Acórdão Arbitral
Os árbitros Fernanda Maçãs (árbitro presidente), Mariana Gouveia de Oliveira e Filomena Salgado Oliveira (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 01-07-2016, acordam no seguinte:
-
Relatório
A…, LDA., pessoa colectiva n.º…, com sede na…, n.º…, …-… Porto, (doravante simplesmente "A…" ou "Requerente"), integrada no serviço de Finanças do Porto - …, vem, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e dos artigos 10.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, em conjugação com a alínea a) do artigo 99.º e a alínea d) do n.º 1 do artigo 102.º, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário — ex vi a alínea a) do n.º 1 do artigo 100.º do sobredito Decreto-Lei —, apresentar pedido de constituição de tribunal arbitral colectivo e de pronúncia arbitral, sendo Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi apresentado em 16-11-2016 pela Requerente nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária), não tendo a Requerente procedido à nomeação de árbitro.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 02-12-2016.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.° 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou os árbitros do tribunal arbitral colectivo que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 17-01-2016, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 01-02-2017.
O pedido de pronúncia arbitral é apresentado, tendo em vista, a título principal, a revogação do despacho proferido em 29 de Agosto de 2016 pela Divisão da Justiça Administrativa e Contenciosa da Direcção de Finanças do Porto, que indeferiu a reclamação interposta pela Requerente, e consequentemente a anulação das liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) de 2011, 2012, 2013 e do primeiro trimestre de 2014 no montante de IVA liquidado de Euros 114.869,19 e de juros no valor de Euros 12.945,92, montantes que ascendem a um valor global de Euros 127.815,11 que a seguir se discriminam:
Ano
|
Natureza
|
N.º
|
Período
|
Valor
|
Data
|
2011
|
IVA
|
…
|
1103T
|
6.463,20 €
|
31.10.2015
|
Juros Compensatórios
|
…
|
1103T
|
1.073,07 €
|
31.10.2015
|
IVA
|
…
|
1106T
|
8.414,17 €
|
31.10.2015
|
Juros Compensatórios
|
…
|
1106T
|
1.312,15 €
|
31.10.2015
|
IVA
|
…
|
1106T
|
3.938,16 €
|
31.10.2015
|
Juros Compensatórios
|
…
|
1109T
|
574,43 €
|
31.10.2015
|
IVA
|
2015…
|
1112T
|
6.433,60 €
|
15.10.2015
|
Juros Compensatórios
|
2015…
|
1112T
|
874,26 €
|
15.10.2015
|
2012
|
IVA
|
2015…
|
1203T
|
6.288,41 €
|
15.10.2015
|
Juros Compensatórios
|
2015…
|
1203T
|
792,51 €
|
15.10.2015
|
IVA
|
2015…
|
1206T
|
14.343,96 €
|
15.10.2015
|
Juros Compensatórios
|
2015…
|
1206T
|
1.025,55 €
|
15.10.2015
|
IVA
|
2015…
|
1209T
|
56.047,23 €
|
15.10.2015
|
Juros Compensatórios
|
2015…
|
1209T
|
5.933,32 €
|
15.10.2015
|
IVA
|
2015…
|
1212T
|
8.340,33 €
|
15.10.2015
|
|
Juros Compensatórios
|
2015…
|
1212T
|
798,84 €
|
15.10.2015
|
2013
|
IVA
|
2015…
|
1303T
|
4.114,30 €
|
31.10.2015
|
Juros Compensatórios
|
2015…
|
1303T
|
528,16 €
|
31.10.2015
|
2014
|
IVA
|
20157…
|
1403T
|
485,83 €
|
15.10.2015
|
Juros Compensatórios
|
2015…
|
1403T
|
33,63 €
|
15.10.2016
|
Total
|
IVA
|
114.869,19 €
|
|
Juros Compensatórios
|
12.945,92 €
|
|
|
Total
|
|
|
127.815,11 €
|
|
A Requerente fundamenta o pedido nos seguintes termos:
-
A requerente é uma sociedade por quotas que se dedica à prestação de cuidados médicos na especialidade Medicina Dentária (CAE 86230 — Actividades de Medicina dentária e odontologia), tendo iniciado a sua actividade em 2010.
-
Na declaração de início de actividade, a Reclamante enquadrou-se no Regime Normal Trimestral, não constando da mesma, de forma expressa, a prévia renúncia à isenção de IVA.
-
Considera a Requerente que “… se atentarmos no quadro 10 da Declaração de alterações de actividade em vigor à data destes factos, designadamente nas suas instruções de preenchimento, e no manual de preenchimento da AT — que se encontra disponível no portal das finanças em http: //info.portaldasfinancas.gov.pt/NR/rdonlyres/982B3F68-04BD-4750-9384-9C45A6A0186B /0/MANUAL D ALTER.ACOES PF.pdf - constatamos que a indicação do regime de IVA como "normal trimestral" reconduz-se a um enquadramento que, no caso de uma sociedade cujo regime-regra em IVA é da isenção sem direito à dedução, exprime uma opção pela renúncia à isenção do IVA.
-
Afirmando ainda que “De resto, não se vislumbrando na dita Declaração um qualquer outro quadro destinado especificamente à opção pela renúncia à isenção, esta constatação torna-se absolutamente evidente.”
-
Continuando, “De facto, a reclamante sempre teve como actividade, conforme resulta da Fundamentação, o exercício da medicina, em particular da medicina dentária, correspondendo-lhe o Código de Actividade (CAE) 86230 - Actividades de medicina dentária e odontologia — o qual compreende as actividades desenvolvidas por médicos dentistas, por odontologistas e dentistas pediátricos, efectuadas em consultórios, clínicas e similares, sem internamento.
Actividade essa que, pela sua própria natureza, é isenta ao abrigo do n° 2 do artigo 9.° do Código do IVA.
-
A Requerente afirma que como “não pretendia que a isenção que impendia sobre a sua actividade lhe cerceasse a faculdade de deduzir o IVA suportado a montante, a requerente declarou, sem embargo daquele CAE, que iria realizar somente "operações que conferem o direito à dedução.
-
Com base nessa informação, enquadrou-a o Serviço de Finanças competente no Regime normal trimestral (por contraposição com o "regime de isenção" que resultaria da actividade efectivamente exercida pela requerente e do CAE correspondente).
