DECISÃO ARBITRAL
Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), Leonardo Marques dos Santos e Ana Maria Gomes Rodrigues, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral:
I – RELATÓRIO
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No dia 11 de Outubro de 2016, A…, S.A., com sede na … de …, …-… … e com o número de identificação de pessoa colectiva … (Requerente), apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade do acto liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) referente ao exercício de 2012, respectiva liquidação de juros compensatórios e de uma demonstração de acerto de contas, na quantia global de € 933.337,09, a pagar até ao dia 18/07/2016.
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Para fundamentar o seu pedido alega a Requerente, em síntese, que as dezassete transferências transfronteiriças, que nos termos dos artigos 65.º/1 e 88.º/8 do CIRC (em vigor à data dos factos) foram desconsideradas como gastos e sujeitas a tributação autónoma pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), correspondem a operações efectivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado, para além violação do princípio da especialização dos exercícios/regime do acréscimo, previsto no artigo 18.º do Código do IRC, em relação a determinados gastos desconsiderados e tributados autonomamente pela AT[1].
Em relação à quantia de €163.402,32, liquidada a título de retenções na fonte alegadamente devidas (€142.136,20) e respectivos juros compensatórios (€21.272,12), alega também a Requerente a sua ilegalidade por falta de fundamentação, bem como por não haver qualquer obrigação, da sua parte, em proceder à retenção na fonte de IRC.
Alega, ainda, a Requerente a ocorrência de vícios de forma, por violação do disposto nos artigos 55.º, 58.º, 59.º/1 e 2 da Lei Geral Tributária (LGT), 6.º e 9.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA), 153.º/2 do Código do Procedimento Administrativo (CPA), aplicável por força do disposto no artigo 2.º/c) da LGT e no artigo 2.º/d) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
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No dia 13-10-2016, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT.
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A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º/2/a) e no artigo 11.º/1/a) do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
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Em 30-11-2016, as partes foram notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar qualquer delas.
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Em conformidade com o preceituado no artigo 11.º/1/c) do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 19-12-2016.
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No dia 03-02-2017, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se por excepção e por impugnação.
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No dia 17-03-2017, realizou-se a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, onde foram inquiridas as testemunhas, no acto, apresentadas pela Requerente.
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Foram, em reunião realizada no dia 19-05-2017, apresentadas alegações orais pelas partes, pronunciando-se sobre a prova produzida e reiterando e desenvolvendo as respectivas posições jurídicas.
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Foi fixado o prazo de 30 dias para a prolação de decisão final.
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O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º/1/a), 5º. e 6.º/1, do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
O processo não enferma de nulidades.
Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.
Tudo visto, cumpre proferir:
II. DECISÃO
A. MATÉRIA DE FACTO
A.1. Factos dados como provados
1- Por via da Ordem de Serviço OI2015…, emitida no âmbito do Código de Actividade 113-04 – Controlo das transferências transfronteiriças – 2012 (Acções especiais 2014), foi determinada uma acção inspectiva à Requerente.
2- A referida acção inspectiva foi de âmbito parcial em sede de IRC, abrangendo o exercício de 2012, tendo em vista as transferências transfronteiriças a seguir indicadas:
3- No âmbito do procedimento inspectivo foram solicitados esclarecimentos à Requerente, através de:
a. E-mail em 8/05/15;
b. Notificação obrigatória nos termos do artigo 65.º do CIRC por via do ofício n.º…, de 11/08/15, na sequência da análise dos elementos remetidos/esclarecimentos prestados em resposta ao e-mail referido no ponto anterior.
4- A requerente respondeu às referidas notificações e prestou os esclarecimentos que considerou adequados, juntando, consoante o caso:
a. Certificados;
b. Contratos de produção;
c. Notas de encomenda;
d. Documento de transporte marítimo (Bill of Lading ou B/L);
e. Seguros;
f. Documento de transporte rodoviário (CRM);
g. Documentos de garantia de pagamento;
h. Documentos de desalfandegamento;
i. Facturas;
j. Comprovativos do pagamento;
k. Comprovativos de preços;
l. Comprovativos de venda;
m. Relatórios de inspecção.
5- A Requerente foi notificada para o exercício do direito de audição e optou por não exercer tal direito.
6- A AT entendeu que os elementos remetidos e as informações prestadas pela Requerente não permitiram comprovar as condições referidas no artigo 65.º/1 do CIRC, na redacção em vigor à data dos factos, e considerou que os encargos em causa não eram dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável, e que deveriam ser sujeitos a tributação autónoma, nos termos do artigo 88.º/8 do CIRC, também na redacção em vigor à data dos factos.
7- Do Relatório de Inspecção Tributária consta, para além do mais, o seguinte:
“Nos termos do artigo 63.º-A da Lei Geral Tributária (LGT), as instituições de crédito e sociedades financeiras estão obrigadas a comunicar à Autoridade Tributária (AT) as transferências financeiras que tenham como destinatário entidade localizada em país, território ou região com regime de tributação privilegiada mais favorável, que não sejam relativas a pagamentos de rendimentos sujeitos a algum dos regimes de comunicação para efeitos fiscais já previstos na lei.
Para efeitos do cumprimento do n.º 2 do artigo 63.º-A da LGT, através da Portaria n.º 1066/2009, de 18/9, foi aprovado o modelo de declaração e respetivas instruções, designado por “declaração de transferências transfronteiras” (modelo n.º 38), que deve ser apresentada, pelas instituições financeiras, por transmissão eletrónica de dados até ao final do mês de Julho do ano seguinte.
Refira-se que nos termos das notas informativas ao campo 11 da citada declaração, apenas devem ser relacionadas as transferências de valor superior a 12.500,00 €.
A Direção de Serviços de Planeamento e Coordenação da Inspeção tributária (DSPCIT) é a entidade gestora da referida obrigação acessória, competindo-lhe a análise da informação nela contida e o planeamento e operacionalização das subsequentes ações e controlo.
Em adequada “Ação de Controlo das Transferências Transfronteiras efetuadas por Pessoas Coletivas” a que se refere o despacho de Sua Excelência a Subdiretora-geral da ITA, de 02-12- 2014, exarado na Informação n.º 162/2014, de 17-11-2014, que faz parte integrante do processo n.º 633-2014 da DSPCIT, a informação constante na declaração modelo no 38 foi tratada e cruzada com os dados fiscais dos ordenantes (neste caso pessoas coletivas) das transferências efetuadas no ano de 2012, para entidades localizadas em país, território ou região com regime de tributação privilegiada mais favorável.
Na sequência da análise dessa informação foi considerado necessário, numa 1ª fase, em ação interna via email/oficio, tomar conhecimento da justificação económica e/ou financeira dessas transferências em função da normal atividade e/ou organização do(s) sujeito(s) passivo(s) (SP) em questão, sem prescindir de que numa 2ª fase, em ação externa, se tenha necessidade de melhor compreender as justificações apresentadas.”
8- No RIT foi determinado um acréscimo à matéria colectável e ao imposto, apurados a partir dos dados constantes do quadro seguinte:
9- O acréscimo à matéria tributável e ao imposto foi o seguinte:
10- A Requerente foi notificada da liquidação adicional de IRC e tributações autónomas referente ao exercício de 2012, da liquidação de juros compensatórios e da demonstração de acerto de contas, tendo ficado obrigada a pagar, até ao dia 18/07/2016, a quantia global de €933.337,09.
