Decisão Arbitral
RELATÓRIO
A…, LDA., contribuinte n.º…, com sede na Rua …, …, ..., …-… …, (doravante “A…” ou “Peticionante”), tendo sido notificada do indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação de IRC n.º 2015…, da liquidação de juros n.º 2015 … e da demonstração de acerto de contas n.º 2015…, respeitantes ao período de tributação de 2011, veio, em 24/11/2016, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e nos artigos 10º , 15.º e seguintes, todos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem Tributária - “RJAT”) deduzir um pedido de pronúncia arbitral contra as referidas liquidações de IRC, juros e demonstração de acerto de contas.
É requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante designada por AT).
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 07-12-2016. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável. As partes foram notificadas dessa designação em 07-12-2016.
Na sequência da comunicação efetuada de acordo com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 06-02-2017.
Descrição da situação
A A…, é detentora do parque eólico da …, com uma potência instalada total de 114 MW, através do qual exerce a atividade de produção e comercialização de energia elétrica mediante recurso à força do vento.
Na ausência, à data dos factos, de uma norma expressa na tabela anexa ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, que fixasse os moldes que a depreciação dos aerogeradores (integrados no domínio do ativo fixo tangível) devesse seguir, a A… entendeu que o período de vida útil associado a tais equipamentos corresponderia a 16 anos, aplicando a taxa de depreciação correspondente de 6,25%.
Por esta via, a A… contabilizou, no período de tributação de 2011, a depreciação anual dos aerogeradores adquiridos, a qual ascendeu a uma importância total de € 6.964.496,49.
Na sequência do procedimento de inspeção decorrente da ordem de serviço n.º OI2014…, de âmbito parcial, realizada ao IRC e respeitante ao período de tributação de 2011, a A… foi notificada do projeto de relatório da inspeção tributária proposto pela Divisão de Inspeção Tributária II, da Direção de Finanças de … (doravante “Serviços de Inspeção Tributária”), no qual se propunha a realização da seguinte correção, em sede de IRC:
Amortizações declaradas
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Amortizações corrigidas
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Correção
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€ 6.964.496,49
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€ 5.571.597,20
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€ 1.392.899,30
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Os Serviços de Inspeção Tributária, tendo por referência o disposto no artigo 31.º, n.º 2, do Código do IRC, e no artigo 5.º, n.º 3, do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, julgaram desadequada a taxa de depreciação de 6,25% praticada pela A… relativamente aos aerogeradores do Parque Eólico da …, por não considerarem razoável o período de vida útil definido pela sociedade inspecionada.
Para essa conclusão, os mesmos apoiaram-se na informação disponibilizada pelo fornecedor de equipamentos “B…”, de acordo com a qual o período de vida útil mínimo esperado para tais equipamentos seria de 20 anos. Consequentemente, os Serviços de Inspeção Tributária sustentaram que a taxa máxima de depreciação permitida para esses equipamentos seria de 5%. Assim justificaram a correção ao resultado fiscal declarado no montante de € 1.392.899,30, como consta da terceira coluna da tabela supra. Não tendo a A… exercido o seu direito de audição, veio o ofício n.º…, de 09.11.2015, dos Serviços de Inspeção Tributária, emitir a versão final do relatório de inspeção tributária, que mantinha a correção proposta nos exatos termos constantes do projeto de relatório.
Posteriormente, a A… foi notificada das demonstrações de liquidação de IRC, de juros compensatórios e de acerto de contas, das quais resultava um montante total de imposto e juros compensatórios a pagar que ascendia a € 277.228,92, cujo prazo de pagamento voluntário terminava a 8 de janeiro de 2016.
Não tendo a reclamante efetuado o pagamento dos referidos atos tributários, foi instaurado o correspondente processo de execução fiscal por parte do Serviço de Finanças de …- … (Processo n.º …2016…, tendo sido apresentada garantia bancária pelo montante de € 351.091,23, para efeitos de suspensão legal do processo (cfr. documento n.º 3).
Argumentos das Partes
Sobre a questão, as Partes requerente e requerida na lide terçaram os argumentos a seguir expostos.
Na fundamentação do seu pedido de pronúncia arbitral, os argumentos esgrimidos pela A… centram-se na viabilidade económica dos parques eólicos à luz do quadro regulatório que serve de base ao exercício da atividade de produção de energia renovável com o recurso à força do vento. Foram estes, em síntese, os argumentos fundamentais esgrimidos pela A… .
a) No tocante à correção mencionada no Relatório de Inspeção, a AT baseou-se numa interpretação incorreta das normas legais concretamente aplicáveis, não tendo percebido a racionalidade económica subjacente à adoção de um período de vida útil correspondente a 16 anos para a depreciação dos aerogeradores instalados no Parque Eólico da … .
b) É preciso ter em conta as especificidades próprias da atividade por si exercida e do respetivo quadro regulatório para se compreender o critério que foi seguido para aquele propósito.
c) Olhando ao disposto no Anexo II, ao Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio (nos termos da sua redação atual), verifica-se que as centrais renováveis licenciadas ao abrigo deste Decreto-Lei e do Decreto-Lei n.º 312/2001, de 10 de dezembro, serão remuneradas pelo fornecimento da eletricidade entregue à rede nacional de distribuição em média e alta tensão (“RND”) através de uma fórmula matemática que está enunciada naquele Anexo.
d) Tal fórmula possibilita que, de uma forma clara e objetiva, todos os agentes económicos ligados ao sector da produção de energia através de fontes renováveis tenham a noção exata e plena de qual será a remuneração que irão auferir durante um certo período de tempo.
e) De acordo com o § 20 do referido Anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, o montante de remuneração definido para as centrais eólicas garantido pelo Estado aos primeiros 33 gigawatts entregues à RND, por megawatt de potência de injeção na mesma, será atribuído até ao limite máximo dos primeiros 15 anos a contar desde o início do fornecimento de eletricidade à rede.
f) Ultrapassados esses 15 anos em que o Estado assegura uma remuneração certa e previsível aos agentes económicos (incluindo a requerente), não existem quaisquer garantias sobre como será efetuada a remuneração da energia que venha a ser produzida por parte das centrais de produção de energia renovável com recurso à força do vento.
g) Não tem conhecimento se as opções políticas vigentes no momento em que finde o “período de garantia remuneratória” serão tendentes a manter uma aposta na produção de energia através do recurso à força do vento.
h) Transcorrido o período de 15 anos em que a tarifa remuneratória a pagar pelo Estado se encontra garantida, a tarifa de mercado que venha eventualmente a ser aplicável nessa ocasião poderá não ser suficiente para salvaguardar a rentabilidade do seu Parque Eólico.
i) É possível antever uma acentuada quebra da rentabilidade económica dos investimentos realizados uma vez findo esse período, podendo a passagem da tarifa garantida para o mercado liberalizado colocar em causa a capacidade de a A… gerar réditos suficientes para fazer face aos custos inerentes à manutenção respetiva do parque eólico.
j) As informações constates dos portais online do OMIP – Operador do Mercado Ibérico de Energia (www.omip.pt) e do MIBEL - Mercado Ibérico de Eletricidade (www.mibel.com), mostram que a remuneração praticada atualmente em contexto de mercado liberalizado é significativamente inferior ao montante da remuneração garantida.
k) Uma quebra de rentabilidade (diminuição da receita que pode ascender entre 6 a 11 vezes face à remuneração auferida ao abrigo da tarifa garantia) seria – segundo as previsões da A…– de tal ordem que aqueles centros electroprodutores de energia renovável deixariam de ser capazes – findos os 15 anos de recebimento da remuneração legalmente garantida – de gerar réditos suficientes para cobrir os custos inerentes à sua manutenção e, nesse sentido, ter-se-ia de proceder ao seu desmantelamento.
l) A isto acresce o facto de ser nulo o valor residual dos aerogeradores, na medida em que não existe mercado para vender um aerogerador usado, nem o valor residual como sucata é suficiente para cobrir os custos de desmantelamento. Pelo que a A… não tem como garantir que, a partir daquele momento, irá continuar a explorar o Parque Eólico da … por muito mais tempo.
m) De acordo com as suas previsões, o Parque Eólico só é económica e financeiramente viável durante o período de tarifa garantida, tendo sido este o critério definido para a depreciação dos aerogeradores.
n) O acolhimento de um período de vida útil de 16 anos e não de 15, como seria de esperar numa lógica de alinhamento com o “período de garantia remuneratória”, nos termos acima expostos, justifica-se porque não será no momento imediatamente subsequente ao término do “período de garantia remuneratória” que o Parque Eólico será desmantelado.
o) O período adicional de sensivelmente 1 ano após o término “período de garantia remuneratória”, permitirá a avaliação da subsistência e a rentabilidade do Parque Eólico da …, sendo então aferidas as condições de mercado que irão vigorar nessa ocasião, no domínio tarifário. Este período será suficiente para que se possa tomar uma decisão consciente, responsável e que melhor sirva os interesses da empresa e dos seus acionistas.
p) A determinação do período de vida útil dos aerogeradores para efeitos da respetiva depreciação em sede fiscal, deve depender acima de tudo de uma análise económica, centrada na utilidade económica dos aerogeradores e não a sua durabilidade técnica, ainda que corretamente atestada pelo fornecedor do equipamento em causa.
q) O sentido do conceito de “vida útil esperada”, a que alude a lei, mais concretamente o artigo 31.º, do Código do IRC e o artigo 5.º do Decreto Regulamentar nº 25/2009, não deve nem pode corresponder ao período de durabilidade de um determinado ativo, devendo ser determinado em função da respetiva ratio legis.
r) Não contendo Tabela I, nem a Tabela II anexas ao Decreto Regulamentar nº 25/2009 uma previsão expressa acerca da taxa de depreciação que deveria ser praticada no caso de aerogeradores, no período a que reportam os factos, aplica-se o disposto no artigo 31.º, n.º 2, do Código do IRC nos termos do qual, quanto “aos elementos para que não se encontrem fixadas taxas de depreciação ou amortização, são aceites as que pela Direcção-Geral dos Impostos sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada”. (o sublinhado e o negrito são da requerente)
s) O facto de aerogeradores, individualmente considerados, terem um período de vida útil mínimo esperado de 20 anos, é neste âmbito irrelevante, rejeitando a associação do conceito fiscal de vida útil ou de utilidade esperada dos aerogeradores à durabilidade dos mesmos, numa lógica de garantia de bom funcionamento dada pelo respetivo fornecedor.
t) A utilidade prevalecente deve ser a utilidade económica e não a “durabilidade” do ativo.
u) O Sistema de Normalização Contabilística, onde vê sublinhado que a razão de ser das amortizações e depreciações decorre do facto de os bens terem “uma vida útil limitada”, devendo ser depreciados em função da sua utilização, no quadro de uma correlação dos gastos de uso de um ativo com os rendimentos que ele gera.
v) Nesse mesmo sentido apontam as taxas e os períodos de depreciação expressamente previstos nas Tabelas I e II anexas ao Decreto Regulamentar nº 25/2009, apresentando como exemplos estipulados na Tabela II para telemóveis (20% e 5 anos), automóveis ligeiros ou mistos (25% e 4 anos) e computadores (33,33% e 3 anos). Em todos estes casos os períodos de depreciação são fixados não em função da durabilidade dos equipamentos, mas da respetiva utilidade económica, sendo decisivo o critério do valor económico – conceito que correlaciona o de uso de um ativo com os rendimentos que ele gera.
w) O plano de negócios por si delineado, que presidiu à definição de uma taxa de depreciação de 6,25%, teve o intuito de permitir um encontro de contas entre os réditos gerados pelos aerogeradores e os custos associados à sua instalação e manutenção.
x) A favor da posição adotada invoca o disposto artigo 28.º do CIRC, onde se lê que “1 - São aceites como custos as reintegrações e amortizações de elementos do ativo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais os elementos do ativo imobilizado que, com carácter repetitivo, sofrerem perdas de valor resultantes da sua utilização, do progresso técnico ou de quaisquer outras causas.” (sombreado da Requerente).
