Decisão Arbitral
I – Relatório
1. No dia 19.04.2017, O Requerente, A…, contribuinte fiscal número …, residente na Rua…, nº…, …, requereu ao CAAD a constituição de tribunal arbitral, nos termos do art. 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por “RJAT”), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, com vista à declaração de ilegalidade do ato de liquidação referida na nota demonstração da liquidação do IRS nº 2017…, no valor de € 11.330,35 e demonstrativa do acerto de contas com o número 2017…, no valor de 7.981,64 €, do ano de 2013.
A Requerente peticiona, ainda, a condenação da Requerida à restituição do imposto que alega ter pagado, acrescido de juros indemnizatórios.
2. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira.
Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1, do art. 6.º, do RJAT, por decisão do Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi designado árbitro o signatário, que comunicou ao Conselho Deontológico e ao Centro de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo no prazo regularmente aplicável.
O Tribunal Arbitral foi constituído em 30-06-2017.
3. Verificando-se a inexistência de qualquer situação prevista no art. 18º, nº 1, do RJAT, que tornasse necessária a reunião arbitral aí prevista, foi dispensada a realização da mesma, com fundamento na proibição da prática de atos inúteis.
As partes, notificadas para o efeito, não apresentaram alegações.
4. Os fundamentos apresentados pela Requerente, em apoio da sua pretensão, foram, sinteticamente, os seguintes:
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No ano de 2013, por virtude de uma reestruturação, o Banco B… viu-se na necessidade de reduzir efetivos e, consequentemente, de pagar indemnizações aos diversos funcionários com quem acordou a revogação do contrato de trabalho.
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Acontece que o impugnante, sendo um dos efetivos que prestava serviço no Banco B…, recebeu dele, por via dessa revogação, uma indemnização no montante de 171.011,60 € (Cfr. sua cláusula 2ª) e não de 172.611,60 €, como a Fiscalização Tributária refere no relatório que elaborou.
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No cômputo do apuramento da indemnização a pagar ao impugnante, foi considerada a antiguidade do impugnante, no Sector bancário, de 15,35 anos, quando em bom rigor, o ora impugnante, conforme infra melhor demonstrará e provará, teve uma antiguidade de 16,84 anos, ou seja, uma antiguidade um pouco superior aos 15,35 anos invocados pela Fiscalização Tributária e, atenta tal realidade factual, o valor da indemnização sujeito a IRS, no ano de 2013, é, conforme infra se concretizará, de 87.397,33 €, e não no valor de 94 975,19 €.
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Na prática significa que, apenas o valor correspondente a 15,34 anos (€ 77.636,41)
ficou não sujeito a IRS e não o correspondente a todo o tempo de serviço prestado no Sector bancário
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A entidade pagadora da indemnização, o banco “B…” era, como ainda é,
outorgante do Acordo Coletivo de Trabalho do Sector Bancário, (doravante designado por ACT do Sector Bancário) instrumento de regulação coletiva de trabalho, cuja última alteração foi publicada no BTE, 1ª série, n.º 20, de 29 de Maio de 2011.
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Para além do B…, as demais instituições bancárias onde o impugnante
prestou trabalho, concretamente no Banco C… no período
compreendido entre 01-03-1996 e 31-08-1997, como acima ficou referido.
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Ora, consta do n.º1 da cláusula 2ª do ACT do Sector Bancário que “O presente Acordo Colectivo de Trabalho obriga as Instituições de Crédito, as Sociedades Financeiras e outras entidades públicas ou privadas que o subscrevem (…) bem como todos os trabalhadores ao seu Serviço representados pelos Sindicatos signatários.”.
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Assim, quer a entidade pagadora da indemnização “B…”, porque aderiu ao ACT do Sector Bancário, quer o próprio impugnante, por ter estado filiado em
sindicatos subscritores daquele acordo, estão abrangidos por aquele instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
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Nomeadamente, pelo conteúdo da cláusula 17º do ACT do Sector Bancário, que
considera como antiguidade do trabalhador, todos os anos de trabalho prestado em instituições de crédito sedeadas em Portugal.