11- Pela notificação de liquidação n.º 2016…, a Requerente foi ainda notificada para pagar, até ao dia 15/07/2016, a quantia de €163.402,32, dos quais €142.130,20 a título de retenções na fonte e €21.272,12 como juros compensatórios.
12- Nos dias 15 e 18 de Julho de 2016, a Requerente procedeu ao pagamento das referidas liquidações.
13- A Requerente foi fundada, no final dos anos 70, com o objectivo de fabricar loiças metálicas em alumínio.
14- A partir de meados da década de oitenta do século passado, dedicou-se, igualmente, à produção de pequenos electrodomésticos, que representava à época um mercado em crescimento.
15- Desde então e progressivamente, este segmento passou a ser a principal aposta da Requerente, através de uma crescente diversificação da respectiva gama de produtos, com o lançamento de novos modelos em várias categorias de pequenos electrodomésticos tais como grelhadores, torradeiras, chaleiras eléctricas, ferros de engomar e muitos outros que a tornou o principal produto de pequenos electrodomésticos com sede em Portugal.
16- A Requerente tem vindo a trabalhar, desde finais do século passado, com diversas empresas sedeadas na China, quer para fabricar os respectivos produtos, quer para adquirir alguns componentes daqueles que fabrica em Portugal.
17- Há vários anos que a Requerente tem vindo a estabelecer relações comerciais com empresas chinesas, algumas das quais facturam através de filiais estabelecidas em Hong Kong.
18- A Requerente celebrou com o Grupo B… um contrato para a produção de máquinas de café expresso, para serem vendidas, sob a marca «D… », que previa a venda de 25.000 máquinas até ao final do ano 2010.
19- As máquinas de café expresso são um produto complexo na gama dos pequenos electrodomésticos, visto que agregam, no mesmo aparelho, três factores potenciadores de elevados problemas técnicos (água, pressão e electricidade).
20- O Grupo B… estava interessado em vender máquinas e, principalmente, cápsulas de café a um preço mais agressivo que as da marca E… .
21- Para o efeito, o Grupo B… obteve da sociedade C… permissão para a comercialização com a marca D… das máquinas e das cápsulas de café expresso F… .
22- Para poderem ser vendidas as máquinas e as cápsulas, estas tinham de cumprir com as patentes detidas pela C…(F… capsules).
23- Para permitir a diferenciação entre as patentes das máquinas de cápsulas E… das da C…, era exigida uma máquina com um “Grupo de Extracção” do café mais complexo.
24- A C…, detentora da patente F… licenciou a sociedade chinesa G… para o fabrico das máquinas de café.
25- Por indicação da mesma C…, a produção das máquinas de café teve de ser efectuada pela empresa chinesa G… .
26- Do contrato celebrado entre a Requerente e o Grupo B… consta, para além do mais, que a Requerente «obteve da C…, SPA, autorização para produzir ou mandar produzir, neste caso na China, os PRODUTOS, a qual é válida pelo período de vigência do contrato de fornecimento celebrado em 7 de maio de 2010 entre a PRIMEIRA CONTRAENTE H…, S.A., e a dita C…, SPA».
27- Do contrato celebrado entre a Requerente e a H…, S.A., costa que as máquinas de café, numa primeira fase, seriam produzidas na República Popular da China e, posteriormente, seriam produzidas em Portugal.
28- Logo no início das vendas ocorridas em Outubro de 2010, foram vendidas todas as máquinas entregues pela Requerente ao H…, pelo que o Grupo B… solicitou àquela a produção urgente de mais 20.000 máquinas para entrega até ao Natal de 2010.
29- Desde as primeiras vendas que se verificou o surgimento de um número elevado problemas técnicos nas unidades vendidas.
30- O contrato com o H… previa um limite de 8% para máquinas devolvidas para assistência técnica durante o período de 2 anos de garantia, com penalizações para devoluções acima daquele valor e, no caso de aquele número se ultrapassar os 10%, o H… considerava que o projecto poderia ter de ser reequacionado por poder colocar em causa a sua imagem de marca, com as consequentes indemnizações, prevendo-se também a aplicação de penalidades à Requerente no caso de atraso nas reparações.
31- O referido valor de 8% foi previsto para devolução de máquinas durante o período de 2 anos.
32- Em Janeiro de 2011, a Requerente alertou a G… para a existência de defeitos em 2.083 de 19.184 máquinas e do respectivo custo extra que esse problema lhe causava.
33- Em Junho de 2011, tinham sido vendidas mais de 73.000 máquinas e sido feita a encomenda de mais 100.000 máquinas até Dezembro de 2011.
34- Nessa altura, o total de máquinas provenientes de lotes afectados pelos defeitos detectados, ascendia a 69.480, tendo-se verificado que 9,1% destas estavam efectivamente defeituosas, e sido estimado que tal percentagem poderia ascender a 30%.
35- Relativamente às máquinas produzidas até 30/06/2011, 47.859 acabaram por carecer de reparação até 31/03/2013.
36- Os referidos problemas técnicos e as devoluções de máquinas eram susceptíveis de pôr em risco a rentabilidade e a continuidade do negócio respectivo, em função dos custos de reparação que a Requerente tinha de suportar e da possibilidade de danos na imagem do H… .
37- A G… reconheceu os referidos problemas.
38- Por forma a compensar os custos com as reparações, foi negociada uma indemnização com a G… que, em Setembro de 2011, acordou o envio «free of charge» de 8.578 máquinas de café expresso, avaliadas comercialmente em USD 464,927.60, como forma de compensação pelos prejuízos até aí causados
39- A Requerente celebrou em 7 Julho de 2011, com efeitos reportados a 1 de Julho de 2011, um contrato com a empresa I… para a orientação, acompanhamento e fiscalização do processo produtivo das máquinas de café fabricadas pela G… (na altura, o modelo …).
40- Os serviços previstos naquele contrato consistiam em:
i. Inspecionar as principais matérias-primas utilizadas na produção, de acordo com as especificações técnicas anexas ao contrato;
ii. Testar 100% das placas electrónicas…;
iii. Efectuar o controlo de qualidade durante as fases de produção;
iv. Inspecionar o produto final de acordo com as especificações técnicas anexas ao contrato;
v. Assegurar que cada máquina fosse testada com pelo menos uma cápsula durante a produção;
vi. Testar em laboratório 5% de cada grupo de máquinas, com 5 cápsulas.
41- Como retribuição pelos serviços prestados pela I…, no referido contrato, foi previsto o valor de 14 dólares americanos, por máquina.
42- A data do anexo figurativo do contrato entre a Requerente e a I…, de Julho de 2011, é de Setembro de 2011.
43- O anexo original padecia de um erro figurativo e foi substituído pelas partes e assinado pelos respectivos responsáveis em substituição do primeiro.
44- Relativamente às máquinas produzidas após 30/06/2011, até 31/03/2013, foi necessária reparação 6.826 máquinas.
45- No final do ano de 2011 e a pedido do Grupo B…, a Requerente desenvolveu uma nova máquina (designada por …, que veio a substituir a anterior …), relativamente à qual apenas o “Grupo de Extracção”, continuou a ser fabricado na China, pois ainda estavam em vigor patentes da E… sobre os “Grupos de Extracção”, sendo o restante desta nova máquina … produzido e concluído em Portugal.