y) O legislador fez apelo à razoabilidade da taxa de depreciação aplicada (artigo 31.º, n.º 2, do Código do IRC e artigo 5.º do Decreto Regulamentar nº 25/2009), sublinhando em seguida que a mesma não só atentou ao efetivo período de vida útil (económica) dos aerogeradores, como o fez tomando em consideração elementos objetivos – o alinhamento da taxa de depreciação praticada com o período de tarifa garantida – que pudessem fundamentar a admissibilidade e razoabilidade da taxa aplicada.
z) Conclui, não sem antes invocar abundante jurisprudência do CAAD, que o critério usado pela AT não teve em conta o critério legal da razoabilidade, ao fundamentar-se em exclusivo em elementos técnicos de natureza meramente teórica, desligados das condições concretas e efetivas em que a Requerente opera.
aa) A Comissão para a Reforma da Fiscalidade Verde, empossada pelo XIX Governo Constitucional, havia recomendado na sua proposta – na parte relativa à fixação do período de amortização de equipamento eólico e fotovoltaico – a fixação de período de amortização de equipamento eólico e fotovoltaico entre 12,5 anos e 25 anos, por sinal não longe de um estudo realizado pelo LNEG (documento 5).
bb) Tendo esta posição sido mais tarde seguida pelo legislador na Lei n.º 82-D/2014, de 31 de dezembro (“Lei da Fiscalidade Verde”), que passou a aceitar uma taxa de depreciação máxima de 8% (documento 1), sustenta-se a razoabilidade do período de 16 anos, já anteriormente aplicado pela A… .
cc) Invoca-se, a título comparativo, o exemplo dos projetos hidroelétricos. Com uma durabilidade muitíssimo superior a qualquer outra instalação geradora de eletricidade, podendo variar entre os 30 e os 80 anos, tem sido entendido pela AT que os as centrais hidroelétricas têm uma vida útil razoável e esperada de 16 anos – nos termos da Tabela I (Taxas Específicas), Divisão V (Eletricidade, gás e água), do Grupo I (Produção, transporte e distribuição de energia elétrica) do Decreto Regulamentar nº 2/90 – pelo que, por maioria de razão, os aerogeradores que estejam em funcionamento 15 anos nunca poderão ter uma vida útil esperada superior a 16 anos.
dd) Se no caso dos equipamentos de centrais hidroelétricas o prazo de depreciação e reintegração de 16 anos é aceite como “razoável”, idêntica conclusão será necessariamente aplicável ao prazo de amortização e reintegração dos aerogeradores.
ee) O regime de amortizações dos aerogeradores deve seguir o conjunto de todas as normas previstas pelo legislador no Código do IRC e no Decreto Regulamentar nº 25/2009 em relação a este tema, tais como: (i) as condições gerais de aceitação das amortizações; (ii) a valorimetria dos elementos do ativo imobilizado; (iii) o período mínimo e máximo de vida útil; (iv) os métodos de cálculo das amortizações; (v) Amortizações por duodécimos; etc., sendo que a aplicação das normas legais (v.g. artigos 3.º e 18.º n.º 2 do Decreto Regulamentar nº 25/2009 e 30.º n.º 6 do Código do IRC), levaria a fixar o período mínimo de vida útil daqueles equipamentos andaria então em torno dos 10 anos a que corresponderia uma taxa de amortização máxima de cerca de 10%.
ff) A Direção dos Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, da AT, já se pronunciou expressamente no sentido de que o “limite temporal da vida útil da central” (fotovoltaica) corresponde ao período em que se encontra vigente a tarifa garantida, tendo reconhecido que a taxa de depreciação aplicável aos painéis fotovoltaicos deve corresponder àquele período, por forma a permitir um encontro de contas entre réditos e gastos, devendo semelhante entendimento ser aplicado, por igualdade de razão aos aerogeradores, sob pena de violação do princípio da igualdade.
gg) A aplicação da taxa de amortização e depreciação proposta pela AT para os aerogeradores é claramente inconstitucional, na medida em que viola os princípios da igualdade, da proporcionalidade e da justiça material, implicando a sua penalização face a outras entidades produtoras de energia, como é o caso das centrais hidroelétricas.
hh) Em síntese, estão devida e plenamente justificadas as circunstâncias de cariz económico e de gestão que determinaram que – para o caso concreto dos aerogeradores por si adquiridos – fosse atribuído um período máximo de 16 anos de vida útil e que, em consequência, a taxa de amortização corretamente a aplicar fosse de 6,25%, pleiteando a ilegalidade e inconstitucionalidade da correção e consequente liquidação adicional efetuadas pela AT, e o consequente restabelecimento da situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, incluindo a indemnização por prestação de garantia indevida, nos termos legais.
Os argumentos apresentados pela AT procuram sublinhar a base legal e técnica da sua consideração da taxa de 5% como razoável e aceitável para a depreciação dos aerogeradores, correspondente a uma vida útil esperada de 20 anos, sendo esta determinante para a concretização do conceito de “período de utilidade esperada”. Com efeito, formam no essencial os seguintes os argumentos da AT:
a) No decorrer da ação de inspeção, foi detetado que a A… havia classificado e contabilizado determinados encargos como custos que, para efeitos de IRC, não assumem essa natureza, conforme previsto no artigo 34.º n.º 1 alínea c) do CIRC, não podendo por esse motivo ser considerados para efeitos de determinação do lucro tributável.
b) No caso sub judice, os aerogeradores são utilizados para a produção de energia mas não se encontram previstos nas tabelas anexas ao Decreto Regulamentar nº 25/2009 de 14 de setembro.
c) A lei não determina a taxa de depreciação ou amortização a aplicar aos aerogeradores destinados à produção de energia, antes remetendo para as taxas que pela AT sejam consideradas razoáveis tendo em conta o período de utilidade esperada.
d) Não obstante a inexistência deste tipo de aerogeradores nas tabelas anexas ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009 de 14 de setembro – em vigor na data a que se reportam os fatos – os mesmos foram indevidamente classificados como integrando a categoria “1230 - Equipamentos de centrais hidroelétricas” – a sua depreciação à taxa prevista naquele diploma para estes equipamentos (6,25%) corresponde a admitir que, para efeitos fiscais, os aerogeradores destinados à produção de energia elétrica têm um período de utilidade esperada de 16 anos.
e) Relativamente aos elementos para que não se encontrem fixadas taxas de depreciação ou amortização, são aceites as que pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada, de acordo com o previsto no n.º 2 do artigo 31º do CIRC.
f) A AT teve de recorrer ao critério previsto no artigo 31º nº 2 do CIRC e no artigo 5º nº 3 do Decreto Regulamentar nº 25/2009 para determinar a referida taxa.
g) Não obstante – na ausência de fixação taxas de depreciação ou de amortização – a AT aceitar taxas que considere razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada, de acordo com o n.º 3 do artigo 31.º do CIRC, conjugado com o n.º 3 do artigo 5.º dos Decretos-Regulamentares n.º 2/90, de 12/01 e n.º 25/09, de 14/09, a mesma tem aceitado, quanto aos bens em causa, uma taxa de amortização de 5% correspondente a 20 anos de vida útil, conforme parecer da Direcção de Serviços do Imposto sobre as Pessoas Coletivas, exarado na informação n.º 922/15 e onde são invocados estudos técnicos que sustentam que toda a indústria refere como tempo de vida útil de projeto o valor de 120.000 horas de funcionamento, o que com fatores de carga standard significa aproximadamente 20 anos.
h) A lei determina que só serão aceites as taxas de depreciação ou amortização que a AT considere razoáveis tendo em conta o período de utilidade esperada, tratando-se do único critério legal aceitável, já que o artigo 31º nº 2 do CIRC, na redação em vigor à data a que se reportam os factos, não utiliza as expressões “designadamente” ou “nomeadamente”.
i) Relativamente às depreciações dos parques eólicos (ativos fixos tangíveis como um todo), a taxa máxima de depreciação a aceitar para efeitos fiscais será de 5% nos períodos de tributação que se tenham iniciado antes de 1 de janeiro de 2015, ao abrigo do n.º 3 do artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009 de 14 de setembro.
j) As correções efetuadas têm como fundamento legal o disposto no artigo 31.º n.º 2 e 34.º n.º 1 do CIRC, em conjugação com o n.º 3 do artigo 5 do Decreto-Regulamentar n.º 25/2009, de 14/09.
k) A razoabilidade aí imposta resultará diretamente do “período de utilidade esperada”, conceito que terá um peso determinante na determinação da taxa de depreciação ou amortização, devendo ser entendido como “período de utilidade expectável, provável” e não “período de utilidade absolutamente exato, preciso e certo”.
l) A AT procedeu à consulta de vários fornecedores destes bens de equipamento, tendo verificado as práticas de outras empresas com o mesmo objeto social, com o objetivo de se apurar a melhor informação sobre a matéria em estudo, neste caso o tempo de utilidade esperada para os aerogeradores.
m) O Relatório da Inspeção Tributária entendeu que “quanto à questão do período de vida útil do equipamento básico, por consulta aos dados técnicos disponibilizados pelo fornecedor dos equipamentos em causa – B..., com o NIPC …, na sequência do pedido de esclarecimentos efetuado pela Direção de Finanças de …, relativamente a outra empresa do Grupo C…, designadamente a D… Lda., verificou-se que o período de vida útil para esses equipamentos é de 20 anos, pelo que os bens deveriam ter sido amortizados a uma taxa de 5% (que corresponde à percentagem da amortização a praticar por cada ano, durante 20 anos, para que o bem fique totalmente amortizado). Este período de 20 anos é consentâneo com a informação fornecida pelo fabricante dos equipamentos, bem como com a intenção de exploração dos parques para os quais foram constituídos direitos de superfície com os proprietários dos terrenos onde estão implantados os parques eólicos que incorporam os equipamentos em causa, conforme atrás referido.”
n) Todas as empresas que comercializam e ou fabricam aerogeradores, cuja informação teve a oportunidade de consultar e analisar, indicam o período de 20 anos como sendo o seu período de vida útil e, por conseguinte, o seu período e utilidade esperada.
o) O período de 20 anos de vida útil mínima é o período recomendado para a projeção das turbinas eólicas pelo Comité Internacional de Eletrónica, na sua norma 61400-1, tendo um estudo do LNEG e outros estudos académicos indicados perfilhado idêntica conclusão.
p) O estudo de impacto ambiental elaborado pelo “Ministère de l’ Écologie et du Développement Durable” (2005) francês, disponível na Web, aponta, na sua página 52, para um período de vida estimada dos aerogeradores de 20 a 30 anos, no fim do qual o explorador tem a responsabilidade de desmantelar o parque eólico e repor o local de implantação no seu estado original.
q) O “Renewable Energy Fact Sheet: Wind Turbines” elaborado pela “United States Environmental Protection Agency”, também disponível na Web, menciona, na sua página 2, uma vida útil típica de 20 anos.
r) A Direcção de Serviços do IRC, com base na sua metodologia de aquisição de conhecimentos e de apreciação, concluiu no mesmo sentido (Informação nº 922/15 de 2015-07-15, relativa ao Proc. 1530/15).
s) Não errou a AT ao exercer a discricionariedade técnica que lhe era cometida pelo art. 31.º n.º 2 do Código do IRC e pelo artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro.
t) Seguindo uma declaração de voto proferido no âmbito do Processo 593/2015, os tribunais devem manifestar deferência para com a administração quando esta exerce discricionariedade técnica “stricto sensu” na medida em que esta supõe um juízo de valoração assente em conhecimentos e regras próprias da ciência ou da técnica não jurídicas que estejam em causa, não cabendo aos tribunais controlar a boa ciência ou a boa técnica empregues pela entidade administrativa, por manifesta falta de competência nas matérias extrajurídicas para tanto necessária.
