aprovou a aquisição ao L… de 27 500 ações próprias ao preço unitário de 43,50 € (valor real à data da deliberação de 23-11-2012), a qual veio a realizar-se em 20-12-2012 (cfr. p. 11 do RIT).

 

4.1.13 Em 20-12-2012 a “G… SGPS” adquiriu as referidas 27 500 ações ao L…, pelo preço de 1 196 250,00 €, correspondente ao preço unitário de 43,50 €, tendo apurado na sua declaração modelo 3 de IRS/2012, uma menos-valia no montante de 3 070 076,36 €, face ao disposto no artigo 45.º/1-b) do CIRS, segundo o qual o valor de aquisição, para a determinação dos ganhos sujeitos a IRS, corresponde ao que serviria de base à liquidação de imposto do selo, caso este fosse devido (cfr. doc. n.º 27, junto ao r.p.a. “transferência interbancária”).

 

4.1.14 Em 26-01-2016 foi emitida a Ordem de serviço n.º OI2016…, a qual esteve na origem do procedimento de inspeção interna ao IRS dos Requerentes, relativo ao ano de 2012, levado a cabo pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto (cfr. p. 2 do PA).

 

4.1.15 Do projeto de correções do Relatório de Inspeção Tributária (RIT) foi proposta uma correção ao rendimento líquido da Requerente B…, no valor de 1 185 250,00 €, respeitante à mais-valia obtida na venda das 27 500 ações da “G… SGPS, SA” pelo L… à própria sociedade, rendimento enquadrado na categoria G, conforme o disposto no artigo 10.º do Código do IRS, resultante da aplicação da cláusula geral antiabuso prevista no artigo 38.º da LGT, por recurso ao procedimento do artigo 63.º do CPPT (cfr. pp. 3 a 16 do PA).

 

4.1.16 Pelo ofício n.º …/… dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto, de 05-02-2016, enviado sob o registo postal n.º RF … PT, de 08-02-2016, foi enviada aos Requerentes cópia do referido projeto de correções do RIT, sendo os mesmos notificados para, no prazo de 30 dias, querendo, exercerem o direito de audição, por escrito ou oralmente, nos termos previstos no artigo 60.º da LGT e artigo 60.º do RCPIT (cfr. doc. n.º 5, junto ao r.p.a. e p. 17 do PA).

 

4.1.17 Em 04-03-2016, os Requerentes, através de mandatária constituída em 11-03-2016, defenderam-se por escrito, requerendo a produção de prova testemunhal através do depoimento das testemunhas Dr. K…, gestor; Dra. P…, TOC; Dr. Q…, advogado; Dr. R…, jurista; e Dra. S…, farmacêutica, juntando ainda cinco documentos, além da respetiva procuração forense (cfr. doc. n.º 8, junto ao r.p.a. e pp. 19 a 58 do PA).

 

4.1.18 É o seguinte o teor da procuração forense (cfr. doc. n.º 7, junto ao r.p.a. e p. 42 do PA):

“PROCURAÇÃO

A…, contribuinte fiscal n.°…, e B…, contribuinte fiscal n.°…, casados entre si no regime da separação de bens, ambos com domicílio fiscal na Rua …, n.º…, …, …-… Porto, constituem como sua mandatária a Sra. Dra. T…, Advogada, titular da Cédula Profissional n.° …-P, com escritório na Rua …, n.°…, … -… Porto, a quem conferem os mais amplos poderes forenses gerais em direito permitidos, incluindo o poder de substabelecer, para em seu nome e representação intervir no âmbito do procedimento tributário que atualmente se encontra pendente na Direção de Finanças do Porto - Serviços de Inspeção Tributária - Divisão … sob o n.º…, bem como em todos os seus incidentes e apensos e em todos os processos graciosos, judiciais ou arbitrais que tenham por objeto as decisões que venham a ser proferidas naquele procedimento e nos seus incidentes e apensos.

Porto, … de Março de 2016”.

 

4.1.19 Através do ofício n.º …/… dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto, de 17-03-2016, enviado sob o registo postal n.º RF … PT, de 18-03-2016, foram os Requerentes notificados, na pessoa da mandatária constituída, para comparecerem na referida direção de finanças, no dia 31-03-2016, pelas 09H30, acompanhados das testemunhas indicadas no exercício do direito de audição, a fim de ser lavrado o correspondente termo de declarações e os factos novos trazidos nos depoimentos testemunhais prestados serem levados em conta na fundamentação da decisão do procedimento inspetivo.