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Antiguidade que é considerada para todos os efeitos previstos no ACT do Sector
Bancário, onde se inclui, claramente, a atribuição de compensação por revogação do contrato de trabalho.
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Do n.º 4 do artigo 2º do CIRS, não resulta que a antiguidade a considerar seja, apenas, a antiguidade na entidade pagadora da compensação por cessão do contrato de trabalho.
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A antiguidade a considerar, no caso concreto, é aquela que corresponde à totalidade do tempo de serviço prestado pelo impugnante em instituições de crédito em Portugal, por força da aplicação do ACT do Sector Bancário e dos contratos individuais de trabalho que sempre a consideraram de forma expressa.
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Na verdade, o conceito de antiguidade não se encontra definido na Lei Fiscal, o que implica o recurso às Leis do trabalho para a determinação do referido conceito, como dispõe o n.º 2 do artigo 11º da LGT.
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Logo, a antiguidade do impugnante corresponde a todo o tempo se serviço prestado no sector bancário, isto é, 16,84 anos, vinculando necessariamente a AT.
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A AT e, em concreto, os SIT de Lisboa fez uma interpretação restritiva da norma (artigo 2º n.º 4 do CIRS), limitando, assim, os direitos da impugnante bem como
as suas legítimas expectativas de ver considerado todo o tempo de serviço prestado no Sector da Banca para efeito de atribuição de indemnização na sequência de revogação contrato de trabalho e, consequentemente, o direito da compensação atribuída não ser tributada como rendimento categoria A.
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O excesso sujeito a IRS, não seria e nem será o declarado, como foi, na importância 81.527,46 €, mas o montante de 87.397,33 €, visto ser o excesso da indemnização que o impugnante recebeu.
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Pode assim concluir-se, com toda a segurança, salvo melhor e fundada opinião, que a liquidação impugnada será de anular, na medida em que se apurou tendo em vista um excesso sujeito a tributação de 94.975,19 €, quando esse excesso é, agora, depois de corrigido o valor da indemnização de 172.611,60 € para 171.011,60 €, tão só e apenas, de 87.397,33 € pelo que deve ser decretada anulação parcial dos atos tributários e o reembolso do imposto a mais liquidado e pago e pagamento de juros indemnizatórios.
5. A ATA – Administração Tributária e Aduaneira, chamada a pronunciar-se, contestou a pretensão da Requerente, defendendo-se por impugnação, em síntese, com os fundamentos seguintes:
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Em causa está a tributação da indemnização paga pelo B… ao R., no montante de 172.611,60€, na sequência de uma rescisão do contrato de trabalho, valor que o próprio Requerente admitiu no ponto dois do direito de audição, ter auferido a título de indemnização.
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A questão controvertida prende-se com saber se a contagem da antiguidade do R., para efeitos de incidência de IRS, no caso de indemnização por rescisão do contrato de trabalho, deve fazer-se tendo em conta o tempo de serviço prestado anteriormente pelo R. noutra instituição bancária (o Banco C…), ou, pelo contrário, apenas considerando o tempo de trabalho prestado na entidade com a qual rescindiu o contrato de trabalho, que motivou o direito à compensação, ou seja, o Banco B… .
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Atento o disposto no nº 4 do art. 2º do CIRS, , o tempo de serviço do R. reporta-se a 15,34 anos pois a antiguidade a contabilizar, para efeitos do nº 4 do art. 2º do CIRS, é a antiguidade na entidade devedora da compensação por cessação do contrato de trabalho, não sendo de ponderar, na aplicação do referido preceito legal, a antiguidade em anterior entidade empregadora, mesmo que o trabalhador e a nova entidade patronal tenham acordado ser de considerar em eventuais futuras “indemnizações”, por contrato de trabalho ou que decorra de instrumentos de regulamentação coletiva.