46- O “Grupo de Extracção” produzido pela E… estava patenteado pela C…, encontrando-se livre de conflitos de patentes com a mencionada E…, pelo que a Requerente continuou a trabalhar com este tipo de “Grupo de Extracção”.
47- O novo acordo com a G…, passou por ser esta a fabricar apenas o “Grupo de Extracção”, ficando a cargo da Requerente a introdução de alterações no sentido de o melhorar e adaptar à restante parte da máquina produzida em Portugal.
48- A Requerente encomendou à I… os moldes sobre os quais a G… fabricaria e fabricou na China os aludidos grupos.
49- Os referidos moldes foram fabricados antes da produção do “Grupo de Extracção”.
50- À J… foram encomendados os moldes seguintes:
i. Flutuador pp;
ii. Separador luz e fixador pcb;
iii. Depósito de cápsulas abs;
iv. Manivela alum cromado;
v. Lateral esq.+ lateral dir. abs.;
vi. Depósito água SAN.
51- Com o “Grupo de Extracção” fabricado pela G… e a restante produção em Portugal foi possível obter um preço competitivo e sem conflitos, ao nível das patentes, permitindo fazer constar das máquinas a indicação “Made in Portugal”.
52- Em 26-03-2012, com efeitos reportados a 01-03-2012, foi celebrado um novo acordo com a I… tendo como objecto a fiscalização e acompanhamento do processo produtivo do novo “Grupo de Extracção” fabricado pela G… .
53- Os serviços previstos naquele contrato consistiam em:
i. Inspecionar as principais matérias-primas utilizadas na produção, de acordo com as especificações técnicas anexas ao contrato;
ii. Efectuar o controlo de qualidade durante as fases de produção;
iii. Inspecionar o produto final de acordo com as especificações técnicas anexas ao contrato;
iv. Testar em laboratório 5% de cada grupo de máquinas, com 5 cápsulas.
54- Como retribuição pelos serviços prestados pela I…, no referido contrato, foi previsto o valor de 6 dólares americanos, por cada grupo inspeccionado.
55- As facturas emitidas ao abrigo do contrato que vem de se referir, discriminam o número de máquinas a que se reportam e multiplicam-no pelo referido valor de 6 USD, relativo a “Production Supervision and Quality Inspection”, em ordem a determinar o valor a pagar (e pago) pela Requerente.
56- Para esta nova máquina, além de peças fabricadas pela própria Requerente, foram necessários, entre outros, os moldes adquiridos à J… e, quanto ao “Grupo de Extracção” os moldes que vieram a ser adquiridos à I… .
57- Os moldes do “Grupo de Extracção” nunca saíram da China, tendo sido utilizados pela G… para o fabrico do novo “Grupo de Extracção”.
58- A transferência n.º 1, constante do quadro que integra o ponto 8 supra, foi realizada no dia 13/01/2012, tendo a Requerente apresentado o seguinte conjunto de documentos à Autoridade Tributária: a factura; a requisição interna; os documentos alfandegários da importação; o conhecimento de embarque marítimo (B/L); o certificado de origem; os documentos de transporte rodoviário; o comprovativo de transferência bancária e os comprovativos de venda do produto e de preço comparável de mercado.
59- A factura relativa à referida transferência está datada de 16/11/2011 e foi levada a gastos nesse exercício.
60- As resistências eléctricas a que se referem a transferência em causa foram fabricadas pela K… e incorporadas pela Requerente em máquinas de cozer a vapor que, posteriormente, foram vendidas à multinacional holandesa L… .
61- O preço de compra das referidas resistências eléctricas foi de 3,546 USD por unidade.
62- A Requerente obteve um orçamento da sociedade M…, S.A., para o mesmo tipo de produto, que propunha um preço de €4,20 por unidade.
63- Relativamente à transferência n.º 2, constante do quadro que integra o ponto 8 supra, de 02/07/2012, a Requerente, apresentou o seguinte conjunto de documentos à Autoridade Tributária: factura, requisição interna, documentos alfandegários da importação, conhecimento de embarque marítimo, certificado de origem, documentos de transporte rodoviário, comprovativo de transferência bancária, comprovativos de venda do produto e o preço comparável de mercado.
64- Os bens foram adquiridos pela Requerente, entraram em Portugal, pagaram os respectivos direitos aduaneiros e foram, posteriormente, vendidos.
65- O preço de compra dos produtos em causa (microondas) foi de 32,30 USD por unidade.
66- A Requerente obteve um orçamento da sociedade N…, para o mesmo tipo de produto, que propunha um preço de 38,51 USD por unidade.
67- Relativamente à transferência n.º 3, constante do quadro que integra o ponto 8 supra, de 28/09/2012 a Requerente apresentou à AT os seguintes documentos: factura, requisição interna, documentos alfandegários da importação, conhecimento de embarque marítimo, certificado de origem, documentos de transporte rodoviário, comprovativo de transferência bancária, comprovativos de venda do produto e o preço comparável de mercado.
68- Os bens foram adquiridos pela Requerente, deram entrada no território nacional e foram, posteriormente, vendidos, tendo sido pagos os respectivos direitos aduaneiros.
69- O preço de compra dos produtos em causa (estação de vapor) foi de 28,97 USD por unidade.
70- A Requerente obteve um orçamento da sociedade O…, para o mesmo tipo de produto, que propunha um preço de 41,40 USD por unidade.
71- Relativamente à transferência n.º 4, constante do quadro que integra o ponto 8 supra, de 13/11/2012, relativa à compra de utensílios de cozinha à P…, a Requerente apresentou à AT os seguintes documentos: factura, requisição interna, documentos alfandegários da importação, conhecimento de embarque marítimo, certificado de origem, documentos de transporte rodoviário, comprovativo de transferência bancária, comprovativos de venda do produto e o preço comparável de mercado.
72- Os bens foram adquiridos pela Requerente, deram entrada no território nacional e foram, posteriormente, vendidos, tendo sido pagos os respectivos direitos aduaneiros.
73- O preço de compra dos produtos em causa (trem de cozinha) foi de 57,76 USD por unidade.
74- A Requerente obteve um orçamento da sociedade Q…, para o mesmo tipo de produto, que propunha um preço de 67,20 USD por unidade.
75- As transferências n.º 5, 6, 7, 8, 9, 11, 14, 16 e 17 constantes do quadro que integra o ponto 8 supra, respectivamente de 3/05/2012, 8/06/2012, 18/06/2012, 31/07/2012, 29/08/2012, 13/09/2012, 24/02/2012, 29/08/2012 e 11/12/2012 reportam-se, também respectivamente, às facturas:
i. TT111073, de 07-10-2011;
ii. TT111120, de 02-11-2011;
iii. TT111124, de 07-11-2011;
iv. TT111127, de 07-11-2011;
v. TT111252, de 02-12-2011;
vi. TT111251, de 02-12-2011;
vii. TT111031, de 03-10-2011;
viii. TT111072, de 07-10-2011;
ix. TT111250, de 02-12-2011;
Todas da sociedade I…, emitidas ao abrigo do contrato de 01-07-2011, acima referido.