Mais foram notificados que, caso entendessem mais conveniente, ou na impossibilidade da comparência no referido Serviço no dia e hora indicados anteriormente, poderiam remeter via postal ou entregar pessoalmente no mesmo Serviço os depoimentos, prestados por escrito, das referidas testemunhas (cfr. pp. 60/61).

 

4.1.20 Através do ofício n.º …/… dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto, de 17-03-2016, enviado sob o registo postal n.º RF … PT, de 18-03-2016, os Requerentes foram notificados nos mesmos termos que a mandatária constituída (cfr. pp. 62/63 do PA).

 

4.1.21 Em 28-03-2016 os Requerentes, através da sua mandatária, requereram que as testemunhas Dra. P… e Dra. S…, prestassem declarações em outra data por lhes ser absolutamente impossível conciliar a sua presença com compromissos familiares inadiáveis (cfr. p. 69 do PA).

 

4.1.22 Por e-mail de 28-03-2016 foi a mandatária dos Requerentes informada do reagendamento para 06-04-2016, pelas 10H00, da inquirição das testemunhas que se mostraram impossibilitadas de comparecer na data inicialmente designada (cfr. p. 64 do PA).

 

4.1.23 São os seguintes os depoimentos das testemunhas arroladas: 

a) Dr. U… (depoimento de 31-03-2016, a pp. 197 do PA) –

"Na qualidade de secretário da mesa da assembleia geral da G… SGPS SA, assistiu a várias reuniões, a partir de 2010, em que debateu por várias vezes, a sucessão do grupo familiar, e havia uma clara intenção de preparar a sucessão aos herdeiros. No caso do V… à mulher, em virtude de terem filhos menores. Ficando mais vincado na altura em que o irmão Sr. N… morreu, em Julho de 2011".

 

b) Dr. Q… (depoimento de 31-03-2016, a pp. 198 do PA) –

"O meu pai era amigo do fundador, W…, e eu também sou amigo da família há muitos anos, tendo-os acompanhado ao longo de todo este tempo e assumindo cargos no conselho fiscal de algumas empresas do grupo. O W… envolveu os cinco filhos no negócio e estes estavam também a preparar a sucessão da terceira geração no envolvimento no grupo. Entre os anos 2010 e 2012, foi uma ideia que foi sendo pensada e preparada e quiseram três dos irmãos, que os filhos começassem a trabalhar e a integrar a gestão das empresas. Os restantes acionistas manteriam as participações mas não interviriam diretamente na atividade do grupo.

A doação de 10% que eles fizeram foi voluntária e intencional, tendo sido muito conversada no seio familiar. Foi discutido e acordado entre todos os irmãos, em 2011, e houve dois ramos da família que não quiseram assumir cargos executivos na direção do grupo. Tinham que estar todos de acordo porque existiam ónus e limitações que o exigiam.

O projeto inicial sempre foi passar as ações aos filhos para eles se envolverem no negócio. Que seriam os filhos destes três acionistas que iriam dar continuidade. Os outros sucessores, os filhos do irmão N… que morreu e do O… iriam seguir outra atividade profissional, não tinham interesse em estar directamente envolvidos no negócio da família.

Mais tarde, as circunstâncias alteraram-se, com o surgimento de um comprador do negócio, mas já muito depois de as doações de ações e as pessoas da terceira geração que iriam assegurar a continuidade da empresa estarem decidas”.

 

c) Dr. R… depoimento de 31-03-2016, a pp. 201 do PA)

Sou consultor jurídico da … e o Dr. L… é advogado externo também desta liga, conhecemo-nos nessa circunstância e desenvolvemos uma relação de proximidade. Ele quis ouvir a minha opinião, por altura do Natal de 2011, sobre a doação de ações que a mãe que lhe queria fazer. Ele pediu-me opinião e na altura jantei em casa do Dr. L…com a mãe e foi-me apresentada uma minuta dessa doação. Dei-lhe duas sugestões relacionadas com o compromisso arbitral e requisitos de transmissão dos direitos mobiliários. Na altura, a Dra. B… colocou-me uma questão de direito sucessório em face do seu regime de casamento, regime de separação geral de bens, pelo que não carecia de qualquer autorização do marido, bem como outra questão sobre quotas hereditárias. Tendo sido essa a minha intervenção no processo”.

