Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 515/2016-T
Data da decisão: 2023-09-07  IUC  
Valor do pedido: € 30.503,79
Tema: IUC – Incidência subjetiva – Inconstitucionalidade – Reforma da Decisão Arbitral (anexa à decisão).
*Substitui a Decisão Arbitral de 11 de maio de 2017.
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SUMÁRIO:

 

1- Atento o princípio da equivalência consagrado no artigo 1.º do Código do IUC, o sujeito passivo do imposto, não deve ser o proprietário formal do veículo, mas sim o possuidor/utilizador do automóvel, porque detém o seu uso e o gozo.

2- Os contratos de locação com opção de compra ou o contrato de compra e venda, acompanhados da emissão de factura na forma legal a titular a transmissão do veículo, constituem prova suficiente para comprovar a transmissão de veículos automóveis sujeitos a registo.

3- Os princípios da legalidade e justiça tributária, da capacidade contributiva, da igualdade, da certeza e da segurança jurídicas, não eram suscetíveis de serem violados pelo artigo 3º, nº 1, do CIUC, na redação anterior ao Decreto-Lei nº 41/2016, de 1.08, quando interpretado no sentido de que estabelecia uma presunção ilidível.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Em cumprimento do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 16-02-2023, que declarou a nulidade da Decisão Arbitral de 11-05-2017, proferida, vem o árbitro ora signatário designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa, apresentar nova decisão, que, concordando, seguirá de muito perto o já apreciado e decidido, que não foi objecto do respectivo processo e Acórdão.

 

1. RELATÓRIO

 

1.1 – A… PORTUGAL LDA., com o NIP: …, Reclamante no procedimento tributário, acima e, à margem referenciado, doravante, denominada "Requerente", veio, invocando o disposto nos números 1 e 2 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante RJAT), do artigo 99.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) e do números 1 do artigo 95.º da Lei Geral Tributária (LGT), requerer a constituição do Tribunal Arbitral Singular, com vista:

 

- Á anulação dos atos de liquidação do Imposto Único de Circulação (doravante designado por IUC), efectuados pela Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante AT), referente aos anos de: 2011 e 2012, respeitante a veículos discriminados no documento probatório n.º 1 que faz parte integrante do Pedido de Pronuncia Arbitral Tributária.

 

- Ao pedido de reembolso do valor total de €30.503,79, indevidamente pagos pela Requerente, acrescidos dos juros indemnizatórios previstos nos artigos 43.º da LGT e no artigo 61.º do CPPT, ex vi, artigo 29.º do RJAT.

 

1.2 - Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro singular, Maria de Fátima Alves, que comunicou a aceitação do encargo, no prazo aplicável:

 

- Em 03-11-2016 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico,

 

- Pelo que, o tribunal arbitral foi constituído em 18-11-2016, conforme o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

 

1.3 - A Requerente, na fundamentação do seu pedido de pronúncia arbitral, afirma, em resumo, o seguinte:

 

- Os atos de liquidação, a que respeitam os impostos únicos de circulação, liquidados, cfr., documento n.º 7, anexo à PI e que se encontram discriminados no documento nº 1, também anexo à PI, foram dirigidos diretamente à Requerente;

 

- A Requerente, dedica-se à importação admissão e comercialização de automóveis das marcas "…" e "…", "maioritariamente em estado novo" pelo que os "veículos objectos das liquidações contestadas, inserem-se na sua actividade de venda de veículos novos à rede dos seus concessionários a quem confere o direito de comercializar, procedendo, à comercialização de veículos junto das entidades financeiras do Grupo B… em Portugal, os quais serão objeto de contratos de locação financeira ou aluguer de longa duração;

 

- "Sendo os concessionários que, em nome próprio e por sua conta, procedem à comercialização dos veículos junto ao público, em geral";

 

- "Subsequentemente, a Requerente procede à entrega física das viaturas aos respetivos concessionários, para que estes possam proceder à revenda das mesmas ao cliente final" (docs. n.ºs 2 e 4, anexo à PI);

 

- No âmbito da sua qualidade como Operador Registado, a Requerente desencadeia os procedimentos tendentes à introdução no consumo das referidas viaturas, pedindo a atribuição de matrícula e, simultaneamente, procede ao registo inicial de propriedade das viaturas, em nome do correspondente cliente final, nos termos do artigo 42.º n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei 55/75, 12 de Fevereiro;

 

- Ora, no momento em que é atribuída a matrícula às viaturas que comercializa em estado novo, a Requerente já transmitiu a respectiva propriedade para terceiros (docs. n.ºs 2, 4 e 5, anexos aos autos);

 

- Há a considerar que a Requerente respeitou sempre o registo inicial da propriedade das viaturas em nome dos clientes finais respeitando os prazos legalmente previstos para o efeito (os 60 dias contados a partir da data de atribuição de matrícula, nos termos do n.º 1 e 2, do artigo 42.º do Decreto-Lei n.º 55/75, 12 de Fevereiro);

 

- No entanto, no finai do ano de 2015, a Requerente foi notificada das liquidações de IUC e respectivos juros compensatórios, pelo que a Requerente, dentro do prazo voluntário, procedeu ao pagamento integral, conforme cópias comprovativas, constantes do documento n.º 7, anexo à PI;

 

- Contudo, "não se conformando com as referidas liquidações a Requerente contestou a legalidade das mesmas, requerendo a respectiva anulação, em sede de Reclamação Graciosa, das quais obteve indeferimento (docs. n.ºs 15 e 16, anexo aos autos);

 

- Ora, neste contexto, e, face aos veículos, em causa, a Requerente atuou como intermediária entre os fabricantes das marcas e os concessionários e foram (e são) estes que procederam à respetiva venda (cfr. 2, 3 e 4) anexo aos autos)

 

- Acresce, ainda, que a Requerente procedeu à emissão de faturas de venda até à data de atribuição das matrículas aos veículos, em Portugal (doc. 1, 2, 5) anexos nos autos;

 

- No caso das vendas da Requerente a concessionários, as emissões de faturas ocorrem, anteriormente, à data das respetivas matrículas, sendo estes identificados pelos números dos chassis e objecto de posterior nota de débito do ISV, já com as matrículas correspondentes;

 

- O que, no caso sub judice, afasta qualquer responsabilidade da Requerente face ao pagamento do IUC, pois esta nunca foi proprietária de qualquer dos veículos em causa, conforme se demonstrou e provou nos factos, documentalmente, apresentados e anexos aos autos, porque, ao momento do ano da matrícula a liquidação do imposto dos veículos, em causa, já não pertenciam à Requerente;

 

- Verificando-se, assim, do que antecede, que "os veículos, em causa, foram todos vendidos aos concessionários, anteriormente à data dos factos tributários consubstanciados na exigibilidade do imposto (IUC)", sendo de considerar, também, que a Requerente" procedeu à faturação dos veículos, em questão, antes da atribuição da matrícula, cfr., documentos n.º 2, 5 e7, anexos aos autos;

 

- Pelo que, à data dos factos tributários, a Requerente, não podia ser considerada sujeito passivo do imposto, facto que lhe veda qualquer responsabilidade subjectiva pelo seu pagamento.