76- As referidas facturas foram levadas a gastos, pela Requerente, no exercício de 2011.
77- A transferência n.º 15 constante do quadro que integra o ponto 8 supra, de 28/02/2012, reporta-se à factura TT111262, também da sociedade I…, ao abrigo do contrato de 01-07-2011, acima referido.
78- Na referida factura consta como data o seguinte: “12-06-11”.
79- A Requerente contabilizou essa factura em 22/12/2011.
80- Às facturas mencionadas nos pontos anteriores, correspondem os seguintes dados:
Factura
|
Data
|
Série[2]
|
Quantidade
|
TT111031
|
03/10/2011
|
A1100357
|
5232
|
TT111072
|
07/10/2011
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A1100358
|
10464
|
TT111073
|
07/10/2011
|
A1100359
|
10464
|
TT111120
|
02/11/2011
|
A1100360
|
8720
|
TT111124
|
07/11/2011
|
A1100361
|
10464
|
TT111127
|
07/11/2011
|
A1100362
|
8720
|
TT111250
|
02/12/2011
|
A1100363
|
10464
|
TT111251
|
02/12/2011
|
A1100364
|
10464
|
TT111252
|
02/12/2011
|
A1100365
|
3488
|
TT111262
|
06/12/2011
|
RO[3]
|
1744
|
81- As facturas em questão discriminam o número de máquinas a que se reportam, nos termos do quadro que antecede, e multiplicam-no, pelos seguintes valores, em ordem a determinar o valor a pagar (e pago) pela Requerente:
i. 6 USD referentes a “Production Supervision and Quality Inspection”;
ii. 5,50 USD referentes a “Final Test Control”;
iii. 2,50 USD referents a “Test PCB Electronic Boards”.
82- A respeito destes pagamentos, a Requerente apresentou à AT comprovativos de pagamento e de vendas, relatórios de inspecção e um orçamento para o mesmo serviço da responsabilidade da R…– empresa que se dedicava a funções semelhantes.
83- Aos relatórios de inspecção apresentados pela Requerente, e referentes às facturas a que se reportam os pontos que antecedem, correspondem os seguintes dados:
Data
|
Série[4]
|
Quantidade
|
9/7/11
|
A1100357/358
|
6074
|
16/7/11
|
A1100358
|
6332
|
22/7/11
|
A1100358/359
|
7480
|
6/8/11
|
A1100359
|
1356
|
27/7/11
|
A1100359
|
823
|
13/8/11
|
A1100359/360
|
10137
|
16/8/11
|
A1100360/361
|
4567
|
25/8/11
|
A1100361
|
3528
|
17/9/11
|
A1100361
|
1985
|
24/9/11
|
A1100362
|
5325
|
30/09/11
|
A1100362
|
4221
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8/10/11
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A1100362
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4275
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15/10/11
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A1100363
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6537
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22/10/11
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A1100363/364
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10491
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28/10/11
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A1100364/365/RO[5]
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7094
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84- A Requerente adquiriu à G… 61.040 máquinas fabricadas entre 1 de Julho e 31 de Outubro de 2011, de acordo com o seguinte quadro:
85- A transferência n.º 10, constante do quadro que integra o ponto 8 supra, de 6/09/2012, refere-se ao pagamento do molde “Diecast Plates…” adquirido à I…, tendo a Requerente apresentado à Autoridade Tributária, para além da factura e comprovativo do respectivo pagamento, comprovativos da venda e dois orçamentos para o fabrico do mesmo molde, da S… e da J…, com valores superiores.
86- O molde em causa foi adquirido pela Requerente para proceder à injecção de placas de alumínio para um grelhador, encomendado pela multinacional L…, tendo custado € 49.097,37 e sido, posteriormente, vendido à L… por € 55.000,00.
87- A Requerente obteve um orçamento da sociedade J…, Ld.ª, para o mesmo tipo de produto, que propunha um preço de €60.000,00.
88- As transferências n.º 12 e 13, constantes do quadro que integra o ponto 8 supra, de 23/10/2012 e de 20/12/2012, respectivamente, dizem respeito a pagamentos à I… pela compra do molde “…– Capsule Machine”, dos moldes “…body – piece nr. 116 e 131”, dos moldes “capsule …– piece nr. 110, … holder – piece nr. 126 e … Gasket – piece nr. 123”, dos moldes “…cover – piece nr. 118, …handle – piece nr. 140 e … handle – piece nr. 139” e dos moldes “Slide – piece nr. 120, Cam – piece nr. 101 e Rod cam – piece nr. 103”.
89- Estes moldes foram utilizados no fabrico da nova versão da máquina de café expresso D… … .
90- Sem a aquisição destes moldes não teria sido possível fabricar o grupo de extracção nem a máquina encomendada pelo H… .
91- Relativamente a esta operação a Requerente apresentou à AT os seguintes documentos: factura, comprovativo de pagamento, extracto de vendas, comprovativos de venda do produto final e orçamento da J…, para as mesmas peças, datado de 09-01-2012, propondo preços superiores para os mesmos moldes.
A.2. Factos dados como não provados
Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.
A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art. 123.º/2, do CPPT e artigo 607.º/3 do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º/1/a) e e), do RJAT).
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º/1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º/1/e), do RJAT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, e a prova testemunhal produzida, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13[6], “o valor probatório do relatório da inspecção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.
Em especial, relativamente aos factos dados como provados nos pontos 29, 36, 43, 45 a 49, 51, 56, 57, 60, 86, 89, 90, foram tidos em conta os depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas, que revelaram conhecimento directo dos factos tal como se consideraram provados, e depuseram de forma lógica e coerente, entre si e com a prova documental disponível, evidenciando credibilidade.
Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente de direito ou conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.
B. DO DIREITO
i. Da matéria de excepção
Começa a Requerida por arguir a excepção dilatória que obsta ao prosseguimento do processo, conducente à absolvição da instância quanto à legalidade da liquidação a título de retenção na fonte de IRC, de acordo com o previsto nos artigos 576.º, n.º 2, 577.º, alínea a) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, porquanto entende que a pretensão de declaração directa da ilegalidade do acto de retenção na fonte está afastada da competência do presente tribunal arbitral, uma vez que nos casos “de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamentos por conta, tal recurso prévio à via administrativa é obrigatório”, nos termos da al. a) do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011.
Não assiste, todavia, razão à Requerida, já que nos presentes autos de processo arbitral não está em causa qualquer acto de retenção na fonte, mas antes um acto de liquidação oficiosa de IRC, acima identificado, que, parcialmente, se fundamenta na omissão pela Requerente, precisamente, da prática de actos de retenção na fonte que a AT entendeu que deveriam ter sido praticados.
Conforme muito bem explicou a Requerente no exercício do seu direito ao contraditório nesta matéria:
“Está em causa nos presentes autos a apreciação da legalidade de actos tributários, praticados exclusivamente pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
Com efeito, a requerente solicitou a este Tribunal Arbitral a declaração da ilegalidade de uma liquidação adicional de IRC, bem como a ilegalidade de uma liquidação de retenções na fonte, esta última alegadamente devida por força de um rendimento obtido em Portugal por uma entidade não residente.