 

d) Dra. P… (depoimento de 06-04-2016, a pp. 199 do PA) –

Colaboro com a G… desde 2010, enquanto TOC, mas já mantinha contacto com os acionistas porque colaborava com empresas do grupo Z… .

Desde que assisto a reuniões em 2010, que se falava na questão da sucessão e da continuidade da empresa. Em Julho de 2011, com o falecimento do Irmão N…, começou a falar-se no assunto de forma mais regular. Os filhos dos acionistas começaram a assistir a reuniões, nomeadamente o Dr. L…, filho da Dra.B…, o X… e a Y…, filhos da D. M….

Quando a decisão foi tomada (doação de ações aos descendentes e no caso concreto do Sr. V… à esposa, por terem três filhos, sendo dois deles menores, para não os prejudicar) para mim não foi surpresa nenhuma porque o assunto já se vinha falando há bastante tempo”.

 

e) Dra. S… depoimento de 06-04-2016, a pp. 200 do PA) –

Sou amiga há mais de vinte anos de B… e nas conversas que tínhamos nos vários jantares, ela falava-me da preocupação e da vontade que tinha que o filho começasse a sucede-la e a interessar-se pelos assuntos da sociedade G… . Esta vontade de doar as ações surge em 2010, quando o filho que estava em Lisboa, desiste da carreira de magistratura e regressa ao Porto. A B… sempre demostrou vontade que o filho a sucedesse, sendo filho único é normal. Quando morreu N…, irmão da B…, já o filho estava a colaborar na empresa, desconhecendo se ainda o faz atualmente. Reforço que estas conversas aconteceram na presença do meu marido, o qual velo a falecer em fevereiro de 2012”.

 

4.1.24 Para efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 63.° do CPPT, a Direção de Finanças do Porto, através do ofício n.º…, de 22-04-2016, registado sob o n.º RF … PT, enviou à Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira a informação que reputou necessária para efeitos de autorização da liquidação com base na aplicação da disposição antiabuso, prevista no artigo 38.º da LGT (cfr. pp. 71 a 113 do PA).

 

4.1.25 Por despacho de 18-10-2016 da Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, foi autorizada a liquidação adicional de IRS dos Requerentes, relativa ao ano de 2012, com base na disposição antiabuso constante do n.º 2 do artigo 38.º da LGT (cfr. pp. 114 e 203 do PA).

 

4.1.26 Pelo ofício n.º 2016… dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto, de 31-10-2016, enviado sob o registo postal n.º RF … PT, de 02-11-2016, com aviso de receção assinado em 03-11-2016, foram os Requerentes notificados, na pessoa da mandatária constituída, das correções resultantes da ação de inspeção (cfr. doc. n.º 9, junto ao r.p.a. e pág. 251 do PA), cujo relatório/conclusões (RIT) seguiu em anexo (cfr. doc. n.º 9, junto ao r.p.a. e pp. 208 a 246 do PA).

 

4.1.27 Pelo mesmo ofício foram também notificados os Requerentes, na pessoa da mandatária constituída, da alteração efetuada nos termos do n.º 4 do artigo 65.º do CIRS, sem recurso a métodos indiretos, ao rendimento líquido do ano de 2012, no montante de 1 500 371,24 €, cuja nota de Fixação/Alteração, sem data, assinada pelo Chefe de Divisão da Divisão de Inspeção Tributária … da Direção de Finanças do Porto - Dr. D…-, seguiu em anexo (cfr. doc. n.º 9, junto ao r.p.a.).

 

4.1.28 Pelo ofício n.º 2016… da mesma direção de finanças, de 31-10-2016, enviado sob o registo postal n.º RF … PT, de 02-11-2016, foram os Requerentes notificados de que, na mesma data, a mandatária constituída foi notificada do resultado da ação de inspeção credenciada pela OI2016…, nos termos do artigo 77.° da LGT e artigo 62.° do RCPIT (cfr. p. 254 do PA).

 

4.1.29 Em 10-11-2016 foi efetuada a liquidação n.º 2016…, relativa à liquidação adicional de IRS do ano de 2012, no montante global de 371 072,63 €, assim determinada (cfr. doc. n.º 14, junto ao r.p.a.):

 

Coleta líquida: ……………………….     423 193,66 €

Retenções na fonte: …………………  -  94 750,60 €

Imposto apurado: …………………...    328 443,06 €

Juros compensatórios: ………………     42 629,57 €

Valor a pagar: ………………………..     371 072,63 €

 

4.1.30 Esta liquidação foi notificada aos Requerentes através de carta registada sob o n.º RY…PT, de 21-11-2016 (cfr. doc.s n.ºs 14 e 15, juntos ao r.p.a.).