 

1.4 - A Requerida, Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por AT), apresentou, inicialmente, resposta, da qual se retira que os atos tributários, controvertidos, não enfermam de qualquer vício de violação de Lei, pronunciando-se pela improcedência da requerida e pela manutenção dos atos de liquidação questionados, defendendo, sumariamente o seguinte:

 

- Põe em causa a exposição formal da PI, apresentada pela Requerente, considerando uma "amálgama documental", que impede perceber "a causa de pedir";

 

- Considerando, assim, inepto o pedido de pronúncia arbitral, alegando insuficiência probatória dos factos invocados pela Requerente;

 

- O que consubstancia uma "exceção dilatória" impeditiva do conhecimento do mérito da causa, nos termos do artigo 576.º n.ºs 1 e 2 do CPC, ex vi, artigo 29.º n.º 1, alínea e, do RJAT;

 

- "O que conduz à absolvição da instância da Requerida, nos termos do artigo 576.º n.º 2 e 577.º, alínea b) do CPC, ex vi, artigo 29.º n.º 1 alínea e, do RJAT;

 

- Posteriormente, em 11-04-2017, apresentou as suas alegações finais, pondo em causa os argumentos invocados pela Requerente, devido ao facto desta fazer:" uma errada interpretação e aplicação das normas legais subsumíveis ao caso, sub judice, notoriamente errada";

                   

- Que os citados "argumentos não têm qualquer apoio ou guarida na lei";

 

- Põe em causa: "o facto gerador do imposto, defendendo que o mesmo é constituído pela propriedade do veículo, bem como atestado pela matrícula ou registo em território nacional, cfr., artigo 6.º do CIUC;

 

- Defende que a Requerente viola o artigo 3.º n.º 1 do CIUC, quando põe em causa, quer o pedido da matrícula quer o pedido do registo dos referidos veículos;

 

- Que pelo facto do primeiro registo de cada automóvel ser concretizado em nome da importadora, a Requerente tem que, necessariamente, figurar como proprietária dos veículos automóveis;

 

- Pois é peremptório que nos termos do artigo 24.º do RRA, o importador por figurar como primeiro proprietário, é, de acordo com o "estatuído nos artigos 3.º e 6.º do CIUC," sujeito passivo do imposto controvertido;

 

- Acresce que o preenchimento da DAV e pago o ISV, são elementos suficientes "para preencher o facto gerador do IUC e, concomitantemente, a incidência subjetiva do imposto";

 

- Põe, também, em causa "as pretensas faturas de venda", pois considera que as mesmas "não são aptas a comprovar a celebração de um contrato sinalagmático";

 

Face aos factos, sumariamente expostos, a Requerida faz uma interpretação geral e objectiva do expressamente disposto nos artigos que invoca, não considerando a presunção do artigo 3.º do CIUC, nem a presunção do respectivos registos, afastando, assim, o artigo 73.º da LGT;

Não, considera, também, o princípio da equivalência, previsto no artigo 1.º do CIUC, corolário do princípio do poluidor/pagador, com assento no n.º 2 do artigo 66.º da CRP;

Nem considera os trâmites efectuados, pela Requerente, aquando da sua primeira inscrição da matrícula ou registo em território nacional, que cumprem os prazos permitidos, face à conjugação do n.º 2 do artigo 42.º do RRA, com o n.º 1 do artigo 17.º do CIUC.

 

1.4.1- Em sede de alegações, a Requerida, invocou, entre o mais, o seguinte:

"A acrescer a tudo quanto acima foi exposto, cabe ainda referir que a interpretação veiculada pela Requerente se mostra contrária à lei fundamental.

O entendimento propugnado pela Requerente com vista a afastar a incidência subectiva e tributação do IUC não tem acolhimento legal e viola os princípios constitucionais da legalidade e justiça tributária, da capacidade contributiva, da igualdade, da certeza e da segurança jurídicas.

Desde logo, o afastamento da incidência subjetiva na tributação em sede de IUC proposto pela Requerente contraria o princípio da legalidade e da tipicidade estatuído no artigo 8.º da LGT e no artigo 103.º da CRP, uma vez que tal entendimento não se escora na lei.

Em nenhuma circunstância o legislador tributário ficcionou o afastamento da tributação em caso de registo, descurando o facto gerador consubstanciado na matrícula.

Isto é, em momento algum o legislador concebeu na lei a posição que a Requerente advoga.

De acordo com as normas citadas, a incidência está sujeita ao princípio da legalidade tributária.

Logo, não tendo o legislador tributário expressamente consagrado na lei o afastamento da incidência subjetiva de tributação em sede de IUC nos casos em que a Requerente aponta, é inequívoco que tal entendimento viola frontalmente o princípio da legalidade tributária consignado no 103.º da Constituição e no artigo 8.º da LGT.

Mas mais: tal entendimento colide ainda com o princípio da capacidade contributiva estatuído no artigo 104.º da Constituição e no artigo 4.º da LGT.

Sobre a capacidade contributiva tem vindo o Tribunal Constitucional a considerar que o princípio da capacidade contributiva, também frequentemente designada por capacidade de pagar – ability to pay – ou capacidade económica – wirtschaftliche Leistungsfähigkeit) como “critério básico da nossa ‘Constituição fiscal’ – concretizando o dever de todos pagarem impostos segundo o mesmo critério, a capacidade contributiva é o critério unitário da tributação.

Assim, o princípio da capacidade contributiva constitui pressuposto e medida dos impostos, constituindo a idoneidade económica para suportar o ónus do tributo, ou seja, exige que o tipo legal de imposto contenha referência só a elementos económico financeiros.

Ora, o entendimento sufragado pela Requerente ao tentar afastar a incidência subjectiva do IUC, afastando concomitantemente o pagamento do IUC, colide frontalmente com o princípio da capacidade contributiva.

Por maioria de razão e porque intrinsecamente associado com o princípio da capacidade contributiva, tal entendimento viola o princípio da igualdade tributária, vertido no artigo 13.º da Constituição.

Por fim, é indubitável que o entendimento sufragado pela Requerente colide com o princípio da certeza e da segurança jurídicas.

 

2. QUESTÕES DECIDENDAS

 

2.1 - Face ao exposto nos números anteriores, relativamente à exposição das partes e aos argumentos apresentados, as principais questões a decidir são as seguintes:

 

- A alegação feita pela Requerente relativa à liquidação material dos atos de liquidação, relativos aos anos de 2011 e 2012, referente ao IUC, pago sobre os veículos supra referenciados no documento n.º 7 e, relacionados no documento n.º 1, anexos à PI;

 

- A questão prévia da exceção, invocada pela AT;

                   

- A questão prévia de exceção, invocada pela Requerente;

 

- A errada interpretação e aplicação das normas de incidência subjetiva do imposto único de circulação liquidado e cobrado, o que constitui, a questão central a decidir no presente processo;

 

- O valor jurídico do registo dos veículos automóveis.

 

- A invocada violação dos principios constitucionais.

 

3. FUNDAMENTOS DE FACTO

 

3.1 - Em matéria de facto, relevante para a decisão a proferir, dá o presente Tribunal por assente, face aos elementos existentes nos autos, os seguintes factos:

 

A Requerente é uma sociedade comercial de direito português, com sede e direcção efectiva em território nacional, enquadrada no regime geral para efeitos de IRC e de IVA, que se dedica à importação, admissão e comercialização de veículos automóveis das marcas «…» e «…», maioritariamente em estado novo.

 

Para comercializar os referidos veículos em Portugal, a Requerente serve-se de uma rede de concessionários a quem confere o direito de comercializar, na fase de retalho, veículos automóveis das marcas em apreço, podendo ainda, em certos casos, proceder à comercialização de veículos junto das entidades financeiras do Grupo B… em Portugal, os quais serão objecto de contratos de locação financeira ou aluguer de longa duração.

São os concessionários que, em nome próprio e por sua conta, procedem à comercialização dos veículos junto do público em geral.

 

Em regra, os compradores dos veículos marca «…» ou «…» dirigem-se aos referidos concessionários com vista à escolha da viatura a adquirir (modelo, cor, equipamentos, etc.) e estes últimos, por sua vez, procedem à encomenda do respectivo veículo à Requerente.

Subsequentemente, a Requerente procede à entrega física da viatura ao concessionário para que este possa proceder à revenda da mesma ao cliente final. Nesse momento, a Requerente emite ao concessionário a respectiva factura de venda do veículo automóvel, transmitindo para este a propriedade e o risco de perda do veículo em presença.

 

No âmbito do procedimento instituído, acima descrito, a ora Requerente efectivamente recebe o pagamento do preço que lhe é devido pela venda das veículos que comercializa através dos seus concessionários.

 

Nos dias seguintes, na sua qualidade de operador registado para efeitos de Imposto Sobre Veículos, a Requerente desencadeia os procedimentos tendentes à introdução no consumo da viatura - i.e., ao pedido de atribuição de matrícula - procedendo ainda a Requerente, em simultâneo, ao registo inicial de propriedade da viatura em nome do cliente final, nos termos do disposto no artigo 42.º , n.ºs 1 e 2, do Decreto n.º 55/75, diploma que aprova o Regulamento do Registo Automóvel.

