DECISÃO ARBITRAL
Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), Leonardo Marques dos Santos e Álvaro José da Silva, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral:
I – RELATÓRIO
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No dia 16 de Janeiro de 2017, A..., pessoa coletiva n.º…, com sede na Rua …, n.º…, …-…, Sintra apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade do acto de indeferimento do Recurso Hierárquico apresentado, relativo à liquidação adicional de IRC n.º 2013…, referente ao exercício de 2011, no valor de €123.054,88.
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Para fundamentar o seu pedido alega a Requerente, em síntese:
i. a violação do dever de fundamentação, porquanto, no que diz respeito à correcção do benefício fiscal de Criação Líquida de Postos de Trabalho, o Relatório Final de Inspecção não discrimina quais os montantes que estão relacionados com a passagem de colaboradores, nem quais os montantes que se referem à substituição de trabalhadores;
ii. a preterição de formalidade essencial, por falta de notificação para o exercício do direito de audição prévia da decisão de indeferimento do recurso hierárquico;
iii. a violação do princípio da legalidade no tocante à correccção às mais-valias fiscais com intenção expressa de reinvestimento; e
iv. a violação do princípio da igualdade bem como ilegalidade no que diz respeito à aplicação do artigo 19.º do EBF que motivou correcções correspondentes à criação líquida de postos de trabalho.
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No dia 18-01-2017, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT.
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A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
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Em 13-03-2017, as partes foram notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar qualquer delas.
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Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 29-03-2016.
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No dia 15-05-2016, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se unicamente por impugnação.
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Atendendo a que não se verificava qualquer das finalidades que legalmente lhe estão cometidas, ao abrigo do disposto na alínea c) do artigo 16.º e no artigo 19.º do RJAT, bem como dos princípios da economia processual e da proibição da prática de atos inúteis, foi dispensada a realização da reunião a que alude o art.º 18.º do RJAT;
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Foi facultada às partes a possibilidade de, querendo, apresentarem, alegações escritas, o que fizeram, pronunciando-se sobre a prova produzida e reiterando e desenvolvendo as respectivas posições jurídicas.
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Foi fixado o prazo de 10 dias após a apresentação de alegações pela Requerida, ou o termo do respectivo prazo, para a entrega da decisão final, prazo esse que foi prorrogado por mais 30 dias.
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O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e do artigo 5.º e do n.º 1 do artigo 6.ºdo RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
O processo não enferma de nulidades.
Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.
Tudo visto, cumpre proferir
II. DECISÃO
A. MATÉRIA DE FACTO
A.1. Factos dados como provados
1- A ora Requerente é uma empresa que opera na área de distribuição alimentar, sendo proprietária de diversas lojas situadas em várias localidades do país.
2- A coberto da ordem de serviço n.º OI2013…, foi a Requerente alvo de procedimento de inspecção para verificação e comprovação da sua situação tributária em sede de IRC e IVA.
3- Concluída a prática dos actos inspectivos e após a elaboração do “Projecto de Relatório”, deram os Serviços de Inspecção Tributária (SIT) cumprimento ao disposto nos artigos 60.º da LGT e do RCPIT, notificando a Requerente para o exercício da audiência prévia.
4- Elaborado o Relatório Final de Inspecção, foram determinados ajustamentos à matéria colectável, bem como ao cálculo de imposto que resultaram na liquidação adicional objecto da presente acção arbitral, e que se reportaram às mais-valias relativas à alienação de viaturas ligeiras de passageiros ou mistas e aos montantes deduzidos a título do benefício fiscal de criação líquida de postos de trabalho.
5- No apuramento das mais-valias e menos valias de 49 veículos ligeiros de passageiros do activo fixo tangível, considerou a AT que a Requerente ao deduzir ao valor de aquisição o montante de depreciações consideradas para efeitos fiscais, não cumpriu com o disposto no n.º 2 do artigo 46.º do CIRC, o que levou a um ajustamento de €167.215,76.
6- No apuramento de menos valia fiscal relativa a um veículo ligeiro de passageiros do activo fixo tangível, considerou a AT que a Requerente não teve em consideração o disposto na alínea l) do n.º 1 do artigo 45.º do CIRC, e procedeu ao acréscimo ao resultado tributável de €419,85.
7- Mais considerou a AT que a Requerente deduziu indevidamente valores referentes à majoração dos encargos relativos à criação líquida de emprego, não tendo cumprido, no seu entender, os requisitos consagrados no artigo 19.º do EBF, o que originou a correcção de €1.024.597,95 ao resultado tributável.
8- Para efeitos de análise à majoração deduzida ao resultado tributável foi a Requerente notificada pessoalmente, em 09-05-2013, para apresentar os seguintes elementos:
a. Mapa que serviu de base ao cálculo do valor deduzido, discriminado por colaborador e com a indicação, para além do valor dos encargos majoráveis e da majoração que lhe estejam associados, o nome, o NIF, a data de nascimento, a data de efectividade, a data de desvinculação e a carga horária;
b. No caso do benefício fiscal contemplar trabalhadores admitidos ou que adquiriram o vínculo de efectividade no período objecto de análise, foram ainda solicitados os contratos de trabalho celebrados entre os trabalhadores admitidos em 2011 e o sujeito passivo, bem como os comprovativos da passagem a contrato sem termo para os funcionários que adquiriram efetividade no período de 2011. Para estes trabalhadores, foram ainda solicitados os comprovativos a que se referem as alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 19.º do EBF.
9- Para além do mais, do RIT consta que:
a. «Assim, os colaboradores cuja majoração foi desconsiderada pelos motivos anteriormente descritos encontram-se identificados com “(a)” na listagem que corresponde ao Anexo V do presente relatório, sendo que o montante deduzido a mais, pelo sujeito passivo, na sequência da situação descrita refere-se aos funcionários a que correspondem os valores inscritos na coluna “Correção 1” do Anexo V do presente relatório e ascende a € 848.780,03.»
b. «de acordo com os elementos disponibilizados pelo sujeito passivo, constatou-se que o mesmo não tinha ajustado o limite máximo de majoração anual ao período de trabalho a tempo parcial, pelo que se procedeu ao recálculo do referido limite, tomando em consideração o período de trabalho parcial, tendo-se obtido os valores constantes na coluna “Limite majoração proporcional carga horária (AT)”, do Anexo V do presente relatório.»;
c. «III.1.2. Mais-valias fiscais com intenção expressa de reinvestimento
O n.º 1 do art.º 46.º do CIRC reporta-se ao conceito de mais-valias e menos-valias fiscais, considerando que as mesmas representam os ganhos adquiridos ou as perdas sofridas relativamente a bens do ativo mediante a sua transmissão onerosa, assim como os resultantes de sinistros ou da afetação permanente desses bens a fins alheios à atividade exercida.