Quer num caso, quer no outro, o acto de apuramento do imposto a pagar, assim como os respectivos fundamentos, foram da exclusiva iniciativa e responsabilidade da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Para o efeito, confiram-se os documentos juntos sob os números 1 a 4, em especial o n.º 4, onde se pode confirmar que os montantes alegadamente devidos, a título de retenção na fonte, foram apurados e liquidados pela própria Autoridade Tributária e Aduaneira.
No mesmo documento n.º 4 pode ver-se a indicação da Autoridade Tributária e Aduaneira de que a requerente ficou notificada para «efectuar o pagamento da liquidação de retenções na fonte de IRC relativa ao ano indicado. Poderá reclamar ou impugnar nos termos e prazos estabelecidos nos art. 70.º e 102.º do CPPT».
É inquestionável que estamos perante um acto tributário, praticado exclusivamente pela Autoridade Tributária e Aduaneira que, apesar de ser uma liquidação a título de retenção na fonte, não teve qualquer intervenção do alegado substituto, pelo que o mesmo seria directamente impugnável e é, igualmente, directamente arbitrável.”
Assim, não estando em causa no presente processo arbitral a apreciação de qualquer acto de retenção na fonte, carece de fundamento a excepção suscitada pela Requerida que deverá, por isso, improceder.
***
ii. Do fundo da causa
A questão essencial que se apresenta a decidir nos presentes autos, conforme é reconhecido pelas partes, prende-se com saber se, relativamente às 17 transferências a que se refere o ponto 8 dos factos dados como provados, a Requerente logrou demonstrar que as mesmas correspondem a operações efectivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado, conforme impõem os artigos 65.º/1 e 88.º/8 do CIRC (em vigor à data dos factos).
Por razões de organização sistemática, dividir-se-á a apreciação da matéria referida em dois grupos, um correspondente às transferências n.º 5, 6, 7, 8, 9, 11, 14, 15, 16 e 17, constantes do quadro que integra o ponto 8 dos factos dados como provados, todas reportadas do contrato de 01-07-2011, outorgado entre a Requerente e a sociedade I…, a que se refere os pontos 39 e ss. da matéria de facto dada como provada, respeitantes a prestações de serviços, e outro correspondente às restantes transferências, individualmente consideradas, respeitantes à aquisição de bens.
Vejamos então.
***
Começando pelo segundo dos grupos elencados, no que diz respeito à transferência n.º 1 de 13/01/2012, constante do quadro que integra o ponto 8 dos factos dados como provados, apurou-se que as resistências eléctricas a que se referem as respectivas facturas de suporte foram fabricadas pela K… e incorporadas pela Requerente em máquinas de cozer a vapor que, posteriormente, foram vendidas à multinacional holandesa L… .
Os documentos apresentados pela Requerente, permitem concluir pela efectividade das operações, concluindo-se para lá de qualquer dúvida razoável que o produto pago foi efectivamente adquirido e importado.
Do mesmo modo, verifica-se que o preço de compra dos produtos em questão foi de 3,546 USD por unidade, e que a Requerente obteve um orçamento da sociedade M…, S.A., para o mesmo tipo de produto, que propunha um preço de €4,20 por unidade.
Face aos factos referidos, conclui-se igualmente que a operação em causa não tem um carácter anormal ou um montante exagerado.
Deste modo, não se verificando os pressupostos dos artigos 65.º/1 e 88.º/8 do CIRC aplicável, enferma nesta parte o acto tributário objecto da presente acção arbitral de erro nos pressupostos de facto, e consequente erro de direito, devendo em tal medida ser anulado, e proceder o pedido arbitral.
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Relativamente à transferência n.º 2 de 02/07/2012, constante do quadro que integra o ponto 8 dos factos dados como provados, apurou-se que os bens foram adquiridos pela Requerente, entraram em Portugal, pagaram os respectivos direitos aduaneiros e foram, posteriormente, vendidos.
Mais se apurou que o preço de compra dos produtos em causa foi de 32,30 USD por unidade e que a Requerente obteve um orçamento para o mesmo tipo de produto, que propunha um preço de 38,51 USD por unidade.
Face aos factos referidos, conclui-se para lá de qualquer dúvida razoável que o produto pago foi efectivamente adquirido e importado e que a operação em causa não tem um carácter anormal ou um montante exagerado.
Deste modo, não se verificando os pressupostos dos artigos 65.º/1 e 88.º/8 do CIRC aplicável, enferma nesta parte o acto tributário objecto da presente acção arbitral de erro nos pressupostos de facto, e consequente erro de direito, devendo em tal medida ser anulado, e proceder o pedido arbitral.
*
Relativamente à transferência n.º 3 de 28/09/2012, constante do quadro que integra o ponto 8 dos factos dados como provados, apurou-se que os bens foram adquiridos pela Requerente, deram entrada no território nacional e foram, posteriormente, vendidos, tendo sido pagos os respectivos direitos aduaneiros.
Mais se apurou que o preço de compra dos produtos em causa foi de 28,97 USD por unidade e que Requerente obteve um orçamento para o mesmo tipo de produto, que propunha um preço de 41,20 USD por unidade.
Face aos factos referidos, conclui-se para lá de qualquer dúvida razoável que o produto pago foi efectivamente adquirido e importado e que a operação em causa não tem um carácter anormal ou um montante exagerado.
Deste modo, não se verificando os pressupostos dos artigos 65.º/1 e 88.º/8 do CIRC aplicável, enferma nesta parte o acto tributário objecto da presente acção arbitral de erro nos pressupostos de facto, e consequente erro de direito, devendo em tal medida ser anulado, e proceder o pedido arbitral.
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Relativamente à transferência n.º 4 de 13/11/2012, constante do quadro que integra o ponto 8 dos factos dados como provados, apurou-se que os bens foram adquiridos pela Requerente, deram entrada no território nacional e foram, posteriormente, vendidos, tendo sido pagos os respectivos direitos aduaneiros.
Mais se apurou que o preço de compra dos produtos em causa foi de 57,76 USD por unidade, a Requerente obteve um orçamento para o mesmo tipo de produto, que propunha um preço de 67,20 USD por unidade.
Face aos factos referidos, conclui-se para lá de qualquer dúvida razoável que o produto pago foi efectivamente adquirido e importado e que a operação em causa não tem um carácter anormal ou um montante exagerado.
Deste modo, não se verificando os pressupostos dos artigos 65.º/1 e 88.º/8 do CIRC aplicável, enferma nesta parte o acto tributário objecto da presente acção arbitral de erro nos pressupostos de facto, e consequente erro de direito, devendo em tal medida ser anulado, e proceder o pedido arbitral.
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Relativamente à transferência n.º 10 de 6/09/2012, constante do quadro que integra o ponto 8 dos factos dados como provados, apurou-se que se refere ao pagamento do molde “…Plates…” adquirido à I…, que foi adquirido pela Requerente para proceder à injecção de placas de alumínio para um grelhador, encomendado pela multinacional L…, tendo custado € 49.097,37 e sido, posteriormente, vendido à L… por € 55.000,00.
Mais se apurou que a Requerente obteve um orçamento da sociedade J…, Ld.ª, para o mesmo tipo de produto, que propunha um preço de €60.000,00.
Face aos factos referidos, conclui-se para lá de qualquer dúvida razoável que o produto pago foi efectivamente adquirido e importado e que a operação em causa não tem um carácter anormal ou um montante exagerado.