 

4.1.31 Em 10-11-2016 foi efetuada a liquidação n.º 2016…, relativa aos consequentes juros compensatórios, no montante de 42 629,57 €, notificada aos Requerentes através de carta registada sob o n.º RY…PT, de 22-11-2016 (cfr. doc.s n.ºs 16 e 17, juntos ao r.p.a.).

 

4.1.32 Em 22-11-2016, a AT remeteu aos Requerentes a Demonstração de Acerto de Contas n.º 2016 … e correspondente Nota de Cobrança, com a indicação da data de 21-12-2016, como data limite de pagamento, e o montante a pagar de 356 588,32 €, assim determinado (cfr. doc.s n.ºs 18 e 19, juntos ao r.p.a.).

 

Imposto apurado: …………………...     328 443,06 €

Estorno (pagamentos anteriores): ..       – 14 484,31 €

Soma: ……………………………….        313 958,75 €

Juros compensatórios: ……………..        42 629,57 €

Valor a pagar: ……………………….      356 588,32 €

 

4.1.33 O pagamento foi efetuado em 20-12-2016 (cfr. doc. n.º 21, junto ao r.p.a.).

 

4.1.34 Em 08-11-2017 a AT requereu a junção de um documento (“despacho de ratificação” da nota de Fixação/Alteração referida em 5.1.27) assinado pelo diretor de finanças do Porto, Dr. AA…, com data de 2017/05/04, não rubricado nem paginado.

 

4.1.35 Por despacho da mesma data, o Tribunal Arbitral admitiu a junção do referido documento e designou a data de 30 de novembro de 2017 para prolação da decisão arbitral.    

 

4.1.36 Em 20-11-2017, Os Requerentes, notificados da junção deste documento, procedem à ampliação do pedido e da causa de pedir, de modo a que o Tribunal Arbitral reconheça a ilegalidade daquele ato, relativamente aos efeitos já produzidos, ao abrigo do disposto no artigo 64.º, n.º 6 do CPTA, aplicável por força do artigo 29.º, n.º 1 alínea c) do RJAT. E que a convalidação do ato não valha senão para o futuro, nos termos do artigo 164.º, n.º 4 do CPA, posto que o ato de sanação foi proferido já na pendência do presente processo.

 

4.1.37 Face às razões de facto e de direito invocadas pelos Requerentes, o Tribunal Arbitral, por despacho de 21-12-2017, admitiu a modificação objetiva da instância e o aditamento ao pedido inicialmente formulado, nos seguintes termos:

“a. Deverá esse douto Tribunal Arbitral declarar a invalidade originária do Ato de alteração proferido pelo Chefe da Divisão de Inspeção Tributária V em data desconhecida (porque omitida no texto do próprio ato e no da sua notificação), decorrente de vício de incompetência relativa; 

b. Deverá esse douto Tribunal Arbitral anular os efeitos lesivos produzidos medio tempore pelo Ato de Alteração no período que precedeu a prolação do Despacho de Ratificação, nos termos do art. 164.º, n.º 5, in fine, do CPA; e consequentemente,

c. Proceder à anulação da Liquidação Impugnada (i) seja porque esta é, em si mesma, um dos efeitos lesivos medio tempore produzidos pelo Ato de Alteração que devem ser anulados por força do art. 164.º, n.º 5, in fine, do CPA; e (ii) seja porque em consequência da anulação dos efeitos lesivos produzidos medio tempore pelo Ato de Alteração, a Liquidação Impugnada está ferida de vício de violação de lei decorrente erro nos pressupostos de facto, na medida em que teve por base uma circunstância que, na realidade, não se verificava, porquanto à data em que foi proferida a Liquidação Impugna­da inexistia um qualquer título juridicamente válido por via do qual se pudesse considerar estabelecida (por alteração ou correção dos rendimentos declarados pelos Requerentes) a base tributável sobre a qual incidiu a Liquidação Impugnada.

(…)

Mais se peticiona a condenação da AT por contumaz litigância de má-fé em indemnização condigna aos Requerentes a fixar segundo o prudente arbítrio desse douto Tribunal Arbitral”.

 

4.1.38 Em 22-12-2017 a Requerida foi notificada para, no prazo de dez dias, produzir, querendo, alegações complementares restritas à matéria contida na alteração admitida, quedando-se pelo silêncio.