 

Nos casos em que a Requerente não procede ao registo inicial da propriedade da viatura em nome dos clientes finais, fica inscrita junto do registo automóvel relativamente a esses veículos uma vez que, na qualidade de operador registado para efeitos de Imposto sobre Veículos Automóveis, introduziu as viaturas no consumo.

 

No momento em que é atribuída a matrícula às viaturas que comercializa em estado novo, a ora Requerente já transmitiu a respectiva propriedade para terceiros.

                                                                    

Dentro do prazo de pagamento voluntário, a Requerente procedeu ao pagamento integral das liquidações de IUC e juros compensatórios.

 

Não se conformando com as referidas liquidações de IUC e juros compensatórios, a Requerente contestou a legalidade das mesmas perante a Administração Tributária, requerendo a respectiva anulação, em sede de reclamação graciosa.

Através do Ofício n.º …, de 10 de Março de 2016, a ora Requerente foi notificada da cumulação das diversas reclamações graciosas em quatro procedimentos, ao abrigo do artigo 71.º do CPPT.

 

Na sequência do exercício do seu direito de audição prévia, a Requerente foi notificada do indeferimento das referidas reclamações graciosas n.ºs …, …, no dia 27 de Maio de 2016.

 

A 4 de Julho de 2016, também na sequência do exercício do seu direito de audição prévia, a Requerente foi notificada do indeferimento das reclamações graciosas n.ºs … e …,

 

A Requerente apresentou elementos probatórios constantes dos documentos n.ºs; 1, 2, 5, 6 e 7, junto à PI, que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais;

 

3.1.1 - FUNDAMENTAÇÃO DOS ATOS PROVADOS

 

- Os factos dados como provados estão baseados nos documentos anexos ao pedido de pronúncia arbitral da supra referida PI, e, nas provas documentais apresentadas pela Requerida no âmbito da exceção da "ineptidão da causa de pedir" e nos documentos probatórios, ao longo de toda a tramitação processual e nas alegações finais, bem como, nas provas documentais apresentadas pela Requerente, quer consubstanciadas na já citada PI e na Réplica, que também consubstancia a exceção da "intempestividade", bem como, nos correspondentes elementos probatórios consubstanciados nas respetivas faturas e contratos que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.

 

3.1.2 - FACTOS NÃO PROVADOS

 

- Não existem factos dados como não provados, dado que todos os factos tidos como relevantes para a apreciação do pedido foram provados.

 

4. FUNDAMENTOS DE DIREITO

 

4.1 - O Tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º n.º 1, alínea a), 5.º n.º 2, alínea a), 6.º n.º 1, 10.º n.º 1, alínea a) e n.º 2 do RJAT:

 

- As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas, ex vi, artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo n.º 1 da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março;

 

- O processo não enferma de nulidades;

 

- Existindo duas questão prévias sobre a qual o Tribunal se deve pronunciar.

 

5- QUESTÃO PRÉVIA1

 

- A Autoridade Tributária; Requerida no processo supra citado, vem, no âmbito da sua Resposta, apresentada, nos termos do disposto e para os efeitos previstos no n.º 1 e 2 do artigo 17.º do RJAT, invocar uma exceção dilatória que se consubstancia na "ineptidão da petição inicial", por alegada insuficiência probatória dos factos invocados pela Requerente;

 

- Pede, a absolvição da instância da Requerida, nos termos dos artigos 576.º, n.º 2 e 577.º, alínea b) do CPC, ex vi artigo 29.º n.º 1, alínea e do RJAT.

 

ATENTO OS FACTOS SUMARIAMENTE EXPOSTOS,

 

Este Tribunal Considera:

 

Que não se verifica na PI, in casu, a falta de indicação "da causa de pedir", até porque, haveria sempre a possibilidade, nos termos do n.º 2 do artigo 98.º do CPPT, ex vi, artigo 29.º , n.º 1, alínea e) do RJAT, e nos termos do n.º 2 do artigo 6.º do CPC, também, ex vi, artigo 29.º n.º 1, alínea e) do RJAT , que ao verificar-se a nulidade recorrente da ineptidão da petição inicial, ser, oficiosamente, "deduzida a todo o tempo, até ao trânsito em julgado da decisão final", determinando-se, assim, "a realização dos atos necessários à regularização da instância", contudo, este Tribunal, não entendeu necessário recorrer a esse mecanismo legal, pois são percetíveis as faturas e contratos apresentadas como documentos n.ºs 2 , 5 e 7, que remetem para o documento n.º 1, todos, anexos à PI;

 

De qualquer forma, entende-se que a formulação factual apresentada, tem algumas repetições documentais que podem, eventualmente, confundir alguns factos relacionais, expostos, mas, não deixa, contudo, de se verificar na PI que a Requerente pede a anulação dos atos de liquidação de IUC sindicados pela AT, nas quatro "Reclamações Graciosas"( cfr. documentos anexos aos autos), por considerar que, ao momento dos atos de liquidação tributária a Requerente não é sujeito passivo do IUC, logo, há que considerar que "a causa de pedir" não é de forma alguma obscura, pois determina bem o seu sentido, e, compreende-se bem, os efeitos jurídicos que a Requerente pretende obter: "que são as anulações dos atos das liquidações efectuadas pela AT, por não se considerar sujeito passivo do respectivo IUC (fatos jurídicos que constituem a causa de pedir e as razões de direito que fundamentam a ação), entendendo-se, neste contexto, que as vendas efectuadas pela Requerente, através dos concessionários aos consumidores finais, estão expressas nas faturas de venda (documento n.º 2 e n.º 5, anexos aos autos);

 

De qualquer forma, os factos contidos nos documentos juntos com os articulados (cfr., Ac., TRC, de 14-10-2008, processo n.º 2377/07.8TBVIS.CI, p. 7), podem ser aproveitados para integrar a descrição da "causa de pedir", quando para eles remetam expressa ou implicitamente, o que, in casu, a PI, controvertida, remete expressamente;

 

Segundo o entendimento de J. Alberto dos Reis (in AC., TRC prc.º n.º 2377/07.8TBVIS.CI, p. 7), o documento junto com a Petição deve considerar-se parte integrante desta e, por isso, susceptível de suprir lacunas de que a Petição enferma (quanto aos factos, obviamente);

 

Sendo de acrescer que, também, J. Alberto dos Reis refere, in Comentário ao CPC, II, p. 371 (in AC., TRC-proc.º n.º 2377/07.8TBVIS.CI, p. 8), que há vício de ininteligibilidade da causa de pedir quando o autor expõe os factos fonte do pedido em termos de tal modo confusos, ambíguos ou ininteligíveis que não seja possível apreender com segurança a causa de pedir;

 

Ora, a PI da Requerente, não é obscura, pois esta permite "determinar bem o seu sentido", não enferma, portanto, de ininteligibilidade, pelo que este Tribunal não considerou necessário a correcção da peça processual (PI).

 

Face ao exposto, é julgada improcedente a alegada exceção da ineptidão do pedido de pronúncia arbitral, por não se verificar que a causa de pedir enferme de ininteligibilidade, pois permite com segurança apreender "a causa de pedir", pelo que se consideram afastados os critérios da alínea a) do n.º 1 e, consequentemente, o disposto no n.º 2 do artigo 98.º do CPPT, ex vi, artigo 29.º, n.º 1, alínea c) do RJAT.

 

6- QUESTÃO PRÉVIA2                                                                                        

 

No concernente à exceção da Intempestividade, alegada pela Requerente, no âmbito da alegada apresentação da Resposta fora de prazo, foi esta exceção dilatória legalmente bem defendida pela Requerida, atentos todos os prazos, incluindo as férias de Natal;

 

Pelo que este Tribunal, remete para o artigo 132.º do CPC, ex vi, artigo 29.º do RJAT,

E, julga tempestiva a Resposta, apresentada pela Requerida, considerando improcedente a referida exceção dilatória.