Por sua vez, o n.º 2 do artigo supra mencionado refere que “as mais-valias e as menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização (...) e o valor de aquisição deduzido (...) das depreciações ou amortizações aceites fiscalmente (...)”
Contudo, as instruções contidas no mapa 31, relativo ao apuramento das mais-valias e menos-valias fiscais, referem que no caso de viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, que não estejam afetas à exploração de serviço público de transportes nem se destinem a ser alugadas no exercício da atividade normal do sujeito passivo, relevam as depreciações praticadas na determinação da mais-valia ou menos valia fiscal.
Por sua vez, há ainda que ter em atenção o disposto na Circular n.º 6/2011 da DSIRC, que estabelece, no seu ponto 32.1, que o cálculo da mais-valia ou menos-valia fiscal é efetuado de acordo com o previsto no n.º 2 do art.º 46.º do CIRC, devendo considerar-se na respetiva fórmula de cálculo as depreciações praticadas.
No período de 2011 o sujeito passivo apurou, relativamente à alienação de diversos bens do ativo fixo tangível, uma diferença positiva entre as mais-valias fiscais (€ 73.866,38) e as menos-valias fiscais (€ 7.224,67), tendo acrescido no campo 740 do quadro 07 da DRM22 a importância de € 33.320,85 [(€ 73.866,38 - € 7.224,67) x 50%], de acordo com o preceituado no n.º 1 do artigo 48.º do CIRC, em razão de ter, expressamente, manifestado a intenção de proceder ao reinvestimento do valor de realização que se lhes encontrava associado, reinvestimento esse que se concretizou no ano de 2011.
Na sequência da análise efetuada ao mapa 31 de mais-valias e menos-valias fiscais, verificou-se que o sujeito passivo alienou 49 viaturas do seu ativo fixo tangível, adquiridas nos anos de 2001 a 2008, cujos valores de aquisição foram superiores a € 29.927,87. Na sequência destas alienações, apurou no mapa 31 uma diferença positiva entre as mais-valias fiscais (€ 29.728,03) e as menos-valias fiscais (€ 7.224,67) no montante de € 22.503,36, conforme os cálculos evidenciados no Anexo IV do presente relatório. Sucede, porém, que para o cálculo efetuado, e relativamente a cada uma das 49 viaturas alienadas, foram levadas em consideração, na coluna 10 do respetivo mapa, as depreciações aceites para efeitos fiscais em vez das depreciações contabilísticas praticadas, como resulta das instruções contidas no referido mapa e do estipulado na Circular n.º 6/2011 da DSIRC.
Ora, a al. e) do n.º 1 do art.º 34.º do CIRC, o n.º 1 do art.º 11.º do DR 25/2009, de 14/09 e a Portaria n.º 467/2010, de 07/07, ao estabelecerem uma limitação ao valor fiscalmente depreciável das viaturas ligeiras de passageiros ou mistas (€ 29.928,87 nos períodos anteriores a 2010, € 40.000,00 no período de 2010 e € 30.000,00 no período de 2011), impele a que as depreciações calculadas sobre os limites assim definidos, não concorrerão para a determinação do resultado tributável.
Com efeito, se o propósito da norma da al. e) do n.º 1 do art.º 34.º do CIRC é limitar as depreciações das viaturas no excedente a determinado valor, não faz sentido admitir que, na alienação do bem, a Autoridade Tributária anule aquele escopo normativo, utilizando no cálculo das mais-valias e menos valias fiscais as depreciações fiscalmente aceites ao invés das contabilizadas.
Daqui decorre que, aquando da alienação destes bens, na determinação das mais-valias ou menos valias fiscais, os valores que relevam são os do custo efetivo de aquisição (e não o valor limite) e o das depreciações praticadas na contabilidade (e não o respetivo valor máximo, reconhecido para efeitos fiscais), conforme se encontra expressamente clarificado nas instruções de preenchimento do mapa 31 de mais-valias e menos-valias fiscais e na Circular supra citada.
Na situação em concreto, em que 48 dos 49 veículos se encontram totalmente depreciados no momento da sua alienação, verifica-se que é nulo o respetivo valor contabilístico (o que significa que o bem foi utilizado pela Empresa durante toda a vida útil), pelo que o valor da mais-valia fiscal é exatamente igual ao da mais-valia contabilística, correspondente ao valor de realização.
Com efeito, e de acordo com os valores evidenciados no Anexo IV, se para o cálculo da mais-valia ou menos-valia fiscal deduzirmos ao valor de aquisição o montante das depreciações praticadas e não o das depreciações aceites para efeitos fiscais, constatamos que existe uma diferença positiva entre a mais-valia fiscal apurada relativamente à alienação das 48 viaturas totalmente depreciadas (€ 359.290,00) e a menos-valia fiscal da viatura não totalmente depreciada (€ 2.355,14), na importância de € 356.934,86, e não de € 22.503,36, como havia sido apurado pelo sujeito passivo, registando-se, deste modo, uma diferença de € 334.431,50 (€ 356.934,86 – € 22.503,36).
Deste modo, a diferença positiva entre as mais-valias fiscais (€ 403.428,35) e as menos-valias fiscais (€ 2.355,14), apuradas no mapa 31, ascende a € 401.073,21, e não a € 66.641,71, valor apurado pelo A…, pelo que no campo 740 do quadro 07 da DRM22 deveria ter sido acrescido o montante de € 200.536,60 (€ 401.073,21 x 50%).