-
Na sequência de uma inspecção externa levada a cabo pela AT na sequência de um pedido de reembolso de IVA apresentado pela Requerente foi a mesma notificada da conclusão de procedimento de inspecção um relativo ao IVA dos anos de 2011 e 2012 que originaram as liquidações de IVA e respectivos juros compensatórios ora em crise.
-
Convergiu a AT na decisão de realização de correcções ao IVA deduzido nos anos em análise (cf. artigo 1° supra) em virtude de estar a requerente enquadrada no regime normal do IVA - quando, alegadamente, deveria estar inserida no regime de isenção — sem prévia renúncia à isenção, única via possível para alcançar aquela dedução.
-
O que em concreto veio arguir a AT foi que o contribuinte não se encontrava numa situação de isenção abrangida pelo n.° 2 do artigo 9.° do Código do IVA, mas sim pelo n.° 1 do mesmo preceito, o qual não admite qualquer renúncia à isenção.
-
Ou seja: o sujeito passivo nunca poderia exercer aquela faculdade por, nas palavras da AT, a mesma apenas permitir a renúncia à isenção quando esta se funda no n° 2 do artigo 9º, sendo que a actividade da requerente apenas se subsumiria na previsão do n.º 1 do mesmo preceito.
-
Ora, não podendo a Requerente concordar com o teor de tal fundamentação nem, consequentemente, com as correlativas liquidações adicionais, por entender que as mesmas são ilegais e injustas, padecendo de erro no preenchimento dos pressupostos tanto de facto como de direito da invocada realidade tributável, vem agora enunciar os evidentes e insofismáveis fundamentos que suportam a sua pretensão.”.
A Requerente termina requerendo a anulação das liquidações impugnadas e a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira ao reembolso das quantias indevidamente pagas, acrescidas dos competentes juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da Lei Geral Tributária.
A AT juntou processo instrutor e respondeu suscitando a excepção dilatória de incompetência do tribunal arbitral por entender estar em causa o reconhecimento do direito de renúncia à isenção prevista nos termos da alínea 2) do artigo 9º, conforme disposto no artigo 12.º, n.º 1, alínea b), ambos do Código do IVA.
Mais, requereu que, mesmo que assim não se entenda, e considerando que não existe na jurisprudência comunitária qualquer decisão susceptível de aplicação directa aos presentes autos, seja ordenado o reenvio do processo ao TJUE, ao abrigo do disposto no artigo 267.º do TFUE, para efeitos de definir o recorte da renúncia ao referido regime de isenção.
Quanto ao mérito, a Requerida argumenta, entre o mais, que estando a actividade de Medicina Dentária e Odontologia, enquadrada no art. 9.º, n.º1, não subsiste a possibilidade de renúncia ao abrigo da alínea b) do n.º1 do art. 12.º do Código do IVA, pelo facto de esta apenas ser aplicável a sujeitos passivos isentos nos termos do n.º 2 do art. 9.º do IVA.
Por outro lado, argumenta a AT que “a opção pela tributação das operações realizada pela Requerente só seria admissível caso as mesmas fossem enquadradas no âmbito do n.º 2 do art. 9.º do CIVA e a opção fosse previamente comunicada, mediante a entrega da declaração de início de actividade ou de alterações, consoante os casos, produzindo efeitos, sempre a partir da data da sua apresentação” considerando estar em causa “uma condição formal enunciada pelo legislador como requisito essencial/ fundamental para que o sujeito passivo possa optar pela tributação de determinadas operações”, sustentando tal conclusão no Acórdão do TCA Sul de 21 de Maio de 2013, proferido no processo n.º 05235/11.
A Requerente apresentou resposta por escrito à excepção e ao pedido de reenvio prejudicial.
Por despacho de 14 de Março de 2017 foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e decidido que o processo prosseguisse com alegações. Mais, foi estabelecido como prazo limite para a prolação do acórdão a data de 17 de Julho de 2017, que foi prorrogado, por despacho de 12 de Julho de 2017, fixando-se como data limite para a prolação do acórdão do dia 17 de Setembro de 2017.
As partes declararam prescindir de apresentar alegações.
-
Saneamento
2.1. As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artº. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
A A…, Lda., pessoa colectiva n.º…, foi incorporada na B…, S.A., contribuinte N.º…, com sede na …, n°…, …, Salas … a … Porto. Os efeitos da fusão por incorporação reportam-se à data 22.12.2016, como consta da Ap. …/2016… da certidão do registo comercial. Por força da mencionada operação de fusão por incorporação, a B… passou a assumir a qualidade de Requerente no presente processo, uma vez que ficou titular de todos os direitos e deveres da sociedade incorporada, designadamente perante a Autoridade Tributária e Aduaneira.
No que se refere ao valor da causa, observa-se que no pedido inicial a Requerente indica o montante de Euros 127.781,48. Como salienta a própria entidade Requerida, certamente por lapso, o valor indicado não corresponde ao valor total das liquidações adicionais de IVA objecto de impugnação e identificadas no ponto I do Relatório. Esse valor corresponde ao montante de Euros 127.815,11.
Fixa-se, assim, oficiosamente, o valor do processo em Euros 127.815,11, em conformidade com o disposto no art. 97.º-A do CPPT, aplicável ex vi art. 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT e art. 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processo de Arbitragem Tributária (RCPAT).
O processo não enferma de nulidades.
2.2.Como vimos, a AT suscitou a excepção de incompetência material por estar em causa o reconhecimento de um direito em matéria tributária, que cumpre apreciar prioritariamente.
A excepção da incompetência é de conhecimento prioritário, como resulta do disposto no artigo 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.
A AT defende a incompetência do Tribunal Arbitral para apreciar o pedido de pronúncia arbitral uma vez que a questão central a apreciar, passa pelo reconhecimento do direito de renúncia à isenção por parte da Requerente. Defendendo a sua tese no facto de, nos presentes autos, os actos de liquidação adicional de IVA efectuados deverão ser qualificados como actos consequentes tendo em conta o conceito, ainda que restrito, adoptado quer pela doutrina, quer pela jurisprudência. Para o efeito, considera que só devem ser qualificados como actos consequentes os que foram produzidos, ou dotados de certo conteúdo, em razão da existência de actos anteriores supostamente válidos que lhes servem de causa, base ou pressuposto.
Considerando assim, no presente caso, os actos de liquidação adicional de IVA, pendentes de apreciação nesta instância arbitral, estão numa relação de dependência do reconhecimento ou não do direito, por parte da Requerente, de renúncia da isenção de IVA, nos termos do artigo 12.º, nº 1, alínea b), do Código do IVA.