Deste modo, não se verificando os pressupostos dos artigos 65.º/1 e 88.º/8 do CIRC aplicável, enferma nesta parte o acto tributário objecto da presente acção arbitral de erro nos pressupostos de facto, e consequente erro de direito, devendo em tal medida ser anulado, e proceder o pedido arbitral.
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Relativamente às transferências n.º 12 e 13, de 23/10/2012 e de 20/12/2012, constantes do quadro que integra o ponto 8 dos factos dados como provados, dizem respeito a pagamentos à I… pela compra do molde “…Boiler –…Machine”, dos moldes “… body – piece nr. 116 e 131”, dos moldes “…holder – piece nr. 110, …holder – piece nr. 126 e …Gasket – piece nr. 123”, dos moldes “… cover – piece nr. 118, … handle – piece nr. 140 e … handle – piece nr. 139” e dos moldes “Slide – piece nr. 120, Cam – piece nr. 101 e Rod cam – piece nr. 103”, que foram utilizados no fabrico da nova versão da máquina de café expresso D… …e que sem a aquisição destes moldes não teria sido possível fabricar o grupo de extracção nem a máquina encomendada pelo H… .
Apurou-se também que a Requerente obteve um orçamento da J…, para as mesmas peças, datado de 09-01-2012, propondo preços superiores para os mesmos moldes.
Verificou-se ainda que a Requerente desenvolveu uma nova máquina (designada por …, que veio a substituir a anterior …), relativamente à qual apenas o “Grupo de Extracção”, a que se destinaram os moldes em questão, que foram naturalmente fabricados antes da produção do “Grupo de Extracção”, continuou a ser fabricado na China, pois ainda estavam em vigor patentes da E… sobre os “Grupos de Extracção”, sendo o restante desta nova máquina … produzido e concluído em Portugal.
Face aos factos referidos, conclui-se para lá de qualquer dúvida razoável que os produtos pagos foram efectivamente adquiridos e que a operação em causa não tem um carácter anormal ou um montante exagerado.
Deste modo, não se verificando os pressupostos dos artigos 65.º/1 e 88.º/8 do CIRC aplicável, enferma nesta parte o acto tributário objecto da presente acção arbitral de erro nos pressupostos de facto, e consequente erro de direito, devendo em tal medida ser anulado, e proceder o pedido arbitral.
***
No que diz respeito ao primeiro grupo de transferências atrás indicado, estão em causa, segundo alega a Requerente e decorre da documentação por ela junta, pagamentos reportados como contrapartida dos seguintes serviços:
i. Inspecção das principais matérias-primas utilizadas na produção, de acordo com as especificações técnicas anexas ao contrato;
ii. Teste de 100% das placas electrónicas PCB;
iii. Controlo de qualidade durante as fases de produção;
iv. Inspecção do produto final de acordo com as especificações técnicas anexas ao contrato;
v. Teste de cada máquina com pelo menos uma cápsula durante a produção;
vi. Teste em laboratório de 5% de cada grupo de máquinas, com 5 cápsulas.
Segundo o contrato que formaliza a prestação de serviços em causa, pela prestação destes era devido pela Requerente o valor de 14 dólares americanos, por máquina.
Do descritivo de pagamento das facturas de suporte dos pagamentos em questão, consta que o valor referido se reporta a:
i. 6 USD referentes a “Production Supervision and Quality Inspection”;
ii. 5,50 USD referentes a “Final Test Control”;
iii. 2,50 USD referentes a “Test PCB Electronic Boards”.
Os serviços a que se reportam os pagamentos em questão, foram facturados nos termos constantes do ponto 72 da matéria de facto dada como provada e ficaram corporizados nos relatórios de inspecção apresentados pela Requerente, a que, para além do mais, correspondem os dados constantes do ponto 75 da mesma matéria de facto.
Conforme se apontou já, está em causa aferir da efectividade das operações e do carácter normal ou montante não exagerado do respectivo custo.
Como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 05-11-2015, proferido no processo 07022/13[7], “No que diz respeito à prova da veracidade da operação não bastará a exibição de documentos escritos, nomeadamente contratos celebrados entre as partes, já que estes se presumem simulados, nem a demonstração do pagamento do preço, pois tal não é posto em causa. O que deve ser objecto de prova é antes a efectiva prestação de serviços”, prova essa que, de acordo com os critérios normais, deverá convencer o julgador, para lá de qualquer dúvida razoável, de que os serviços foram efectivamente prestados.
Ora, no caso, e relativamente aos serviços ora em apreço, tal não ocorre.
Com efeito, compulsada toda a prova apresentada pela Requerente a este propósito, subsistem incongruências e desfasamentos que não permitem ao Tribunal ultrapassar o estado de dúvida, relativamente à efectiva prestação dos serviços em questão, verificando-se, desde logo, que os relatórios apresentados pela Requerente, principal evidência física da prestação dos serviços controvertidos, não são coerentes com a facturação apresentada.
Assim, as facturas TT111031, TT111072, TT111073, TT111120 e TT111124, que abrangem as séries A1100357 a A1100361, reportam-se a um total de 45344 máquinas. Já os relatórios de 9/7/11 (séries 357/358), de 16/7/11 (série 358), de 22/7/11 (séries 358/359), de 6/8/11 (série 359), de 27/7/11, (série 359), de 13/8/11, (séries 359/360), de 16/8/11, (séries 360/361), de 25/8/11 (série 361), e de 17/9/11, (série 361) que abrangem a totalidade das mesmas séries, 42282, ou seja, menos 3062 máquinas.
As restantes facturas, referentes às restantes séries até à série A1100365, e incluindo a “RO”, reportam-se a 34880 máquinas, quando os restantes relatórios, abrangendo o mesmo conjunto de máquinas 37943 máquinas, ou seja, uma diferença de 3063 máquinas.
Acresce ainda que as facturas em questão e os correspondentes relatórios, como se infere da data de início do contrato de prestação de serviços (1/7/2011) e do primeiro relatório (9/7/2011), por um lado, e da data e séries do último relatório referente às séries facturadas (28/10/2011), por outro, se reportam às máquinas produzidas entre 1 de Julho de 2011 e 31 de Outubro do mesmo ano (séries A1100357 a A1100365 e “RO”), nas quantidades respectivas de 80224 (facturas) e 80225 (relatórios), quando, segundo os dados fornecidos pela própria requerente (cfr. doc. 16 junto pela Requerente e ponto 84 dos factos dados como provados), entre aquelas datas (1/7/2011 e 31/10/2011) foram produzidas 61040 máquinas.
Face a estas circunstâncias, não é possível concluir para lá de qualquer dúvida razoável, como pretende a Requerente, pela efectividade dos serviços a que aquela reporta os pagamentos ora em questão, o que só por si é suficiente para conduzir à improcedência, nesta parte, do pedido arbitral formulado.
*
Relativamente a esta matéria, cumpre apreciar, face ao que vem de se concluir, a suscitada violação do princípio da especialização dos exercícios, previsto no artigo 18.º do Código do IRC.
Dispõe o referido artigo, naquilo que para o caso releva, que:
“1 - Os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica.
2 - As componentes positivas ou negativas consideradas como respeitando a períodos anteriores só são imputáveis ao período de tributação quando na data de encerramento das contas daquele a que deviam ser imputadas eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas.”