Assim, atentos ao exposto, a legislação invocada e os cálculos efetuados, e tendo em consideração que o sujeito passivo mencionou a intenção de reinvestir o valor de realização, no quadro 09 do Anexo A da IES, de acordo com o estipulado no art.º 48.º do CIRC, procede-se à correção, para efeitos de apuramento do resultado tributável, do montante de € 167.215,75 (€ 334.431,50 x 50%), correspondente a 50% da diferença entre as mais-valias e menos-valias fiscais apuradas pela Autoridade Tributária e as mais-valias e menos-valias fiscais apuradas pelo sujeito passivo.»
d. «Verifica-se portanto que, é a data de admissão (ou de passagem) a contrato por tempo indeterminado que releva para efeitos de determinação da criação líquida de postos de trabalho em determinado período de tributação e que permite às entidades sujeitas a IRC a dedução majorada dos gastos suportados com os trabalhadores que a geraram que foram inicialmente seleccionados (apenas esses especificamente) para o efeito, ao longo dos cinco anos seguintes ao do inicio do referido contrato (um mesmo contrato/trabalhador e um mesmo posto de trabalho), dentro dos limites legalmente expressos.
e. Contrariamente ao defendido pela recorrente, este beneficio fiscal está temporalmente limitado a um período de cinco anos que se inicia na data do princípio da vigência do contrato de trabalho conforme n.º 5 do art. 19.º do EBF. A menção “do contrato de trabalho” inscrita naquela norma refere-se manifestamente ao contrato de trabalho de determinado trabalhador que para além de reunir as condições de entrada elegível foi nominalmente elegido para efeitos de definição da criação líquida de postos de trabalho no período de tributação em causa. Só assim se observa o objectivo ambicionado com a introdução deste benefício fiscal referente à criação de emprego estável e duradouro.»
f. «Ou seja, mesmo que nos períodos de tributação seguintes não haja criação liquida de postos de trabalho, é sempre possível efectuar a dedução até completar os cinco anos de vigência do contrato do contrato sem termo, desde que os trabalhadores que integram a criação líquida de postos de trabalho se mantenham na empresa nesses períodos.
Caso alguma das entradas (trabalhadores) elegível e seleccionadas “ab initio” pela entidade sujeita a IRC para efeitos de cálculo do benefício fiscal nas condições do art.º 19º do EBF, cessar o vínculo contratual com a empresa no decurso do período de cinco anos seguintes ao do início do contrato sem termo, terma a possibilidade de majoração dos gastos suportados por óbvia inexistência de base de cálculo, atendendo à inexistência de gastos com aquele trabalhador específico.»
10- A Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação subsequente, o qual foi objecto, em 12-10-2015, de despacho de indeferimento com os fundamentos constantes da Informação n.º …-…/2015.
11- Previamente à decisão de indeferimento referida, a Requerente foi notificada para exercer o seu direito de audiência prévia.
12- A ora Requerente recorreu hierarquicamente do indeferimento referido, através de petição que deu entrada em 13-11-2015, tendo o recurso sido parcialmente deferido, por despacho de 10-10-2016, com os fundamentos da Informação n.º I2016…, de 09-05-2016.
13- Previamente à decisão de deferimento parcial referida, a Requerente não foi notificada para exercer o seu direito de audiência prévia.
A.2. Factos dados como não provados
Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.
A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. n.º 2 do artigo 123.º do CPPT e n.º 3 do artigo 607.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. n.º 1 do artigo 511.º do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.ºdo RJAT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do n.º 7 do artigo 110.º do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13[1], “o valor probatório do relatório da inspecção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.
B. DO DIREITO
Começa a Requerente por arguir a falta de fundamentação do acto tributário objecto da presente acção arbitral, porquanto “Da fundamentação fornecida aquando do Relatório Final de Inspeção a ora REQUERENTE não conseguia determinar, com rigor, o quantum do indeferimento para duas das correções efetuadas pela AT”, concretamente no que diz respeito à “a passagem de colaboradores de contrato a termo para contrato a tempo indeterminado e a substituição de funcionários inicialmente considerados”, uma vez que “A AT efetua a correção ao benefício fiscal da CLPT sem discriminar (a) quais os montantes que estão relacionados com a passagem de colaboradores e (b) quais os montantes que se referem à substituição de trabalhadores.”.
Como é sabido, e ambas as partes o reconhecem, a fundamentação é uma exigência dos actos tributários em geral, sendo uma imposição constitucional (268.º da CRP) e legal (artigo 77.º da LGT).
Resumidamente, pode dizer-se que é hoje pacífico na doutrina e na jurisprudência nacionais que a fundamentação exigível tem de reunir as seguintes características:
1. Oficiosidade: deve partir sempre da iniciativa da administração, não sendo admissíveis fundamentações a pedido;
2. Contemporaneidade: deve ser coeva da prática do acto, não podendo haver fundamentações diferidas;
3. Clareza: deve ser compreensível por um destinatário médio, evitando conceitos polissémicos ou profundamente técnicos;
4. Plenitude: deve conter todos os elementos essenciais e que foram determinantes da decisão tomada. Esta característica desdobra-se em duas exigências, a saber: o dever de justificação (normas legais e factualidade – domínio da legalidade) e de motivação (domínio da discricionariedade ou oportunidade, quando é preciso uma valoração).
Ora, se a fundamentação é, nos termos referidos, necessária e obrigatória, tal não pode nem deve ser entendido de uma forma abstracta e/ou absoluta, ou seja, a fundamentação exigível a um acto tributário concreto deve ser a que funcionalmente é necessária para que aquele não se apresente perante o contribuinte como uma pura demonstração de arbítrio. Esta será – julga-se – a pedra de toque do cumprimento do dever de fundamentação: quando, perante um destinatário médio colocado na posição do destinatário real, o acto tributário se apresente, sob um ponto de vista de razoabilidade, como um produto do puro arbítrio da Administração, por não serem discerníveis os motivos de facto e/ou de direito em que assenta, o acto padecerá de falta de fundamentação.
Neste mesmo sentido, se orienta a jurisprudência do STA que considera que “a exigível fundamentação de direito do acto tributário será suficiente com a referência aos princípios jurídicos pertinentes, ao regime legal aplicável ou a um quadro normativo determinado, desde que, em qualquer caso, se possa concluir que aqueles eram conhecidos ou cognoscíveis por um destinatário normal colocado na posição em concreto do real destinatário.”[2].