A Requerente apresenta Requerimento de Resposta à AT, onde rebate os argumentos apresentados pela AT assente na jurisprudência já firmada pelo próprio Tribunal Arbitral.
Efectivamente, esta mesma questão de excepção, já foi apreciada em processos anteriores, nomeadamente nos Acórdãos proferidos no Processos n.º 168/2005-T, n.º 782/2015-T e no n.º 789/2015-T.
É jurisprudência firmada nos referidos Acórdãos que a Portaria n.º 112-A/2011, relativamente aos actos enquadráveis indicados no artigo 2.º, apenas afastou do âmbito da vinculação da Administração Tributária, em matéria não aduaneira, as pretensões relativas a actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidas de recurso à via administrativa e as pretensões relativas a actos de determinação da matéria colectável e actos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indirectos, incluindo a decisão do procedimento de revisão.
Uma vez que não se está perante qualquer das situações em que a Portaria n.º 112-A/2011 afasta a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, pelo que a competência tem de ser aferida apenas à face do RJAT.
A competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é definida, em primeira linha, pelo artigo 2.º, n.º 1, do RJAT, que estabelece o seguinte:
1 - A competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões:
a) A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;
b) A declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais; Em segunda linha, a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é limitada pela vinculação da Autoridade Tributária e Aduaneira que, nos termos do artigo 4.º, n.º 1, do RJAT, veio a ser definida pela Portaria n.º 112-A/2011, de 12 de Março, que estabelece o seguinte, no que aqui interessa:
Os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto -Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com excepção das seguintes:
a) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
b) Pretensões relativas a actos de determinação da matéria colectável e actos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indirectos, incluindo a decisão do procedimento de revisão; c) Pretensões relativas a direitos aduaneiros sobre a importação e demais impostos indirectos que incidam sobre mercadorias sujeitas a direitos de importação; e d) Pretensões relativas à classificação pautal, origem e valor aduaneiro das mercadorias e a contingentes pautais, ou cuja resolução dependa de análise laboratorial ou de diligências a efectuar por outro Estado membro no âmbito da cooperação administrativa em matéria aduaneira.
Por outro lado, refere também o Acórdão relativo ao processo n.º 186/2015-T:
“Como se vê pelo artigo 2.º do RJAT, a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD foi definida pelo RJAT apenas tendo em atenção o tipo de actos que são objecto das pretensões dos contribuintes e não em função do tipo de questões que é necessário apreciar para decidir se os actos são legais ou ilegais.
Não há, designadamente, qualquer proibição de apreciação de matérias relativas à verificação dos pressupostos do direito de renúncia à isenção de IVA ou quaisquer outras questões de legalidade relativas aos actos dos tipos referidos no artigo 2.º do RJAT. Uma liquidação de imposto que parta da desconsideração de uma isenção ou de uma renúncia a isenção não deixa de ser um acto tributário de liquidação. E a pretensão de apreciação da legalidade ou da ilegalidade dessa desconsideração subjacente a um acto de liquidação não deixa, portanto, de ser a apreciação de uma pretensão relativa à declaração de ilegalidade de actos de liquidação, em que se materializa essa desconsideração.
Assim, no processo arbitral, à semelhança do que sucede no processo de impugnação judicial, pode, em regra, ser imputada aos actos de liquidação qualquer ilegalidade, como decorre do artigo 99.º do CPPT, subsidiariamente aplicável. Só não será assim nos casos em que a lei preveja a impugnabilidade autónoma de actos administrativos que são pressuposto dos actos de liquidação, sendo só nessa medida que fica afastada a apreciação da legalidade dos actos de liquidação em todas as vertentes.
Mas, para haver essa impugnabilidade autónoma, é necessário que haja algum acto administrativo em matéria tributária, pois a impugnabilidade reporta-se a actos e não a posições jurídicas assumidas explícita ou implicitamente como pressupostos dos actos de liquidação, mas não materializadas em actos tributários autónomos.
Os actos consequentes, de que fala a Autoridade Tributária e Aduaneira, são consequentes de outros actos tributários ou administrativos anteriores e, no caso em apreço, não há notícia de que tenha sido praticado qualquer acto administrativo apreciando se a Requerente tem ou não direito a renunciar à isenção de IVA.
Isto é, para haver limitação à impugnabilidade dos actos de liquidação impugnados, teria de ser praticado, anteriormente, algum acto administrativo que fosse pressuposto destes actos de liquidação, o que não sucedeu no caso em apreço.
Por isso, sendo os actos de liquidação lesivos dos interesses da Requerente e sendo os únicos actos praticado pela Administração Tributária sobre a situação neles apreciada, tem de ser assegurada a sua impugnabilidade contenciosa com fundamento em qualquer ilegalidade, como decorre do princípio da tutela judicial efectiva, consagrado nos artigos 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, da CRP.
Por outro lado, quando não há qualquer acto autonomamente impugnável anterior a um acto de liquidação versando sobre os seus pressupostos, pode «ser invocada na impugnação da decisão final qualquer ilegalidade anteriormente cometida» (parte final do artigo 54.º do CPPT), pelo que todas as questões relativas à legalidade dos actos de liquidação podem ser apreciadas nos tribunais tributários em processo de impugnação judicial, como decorre da alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º e do artigo 99.º do mesmo Código.
Na verdade, nos tribunais tributários, mesmo quando, tendo sido praticados actos de liquidação, se estiver perante uma situação em que poderia ser mais útil para o contribuinte o uso da acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo (por possibilitar, para além da apreciação da legalidade de actos a definição para o futuro dos direitos do contribuinte), o uso da acção em vez da impugnação judicial é uma mera faculdade, como decorre do próprio texto do artigo 145.º, n.º 3, do CPPT, ao dizer que «as acções apenas podem ser propostas sempre que esse meio processual for o mais adequado para assegurar uma tutela plena, eficaz e efectiva do direito ou interesse legalmente protegido».
Isto é, o que se prevê nesta norma é limitação ao uso da acção e não limitação ao uso do processo de impugnação judicial.
Com efeito, é manifesto que o processo de impugnação judicial inclui a possibilidade de reconhecimento de direitos em matéria tributária, como o são o direito à anulação ou declaração de nulidade de liquidações, o direito a juros indemnizatórios e o direito a indemnização por garantia indevida, pelo que o facto de estar em causa o reconhecimento de direitos não é obstáculo à utilização do processo de impugnação udicial.