As correcções contra as quais a Requerente se insurge foram operadas a três níveis, como se viu, designadamente ao nível da não dedutibilidade do gasto, nos termos do artigo 65.º/1, ao nível da tributação autónoma, prevista no artigo 88.º/8, e ao nível da retenção na fonte, a que se reporta o artigo 94.º/1/f), 2, 3/b), e 5, por referência ao artigo 4.º/3 e 4, todos do CIRC aplicável.
Relativamente a esta última correcção, o disposto no supra referido artigo 18.º do CIRC em nada interfere, na medida em que a retenção na fonte apenas é devida aquando do pagamento.
No que concerne à tributação autónoma, e tendo em conta que o referido artigo 88.º/8 do CIRC reporta a sua incidência a “despesas correspondentes a importâncias pagas ou devidas”, verifica-se que a AT optou, nas correcções que operou, por fazer incidir a mesma sobre as importâncias pagas.
Ora, tendo em conta que os pagamentos em causa, sujeitos a tributação autónomas, se deram no ano de 2012, nada haverá a censurar, sob a óptica do artigo 18.º do CIRC, às correcções em apreciação.
Já no que diz respeito às correcções operadas, relativamente aos pagamentos ora em questão, ao abrigo do artigo 65.º/1 do CIRC, dispõe o mesmo que:
“Não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável as importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, salvo se o sujeito passivo puder provar que tais encargos correspondem a operações efetivamente realizadas e não têm um caráter anormal ou um montante exagerado.”.
Conforme a mera leitura do preceito evidencia, a correcção em questão opera sobre a dedução “para efeitos de determinação do lucro tributável as importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável”.
Dos factos dados como provados resulta que a Requerente deduziu as importâncias devidas à I…, a que se reportam os pagamentos ora em análise, no exercício de 2011.
Foi esta dedução que, face à fundamentação das correcções operadas e ao quanto atrás se concluiu, que se deu em contravenção ao disposto no artigo 65.º/1 do CIRC.
Daí que, nos termos legais, a correcção da ilegalidade em que a Requerente incorreu se tivesse de dar naquele exercício de 2011, e não, como operou a AT, no exercício de 2012, já que neste a Requerente não procedeu a qualquer dedução relativa aos pagamentos em questão, pelo que nada há, a esse nível, a corrigir.
Deste modo, relativamente à correcção operada ao abrigo do artigo 65.º/1 do CIRC aplicável, com base nos pagamentos acima referidos, deverá proceder o pedido arbitral, já que enferma a mesma de erro nos pressupostos de facto, e, consequentemente, de direito, devendo ser anulada.
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Alega ainda a Requerente a ilegalidade das quantias liquidadas a título de retenção na fonte, por falta de fundamentação, bem como por não haver qualquer obrigação, da sua parte, em proceder à retenção na fonte de IRC.
Relativamente à arguida falta de fundamentação, verifica-se que resulta suficientemente do Relatório de Inspecção, designadamente das suas p. 33, 118 a 121, 124 e 125, que a retenção na fonte liquidada resulta da aplicação aos factos ali discriminados do regime do artigo 94.º, com referência aos artigo 4.º/3 e 4, e 87.º/4/e), do CIRC aplicável.
Deste modo, dever-se-á ter por cumprido o ónus em questão que assistia à AT.
No que respeita à obrigação de retenção na fonte, dispõe o artigo 94.º do CIRC aplicável, no que para o caso releva, que;
“1 - O IRC é objeto de retenção na fonte relativamente aos seguintes rendimentos obtidos em território português: (…)
f) Rendimentos referidos na alínea d) do n.º 3 do artigo 4.o obtidos por entidades não residentes em território português, quando o devedor dos mesmos seja sujeito passivo de IRC ou quando os mesmos constituam encargo relativo à atividade empresarial ou profissional de sujeitos passivos de IRS que possuam ou devam possuir contabilidade;
g) Rendimentos provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos e rendimentos de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, com exceção dos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se obtidos em território português os rendimentos mencionados no n.º 3 do artigo 4.º, excetuados os referidos no n.º 4 do mesmo artigo.”
Por sua vez, dispõe o artigo 4.º do mesmo CIRC que:
“3 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se obtidos em território português os rendimentos imputáveis a estabelecimento estável aí situado e, bem assim, os que, não se encontrando nessas condições, a seguir se indicam:
c) Rendimentos a seguir mencionados cujo devedor tenha residência, sede ou direção efetiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado:
6) Os provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos;
7) Os derivados de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, com exceção dos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras;
4 - Não se consideram obtidos em território português os rendimentos enumerados na alínea c) do número anterior quando os mesmos constituam encargo de estabelecimento estável situado fora desse território relativo à atividade exercida por seu intermédio e, bem assim, quando não se verificarem essas condições, os rendimentos referidos no n.º 7 da mesma alínea, quando os serviços de que derivam, sendo realizados integralmente fora do território português, não respeitem a bens situados nesse território nem estejam relacionados com estudos, projetos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio.”.
Na apreciação desta matéria, em oposição com o que acontece quanto à não dedutibilidade dos pagamentos, a que se refere o artigo 65.º/1, e à tributação autónoma, a que se refere o artigo 88.º/8, ambos do CIRC, não se poderá perder de vista que o ónus da prova da verificação dos respectivos pressupostos assiste à AT, já que “É à AT que cabe a obrigação da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável)”[8].
Tendo em conta o quadro normativo invocado, e sendo inequívoco e pacífico, que estão em causa pagamentos feitos por uma entidade residente em Portugal – a Requerente – a uma entidade não residente e sem estabelecimento estável neste país – a I…– e que os pagamentos em causa não constituíram encargo de estabelecimento estável da entidade pagadora situado fora de território nacional, cumpriria à AT demonstrar que:
a) Estão em causa rendimentos “provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos” ou de “prestações de serviços realizados ou utilizados em território português”;
b) Estão em causa rendimento provenientes de prestações de serviços que “respeitem a bens situados nesse território nem estejam relacionados com estudos, projetos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio.”.
Compulsada a matéria de facto apurada, não é possível validar qualquer dessas conclusões.
Com efeito, nada permite indicar, ao contrário do que se especula no Relatório de Inspecção Tributária, que a intervenção da I… em apreço se reporte à intermediação na celebração de quaisquer contratos, desde logo na medida em que não são conhecidos quaisquer contratos que hajam sido celebrados a jusante da intervenção daquela.
Por outro lado, face ao apurado, nada permite igualmente apurar que hajam sido prestados em território nacional quaisquer serviços pela I…, em função dos pagamentos em apreciação, ou sequer, que haja sido assumido tal compromisso, ainda que não efectivamente cumprido.
Por fim, e tendo em conta o teor das prestações assumidas pela referida I…, no contrato subjacente aos pagamentos sujeitos a retenção na fonte pela AT, atrás referidos, não se poderá concluir que estejam em causa serviços que “estejam relacionados com estudos, projetos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio”, já que, tal como definidos contratualmente, e sendo que nada de quanto se apurou permite concluir noutro sentido, os serviços contratados revestem-se da natureza de serviços de fiscalização e controle de qualidade.
Posto isto, haverá que concluir, todavia, que assiste razão à Requerente no que diz respeito à inaplicabilidade, in casu, de qualquer obrigação, da sua parte, em proceder à retenção na fonte de IRC, relativamente aos pagamentos referidos.