O n.º 1 do artigo 77.º da LGT refere, assim, que: “A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.”.
Descendo ao caso concreto, verifica-se que os actos de liquidação em questão ocorreram na sequência de acto inspectivo e em conformidade com o relatório de inspecção tributária homologado por despacho, relatório esse onde constam os fundamentos das liquidações em causa, que a Requerente, desde a reclamação graciosa, demonstrou compreender, tomando, de maneira fundada, a decisão de não aceitar.
Concretamente, e no que diz respeito à dúvida suscitada pela Requerente, relativamente a não conseguir determinar, com rigor, o quantum do indeferimento para as correções efetuadas pela AT respeitantes à passagem de colaboradores de contrato a termo para contrato a tempo indeterminado e à substituição de funcionários inicialmente considerados, verifica-se que do relatório de inspecção consta expressamente que tais cálculos tiveram por base o mapa disponibilizado pela Requerente relativo ao cálculo do benefício fiscal em causa e as listagens de trabalhadores que constituíram a criação líquida no ano de 2006, sendo que os trabalhadores cuja majoração foi desconsiderada pelos motivos em causa foram identificados com a letra “(a)” na listagem do Anexo V ao RIT.
Verifica-se assim que, não obstante, como refere a Requerente, o RIT não discriminar quais os montantes que estão relacionados com a passagem de colaboradores e quais os montantes que se referem à substituição de trabalhadores, fornece aquele aos seus destinatários os dados suficientes para proceder a esses cálculos.
Não obsta a tal conclusão, a circunstância, apontada pela Requerente, de os números resultantes de tais cálculos poderem diferir entre o RIT e a decisão do Recurso Hierárquico, bem como a possibilidade de a Requerente entender e demonstrar que tendo por base os elementos indicados, os resultados deverão ser outros, ou mesmo que não é possível, rigorosamente, determinar cada montante relevante.
Com efeito, tal situação reconduzir-se-á não a uma falta de fundamentação mas a uma fundamentação errada.
Como se escreveu no Ac. do STA de 28-09-2011, proferido no processo 0494/11:
“II - A fundamentação do acto tributário de liquidação não é obscura nem insuficiente se explicita as razões que levaram a Administração Tributária a efectuar a correcção à matéria colectável declarada (...)
III - O facto de, porventura, a valia substancial dos fundamentos aduzidos no discurso fundamentador ser insuficiente ou inapta, do ponto de vista legal, para suportar a correcção efectuada, é matéria que não contende com a fundamentação formal do acto, mas sim com a sua fundamentação substancial.”
Deste modo, entende-se que, considerado o contexto concreto em que foi produzido o acto de liquidação em questão nos presentes autos, será perceptível, para um destinatário médio colocado na posição do destinatário real, que os fundamentos daqueles são os constantes do relatório de inspecção que o precedeu, sendo certo que mais se afigura claro que a Requerente compreendeu isso mesmo, pelo que deverá improceder o arguido vício de falta de fundamentação.
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Ainda no plano da forma, argui a Requerente a, provada, falta de notificação para o exercício de Direito de Audição Prévia, relativamente à decisão de indeferimento parcial do Recurso Hierárquico que interpôs.
Como explica Carla Castelo Trindade[3], “não são arbitráveis os vícios próprios dos actos de indeferimento de reclamações graciosas e recursos hierárquicos ou de pedidos de revisão do acto tributário porque escapam ao âmbito material da arbitragem tributária. Por outras palavras, estes actos de indeferimento só poderão ser “trazidos” para a jurisdição arbitral, na estrita condição de terem, eles próprios, apreciado a (i)legalidade do acto tributário que o sujeito passivo, verdadeira e efectivamente, pretende impugnar pela via arbitral.”. Ou seja, “O objecto do pedido de pronúncia arbitral será, então, a (i)legalidade do acto tributário de primeiro grau, independentemente de o sujeito passivo apontar como objecto da sua acção arbitral este (o acto de primeiro grau), ou o de segundo, isto sempre, desde que o de segundo aprecie a (i)legalidade do acto de primeiro grau.”.
Sem prejuízo do referido quanto às questões de competência descritas, sempre se dirá que, materialmente, não assiste razão à Requerente.
Com efeito, não obstante a doutrina a suscitar dúvidas de constitucionalidade relativas ao n.º 3 do artigo 60.º da LGT[4], que aqui não importa desenvolver, cumpre não esquecer os exactos termos em que a lei permite a dispensa do direito de audição: “Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dispensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais ainda se não tenha pronunciado” (negritos acrescentados). Assim, mesmo que o exercício do Direito de Audição Prévia permitisse à Requerente “nomeadamente, invocar a falta de fundamentação”, e que “existem novos elementos em sede de Recurso Hierárquico”, designadamente “uma alteração dos valores objetos de correção pela AT no âmbito do benefício fiscal da CLPT”, não existiria uma violação do disposto no n.º 5 do artigo 267.ºda CRP e no artigo 60.º da LGT.
Com efeito, os vícios ou deficiências próprias do acto praticado não são, manifestamente, “elementos novos” e muito menos “factos novos” como exige a lei. O mesmo se passa com a consideração de valores menores para a correcção relativa aos benefícios fiscais, que decorre de uma consideração ou apreciação diferente dos mesmos elementos, à luz dos argumentos aportados pela própria Requerente, e em benefício desta.
Assim, e por tudo o exposto, deve improceder, também nesta parte, o pedido arbitral.
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Insurge-se, seguidamente, a Requerente contra a correcção operada pela AT, no acto tributário sub iudice, relativa às mais-valias fiscais com intenção expressa de reinvestimento, relativamente às quais foi considerado ter sido efectuado de modo erróneo o apuramento das mais-valias fiscais relativas à alienação de viaturas ligeiras de passageiras ou mistas.
Neste âmbito, entendeu a AT que, para efeitos de apuramento das mais ou menos-valias fiscais, deveriam ser considerados não o montante das depreciações aceites fiscalmente mas sim o montante das depreciações praticadas na contabilidade.