u) Diante da discricionariedade técnica o controle jurisdicional terá que limitar-se à verificação do respeito, ou não, dos limites legais da discricionariedade, dos limites positivos que presidiram à atribuição legal do poder discricionário e correspondentes prerrogativas – podendo especificamente sindicar-se, nas “fronteiras da “margem da livre apreciação”, (1) um erro grosseiro ou manifesto de apreciação (2) um erro nos pressupostos de facto (3) um desvio de poder ou (4) a violação manifesta dos princípios gerais da imparcialidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da boa-fé como princípios conformadores da atividade administrativa.
v) O Tribunal não pode sindicar aqueles juízos, por muito que eles divirjam do entendimento dos particulares ou do entendimento do próprio julgador – tendo o Tribunal que cingir-se às zonas de vinculação adjacentes, e quando muito demonstrar, através de outras informações técnico-profissionais corroboradas por especialistas, que as informações e estudos utilizados pela Administração para a pretendida densificação de conceitos extrajurídicos, insistindo em seguida que a mera divergência de juízos entre a Administração e os particulares, ou até entre a Administração e o Tribunal não constitui prova de qualquer erro ou vício do ato impugnado que seja passível de sindicância contenciosa, não legitimando o tribunal a substituir-se à administração na formulação de um juízo que cabe estritamente no mérito e na oportunidade da ação desta.
w) Apenas em casos de erro grosseiro em que possa concluir-se que a Administração exorbitou dos seus poderes e saiu abertamente do campo da discricionariedade técnica para entrar no da ilegalidade, a ponto de o tribunal poder anular a decisão administrativa em causa, é pacífico que este não pode substituir a decisão administrativa anulada por outra que reputa mais adequada – ou seja, não pode, sem violação do principio constitucional da separação de poderes, avocar para si aquela discricionariedade técnica.
x) Um Tribunal pode achar que é mais razoável o prazo proposto pela A…, ou pode ao invés achar que é mais razoável o prazo proposto pela AT – mas essa avaliação é irrelevante no caso, na medida em que a taxa de depreciação de 5% propugnada pela AT e o correspondente período de 20 anos de vida útil das turbinas refletem um entendimento que resulta e converge com a opinião de cientistas independentes e com literatura cientifica atualizada, bem como com a opinião das empresas supra referidas que comercializam e/ou fabricam aerogeradores.
y) A vida útil dos aerogeradores apresenta uma forte ligação à viabilidade económica do parque eólico, sendo que nalguns estudos referem-se a períodos de operação de 35 a 40 anos. O peso de manutenção e das reparações aumenta com a idade e o uso dos equipamentos, pelo que a rentabilidade máxima de um parque eólico situa-se entre os 20 e 25 anos.
z) A AT não errou ao exercer a discricionariedade técnica que lhe era cometida pelo art. 31.º n.º 2 do Código do IRC e pelo art. 5.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, e menos ainda a AT errou gravemente, em termos que permitissem a impugnação contenciosa do exercício legal do seu poder discricionário.
aa) A Requerente tem ao seu dispor a possibilidade consagrada no artigo 31º-B do CIRC[1], que estabelece que quando os factos que determinaram as desvalorizações excecionais (ex: inovações técnicas excecionalmente rápidas ou alterações significativas) dos ativos e o abate físico, o desmantelamento, o abandono ou a inutilização ocorram no mesmo período de tributação, o valor líquido fiscal dos ativos pode ser aceite como gasto do período.
bb) O conceito de utilidade económica não tem qualquer fundamento legal, nem a A… apresenta um suporte legal que lhe permita defender que o conceito fiscal de período de vida útil esperada corresponde à sua interpretação, sendo a referência à palavra “económica” um acrescento imputável ao “espírito legislativo e inovador” dessa empresa.
cc) Das normas legais analisadas resulta claro que estamos a falar da vida útil de um bem, e não de uma qualquer vida económica.
dd) A vida útil de um bem, de acordo com a NCRF 7 (NCRF publicadas pelo Aviso nº 15 655/2009, D.R. nº 173, Série II, de 2009-09-07) é o período durante o qual uma entidade espera que o bem esteja disponível para a sua utilização, não podendo depender da performance económica de um determinando sujeito passivo ou do projeto em que o bem a amortizar está inserido.
ee) Os ativos fixos tangíveis possuem normalmente uma vida útil limitada e, como tal, devendo ser depreciados em função da sua utilização por parte de cada entidade.
ff) A determinação da taxa de depreciação ou amortização não está, nem pode estar em relação direta com os lucros ou prejuízos que a atividade da A…, ou de qualquer outro sujeito passivo, possam originar.
gg) O critério apontado pelo artigo 31º nº 2 do CIRC não é o da “razoabilidade da taxa, tendo em conta os lucros ou prejuízos da atividade do sujeito passivo…", mas sim o da “razoabilidade da taxa, tendo em conta o período de utilidade esperada”.
hh) O critério do período de vida útil esperada tal como utilizado pela AT é objetivo, ao contrário do utilizado pela A…, de sentido subjetivo por depender da performance económica dos sujeitos passivos.
ii) A interpretação defendida pela A… causará necessariamente situações de desigualdade entre diferentes sujeitos passivos que desenvolvam a mesma atividade da empresa aqui em causa e que utilizem os mesmos bens, já que defende uma dependência da determinação das taxas de amortização da performance económica de cada sujeito passivo.
jj) Está-se perante um simples caso não regulado e não diante de uma lacuna, assumindo o legislador, no artigo 31º nº 2 do CIRC, a intenção de não regular exaustivamente nessa matéria e a disponibilidade para não fixar taxas de depreciação ou amortização de determinados bens e remeter para o período de vida útil do bem a amortizar e para a discricionariedade técnica (balizada pela "razoabilidade") da AT.
kk) O estudo realizado pela H… (H…), mobilizado pela A…, tem como destinatários os Estados, tendo um carácter meramente orientador dos investimentos estatais e levando a cabo uma análise dos custos e benefícios que a energia hidroeléctrica poderá acarretar para um Estado, não versando sobre a energia produzida por aerogeradores.
ll) Da Divisão V do Grupo I - Produção, transporte e distribuição de energia eléctrica da tabela I anexa ao Decreto Regulamentar nº 25/2009 resulta que existem outros equipamentos que têm taxas inferiores à de 6,25% prevista para as hidroeléctricas.
mm) Para as obras hidráulicas fixas está prevista uma taxa de 3,33%, para as subestações e postos de transformação e para as Linhas de AT e suportes está prevista uma taxa de 5% (Tabela I anexa ao Decreto Regulamentar nº 25/2009) pelo que a A… não pode afirmar que não existem outros equipamentos e/ou instalações aos quais se aplique uma taxa inferior a 6,25%.
nn) A A… não pode utilizar um mero estudo sobre as Hidroeléctricas para determinar a taxa de depreciação ou amortização aplicável aos aerogeradores, pois constituem realidades totalmente distintas.
oo) Aa taxa de 6,25% não pode ser justificada através do regime estabelecido no Decreto-Lei nº 189/88, de 27 de maio – que regula a atividade de produção de energia elétrica que se integre, nos termos do Decreto-Lei n.º 182/95, de 27 de julho, revogado pelo Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, no Sistema Elétrico Independente, mediante utilização de recursos renováveis ou resíduos industriais, agrícolas ou urbanos – já que aí apenas se regula a remuneração em causa, nunca se referindo qualquer período de utilidade esperada, sendo que as respetivas normas sugerem que os equipamentos em causa têm uma duração superior a 15 anos ao utilizarem a expressão “os primeiros 15 anos”.
pp) Deste modo, se a licença a que se refere o ofício da DSIRC (documento 6) tem uma duração limitada de 20 anos, a mesma é amortizável durante esse período de tempo, sendo que aquele documento não faz depender a determinação da taxa de depreciação/amortização dos aerogeradores da existência de uma tarifa garantida.
qq) A AT atuou em conformidade com o disposto no artigo 31º nº 2 do CIRC, tendo determinado a taxa de depreciação ou amortização que resulta dos períodos de utilidade esperada de 20 anos expressamente indicado pelas entidades fornecedoras dos aerogeradores com conhecimento especializado na matéria em questão, bem como por estudos técnico-cientificos.
rr) A aplicação da taxa de 5% aos aerogeradores não é injustificada ou desproporcional, uma vez que resulta diretamente do período de utilidade esperada supra referido.
ss) A AT está vinculada ao princípio da verdade material (artigos 5° e 6° do RCPIT) e nessa medida adotou todas as diligências que lhe eram exigíveis e adequadas à descoberta da verdade material, ou seja, determinar com objetividade, rigor e segurança a taxa de amortização, conforme previsto no artigo 31º nº 2 do CIRC.
tt) A fixação de uma taxa de amortização a aplicar aos referidos de 5% tem fundamento no artigo 31º nº 2 do CIRC e no artigo 5º nº 3 do Decreto Regulamentar nº 25/2009.
Reunião art. 18º RJAT
No processo foram arroladas e ouvidas como testemunhas E…, Técnico de Energia Eólica, com domicílio profissional na …, n…, …, …-… Lisboa; e F…, Diretora de Contabilidade, com domicílio profissional na …, n.º…, …, … …-… Lisboa.
A primeira testemunha, de nome E…, não obstante ter reconhecido uma relação funcional com o grupo da A…, afirmou que isso não o impedia de depor com independência e verdade. Quando interrogado pelo advogado, pela autoridade tributária e pelos árbitros, o mesmo disse:
a) Sobre a vida útil dos aerogeradores e o sentido do relatório da inspeção tributária, (ver gravação áudio CAAD), afirmou que a norma internacional pertinente obriga a que os aerogeradores sejam projetados pelos fabricantes para uma vida útil de vinte anos. Isso vale para os geradores em causa, da G…, e para todos os demais, já que têm que seguir essa mesma norma. Essa projeção técnica de vida útil é feita por antecipação, antes da confirmação da sua efetiva vida útil no terreno.
b) De acordo com o depoente, a garantia dos equipamentos é apenas de 1 ano e não de 20 anos. A partir de um ano, os problemas técnicos correm por conta da empresa proprietária do aerogerador e não por conta do fabricante. O prazo de 20 anos é importante para a obtenção do financiamento bancário.
c) Os 20 anos são um prazo tendencial, insuscetível de verificação empírica, sendo que o mais importante é a observância dos procedimentos de verificação de qualidade impostos pela norma internacional.
d) O depoente afirmou que os aerogeradores foram sendo objeto de renovação e substituição das várias partes componentes, o que representa uma substituição substancial do aerogerador. Na prática, diz o depoente, os aerogeradores só resistem ao passar do tempo mediante a substituição dos seus elementos, sem prejuízo da diminuição gradual da respetiva utilidade económica.
e) De acordo com o E…, o transcurso do prazo da tarifa garantida de 15 anos pode inviabilizar economicamente muitos parques eólicos. Em seu entender, o prazo de 15 anos para essa tarifa não pode ser dissociado de uma expectativa acerca da sua vida útil, que o LNEG situava entre um mínimo de 12,5 anos e um máximo de 20 a 25 anos, estudo que esteve na base da reforma da fiscalidade verde.
f) O parque da A… está em funcionamento desde 2008, sendo que os aerogeradores já viram muitos dos seus elementos (v.g. hubs, pás, transformadores) originários substituídos, o que corresponde, na prática, a um reequipamento do parque.
g) Para ele, 15 a 16 anos é uma longevidade acima da qual o aerogerador perde utilidade e incorre em custos acrescidos de manutenção, perdendo competitividade mesmo com a tarifa garantida.
h) A obsolescência vai-se acentuando a partir dos 10 ou 12 anos de vida útil, como reconhecido pelo estudo do LNEG, sendo maiores os custos de manutenção e a dificuldade em encontrar peças adequadas, tornando inviável a manutenção do parque em serviço e destruindo qualquer valor residual dos aerogeradores mesmo depois de desmantelado o parque eólico, não havendo um mercado para aerogeradores em segunda mão.
i) Ao fim de 15 anos a única opção é adquirir novos e mais eficazes aerogeradores, não fazendo sentido manter os existentes.
j) O prazo de vida útil de 20 anos não é razoável, porque não há maneira de garantir a sua longevidade durante esse tempo sem operações de substituição dos seus principais componentes (v.g. hubs, pás) operações essas que não se reconduzem à simples manutenção.