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Alega, ainda, a Requerente a ocorrência de vícios de forma, por violação do disposto nos artigos 55.º, 58.º, 59.º/1 e 2 da LGT, 6.º e 9.º do RCPIT, 153.º/2 do Código do Procedimento Administrativo, aplicável por força do disposto na al. c) do artigo 2.º da LGT e na al. d) do artigo 2.º do CPPT.
Ressalvado o respeito devido, entende-se que carecem de fundamento as alegações em questão já que, tanto quanto evidencia o processo administrativo e o Relatório de Inspecção Tributária, aquele decorreu em termos perfeitamente normais, tendo a AT actuado, dentro do quadro legal das suas funções e assumido uma postura que não se pode deixar de considerar aceitável, dentro dos poderes e deveres que lhe assistem, mormente aqueles a que se reportam os preceitos que a Requerente aponta como violados, e condensado as respectivas conclusões, certas ou não, nos termos previamente analisados, num relatório que é perfeitamente inteligível, não obstante a complexidade da matéria, veiculando de forma suficientemente explícita e coerente os pressupostos de facto e de direito que considerou verificados e em que assentam as correcções contra as quais a Requerente se insurge, sem que no apuramento daquele haja omitido diligências que se lhe impusessem realizar, ou realizado diligências que legalmente lhe estivessem vedadas.
Devem, pelo exposto, improceder os vícios arguidos pela Requerente atrás referidos.
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Deste modo, pelo exposto e em suma, conclui-se que deverá proceder o pedido de pronúncia arbitral, no que diz respeito à anulação do acto liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) referente ao exercício de 2012, objecto da presente acção arbitral, com excepção da parte relativa à tributação autónoma incidente sobre os pagamentos correspondentes às transferências n.º 5, 6, 7, 8, 9, 11, 14, 15, 16 e 17, constantes do quadro que integra o ponto 8 dos factos dados como provados.
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Quanto ao pedido de juros indemnizatórios formulado pela Requerente, o artigo 43.º, n.º 1, da LGT estabelece que são devidos juros indemnizatórios quando se determine, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
No caso, os erros que afectam a liquidação são imputáveis à AT, que praticou o acto de liquidação ilegal por sua iniciativa.
Tem, pois, direito a ser reembolsada a Requerente da quantia que pagou indevidamente (nos termos do disposto nos artigos 100.º da LGT e 24.º, n.º 1, do RJAT) e, ainda, a ser indemnizada pelo pagamento indevido através do pagamento de juros indemnizatórios, pela Requerida, desde a data do pagamento da quantia, até reembolso, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º/1 e 4, e 35.º/10, da LGT, artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.
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Formula, ainda, a Requerente o pedido de condenação da Requerida numa despesa equivalente às despesas e honorários dos seus mandatários, não indicando, todavia qualquer fundamento legal para a sua pretensão, quer de um ponto de vista substantivo quer processual.
Ressalvado o respeito devido a outras opiniões, entende-se que a opção pela jurisdição arbitral implica a renúncia à compensação das despesas cobertas pelas custas de parte, onde se incluem os honorários de advogado (artigo 25.º/2/d) do Regulamento das Custas Processuais).
Efetivamente, não se prevendo o pagamento de custas de parte na jurisdição arbitral, ao admitir-se a possibilidade de ser pedida, pelos contribuintes, compensação pelos encargos com mandatário, estar-se-ia a discriminar negativamente a AT, na medida em que, nas causas que vença, não se verá compensada pelas correspondentes custas de parte, nem poderá obter a correspondente compensação.
Deste modo, dever-se-á entender que, ao optar pela jurisdição arbitral tributária, quer a AT quer o contribuinte, estão a abdicar da compensação devida por despesas abrangidas pelas custas de parte.
Sem prejuízo do que vem de se dizer, entende-se ainda não caber na competência dos tribunais arbitrais em matéria tributária, a apreciação da pretensão indemnizatória em causa.
Com efeito, como se decidiu no Ac. do Pleno do STA de 30-04-2013, proferido no processo 03197/13[9]:
“Está atribuída aos tribunais administrativos a competência para a acção em que a parte vencedora em anterior demanda vem pedir indemnização pelos encargos que suportou como honorários a advogado, ainda que tal acção tenha decorrido perante os tribunais tributários.”
Considera-se, assim, tendo em conta, nos termos explicitados no referido aresto, o disposto nos artigos 4.º/1, 37.º/f) e 49.º, todos do ETAF, bem como o disposto no artigo 2.º do RJAT, verificar-se, quanto ao pedido em causa, a excepção da incompetência absoluta da incompetência em razão da matéria, de conhecimento oficioso e que obsta ao conhecimento do mérito do pedido.
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C. DECISÃO
Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar parcialmente procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:
a) Anular o acto liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) referente ao exercício de 2012, objecto da presente acção arbitral, com excepção da parte relativa à tributação autónoma incidente sobre os pagamentos correspondentes às transferências n.º 5, 6, 7, 8, 9, 11, 14, 15, 16 e 17, constantes do quadro que integra o ponto 8 dos factos dados como provados;
b) Condenar a Requerida no pagamento de juros indemnizatórios devidos desde a data do pagamento do imposto ora anulado, até ao reembolso integral da quantia paga;
c) Condenar as partes nas custas do processo, na proporção do respectivo decaimento, fixando no montante de € 4.534,00 a parte a cargo da Requerente, e no montante de € 10.460,00 a parte a cargo da Requerida.
D. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 1.096.739,41, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
E. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 14.994,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pelas partes, na proporção do respectivo decaimento, acima fixada, uma vez que o pedido foi parcialmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.
Notifique-se.
Lisboa 18 de Agosto de 2017
O Árbitro Presidente
(José Pedro Carvalho - Relator)
O Árbitro Vogal
(Leonardo Marques dos Santos – com declaração de voto)
O Árbitro Vogal
(Ana Maria Rodrigues)
Declaração de voto de vencido
Voto vencido o Acórdão supra, apenas quanto à decisão relativa aos pagamentos correspondentes às transferências n.º 5, 6, 7, 8, 9, 11,14, 15, 16 e 17, porquanto entendo, salvo o devido respeito pela opinião contrária, que a Requerente fez prova bastante de que os encargos correspondem a operações efetivamente realizadas e que não têm um caráter anormal ou um montante exagerado.
Em face do exposto, julgaria procedente o pedido de anulação da totalidade do acto de liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 2012.
18 de Agosto de 2017
Leonardo Marques dos Santos
[1] Concretamente: transferência n.º 1 de 13/01/2012, transferência n.º 5 de 3/05/2012, transferência n.º 6 de 8/06/2012, transferência n.º 7 de 18/06/2012, transferência n.º 8 de 31/07/2012, transferência n.º 9 de 29/08/2012, transferência n.º 11 de 13/09/2012, transferência n.º 14 de 24/02/2012, transferência n.º 15 de 28/02/2012 e transferência n.º 16 de 29/08/2012.
[2] PO (“Production Order”).
[4] PO (“Production Order”).
[6] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.
[8] Cfr. Ac. TCA-Sul de 16-01-2007, proferido no processo 00911/03, disponível em www.dgsi.pt.