Assim, como refere a Autoridade Tributária e Aduaneira, tendo o processo arbitral tributário sido criado como alternativa ao processo de impugnação judicial, é de concluir que não há obstáculo a que a legalidade dos actos de liquidação em causa neste processo seja apreciada por este Tribunal Arbitral, pois nos tribunais tributários essa legalidade poderia ser apreciada em processo de impugnação judicial.
Por isso, quanto ao pedido de anulação dos actos de liquidação, improcede a excepção da incompetência material suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira com fundamento em estar em causa o reconhecimento de um direito em matéria tributária.”
Não se vendo qualquer motivo para divergir do doutamente expendido nos acórdãos que acabamos de citar, com os quais concordamos integralmente, quer na fundamentação, quer na conclusão, improcede a excepção da incompetência material suscitada pela Requerida.
-
Matéria de Facto
3.1.Factos provados
-
A Requerente foi constituída em Junho de 2010, sob a forma jurídica de sociedade por quotas;
-
A Requerente desenvolve a actividade de prestação de cuidados médicos na especialidade Medicina Dentária (CAE 86230 — Actividades de Medicina dentária e odontologia;
-
A ora Requerente teve como actividade, à data dos factos em análise, a prestação de serviços de Medicina Dentária e Odontologia em estabelecimento aberto ao público, incluindo realização de consultas médicas e todo um conjunto de tratamento e/ou actos cirúrgicos no âmbito da medicina dentária, bem como exames complementares de diagnóstico, tais como radiografias;
-
Na declaração de início de actividade, em sede de IVA, e desde o início da sua actividade, em 1 de Junho de 2010 a Requerente ficou enquadrada no Regime Normal de tributação, de periodicidade Trimestral;
-
O enquadramento fiscal da Requerente em sede de IVA resultou do Declaração de Início de Actividade que foi efectuada por declaração verbal, denominado “front-office”, no Serviço de Finanças do Porto-…, em 14 de Junho de 2010;
-
Na referida declaração verbal foi devidamente assinalada a actividade da Requerente;
-
Na Declaração de início de actividade não foi expressamente assinalada, quanto ao tipo de operações, a isenção prevista no artigo 9.º do Código do IVA, nem a renúncia à isenção prevista no artigo 12.º do mesmo Código;
-
Decorrente do enquadramento assinalado na Declaração de Início de Actividade a Requerente liquidou IVA em todas as operações efectuadas no âmbito das actividades desenvolvidas, tendo igualmente procedido à dedução do imposto suportado nos termos previstos para os sujeitos passivos enquadrados do regime normal trimestral;
-
A inspecção tributária externa à Requerente, de âmbito geral, incidiu sobre os exercícios de 2011 e de 2012 e teve por base a Ordem de Serviço n.º OI2014…, emitida em 12 de Março de 2014 pela Direcção de Finanças do Porto. Por despacho de 24 de Março de 2015 do Chefe da … Divisão da Direcção de Finanças do Porto o prazo do procedimento inspectivo aos exercícios de 2011 e 2012 foi prorrogado por mais 3 meses;
-
As liquidações adicionais de IVA efectuadas pela AT tiveram origem na correcção do IVA deduzido nos períodos de 2011 e 2012, abrangendo igualmente o exercício de 2013 e o 1.º trimestre de 2014, acrescida dos respectivos juros compensatórios;
-
A Requerente optou por proceder ao pagamento integral das liquidações adicionais de IVA e respectivos juros dentro do período voluntário de pagamento.
3.2. Factos não provados
Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.
3.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto
Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral, no processo administrativo, e a posição assumida pelas partes e livremente apreciada pelo Tribunal.
-
Quanto ao Mérito
-
Formalização da renúncia à isenção de IVA
Na declaração de início de actividade, em sede de IVA, e desde o início da sua actividade, em 1 de Junho de 2010 a Requerente ficou enquadrada no Regime Normal de tributação, de periodicidade trimestral.
O enquadramento fiscal da Requerente em sede de IVA resultou do Declaração de Início de Actividade que foi efectuada, a 14 de Junho de 2010, por declaração verbal, denominado “front-office”, no Serviço de Finanças do Porto-…, em 14 de Junho de 2010.
Na referida declaração verbal foi devidamente assinalada a actividade da Requerente à data de início de actividade (1 de Junho de 2010), tendo a Requerente ficado enquadrada no Regime Normal Trimestral, pressupondo tal enquadramento a “prévia” renúncia à isenção do IVA do artigo 9.º do Código do IVA (CIVA), que elenca as isenções nas operações.
Adicionalmente, constata-se da Declaração de Início de Actividade manuscrita (que se encontra junto ao processo e à Impressão da “Confirmação dos Dados de Actividade”), e na qual está inserida a vinheta do TOC, está assinalado, no Quadro 13 relativo ao “IVA – Opção por Regime de Tributação”, o exercício do direito à opção pelo Regime Normal de IVA nos termos do artigo 12.º do CIVA (i.e. renúncia à isenção), apresentando-se no Quadro 11 relativo ao “Tipo de Operações” assinalado o campo A – Transmissões de bens e/ou prestações de serviços que conferem direito à dedução.
A Requerente indicou no referido Serviço de Finanças que desenvolve a actividade de prestação de cuidados médicos na especialidade Medicina Dentária (CAE 86230 — Actividades de Medicina dentária e odontologia).
Na redacção em vigor ao momento dos factos, o artigo 35.º do Código do IVA referia o seguinte:
Artigo 35.º
Apresentação das declarações
1 - As declarações referidas nos artigos 31.º a 33.º são enviadas por transmissão electrónica de dados ou apresentadas em qualquer serviço de finanças ou noutro local legalmente autorizado, por declaração verbal efectuada pelo sujeito passivo, de todos os elementos necessários ao registo e início da actividade, à alteração dos dados constantes daquele registo e à cessação da actividade, sendo estes imediatamente introduzidos no sistema informático e confirmados pelo declarante, após a sua impressão em documento tipificado.
2 - O documento comprovativo referente às declarações mencionadas no número anterior, apresentadas nos serviços de finanças ou noutros locais autorizados, é entregue ao sujeito passivo, após autenticação pelo funcionário receptor e aposição da vinheta do técnico oficial de contas, se for o caso, que assume a responsabilidade fiscal do sujeito passivo a que respeitam as declarações.
