Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 750/2016-T
Data da decisão: 2017-08-28  IMT  
Valor do pedido: € 15.050,00
Tema: IMT – Isenção – Inutilidade Superveniente da Lide.
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Decisão Arbitral

 

 

I - RELATÓRIO

1. Em 22 de dezembro de 2016, o contribuinte A…, titular do NIF…, residente em Rua…, …, em Leiria, (doravante designado por “Requerente”) requereu a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por “RJAT”).

2. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e notificado, em 29 de dezembro de 2016, à Autoridade Tributária e Aduaneira (de ora em diante designada por “AT” ou a “Requerida”).

3. O Requerente pretende a pronúncia do Tribunal Arbitral com vista a declarar a ilegalidade do ato de liquidação de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) no valor de € 15.050,00 (quinze mil e cinquenta euros).

4. No pedido de pronúncia arbitral, o Requerente optou por não designar árbitro. Nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitro do tribunal arbitral singular o Exmo. Senhor Dr. Olívio Mota Amador que, no prazo aplicável, comunicou a aceitação do encargo.

5. As partes foram notificadas, em 10 de fevereiro de 2017, da designação do árbitro, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

6. De acordo com o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral foi constituído em 3 de março de 2017.

7. Em 22 de março de 2017, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua Resposta.

8. O Tribunal Arbitral por despacho, de 4 de junho de 2017, concedeu ao Requerente o prazo de 10 dias para se pronunciar sobre a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide alegada pela Requerida na Resposta.

9. O Requerente, em 23 de junho de 2017, informou que foi notificado pela A.T. do deferimento da reclamação graciosa que tinha apresentado e que deve ser declarada extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, com as devidas consequências legais, nomeadamente, custas e procuradoria a cargo da Requerida.

10. Em 17 de agosto de 2017, o Tribunal Arbitral dispensou a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, por não haver lugar à produção de prova constituenda, o que fez ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal na condução do processo, e em ordem a promover a celeridade, simplificação e informalidade deste (vd., artigos 19.º, n.º 2 e 29.º, n.º 2 do RJAT). O Tribunal fixou, ainda, o dia 1 de setembro de 2017 como prazo limite para a prolação da decisão arbitral.

11. A posição do Requerente, de harmonia com o disposto na petição de constituição do Tribunal Arbitral, é, em síntese, a seguinte:

11.1. Nos termos do disposto no artigo 270.º, n.º 2, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (C.I.R.E.) “Estão igualmente isentos de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis os atos de venda, permuta ou cessão da empresa ou de estabelecimentos desta integrados no âmbito de planos de insolvência, de pagamentos ou de recuperação ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente.”

11.2. A transmissão em causa nos autos é uma transmissão efetuada através de venda, no âmbito da liquidação da massa insolvente, pelo que deve aplicar-se a isenção prevista no artigo 270.º, n.º 2, do C.I.R.E.

11.3. Neste sentido já decidiu o Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito dos processos n.º 0968/13, acórdão datado de 11/11/2015, e n.º 013560/15, acórdão datado de 20/01/2016, cuja fundamentação se adere na íntegra.

11.4. Também tem sido o mesmo entendimento adotado pelo Tribunal Arbitral, conforme resulta das decisões proferidas no âmbito dos processos n.ºs 99/2015-T, 95/2015-T, 693/2015-T e 664/2015-T.

11.5. No presente caso estão preenchidos os requisitos exigidos para a aplicação da isenção de IMT, prevista no artigo 270.º, n.º 2, do C.I.R.E, porque a referida isenção aplica-se, não apenas às vendas ou permutas de empresas e estabelecimentos enquanto universalidade de bens, mas também às vendas e permutas de imóveis (enquanto elementos do seu ativo), desde que enquadradas no âmbito de um plano de insolvência ou de pagamento, ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente.

11.6. Nestes termos, deve ser declarado ilegal e anulado o ato de liquidação de IMT, no valor de 15.050,00€ (quinze mil e cinquenta euros), por violação do artigo 270.º, n.º 2, do C.I.R.E. e dos princípios gerais da atividade administrativa, nomeadamente os consignados nos artigos 3.º, 4.º, 6.º, 7.º, 8.º, 9.º e 10.º do CPA.