 

 

4.2 Factos não provados

Não há factos relevantes para a decisão da causa que devam considerar-se não provados.

 

 

4.3 Motivação

Relativamente à matéria de facto o tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor [(cfr. artigos 596.º, nº 1 e 607.º, n.ºs 2 a 4 do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29.º, nº 1, alíneas a) e e) do RJAT)] e consignar se a considera provada ou não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2 do CPPT).

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artigo 607.º, n.º 5 do CPC). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (e.g. força probatória plena dos documentos autênticos, cfr. artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação. 

Assim, a convicção do tribunal fundou-se no acervo documental junto aos autos, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido, bem como nas posições assumidas pelas partes.

 

  

5.4 Matéria de Direito (fundamentação)

Objeto do litígio

As questões que constituem o thema decidenduum reconduzem-se em saber se as liquidações n.ºs 2016…, relativa ao IRS do ano de 2012 e 2016…, respeitante aos respetivos juros compensatórios, se encontram eivadas de qualquer dos vícios formais e materiais invocados que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade, ou à sua anulação, e ainda se naquela liquidação se mostram verificados os pressupostos de facto e de direito previstos no artigo 38.º, n.º 2, da LGT, para a aplicação da Cláusula Geral Antiabuso.

 

Questões a decidir:

- Da (i)legalidade da liquidação de IRS n.º 2016…, relativa ao exercício de 2012;

- Da (i)legalidade da liquidação de juros compensatórios n.º 2016…;

- Do pedido de condenação no pagamento de juros indemnizatórios; e

- Da pedido de condenação da AT como litigante de má-fé.

*

Da (i)legalidade das liquidações impugnadas (IRS/2012 e juros compensatórios)

Os vícios formais arguidos pelos Requerentes (3.1 a 3.9 e 3.15 e 3.16), a verificarem-se, conduzirão à anulação dos atos impugnados.

Assim, nos termos do artigo 124.º, n.ºs 1 e 2, al. b) do CPPT, comecemos pela apreciação dos mesmos segundo a ordem indicada pelos Requerentes no requerimento de pronúncia arbitral, realinhada pelo requerimento de 20-11-2017, e depois a questão substancial relacionada com a verificação dos requisitos de aplicação da CCGA, previstos no n.º 2 do artigo 38.º da LGT, sendo que a procedência de qualquer dos vícios terá como consequência a não pronúncia, por prejudicada, dos restantes.

 

Ilegalidade decorrente de vício de incompetência relativa (3.1 supra)

Resulta dos autos que a liquidação impugnada com o n.º 2016…, respeitante ao IRS do ano de 2012, teve por base o rendimento líquido no montante de 1 500 371,24 €, alterado pelo Chefe da Divisão de Inspeção Tributária … da Direção de Finanças do Porto – Dr. D…-, nos termos do n.º 4 do artigo 65.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, em data desconhecida, porque omitida no texto do próprio ato (“Nota de Fixação/Alteração” constante do documento n.º 9 junto com o requerimento de pronúncia arbitral).

Porém, nos termos do n.º 5 do referido artigo a competência para a prática de tais atos cabe ao diretor de finanças do domicílio dos Requerentes, ou seja, in casu, ao diretor de finanças do Porto.

Com efeito preceitua o referido normativo legal: “A competência para a prática dos atos de apuramento, fixação ou alteração referidos no presente artigo é exercida pelo diretor de finanças em cuja área se situe o domicílio fiscal dos sujeitos passivos, podendo ser delegada noutros funcionários sempre que o elevado número daqueles o justifique”.

Assim, aquele ato de alteração do rendimento líquido está ferido de vício de incompetência relativa em razão da hierarquia, na medida em que foi praticado por órgão ou agente que não dispunha de competência própria, delegada ou subdelegada para a sua prolação.

Como ensina Marcello Caetano[1], “Diz-se incompetência a ilegalidade resultante da prática por um órgão ou agente administrativo de acto que ele não tinha o poder legal de praticar no caso dessa ilegalidade não constituir usurpação de poder[2]”   

Para Diogo Freitas do Amaral[3], a incompetência pode ser definida como “O vício que consiste na prática, por um órgão da Administração, de um acto incluído nas atribuições ou na competência de outro órgão da Administração”, sendo relativa quando “um órgão de uma pessoa colectiva pública pratica um acto que está fora da sua competência, mas que pertence à competência de outro órgão da mesma pessoa colectiva[4]” e em razão da hierarquia quando “se invadem os poderes conferidos a outro órgão em função do grau hierárquico, nomeadamente quando o subalterno invade a competência do superior, ou quando o superior invade a competência própria ou exclusiva do subalterno[5]”.