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Logo, foi sobre a antiguidade de 15,34 anos que foi apurado o montante indemnizatório excluído de tributação de IRS, porquanto é este o tempo de serviço prestado na última entidade empregadora, sobre quem recai o dever de pagar a compensação.
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O conceito de antiguidade – antiguidade per si, sem qualquer qualificativo – em sede laboral não comporta uma especial densidade científica que o afaste significativamente do sentido da linguagem corrente: traduzindo, tal como noutros contextos jurídicos, um intervalo juridicamente relevante, com efeitos diversos, entre um determinado termo inicial e um determinado termo final.
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Apesar de os instrumentos de regulamentação coletiva aduzirem vários qualificativos à antiguidade laboral, a verdade é que o Código do Trabalho não define o que seja “antiguidade” nem apresenta uma qualificação unívoca dela, constatando-se, contudo, à saciedade, a prevalência da noção de “antiguidade na empresa”, incluindo em matéria de cessação do contrato de trabalho.
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Ao regime jurídico do artigo 2.º, n.º 4, do Código do IRS, subjaz uma notória vocação anti abuso, própria das cláusulas especiais preventivas da evasão fiscal – vocação que tem especial razão de ser, pois não seriam em qualquer caso aceitáveis acordos que dispusessem sobre antiguidade laboral, reconhecendo antiguidades meramente artificiais e impondo tal reconhecimento para efeitos de delimitação negativa da incidência de imposto.
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O recurso à norma do artigo 11.º, n.º 2 da LGT pressupõe – face à expressão “salvo se outro decorrer diretamente da lei” – a inexistência na norma legal (alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS) de um qualquer sentido próprio de antiguidade.
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A questão prende-se com o facto de saber-se se aquela alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS, enquanto detentora de um sentido próprio do conceito de “antiguidade na empresa” que se comprova existir, pode ser permeável a outras qualificações de antiguidade acordadas em instrumentos jurídicos de natureza negocial, bilaterais ou coletivos, que imponham à entidade devedora da prestação pecuniária referida nessa norma uma antiguidade maior do que a correspondente à duração da relação contratual outorgada por tal entidade tendo presente que “a qualificação do negócio jurídico efetuada pelas partes (…) não vincula a administração tributária” de acordo com o n.º 4, do artigo 36.º da LGT – norma que abrange, naturalmente, por maioria de razão, as qualificações das partes incidentes sobre o objeto negocial -, a questão terá de obter a sua solução na integral interpretação jurídica de todo o normativo implicado pela expressão “número de anos ou fração de antiguidade ou de exercício de funções a entidade devedora”, contida na alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS.
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Uma vez respeitados os limites legais imperativos quanto às compensações ou indemnizações por cessação do contrato de trabalho, não está, naturalmente, em causa a plena legitimidade de os instrumentos jurídicos negociais vincularem a entidade devedora a compensações/indemnizações pecuniárias superiores ao montante correspondente à delimitação negativa da incidência fiscal prevista na alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS.
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O que está em causa é saber se tais instrumentos jurídicos negociais podem impor a amplitude da própria tributação, como se de uma tributação voluntária se tratasse.
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O espírito da lei reclama uma interpretação em termos literais da expressão “números de anos ou fração de antiguidade ou de exercício de funções na entidade devedora” referenciada à “entidade devedora”, não admitindo que na “antiguidade na entidade devedora” se considerem, para além da antiguidade inerente à efetiva duração da relação contratual outorgada por essa entidade, majorações decorrentes de instrumentos jurídicos negociais.
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O elemento literal da interpretação jurídica permite confirmar, numa perspetiva de correção sintática, que a antiguidade prevista na alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS é a antiguidade na “entidade devedora”, correspondente à “antiguidade na empresa” que, por força do elemento histórico-sistemático inerente à norma do atual n.º 10 do mesmo artigo, corresponde à “entidade empregadora/patronal”, com a amplitude decorrente desta norma, bem como das situações de sucessão na posição desta entidade, máxime por efeito da equiparação inerente ao artigo 285.º do Código de Trabalho de 2009.