k) Quando os fornecedores falam de uma vida útil de 20 anos, fazem-no em abstrato e sem comprovação empírica.
l) A longevidade técnica e funcional dos aerogeradores é indissociável da tarifa praticada, não podendo a viabilidade económica dos aerogeradores ser aferida em abstrato. Essa viabilidade, pressupondo uma análise de custos e benefícios, depende sempre da tarifa praticada, seja ela regulada ou definida pelo mercado.
m) Os contratos de operação e manutenção celebrados pela A… com o fabricante dos aerogeradores tem a duração de 15 anos e impõem uma revisão preço aos 5 e 10 anos, na medida em que a verificação da operação e a manutenção dos aerogeradores implica custos com inspeções, reparações e substituição de peças que vão aumentando.
n) Muitos parques eólicos envolvem custos de manutenção que acarretam perdas para os fabricantes, que têm que ser compensados com ganhos noutros parques.
o) Todos os anos, desde há 40 anos para cá, surgem novos aerogeradores sendo a sua evolução técnica um processo gradual.
p) As trocas de pás e de outros componentes dos aerogeradores são frequentemente indispensáveis para a garantia da potência inicialmente projetada e contratada para o aerogerador.
q) Ao fim de alguns anos, dada a obsolescência das máquinas, torna-se economicamente mais vantajoso e competitivo proceder à substituição de toda a máquina eólica por uma nova mais tecnicamente mais evoluída e energeticamente mais eficaz e eficiente. Foi essa a opção para o primeiro parque da A… .
r) Na análise das empresas eólicas atende-se aos custos de aquisição (v.g. 900 000€/MW, em máquinas de 2MW), custos de acesso, custos de manutenção e expectativa de retorno.
s) Não é lhe é possível estimar com precisão a percentagem dos custos de manutenção nos custos totais.
t) Os 20 anos constante do certificado não tem grande valor, a não ser para os bancos, não servindo de garantia nenhuma.
u) Em seu entender, deve concordar-se com a afirmação do estudo do LNEG, segundo o qual a um prazo mínimo de 20 anos de vida útil, tal como aceite pela AT, corresponderia um prazo máximo de 40 anos, o que não é sustentável.
A segunda testemunha, de nome F…, Diretora de contabilidade da empresa A… e das empresas do grupo, interrogada sobre o período de tarifa garantida e da duração estimada dos aerogeradores e as condições de exploração dos parques eólicos afirmou:
1) Não é uma coincidência ter sido determinado um prazo de 15 anos para a tarifa garantida e a vida económica útil dos aerogeradores.
2) Os aerogeradores representam um peso de 70% a 80% do investimento estatal, sendo que a sua amortização a 20 anos, para lá da tarifa garantida, torna economicamente inviável a operação dos aerogeradores.
3) A amortização dos aerogeradores tendo por referência as centrais hídricas afigura-se razoável, por maioria de razão, na medida em que estas são amortizáveis em 16 anos apesar de terem uma durabilidade física muito superior.
4) Uma outra empresa do grupo encontra-se em desmantelamento ao fim de 14 anos em virtude da obsolescência das máquinas e à conveniência da sua substituição por outras.
5) Os aerogeradores não têm qualquer valor residual depois da cessação da sua utilização, havendo que contabilizar o custo do desmantelamento e da remoção dos mesmos.
6) A licença de exploração do parque não tem prazo, não tendo qualquer relação com a questão da vida útil dos aerogeradores.
7) A contratualização da utilização dos terremos para exploração dos parques eólicos entra em linha de conta com outros fatores (v.g. estudos técnicos; interesses económicos dos proprietários; eventual continuação da exploração com novos aerogeradores) para além da questão concreta da vida útil dos concretos aerogeradores utilizados.
8) A inspeção tributária realizada teve uma natureza interna, nunca tendo manifestado abertura a considerar um intervalo entre limites mínimos e máximos de vida útil.
9) Mesmo que o prazo de tarifa garantida fosse de 20 anos, não seria certo que a exploração dos aerogeradores fosse compatível com a sua amortização em 20 anos, dependendo isso de uma análise dos custos incorridos, nomeadamente em manutenção, e da própria disponibilidade das empresas fornecedoras de celebrar contratos de manutenção economicamente viáveis durante todo esse tempo.
Finda a audiência, as partes manifestaram a sua intenção de apresentar alegações por escrito, o que só a AT fez, a 4 de maio de 2017, invocando u os apoios doutrinais e jurisprudenciais considerados relevantes e reiterando os argumentos aduzidos na contestação. Sintetizam-se os principais tópicos da sua retórica argumentativa:
1. O cálculo das depreciações e amortizações deve ser feito, em regra, pelo método das quotas constantes (artigo 30.º n.º1 do CIRC). Relativamente aos elementos para que não se encontrem fixadas taxas de depreciação ou amortização, são aceites as que pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada, de acordo com o previsto no n.º2 do artigo 31º do CIRC. A AT teve que recorrer ao critério previsto no artigo 31º nº 2 do CIRC e no artigo 5º nº 3 do Decreto Regulamentar nº 25/2009 para determinar a referida taxa.
2. A lei não determina a taxa de depreciação ou amortização a aplicar aos aerogeradores destinados à produção de energia, antes remetendo para as taxas que pela AT sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada. O único critério que a lei impõe à AT é que esta, na determinação da taxa de depreciação ou amortização, observe o "período de utilidade esperada".
3. A AT procurou, em todos os meios, informação sobre os aerogeradores, nomeadamente estudos técnicos de fiabilidade mecânica, quer junto dos fabricantes ou fornecedores, quer nas páginas web de instituições ligadas às energias renováveis. E conforme todas as empresas que comercializam e ou fabricam aerogeradores, cuja informação a AT teve a oportunidade de consultar e analisar, indicam o período de 20 anos como sendo o seu período de vida útil. A AT, à data dos factos, munida da informação técnica que reuniu, determinou a taxa de depreciação com base em critérios de razoabilidade. Do próprio depoimento de E… conclui-se que não se pode considerar desrazoável o critério aplicado pela AT.
4. No que concerne ao período de vida útil dos aerogeradores em Portugal encontramo-nos no domínio das suposições, pois não foi, até à data, desmantelado nenhum parque eólico com fundamento na obsolescência dos aerogeradores. A principal preocupação da Requerente tem subjacente motivos puramente económicos e não a real durabilidade do equipamento em causa, ao passo que a AT lançou mão dos critérios que a lei lhe impunha. Ao abrigo do n.º 3 do artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, a AT considerou como razoável o período de vida útil de 20 anos e a percentagem de 5% de depreciação para os parques eólicos, considerados como elemento único do Ativo Fixo Tangível. Todas as empresas que comercializam e ou fabricam aerogeradores, cuja informação a AT teve a oportunidade de consultar e analisar, indicam o período de 20 anos como sendo o seu período de vida útil.
5. O entendimento da AT resulta e converge com a opinião de cientistas independentes e com literatura cientifica atualizada, bem como com a opinião de empresas que comercializam e/ou fabricam aerogeradores. A AT não errou ao exercer a discricionariedade técnica que lhe era cometida pelo art. 31.º n.º 2 do Código do IRC e pelo artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro. Não se podendo concluir que a Requerida não agiu com razoabilidade, conforme lhe competia, na determinação das taxas aqui em causa.
6. A vida útil dos aerogeradores apresenta uma forte ligação à viabilidade económica do parque eólico, sendo que nalguns estudos referem-se a períodos de operação de 35 a 40 anos. O peso de manutenção e das reparações aumenta com a idade e o uso dos equipamentos pelo que a rentabilidade máxima de um parque eólico situa-se entre os 20 e 25 anos. A AT atuou em conformidade com o disposto no artigo 31º nº 2 do CIRC, tendo determinado a taxa de depreciação ou amortização que resulta dos períodos de utilidade esperada de 20 anos expressamente indicado pelas entidades fornecedoras dos aerogeradores com conhecimento especializado na matéria em questão, bem como por estudos técnico-científicos. A aplicação da taxa de 5% aos aerogeradores não é injustificada ou desproporcional, uma vez que resulta diretamente do período de utilidade esperada de 20 anos. A atuação da AT respeita integralmente os princípios da igualdade, da proporcionalidade e da tributação do lucro real.
SANEAMENTO
2.1. O tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído.
2.2. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
2.3. O processo não enferma de nulidades.
2.4. Não foram suscitadas exceções.
2.5. Não se verificam quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
Mérito
Factos
Factos provados
Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas dão–se como assentes e provados os seguintes factos, com base nos documentos apresentados e indicados – para os quais remetemos e aqui damos como reproduzidos para todos os efeitos legais, limitando-nos aqui a elencar os factos relevantes – e na reunião entre as partes promovida pelo presente tribunal arbitral nos termos do disposto no artigo 18º do RJAT.
1) A A… é uma sociedade por quotas que tem por objeto a produção e comercialização de energia através da exploração de empreendimentos de aproveitamento de energias renováveis, bem como quaisquer outras atividades complementares ou acessórias daquela que eventualmente venham a ser necessárias ou a ter relação com o objeto principal.
2) A Requerente iniciou a sua atividade em julho de 2002, a qual consiste na “Produção de eletricidade de origem eólica, geotérmica e solar” (CAE 35113), encontrando-se enquadrada em sede de IVA no regime normal de periodicidade mensal e em sede de IRC no regime geral de tributação.
3) No âmbito da sua atividade, a A… é detentora do parque eólico da …, no qual dispõe de aerogeradores com uma potência instalada total de 114 MW, a onde exerce a atividade de produção e comercialização de energia elétrica mediante recurso à força do vento.
4) Em termos fiscais, a A… entendeu – na ausência, à data dos factos, de uma norma expressa na tabela anexa ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, que fixasse os moldes que a amortização dos aerogeradores (integrados no domínio do ativo imobilizado corpóreo) devesse seguir – que o período de vida útil associado a tais equipamentos corresponderia a 16 anos, aplicando a taxa de amortização correspondente de 6,25%.
5) Seguindo este procedimento, a A… contabilizou, no período de tributação de 2011, a amortização anual dos aerogeradores adquiridos, a qual ascendeu a uma importância total de € 6.964.496,49.
6) Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI2014…, de 12/03/2014 foi realizada uma ação inspetiva interna à sociedade A… ora requerente arbitral – de âmbito parcial – IRC – e incidente sobre o exercício de 2011, na sequência da qual veio a ser emitida a liquidação impugnada.
7) A atuação da AT assentou na consideração de que o período de vida útil dos equipamentos aerogeradores da Requerente é de vinte anos, a que corresponde uma taxa de amortização de 5%.
8) A reclamação graciosa apresentada pela Requerente foi objeto de indeferimento expresso.
9) A Requerente não procedeu ao pagamento voluntário do imposto liquidado, pelo que foi instaurada a respetiva execução fiscal, sob o n.º …2016…, na qual apresentou garantia bancária pelo montante de € 351.091,23, para efeitos de suspensão legal do processo (cfr. documento n.º 3).
10) A norma internacional pertinente obriga a que os aerogeradores sejam projetados pelos fabricantes para uma vida útil de 20 anos. (cfr. depoimento de E…).
11) A AT tem entendido que as centrais hidroelétricas têm uma vida útil razoável e esperada de 16 anos – nos termos da Tabela I (Taxas Específicas), Divisão V (Eletricidade, gás e água), do Grupo I (Produção, transporte e distribuição de energia elétrica) do Decreto Regulamentar nº 2/90.
12) Um estudo do LENEG, que esteve na base da reforma da fiscalidade verde, aponta para uma vida útil dos aerogeradores entre um mínimo de 12,5 e um máximo de 20 a 25 anos. (cfr. documento 5)
13) A obsolescência vai-se acentuando a partir dos 10 ou 12 anos de vida útil, como reconhecido pelo estudo do LENEG, sendo maiores os custos de manutenção e a dificuldade em encontrar peças adequadas. (cfr. documento 5 e depoimento de E…)
14) As trocas de pás e de outros componentes dos aerogeradores são frequentemente indispensáveis para a garantia da potencia inicialmente projetada e contratada para o aerogerador. (cfr. depoimento de E…).