Assenta, essencialmente a referida Autoridade o seu entendimento, no RIT e, por remissão, na Circular n.º 6/2011 da DSIRC, na consideração de que será intenção legal “a não recuperação, na venda, do montante das depreciações praticadas que, por força da limitação do valor depreciável estabelecido por lei, não foram fiscalmente aceites no período em que o bem esteve a ser depreciado.”.
Em causa está, em primeira linha, a aplicação do n.º 2 do artigo 46.º do CIRC, que na redacção aplicável prescrevia:
“2 - As mais-valias e as menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das perdas por imparidade e outras correções de valor previstas no artigo 35.º, bem como das depreciações ou amortizações aceites fiscalmente, sem prejuízo da parte final do n.º 5 do artigo 30.º.”
Não estando em causa a aplicação da parte final do n.º 5 do artigo 30.º, pretende-se saber se a referência operada no normativo transcrito a “depreciações ou amortizações aceites fiscalmente” deve ser compreendida na sua literalidade, como sustenta a Requerente, ou se, como considerou a AT, deve ser interpretada correctivamente, no que às viaturas ligeiras de passageiros ou mistas cujo valor de aquisição ou de reavaliação exceda o limite previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º do CIRC, no sentido de que nesses casos dever-se-á atender não às “depreciações ou amortizações aceites fiscalmente”, como expressamente mencionado, mas às depreciações ou amortizações efectivamente praticadas, na contabilidade, pelo sujeito passivo.
A resposta a tal questão implica uma devida valorização do elemento literal da interpretação, o que resulta numa interpretação declarativa (e não corretiva) da norma interpretanda.
Não interessando agora desenvolver a controversa questão da admissibilidade da interpretação corretiva no ordenamento jurídico nacional, nem a, ainda mais, controversa questão da admissibilidade da interpretação corretiva no âmbito do direito tributário, sempre será de confirmar que o fundamento invocado pela AT, para a hermenêutica por si sustentada, não é sequer apto a alicerçar a conclusão por si retirada, porquanto não se tem como resultante de forma suficientemente inteligível, do ordenamento jurídico globalmente considerado, que, nas palavras do Ilustre Mestre Prof. Doutor Baptista Machado[5], a lei “tomada à letra, abrange outras [hipóteses] que decididamente não estão no [seu] espírito”, que estejamos verdadeiramente perante “fórmulas legislativas abortadas ou de verdadeiros lapsos” ou que “a fórmula normativa é tão mal inspirada que nem sequer consegue aludir com uma clareza mínima às hipóteses que pretende abranger e, tomada à letra, abrange outras que decididamente não estão no espírito da lei” e que, por isso se torna necessário “ir mais além e sacrificar, em obediência ainda ao pensamento legislativo, parte de uma fórmula normativa”.
Sendo certo que, como refere a AT, a norma da alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º do CIRC limita, nas hipóteses nela abrangidas, o valor das depreciações fiscalmente aceites, e que a consideração destas para efeitos do apuramento de mais e menos valias, conforme prescrito expressamente pelo n.º 2 do artigo 46.º do CIRC em questão, poderá conduzir a situações em que as depreciações cuja relevância fiscal tenha sido excluída por aquela primeira norma aproveitem fiscalmente ao sujeito passivo, menos certo não é que não é possível afirmar que tal se deva a lapso ou inépcia do legislador.
De modo a poder validar tal conclusão, não é suficiente, como fez a AT, verificar que o efeito da alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º do CIRC não se mantém em determinados casos de aplicação literal do n.º 2 artigo 46.ºdo mesmo Código, sendo ainda necessário verificar qual a ratio legis daquela primeira norma, e demonstrar que a mesma fica flagrantemente esvaziada naqueles referidos casos.
Ora, no caso, não é isso que acontece.
O regime da alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º do CIRC tem subjacente, numa linha de continuidade com o regime de tributação autónoma dos encargos com viaturas, a consideração de que a utilização pelas empresas de viaturas acima de determinado valor não tem uma justificação integralmente empresarial, sendo, essencialmente, em função de tal juízo que se justificará a limitação das amortizações e reintegrações nos termos ali consagrados.
Nos casos abrangidos pelo n.º 2 do artigo 46.º do CIRC, não estamos já no campo da utilização dos veículos pelo sujeito passivo de IRC, mas no âmbito da sua alienação, o que vale por dizer que a norma em questão opera, justamente, nos casos em que aquele cessa de ter a disponibilidade na respectiva esfera da viatura cuja utilização a lei tem, no âmbito da alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º, por não integralmente justificável do ponto de vista empresarial. Ou seja, dito de outro modo, nas hipóteses de operatividade do n.º 2 do artigo 46.º em causa, o sujeito passivo está, precisamente, a actuar no sentido pretendido pelo legislador no âmbito da norma da alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º, desfazendo-se da(s) viatura(s) cuja aquisição e uso o legislador pretende desincentivar.
Por outro lado, os efeitos da interpretação declarativa do n.º 2 do artigo 46.º do CIRC não se sobrepõem totalmente aos efeitos da alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º do mesmo Código, já que por força deste último, enquanto não proceder à alienação das viaturas abrangidas pelo correspondente regime, o sujeito passivo apresentará um lucro tributável superior, ou um prejuízo tributável inferior, aos que existiriam se não fosse tal regime, com todas as consequências daí decorrentes.
Daí que, estando em causa situações distintas, em aspectos relevantes, não se possa afirmar, como se apontou atrás, que o teor literal do n.º 2 artigo 46.º do CIRC em causa, enferme de verdadeiro lapso, ou constitua uma fórmula legislativa abortada, já que o teor do mesmo, ainda que se possa ter – assim é a perspectiva da AT – como não correspondente ao mais sagaz dos legisladores, não é incompatível com o padrão de um legislador razoável, nos termos genericamente entendidos no contexto das práticas actuais, não se verificando qualquer violação da tributação pelo lucro real, até porquanto não se demonstram quaisquer circunstâncias que apontem ou indiciem que as variações patrimoniais da Requerente decorrentes das alienações em causa sejam efectivamente superiores às que foram corrigidas.