A incompetência relativa gera a anulabilidade do ato por ela viciado, cfr. artigo 163.º, n.º 1, do CPA, que refere: “São anuláveis os atos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou outras normas jurídicas aplicáveis, para cuja violação se não preveja outra sanção”. Gerando também, por arrastamento e extensão, a consequente anulabilidade da própria liquidação impugnada, por força do princípio da impugnação unitária prevista no artigo 54.º do CPPT.

 

Tendo em vista a sanação do referido ato de alteração do rendimento líquido foi apresentado pela Requerida, em 07 de novembro de 2017, um documento intitulado “Despacho de Ratificação”, datado de 04-05-2017, e que, como a mesma refere no respetivo requerimento de junção “(…) é parte integrante do P.A. e que, só por lapso, não foi anexado ao mesmo”.

Diga-se desde já que tal despacho de ratificação não se encontra paginado nem rubricado de acordo com o disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 64.º do CPA, contrariamente às 255 folhas do processo administrativo. Por outro lado, quer na resposta, quer nas alegações, apresentadas em 21-09-2017 e 30-10-2017, respetivamente, não foi feita qualquer referência ao referido despacho. Aliás, naquele articulado a AT não se pronuncia sobre o assunto e nas alegações refere apenas “Conforme é facilmente percetível do processo administrativo, a fls. 75, 117, 203, 208 e 251, todos os atos contêm assinatura e a data em que foram praticados”.

 

 Deste modo importa conhecer da validade, eficácia e efeitos do despacho de ratificação, ou seja, se operam ex tunc ou ex nunc.

 

Se tomarmos em consideração que o despacho foi proferido em 04-05-2017 e que o tribunal arbitral foi constituído em 01-06-2017, nos termos do artigo 15.º do RJAT, os efeitos da ratificação operam ex tunc, ou seja, retroagem os seus efeitos à data do ato a que respeita (ato que alterou o rendimento líquido para efeitos de IRS), por força do disposto no n.º 5 do artigo 164.º do CPA, que preceitua: “Desde que não tenha havido alteração ao regime legal, a ratificação, a reforma e a conversão retroagem os seus efeitos à data dos atos a que respeitam, mas não prejudicam a possibilidade de anulação dos efeitos lesivos produzidos durante o período de tempo que as tiver precedido, quando ocorram na pendência de processo impugnatório e respeitem a atos que envolvam a imposição de deveres, encargos, ónus ou sujeições, a aplicação de sanções ou a restrição de direitos e interesses legalmente protegidos”.

   

Porém se atentarmos na relevância da data de junção aos autos do despacho de ratificação (07-11-2017), uma vez que, nos termos dos artigos 83.º, n.º 3 do CPTA e 573.º, n.º 1 do CPC, toda a defesa deve ser deduzida na contestação (resposta, no processo arbitral tributário), excetuados os incidentes que a lei manda deduzir em separado (princípio da concentração da defesa) e a teleologia do artigo 168.º, n.º 3 do CPA que impõe que o tribunal tome conhecimento da prolação do ato anulatório (ou do ato convalidante) antes de encerrada a discussão da causa de modo que lhe seja possível extrair da prática de um tal ato todas as necessárias consequências em matéria de subsistência da instância e de utilidade da decisão a proferir (princípio da estabilidade da instância). Ou, no dizer de Diogo Freitas do Amaral[6], em comentário à referida norma: “Deste modo, garante-se que a última palavra sobre a legalidade do ato administrativo impugnado cabe ao tribunal. Este deve pronunciar-se sobre todas as causas de invalidade que tenham sido invocadas, assim como deve identificar a existência de causas de invalidade diversas das que tenham sido alegadas (cfr. CPTA, art. 95.º, n.º 2), de modo a assegurar um juízo definitivo sobre a invalidade ou validade daquele ato”, o ato de ratificação é ilegal, porquanto:

  • Foi praticado em data posterior ao prazo de 30 dias previsto no artigo 13.º, n.º 1 do RJAT, e que, in casu, terminou em 09-05-2017 (refira-se que o pedido de constituição do tribunal arbitral foi notificado à Requerida em 23-03-2017);
  • Foi praticado em data posterior ao encerramento da discussão, que coincide com o início da fase das alegações[7] (02-10-2017), cfr. artigo 168.º, n.º 3 do CPA, ex vi do artigo 164.º, n.º 1 do mesmo código; e
  • Foi praticado na pendência dos autos (o tribunal arbitral foi constituído em 01-06-2017), pelo que, apesar de convalidante, opera ex tunc permitindo a anulação dos efeitos lesivos produzidos durante o período de tempo que o precedeu, cfr. artigo 164.º, n.º 5, in fine, do CPA e 64.º, n.º 6 do CPTA.