15) Os contratos de operação e manutenção celebrados pela A… com o fabricante dos aerogeradores têm a duração de 15 anos e impõem uma revisão preço aos 5 e 10 anos. (cfr. depoimento de E…).
16) Os aerogeradores não têm qualquer valor residual depois da cessação da sua utilização, havendo que contabilizar o custo do desmantelamento e da remoção dos mesmos.
17) A contratualização da utilização dos terremos para exploração dos parques eólicos entra em linha de conta com outros fatores (v.g. estudos técnicos; interesses económicos dos proprietários; eventual continuação da exploração com novos aerogeradores) para além da questão concreta da vida útil dos concretos aerogeradores utilizados (cfr. depoimento de F…).
A convicção do Tribunal sobre os factos dados como provados resultou do exame dos documentos anexados aos autos, do reconhecimento de factos efetuado pela Requerente, dos depoimentos das testemunhas indicadas, que revelaram conhecimento direto da matéria reportada, tudo conforme se especifica nos pontos da matéria de facto acima enunciados.
Motivação
O presente Tribunal apreciará e decidirá do mérito da causa, que consiste em apreciar se o período de vida útil de 20 anos definido pela Requerida no âmbito das correções aritméticas na base da liquidação de IRC n. 2015…, da liquidação de juros n.º 2015 … e da demonstração de acerto de contas n.º 2015…, respeitantes ao período de tributação de 2011, para os aerogeradores eólicos do Parque Eólico da … se considera como razoável, tendo em consideração a regulação aplicável, nos termos do que resultava, à data relevante dos factos, do n.º 2 do artigo 31.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) e do n.º 3 do artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro.
Cabe resolver, nas questões suscitadas pela Requerente no que diz respeito às correções aritméticas determinativas das liquidações impugnadas relativamente à consideração do período de vida útil esperado dos aerogeradores do Parque Eólico da … de 20 anos, correspondente a uma taxa de depreciação de 5%, em vez do período de 16 anos adotado pela Requerente, correspondente a uma taxa de depreciação de 6,25%, bem como quanto à violação dos princípios constitucionais da igualdade e da tributação do lucro real.
Direito
Questão decidenda
A questão decidenda consiste fundamentalmente em saber se foi juridicamente adequada a correção, feita pela Requerida, a taxa de depreciação dos aerogeradores adotada pela A… . Mais especificamente, importa indagar se, do ponto de vista de uma análise regulatório-económica, o critério acolhido pela AT para a determinação das taxas de depreciação dos aerogeradores – nos termos dos artigos 31º/2º do CIRC e 5º/3 do Decreto Regulamentar nº 25/2009, na redação então vigente – pode ser considerado razoável e aceitável, tendo em conta o “período de utilidade esperada”.
O cálculo das depreciações e amortizações deve ser feito, em regra, pelo método das quotas constantes (artigo 30º/1 do CIRC). A lei vigente ao momento dos factos não determinava a taxa de depreciação ou amortização a aplicar aos aerogeradores destinados à produção de energia. Aplicava-se por isso o artigo 31º/2 do CIRC, que dispunha que “Relativamente aos elementos para que não se encontrem fixadas taxas de depreciação ou amortização, são aceites as que pela Direcção-Geral dos Impostos sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada.” Como resulta do teor literal deste preceito, o legislador decidiu remeter para as taxas de depreciação ou amortização que pela AT sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada.
Esta opção é disciplinada no artigo 5º/3 do Decreto Regulamentar nº 25/2009, de 4 de setembro, diploma que consagra o regime das depreciações. Aí se dispõe que “relativamente aos elementos para os quais não se encontrem fixadas, nas tabelas referidas no n.° 1, taxas de depreciação ou amortização são aceites as que pela Autoridade Tributária e Aduaneira sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de vida útil esperada daqueles elementos.”
A exegese do preceito permite concluir que a opção normativa seguida não foi no sentido de obrigar a AT a aceitar as taxas de depreciação acolhidas pelo sujeito passivo desde que as mesmas fossem razoáveis, mas sim de o sujeito passivo ter de aceitar as taxas de a DGI considere razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada. Ou seja, o legislador delegou na AT a competência de resolver de forma autorizada as questões suscitadas pela parcimónia regulatória das tabelas de depreciação e amortização
Discricionariedade administrativa
Na sua função de preenchimento (gap-filling) das lacunas tabelares, o artigo 5º/3 do Decreto Regulamentar nº 25/2009 atribuí à AT uma dupla incumbência. Por um lado, ela deve densificar o conceito de período de utilidade esperada, o qual se perfila, do ponto de vista teorético-jurídico, um conceito indeterminado. Por outro lado, impõe-se que parta daí para a identificação de uma taxa de depreciação que considere razoável e que seja suscetível de como tal ser considerada em sede de controlo jurisdicional. Esta dupla incumbência circunscreve um espaço de discricionariedade técnica à AT, relativamente ao qual os tribunais devem manifestar uma medida significativa de deferência, dentro de limites constitucionais e legais.
As decisões administrativas discricionárias, como todas as outras decisões administrativas, devem ser tomadas dentro dos limites da competência legalmente atribuída, no quadro de uma interpretação razoável da margem de manobra contemplada pelo legislador. A discricionariedade técnica não configura um espaço livre de direito e de controlo jurisdicional. Ela encontra-se circunscrita pelos direitos fundamentais, pelos princípios constitucionalmente estruturantes e pelos demais princípios do ordenamento jurídico.
É por referência a estes princípios que devem ser concretizados os conceitos indeterminados, como seja o de período de utilidade esperada ou de taxa de depreciação razoável, sob pena de erro na interpretação do direito. O aproveitamento desta margem de apreciação deve pautar-se pelos princípios da igualdade, adequação, proporcionalidade e segurança jurídica, sob pena de erro na aplicação do direito.
Em todo o caso, a discricionariedade técnica impõe alguns limites ao nível de escrutínio a exercer pelos tribunais. As decisões administrativas discricionárias só podem ser judicialmente revistas com base em fundamentos limitados, tais como erro nos pressupostos de facto, erro manifesto de interpretação e aplicação do direito, má-fé dos decisores, prossecução de finalidades impróprias ou consideração de fatores irrelevantes.
Período de utilidade esperada
O conceito de período de utilidade esperada corresponde, essencialmente, ao período de vida útil do ativo. O conceito é referido no artigo 30º/4 do CIRC[2], embora não seja acompanhado de uma definição. Normalmente ele é entendido como o período de tempo em que o ativo é passível de ser utilizado, de acordo com as regras normais da experiência no setor de atividade em causa. A concretização do conceito de período de vida útil, ou de período de utilidade esperada, impõe que sejam observadas as condições de funcionamento específicas em que o ativo é normalmente usado.
Decisivo para a determinação de tempo da utilidade esperada não é a duração do uso operacional pelo contribuinte individual, mas a utilidade objetiva de um ativo, tendo em conta o stress operacional específico típico do ativo. Esta deve ser determinada tendo em conta todas as circunstâncias relevantes.
Como auxílio para a determinação da vida útil dos ativos, tem o Governo, com a participação de associações profissionais dos diferentes setores de atividade, aprovado as tabelas com as taxas de específicas e genéricas de depreciação e amortização económica para bens de uso geral e para diferentes setores da economia, anexas ao Decreto-Regulamentar nº 25/2009, que dele fazem parte integrante. Elas têm subjacente uma presunção de correção jurídico-económica, embora não sejam vinculativas para os tribunais.
O recurso a tabelas gerais e específica de depreciação e amortização e a critérios de razoabilidade a densificar pela AT afigura-se adequado, necessário e proporcional, tendo em vista a necessidade de ponderar e harmonizar os princípios constitucionais da tributação do rendimento real e da capacidade contributiva, por um lado, com a garantia da eficiência da administração fiscal, por outro lado, considerando a necessidade de simplificar procedimentos e desonerar a AT dos elevados custos de transação e informação que uma atenção precisa e fina à situação económica concreta de cada contribuinte individualmente considerado inevitavelmente acabaria por acarretar. Sem esquecer que essa técnica normativa tem o mérito de assegurar o respeito pelos princípios da igualdade, segurança jurídica e proteção da confiança na tributação, ao mesmo tempo que garante uma concorrência justa e não distorcida entre as várias empresas dentro de cada setor de atividade.
Por duração da utilização entende-se o período em que o ativo pode ser usado de acordo de acordo com a experiência comum. Para a determinação da "vida útil" devem ser observadas as condições específicas de operação em que o ativo é utilizado[3]. Decisivo para a delimitação do tempo de vida útil não é uso operacional pelo contribuinte individual, mas a vida útil objetivamente esperada, considerando as cargas normais de funcionamento específico. A vida útil é determinada com base nos seguintes fatores: a) desgaste técnico; 2) desvalorização económica e 3) quadro legal relevante. O conceito de vida útil adquire, por esta via, uma configuração tridimensional, nos termos que sintetizamos[4].
A vida útil técnica compreende o período de tempo em que o bem pode ser tecnicamente consumido ou utilizado. Este é um importante aspeto para a determinação da vida útil esperada, embora não o único. A vida útil económica é o período em que o bem pode ser utilizado de forma rentável, incluindo a possível venda para outros fins depois da utilização original. A vida útil jurídica compreende o quadro regulatório pertinente (v.g. duração de autorizações; duração de contratos de arrendamento), apontando para uma maior ou menor estabilização das expectativas e proteção da confiança legítima. Estes critérios devem ser aplicados aos diversos setores de atividade. A sua relevância deve ser aferida de forma contextual. Por exemplo, para a determinação do período de vida útil das turbinas eólicas não são necessariamente decisivos os contratos celebrados entre proprietários e arrendatários dos terrenos em que o parque eólico será instalado, na medida em que o respetivo conteúdo depende de outras variáveis para além das características das turbinas eólicas.
No caso de não existir uma absoluta coincidência entre a duração técnica, a utilidade económica e a estabilidade jurídica, são pensáveis, em abstrato, diferentes soluções. Uma delas seria optar pela que melhor protegesse a base tributária e o erário público. Alternativamente poder-se-ia enveredar pelo entendimento mais favorável ao contribuinte, usando o critério económico como decisivo para a determinação da taxa de depreciação.
Uma terceira possibilidade, acolhida pelo legislador fiscal português, é a de permitir à AT que opere uma leitura sinótica, integrada e holística das três dimensões do conceito de vida útil, ou de período de utilidade esperada, assente numa ponderação equilibrada dos interesses em presença e numa avaliação razoável e não arbitrária dos dados técnicos, económicos e jurídicos relevantes. É contra este pano de fundo que deve ser interpretado e aplicado o artigo 5º/3 do Decreto Regulamentar nº 25/2009, quando refere que as “taxas de depreciação ou amortização são aceites as que pela Autoridade Tributária e Aduaneira sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de vida útil esperada daqueles elementos”.
O preceito em causa diz que é à AT que cabe decidir sobre a razoabilidade das taxas de depreciação. O mesmo reflete o acolhimento de uma teoria da deferência, reconhecendo que está em causa a procura, pela AT, de uma resposta aceitável a questões técnicas complexas[5]. Esta remissão para a ideia de razoabilidade confere à AT um espaço de discricionariedade técnica que se traduz numa significativa margem de apreciação. Naturalmente que não se trata de um espaço de decisão ilimitado e insindicável, compatível com o arbítrio e o subjetivismo.
Razoabilidade
O conceito de razoabilidade é utilizado, no âmbito jurídico-normativo, quando se está diante de situações problemáticas em que a resposta não é suscetível de ser alcançada em termos lógico-binários (v.g. 0,1; tudo, nada), ou seja, em que a mesma não se apresenta axiomática, óbvia, clara, patente, incontroversa, inequívoca e indiscutível[6]. A utilização do conceito de razoabilidade evidencia uma medida considerável de pluralismo no discurso jurídico, sinalizando a partida do princípio de que para alguns problemas – em que a evidência empírica não é conclusiva ou em que sendo conclusiva não é suscetível de ser interpretada apenas de um modo – são possíveis, plausíveis e aceitáveis diferentes respostas alternativas.