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Por outro lado, lê-se na cláusula 2ª do ACT para o Sector Bancário (2012) o seguinte:
“O presente Acordo Coletivo de Trabalho é aplicável em todo o território nacional, no âmbito do sector bancário, e obriga as Instituições de Crédito e as Sociedades Financeiras que o subscrevem (adiante genericamente designadas por Instituições de Crédito ou Instituições), bem como todos os trabalhadores ao seu serviço filiados nos Sindicatos dos Bancários do Centro, do Norte e do Sul e Ilhas, representados pela outorgante FEBASE – Federação do Sector Financeiro e doravante designados por Sindicatos, abrangendo 26 empregadores e estimando-se em 54.300 os trabalhadores abrangidos.(…)”
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Pelo que, para que o aludido ACT possa ser aplicável, é necessário que o trabalhador em causa seja filiado num dos aludidos sindicatos e que a instituição de crédito seja subscritora do aludido Acordo.
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Acontece que, no caso concreto, o R. não provou, nem tão pouco alegou, a sua filiação a qualquer dos mencionados sindicatos, o que, só por si, é motivo excludente da invocação da cláusula 17ª do ACT.
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Face ao exposto, o ato de liquidação adicional, em crise nestes autos, não enferma de qualquer vício que ponha em causa a sua legalidade e validade.
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Razão pela qual não há lugar ao pagamento de quaisquer juros indemnizatórios.
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As alegações da Requerente não podem, de todo, proceder, porquanto fazem uma interpretação e aplicação das normas legais subsumíveis ao caso sub judice notoriamente errada.
6. O tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído nos termos do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas.
O processo não padece de vícios que o invalidem.
7. Cumpre solucionar as seguintes questões:
a) Ilegalidade do ato de liquidação objeto do processo.
b) Direito à restituição do imposto.
c) Direito a juros indemnizatórios.
II – A matéria de facto relevante
8. Consideram-se provados os seguintes factos:
8.1.O impugnante foi, trabalhador na instituição bancária “B…, entre 01-03-1998 e 30-05-2013.
8.2.No período compreendido entre 01-03-1996 e 31-08-1997, impugnante foi trabalhador no Banco C… .
8.3.Em 7.05.2013 o impugnante e “B… celebraram o acordo de revogação do contrato de trabalho, em consequência da qual o trabalhador recebeu a quantia de 172.611,6 €.
8.4. De acordo com a declaração de IRS apresentada pelo contribuinte, a parte de indemnização isenta face ao artigo 4º, nº 2, al. a) do CIRS, teve por base uma antiguidade de 18 anos completos no Sector bancário .
8.5. A liquidação adicional “sub judice” teve por base uma antiguidade de 15,34 anos.
8.6. A liquidação objeto do processo fundamentou-se no Relatório de Inspeção Tributária onde consta, designadamente, o seguinte:
8.7. O impugnante pagou o imposto ora impugnado em 01-03-2017.
Com interesse para a decisão da causa inexistem factos não provados
9. A convicção do Tribunal quanto à decisão da matéria de facto dos números 8.1), 8.2), 8.4), 8.5), 8.6) e 8.7) do probatório alicerçou-se nos documentos constantes do processo, bem como nos articulados apresentados, sendo de salientar inexistir discordância das partes relativamente a esta matéria.
No que respeita à matéria do número 8.3) do probatório, a convicção do Tribunal resulta, fundamentalmente, do facto do Requerente ter afirmado expressamente no exercício do direito de audição no âmbito do procedimento de inspeção tributária ter recebido o valor de 172.611,6 €, reforçado pelo facto de, já em 26.02.2016, este valor de indemnização ter sido referido pela Requerida em notificação de 26.02.2016, endereçada ao contribuinte, constante do processo administrativo, mencionando que tal resultava de dados recolhidos junto do B…, não constando do processo administrativo qualquer contestação da Requerente relativamente a este valor.
