Decisão Arbitral
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Pedro Miguel Bastos Rosado e Dr. Hugo Daniel Ferreira Leite Henriques (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 29-05-2017, acordam no seguinte:
1. Relatório
A… LDA, pessoa colectiva n.º…, com sede na Rua …, n.º … -… …-… Aveiro, (doravante designado como «Requerente»), veio, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária ou “RJAT”), apresentar pedido de pronúncia arbitral visando:
– Objecto imediato - Declaração de ilegalidade da decisão que decidiu improcedente o Recurso hierárquico interposto da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa deduzida com o pedido de anulação da Liquidação adicional de IRS (retenção na fonte) e dos juros compensatórios, efectuadas com referência a Novembro de 2011;
– Objecto mediato – Declaração da ilegalidade dos actos tributários de liquidação adicional do IRS - Retenções na Fonte - Capitais – Outros Rendimentos, efectuada pela AT com referência ao mês de Novembro de 2011, no montante de € 72.413,58 e dos juros compensatórios no montante de € 1.610,95, no total global de € 74.024,53 (setenta e quatro mil vinte e quatro euros e cinquenta e três cêntimos).
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 24-03-2017.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 11-05-2017 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 29-05-2017.
A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que defendeu que o pedido deve ser julgado improcedente.
Por despacho de 18-09-2017 foi dispensada reunião e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas.
As Partes apresentaram alegações.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos arts. 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.
As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Com base nos elementos que constam do processo e do processo administrativo junto aos autos, consideram-se provados os seguintes factos:
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A Requerente é uma sociedade do tipo por quotas constituída em 11-08-1992 para o exercício da actividade de "prestação de serviços médicos";
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O capital social do montante de cinco mil euros está distribuído pelos seguintes sócios e quotas:
– B…titular de uma quota do valor nominal de € 2.750,00 representativa de 55%;
– C…, esposa do primeiro, titular de uma quota do valor nominal de € 2.000,00 representativa de 40% e,
– D…titular de uma quota do valor nominal de € 250,00 representativa de 5%;
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Os sócios B… e C…, casados no regime da comunhão de bens, são detentores de 95% do capital social da Requerente;
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A gerência está, desde a constituição da sociedade, confiada ao sócio B…, licenciado em Medicina, médico especialista de medicina interna;
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O sócio gerente B… exerce, a tempo inteiro, a sua actividade de médico especialista, por conta do Hospital da Universidade de Coimbra;
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Para além desta actividade, presta serviços no âmbito da sua especialidade de médico, por conta da sociedade Requerente;
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A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma acção inspectiva externa à Requerente, que se iniciou em 10-11-2011 terminou em 15-06-2012 (página 4 do Relatório da Inspecção Tributária);
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Naquela acção inspectiva, foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:
Conclusões
Em função dos factos e do enquadramento já detalhado anteriormente, importa sintetizar os elementos que suportam a tributação proposta:
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O registo nas contas obedece a regras consagradas no POC e no SNC.
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A avaliação e controlo dos movimentos ocorridos nas contas, entre as quais a conta "Caixa", "Reservas" e "Resultados Transitados" obedecem a normas, princípios e boas práticas.
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Com base nas normas contabilísticas e declarativas, sem comprovação contrária, as declarações apresentadas pelo sujeito passiva consideram-se verdadeiras e de boa-fé.
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Sem sustentação, apenas para desvirtuar aqueles princípios se pode alegar que os factos tributários não são os que relevam da contabilidade, mas outros que se reportam a períodos caducados, portanto, não tributáveis.
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Não se estabeleceu qualquer relação dos rendimentos obtidos com mútuos, prestação de trabalho ou do exercício de cargo social.
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Os rendimentos pagos pelo sujeito passivo foram qualificados como distribuição de lucros ou adiantamento por conta de lucros, portanto, enquadrados na categoria E - rendimentos de capitais - artigos 5.º e 6º, ambos do Código do IRS, conforme resulta quer das alegações do próprio sujeito passivo, quer das liquidações da retenção na fonte por ele efetuadas, e que alegadamente diz ser devida, no decurso do procedimento inspetivo.
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No que respeita ao montante sujeito a tributação, foi fixado o valor correspondente à totalidade do saldo, que de acordo com a contabilidade deveria figurar, na conta "Caixa" e que no dia 10 de Novembro se constatou não existir.
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Quanto ao momento da tributação foi fixado o mês de Novembro de 2011 - em que ocorreu a avaliação do saldo da conta "Caixa" e se identificou a sua inexistência, com efeito considerou-se que a colocação à disposição ocorreu no dia 9 de Novembro - artigo 7.º do Código do IRS;
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Note-se que, em resultado da factualidade coligida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, não foram identificados indícios sérios, objetivos e sustentados que revelassem que a realidade tributável, leia-se, facto tributário, fosse outra.
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O sujeito passivo confrontado com os factos e o enquadramento associado, desde o momento em que se constatou a divergência no saldo da conta "Caixa", limitou-se a defender que a distribuição dos lucros ocorreu em períodos e montantes por ele escolhidos, sem contudo fazer qualquer prova que fragilizasse a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira. Referindo apenas em abono de uma menor tributação a que assim ficaria sujeito.
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O sujeito passivo apresentou como único elemento de prova, atas datadas de 31 de Março dos anos de 2007 a 2011, as quais referem a distribuição de resultados aos sócios e que contrariam a contabilidade por si apresentada, referentes aos vários anos de atividade.
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De referir que aquelas atas foram assinadas pelos sócios da empresa, o Dr. E… e a Dra. C…, que são casados, e o Dr. D…, irmão do Dr. E… .
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Também não ousou apresentar qualquer prova sustentável do momento em que ocorreu a colocação à disposição dos sócios da diferença apurada no saldo do "Caixa".