3 - As declarações são informadas no prazo de 30 dias pela Direcção-Geral dos Impostos, que se pronuncia sobre os elementos declarados e quaisquer outros com interesse para a apreciação da situação.
4 - No caso de a Direcção-Geral dos Impostos discordar dos elementos declarados, fixa os que entender adequados, disso notificando o sujeito passivo.
A primeira questão a analisar prende-se com o enquadramento inicial efectuado na Declaração de Início de Actividade. De acordo com a informação constante dos autos, a Requerente terá usado de um dos procedimentos previstos no art.º 35.º do Código do IVA “por declaração verbal efectuada pelo sujeito passivo, de todos os elementos necessários ao registo e início da actividade”.
Nos termos daquele procedimento os dados fornecidos pelo sujeito passivo, ora Requerente, seriam “… imediatamente introduzidos no sistema informático e confirmados pelo declarante, após a sua impressão em documento tipificado”.
Ora, de acordo com os factos provados documentalmente no presente processo, a Requerente foi enquadrada pelo Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia … como exercendo como única actividade “Actividades de Medicina”, sob o CAE 86230.
Paralelamente, o mesmo Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia … terá enquadrado a Requerente no regime Normal Trimestral, i.e. como sujeito passivo integralmente sujeito e não isento de IVA, o que aliás é suportado ainda pela informação constante do quadro referente ao tipo de operações, onde se assinala que apenas desenvolve operações que conferem o direito à dedução.
Haja esta declaração sido efetuada com base na declaração verbal da Requerida ou não - dado que se parece encontrar em contradição com a declaração manuscrita junta aos autos - é notória a contradição dos seus próprios termos – por um lado, a única actividade exercida (CAE 86230) encontra-se isenta de IVA sem direito à dedução - seja ao abrigo do n.º 1 ou do n.º 2 do Artigo 9.º - e por outro, o contribuinte é enquadrado no regime normal, com integral direito à dedução do IVA suportado.
Ora, é muito importante e extremamente relevante que, no momento da apresentação da Declaração de Início de Actividade, feita por declaração verbal (front-office), não subsistam quaisquer dúvidas na esfera do sujeito passivo relativamente ao seu enquadramento fiscal, e das consequências decorrentes desse mesmo enquadramento, nomeadamente em sede de IVA, atento aliás o princípio da colaboração consagrado no artigo 59.º da LGT.
Por outro lado, salienta-se que o Serviços de Finanças de Vila Nova de Gaia … tinha na sua posse todos os elementos relevantes para um correcto enquadramento da actividade da Requerente, assim como da vontade desta optar pelo Regime Normal em sede de IVA, nada tendo questionado a esse respeito.
Mais, nos termos dos números 3.º e 4.º do art.º 35.º na redacção em vigor ao momento, e também actualmente, a AT tinha de, no prazo de 30 dias, informar as declarações pronunciando-se “sobre os elementos declarados e quaisquer outros com interesse para a apreciação da situação.” e, no caso de “… discordar dos elementos declarados” fixar “os que entender adequados, disso notificando o sujeito passivo.”.
Ora, a AT nada fez a este respeito, o que nos leva a concluir que aceitou o enquadramento da Requerente no Regime Normal Trimestral, entendendo o mesmo como uma manifestação da opção de renúncia à isenção de IVA, nos termos do art.º 12-º do respectivo Código, a qual estava assinalada no Quadro 13 da Declaração manuscrita.
Se não deixa de ser verdade que a renúncia à isenção está dependente do cumprimento de um requisito formal de exercício efectivo dessa opção e, mesmo admitindo que a formalização dessa opção não seguiu todos os formalismos habitualmente previstos, não é menos certo que a Requerente manifestou a sua vontade de aplicação do Regime Normal Trimestral, o que implica tacitamente a opção pela renúncia à isenção na sua declaração de início de actividade
Sobre este aspecto, é importante recordar que o artigo 12.º do CIVA dispõe apenas, no seu número 2, que a opção pela tributação deve ser exercida na declaração de início de actividade. Ora, parece resultar inequivocamente do enquadramento do sujeito passivo constante da referida declaração de início de actividade que este procurou renunciar à isenção tendo-se enquadrado no regime normal de tributação, declarando praticar operações sujeitas que conferem direito à dedução. O mero facto de não se ter assinalado correctamente a quadrícula adequada no formulário em causa não pode sobrepor-se ao enquadramento substancial declarado pela Requerente e aceite pela AT – i.e. o da sujeição integral a IVA.
Este entendimento é ainda mais pertinente quando é certo que foi a AT que preencheu a declaração de início de actividade no sistema informático, não tendo assinalado a opção pelo regime de tributação, indicada pela Requerente na declaração manuscrita, não obstante ter aceite a declaração de exercício de uma actividade médica como uma prestação de serviços que confere direito à dedução de IVA. Ora, este procedimento da AT é susceptível de pôr em causa o dever de colaboração consagrado no artigo 59.º da LGT, nos termos do qual a AT deve prestar a assistência necessária ao cumprimento dos deveres acessórios dos contribuintes.
Por outro lado, caso a AT entendesse que a opção pelo regime normal de tributação de IVA não estava em consonância com os requisitos formais impostos, teria obrigatoriamente de, no prazo de 30 dias, nos termos do n.º 3 do art.º 35.º do Código do IVA, de se pronunciar sobre os elementos declarados, assim como sobre quaisquer outros com interesse para a apreciação da situação.
Para o efeito, teria ainda de, nos termos do n.º 4 do mesmo artigo, notificar a Requerente, caso discordasse dos elementos declarados, fixando os que entendesse serem adequados.
Ora, na ausência de tal procedimento, só pode concluir-se que os Serviços de Finanças não detectaram qualquer irregularidade no enquadramento da actividade da Requerente no Regime Normal de IVA.
Nesses termos, a Requerente passou a liquidar IVA em todas as operações efectuadas no âmbito da actividade desenvolvida – prestação de serviços de Medicina Dentária e Odontologia em estabelecimento aberto ao público, que se consubstancia na realização de consultas médicas e todo um conjunto de tratamento e/ou actos cirúrgicos no âmbito da medicina dentária, bem como exames complementares de diagnóstico – em total consonância com o enquadramento constante da Declaração de Início de Actividade.
Do mesmo modo, a Requerente passou a efectuar a dedução do imposto que suportou de acordo com o enquadramento daí resultante.