Por outro lado, para prova do valor que alega, o Requerente apenas juntou cópia do acordo de resolução do contrato de trabalho pelo qual o empregador se comprometeu a pagar uma indemnização de 171.011,60 € mas não avançou qualquer justificação para anteriormente ter afirmado, expressamente, ter recebido 172.611,6 € de indemnização, nem se propôs produzir qualquer outra prova do valor que agora veio invocar, acrescendo que o facto ter sido estabelecida uma indemnização de 171.011,60 €, não impedir os contraentes de, no âmbito da sua liberdade contratual alterarem tal valor.
-III- O Direito aplicável
10. O problema jurídico objeto do presente processo, prende-se, essencialmente, com o conteúdo do conceito de “antiguidade” constante do art. 2º, nº 4, al. b), do CIRS.
Concretamente, em saber se a contagem da antiguidade do R., para efeitos de incidência de IRS, no caso de indemnização por rescisão do contrato de trabalho, deve fazer-se, também tendo em conta o tempo de serviço prestado anteriormente pelo R. noutra instituição bancária (o Banco C…), ou, pelo contrário, apenas considerando o tempo de trabalho prestado na entidade com a qual rescindiu o contrato de trabalho que motivou o direito à compensação, ou seja, o Banco B… .
A norma objeto de discussão neste processo está contida no nº 4, al. b), do artigo 2º do Código do IRS, cujo teor é o seguinte:
“4 - Quando, por qualquer forma, cessem os contratos subjacentes às situações referidas
nas alíneas a), b) e c) do n.º 1, mas sem prejuízo do disposto na alínea d) do mesmo
número, quanto às prestações que continuem a ser devidas mesmo que o contrato de
trabalho não subsista, ou se verifique a cessação das funções de gestor público,
administrador ou gerente de pessoa colectiva, bem como de representante de
estabelecimento estável de entidade não residente, as importâncias auferidas, a qualquer
título, ficam sempre sujeitas a tributação:
a) (…)
b) Na parte que exceda o valor correspondente ao valor médio das remunerações
regulares com carácter de retribuição sujeitas a imposto, auferidas nos últimos 12
meses, multiplicado pelo número de anos ou fracção de antiguidade ou de exercício de
funções na entidade devedora, nos demais casos, salvo quando nos 24 meses seguintes
seja criado novo vínculo profissional ou empresarial, independentemente da sua natureza,
com a mesma entidade, caso em que as importâncias serão tributadas pela totalidade.”
Conforme se pode ler no acórdão do TCA-SUL de 12-03-2013, proferido no processo 5971/12[1]:
“Da exegese do artº.2, nº.4, do C.I.R.S., deve concluir-se que nos casos de recebimento de indemnizações por extinção do contrato de trabalho ou outros contratos que originem rendimentos tributáveis na categoria A do I.R.S., a lei consagra uma não sujeição a imposto (delimitação negativa da incidência objectiva do I.R.S. em sede de categoria A) ainda que com um limite máximo. O limite da não sujeição é o valor correspondente a uma vez e meia o valor médio das remunerações regulares com carácter de retribuição sujeitas a imposto, auferidas nos últimos doze meses, multiplicado pelo número de anos, ou fracção, de antiguidade ou de exercício de funções na entidade devedora (cfr. ac.T.C.A.Sul, 21/9/2010, proc.3748/10; Rui Duarte Morais, Sobre o I.R.S., 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.56).
Não tendo o legislador fiscal definido para este efeito, o conceito de antiguidade do trabalhador, temos de nos socorrer do conteúdo desse conceito tal como vigora no direito laboral, sabido que constitui doutrina corrente (actualmente consagrada no artº.11, da L.G.T.) que sempre que nas normas fiscais se empreguem termos próprios de outros ramos do direito, devem os mesmo ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo
se outro decorrer directamente da lei.