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Não foi apresentado qualquer elemento que permitisse sustentar a existência de fluxos financeiros entre a sociedade e os sócios que permitisse concluir que os montantes em "Caixa" foram sendo retiradas em momento anterior a 10 de Novembro de 2011.
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A falta de tal prova impede que sejam tomadas as diligências necessárias à verificação da sua validade e da eventual conclusão de que o momento da tributação não se reporta a 10 de Novembro de 2011, mas a qualquer outro momento anterior.
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A Autoridade Tributária e Aduaneira sustenta o facto tributário (natureza, montante e momento) nos elementos que de uma forma mais legal, lógica, óbvia, natural e comprovável resultam da contabilidade do sujeito passivo (a persistência no tempo de saldo do "Caixa").
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Face aos pressupostos factuais e legais identificados pela Autoridade Tributária e Aduaneira considera-se fundamentada, quanto à forma e quanto à substância, a qualificação jurídica da natureza, dos montantes e dos momentos, propostos para tributação, que assim se considera inequívoca.
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Note-se que, constatada a inexistência do saldo na conta "Caixa" e não havendo qualquer documento ou registo contabilístico dessa transferência como estava obrigado a fazer, não pode ser apurada qualquer outra conclusão que não seja a de que as retiradas ocorreram a título de distribuição e adiantamento de lucros. Tal decorre por verificação dos requisitos de aplicabilidade da presunção legal a que se refere o n.º 4 do artigo 6.º do Código do IRS.
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O que de facto se mostra relevante é que a diferença encontrada no saldo da conta "Caixa" ingressou no património dos sócios (o que aliás foi admitido quer pelas próprias alegações do sujeito passivo, quer pela liquidação, no decurso do procedimento inspetivo, da retenção na fonte). Por este facto a sua capacidade contributiva aumentou, embora não tivesse incidido o imposto devido sobre esse incremento óbvio e significativo de rendimento.
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Realce-se que, não poderia deixar de ser tributado aquele que, distribuindo lucros, não faz qualquer registo na contabilidade, quando quem distribui os mesmos lucros o regista devidamente em contas apropriadas na contabilidade é tributado. A permitir-se o primeiro resultado, seria possibilitar uma "menor" tributação para o incumprimento "maior" perante uma realidade tributária rigorosamente igual.
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Nem tão pouco aquele que dando conhecimento do facto tributário em 2012, no âmbito de um procedimento inspetivo, o tenta imputar a períodos anteriores, com o objetivo de obter vantagens de natureza fiscal.
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Ora, a verificar-se a distribuição de lucros nos anos de 2008 a 2010, deveria o sujeito passivo declarar a respetiva distribuição naqueles anos, e dessa forma dar conhecimento à Autoridade Tributária e Aduaneira.
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Se o sujeito passivo não declarou qualquer distribuição de resultados, nos anos em que afirma ter-se verificado, e não tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira outra forma de a conhecer, nem estando obrigada a conhecê-la, tem de considerar-se verificado o facto tributário, para efeitos de caducidade do direito de liquidação, no momento em que o sujeito passivo procede ao seu registo na contabilidade. É que só nessa data a Autoridade Tributária e Aduaneira deverá legalmente considerar-se conhecedora da distribuição de resultados e não no momento em que o sujeito passivo entende vir alegar, sem o comprovar.
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Apesar de não nos ter sido possível comprovar a entrada do dinheiro em contas dos sócios, isso também não se revela necessário. Aliás, os rendimentos colocados à disposição dos sócios não têm necessariamente que ser depositados em contas bancárias ou serem de conhecimento objetivo.
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Relevante é a afetação (com direito de propriedade plena) dos rendimentos aos sócios e não propriamente a constatação do destino que lhes foi dado. Aliás, a tributação é fundamentada com a colocação dos rendimentos à disposição dos sócios e não pela afetação que estes possam dar a tais rendimentos.
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Note-se também que a conclusão de que os rendimentos foram atribuídos sustenta-se no facto de que o dinheiro que existia no "Caixa" deixou de aí constar. Não havendo outra, justificação para o facto, apenas a apropriação por parte dos sócios é credível.
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Importa ainda notar que, mesmo podendo suceder que a distribuição do saldo da conta "Caixa" não foi proporcional às participações dos sócios, como estabelece por princípio o Código das Sociedades Comerciais, para efeitos de tributação, tal facto é irrelevante, uma vez que prevalece o montante global dos rendimentos colocados à disposição dos sócios, independentemente da sua repartição.
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Não podemos deixar de recordar a sustentação que é dada ao caso em apreço por força das decisões firmadas por diversos Acórdãos e de opiniões divulgadas pela própria Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas.
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Em suma, e recordando, a tributação que agora se propõe resulta diretamente do facto de se ter concluído, sustentadamente, que os sócios viram a sua capacidade contributiva aumentada por força da disponibilidade que lhes foi conferida com a atribuição dos valores que se encontravam na conta "Caixa".
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Qualquer outra alternativa de tributação careceria de sustentabilidade de argumentos que teriam de se revelar de linear evidência e consistência, sendo que a correspondente comprovação apenas poderia estar na posse e acessibilidade do sujeito passivo, o que nunca nos foi apresentado.
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Em resultado, com os factos descritos conclui-se que o sujeito passivo procurou fazer sair da sociedade a favor dos sócios, os seus resultados, evitando a tributação dos mesmos, quer ao nível da sociedade, quer do sócio.
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O montante em causa, porque resulta de ganhos da sociedade de que foram beneficiários os seus sócios; deve ser considerado como distribuição de lucros já obtidos e futuros e, por isso, constitui rendimento daqueles, sujeito a tributação em IRS, categoria E, nos termos do disposto no artigo 6.º, n.º 1, alínea h), do Código do IRS.