Assim, julga-se assentar a correcção ora em apreço em erro de direito – por errada interpretação do disposto no n.º 2 do artigo 46.º do CIRC aplicável, devendo como tal ser anulada, procedendo, nesta parte, o pedido arbitral.
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Questiona, por fim, a Requerente as correcções relativas ao benefício fiscal por criação líquida de postos de trabalho (CLPT), sustentando, em suma, que:
- Para efeitos do cômputo do período remanescente do benefício fiscal, pode admitir-se a substituição dos trabalhadores selecionados para o benefício fiscal da CLPT por outros trabalhadores, igualmente, elegíveis mas que, ab initio, não foram selecionados para verem os respetivos encargos majorados; e que
- O montante máximo da majoração anual, previsto no n.º 3 do artigo 19.º do EBF, não deve ser ajustado proporcionalmente ao período normal de trabalho, i.e. a majoração de um trabalhador a tempo parcial não deve ser proporcionalmente reduzida ao seu período normal de trabalho.
Vejamos cada uma destas questões.
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Em causa está o benefício fiscal previsto no artigo 19.º do EBF (criação de emprego para jovens), que na redacção aplicável ao facto tributário sub iudice, apresenta o seguinte teor:
“1 — Para a determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC e dos sujeitos passivos de IRS com contabilidade organizada, os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado, são considerados em 150 % do respectivo montante, contabilizado como custo do exercício.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se:
a) ‘Jovens’ os trabalhadores com idade superior a 16 e inferior a 35 anos, inclusive, aferida na data da celebração do contrato de trabalho, com exceção dos jovens com menos de 23 anos, que não tenham concluído o ensino secundário, e que não estejam a frequentar uma oferta de educação-formação que permita elevar o nível de escolaridade ou qualificação profissional para assegurar a conclusão desse nível de ensino;
b) ‘Desempregados de longa duração’ os trabalhadores disponíveis para o trabalho, nos termos do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, que se encontrem desempregados e inscritos nos centros de emprego há mais de 9 meses, sem prejuízo de terem sido celebrados, durante esse período, contratos a termo por período inferior a 6 meses, cuja duração conjunta não ultrapasse os 12 meses;
c) «Encargos» os montantes suportados pela entidade empregadora com o trabalhador, a título da remuneração fixa e das contribuições para a segurança social a cargo da mesma entidade;
d) «Criação líquida de postos de trabalho» a diferença positiva, num dado exercício económico, entre o número de contratações elegíveis nos termos do n.º 1 e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respetiva admissão, se encontravam nas mesmas condições.
3 — O montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é o correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida.
4 - Para efeitos da determinação da criação líquida de postos de trabalho, não são considerados os trabalhadores que integrem o agregado familiar da respetiva entidade patronal.
5 — A majoração referida no n.º 1 aplica-se durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho, não sendo cumulável, quer com outros benefícios fiscais da mesma natureza, quer com outros incentivos de apoio ao emprego previstos noutros diplomas, quando aplicáveis ao mesmo trabalhador ou posto de trabalho.”.
Compulsada a norma aplicanda, verifica-se que a mesma dispõe, no que para o caso interessa, que:
- “os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho (...), são considerados em 150 % do respectivo montante, contabilizado como custo do exercício.”;
- “consideram-se:
(...) «Criação líquida de postos de trabalho» a diferença positiva, num dado exercício económico, entre o número de contratações elegíveis nos termos do n.º 1 e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respetiva admissão, se encontravam nas mesmas condições.”.
Conjugados os dois segmentos normativos evidenciados, verifica-se que a norma resultante de tal operação vai no sentido de que “os encargos correspondentes a diferença positiva entre o número de contratações elegíveis nos termos do n.º 1 e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respetiva admissão, se encontravam nas mesmas condições, são considerados em 150 % do respectivo montante, contabilizado como custo do exercício.”.
Este enunciado, permite desde logo perceber que a relevância dos encargos para a consideração em 150% do respectivo montante, se afere em função de uma diferença de números (e não de um grupo concreto de trabalhadores) de contratações (e não de concretos contratos) elegíveis (e não eleitos). O facto de a lei utilizar um critério numérico “diferença positiva” em nada põe em causa o objetivo extrafiscal de criar novos postos de trabalho ou de facilitar a inserção ou reinserção no mundo laboral, revelando apenas uma preocupação com uma contabilidade global e objetiva que não tem por referência cada trabalhador, i.e., uma contabilidade subjetiva. Todas estas notas apontam de maneira suficientemente clara no sentido de que para efeitos do cômputo do período remanescente do benefício fiscal, pode admitir-se a substituição dos trabalhadores selecionados para o benefício fiscal da CLPT por outros trabalhadores, desde que igualmente elegíveis, mas que, ab initio, não foram selecionados para verem os respetivos encargos majorados.
Com efeito, o teor do regime normativo em questão denota que a relevância está na diferença entre o número de contratações e o número de saídas de trabalhadores elegíveis, e não entre o número de trabalhadores contratados e o número de saídas dos mesmos, como está subjacente à interpretação secundada pela AT, sendo irrelevante, na perspectiva de tal regime, que os procedimentos da organização administrativa para processamento do benefício passem pela individualização de trabalhadores a relevar para o efeito.
Não obsta ao entendimento exposto, a circunstância de no n.º 5 do artigo 19.º em questão, se refira que a majoração se aplica “durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho”.
Assim, e desde logo, a norma em questão não trata de definir os pressupostos de fruição do benefício fiscal em causa, mas unicamente de determinar a forma de contagem do prazo de duração do mesmo.
Por outro lado, a referida norma integra um grupo de preceitos do regime em causa que, pontualmente, conferem relevância aos trabalhadores que concretamente compõem o número atendido para o benefício em análise, como acontece com a exclusão de “trabalhadores que integrem o agregado familiar da respetiva entidade patronal”, e da cumulação com outros benefícios fiscais da mesma natureza e outros incentivos de apoio ao emprego previstos noutros diplomas, relativamente ao mesmo trabalhador.