 

7 - QUESTÃO DA ERRADA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA NORMA DE INCIDÊNCIA SUBJETIVA DO IUC

 

7.1 Considerando ser pacífico o entendimento, na doutrina, de que na interpretação das leis fiscais valem plenamente os princípios gerais de interpretação os quais serão, apenas e naturalmente, limitados pelas exceções e particularidades ditadas pela própria lei objeto de interpretação. Trata-se de um entendimento que tem vindo a merecer acolhimento nas Leis Gerais Tributárias de outros países e que veio também a ter assento no artigo 11.º da nossa Lei Geral Tributária, o que vem, aliás, sendo frequentemente sublinhado pela jurisprudência.

É consensualmente aceite que tendo em vista a apreensão do sentido da lei, a interpretação socorre-se, a priori, em reconstruir o pensamento legislativo através das palavras da lei, o que significa, procurar o seu sentido literal, valorando-o e aferindo-o à luz de outros critérios, intervindo, os designados elementos de natureza lógica; racional ou teleológicos e de ordem sistemática:

 

- A propósito da interpretação da lei fiscal, há a considerar a jurisprudência, nomeadamente, os Acórdãos do STA de 05-09-2012, processo n.º 0314/12 e de 06-02-2013, processo 01000/12, disponíveis em www.dgsi.pt, a importância do disposto no artigo 9.º do Código Civil (CC), enquanto elemento fundamental da hermenêutica jurídica;

 

- Dispõe o n.º 1 do artigo 3.º do CIUC que " São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou coletivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados";

 

- A formulação usada no referido, artigo, socorre-se da expressão "considerando-se" o que suscita a questão de saber se, a tal expressão pode ser atribuído um sentido presuntivo, equiparando-se à expressão "presumindo-se", trata-se de expressões frequentemente utilizadas, com sentidos equivalentes;

 

- Como ensina Jorge Lopes de Sousa, in Código do Procedimento e do Processo Tributário, Anotado e Comentado, volume I 6.ª Edição, Área Editora, SA, Lisboa 2011, p. 589, que em matéria de incidência tributária, as presunções podem ser reveladas pela expressão "presume-se" ou por expressão semelhante, aí se mencionando diversos exemplos dessas presunções, referindo-se a constante no artigo 40.º, n.º 1 do CIRS, em que se usa a expressão "presume-se" e a constante no artigo 46.º n.º 2, do mesmo Código, em que se faz uso da expressão "considera-se", enquanto expressão com um efeito semelhante àquela e, consubstanciando, igualmente, uma presunção;

 

- Na formulação legal exarada no n.º 1 do artigo 3.º do CIUC, em que se consagrou uma presunção, revelada pela expressão " considerando-se", de significado semelhante e de valor equivalente à expressão "presumindo-se", em uso desde a criação do imposto em questão (não sendo, no entanto, de considerar as atuais alterações interpretativas, do referido artigo n.º 3.º do CIUC, uma vez que os factos, em causa não são abrangidos pelas disposições legais em vigor);

 

- O uso da expressão "considerando-se" mais não visou do que o estabelecimento de uma aproximação mais vincada e nítida entre o sujeito passivo do IUC e o efectivo proprietário do veículo, o que está em sintonia com o reforço conferido a propriedade do veículo, que passou a constituir o facto gerador do imposto, nos termos do artigo 6.º do CIUC;

 

- A relevância e o interesse da presunção, em causa, que historicamente foi revelado por intermédio da expressão "presumindo-se" e que agora, se serve da expressão "considerando-se", reside na verdade e na justiça que, por essa via, se confere às relações fiscais e, que corporizam valores fiscais fundamentais, permitindo tributar o real e efectivo proprietário e não aquele que, por circunstâncias de diversa natureza, não passa, por vezes, de um aparente e falso proprietário. Se o caso, assim não fosse considerado, não se admitindo e relevando a apresentação de elementos probatórios destinados à demonstração de que o efectivo proprietário é, afinal, pessoa diferente da que consta do registo e, que inicialmente, e, em princípio, se supunha ser o verdadeiro proprietário, aqueles valores seriam objectivamente postergados.

 

7.2 - Há a considerar, também, o princípio da equivalência, inscrito no artigo 1.º do CIUC, que tem subjacente o princípio do poluidor-pagador e, concretiza a ideia nele inscrita de que quem polui deve, por isso, pagar. O referido principio tem assento constitucional, na medida em que representa um corolário do disposto na alínea h) do n.º 2 do artigo 66.º da constituição, tendo, também, assento no direito comunitário, seja ao nível do direito originário, artigo 130.º-R, do Tratado de Maastrich (Tratado da União Europeia, de 07-02-1992), onde o aludido princípio passou a constar como suporte da Política Comunitária, no domínio ambiental e que visa responsabilizar quem contribui com os prejuízos que advêm para a comunidade, decorrentes da utilização dos veículos automóveis, sejam assumidos pelos seus proprietários-utilizadores, como custos que só eles devem suportar.

 

7.3 - Atentos os factos supra descritos, importa salientar que os já referidos elementos de interpretação, sejam os relacionados com a interpretação literal, apoiada nas palavras legalmente utilizadas, sejam as respeitantes aos elementos lógicos de interpretação, de natureza histórica ou de ordem racional, apontam, todos eles, no sentido de que a expressão "considerando-se" tem um sentido equivalente à expressão "presumindo-se", devendo, assim entender-se que o disposto no n.º 1 do artigo 3.º do CIUC consagra uma presunção legal que, face ao artigo 73.º da LGT, onde se estabelece que "As presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário", será necessariamente ilidível, o que significa que os sujeitos passivos são, em princípio, as pessoas em nome de quem tais veículos estejam registados. Serão, pois, essas pessoas, identificadas nessas condições a quem a AT se deve, necessariamente, dirigir;

 

- Mas será, em princípio, dado que no quadro de audição prévia, de carácter obrigatório, face ao disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT, a relação tributária poderá ser reconfigurada, validando-se o sujeito passivo inicialmente identificado ou redirecionando-se o procedimento no sentido daquele que for, afinal, o verdadeiro e efectivo, sujeito passivo do imposto em causa;

 

- O contribuinte tem o direito de ser ouvido, mediante audição prévia (José Manuel Santos Botelho, Américo Pires Esteves e José Cândido de Pinho, in

Código do Procedimento Administrativo, Anotado e Comentado, 4.ª edição, Almedina, 2000, anotação 8 do artigo 100.º);

 

- A audição prévia que, naturalmente, se terá de concretizar em momento imediatamente anterior ao procedimento da liquidação, corresponde à sede e altura própria para, com certeza e segurança se identificar o sujeito passivo do

 

- Que nos autos em apreço, a Requerente, demonstrou, à AT, em sede de audição prévia, que os factos incidiam no âmbito de vendas e contratos a concessionários, pelo que, através de documentos, anexos aos autos nunca a Requerente pode ser responsável pelo pagamento do IUC.

 

8 - SOBRE O VALOR JURIDICO DO REGISTO

 

8.1 - Relativamente ao valor jurídico do registo, importa notar o que estabelece o n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro (diversas vezes alterado, sendo a última por via da Lei n.º 39/2008, de 11 de Agosto), quando estatui que " o registo de veículos tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos a motor e respectivos reboques, tendo em vista a segurança do comércio jurídico":

 

- O artigo 7.º do Código do Registo Predial (CRP), aplicável, supletivamente, ao registo de automóveis, por força do artigo 29.º do CRA, dispõe que" O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define";

 

- O registo definitivo não constitui mais do que uma presunção ilidível, admitindo, por isso, contraprova, como decorre da lei e a jurisprudência vem assinalando, podendo ver-se, entre outros os Acórdãos do STJ n.º 03B4369 de 19-02-2004 e n.º 07B4528, de 29-01-2008, disponíveis em: www.dgsi.pt;

 

- Portanto, a função legalmente reservada ao registo é por um lado a de publicitar a situação jurídica dos bens, no caso em apreço; dos veículos e, por outro lado, permite-nos presumir que existe o direito sobre esses veículos e que o mesmo pertence ao titular, como tal inscrito no registo, não tem uma natureza constitutiva do direito de propriedade, mas apenas declarativa, daí que o registo não constitua condição de validade da transmissão do veículo do vendedor para o comprador;

 

- Os adquirentes dos veículos tornam-se proprietários desses mesmos veículos por via da celebração dos correspondentes contratos de compra e venda, com registo ou sem ele;

 