 

Em todo o caso, o despacho de ratificação sempre seria juridicamente ineficaz, por não ter sido objeto de notificação aos seus diretos interessados, cfr. artigo 77.º, n.º 6, da LGT; artigo 36.º, n.º 1, do CPPT; e artigo 66.º, n.º 1, do CIRS.

 

Por outro lado, não foi notificado ao Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) no prazo limite fixado no artigo 13.º, n.º 1, do RJAT, pelo que nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, findo o prazo previsto no n.º 1, a administração tributária fica impossibilitada de praticar novo ato tributário relativamente ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação, a não ser com fundamento em factos novos.

Com efeito refere o n.º 1 daquele artigo: “Nos pedidos de pronúncia arbitral que tenham por objeto a apreciação da legalidade dos atos tributários previstos no artigo 2.º, o dirigente máximo do serviço da administração tributária pode, no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, proceder à revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja ilegalidade foi suscitada, praticando, quando necessário, ato tributário substitutivo, devendo notificar o presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) da sua decisão, iniciando-se então a contagem do prazo referido na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º”.

 

Nestes termos deverá proceder-se à anulação da liquidação Impugnada (i) seja porque esta é, em si mesma, um dos efeitos lesivos medio tempore produzidos pelo ato de alteração que devem ser anulados por força do artigo 164.º, n.º 5, in fine, do CPA; e (ii) seja porque em consequência da anulação dos efeitos lesivos produzidos medio tempore pelo ato de alteração, a liquidação Impugnada está ferida de vício de violação de lei decorrente de erro nos pressupostos de facto, na medida em que teve por base uma circunstância que, na realidade, não se verificava, porquanto à data em que foi proferida a liquidação Impugnada inexistia um qualquer título juridicamente válido por via do qual se pudesse considerar estabelecida (por alteração ou correção dos rendimentos declarados pelos Requerentes) a base tributável sobre a qual incidiu a liquidação Impugnada.

 

Face à procedência do vício de incompetência relativa invocado pelos Requerentes fica prejudicada a pronúncia dos restantes vícios.

 

 

*

 

 

Do pedido de condenação no pagamento de juros indemnizatórios

Os Requerentes pedem ainda que lhes sejam pagos juros indemnizatórios, por erro dos serviços, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, tendo provado que o pagamento da quantia liquidada ocorreu em 20-12-2016.

Este preceito, aplicável subsidiariamente ao processo arbitral tributário, por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, refere “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.”

Considera-se verificada a existência de erro imputável aos serviços, segundo jurisprudência uniforme do STA[8], sempre que se verificar a procedência da reclamação graciosa ou impugnação judicial do ato de liquidação (no mesmo sentido, a decisão no processo arbitral n.º 218/2013-T).

Deste modo, reconhece-se o direito dos Requerentes a juros indemnizatórios à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT; artigo 61.º, n.ºs 2 a 5 do CPPT; artigo 559.º, n.º 1, do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril, desde a data do pagamento indevido do imposto e juros compensatórios (20-12-2016) até à data do processamento da respetiva nota de crédito, conforme o disposto no n.º 5 do artigo 61.º do CPPT.

 

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Do pedido de condenação da AT como litigante de má-fé

Requerem, por fim, os Requerentes que a AT seja condenada como litigante de má-fé, nos termos dos artigos 542.º e 543.º do CPC, em multa condigna e no pagamento aos Requerentes de indemnização a fixar, segundo o prudente arbítrio deste tribunal arbitral, em montante correspondente a 5% do valor do pedido condenatório (356 588,32€).