Estas disposições, que justificarão, precisamente, que do ponto de vista do controle administrativo se imponha a necessidade de individualização dos trabalhadores a que concretamente se reporta o benefício usufruído, apontam antes no sentido de, na medida em que o legislador considerou relevante tal individualização, expressou-o devidamente, o que, como se viu, não ocorre na formulação dos pressupostos necessários àquela fruição.
Parece ainda impressivo o facto de nos números 1 a 4 do artigo 19.º do EBF a lei se referir globalmente a “postos de trabalho”, apenas aludindo a “contrato de trabalho” para especificar o tipo de vínculo laboral (i.e., por tempo indeterminado). Assim, uma vez mais, sem prejuízo de se poder invocar, no sentido de uma análise individualizada (contrato a contrato), o facto de o n.º 5 do artigo 19.º do EBF estabelecer que o período de cinco anos é contado “do início da vigência do contrato de trabalho”, sempre será de referir que, não apenas a referência inominada e coletiva a “postos de trabalho” é preponderante e maioritária ao longo de todo o artigo, como o termo inicial da contagem do prazo de cinco anos teria sempre que ter por base um contrato específico. A contagem não poderia ter por termo inicial “um” - qualquer - contrato de trabalho, mas sim “o” contrato de trabalho elegível, que pode ser posteriormente substituído por um novo contrato de trabalho, também ele elegível.
Não se acolhe igualmente o entendimento de que “a substituição de um trabalhador já vinculado à R., por outro que cessa o seu contrato de trabalho, não consubstancia um aumento efectivo de número de trabalhadores, nem tão pouco de postos de trabalho, pressupostos da concessão do benefício – ou seja, não preenche o pressuposto da “criação liquida de postos de trabalho”. Com efeito, o juízo de verificação ou não de um aumento efectivo de número de trabalhadores há-de necessariamente ser feito à luz do critério legal, ou seja, em função da diferença entre o número de contratações elegíveis nos termos do n.º 1 e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respetiva admissão, se encontravam nas mesmas condições, e não, obviamente, em função de outros critérios, como sejam o do número de trabalhadores que no momento da substituição se encontravam empregados.
Não se acolhe igualmente, o argumento de que o entendimento referido contraria a tutela de um interesse público extrafiscal – o do aumento de uma empregabilidade duradoura e estável, como alega a Requerida, já que o referido interesse público é devidamente assegurado com o aumento líquido, nos termos prescritos pela alínea e) do n.º 2 do artigo 19.º, do número de contratos de trabalho por tempo indeterminado, uma vez que, para além do mais, o regime próprio de tais contratos obsta a que a entidade empregadora, destinatária do benefício fiscal em discussão, faça cessar livremente tais contratos, que só se extinguirão por causas objectivas e/ou imputáveis ao trabalhador, circunstâncias que, obviamente, escapam ao domínio da referida entidade.
Esta circunstância, aliás, milita no sentido da interpretação ora proposta, na medida em que escapando, por norma, à vontade da entidade destinatária do benefício as situações de cessação dos contratos de trabalho de que aquele depende, seria desadequado que cessando um contrato determinado por razões alheias à beneficiárias (casuais ou imputáveis a terceiro), a mesma se visse privada do benefício, mesmo no caso em que assegurasse, nos termos legais, o aumento líquido dos postos de trabalho justificativo daquele.
Assim, e face a todo o exposto, considerando-se que para efeitos do benefício fiscal a que alude o artigo 19.º do EBF relevam os encargos correspondentes à diferença positiva entre o número de contratações elegíveis nos termos do número 1 e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respetiva admissão, se encontravam nas mesmas condições, admitindo-se, por isso, a substituição dos trabalhadores selecionados para o benefício fiscal em questão por outros trabalhadores, igualmente, elegíveis mas que, ab initio, não foram selecionados, enfermará o acto tributário objecto da presente acção arbitral de erro nos pressupostos de direito, devendo como tal, nessa parte, ser anulado, procedendo, na mesma medida, o pedido arbitral formulado.
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Coloca-se, por fim, a resolver por este Tribunal arbitral a questão de saber se o montante máximo da majoração anual, previsto no n.º 3 do artigo 19.º do EBF, deve, ou não, ser ajustado proporcionalmente ao período normal de trabalho de cada trabalhador eleito para efeitos do mesmo, ou seja, se a majoração de um trabalhador a tempo parcial deve, ou não, ser proporcionalmente reduzida na medida do seu período normal de trabalho
Em relação a tal questão, entendeu a AT que a resposta deveria positiva, ou seja, que estando em causa a contratação de trabalhadores a tempo parcial, o limite máximo do benefício fiscal em causa deveria ser reduzido, na mesma proporção existente entre o horário a tempo parcial em causa, e o horário completo.
Alega, em suma, a Requerida em tal matéria que, nos termos legais, se afere o direito à majoração dos encargos elegíveis, com base, entre outros, e para efeitos de cômputo dos encargos, no indicador “salário mínimo” e “retribuição mínima mensal garantida” determinada por lei, que tem como pressuposto o trabalho a tempo inteiro, que na data que releva para os autos, era de 40 horas semanais, pelo que se tem de concluir que a majoração a que alude o artigo 19.º tem, assim, em vista a ocupação de um posto de trabalho a tempo inteiro.
Para a Requerida, o não ajustamento do montante da retribuição mínima mensal garantida para efeitos do n.º 3 do artigo 19.º, redundaria num enviesamento do montante do benefício em favor da contratação de trabalhadores a tempo parcial em detrimento da contratação de trabalhadores a tempo completo, o que contraria os objectivos prosseguidos com a aplicação da medida em causa, para além de que sempre redundaria numa desigualdade de tratamento, entre as entidades que procedessem à contratação a tempo inteiro e aquelas que contratassem a tempo parcial.
Ressalvado o respeito devido, julga-se que a argumentação exposta encerra um erro de princípio, decorrente de assumir que a intenção da Lei é assegurar a ocupação do tempo do trabalhador e não o seu rendimento.
Com efeito, e sempre ressalvado o respeito devido a outras opiniões, considera-se que sob o ponto de vista do interesse público, o valor da criação de emprego (e, no caso, de emprego estável), está no rendimento que aquele assegura ao trabalhador, e não no volume de tempo deste que aquele ocupa.