- Neste contexto cabe lembrar que, face ao disposto no n.º 1 do artigo 408.º do CC, a transferência de direitos reais sobre as coisas, no caso sub judice, veículos automóveis, é determinado por mero efeito do contrato, sendo que nos termos do disposto na alínea a) do artigo 879.º do CC, entre os efeitos essenciais do contrato de compra e venda, avulta a transmissão da coisa;

 

- Face ao exposto, torna-se claro que o pensamento legislativo aponta no sentido de que o disposto no n.º 1 do artigo 3.º do CIUC, consagra uma presunção "juris tantum, consequentemente ilidível, permitindo, assim, que a pessoa, que, no registo, está inscrita como proprietária do veículo, possa apresentar elementos de prova destinados a demonstrar que tal propriedade está inserida na esfera jurídica de outra pessoa, para quem a propriedade foi transferida;

 

- O que no referente aos factos controvertidos, existem, junto aos autos  documentos, que foram provados pela Requerente, tanto em sede de audição previa, como no pedido de pronúncia arbitral, configurando, por isso a certeza de que pertence aos respectivos proprietários/utilizadores, dos veículos, a responsabilidade subjectiva dos IUCs, nos termos do n.º 1 e 2 do artigo 3.º2 do CIUC

 

9 - A PRESUNÇÃO DO ARTIGO 3.º DO CIUC E A DATA EM QUE O IUC É EXIGÍVEL

                        

9.1 - DATA EM QUE O IUC É EXIGÍVEL

 

- O IUC é um imposto de tributação periódica, cuja periodicidade corresponde ao ano que se inicia no ato da matrícula ou em cada um dos seus aniversários, conforme o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 4.º do CIUC;

                   

- É exigível nos termos do n.º 3 do artigo 6.º do referido Código;

 

- Sendo de referir que, quanto à liquidação do IUC tributado à Requerente sobre os veículos supra referenciados, no ano de 2011 e 2012 há que considerar, que ao momento dos factos tributários, as viaturas em causa estavam na esfera jurídica dos proprietários/utilizadores dos referidos automóveis, porque estes detêm o uso e o gozo dos referidos veículos, pelo que nos termos do n.º 1 e 2 do art. 3.º do CIUC, têm que ser responsabilizados, pelo pagamento da obrigação do referido imposto.

 

9.1.1 - Em relevância sobre o ónus da prova, estipula o artigo 342.º n.º 1 do CC "àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado";

 

9.1.2 - Também o artigo 346.º do CC (contra prova) determina, que "à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contra prova a respeito dos mesmos factos, destinados a torná-los duvidosos; se o conseguir, é a questão decidida contra a parte onerada com a prova." (Como afirma Anselmo de Castro, A., 1982, ED. Almedina Coimbra, "Direito Processual Civil Declaratório", III, p. 163, "recaindo sobre uma das partes ónus probatório, à parte contrária basta opor contra prova, sendo esta uma prova destinada a tornar duvidosa os factos alegados pela primeira".

Assim, no caso dos autos, o que a Requerente tem que provar, afim de ilidir a presunção que decorre quer do artigo 3.º do CIUC quer do próprio Registo Automóvel, é que ela Requerente não era proprietária dos veículos em causa no período a que dizem respeito as liquidações impugnadas. Propõe provar, segundo resulta dos autos, é que a, propriedade dos veículos, não lhe pertenciam nos períodos a que as liquidações dizem respeito. Apresentando, assim, as faturas de venda, constantes dos  documentos n.ºs 1, 7, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidas, para todos os efeitos legais.

 

9.2 - ILISÃO DA PRESUNÇÃO

 

- A Requerente, como se refere em 3.1., relativamente aos factos provados, alegou, com o propósito de afastar a presunção, não ser sujeito passivo do imposto, aquando da ocorrência dos factos tributários, oferecendo para o efeito os seguintes documentos;

 

- Faturas de venda aos concessionários e aos consumidores finais, documentos junto aos autos com os n.ºs 1,2, 4, 5 e 7;

 

- Ora, esses documentos, gozam, da presunção da veracidade prevista no n.º 1 do artigo 75.º da LGT. Decorrendo daqui, que à data em que o IUC era exigível quem detinha a propriedade dos veículos automóvel eram os legítimos proprietários e não a Requerente.

 

10 - OUTRAS QUESTÕES RELATIVAS À LEGALIDADE DOS ATOS DE LIQUIDAÇÃO

 

- Relativamente à existência de outras questões atinentes à legalidade dos atos de liquidação, tendo em conta que está ínsito no estabelecimento de uma ordem de conhecimentos dos vícios, tal como o previsto no artigo 124.º do CPPT, que procedendo o pedido de pronúncia arbitral baseado em vícios que impedem a renovação das liquidações impugnadas, fica prejudicado, porque inútil, o conhecimento de outros vícios, pelo que, não se afigura necessário conhecer das demais questões suscitadas.

 

11. DA INTERPRETAÇÃO DESCONFORME A CONSTITUIÇÃO

 

Invoca a Requerida que a interpretação do artigo 3º do CIUC, no sentido considerado, é inconstitucional, por constituir uma violação dos princípios da legalidade e justiça tributária, da capacidade contributiva, da igualdade, da certeza e da segurança jurídicas.

Vejamos

 

1.1- É o artº.103 da CRP, que consagra o princípio da legalidade tributária, como um dos elementos estruturantes do Estado de direito constitucional, o qual se traduz na regra da reserva de lei para a criação e definição dos elementos essenciais dos impostos, não podendo estes deixar de constar de diploma legislativo. A universalidade da doutrina assinala dois corolários ao mesmo: o princípio da preeminência de lei e o princípio da reserva de lei.

 

Assim, nos termos da consagração constitucional do princípio da legalidade tributária, os impostos devem ser criados por Lei, e Lei formal emanada da Assembleia da República, a qual, nos termos do artigo 103.º n.º 2 da CRP deve determinar a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias gerais dos contribuintes.

 

Como refere Casalta Nabais, o princípio da legalidade fiscal exprime uma reserva material de lei formal que se analisa em dois aspectos ou (sub)princípios: 1) no princípio da reserva de lei formal, que implica a reserva à lei ou ao decreto-lei, autorizado da matéria fiscal referenciada; 2) no princípio da reserva material ou conteudística, em geral referido com base na dogmática alemã, por princípio da tipicidade, que impõe que a lei ou o decreto-lei autorizado contenha disciplina completa da matéria reservada.

 

Também Ana Paulo Dourado, a lei é o ponto de partida para garantir a segurança jurídica, porque é aprovada pelos representantes parlamentares. A lei também serve a igualdade, por ser geral e abstracta, embora não seja suficiente para garantir esta última.

Na Constituição portuguesa de 1976, continua, o princípio da legalidade fiscal é objecto de cinco artigos que abrangem:

- A vertente das competências e divisão vertical de poderes tributários que inclui a distribuição de competências entre Assembleia da República e Governo e competências das Regiões Autónomas e das Autarquias Locais em matéria fiscal (arts. 165.º, n.º 1 al. i), e n.º 2, 227.º, n.º 1 al. i), 232.º n.º 1 e 238.º n.º 4);

- O objecto da reserva de lei, que inclui a criação de impostos e sistema fiscal (de que fazem parte os elementos essenciais do imposto, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes), e o regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas (arts. 165.º, n.º 1 al. i) e 103.º n.º 2);

- A vertente material, no sentido das exigências de densificação da lei fiscal quanto aos elementos essenciais dos impostos – exigências estabelecidas na primeira parte do art. 103.º n.º 2 (incidência e taxa), garantindo um princípio de legalidade substancial ou princípio da tipicidade fiscal;

- Um princípio de preferência ou precedência de lei, no art. 103.º n.º 3, e a consagração de um direito de resistência à tributação que viole a Constituição ou a lei.

 

9.1.1- Ora, não se vê, que a não expressa consagração na lei do “afastamento de incidência subjectiva de tributação”, nos caso em análise, belisque, minimamente, o principio da legalidade tributária, em qualquer das suas dimensões ou vertentes, como argui a Requerida.