Quando a evidência é inconclusiva, uma decisão determinada e precisa afigura-se epistemologicamente impossível. Mas mesmo quando a evidência é conclusiva, são possíveis e toleradas falhas de raciocínio técnico desde que o erro não seja manifesto e o resultado não seja absurdo. Nestes casos, o direito admite uma margem de desacordo razoável entre membros de uma mesma comunidade epistémica dispondo dos mesmos dados empíricos (v.g. técnicos, económicos e jurídicos) na medida em que nem sempre é possível determinar com clareza quem está a raciocinar corretamente e quem está a errar.
O desacordo razoável, entre partes igualmente competentes do ponto de vista técnico, pode subsistir mesmo depois de uma deliberação argumentativa de boa fé. Porque assim é, o direito não insiste sempre na identificação de uma única resposta certa em todos os tempos e lugares, satisfazendo-se com uma abordagem razoável ou aceitável do problema. Não sendo possível ou viável uma suspensão reflexiva, deve admitir-se várias decisões possíveis dentro de um continuum. O conceito de razoabilidade permite delimitar o espaço de desacordo admissível e resolvê-lo no sentido de um ajuste equilibrado[7].
A taxa de depreciação dos aerogeradores
No domínio da depreciação dos aerogeradores, a análise do direito comparado mostra que a aplicação dos critérios técnicos, económicos e jurídicos à determinação da utilidade esperada dos aerogeradores se tem revelado compatível com diferentes resultados, sendo frequente deparar com distintas concretizações do conceito de vida útil. Isto, mesmo sem falar da existência de regimes fiscais favoráveis ao investimento em energia renovável, que disciplinam a depreciação dos ativos independentemente do respetivo período de utilidade esperada.
Casos há, por exemplo, em que se atende à vida útil de cada um dos elementos do aerogerador e se admite a sua depreciação separada. Noutro sentido, que se afigura mais sustentável, considera-se os aerogeradores, ou turbinas eólicas, são ativos compostos por diferentes elementos que apenas podem ser utilizados no seu conjunto após a montagem. As peças individuais não têm qualquer utilidade económica separadamente. O período de utilidade esperada pode ser determinado unicamente pela coordenação técnica entre si.
Ao longo das últimas décadas a vida útil esperada dos aerogeradores, para efeitos de depreciação, tem sido fixada, em vários Estados, em 12, 15, 16 ou 20 anos[8], podendo coexistir com regimes jurídicos de depreciação acelerada de 5 ou 10 anos[9]. Neste quadro, a questão que se coloca consiste em saber se a fixação da utilidade esperada de um aerogerador em 20 anos pode ser considerada razoável. Naturalmente que o espaço de razoabilidade deve ser balizado pelas ideias de justiça, adequação, proporção, equidade e moderação. Ele é incompatível com resultados que possam ser considerados arbitrários, anómalos e absurdos.
A razoabilidade de uma decisão administrativa depende, para a sua legitimação, de uma análise em dois tempos, procedimental e substancial. Do ponto de vista procedimental, é relevante averiguar se a AT se baseou em toda a informação relevante a que poderia razoavelmente aceder e considerar ou se teve em consideração fatores (v.g. finalidades impróprias; interesses particulares) que não devia sequer ter ponderado. Neste âmbito, deve reconhecer-se que, adotando um procedimento relativamente formal (J. A. Pojanowski), a AT procurou, num conjunto diversificado e confiável de fontes, agregar informação sobre os aerogeradores, nomeadamente recorrendo a estudos técnicos de fiabilidade mecânica, quer junto dos fabricantes ou fornecedores, quer nas páginas web de instituições ligadas às energias renováveis.
Nas várias fontes de informação compulsadas pela AT é relativamente frequente encontrar a adscrição aos aerogeradores de um período de utilidade esperada de 20 anos[10]. Na verdade, esse período é diversas vezes apresentado na literatura especializada como sendo típico e convencional, por contraposição aos regimes fiscais de depreciação acelerada[11]. Pelo que a AT, ao edificar sobre o normal, típico e convencional, afasta qualquer suspeita de ter sido arbitrária, irrazoável ou excessiva. O seu entendimento foi alcançado através de um procedimento diligente e sério de recolha e análise de informação científica, técnica, económica e jurídica relevante, estando longe de corresponder a uma irrupção de arbítrio, subjetivismo ou a uma intuição eidética das essências. O modo de proceder adotado é favorável a uma manifestação de deferência relativamente à AT por parte das instâncias jurisdicionais de controlo[12].
Do ponto de vista substancial, é importante averiguar se o período de utilidade esperada e a taxa de amortização a que a AT chegou são manifestamente erróneos, anómalos ou absurdos, de tal forma que conclusa que nenhuma outra autoridade administrativa informada e razoável poderia ter chegado a semelhante decisão. Do que se trata, no processo em apreço, é saber se o período de vida útil esperada e a correspondente taxa de 5% de depreciação se encontram fora da margem de apreciação que os conceitos de período de utilidade esperada e de razoabilidade necessariamente conferem à AT.
Para chegar a uma taxa de depreciação que considerou razoável (5%), a AT teve em conta um período de vida útil esperada de 20 anos, sendo que este se situa dentro das balizas dadas pelos períodos mínimos (v.g. 12,5 anos) e máximos (v.g. 25 a 30) anos, frequentemente referidos na norma internacional e nos estudos técnicos e económicos sobre o assunto[13], sendo igualmente usado por outras autoridades tributárias (v.g. Dinamarca) para a depreciação de turbinas eólicas. Com efeito, na literatura especializada, a depreciação das turbinas eólicas ao longo de vinte anos de utilidade esperada é considerada uma solução razoável[14]. A AT procurou alicerçar a sua ratio decidendi
Naturalmente que o critério de razoabilidade admite uma margem de discordância razoável diante de evidência inconclusiva ou insuscetível de valoração inequívoca, situando-se a divergência entre a AT e a A…, dentro dessa margem de discordância. Mas mesmo que se considere que a evidência é conclusiva, ainda assim o conceito de razoabilidade admite uma margem de erro razoável, que também não parece ter sido ultrapassada pela AT.
Evidentemente que nada impede que o legislador, por razões políticas, económicas ou ambientais, adote outros critérios e chegue a outras taxas de depreciação, seguindo o exemplo daqueles que admitem depreciações de turbinas eólicas em 16, 14, 10 ou mesmo 6 ou 5 anos, no caso dos regimes das depreciações aceleradas. A promoção do crescimento e do emprego, o rápido desenvolvimento tecnológico e a necessidade de investir em energias renováveis podem justificar inteiramente essa opção[15]. O legislador pode a todo o tempo adotar um critério diferente de depreciação dos aerogeradores, como fez, neste domínio, quando, através da Lei n.º 82-D/2014, de 31 de dezembro, que aprova a Reforma da Fiscalidade Verde. Existem muitas possibilidades razoáveis para proceder à depreciação dos aerogeradores. Mas isso não significa que o critério perfilhado pela AT possa ser considerado irrazoável.
Atendendo aos mesmos critérios procedimentais e substanciais, a solução propugnada pela A…, de uma taxa de 6,25% a 16 anos, pode ser considerada, não só inteiramente razoável, mas até, eventualmente, mais razoável do que a sustentada pela AT. Não foi certamente de ânimo leve que na Alemanha a jurisprudência fixou um período de utilidade esperada para a depreciação de 16 anos para as turbinas eólicas[16].
Mas a razoabilidade da Requerente é irrelevante para o desfecho do caso em apreço e não pode ser usada contra a posição acolhida pela AT. O artigo 5º/3 do Decreto Regulamentar nº 25/2009 remete para a taxa de depreciação que a AT considerar razoável, o que não abre espaço para uma “comparação de razoabilidades” (v.g. voto de vencido à Decisão CAAD do Processo 593/2015-T, 29-7-2016), por mais interessante e intelectualmente estimulante que esse exercício possa ser.
Por outras palavras, o que está em causa não é a questão de saber se a taxa adotada e defendida pelo contribuinte é razoável ou não, ou até se é mais razoável do que a propugnada pela AT, mas sim saber se o período de utilidade esperada de 20 anos preconizado pela AT, e a correspondente taxa de depreciação de 5%, são suscetíveis de ser considerados razoáveis e aceitáveis. Insistindo, o artigo 5º/3 do Decreto Regulamentar nº 25/2009, determina que nos casos não previstos nas tabelas de depreciação e amortização devem ser aceites as taxas que pela AT sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de vida útil esperada daqueles elementos.
Saliente-se, a propósito, que a possibilidade de correção em baixa das taxas de depreciação (write-down) está prevista no artigo 5º/2 do Decreto Regulamentar nº 25/2009, onde se excetuam expressamente alguns casos em que “as taxas de depreciação ou amortização são calculadas com base no correspondente período de utilidade esperada, o qual pode ser corrigido quando se considere que é inferior ao que objetivamente deveria ter sido estimado”. Mas essa possibilidade não se encontra mencionada no nº 3, em que se remete para um critério de razoabilidade a concretizar pela a AT, razoabilidade essa que se estende ao preenchimento do conceito indeterminado do período de utilidade esperada, sendo que 20 anos não corresponde a uma leitura singular e idiossincrática da AT, pois que é acolhido por outras autoridades tributárias.
Uma avaliação da base empírica e dos aspetos processual e substancial da posição da TA sustenta o entendimento maioritário do presente coletivo arbitral no sentido de que a densificação do conceito de período de vida útil esperada de 20 anos e a fixação de uma taxa de depreciação de 5% é ainda sustentável, do ponto de vista técnico, económico e jurídico, dentro do espaço de discricionariedade técnica da AT, não podendo ser consideradas anómalas, absurdas ou desproporcionais.
Conclui-se, assim, que a AT não errou e que, mesmo que tivesse errado, o que se concede só pelo andar da discussão, nunca teria ultrapassado a margem de erro que lhe é tolerável nos casos de discricionariedade técnica. Daí que, à luz do disposto no artigo 31º do CIRC e do artigo 5º/3 do Decreto Regulamentar 25/2009, de 14 de setembro, seja de 5% a taxa de depreciação aplicável.
Decisão
Nos termos do exposto, este Tribunal Arbitral decide, por maioria, dar razão à AT e, consequentemente, julgar totalmente improcedente o pedido formulado pela Requerente, condenando-a nas custas do processo.
Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 277.228,92 em conformidade com o disposto no artigo 97º-A/1/a) do CPPT, aplicável por força do artigo 29º/1/a) do RJAT e artigo 3º/2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Custas
Nos termos do artigo 22º/4º do RJAT fixam-se as custas em € 5.202,00
Lisboa, 7 de junho de 2017
José Baeta de Queiroz
Jónatas Eduardo Mendes Machado
Ricardo Gomes Pedro
(vencido nos termos de declaração de voto anexa)
Voto de vencido
Não acompanho o sentido da presente decisão arbitral, pelas seguintes razões que passo a expender:
I. Introdução e quadro legal
Como é pacificamente aceite por Requerente e Requerida, a questão que se coloca nos presentes autos prende-se com saber qual a taxa de depreciação aplicável, do ponto de vista fiscal, aos aerogeradores produtores de energia elétrica no período de tributação de 2011.
À data a que os factos se reportam, em sede de IRC, a matéria de depreciações e amortizações encontrava-se regulada pelo artigo 29.º e seguintes do Código do IRC, bem como pelo Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro (doravante, designado por DR 25/2009).
Não é facto controvertido que os equipamentos em apreço se tratam de elementos constituintes do ativo fixo tangível da Requerente sujeitos a deperecimento, sendo, consequentemente, geradores de depreciações relevantes para efeitos fiscais, nos termos do n.º 1 do artigo 29.º do Código do IRC.
O DR 25/2009 contém, à semelhança do seu predecessor (DR 2/90, de 12 de janeiro), um conjunto de tabelas – uma específica, que determina taxas de depreciação ou amortização consoante o setor de atividade em que tais elementos do ativo estão afetos – e uma genérica.