Atendendo aos princípios da prevalência da substância sobre a forma, da proporcionalidade, segurança jurídica e justiça material, entende este Tribunal que não poderá a AT prevalecer-se de um mero erro de preenchimento de um formulário – frequentemente de difícil compreensão – e no qual participou, para reenquadrar o sujeito passivo em sede de IVA, arrecadando não só o IVA cobrado aos clientes da Requerente como ainda o IVA suportado por esta no exercício da sua actividade.
Assim, entendemos que não assiste razão à AT neste ponto, estando em causa um mero erro no preenchimento da declaração de início de actividade e não a omissão do exercício da opção pela tributação nos termos do artigo 12.º do CIVA.
No mesmo sentido se pronunciou o Acórdão do CAAD dado no Processo n.º 782/2015-T, de 30 de Setembro de 2016.
Sobre esta matéria cabe ainda referir que a situação descrita nos autos não é equivalente àquela em análise no Acórdão do TCA Sul de 21 de Maio de 2013 citado pela AT.
Com efeito, no Acórdão do TCA Sul de 21 de Maio de 2013, proferido no processo n.º 05235/11, a impugnante exercia um conjunto de actividades diversas, algumas sujeitas e não isentas de IVA e outras isentas sem direito à dedução. Conforme relatado no referido aresto, o sujeito passivo em causa havia assinalado os campos 1 e 2 do quadro 11 da sua declaração de início de actividade, correspondentes a “transmissões de bens e ou prestações de serviços que conferem o direito à dedução” e “transmissões de bens e ou prestações de serviços isentas que não conferem o direito à dedução”.
Ora, este enquadramento como sujeito passivo misto (e bem assim, os demais factos descritos que ao presente processo não importam) terão levado o douto Tribunal a considerar que impugnante em causa havia “assumido comportamento inadequado incapaz de possibilitar a afirmação, conscienciosa de ter agido como “sujeito passivo integral”, durante todo o tempo compreendido entre janeiro de 2000 e junho de 2006, pelo que, desde logo, não se mostra preenchido o pressuposto sustentador da questão pretendida submeter à jurisdição do TJUE”.
Importa, assim, analisar a questão central em crise,
-
Enquadramento da actividade da Requerente e possibilidade de renúncia à isenção de IVA
A questão a decidir foi suscitada nos processos n.º 168/2015-T, de 18 de Setembro de 2015, n.º 303/2015-T, de 18 de Novembro de 2015, n.º 315/2015-T, de 27 de Novembro de 2015, n.º 788/2015-T, de 24 de Maio de 2016, n.º 782/2015-T, de 30 de Setembro de 2016 e n.º 789/2015-T, de 19 de Julho de 2016, tendo os tribunais arbitrais, constituídos junto do CAAD, julgado matéria em tudo idêntica à dos presentes autos, cujas conclusões este Tribunal, por com elas concordar, segue de perto.
Cabe assim a este Tribunal, com competência para o efeito, verificar a legalidade das liquidações adicionais de IVA e respectivos juros compensatórios, ora impugnadas.
Para o efeito importa decidir sobre o enquadramento da actividade da Requerente, em sede de IVA, e, desse modo, decidir se a mesma é susceptível de ficar abrangida pelo disposto no n.º 1 ou n.º 2 do artigo 9.º do Código do IVA e, consequentemente, se passível de renúncia é isenção do imposto.
Deste modo, interessa atentar, para o que aqui interessa, ao disposto nos artigos 9.º e 12.º do Código do IVA.
Em matéria de isenção, na matéria em apreciação o artigo 9.º do Código do IVA refere o seguinte:
Artigo 9.º
Isenções nas operações internas
Estão isentas do imposto:
1) As prestações de serviços efectuadas no exercício das profissões de médico, odontologista, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas;
2) As prestações de serviços médicos e sanitários e as operações com elas estreitamente conexas efectuadas por estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares;
(…)
Por outro lado, o art.º 12.º do Código do IVA a respeito da renúncia à isenção de IVA nos serviços de saúde, refere que:
Artigo 12.º
Renúncia à isenção
1 - Podem renunciar à isenção, optando pela aplicação do imposto às suas operações:
a)(…);
b) Os estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares, não pertencentes a pessoas colectivas de direito público ou a instituições privadas integradas no sistema nacional de saúde, que efectuem prestações de serviços médicos e sanitários e operações com elas estreitamente conexas;
(…)
2 - O direito de opção é exercido mediante a entrega, em qualquer serviço de finanças ou noutro local legalmente autorizado, da declaração de início ou de alterações, consoante os casos, produzindo efeitos a partir da data da sua apresentação.
Estas isenções estão conexionadas com o artigo 132.º da Directiva n.º 2006/112/CE, de 28-11-2006, que estabelece nomeadamente o seguinte:
-
Os Estados–Membros isentam as seguintes operações:
(...)
b) A hospitalização e a assistência médica, e bem assim as operações com elas estreitamente relacionadas, asseguradas por organismos de direito público ou, em condições sociais análogas às que vigoram para estes últimos, por estabelecimentos hospitalares, centros de assistência médica e de diagnóstico e outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos;
c) As prestações de serviços de assistência efectuadas no âmbito do exercício de profissões médicas e paramédicas, tal como definidas pelo Estado–Membro em causa;
(…)
Nos termos da referida alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º do CIVA, é permitida a renúncia à isenção de IVA a “Os estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares, não pertencentes a pessoas colectivas de direito público ou a instituições privadas integradas no sistema nacional de saúde, que efectuem prestações de serviços médicos e sanitários e operações com elas estreitamente conexas”, prevendo o n.º 2 do art.º 9.º do Código do IVA a isenção das “prestações de serviços médicos e sanitários e as operações com elas estreitamente conexas efectuadas por estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares”.
Deste modo, a renúncia é isenção de IVA só é possível caso a actividade desenvolvida pela Requerente seja a de “prestações de serviços médicos e sanitários e as operações com elas estreitamente conexas efectuadas por estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares” e desde que a Requerente se enquadre no conceito de “estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares, não pertencentes a pessoas colectivas de direito público ou a instituições privadas integradas no sistema nacional de saúde, que efectuem prestações de serviços médicos e sanitários e operações com elas estreitamente conexas.”.