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Importa ainda salientar o facto de que o sujeito passivo apenas em 23 de Março de 2012, no decurso do procedimento inspetivo, procedeu à liquidação da retenção na fonte que alegadamente diz ser devida, quantificando e identificando os momentos em que a distribuição de resultados alegadamente ocorreu, sem comprovar aqueles factos.
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A contabilidade e todas as demonstrações financeiras apresentadas pelo sujeito passivo, não têm qualquer suporte nas atas agora exibidas.
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O que o sujeito passivo vem agora, entenda-se no decurso do procedimento de inspeção, apresentar as atas reportadas à data em que alegadamente diz ter sido deliberado proceder à distribuição de resultados, são os únicos documentos impossíveis de validar, e são precisamente os únicos que contrariam todos os outros elementos aprovados, apresentados e registados pelo sujeito passivo.
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Face ao exposto, considerando que a distribuição de resultados no montante de € 490.800,85 ocorreu em 10 de Novembro de 2011, não deverão ser aceites as liquidações efetuadas pelo sujeito passivo com efeitos a Dezembro/2008, Dezembro/2009 e Novembro/2010, nos montantes de € 11.566,60, € 10.102 80 e € 11.439,20 (a que correspondem as bases tributáveis de € 57.833,00. € 50.514,00 e € 53.205,58), mas uma única liquidação de retenção na fonte reportada a 9 de Novembro da'2011 no valor de global de €490.800,85 a que corresponde o imposto de €490.800,85 x 21,5% = € 105.522,18. Atendendo a que a taxa liberatória de retenção na fonte prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 71º de Código do IRS, em 2008 e 2009, era de 20%, a liquidação efetuada pelo sujeito passivo nos períodos de Dezembro/2008 e Dezembro/2009, no total de €21669,40, ao ser reportada a Novembro de 2011 deverá ser acrescida de € 1.625,21 [(€ 57.833,00 + € 50.514,00) x 1,5%].
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Assim, as correções a efetuar no período de Novembro de 2011 serão de €72.413,58 (€490.800,85 -€ 57.833,00 - € 50.514,00 - € 53.205,58) X 215% + [(€ 57.833,00 + € 50.514,00)x 1,5%]. Conclui-se pois que o próprio sujeito passivo admite a natureza daqueles rendimentos, a título de rendimentos de capitais resultantes da distribuição de lucros ou de adiantamento por conta de lucros a que se refere a alínea h) do n.º 2 do artigo 5.º do Código do IRS. O sujeito passivo, aparentemente com objetivos meramente fiscais, apenas discorda do momento em que ocorre a distribuição, sem que, em algum instante, sustente as suas alegações.
Posteriormente deverá ser elaborada informação dirigida à Divisão de Tributação da Direção de Finanças de Aveiro, no sentido de alterar a data que consta das guias submetidas pelo sujeito passivo, referentes às liquidações de retenção na fonte, dos períodos de Dezembro/2008, Dezembro/2009 e Novembro/2010, passando a constar em ambas o período de Novembro de 2011.
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Na sequência da acção inspectiva foi elaborada a liquidação de retenções na fonte n.º 2012…, do montante de € 72.413,58 e liquidação de juros compensatórios n.º 2012… no montante de € 1.610,95; (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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Em 27-12-2012, a Requerente apresentou reclamação graciosa da liquidação, que foi indeferida por despacho de 07-05-2013, com remissão para informações (relativas ao projecto de decisão e a decisão) cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:
2.2. Análise
2.2.1. Origem e Fundamentos das Correcções
A reclamante foi objecto de uma acção inspectiva externa, que teve como finalidade efectuar a contagem física dos valores em caixa da sociedade, procurando confrontar essa realidade física com a contabilística evidenciada na conta "11 - Caixa" - cf. relatório a fls. 29 a 48 dos autos. Em 9 de Novembro de 2011 o saldo do "Caixa" era de €492.030,85. Da contagem dos valores em Caixa, efectuada no dia 2012-11-10, foi declarado pelo s.p. que os únicos valores que a empresa tinha em caixa correspondiam às importâncias provenientes das consultas realizadas nos dias 7 e 8 de Novembro de 2012, as quais totalizam €1.230,00.
Com base na alínea h) do n.º 2 do artigo 5º do CIRS, a divergência do saldo do "Caixa" que totaliza €490.800,85 (492.030,85 - 1.230,00), foi considerado a título de distribuição de lucros (até à concorrência do saldo da conta 56 - Resultados Transitados, no montante de €475.692,59) e a título de adiantamento por conta de lucros, no montante remanescente até perfazer o saldo evidenciado na conta "Caixa" que se comprovou inexistente, isto é, €15.108,26 (€490.800,85 - €475.692,59).
Desta forma, o montante de €490.800,85 está sujeito a uma retenção na fonte à taxa de 21,5% que ascende a €105.522,18 (€490.800,85 x 21,5%), tal como previsto na al. c) do n.º 1 do art.º 71º do Código do IRS, que deverá ser entregue até ao dia 20 do mês seguinte àquele a que se reporta.
Ficou assim demonstrado que o montante de €105.522,18 se refere à retenção na fonte em falta por terem sido colocados à disposição rendimentos de capitais - lucros e adiantamento por conta de lucros, sem que a mesma tivesse sido efectuada.
2.2.2. Argumentos Invocados pelo Reclamante
O reclamante não concorda com tais correcções, alegando em síntese:
- A AT ficcionou que a distribuição dos lucros e adiantamentos por conta de lucros ocorreu na data da verificação fiscal do caixa;
- A AT apenas comprovou que não existiam na caixa / cofre da reclamante os valores que constavam do saldo de caixa;
- Impunha-se determinar o momento em que os valores que constavam do saldo de caixa escritural tinham sido colocados à disposição dos titulares do capital:
- A reclamante procedeu, no decurso do procedimento da IT, ao cálculo do imposto que relativamente aos lucros e adiantamentos por conta de lucros que colocou à disposição dos seus titulares no período de 2008 até 2010.