A condenação como litigante de má-fé, não estando expressamente prevista em sede de arbitragem tributária (sem prejuízo de o tribunal concluir, obviamente, pela existência pura e simples da existência de má fé, maxime, dos pressupostos para a condenação se para tal tivesse competência) deve restringir-se às situações em que se demonstre, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu, consciente e voluntariamente, com dolo ou negligência grosseira, exteriorizando uma atuação manifestamente reprovável e censurável, dirigida a impedir a ação da justiça e frustração do interesse da parte contrária, mediante a ocultação ou distorção de factos que não poderia (ou deveria) ignorar.

Importa, desde já, salientar que o disposto no CPC sobre a litigância de má fé nunca poderia ser aplicado à AT, já que o disposto no artigo 104.º da LGT, tem natureza de norma especial.

Sem dúvida que um dos princípios enformadores do processo arbitral é a boa fé processual, aplicável, de resto, aos árbitros, às partes e aos mandatários (cf. artigo 16.º, alínea f), do RJAT). Mas nada no comportamento da Requerida é censurável, pois que se limitou a defender os seus interesses e posições com base na argumentação jurídica que entendeu mais adequada, em termos, aliás, semelhantes ao que tem feito em muitos outros processos arbitrais.

E, em qualquer caso, de modo algum se verifica a previsão do artigo 104.º, n.º 1, da LGT, que estatui que a administração tributária pode ser condenada numa sanção pecuniária a quantificar de acordo com as regras sobre a litigância de má fé “em caso de actuar em juízo contra o teor de informações vinculativas anteriormente prestadas aos interessados ou o seu procedimento no processo divergir do habitualmente adoptado em situações idênticas”.

Nestes termos, improcede este pedido de condenação em litigância de má da Requerida.

 

 

***

 

 

6. Decisão

Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

a. Declarar a invalidade originária do ato de alteração, proferido pelo Chefe de Divisão da Divisão de Inspeção Tributária … da Direção de Finanças do Porto, em data desconhecida (porque omitida no texto do próprio ato e no da sua notificação), decorrente de vício de incompetência relativa; 

b. Declarar a anulação dos efeitos lesivos produzidos medio tempore pelo ato de alteração no período que precedeu a prolação do despacho de ratificação, nos termos do artigo 164.º, n.º 5, in fine, do CPA;

c. Julgar totalmente procedente o pedido de anulação das liquidações n.º 2016… de IRS, relativa ao ano de 2012, e n.º 2016… de juros compensatórios, por vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto e de direito e anular as liquidações impugnadas, com as devidas consequências legais; 

d. Julgar procedente o pedido de condenação da Requerida a reembolsar as quantias indevidamente pagas pelos Requerentes, no montante global de 356.588,32 €, correspondendo 313.958,75 € a IRS do ano de 2012 e 42.629,57 € a juros compensatórios;

e. Julgar procedente o pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios contados, à taxa legal em vigor, sobre a referida quantia (356.588,32 €), desde a data do pagamento (20-12-2016) até à data do processamento da respetiva nota de crédito;

f. Declarar a inexistência de má-fé na litigância da Autoridade Tributária; e

g. Condenar a Requerida no pagamento das custas do processo, no montante de 6.120,00 €.

 

 

 

7. Valor do Processo

De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT), fixa-se ao processo o valor de 356.588,32 €.

 

 

 

8. Custas

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4 do RJAT, fixa-se o montante das custas em 6.120,00 €, nos termos da Tabela I, anexa ao RCPAT, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Notifique.

 

Lisboa, 01 de fevereiro de 2018.

 

 

 

 

O Árbitro Presidente  ,

 

(José Baeta de Queiroz)

 

 

 

 

O Árbitro Adjunto,

 

 

(Rui Ferreira Rodrigues)

 

 

 

O Árbitro Adjunto,

 

(José Rodrigo de Castro)

 

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no artigo 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.

 



[1] In “ Manual de Direito Administrativo”, 10.ª ed. Almedina. Coimbra, 1999, v. II, pp. 499/500   

[2] Ibidem, p. 498 (A usurpação de poder consiste na prática, por um órgão administrativo, de acto incluído nas atribuições dos tribunais judicias)

[3] In “Direito Administrativo”, Lições aos alunos do curso de Direito, em 1988/89, v. III, p. 298

[4] Ibidem, p. 299

[5] Idem

[6] In “Curso de Direito Administrativo”, 3.ª ed. Almedina, 2016, v. II, p. 396   

[7] Ibidem, p. 396

[8] www.dgsi.pt - Acórdãos do STA de 22-05-2002, Proc. n.º 457/02; de 31.10.2001, Proc. n.º 26167; de 2.12.2009, Proc. n.º 0892/09