No entendimento da AT os campos de aplicação das alíneas b) e c) do artigo 132.º da Directiva n.º 2006/112/CE correspondem aos campos de aplicação dos n.ºs 2) e 1), respectivamente, do artigo 9.º do CIVA, e com esse pressuposto, na esteira de jurisprudência do TJUE sobre o campo de aplicação da norma das alíneas b) e c) do artigo 13.º- A, n.º 1, da Sexta Directiva [literalmente correspondentes às alíneas b) e c) do artigo 132.º da Directiva n.º 2006/112/CE].
Mais, entendendo que:
“Estas alíneas consagram a totalidade das isenções das prestações médicas em sentido estrito, isentando, tal como se diz no Acórdão proferido no processo C-141/00 de 10 de Setembro de 2002 (Acórdão Kügler), “A alínea b) desta disposição (…) todas as prestações efectuadas no meio hospitalar, ao passo que a alínea c) se destina a isentar as prestações médicas fornecidas fora desse âmbito, tanto no domicílio do paciente, ou em qualquer outro lugar”.
Deste modo, conclui a AT que sendo a actividade da Requerente “… de medicina dentária/odontologia, como a mesma é exercida pela própria enquanto entidade de direito privado. Logo, só podemos concluir que a sua actividade tem efectivamente cabimento legal no disposto no artigo 9.°, n.° 1 do CIVA". Acrescentando ainda que, “para entender que a actividade da reclamante não tem enquadramento no n.° 2 do artigo 9.° do CIVA, que a "actividade realizada por esta (em estabelecimentos comerciais clínicas – fora do ambiente hospitalar), não poderá inserir-se em virtude disso, no disposto nesse normativo".
Deste modo, conclui que sendo a actividade exercida fora do meio hospitalar, deve-lhe ser aplicável a isenção do n.º 1 do art.º 9.º do Código do IVA e, como tal, não poderia a Requerente renunciar à isenção de IVA.
Em nosso entender e na senda dos anteriores Acórdãos proferidos pelo CAAD, já anteriormente referidos, o entendimento que a AT faz do Acórdão Kügler, já veio a ser esclarecido pelo TJUE, no Acórdão L.u.P. (dee 08-06-2006, proferido no processo n.º C-106/05), posterior ao Acórdão Kügler.
Efectivamente, esclareceu o TJUE, no referido Acórdão L.u.P. que:
“O artigo 13.°, A, n.º 1, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, (...) deve ser interpretado no sentido de que análises clínicas que tenham por objecto a observação e o exame dos pacientes a título preventivo, que sejam efectuadas, como as que estão em causa no processo principal, por um laboratório de direito privado externo a um estabelecimento de assistência médica sob prescrição de médicos generalistas, são susceptíveis de ser abrangidas pela isenção prevista por essa disposição enquanto cuidados médicos dispensados por outro”.
Neste acórdão L.u.P., TJUE entendeu que:
“uma vez que as análises clínicas são abrangidas, tendo em conta a sua finalidade terapêutica, pelo conceito de «assistência médica» previsto no artigo 13.°, A, n.º 1, alínea b), da Sexta Directiva, um laboratório como o que está em causa no processo principal deve ser considerado um estabelecimento da «mesma natureza» que os «estabelecimentos hospitalares» e os «centros de assistência médica e de diagnóstico» na acepção dessa disposição»
Vem em reforço, o que se retira do ponto 35 do acórdão do TJUE De Fruytier, de 02-07-2015, proferido no processo n.º C-334/14, em que se citam os acórdãos L.u.P., C‑106/05, pontos 18 e 35 e CopyGene, C‑262/08, ponto 60, “que um laboratório de direito privado que efectua análises clínicas deve ser considerado um estabelecimento «da mesma natureza” que os “estabelecimentos hospitalares” e os “centros de assistência médica e de diagnóstico” na acepção dessa disposição, uma vez que essas análises são abrangidas, tendo em conta a sua finalidade terapêutica, pelo conceito de “assistência médica”.
É assim, suficientemente clara nesta matéria a jurisprudência comunitária, no sentido de que, como se escreveu na decisão do processo arbitral 168/2015-T, atrás citado, que “a isenção prevista na alínea b) do artigo 132.º abrange os serviços prestados por entidades dos tipos que presta a Requerente, independentemente de a prestação ocorrer ou não em meio hospitalar, interpretação que está em manifesta sintonia com o texto desta norma, ao fazer referência à isenção das operações estreitamente relacionadas com a hospitalização e a assistência médica asseguradas aos «centros de assistência médica e de diagnóstico».”.
Por isso, tem de se concluir que, à face da jurisprudência do TJUE, a isenção prevista na alínea b) do artigo 132.º abrange os serviços prestados pela Requerente de prestação de cuidados médicos na especialidade medicina dentária e odontologia, independentemente de a prestação ocorrer ou não em meio hospitalar.
Em nosso entender, esta é a interpretação que está em manifesta sintonia com o texto desta norma, ao fazer referência à isenção das operações estreitamente relacionadas com a hospitalização e a assistência médica asseguradas pelos “centros de assistência médica e de diagnóstico”.
No que respeita ao enquadramento da actividade da Requerente no âmbito do CIVA, reitera-se o decidido nos Acórdãos anteriores, nos termos seguintes:
“No que concerne ao artigo 9.º do CIVA, o texto do seu n.º 2), não fornece também suporte explícito para a tese da defendida pela Autoridade Tributária e Aduaneira de que apenas a actividade exercida em meio hospitalar nele se enquadra e, designadamente, que está fora da sua previsão a prestação de serviços de análises clínicas e de diagnóstico conexos com actividades hospitalares. Na verdade, neste n.º 2) do artigo 9.º faz-se referência, para além dos estabelecimentos hospitalares, também a «clínicas, dispensários e similares».”
“A referência a «dispensários» abrange inequivocamente prestação de serviços de saúde fora desse meio hospitalar, pois o significado de «dispensário» é o de «estabelecimento de beneficência, para tratamento de doentes com dificuldades económicas, dando-lhes acesso a consultas e medicamentos gratuitos», ou «estabelecimento para dar, gratuitamente, cuidados e medicamentos aos doentes pobres que podem ser tratados no domicílio».”
“Por outro lado, a referência a «similares», interpretada em consonância com a norma paralela da alínea c) do artigo 132.º da Directiva n.º 2006/112/CE, que faz referência a «centros de assistência médica e de diagnóstico e outros estabelecimentos da mesma natureza», permite concluir que caberão também nesse conceito entidades do tipo da Requerente, que presta serviços de saúde de análises clínicas e de diagnóstico em conexão com estabelecimentos hospitalares. Assim, não tem suporte textual a tese defendida pela Autoridade Tributária e Aduaneira de que a isenção aplicável aos estabelecimentos do tipo da Requerente não está prevista no n.º 2 do artigo 9.º do CIVA.”