- Considerando que relativamente aos factos tributários ocorridos nos períodos anteriores a 2008, se verificou a caducidade, como excepção peremptória prevista no art. 45º da LGT.
- Propondo-se fazer prova do momento em que os rendimentos foram efectivamente colocados à disposição dos seus titulares através dos extractos das suas contas bancárias:
- Por outro lado, nos termos do art. 74º da LGT, cabia à AT a prova dos factos alegados, ou seja, a prova de que o facto tributário se deu na data da contagem física do caixa;
- O acto tributário é ilegal por violação do disposto no art. 74º da LGT:
- O acto tributário é também ilegal por violação do princípio da descoberta da verdade material consagrada entre outros no art.º 58º da LGT.
- Deve ser anulada a liquidação de juros compensatórios que a AT efectuou no montante de €1.610,95.
2.2.3. Análise da reclamação
A IT verificou haver uma divergência entre o valor apurado na contagem física do "Caixa" e o seu valor contabilístico, no seguinte montante:
• Saldo contabilístico da conta 11 - Caixa em 09 de Novembro de 2011 €492.030,85
• Saldo dos valores em "Caixa apurados com a contagem física €1.230,00
Confrontado o s. p. com os factos, este admitiu, que a divergência se ficava a dever a retiradas de valores em dinheiro a título de distribuição de lucros ou de adiantamentos por conta de lucros, as quais não foram relevadas contabilisticamente como tal.
A natureza do rendimento está assumida pelo s.p. reconhecendo tratar-se de rendimentos de capitais resultantes da distribuição de lucros ou de adiantamentos por conta de lucros a que se refere a al. h) do n.º 2 do artigo 5º do CIRS.
A questão que se coloca é determinar o momento em que ocorrem os factos tributários relacionados com a colocação dos lucros a disposição dos seus titulares.
Defende a reclamante ter havido uma distribuição sucessiva de resultados desde 2006, não tendo efectuado qualquer registo na contabilidade nem efectuado o pagamento do imposto, pelo que propõe a tributação dos resultados apurados nos últimos 4 anos, defendendo que o direito à liquidação dos resultados distribuídos anteriormente já caducou.
A I.T. considera que o facto tributário ocorreu no dia em que foi levada a cabo a verificação do saldo de Caixa, no âmbito da acção inspectiva, portanto, 10 de Novembro de 2011.
O n.º 1 do art.º 75º da LGT dispõe que, "Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial".
Nenhum indício foi observado pela IT que a levasse a colocar em causa a contabilidade que lhes foi apresentada, pelo que consideraram como verdadeiros os valores e os resultados apresentados pelas demonstrações financeiras dos anos analisados.
A análise detalhada da contabilidade a períodos anteriores à verificação de que o saldo do "Caixa" tinha sido distribuído, não permitiu à IT reunir indícios de que essa não existência do saldo de "Caixa" se pudesse reportar a algum dos anos agora analisados, isto é, 2008, 2009 ou 2010 (como pretende o s.p. ao proceder à entrega de guias de retenção na fonte de IRS para os anos referidos).
Não existe qualquer evidência objectiva e sustentável de que o saldo já não se encontrava na empresa em períodos anteriores à verificação do saldo de caixa, por parte da IT.
Conclui-se assim estar verificado o primado da verdade e da boa fé das demonstrações financeiras a que se refere o preceituado no art.º 75º da LGT.
Não assiste razão ao reclamante quando afirma que a AT não desenvolveu esforços para comprovar os factos tributários e o momento em que ocorreram.
A AT, através da acção inspectiva, analisou e extraiu todos os elementos possíveis que a contabilidade da reclamante fornecia, não se vislumbrando que outros elementos poderia ter recolhido.
Durante a acção inspectiva o s.p. limitou-se a defender que a distribuição dos lucros ocorreu em períodos e montantes por ele escolhidos, sem contudo fazer qualquer prova que fragilizasse a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Vem agora em sede de reclamação graciosa tentar fazer prova do momento em que os rendimentos, foram efectivamente colocados à disposição dos seus titulares através de alguns extractos bancários, extractos estes que não fazem referência aos titulares das contas.
De qualquer modo, mesmo tratando-se de contas dos sócios, as mesmas não fazem prova de que as verbas depositadas e que se encontram destacadas, são provenientes de distribuição de resultados. Temos assim, que determinadas verbas foram depositadas naquelas contas, em determinadas datas, não sabendo, no entanto, qual a origem das mesmas.
Juros compensatórios
Vem a reclamante alegar que desconhece os motivos porque foram liquidados os juros compensatórios, o mesmo é dizer que as liquidações não estão fundamentadas nos termos legalmente exigidos.
A notificação respeitante a juros compensatórios, ora contestada, refere a natureza dos juros exigidos, devidos a Retenção na Fonte de IRS, do ano de 2011 e que os juras são contados desde o prazo das retenções respectivas, até ao suprimento, correcção ou detecção da falta que motivou o retardamento da liquidação, motivo por que a notificação revela-se em conformidade com as exigências plasmadas nas normas em vigor à data do facto tributário, tornando cognoscível à reclamante a razão de ser da liquidação.
Alega ainda a reclamante que "nem do relatório nem daquela "Demonstração" a reclamante não consegue descortinar como foi determinada a "data do fim".
De acordo com o estipulado no n.º 4 do artigo 35º da LGT, "Para efeitos do n.º anterior, em caso de inspecção, a falta considera-se suprida ou corrigida a partir do auto de noticia".
A "data do fim" que consta na nota de liquidação – 2012-07-10 – é a data em que foi levantado para auto de notícia.