Dito de outro modo, um emprego será tanto mais valioso sob o ponto de vista fiscal, quanto mais elevado for o rendimento que assegura ao trabalhador, e não quanto maior for a parcela do tempo deste que absorve.
Daí que se considere que para efeitos do benefício fiscal em causa, o que releva é o valor efectivamente pago ao trabalhador (os encargos efectivamente suportados com este), e não o tempo que aquele tem de trabalhar, para obter tal valor.
Tal entendimento, ao contrário do que sustenta a Requerida, não conduz a qualquer enviesamento, já que, como se vê, será indiferente, na perspectiva do benefício fiscal em questão, se a contratação ocorre a tempo parcial ou a tempo inteiro. Enviesamento resultaria, isso sim, do acolhimento propugnado pela Requerida, que se traduziria num incentivo à contratação, a tempo inteiro, sim, mas com salários baixos, e num desincentivo à contratação a tempo parcial, com salários mais elevados, bem como de mão de obra mais qualificada não se podendo deixar de ter presente que estamos sempre e em todos os casos (a tempo inteiro ou a tempo parcial), perante contratos por tempo indeterminado, pelo que os contratos a tempo parcial sempre tenderão a ver os seus horários alargados, já que entre comprometer-se com novos contratos de trabalho por tempo indeterminado, ou alargar a duração de contratos existentes, a tendência das empresas será, por regra, neste último sentido.
Não se verifica igualmente, ao contrário do que sugere a Requerida, em razão do entendimento que se vem de expor, qualquer preterição do princípio da igualdade em função de qualquer interesse relevante integrante do regime legal em causa.
Assim, prosseguindo com o exemplo que vem nos autos desde a fase procedimental[6], acrescentar-se-á ao mesmo, para melhor compreensão, duas outras situações, de trabalhadores contratados, com os mesmos horários, mas a auferir o salário mínimo nacional.
Deste modo, vistas as coisas nesta perspectiva mais abrangente, verifica-se que, como aponta a AT, na perspectiva ora subscrita, as entidades que contratem os trabalhadores com o salário de €1.000,00 mensais, fruirão do mesmo valor do benefício, que o trabalhador seja contratado a tempo inteiro, ou a meio tempo.
Todavia, o mesmo acontece com entidades que contratem trabalhadores nos mesmos termos, com um salário, por exemplo, de €10.000,00 mensais. Trata-se, em todos os casos, da operatividade própria do limite máximo do benefício fiscal, que fixa o encargo máximo que o Estado está disponível para arcar para servir o interesse prosseguido com aquele, e que, como tal, não encerra qualquer violação do princípio da igualdade.
Já tendo em conta as situações atrás aditadas ao exemplo, verifica-se que seguindo a posição subscrita pela Requerida, as entidades que contratassem com salário mínimo, usufruiriam do mesmo benefício que as entidades que contratassem com salário de €1.000,00.
Ora, esta situação é que constituiria um incentivo à contratação com salários baixos (e consequentemente de mão de obra menos qualificada) e uma desigualdade face aos valores subjacentes ao benefício fiscal em análise, já que entidades que criassem emprego com um valor igual (pagando o mesmo salário ao trabalhador, mas exigindo-lhe menos horas de trabalho) teriam um benefício fiscal menor que entidades que outras (pagando o mesmo salário ao trabalhador, mas exigindo-lhe mais horas de trabalho.
Assim, e face a todo o exposto, considera-se inexistir fundamento para a interpretação subjacente à correcção ora em causa, efectuada e aplicada pela AT, enfermando a mesma de erro nos pressupostos de direito e devendo, como tal, ser anulada, procedendo, também nesta parte, o pedido arbitral.
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Quanto ao pedido de juros indemnizatórios formulado pela Requerente, o n.º 1 do artigo 43.º da LGT estabelece que são devidos juros indemnizatórios quando se determine, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
No caso, os erros que afectam a liquidação são imputáveis à Autoridade Tributária e Aduaneira, que praticou o acto de liquidação ilegal por sua iniciativa.
Tem, pois, direito a ser reembolsado a Requerente da quantia que pagou indevidamente (nos termos do disposto nos artigos 100.º da LGT e n.º 1 do artigo 24.º do RJAT) e, ainda, a ser indemnizada pelo pagamento indevido através do pagamento de juros indemnizatórios, pela Requerida, desde a data do pagamento da quantia, até reembolso, à taxa legal supletiva, nos termos dos n.ºs 1 e 4 do artigo 43.º e n.º 10 do artigo 35.º da LGT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.
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C. DECISÃO
Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência,
a) Anular o acto de liquidação adicional de IRC n.º 2013…, referente ao exercício de 2011, no valor de € 123.054,88;
b) Determinar a restituição ao Requerente do imposto indevidamente liquidado e pago;
c) Condenar a Requerida no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos acima discriminados;
d) Condenar a Requerida nas custas do processo, no montante de € 3.060,00.
D. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 123.054,88, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
E. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €3.060,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerida, uma vez que o pedido foi totalmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.
Notifique-se.
Lisboa 25 de Agosto de 2017
O Árbitro Presidente
(José Pedro Carvalho - Relator)
O Árbitro Vogal
(Leonardo Marques dos Santos)
O Árbitro Vogal
(Álvaro José da Silva)
[1] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.
[2] Cfr., p. ex., Ac. do STA de 08-06-2011, proferido no processo 068/11.
[3] Regime Jurídico da Arbitragem Tributária - Anotado, Almedina, 2014, p.70.
[4] Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada e comentada, 4.ª Edição, 2012, pp. 508-509.
[5] Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 20.ª reimpressão, 2012, p. 186.
[6] O trabalhador “A”, que inicia o contrato de trabalho por tempo indeterminado a tempo completo (40 horas semanais) em 01 de Março de 2011, com encargos anuais majoráveis de €14.000,00 (€1.000,00/mês), e os trabalhadores “B” e “C” elegíveis e seleccionados para efeitos do benefício fiscal, que iniciem o contrato de trabalho por tempo indeterminado a tempo parcial (20 horas semanais/ fins de semana), em 01 de Março de 2011, com encargos majoráveis de €7000,00, cada (€500,00/mês)