O direito laboral prevê um conceito amplo de antiguidade ao permitir que seja tomado em linha de conta o tempo de serviço e a categoria já alcançados noutras entidades patronais, por forma a que ele seja admitido sem prejuízo da antiguidade ali adquirida, pois que tal não é proibido nem pela lei (cfr.v.g.artºs.129, nº.1, al.j), e 396, do Código do Trabalho) nem pelos princípios da boa fé, sendo uma prática atendida nalguns Instrumentos de Regulamentação Colectiva de Trabalho e nos usos da profissão do trabalho e das empresas.
Pelo que, assenta a questão controvertida no problema de saber qual a antiguidade a ter em conta no caso de ter sido estabelecida entre a entidade patronal e o trabalhador uma antiguidade anterior à da admissão na empresa, cumprindo, antes de mais, esclarecer que, tal como parece unânime no direito laboral, são três as fontes que poderão
estabelecer essa antiguidade, a saber (tendo por pano de fundo o princípio da liberdade
contratual - cfr.artº.405, do C.Civil):
1-A Lei;
2-O Contrato Individual de Trabalho;
3-Os Instrumentos de Regulação Colectiva de Trabalho.
Não resultando da norma sob exame (cfr.artº.2, nº.4, do C.I.R.S.) que o conceito de antiguidade se refira restritamente ao tempo de serviço na entidade devedora da compensação pela cessação do contrato de trabalho, e nada justificando uma interpretação restritiva da norma de incidência, a noção mais lata de antiguidade oriunda do direito laboral deve ser aceite para o cálculo da importância sujeita a tributação em
sede de I.R.S. “
Este entendimento, que também aqui se perfilha pelas razões enunciadas no aresto, está em linha com jurisprudência pacífica.[2]
Assim, conclui-se falecer razão à Requerida quanto a esta questão.
11. A Requerida alega, ainda, que:
“(…) para que o aludido ACT possa ser aplicável, é necessário que o trabalhador em causa seja filiado num dos aludidos sindicatos e que a instituição de crédito seja subscritora do aludido Acordo”
E que,
“(…) no caso concreto, o R. não provou, nem tão pouco alegou, a sua filiação a qualquer dos mencionados sindicatos, o que, só por si, é motivo excludente da invocação da cláusula 17ª do ACT.”
Porém, também aqui não lhe assiste razão pois, como se pode ler no acórdão do STA de 02-03-2011, proc. 049/10[3], cuja doutrina também se sufraga:
“no contencioso de mera legalidade, como é o caso do processo de impugnação judicial, o tribunal tem de quedar-se pela formulação do juízo sobre a legalidade do acto sindicado tal como ele ocorreu, apreciando a respectiva legalidade em face da fundamentação contextual integrante do próprio acto. Porque o contribuinte tem de defender-se apenas dos pressupostos enunciados na fundamentação contextual do acto tributário e dos quais se distraíram os efeitos lesivo, o tribunal está impedido de valorar valoração de razões de facto e de direito que não constam dessa fundamentação, isto é, que não foram invocados para conduzir ao acto tributário impugnado, pois se assim não fosse o particular ver-se-ia surpreendido em juízo com a invocação de uma outra realidade e isso representaria uma contracção do seu direito de recurso contencioso face à impossibilidade de utilizar os meios conferidos por lei para sindicar os actos tributários e que são mais favoráveis que os meios conferidos por lei para impugnar decisões judiciais.”[4]
Ora, no caso dos autos, no RIT que fundamenta o ato tributário, a AT apenas alicerça a sua posição com base na interpretação que faz da norma que emerge da al. b) do nº 4, do art. 2º do CIRS, não invocando que o Requerente não estava abrangido pelo ACT.