12. A Requerida na resposta veio informar o Tribunal Arbitral que o Chefe da Divisão de Justiça Tributária – Contencioso, da Direção de Finanças de Leiria, por despacho, de 21 de fevereiro de 2017, deferiu a Reclamação Graciosa apresentada pelo Requerente.  Em consequência, a Requerida conclui “(…) pela existência, in casu, de inutilidade superveniente da lide, dado que a pretensão que o Requerente pretendia fazer valer em juízo se encontra já satisfeita, pelo que o efeito útil da presente ação, se encontra totalmente esvaziado, não trazendo o seu prosseguimento, quaisquer consequências benéficas para o Requerente.”.

II – SANEAMENTO

13. O tribunal arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5º., n.º 2, e 6.º, n.º 1, do RJAT.

14. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de março.

15. A Requerida suscitou a inutilidade superveniente da lide, questão prévia cuja análise deverá preceder o conhecimento do mérito do pedido.

16. Não foram suscitadas outras exceções de que cumpra conhecer.

17. O processo não enferma de quaisquer vícios que o invalidem.

III – MATÉRIA DE FACTO

18. Factos provados

Com base na prova documental junto aos autos, consideram-se provados os seguintes factos:

A) O Requerente adquiriu, em 28 de novembro de 2012, por escritura pública realizada no Cartório Notarial da … os seguintes imóveis:

(i) Prédio rústico composto por terra com vinha, oliveiras e árvores de fruto, sito em…, Rua de …, freguesia de …, concelho de Leiria, inscrito na matriz predial rústica sob o nº…, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº …/ …;

(ii) Prédio rústico, composto por pinhal e eucaliptal, sito em …, freguesia de …, concelho de Leiria, inscrito na matriz predial rústica sob o nº…, descrito na conservatória do registo Predial de Leiria sob o nº …/… .

B) Os prédios, identificados na alínea anterior, faziam parte do ativo da sociedade “B…, Lda.”, NIF nº…, tendo a aquisição ocorrido no âmbito de processo de insolvência da referida pessoa coletiva, que correu seus termos no Tribunal Judicial de Leiria, sob o n.º …/10… TBLRA.

C) O Requerente apresentou na escritura pública, referida na alínea A), as guias emitidas pela AT, sem qualquer valor a liquidar, relativamente ao IMT e ao Imposto do Selo e ficaram arquivados no Cartório Notarial da … os documentos comprovativos, da isenção do IMT e do Imposto do Selo, nos termos do n.º 2 do artigo 270.º e da alínea d) do artigo 269.º do C.I.R.E..

D) O Requerente foi notificado, em 20 de novembro de 2015, para exercer o direito de audição prévia, sobre a liquidação adicional do IMT referente à aquisição dos imóveis, identificados na alínea A), por a AT entender que a isenção prevista no artigo 270.º, n.º 2, do C.I.R.E. não deve ser concedida em caso de venda isolada de bens do alienante/insolvente.

E) O Requerente exerceu, em 3 de dezembro de 2015, o direito de audição prévia, tendo considerado ilegal a projetada liquidação adicional de IMT.

F) Em 24 de agosto de 2016, a AT notifica o Requerente para efetuar o pagamento do IMT, no valor de 15.050,00€ (quinze mil e cinquenta euros), reiterando a fundamentação já invocada aquando a notificação da demonstração da liquidação adicional de IMT.

G) Em  9 de setembro de 2016, o Requerente apresenta a Reclamação Graciosa n.º …2016… relativa à liquidação adicional de IMT, referida na alínea D).

H) A Reclamação Graciosa, identificada na alínea anterior, foi deferida por despacho do Chefe de Divisão da Divisão de Justiça Tributária – Contencioso da Direção de Finanças de Leiria proferido, em 21 de fevereiro de 2017.

 

19. Factos não provados

Não existem factos relevantes para a decisão que não se tenham provado.