Quanto à alegação de que "a AT não indica algum facto que demonstre a existência de culpa da reclamante", somos a informar o seguinte:
Em face do preceituado nos artigos 35º da LGT e 91º do Código do IRS, constituem requisitos essenciais para a liquidação de juros compensatórios a existência de uma divida de IRS, de um atraso na efectivação da liquidação do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter e da imputabilidade do atraso à actuação culposa do contribuinte.
A reclamante procedeu à distribuição de lucros e adiantamentos por conta de lucros a que se refere a al. h) do n.º 2 do artigo 5º do Código do IRS e que estão sujeitos a retenção na fonte, à taxa liberatória de 21,5% e que deveria ser entregue nos cofres do Estado até ao dia 20 do mês seguinte a que se reporta.
Sobre o caso em apreço, importa referir o Acórdão do STA de 30-11-2011 (processo n." 0619/11) segundo o qual:
- Também no que se refere à culpa, aceitamos que a fundamentação se baste com a descrição da conduta quando, como no caso, esta assuma a natureza de ilícito. Na verdade, a doutrina e a jurisprudência têm vindo a defender a tese de que quando uma determinada conduta constitui um facto qualificado por lei como ilícito deve fazer decorrer dessa conduta - por ilação lógica - a existência de culpa (não porque a culpa se presuma, mas por ser algo que, em regra, se liga, ao carácter ilícito-típico do facto praticado) e que, por essa via, se deve partir do pressuposto de que existe culpa sempre que a actuação do contribuinte integra a hipótese de qualquer infracção tributária".
(...)
2. Proposta de decisão
No exercício do direito de audição o reclamante vem aduzir os mesmos fundamentos e factos já referenciados na sua petição, os quais já foram devidamente e claramente objecto de apreciação e explanação no Projecto de Decisão.
Continua s reclamante a alegar ter havido uma distribuição sucessiva de resultados desde 2006, através de "entregas" que mensalmente o sócio deposita na sua conta bancária. Para prova destas "entregas" a reclamante junta cópia dos extractos bancários da conta pessoal do sócio gerente.
Como já foi referido no Projecto de Decisão, os referidos extractos não fazem prova de que as verbas depositadas naquelas contas são provenientes de distribuição de lucros efectuada pela reclamante, uma vez que se desconhece a origem das mesmas.
Note-se que, e tal como referido a pág. 18 do Relatório da Inspecção, no caso em apreço não se consumou o lançamento em c/c específicas dos sócios mas sim o facto de as importâncias escrituradas no "caixa" na altura da contagem física do mesmo não estarem lá.
Em função do procedimento adoptado, o facto tributário considera-se ocorrido no dia em que foi levada a cabo a verificação do saldo de "Caixa" no âmbito da acção inspectiva, portanto, 10 de Novembro de 2011.
A presunção ínsita no n.º 5 do artigo 6º do CIRS pode ser ilidida mas apenas quanto à natureza dos rendimentos da categoria E - distribuição de lucros ou adiantamentos dos lucros e não quanto ao momento da sua obtenção.
-
Em 13-06-2013, a Requerente interpôs recurso hierárquico da decisão da reclamação graciosa;
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O recurso hierárquico foi indeferido por despacho que manifesta concordância com uma informação cujo teor se dá como reproduzido em que se refere, além do mais o seguinte:
2. Informação
A recorrente no presente Recurso Hierárquico não apresenta qualquer elemento novo capaz de inverter a decisão proferida no processo de reclamação graciosa, não tendo apresentado novos fundamentos capazes de alterar as conclusões retiradas. As questões em causa já foram analisadas na informação prestada aquando da apreciação da reclamação graciosa, a qual corroboramos.
No entanto, e sem prescindir, será de referir o seguinte:
1- Pretende o sujeito passivo a anulação do despacho recorrido com fundamento em ilegalidade por erro sobre os pressupostos de facto e de direito e a inexistência de facto tributário.
2- Alega a recorrente que os excedentes líquidos de tesouraria foram, ao longo dos anos, distribuídos mensalmente aos sócios, a título de participação nos lucros da sociedade, que deles passaram a dispor para a sua economia pessoal.
3- Estes factos nunca foram relevados na contabilidade, o que originou saldos anormalmente elevados de caixa. "Saldos que se conclui de forma imediata e objectiva serem anormalmente elevados se forem considerados os dados de experiência comum e as boas práticas aplicáveis à movimentação da conta caixa" (sublinhado nosso).
4- A recorrente alega que a existência escritural de um saldo anormal de Caixa constitui um facto notório de que falta registar movimentos de saldo de caixa, e que sendo um facto notório não carece de ser provado.
5- Segundo Dr. Joel Timóteo Ramos Ferreira, Juiz de Circulo, em Revista "O Advogado", II Série, Junho de 2006:
"1.1. Há factos que falam por si. Além de dispensarem qualquer prova, também dispensam a sua alegação. As partes nem sequer carecem de fazer referência aos mesmos, porque podem ser considerados pelo Juiz para a decisão de uma determinada causa. A estes factos chama a lei de processo, factos notórios (art.º 514.º. nº 1 do Código de Processo Civil).
1.2. Na definição mais clássica, facto notório é aquele que é do conhecimento geral. Como refere Calamandrei (Per La Defínizione Del Fatio Notório, 1925, 1º, pg. 309), trata-se do conhecimento comum das pessoas que pertencem a uma determinada esfera social, sendo esta constituída por um conjunto de pessoas que, por diversos motivos - de tempo, religião, de profissão, de cultura, etc.-, têm interesses comuns. Daí que, a doutrina tem classificado os factos notórios em duas espécies:
- Os acontecimentos de que a generalidade das pessoas tomou conhecimento (v.g., um terramoto, uma guerra, um ciclone, uma inundação, um incêndio, uma revolução política, etc.);
- Os factos que adquiriram o carácter de notórios por via indirecta, ou seja, através de raciocínios desenvolvidos a partir de factos do conhecimento comum.