A utilização de uma ou outra tabela é determinada em função do disposto no n.º 1 do artigo 5.º do DR 25/2009: as «taxas de depreciação ou amortização específicas fixadas na tabela i (…)» aplicam-se aos «elementos do ativo dos correspondentes ramos de atividade» e «quando estas não estejam fixadas» naquela tabela, aplicam-se «as taxas genéricas mencionadas na tabela ii» (sublinhado meu).
Ou seja, se os aerogeradores constarem expressamente na tabela específica a que se refere o DR 25/2009, a quota anual de depreciação que pode ser aceite fiscalmente é determinada em função da taxa máxima lá prevista. Caso contrário, aplica-se a taxa da tabela genérica.
Na eventualidade de não ser possível aplicar, quer uma taxa da tabela específica, quer uma taxa da tabela genérica, o Código do IRC dispõe, no n.º 2 do artigo 31.º do Código do IRC, que «relativamente aos elementos para que não se encontrem fixadas taxas de depreciação ou amortização, são aceites as que pela Direcção-Geral dos Impostos sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada».
Norma semelhante se encontra no n.º 3 do artigo 5.º do DR 25/2009, ao dispor que «relativamente aos elementos para os quais não se encontrem fixadas, nas tabelas referidas no n.º 1, taxas de depreciação ou amortização são aceites as que pela Direcção-Geral dos Impostos sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada».
II. Posição da Requerente
Foi no âmbito deste quadro normativo que a Requerente decidiu depreciar contabilística e fiscalmente os aerogeradores à taxa decorrente de um período de vida útil de 16 anos, considerando que, à data a que se reportam os factos, estes equipamentos não tinham enquadramento, quer na tabela específica, quer na tabela genérica, ambas anexas ao DR 25/2009.
O prazo de 16 anos tem uma correspondência praticamente coincidente com o período – 15 anos –durante o qual o parque eólico onde os equipamentos se encontram instalados tem uma remuneração garantida do Estado (no âmbito do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio), o que permitirá, na perspetiva da Requerente, assegurar um funcionamento equilibrado dos aerogeradores, tendo em consideração o desgaste a que se encontram sujeitos e os custos com a sua manutenção (preventiva e corretiva) necessária para estes manterem um nível razoável de eficiência.
III. Posição da Requerida
A Requerida, por sua vez, não concorda com tal prazo, por o mesmo ser inferior ao prazo de 20 anos que, na sua interpretação, é o prazo mínimo de vida útil de tais equipamentos, baseando-se, para tal, numa certificação emitida por um fabricante dos mesmos.
IV. Os conceitos de “período de vida útil” e “período de utilidade esperada”
A liquidação adicional emitida pela AT resulta, quanto a mim, de diferentes perspetivas das Partes quanto aos conceitos de “período de vida útil” e “período de utilidade esperada”.
Efetivamente, e relativamente ao primeiro, é possível afirmar que existe
· Um “período de vida útil” económico/ contabilístico; e
· Um “período de vida útil” fiscal.
Quanto ao conceito “período de vida útil” económico/ contabilístico – e estando em causa ativos fixos tangíveis – dispõe a Norma Contabilística e de Relato Financeiro (NCRF) n.º 7, no capítulo “Definições”, que «vida útil é:
a) O período durante o qual uma entidade espera que um ativo esteja disponível para uso; ou
b) O número de unidades de produção ou similares que uma entidade espera obter do ativo».
Daqui resulta que a vida útil económica é o período durante o qual uma Empresa prevê vir a utilizar determinado ativo ou, por outras palavras, o período durante o qual a Empresa reconhece que a utilização daquele ativo gera valor (pois caso assim não fosse, não o utilizaria, atendendo ao seu intuito económico).
E esta lógica de utilização com valor pode ser reconhecida de forma linear ou em função das unidades de produção geradas pelo ativo.
Esta expetativa de utilização com valor poderá não ter (e normalmente não tem) nenhuma correspondência com a duração física do bem, razão pela é natural constatar que diferentes sujeitos passivos atribuam diferentes períodos de vida útil aos mesmos tipos de bens, ainda que operando no mesmo setor de atividade.
E ao fazê-lo, apenas estão a refletir economicamente as suas expetativas, sem que daí resulte necessariamente qualquer consequência fiscal, desde que tais períodos se encontrem compreendidos dentro dos períodos mínimo e máximo de vida útil relevantes para efeitos fiscais, o que apenas reforça a autonomia dos critérios económico, fiscal e físico no que concerne ao conceito de “período de vida útil”.
Quanto ao período de vida útil fiscal, atente-se ao disposto no artigo 3.º do DR 25/2009, sob a epígrafe “período de vida útil”:
«1- A vida útil de um elemento do ativo depreciável ou amortizável é, para efeitos fiscais, o período durante o qual se deprecia ou amortiza totalmente o seu valor, excluído, quando for caso disso, o respetivo valor residual.
2 - Qualquer que seja o método de depreciação ou amortização aplicado, considera-se:
a) Período mínimo de vida útil de um elemento do ativo, o que se deduz da quota de depreciação ou amortização que seja fiscalmente aceite nos termos dos números 1 e 2 do artigo 5.º;
b) Período máximo de vida útil de um elemento, o que se deduz de quota igual a metade da referida na alínea anterior. (…)»
Assim, e independentemente do tempo durante o qual um ativo se encontre em funcionamento e a gerar rendimentos, o período relevante para que a sua depreciação seja considerada fiscalmente é o que decorre das taxas previstas nas Tabelas anexas ao DR 25/2009, sendo facultada ainda a possibilidade ao sujeito passivo, em função, entre outros motivos, das suas estimativas de ritmo de geração de rendimentos, optar entre reconhecer fiscalmente aquela depreciação durante o período mínimo ou o período máximo de vida útil do ativo.
Podemos, assim, afirmar que o período de vida útil fiscal é caracterizado por uma certa rigidez e flexibilidade:
· Rigidez – implícita à própria fixação de taxas de depreciação aceites fiscalmente; e
· Flexibilidade – associada à opção concedida aos sujeitos passivos para depreciarem fiscalmente, durante o período mínimo ou máximo de vida útil – que o legislador implicitamente considera como períodos razoáveis – os ativos.
E fez refletir esse mesmo princípio (da razoabilidade) para os bens que não constam expressamente nas Tabelas anexas ao DR 25/2009, impondo, nestes casos, que a taxa de depreciação aceite fiscalmente é determinada em função do período de utilidade esperada do ativo correspondente, daqui decorrendo a ideia de que um ativo fixo tangível sujeito a deperecimento deverá ser depreciado durante o tempo em que se preveja que seja útil (no sentido económico do termo) para a entidade que o utiliza.
Por fim: o conceito de “período de utilidade esperada”, o qual interpreto como sendo muito semelhante ao conceito de “período de vida útil” económico, por ambos assentarem numa lógica de “utilização com valor” de um ativo.
V. O critério da razoabilidade e a sua aplicação ao caso concreto
Numa primeira leitura do n.º 2 do artigo 31.º do Código do IRC, parece redundar que o elemento literal da Lei dá primazia absoluta à opinião da Requerida, porquanto são aceites fiscalmente as taxas por ela consideradas razoáveis.
Contudo, e ainda que reconhecendo que estamos no domínio dos poderes discricionários da Administração, não faço essa interpretação. Ou seja, de que basta que a Administração apresente um período de utilidade esperada que se configure razoável para que seja desconsiderado o do sujeito passivo.
Desde logo, porque é sobre o sujeito passivo que recai uma decisão sobre a taxa de depreciação a praticar, atendendo à natureza da sua atividade e à previsão de resultados a obter com equipamentos que não constam nas Tabelas anexas ao DR 25/2009.
E a Lei não impõe que tal decisão decorra da entrega de requerimento ou de pedido de informação vinculativa junto da AT.
Aliás, não o faz, nem o deveria fazer. Cabe, em primeira instância, ao sujeito passivo, de acordo com a sua experiência e previsões, definir, no âmbito da sua autonomia de gestão, qual o período de utilidade esperada para tais equipamentos.
Apenas e só se tal período não for razoável é que a AT, nos termos desta norma, deverá corrigir o período de utilidade esperada definido pelo sujeito passivo.
Ainda que se diga que o n.º 2 do artigo 5.º do DR 25/2009 prevê expressamente essa possibilidade de atuação da AT – ao estabelecer que «as taxas de depreciação ou amortização são calculadas com base no correspondente período de utilidade esperada, o qual pode ser corrigido quando se considere que é inferior ao que objectivamente deveria ter sido estimado» – a ausência de referência semelhante no n.º 3 da mesma norma não confere poderes à AT de corrigir, em qualquer circunstância, os períodos de utilidade esperada considerados pelos sujeitos passivos.
O âmbito de atuação da AT nesta matéria encontra-se, quanto a mim, delimitado, desde logo pelo maior desconhecimento da AT quanto às particularidades das atividades desenvolvidas pelos sujeitos passivos, bem como pela razão óbvia de a AT não ser a única entidade a poder definir períodos de utilidade esperada razoáveis.
O que nos leva à seguinte questão: é de admitir uma correção, como a que a AT fez no presente caso, se se concluir que os períodos de utilidade esperada considerados pela Requerente e Requerida – assentes em critérios diferentes, como se viu – são razoáveis?
Na minha opinião, tal correção não é admissível.
Aprovar tal cenário seria admitir uma intromissão gritante da AT nas decisões de gestão dos sujeitos passivos, devendo estar circunscrita apenas aos casos em que o período considerado por estes não obedeceu a critérios de índole económica, tonando-o irrazoável.
Ora, não me parece que o critério utilizado pela Requerente não esteja imbuído desse espírito economicista: é perfeitamente lógico e razoável que se opte por um período de utilidade esperada definido em função do tempo em que as receitas decorrentes da utilização desse ativo tenham uma remuneração garantida e pré-determinada.
Ademais, é igualmente de admitir a possibilidade de coexistirem diferentes períodos de utilidade esperada para o mesmo equipamento e tal não significa necessariamente que um deles seja razoável em detrimento do outro (que passaria, em consequência, a ser irrazoável).
A Lei, ao referir que «são aceites as que pela Direcção-Geral dos Impostos sejam consideradas razoáveis» reflete precisamente a possibilidade de o mesmo equipamento poder ter diversos contextos e circunstâncias de utilização, sejam de natureza técnica, física, legal, entre outros, que justifiquem diferentes períodos de utilidade esperada por parte dos sujeitos passivos. Contudo, e incompreensivelmente, não é isto a que se tem assistido por parte da AT relativamente aos aerogeradores, como a diversa jurisprudência arbitral o confirma: a AT ignora todas estas condicionantes e estabelece um prazo fixo de 20 anos de utilidade esperada.
O que, diga-se, contraria também o referido acima quanto à flexibilidade que o legislador atribuiu ao período de vida útil fiscal e à liberdade que concedeu aos sujeitos passivos em definirem os seus próprios períodos de utilidade esperada, de acordo com o seu conhecimento e previsões, sem o fazer depender de autorização prévia da AT.
Na verdade, o que a AT deveria fazer era, com base nos estudos que diligentemente recolheu e analisou, considerar o período de utilidade esperada de 20 anos como um período médio, não taxativo, de forma a introduzir as condicionantes acima referidas na sua avaliação do período de utilidade esperada e a colocar em pé de igualdade, para efeitos de depreciação fiscal, os bens que não constam expressamente nas tabelas anexas ao DR 25/2009, com os que lá constam.
Note-se que os estudos que suportam a tese da AT não indicam unanimemente um período mínimo de vida útil de 20 anos, havendo variabilidade no prazo[17] e, facto relevante: nem todos os estudos se referem a um período de vida útil mínimo, antes remetem para a definição de um período esperado de funcionamento em determinadas condições, consideradas “padrão”. Como pode a AT daqui inferir um prazo mínimo de vida útil ou de utilização?