Pelo contrário, do discurso fundamentador da AT emerge, inequivocamente, que a Requeria entendia que o Requerente estava abrangido pelo ACT, uma vez que é a própria que afirma no RIT o seguinte:
“foi o assunto reencaminhado à respetiva entidade competente o Órgão da administração tributária central -Direção dos Serviços de IRS, para superior apreciação e decisão” (…)”relacionado com a sua aplicação aos trabalhadores do setor bancário abrangidos pelo respetivo ACT, tendo sido proferido despacho de 21.03.2016, da Senhora Diretora Geral, foi sancionado o seguinte entendimento:
“As importâncias auferidas pelos trabalhadores do setor bancário, a titulo de indemnização pela cessação do contrato de trabalho, abrangidos pelo ACT(…).”
Face à fundamentação do ato não tinha, o Requerente, manifestamente, que alegar e provar que estava abrangido pelo ACT.
Assim sendo, o ato tributário é ilegal por violar o art. 4º, nº. 2, al. b) do CIRS, quanto ao conceito de antiguidade, nos termos acima expostos.
Do exposto, emergem as seguintes conclusões:
a) A antiguidade a considerar é de 16,82 anos e não 18 anos como resultou da declaração de rendimentos do contribuinte.
b) O ato tributário impugnado é ilegal por se basear na antiguidade de 15,35 anos e não na de 16,84 anos
c) A matéria tributável a acrescer relativamente à primeira liquidação deve basear-se, atenta a matéria provada, numa indemnização recebida de 172.611,6 € e não de 171.011,60 €.
12. Veio, ainda, a Requerente pedir a condenação da Requerida a restituir ao Requerente o imposto pago a mais respeitante à liquidação sub judice, acrescido de juros indemnizatórios.
No caso em apreço, é manifesto que, na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação, é procedente a pretensão do Requerente à restituição por força do arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para restabelecer a situação que existiria se a ilegalidade em causa não tivesse sido praticada.
No que concerne aos juros indemnizatórios, cabe ainda apreciar esta pretensão à luz do artigo 43º da Lei Geral Tributária.
Dispõe o nº 1 daquele artigo que “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.
Sufragamos o entendimento de Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa que sustentam que “O erro imputável aos serviços que operaram a liquidação fica demonstrado quando procederem a reclamação graciosa ou a impugnação judicial dessa mesma liquidação e o erro não for imputável ao contribuinte” (Lei Geral Tributária, encontros da escrita, 4ª Edição, 2012, pág. 342).
No caso “sub judice”, não sendo o erro que deu origem à liquidação imputável ao Requerente, não poderá deixar de proceder o pedido de condenação da Requerida quanto aos juros indemnizatórios.
Termos em que se julga parcialmente procedente o pedido de pronuncia arbitral, declarando-se a ilegalidade do ato tributário impugnado, devendo a Requerida liquidar a obrigação tributária com base na antiguidade de 16,84 anos e restituir ao Requerente o imposto pago a mais, acrescido de juros indemnizatórios.
Valor da ação: 7.981,64 € (sete mil novecentos e oitenta e um euros e sessenta e quatro cêntimos) nos termos do disposto no art. 306º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.
Custas, no valor de 612.00 € (seiscentos e doze euros), pelo Requerente na proporção de vinte e um por cento e pela Requerida no valor de setenta e nove por cento, nos termos do nº 4 do art. 22º do RJAT.
Notifique-se.
Lisboa, CAAD, 29.11.2017
O Árbitro
Marcolino Pisão Pedreiro
[2] cfr. ac.T.C.A.Sul, de 11/5/2004, proc.6002/01; ac. T.C.A.Sul, de 21/9/2010, proc. 3748/10 (consultáveis em “http://www.dgsi.pt”), decisão arbitral de 2.05.2016 proferida no proc. nº 616/2015-T, decisão arbitral, de 14.11.2016, proferida no proc. n.º: 230/2016-T e decisão arbitral , de 19.10.2017, proferida no proc. n.º: 126/2017-T (consultáveis em “https://caad.org.pt/”).
[4] Em sentido idêntico ac. do STA de 19-12-2007, proc. 0874/07, de 06-09-2011, proc. 0371/11, de 18-03-2015, proc. 01911/13 e ac. do TCA-Norte de 25-06-2010, proc. 00232/01.