1.3. Nesta senda, Alberto dos Reis (CPC Anotado, III, p. 261) classifica como "factos notórios apenas aqueles que sejam do conhecimento geral, ou seja, os que sejam do conhecimento da massa dos cidadãos portugueses regularmente informados, isto é, com acesso aos meios normais de informação". Consequentemente, não se podem considerar como notórios os factos que sejam do conhecimento de um sector restrito de pessoas, com informação muito acima da média ou de um sector muito específico (ex. problemas de natureza económica, ocorrências ou práticas de funcionais de uma profissão).
6- Ora, não é do conhecimento da generalidade dos cidadãos normalmente informados que quando a contabilidade de uma empresa apresenta um saldo anormal de Caixa, tal facto significa que falta registar movimentos de saída de caixa - tratam-se de factos que serão do conhecimento de um sector muito especifico, relacionados com práticas funcionais de urna profissão - "Saldos que se conclui de forma imediata e objectiva (...) se forem considerados (...) as boas práticas aplicáveis a movimentação da conta caixa". A maioria dos portugueses não tem conhecimentos técnicos de contabilidade, nem sabe o que é a conta Caixa.
7- Não obstante, a definição de "Facto notório" encontra-se estabelecido no Código de Processo Civil, só produzindo efeitos nessa esfera. Este conceito não é aplicável aos factos tributários nem existe na legislação fiscal.
8- A primeira condição para a relevância da contabilidade é que ela exista e esteja em condições de justificar os movimentos que reflecte e que afectam o património e os resultados da empresa.
9- Em termos materiais, a contabilidade engloba não só os livros e registos - alguns dos quais são obrigatórios e devem obedecer a determinados formalismos - mas também os documentos justificativos.
10- O valor probatório de uma contabilidade assenta essencialmente nos respectivos documentos de justificativos, implicando o cumprimento da regra imposta pelo n.º 1 e pela alínea a) do n.º 2 do artigo 123º do CIRC, segundo a qual "Todos os lançamentos devem ser apoiados em documentos justificativos, datados e susceptíveis de serem apresentados sempre que necessário".
11- Preconiza ainda o n.º 3 do artigo 17º do CIRC que, a contabilidade deve estar organizada de acordo com a normalização contabilística e reflectir todas as operações realizadas pelo sujeito passivo.
12- Ora, na situação em concreto, o procedimento inspectivo teve por base a análise retrospectiva dos saldos evidenciados na conta Caixa, tendo a data da verificação do saldo de caixa ocorrido em 9 de Novembro de 2011.
13- No momento em que foi iniciado o procedimento inspectivo, a contabilidade encontrava-se registada até ao mês de Junho de 2011.
14- Deste modo, foram analisados os movimentos ocorridos posteriormente (quer de entrada, quer de saída no "Caixa"), para que se pudesse apurar o saldo de caixa que se encontrava na empresa à data de 09 de Novembro.
15- Assim, desta forma, reuniram-se os elementos necessários, em função dos quais resultou uma diferença entre o valor apurado na contagem física do "Caixa" e o seu valor contabilístico, conforme ficou demonstrado:
- Saldo contabilístico da conta de 11 - caixa em 09 de Novembro de 2011......€ 492.030,85
- Saldo dos valores em "Caixa" apurados com a contagem física..................... € 1.230.00
- Diferença entre o saldo contabilístico e o saldo efetivo............................. € 490.800,85
16- Em resultado deste procedimento constatou-se que em 09 de Novembro de 2011 o saldo do caixa era de € 492.030,85,
17- "O sujeito passivo não apresentou uma justificação objetiva para aquela divergência no "Caixa". No entanto, confrontado com os factos admitiu, implicitamente, que a divergência se ficava a dever a retiradas em dinheiro a título de distribuição de lucros ou de adiantamento por conta de lucros, as quais não foram relevadas contabilisticamente como tal. Na verdade, não obstante não haver relevação contabilística do facto, pela análise circunstancial efetuada, conclui-se que os sócios passaram a ter a titularidade dos montantes que antes se encontravam no "Caixa" da sociedade. Foi ressalvado o facto de a empresa nunca ter efetuado empréstimos aos sócios-gerentes.
Foi ainda esclarecido que os valores recebidos são depositados na conta da empresa e em contas pessoais" - Relatório da Inspecção
18- A questão de fundo subjacente à reclamação, e que se encontra aqui em discussão, não é a natureza dos rendimentos como rendimentos da Categoria E - distribuição de lucros e adiantamento por conta de lucros - mas sim o momento em que foram tributados.
19- Defende a recorrente ter havido uma distribuição sucessiva de resultados desde 2006, não tendo efectuado qualquer registo na contabilidade nem efectuado o pagamento do imposto, pelo que propõe a tributação dos resultado distribuídos nos últimos quatro anos, defendendo que o direito à liquidação dos resultados distribuídos anteriormente.
20- E, para provar as "entregas" que mensalmente os sócios depositavam nas suas contas bancárias ao longo dos anos, a recorrente juntou extractos bancários das contas pessoais dos sócios e disponibilizou-se para apresentar cópias dos cheques aí depositados, reiterando, assim, os argumentos invocados e já amplamente analisados em sede de procedimento de reclamação graciosa.
21- A Inspecção Tributária, quanto ao momento da distribuição dos lucros aos sócios, concluiu, e bem, que os valores foram movimentados no ano de 2011.
22- De facto, em todos os anos objecto de análise, o caixa evidenciava saldos bastante elevados (conforme demonstrado no Relatório da Inspecção), pelo que a divergência apurada – que traduz a inexistência dos valores em caixa – leva a concluir que, os saldos que foram sendo declarados e acumulados ao longo dos anos, foram movimentados inequivocamente em Novembro de 2011.
23- Possuindo a sociedade recorrente contabilidade organizada, esta persistiu na contabilização de saldos de caixa elevados ao longo dos anos.