 

9.2- Por outro lado, o Tribunal Constitucional tem, efetivamente, vindo a defender o afastamento um controlo meramente negativo da igualdade tributaria, passando a adoptar o princípio da capacidade contributiva como critério adequado à repartição dos impostos” e que, não excluindo deste princípio a eventualidade do recurso igualmente ao princípio (negativo) da proibição do arbítrio, o princípio da igualdade tributária acaba “por poder concretizarse nas seguintes três vertentes: generalidade, uniformidade, (a aferir através do princípio da capacidade contributiva) e a da proibição do arbítrio.

 

Refere-se no Acórdão n.º 53/2018, (...) o princípio da igualdade tributária pode ser concretizado através de vertentes diversas: uma primeira, está na generalidade da lei de imposto, na sua aplicação a todos sem exceção; uma segunda, na uniformidade da lei de imposto, no tratar de modo igual os contribuintes que se encontrem em situações iguais e de modo diferente aqueles que se encontrem em situações diferentes, na medida da diferença, a aferir pela capacidade contributiva;

Uma última, está na proibição do arbítrio, no vedar a introdução de discriminações entre contribuintes que sejam desprovidas de fundamento racional.

Em suma, o princípio da capacidade contributiva obriga a que os sujeitos passivos contribuam para os encargos públicos de acordo com a respectiva capacidade contributiva (ability to pay), actuando como pressuposto e, ao mesmo tempo, como limite de tributação, no sentido em que quem não dispõe de força contributiva não é tributado – dimensão positiva – e quem dispõe só pode ser tributado até ao limite que lhe permite a sua capacidade contributiva, ou seja, não é permitido que o contribuinte contribua para os encargos tributários em medida superior àquela que é a sua capacidade contributiva – dimensão negativa.

 

9.2.1-Tambem, aqui se não vê - considerando a racio e estrutura referidos - em que medida,  a interpretação, seguida, viola os principios da igualdade e capacidade produtiva.

 

9.3- Por fim

Concorda-se com o entendido na Decisão Decisão 740/2016-T:

(…) Considere-se, a propósito do princípio da confiança e do princípio da segurança jurídica, o referido pelo Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18 de Junho de 2003, Proc. Nº 01188/02:

“Um dos corolários do princípio da boa-fé consiste no princípio da protecção da confiança legítima, incorporando a boa-fé o valor ético da confiança. Vide, Marcelo Rebelo de Sousa e José de Melo Alexandrino, in “Constituição da República Portuguesa Comentada”, a págs. 396, Margarida Olazabal Cabral, in “O concurso público nos contratos administrativos”, a págs.92, Jesus Gonzalez Perez, in “El principio general de la buena fe en el derecho administrativo”, 2ª edição, a págs. 52, Frederico Castilho Blanco, in “La protección de confianza en el derecho administrativo,”, a págs. 77 e seguintes e Sainz Moreno, in “La buena fe en las relaciones de la Administración con los administrados”, in Revista de Administración pública”, nº 89, a págs. 314. Pode dizer-se, numa formulação sintética, que a Administração viola a boa-fé quando falta à confiança que despertou num Particular ao actuar em desconformidade com aquilo que fazia antever o seu comportamento anterior, sendo que, enquanto princípio geral de direito, a boa-fé significa “que qualquer pessoa deve ter um comportamento correcto, leal e sem reservas, quando entra em relação com outros pessoas” – apud M. Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco Amorim, in “Código do Procedimento Administrativo”, 2ª edição, a págs. 108 -, apresentando-se como vocacionado para, designadamente, impedir o verificação de comportamentos desleais e incorrectos (obrigação de lealdade). Aliás, a exigência da protecção da confiança é também uma decorrência do princípio da segurança jurídica, imanente ao Estado de Direito. Contudo, a aplicação do princípio da protecção da confiança está dependente de vários pressupostos, desde logo, o que se prende com a necessidade de se ter de estar em face de uma confiança “legítima”, o que passa, em especial, pela sua adequação ao Direito, não podendo invocar-se a violação do princípio da confiança quando este radique num acto anterior claramente ilegal, sendo tal ilegalidade perceptível por aquele que pretenda invocar em seu favor o referido princípio. Por outro lado, para que se possa, válida e relevantemente, invocar tal princípio é necessário ainda que o interessado em causa não o pretenda alicerçar apenas na sua mera convicção psicológica antes se impondo a enunciação de sinais externos produzidos pela Administração suficientemente concludentes para um destinatário normal e onde se possa razoavelmente ancorar a invocada confiança. Vide, neste sentido, Jesus Gonzalez Perez, in “Comentarios a la ley de procedimiento administrativo”, a págs. 982-983. Acresce que um outro pressuposto a atender relaciona-se com a necessidade de o Particular ter razões sérias para acreditar na validade dos actos ou condutas anteriores da Administração aos quais tenha ajustado a sua actuação.” (sublinhados nossos).

No caso em concreto, não se afigura possível que tal interpretação coloque em causa a protecção da confiança e a segurança jurídica. Efectivamente, decorre de forma bastante clara do artigo 3º do CIUC que o legislador pretendia consagrar uma presunção, sendo essa a jurisprudência dominante. Quanto ao facto de se tratar de uma presunção ilidível, tal deriva do expressamente disposto no art. 73.º da LGT.

Ora, os princípios da confiança e da segurança jurídica derivam da necessidade de existir um mínimo de certeza e de segurança nos direitos dos particulares, bem como nas expectativas juridicamente criadas pelos mesmos. A razão da existência destes princípios prende-se com a tutela da confiança dos particulares na actuação do Estado.

No caso concreto, não existe qualquer possibilidade de criação de uma expectativa de confiança criada pelo particular no sentido de o artigo 3º do CIUC não consagrar uma presunção. Muito pelo contrário, poderia até defender-se que o princípio da confiança e da segurança jurídica legitimariam a expectativa do particular que considera que o artigo 3º do CIUC configura uma presunção ilidível, como assim sempre tem vindo a ser interpretado.(…).

 

9.3.1-No mesmo sentido, proc. 109/2017-T:

(…) Não se vislumbra, porém, salvo o devido respeito, como é que a posição que sustenta que o artigo 3º, nº 1, do CIUC, consagra uma presunção ilidível, poderá pôr em causa os princípios da confiança e da segurança jurídica, sendo que os mesmos impõem deveres e restrições da atuação jurídico-pública.

Efetivamente, como refere  Jorge Bacelar Gouveia  o princípio da segurança jurídica exige “a publicidade dos actos do poder público, assim como a clareza e a determinabilidade das fontes de direito” e que o princípio da proteção da confiança requer “que o quadro normativo vigente não mude de modo a frustrar as expectativas geradas nos cidadãos acerca da sua continuidade, com a proibição de uma intolerável retroactividade das leis, assim  como a necessidade da sua alteração em conformidade com as expectativas que sejam constitucionalmente tuteladas” (Manual de Direito Constitucional, Almedina, 4ª Ed., Vol. II, pág. 821).

Por sua vez, escreve Jorge Reis Novais, relativamente a estes princípios que “Sem a possibilidade, juridicamente garantida, de poder calcular e prever os possíveis desenvolvimentos da actuação dos poderes da actuação dos poderes públicos susceptíveis de repercutirem na sua esfera jurídica, o individuo converter-se-ia, em última análise com violação do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, em mero objecto do acontecer estatal.” (Os princípios Constitucionais Estruturantes da República Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, pag. 261-262)

Estes princípios jurídicos visam, pois, controlar e limitar a atuação dos poderes públicos face aos particulares. Pela sua própria natureza, podem ser invocadas por estes face aos poderes públicos, porque são os interesses dos particulares, face à atuação daqueles, que os princípios em causa visam proteger e não os poderes públicos face à sua própria atuação, globalmente considerada.

É, pois, manifesto que a interpretação da norma sustentada pela Requerente e acolhida pela primeira decisão arbitral não viola os princípios em causa.

Assim, conclui-se que   a interpretação proposta pela Requerente do artigo 3º, nº 1, do CIUC, na redação à data dos factos, não é contrária à Constituição da República Portuguesa, pelo que improcede a alegação de inconstitucionalidade suscitada pela Requerida.(...).