Deste modo, estando a actividade desenvolvida pela Requerente abrangida pelo n.º 2 do art.º 9.º do Código do IVA, não tem suporte textual a tese defendida pela AT, pelo que se conclui que à Requerente é legítima a opção pela renúncia à isenção do imposto, nos termos do art.º 12.º do mesmo Código.
Deste modo, as liquidações efectuadas pela AT enfermam de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito.
As liquidações de juros compensatórios têm como pressuposto as liquidações de IVA em que se integram (n.º 8 do artigo 25.º da LGT), pelo que enfermam do mesmo vício.
Termos em que deve julgar-se procedente o pedido da Requerente e, nesta sequência, anular as liquidações impugnadas, incluindo os respectivos juros compensatórios.
4.3.Reenvio prejudicial
A Requerida, na sua resposta, solicita que seja ordenado o reenvio do processo ao TJUE, ao abrigo do disposto no artigo 267.º do TFUE, para efeitos de definir o recorte da renúncia ao referido regime de isenção.
Para o efeito alega a mesma que “Estando os actos de liquidação adicional de IVA, pendentes de apreciação nesta instância arbitral, numa relação de dependência do reconhecimento ou não do direito da ora Requerente à renúncia à isenção de IVA (como atrás ficou referido), e não existindo na jurisprudência comunitária qualquer decisão susceptível de aplicação directa aos presentes autos, solicita-se, desde já, que seja ordenado o reenvio do processo ao TJUE, ao abrigo do disposto no artigo 267.º do TFUE, para efeitos de definir o recorte da renúncia ao referido regime de isenção.”.
Também esta matéria já objecto de decisão em diversos Acórdãos do CAAD, a qual acompanhamos, nomeadamente nos que foram proferidos nos Processos n.º 303/2015-T, n.º 315/2015-T, n.º 782/2015-T e no n.º 789/2015-T.
Conforme já amplamente evidenciado, as recomendações aos órgãos de jurisdicionais nacionais relativas à apresentação dos processos prejudicais (2012/C 338/01 do TJUE), nomeadamente quanto ao papel do Tribunal de Justiça no âmbito do processo prejudicial “… consiste em interpretar o direito da União ou pronunciar-se sobre a sua validade, e não em aplicar este direito à situação de facto subjacente ao processo principal. Esse papel incumbe ao juiz nacional e, por isso, não compete ao Tribunal pronunciar-se sobre questões de facto suscitadas no âmbito do litígio no processo principal nem sobre eventuais divergências de opinião quanto à interpretação ou à aplicação das regras de direito nacional.”.
Acresce a tudo isto que a própria matéria sobre a qual a AT pretende esclarecimentos, em termos genéricos, não é uma matéria regulada directamente pelo direito da União Europeia, mas antes deixada na discricionariedade dos Estados-Membros, os quais são competentes para definir os termos e âmbito de aplicação do eventual direito de renúncia à isenção. Assim, nos termos do artigo 267.º do TFUE, o Tribunal de Justiça da União Europeia não terá competência para proceder à interpretação das normas domésticas sobre a renúncia à isenção.
O mesmo se diga sobre as próprias dúvidas interpretativas sobre o conteúdo concreto dos n.ºs 1 e 2 do artigo 9.º do Código do IVA.
Por último, existindo jurisprudência europeia e nacional na matéria e não suscitando a situação em análise nenhuma dúvida real quanto à possibilidade de aplicar essa jurisprudência ao caso concreto, permitindo não só definir o âmbito da isenção prevista na Directiva IVA e nos n.ºs 1 e 2 do art.º 9.º do Código do IVA, como da renúncia à isenção prevista no art.º 12.º deste Código, cabe aos órgãos jurisdicionais nacionais a interpretação do concreto conteúdo dos referidos normativos.
Termos em que não se está perante uma situação em que se justifique o reenvio prejudicial, pelo que se indefere o requerido pedido apresentado pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
5.Juros Indemnizatórios
Requerente pede ainda que a AT seja condenada a reembolsá-la das quantias indevidamente pagas, acrescidas dos competentes juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º da LGT.
Esta mesma questão já foi suscitada em diversos processos anteriores em que se analisa matéria em tudo idêntica à dos autos, entre os quais o Processo 303/2015-T do CAAD, onde se escreveu o que ora, com a devida vénia, se transcreve:
“De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».
Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».
O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral, bem como o reembolso da quantia paga, que é pressuposto da existência daqueles juros.”
Na sequência da ilegalidade dos actos de liquidação adicionais de IVA e de juros compensatórios, objecto do presente processo de impugnação, dúvidas não subsistem que a AT deverá proceder, não só à restituição dos montantes indevidamente pagos pela Requerente no montante de Euros 127.815,11, dando cumprimento ao imperativo do artigo 100.º da LGT supra citado, bem como ao pagamento dos respectivos juros indemnizatórios que são devidos desde as datas em que os pagamentos foram efectuados pela Requerente até à data em que venha a ocorrer o respectivo reembolso.
-
Decisão
Nestes termos, e com os fundamentos expostos, este Tribunal Arbitral decide:
-
Julgar improcedente a excepção de incompetência material suscitada pela Requerida;
-
Julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral, com a declaração da ilegalidade, pelas razões expostas supra, das liquidações adicionais de IVA do ano de 2011, 2012, 2013 e 1.º trimestre de 2014 objecto dos autos e respectivos juros compensatórios, com a consequente anulação dessas liquidações por padecerem de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito;
-
Anular o despacho de 29 de Agosto de 2016 da Divisão da Justiça Administrativa e Contenciosa da Direcção de Finanças de Porto, que indeferiu a reclamação interposta pela Requerente;
-
Condenar a Requerida ao pagamento dos juros indemnizatórios;
-
Condenar a Requerida ao pagamento das custas do processo.
-
Valor do processo
De harmonia com o disposto no art.º 305.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de Euros 127.815,11.
-
Custas
Nos termos do art.º 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em Euros 3060,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Notifique. Lisboa, 15 de Setembro de 2017
Os Árbitros,
Fernanda Maçãs (Presidente)
Mariana Gouveia de Oliveira (vogal)
Filomena Salgado Oliveira (vogal)