24- E a verificação de que o saldo de caixa já não existia na empresa apenas ocorreu no dia em que foi levada a cabo a verificação do saldo de Caixa no âmbito da acção inspectiva, ou seja, em 10 de Novembro de 2011, data em que se considera ocorrido o facto tributário. Até esta data, estão reunidos todos os pressupostos para considerar a contabilidade como verdadeira e de boa-fé, ou seja, que o saldo contabilístico existente em 9 de Novembro de 2011 correspondia ao saldo real na mesma data.
4. Parecer
Deste modo, e considerando que os fundamentos do presente Recurso Hierárquico em nada alteram o sentido da decisão proferida, somos de parecer que não há razões para revogar o acto recorrido, devendo os autos ser remetidos Superiormente.
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A documentação bancária que consta dos documentos n.ºs 5 a 7 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos, reporta-se a conta em nome de B… e C… (documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
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A Requerente registava os valores gerados pela sua actividade na conta de “Caixa”, com que pagava os seus encargos, aumentando e diminuindo o saldo de “Caixa” em conformidade;
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Nos finais dos exercícios de 2007, 2008, 2009, 2010 e 2011, nas demonstrações financeiras apresentadas pela Requerente foram referidos saldos de caixa de € 316.985,01, de € 374.819,05, de € 425.331.80, de € 488.225,14 e de € 511.288,08, respectivamente (documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e páginas 9 e 14 do Relatório da Inspecção Tributária);
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Em actas de reuniões da assembleia geral da Requerente datadas de 31 de Março dos anos de 2007 a 2011, refere-se a distribuição de resultados aos sócios da Requerente relativos aos anos de 2006 a 2010, que não foram reflectidas na contabilidade (páginas 17 e 22 e 23 do Relatório da Inspecção Tributária);
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No ponto 3 da acta datada de 31-03-2007, refere-se a distribuição aos sócios, na proporção das suas quotas, do resultado líquido apurado no exercício de 2006, bem como da totalidade dos resultados transitados, não distribuídos por deliberações anteriores da assembleia geral (página 22 do Relatório da Inspecção Tributária);
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As actas n.ºs 18, 19, 20 e 21 das reuniões da assembleia geral da Requerente referem a aprovação de contas dos anos de 2007, 2008, 2009 e 2010, decisões no sentido de proceder à distribuição aos sócios do resultado líquido apurado no exercício respectivo (página 23 do Relatório da Inspecção Tributária);
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As importâncias que não se encontram no “Caixa” foram afectas aos sócios a título de lucros ou de adiantamento por conta de lucros não foram registados na contabilidade (página 25 do Relatório da Inspecção Tributária);
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Não foram efectuados lançamentos nas contas dos sócios relativos às quantias referidas;
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Os valores distribuídos aos sócios não foram depositados na conta bancária da Requerente, sendo entregues aos sócios em dinheiro e cheques que depositaram na referida conta do F…;
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Em Março de 2012, no decurso do procedimento inspectivo, a Requerente procedeu à liquidação da retenção na fonte, através da submissão de três declarações de retenções na fonte com o código 108 — IRS - Capitais - Outros rendimentos, bem como ao respectivo pagamento, nos períodos e montantes a seguir discriminados:
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(página 21 do Relatório da Inspecção Tributária);
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Em 20-03-2017, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pela Requerente com o pedido de pronúncia arbitral e no processo administrativo.
Os documentos bancários apresentados pela Requerente como documentos n.ºs 4 a 7 juntos com o pedido de pronúncia arbitral permitem concluir que nos anos de 2005 a 2007 foram realizados movimentos bancários numa conta do F… em nome dos sócios B… e C…, designadamente depósitos de valores e em numerário.
Não se provou que a quantia de € 490.800,85 correspondente à diferença entre o saldo contabilístico registado na conta 11 – caixa em 09-11-2011 e o saldo efectivo encontrado na acção inspectiva, tenha sido colocada à disposição dos sócios da Requerente em 2011.
A documentação bancária apresentada pela Requerente relativa a movimentos bancários na conta dos sócios B… e C… no F…, conjugada com as deliberações da assembleia geral da Requerente realizadas nos anos de 2007 a 2010 em que se faz referência a distribuição aos sócios dos resultados líquidos dos anos anteriores e a falta da importância no “Caixa” que se constatou existir em 2011, levam a concluir que terá ocorrido essa distribuição em anos anteriores a 2011, sem que essa distribuição tivesse sido registada na contabilidade.
3. Matéria de direito
3.1. Vício de erro sobre os pressupostos de facto
No artigo 5.º, n.ºs 1 e 2, alínea h) do CIRS consideram-se rendimentos de capitais «os lucros das entidades sujeitas a IRC colocados à disposição dos respectivos associados ou titulares, incluindo adiantamentos por conta de lucros, com exclusão daqueles a que se refere o artigo 20.º».
No n.º 1 e na subalínea 2) da alínea a) do n.º 3 do artigo 7.º do mesmo Código resulta que os rendimentos referidos fixam sujeitos a tributação desde o momento em que são colocados à disposição do seu titular.
Por isso, é neste momento que se considera verificado o facto tributário e não quando a Autoridade Tributária e Aduaneira tenha ou devesse ter conhecimento de que ele ocorreu.
De resto, a Autoridade Tributária e Aduaneira dispõe de meios inspectivos para apurar os factos tributários mesmo quando não são cumpridas obrigações declarativas, pelo que tem o dever de diligenciar para ao averiguar a tempo de efectuar liquidações relativas a factos não declarados, se for caso disso, sendo para esses casos de deficiência de cumprimento de obrigações declarativas que se pode justificar a admissibilidade de liquidação no prazo de 4 anos (ou mais) e não nos prazos normais previstos para os casos em que as liquidações são baseadas nas declarações. Aliás, no caso em apreço, através das IES era constatável a existência de um saldo de caixa anormalmente elevado para o volume de negócios da Requerente, o que poderia ter justificado uma acção inspectiva muito antes do ano de 2011. Na verdade, «na origem do procedimento está o facto de se ter identificado um saldo de caixa em anos sucessivos com valores elevados» (como se refere na página 5 do Relatório da Inspecção Tributária), pelo que já antes a Autoridade Tributária e Aduaneira poderia ter constatado essa anormalidade e ter procedido a inspecção externa ou, pelo menos, ter pedido esclarecimentos à Requerente.