Como vimos, tratando-se o “período de utilidade esperada” de um conceito com substrato económico, este mesmo é subjetivo e depende de uma avaliação individual de cada entidade quanto às perspetivas de geração de valor de determinado equipamento.
Assim sendo, a classificação de um período de utilidade esperada dependerá, apenas e só, da justificação apresentada pelo sujeito passivo para a sua adoção, podendo naturalmente a AT escrutinar o mesmo a posteriori e concluir, ou não, pela sua razoabilidade.
Mas tal exercício acarreta-lhe um ónus adicional de justificação, pois não se exigindo – e bem – ao sujeito passivo uma autorização prévia junto da AT, não se pode retirar as mesmas consequências fiscais como se ele o devesse ter feito e tenha optado por não o fazer, desde que ele demonstre que seguiu um critério razoável na fixação do período de utilidade esperada.
E parece-me que foi esse o caminho trilhado pela Requerente ao decidir amortizar em 16 anos os aerogeradores, prazo que considero razoável, face aos elementos de prova apresentados, dos quais destaco:
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Uma significativa redução das receitas do parque eólico em que os aerogeradores se encontram instalados após o terminus do período de garantia remuneratória. A consideração de um período de 16 anos, muito próximo do prazo de 15 anos que consta no Anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, permite um balanceamento entre os rendimentos gerados pelos equipamentos e os custos – no âmbito dos quais as depreciações assumem papel relevante – associados;
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A reduzida disponibilidade dos fabricantes de aerogeradores em celebrarem contratos de operação e manutenção para além do período de 15 anos. A discrepância entre este prazo e o da norma internacional (20 anos) resulta da própria experiência dos fabricantes quanto ao prazo durante o qual aqueles equipamentos funcionam com níveis de eficiência razoáveis e, consequentemente, os seus proprietários estão na disposição em continuar com operações de manutenção dos mesmos, evitando incorrer nesses custos após o decurso de 15 anos, em que se torna economicamente mais vantajoso proceder à substituição dos aerogeradores por novos equipamentos mais eficientes.
A experiência da Requerente no âmbito da sua atividade e descrita perante o Tribunal atesta o referido no ponto anterior: o Técnico de Energia Eólica arrolado pela Requerente como testemunha deu conta que os aerogeradores em apreço – instalados em 2008 – foram já objeto de intervenções significativas até à data, nomeadamente:
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Substituição de hub’s (parte central dos aerogeradores); e
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Substituição de transformadores (o que afetou metade dos aerogeradores),
prevendo-se, que todas as pás dos aerogeradores sejam substituídas até ao final de 2020.
Ou seja, as condições reais de utilização e funcionamento destes equipamentos tendem a reduzir a sua vida útil, face ao período “padronizado” de 20 anos considerado pela AT. Este carácter (padronizado) ressaltou igualmente do depoimento da mesma testemunha, tendo-o classificado igualmente como teórico e estimado, porquanto:
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Teórico, ao ter por base os resultados de ensaios efetuados em condições “padrão”, ou seja, por não traduzir as reais condições de utilização daqueles equipamentos, designadamente, por tais ensaios serem realizados em locais diferentes daqueles em que vão ser instalados no que respeita à previsibilidade e intensidade dos ventos. Deste modo, e ao não atender às particularidades dos ventos, a certificação internacional não está a refletir este fator de desgaste na eficiência e, consequentemente, na rentabilidade dos equipamentos; e
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Estimado, porquanto aqueles ensaios têm uma duração bastante inferior (ex. um ano) ao prazo de 20 anos.
Parece-me, assim, que a opinião expressa pela AT enquanto fundamento à correção ao lucro tributável da Requerente se baseou num critério “rígido”, desconectado de razões económicas (por a AT não relevar, por exemplo, os custos necessários para manter os aerogeradores em funcionamento dentro de limites razoáveis de eficiência) e reportando-se apenas à durabilidade física de um ativo (e ignorando, neste âmbito, por exemplo, que condições de utilização estão subjacentes à determinação desse período e qual a correspondência das mesmas com as condições em que o ativo vai ser efetivamente utilizado).
Atentas as regras supra citadas, parece-me que a Requerente seguiu um critério mais assente na “utilidade económica” do ativo, ao passo que a Requerida defendeu, por sua vez, um critério mais direcionado para a “durabilidade” do ativo.
Ainda que reconheça que a AT encetou um conjunto de diligências com vista a suportar um período mínimo de vida útil de 20 anos, socorrendo-se, por se tratar de matéria que extravasa a sua área de competência técnica, de estudos relativos à duração dos equipamentos em apreço, entendo que esse exercício e fundamentação não são suficientes para qualificar o prazo de 16 anos da Requerente como irrazoável.
E esta é uma questão nuclear: não basta, como afirma a Requerida, apresentar um período de utilidade esperada razoável para efeitos do n.º 2 do artigo 31.º do Código do IRC e do n.º 3 do artigo 5.º do DR 25/2009: é necessário que além de razoável, a sua justificação torne aquele que foi considerado pela Requerente como irrazoável.
Tomemos ainda em conta o que está implícito no raciocínio da AT ao considerar que para os aerogeradores é aplicável um período de vida útil mínimo de 20 anos: o período máximo de vida útil seria, neste caso, de 40 anos. Ora, da prova recolhida, não creio que esses prazos sejam adequados, reforçando a minha interpretação de que o prazo de 20 anos deve ser interpretado como um prazo médio.
Relevemos, igualmente, a evolução normativa ocorrida, com a entrada em vigor da Lei n.º 82-D/2014, de 31 de dezembro – que aprovou a Reforma da Fiscalidade Verde – no âmbito da qual passaram a estar expressamente incluídos os «equipamentos de energia eólica» na Tabela ii anexa ao DR 25/2009, com uma taxa máxima de depreciação de 8%.
Àquela taxa correspondem um período mínimo e máximo de vida útil de 12,5 anos e 25 anos, respetivamente, períodos mais consentâneos e dotados da rigidez e flexibilidade que historicamente o legislador fiscal tem atribuído na fixação das taxas de depreciação.
Sem colocar em causa que tal alteração apenas produz efeitos de 1 de janeiro de 2015 em diante, parece-me razoável admitir que entre 2011 – ano a que reportam os factos – e 2015[18] não ocorreram factos que justifiquem uma redução de 37,5% (20 anos – 12,5 anos = 7,5 anos / 20 anos = 37,5%) no período mínimo de vida útil dos aerogeradores.
O período de vida útil mínimo de 12,5 anos contraria, assim, de forma evidente a opinião expressa pela Direção de Serviços do IRC (na Informação nº 922/15 de 2015-07-15, relativa ao Proc.1530/15), proferida já após a entrada em vigor da Lei n.º 82-D/2014, de 31 de dezembro, e onde propugna por uma taxa de depreciação de 5%, subjacente a um período mínimo de vida útil de 20 anos.
Assim, e face aos argumentos supra expostos, torna-se difícil compreender a decisão da AT em corrigir o lucro tributável da Requerente, porquanto, na ausência dos aerogeradores das Tabelas anexas ao DR 25/2009, a Requerente adotou um período de vida útil que assenta em critérios económicos e aplicáveis à sua concreta situação, e que, na minha opinião, não merecem censura.
Para desconsiderar aquele período de utilidade esperada, a AT deveria ter apresentado outros argumentos que tornassem a decisão da Requerente irrazoável, mas assim não interpreto: o prazo mínimo de vida útil de 20 anos, determinado numa ótica de durabilidade standard do ativo não é suficiente, do meu ponto de vista, para beliscar a razoabilidade económica subjacente ao prazo de 16 anos adotado pela Requerente.
Ricardo Gomes Pedro
[1] Artigo 31º-B CIRC, na redação atualmente vigente. Corresponde ao artigo 38º do CIRC na redação vigente anterior à Lei nº 2/2014, de 16 de janeiro.
[2] Na versão em vigor até dezembro de 2013, correspondendo ao artigo 31º/5 do IRC na redação da lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro, que republicou o CIRC.
[3] Desenvolvidamente, sobre a natureza, estrutura e função da depreciação, Meier, “Abschreibung”, Beck'sches Steuer- und Bilanzrechtslexikon (Bestlex, beck-online), Edition 1/17 Rn 1-65.
[4] Cfr. num sentido muito próximo o § 57 da Norma Contabilística e de Relato Financeiro 7.
[5] Jeffrey A. Pojanowski, Reason and Reasonableness in Review of Agency Decisions”, 104, Northwestern University Law Review, 2010, 799 ss.
[6] Frédéric G. Sourgens “, “Reason And Reasonableness: The Necessary Diversity of the Common Law”. 67 Maine Law Review, 2015, 73 ss.
[7] Frédéric G. Sourgens “, “Reason And Reasonableness: The Necessary Diversity of the Common Law”. 67 Maine Law Review, 2015, 93 ss.
[8] Zifa Liu, Wenhua Zhang , Changhong Zhao, Jiahai Yuan, “The Economics of Wind Power in China and Policy Implications”, Energies 2015, 8, 1529-1546; doi:10.3390/en8021529file:///C:/Users/Jónatas%20Machado/Downloads/energies-08-01529.pdf (25-5-2017)
[9] Felix Mormann, “Beyond Tax Credits: Smarter Tax Policy for a Cleaner, More Democratic Energy Future”, 31 Yale Journal On Regulation, 2014, 303 Ss.
[10] M. Ragheb, The Economics of Wind Power, 16-3-2017. http://mragheb.com/NPRE%20475%20Wind%20Power%20Systems/Economics%20of%20Wind%20Energy.pdf
[11] Veja-se, por exemplo, a seguinte formulação: “With accelerated depreciation, wind projects can write off the value of their equipment on their financial balance sheets over 5 years rather than the typical 20-year projected lifetime of a project.”, (o sublinhado é nosso), cfr. Community Windustry, Wind Toolbox, Chapter 10: Tax Incentives, http://www.windustry.org/community_wind_toolbox_10_tax_incentives, (25-5-2017); no mesmo sentido, “Windpower projects are intended to operate for about twenty years. Under the 5 year Modified Accelerated Cost-Recovery System (MACRS) schedule, the depreciation is accelerated over a relatively short five to six year period, rather than a more conventional twenty years”. ( sublinhado é nosso) Andrew Merecich, “A closer look at two remaining financial tools”, Windpower Engineering Development, June 25, 2014, http://www.windpowerengineering.com/policy/closer-look-two-remaining-financial-tools/ (25-5-2017).
[12] Salientando a importância do processo de decisão adotado pela administração, Jeffrey A. Pojanowski, Reason and Reasonableness in Review of Agency Decisions”, 104, Northwestern University Law Review, 2010, 804 ss.
[13] Veja-se, por exemplo, David Richardson, “The tax treatment of capital investments in renewable energy”, October 2008, http://www.tai.org.au/sites/defualt/files/WP118_7.pdf (25-5-2017) atribuindo uma vida útil de 30 anos às turbinas eólicas, sem deixar, porém, de reconhecer que o rápido progresso tecnológico acelera a sua depreciação económica.
[15] Rebecca N. Morrow, “Accelerating Depreciation In Recession”, 19, University of Florida Tax Review, 2016, 465 ss.
[16] Niedersächsisches FG, Urteil vom 16.09.2009, 2 K 495/05 und 2 K 496/05.
[17] O Estudo Técnico “Período de Vida útil Esperada de equipamentos de conversão de energia eólica” do Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), de Dezembro de 2013, e realizado pelas Professoras Doutoras Raquel Marujo, Teresa Simões e Ana Estanqueiro, em apontamento aos contratos de manutenção destes equipamentos, refere que «nos anos mais recentes têm surgido casos nos quais estes contractos são redigidos para períodos mais longos, chegando a atingir o período de vida útil esperado para as turbinas eólicas (cerca de 20 anos)» (sublinhado e destacado meus).
[18] Os trabalhos da Comissão para a Reforma da Fiscalidade Verde contaram com estudos realizados e/ ou concluídos antes da entrada em vigor da referida Lei, pelo que o gap temporal entre os factos sob análise na presente decisão arbitral e a alteração legal é ainda menor que 4 anos