 

Na conformidade do exposto

9.4- No caso, contrariamente ao defendido pela Recorrida, não vislumbra este Tribunal que a interpretação assumida na sentença, (nomeadamente á aplicação do art. 3º do CIUC, padeça do vício de inconstitucionalidade (violação de lei), não pondo, por isso, qualquer entrave ao entendido sobre o merito do dissenso.

 

12- REEMBOLSO DO MONTANTE TOTAL PAGO

Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º do RJAT e, em conformidade com o aí estabelecido, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação, vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos de procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários "Restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito";

 

Trata-se de comandos legais que se encontram em total sintonia com o disposto no artigo 100.º da LGT, aplicável ao caso, ex vi, do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, no qual se estabelece que f' A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, correspondendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei";

 

O caso constante nos presentes autos, suscita a manifesta aplicação das mencionadas normas, posto que na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação, referenciados, neste processo, terá, por força dessas normas, de haver lugar ao reembolso dos montantes pagos, seja a título do imposto pago, seja dos correspondentes juros compensatórios, como forma de alcançar a reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade.

 

13 - DO DIREITO A JUROS INDEMNIZATÓRIOS

A declaração da ilegalidade e consequente anulação de um ato administrativo confere ao destinatário do ato o direito à reintegração da situação em que o mesmo se encontraria antes da execução do ato anulado.

No âmbito da liquidação do imposto, a sua anulação confere ao sujeito passivo o direito à restituição do imposto pago e, em regra, o direito a juros indemnizatórios, nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT e, artigo 61.º do CPPT.

Pelo que tem a Requerente direito a juros indemnizatórios sobre o montante de imposto pago referente às liquidações anuladas.

 

DECISÃO

Face ao exposto, este Tribunal Arbitral Singular decide:

 

- Julgar procedente o pedido de declaração da ilegalidade do indeferimento das reclamações Graciosas, bem como da liquidação do IUC, respeitante aos anos de 2011 e 2012, relativamente aos veículos automóvel identificados no presente processo, anulando-se, consequentemente, os correspondentes atos tributários;

- não considerar verificado qualquer vicio de inconstitucionalidade, nos termos requeridos.

- Julgar procedente o pedido de condenação da Administração Tributária no reembolso da quantia indevidamente paga, no montante de 30 503,79 (trinta mil, quinhentos e três euros e setenta e nove cêntimos), condenando a Autoridade Tributária e Aduaneira a efetuar estes pagamentos;

- Deve, também, a AT efectuar o pagamento correspondente ao montante devido aos juros indemnizatórios, sobre o imposto pago, referente às liquidações anuladas, nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT, ex vi, do n.º 2 do artigo 61.º, do CPPT (Redação da Lei n.º 55-A/2010, de 31-12, entrada em vigor, em 2011-01-01.

 

 

VALOR DO PROCESSO: Em conformidade com o disposto nos artigos 306.º n.º 2 do CPC e 97.º-A, n.º 1 do CPPT e no artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de €30 503,79.

 

CUSTAS: De harmonia com o n.º 4 do artigo 22.º do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 1 836,00, nos termos da Tabela l, anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Notifique-se, as partes.

Lisboa, 07-09-2023

 

O Arbitro

 

Fernando Miranda Ferreira

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAAD: Arbitragem Tributária

Processo n.º: 515/2016-T

Tema: IUC - Incidência Subjetiva - Presunções Legais.

 

*Substituída pela decisão arbitral de 07 de setembro de 2023.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

DECISÃO ARBITRAL-TRIBUTÁRIA

 

 

  1. RELATÓRIO

 

  1. – A… LDA., com o NIP: …, Reclamante no procedimento tributário, acima e, à margem referenciado, doravante, denominada “Requerente”, veio, invocando o disposto nos números 1 e 2 do artigo 10º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante RJAT), do artigo 99º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) e do números 1 do artigo 95º da Lei Geral Tributária (LGT), requerer a constituição do Tribunal Arbitral Singular, com vista a:

 

  • A anulação dos atos de liquidação do Imposto Único de Circulação (doravante designado por IUC), efectuados pela Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante AT), referente aos anos de: 2011 e 2012, respeitante a veículos descriminados no documento probatório nº 1 que faz parte integrante do Pedido de Pronuncia Arbitral Tributária.

 

  • Ao pedido de reembolso do valor total de € 30.503,79, indevidamente pagos pela Requerente, acrescidos dos juros indemnizatórios previstos nos artigos 43º da LGT e no artigo 61º do CPPT, ex vi, artigo 29º do RJAT.

 

  1. Nos termos do disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 6º e da alínea b) do nº 1 do artigo 11º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro singular, Maria de Fátima Alves, que comunicou a aceitação do encargo, no prazo aplicável:

 

  • Em 03-11-2016 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11º nº 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6º e 7º do Código Deontológico,
  • Pelo que, o tribunal arbitral foi constituído em 18-11-2016, conforme o preceituado na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do Decreto-Lei nº10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228º da Lei 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

 

  1. A Requerente, na fundamentação do seu pedido de pronúncia arbitral, afirma, em resumo, o seguinte:

 

  • Os atos de liquidação, a que respeitam os impostos únicos de circulação, liquidados, cfr., documento nº 7, anexo à PI e que se encontram discriminados no documento nº 1, também anexo à PI, foram dirigidos diretamente à Requerente;

 

  • A Requerente, dedica-se à importação admissão e comercialização de automóveis das marcas “…” e “…”, “maioritariamente em estado novo” , pelo que os “veículos objectos das liquidações contestadas, inserem-se na sua actividade de  venda de veículos novos à rede dos seus concessionários a quem confere o direito de comercializar, procedendo, à comercialização de veículos junto das entidades financeiras do Grupo A… em Portugal, os quais serão objeto de contratos de locação financeira ou aluguer de longa duração;

 

  • “Sendo os concessionários que, em nome próprio e por sua conta, procedem à comercialização dos veículos junto ao público, em geral”; 

 

  •  “Subsequentemente, a Requerente procede à entrega física das viaturas aos respetivos concessionários, para que estes possam proceder à revenda das mesmas ao cliente final” (docºs nºs 2 e 4, anexo à PI);

 

  • No âmbito da sua qualidade como Operador Registado, a Requerente desencadeia os procedimentos tendentes à introdução no consumo das referidas viaturas, pedindo a atribuição de matrícula e, simultaneamente, procede ao registo inicial de propriedade das viaturas, em nome do correspondente cliente final, nos termos do artigo 42º nºs 1 e 2 do Decreto -Lei nº 55/75, 12 de Fevereiro;

 

  • Ora, no momento em que é atribuída a matrícula às viaturas que comercializa em estado novo, a Requerente já transmitiu a respectiva propriedade para terceiros (docºs nºs 2, 4 e 5, anexos aos autos);

 

  • Há a considerar que a Requerente respeitou sempre o registo inicial da propriedade das viaturas em nome dos clientes finais respeitando os prazos legalmente previstos para o efeito (os 60 dias contados a partir da data de atribuição de matrícula, nos termos do nº 1 e 2, do artigo 42º do Decreto-Lei nº 55/75,12 de Fevereiro);

 

  • No entanto, no final do ano de 2015, a Requerente foi notificada das liquidações de IUC e respectivos juros compensatórios, pelo que a Requerente, dentro do prazo voluntário, procedeu ao pagamento integral, conforme cópias comprovativas, constantes do documento nº 7, anexo à PI;

 

  • Contudo, “não se conformando com as referidas liquidações a Requerente contestou a legalidade das mesmas, requerendo a respectiva anulação, em sede de Reclamação Graciosa, das quais obteve indeferimento ( docºs nºs 15 e 16, anexo aos autos);

 

  • Ora, neste contexto, e, face aos veículos, em causa, a Requerente atuou como intermediária entre os fabricantes das marcas e os concessionários e foram (e são) estes que procederam à respetiva venda ( cfr. 2, 3 e 4) anexo aos autos) ;

 

  • Acresce, ainda, que a Requerente procedeu à emissão de faturas de venda até à data de atribuição das matrículas aos veículos, em Portugal (docº 1, 2, 5) anexos nos autos;

 

  • No caso das vendas da Requerente a concessionários, as emissões de faturas ocorrem, anteriormente, à data das respetivas matrículas, sendo estes identificados pelos números dos chassis e, objecto de posterior nota de débito do ISV, já com as matrículas correspondentes;

 

  • O que, no caso sub judice, afasta qualquer responsabilidade da Requerente face ao pagamento do IUC, pois esta nunca foi proprietária de qualquer dos veículos em causa, conforme se demonstrou e provou nos factos, documentalmente, apresentados e anexos aos autos, porque, ao momento do ano da matrícula a liquidação do imposto dos veículos, em causa, já não pertenciam à Requerente;

 

  • Verificando-se, assim, do que antecede, que “os veículos, em causa, foram todos vendidos aos concessionários, anteriormente à data dos factos tributários consubstanciados na exigibilidade do imposto (IUC)”, sendo de considerar, também, que a Requerente” procedeu à faturação dos veículos, em questão,  antes da atribuição da matrícula, cfr., documentos nº 2 , 5 e7, anexos aos autos;

 

  • Pelo que, à data, dos factos tributários, a Requerente, não podia, ser considerada, sujeito passivo do imposto, facto que lhe veda qualquer responsabilidade subjectiva pelo seu pagamento.