A presunção de veracidade das declarações e contabilidade da Requerente, estabelecida no artigo 75.º, n.º 1, da LGT é afastada, nos termos da alínea a) do seu n.º 2, quando resulta com evidência da prova produzida que a escrita não está devidamente organizada, designadamente com todos os lançamentos que deveriam ter sido efectuados e respectivos documentos justificativos, como exige o artigo 123.º, n.ºs 1 e 2, alínea o CIRC.
De qualquer forma, no caso em apreço, resulta prova produzida que as receitas geradas pela actividade da Requerente eram afectas aos seus encargos e, na parte restante, colocadas à disposição dos sócios, inclusivamente em anos anteriores a 2008, como se vê pelos extractos bancários juntos com o pedido de pronúncia arbitral.
Por isso, relativamente aos rendimentos que foram colocados à disposição dos sócios em anos anteriores a 2011, era nos anos em que essa colocação ocorreu e os rendimentos ficaram sujeitos a tributação, tendo a Requerente obrigação de efectuar retenção na fonte, a título definitivo, nos termos do artigo 71.º, n.º 1, alínea c), do CIRS.
Assim, desde logo, conclui-se que a que impugnada enferma de vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto, ao entender que a colocação das quantias correspondentes ao saldo de caixa verificado em 2011, apenas ocorreu em 10-11-2011.
O erro sobre os pressupostos de facto constitui vício de violação de lei, que justifica a anulação da liquidação, de harmonia com o preceituado no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
3.2. Caducidade do direito de liquidação
No decurso da acção inspectiva a Requerente procedeu à liquidação da retenção na fonte, através da submissão de três declarações de retenções na fonte com o código 108 — IRS - Capitais - Outros rendimentos, bem como ao respectivo pagamento, relativamente aos valores tributáveis de € 57.833,00 (referente a 2008), € 50.514,00 (referente a 2009) e € 53.205,58 (referente a 2010), correspondentes aos aumentos do saldo de caixa de cada um daqueles anos (página 22 do Relatório da Inspecção Tributária).
Tendo-se concluído que os lucros ou adiantamento por conta de lucros eram colocados à disposição dos sócios nos anos em que eram gerados, os rendimentos referentes a anos anteriores a 2008, traduzidos no saldo de caixa de € 316.985,01 que se verificava no final do ano de 2007, terão sido obtidos em anos anteriores a 2008, sendo nesse sentido que aponta a prova produzida.
A Requerente coloca a questão de saber se, relativamente a esses rendimentos a que corresponde o saldo de caixa de € 316.985,01, gerados antes de 2008, se verificava ou não a caducidade do direito de liquidação, no ano de 2012, em que a liquidação impugnada foi efectuada.
O prazo geral de caducidade do direito de liquidação é de 4 anos, nos termos do artigo 45.º, n.º 1, da LGT.
Este prazo conta-se, nos impostos sobre o rendimento, quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou o facto tributário (artigo 45.º, n.º 4, da LGT).
À face desta norma especial sobre o início do prazo de caducidade quando a tributação deva ser efectuada através retenção na fonte a título definitivo, não pode aceitar-se, por falta de suporte legal, a tese defendida pela Autoridade Tributária e Aduaneira de que esse prazo só se inicia com o conhecimento pela Autoridade Tributária e Aduaneira da ocorrência do facto tributário.
Aliás, essa tese nem sequer em geral é defensável em sede de impostos sobre o rendimento, pois o início do prazo de caducidade verifica-se no início do ano civil subsequente àquele em que o facto tributário ocorreu, apesar de as obrigações de apresentação das declarações destinadas a fornecer à Autoridade Tributária e Aduaneira o conhecimento desses factos só deverem ser cumpridas posteriormente (artigos 120º do CIRC e 60.º do CIRS).
O prazo de caducidade suspende-se durante a acção inspectiva externa, desde que a sua duração não exceda 6 meses (artigo 46.º, n.º 1, da LGT), mas, no caso em apreço, a acção inspectiva durou mais de 6 meses (entre 10-11-2011 e 15-06-2012), pelo que não há que considerar qualquer período de suspensão da caducidade do direito de liquidação.
Assim, relativamente aos rendimentos subjacentes ao saldo de caixa que se verificava no final de 2007, o prazo de caducidade do direito de liquidação iniciou-se, pelo menos, em 01-01-2008 (em datas anteriores quanto a rendimentos de anos anteriores a 2007), pelo que a caducidade do direito de liquidação ocorreu, pelo menos, no final do 4.º ano posterior ao ano em que se verificou a colocação à disposição, isto é, em 31-12-2011.
Por isso, em 2012, quando foi efectuada a liquidação, já tinha transcorrido integralmente o prazo de caducidade do direito de liquidação.
A não efectivação da liquidação dentro do prazo de caducidade constitui vício de violação de lei que justifica a sua anulação, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
4. Decisão
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
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Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
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Anular a liquidação de retenções na fonte n.º 2012…, do montante de € 72.413,58 e liquidação de juros compensatórios n.º 2012…, no montante de € 1.610,95.
5. Valor do processo
De harmonia com o disposto no art. 305.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 74.024,53.
6. Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.448,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 14-11-2017
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Pedro Miguel Bastos Rosado)
(Hugo Daniel Ferreira Leite Henriques)