IV – QUESTÃO PRÉVIA

20. A Requerida na Resposta suscitou a questão da inutilidade superveniente da lide resultante do despacho de deferimento da reclamação graciosa, proferido, em 21 de fevereiro de 2017, pelo Chefe de Divisão da Divisão de Justiça Tributária – Contencioso da Direção de Finanças de Leiria.

21. O Requerente, conforme referido no n.º 9, foi notificado para se pronunciar quanto à questão identificada no ponto anterior, tendo afirmado que “(…) deve ser declarada extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, com as devidas consequências legais, nomeadamente, custas e procuradoria a cargo da requerida.”.

22. O deferimento pela AT da reclamação graciosa apresentada pelo Requerente acarreta a revogação do ato de liquidação de IMT impugnado nos presentes autos. Este facto, que ocorreu na pendência do processo arbitral, torna inútil o prosseguimento da lide, conforme alegaram a Requerida e o Requerente.

23. Tendo em consideração que o resultado que o Requerente pretendia obter com o presente processo arbitral foi já integralmente atingido, a decisão arbitral que conheceria do mérito das pretensões formuladas pelo Requerente, afigura-se destituída de qualquer efeito útil, porquanto se verifica a inutilidade superveniente da lide.

24. A inutilidade superveniente da lide é causa de extinção da instância, nos termos do disposto no artigo 277.º, alínea e), do CPC. Sendo o CPC de aplicação subsidiária em relação ao processo arbitral tributário, nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

 

 

 

 

V – DAS CUSTAS

25. De harmonia com o disposto no artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, “da decisão arbitral proferida pelo tribunal arbitral consta a fixação do montante e a repartição pelas partes das custas directamente resultantes do processo arbitral”.

26. Nos termos do artigo 536.º, n.º 3, do CPC, de aplicação subsidiária em relação ao processo arbitral tributário nos termos do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, no caso de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, “(…) a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, caso em que é este o responsável pela totalidade das custas”. De acordo com o disposto no n.º 4 do mesmo artigo “Considera-se, designadamente, que é imputável ao réu ou requerido a inutilidade superveniente da lide quando esta decorra da satisfação voluntária, por parte deste, da pretensão do autor ou requerente (…)”.

27. Dos presentes autos arbitrais resulta que a liquidação de IMT objeto do presente pedido de pronúncia arbitral só foi revogada pela Requerida, através do despacho de 21 de fevereiro de 2017, ou seja, após a entrada no CAAD do pedido de constituição do tribunal arbitral, que ocorreu em 22 de dezembro de 2016.

28. Acresce que tendo o pedido de constituição do Tribunal Arbitral sido aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD, em 29 de dezembro de 2016 e notificado à Requerida na mesma data, o dirigente máximo do serviço da administração tributária poderia, de acordo com o disposto no artigo 13.º, n.º 1, do RJAT “(…) no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, proceder à revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja legalidade foi suscitada (…)”. A Requerida nada fez naquele prazo e o Tribunal Arbitral foi constituído em 3 de março de 2017. Só na Resposta, em 22 de março de 2017, a Requerida informou o Tribunal Arbitral que tinha deferido a reclamação graciosa referente ao ato objeto do presente pedido de pronúncia arbitral.

29. Em consequência do exposto, deve ser imputada à Requerida a responsabilidade pelas custas, na sua totalidade, para efeitos do disposto no artigo 12.º, n.º 2, do RJAT e no artigo 4.º, n.º 4, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

VI - DECISÃO

De harmonia com o exposto, este Tribunal Arbitral decide:

a)      Declarar extinta a presente instância arbitral, por inutilidade superveniente da lide;

b)      Condenar a Requerida a pagar as custas do presente processo.

 

Fixa-se o valor do processo em € 15.050,00 (quinze mil e cinquenta euros), nos termos do disposto no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

Fixa-se a taxa de arbitragem em € 918,00 (novecentos e dezoito euros), nos termos da Tabela I do Regulamento de Custas dos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT), a pagar integralmente pela Requerida, nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT

 

Notifique-se.

 

Lisboa, Centro de Arbitragem Administrativa, 28 de agosto de 2017

 

O árbitro

 

Olívio Mota Amador