 

  1. A Requerida, Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por AT), apresentou, inicialmente, resposta, da qual se retira que os atos tributários, controvertidos, não enfermam de qualquer vício de violação de Lei, pronunciando-se pela improcedência da requerida e pela manutenção dos atos de liquidação questionados, defendendo, sumariamente o seguinte:

 

  • Põe em causa a exposição formal da PI, apresentada pela Requerente, considerando uma “amálgama documental”, que impede perceber “a causa de pedir”;

 

  • Considerando, assim, inepto o pedido de pronúncia arbitral, alegando insuficiência probatória dos factos invocados pela Requerente;

 

  • O que consubstancia uma “exceção dilatória” impeditiva do conhecimento do mérito da causa, nos termos do artigo 576º nºs 1 e 2 do CPC, ex vi, artigo 29º nº 1, alínea e, do RJAT;

 

  • “ O que conduz à absolvição da instância da Requerida, nos termos do artigo 576º nº 2 e 577º, alínea b) do CPC, ex vi, artigo 29º nº 1 alínea e, do RJAT;

 

  • Posteriormente, em 11-04-2017, apresentou as suas alegações finais, pondo em causa os argumentos invocados pela Requerente, devido ao facto desta fazer:” uma errada interpretação e aplicação das normas legais subsumíveis ao caso, sub judice, notoriamente errada”;

 

  • Que os citados “argumentos não têm qualquer apoio ou guarida na lei”;

 

  • Põe em causa: “o facto gerador do imposto, defendendo que o mesmo é constituído pela propriedade do veículo, bem como atestado pela matrícula ou registo em território nacional, cfr., artigo 6º do CIUC;

 

  • Defende que a Requerente viola o artigo 3º nº 1 do CIUC, quando põe em causa, quer o pedido da matrícula quer o pedido do registo dos referidos veículos;

 

  • Que pelo facto do primeiro registo de cada automóvel ser concretizado em nome da importadora, a Requerente tem que, necessariamente, figurar como proprietária dos veículos automóveis;

 

  • Pois é peremptório que nos termos do artigo 24º do RRA, o importador por figurar como primeiro proprietário, é, de acordo com o “estatuído nos artigos 3º e 6º do CIUC,” sujeito passivo do imposto controvertido;

 

  • Acresce que o preenchimento da DAV e pago o ISV, são elementos suficientes “para preencher o facto gerador do IUC e, concomitantemente, a incidência subjetiva do imposto”;

 

  • Põe, também, em causa “as pretensas faturas de venda”, pois considera que as mesmas “não são aptas a comprovar a celebração de um contrato sinalagmático”;

 

Face aos factos, sumariamente expostos, a Requerida faz uma interpretação geral e objectiva do expressamente disposto nos artigos que invoca, não considerando a presunção do artigo 3º do CIUC, nem a presunção do respectivos registos, afastando, assim, o artigo 73º da LGT;

Não, considera, também, o princípio da equivalência, previsto no artigo 1º do CIUC, corolário do princípio do poluidor/pagador, com assento no nº 2 do artigo 66º da CRP;

Nem considera os trâmites efectuados, pela Requerente, aquando da sua primeira inscrição da matrícula ou registo em território nacional, que cumprem os prazos permitidos, face à conjugação do nº 2 do artigo 42º do RRA, com o nº 1 do artigo 17º do CIUC.

 

  1. A reunião prevista no artigo 18º do RJAT foi dispensada, por se tratar de questões já suficientemente debatida, quer nos autos quer na Jurisprudência, entendendo, este Tribunal Arbitral Singular, desnecessário as alegações finais e prescindiu, da inquirição de testemunhas;

 

  • Pelo que neste contexto, o Tribunal, em cumprimento do disposto no artigo 18º, nº 2 do RJAT, designou, previsivelmente, até ao dia 27-02-2017, a prolação da decisão arbitral.

 

  • Contudo, no âmbito da Decisão Arbitral, supra referida, a Requerida veio a este Tribunal dizer que não lhe tinha sido dado oportunidade do direito de contraditório, nos termos do nº 3 do artigo 3º do CPC, ex vi, artigo 29º do RJAT;

 

  • Ora, aquando da Resposta da AT, em que foi invocado, uma exceção dilatória, por considerar inepta a causa de pedir, pedindo, por isso, a absolvição da instância, a Requerente, apresentou uma Réplica, contestando os factos controvertidos e, alegando uma exceção dilatória, por intempestividade da Resposta, apresentada, pela Requerida” fora de prazo”;

 

  • Nesta sequência, a Requerida, só se pronunciou-se e, bem, pela tempestividade do Requerimento da sua Resposta, abstendo-se de fazer qualquer alusão ao seu direito de contraditório, quando o poderia ter feito;

 

  • O que, perante esta “ausência” de argumentações, por parte da Requerida, levou a que este Tribunal, considerasse que a Requerida, se abstinha de argumentar mais factos probatórios, em sua defesa;

 

  • De qualquer forma, foi este lapso, por parte do Tribunal, corrigido, dando oportunidade às partes (Requerente e Requerida) a possibilidade de se pronunciarem, sobre quaisquer questões de facto e de direito suscitadas no processo, assegurando-se, assim, o contraditório e a igualdade das partes, nos termos do artigo 16º, alíneas: a) e b) do RJAT, com base nos pressupostos das alíneas c) e e) do mesmo comando legal, princípios conjugados com o disposto nos artigos 6º e artigo 7º nº1, e artigo 9º nº 1, todos do CPC, ex vi, artigo 29º do RJAT;
  • Neste contexto processual, foi assegurado por este Tribunal,” ao longo de todo o processo, a igualdade substancial das partes, potenciando os seus meios de defesa”, nos termos do artigo 4º do CPC, ex vi, artigo 29º do RJAT;

 

  • Pelo que, pese, embora o facto de a Requerente, não ter apresentado nada de novo, para a decisão do mérito da causa, para além dos factos probatórios já apresentados, veio a Requerida apresentar as sua alegações finais em 11-04-2017, que foram criteriosamente analisados e aplicáveis à presente Decisão Arbitral Tributária, nos termos do artigo 123º, nº 2, do CPPT, ex vi artigo 29º do RJAT, com assento “na livre apreciação dos factos e na livre determinação das diligências de produção de provas necessárias”, alínea e) do artigo 16º do RJAT.

 

Face ao exposto, este Tribunal Arbitral Singular, com assento nos artigos 6º do CPC “Dever de Gestão Processual”,

 Retifica

 a presente Decisão Arbitral Tributária, no âmbito do processo nº 515/2016-T, nos termos do nº 2 do artigo 613º e nº 1 do artigo 414º, ambos do CPC, ex vi artigo 29º do RJAT.

 

 

  1. QUESTÕES DECIDENDAS

 

  1. Face ao exposto nos números anteriores, relativamente à exposição das partes e aos argumentos apresentados, as principais questões a decidir são as seguintes:

 

  • A alegação feita pela Requerente relativa à liquidação material dos atos de liquidação, relativos aos anos de 2011 e 2012, referente ao IUC, pago sobre os veículos supra referenciados no documento nº 7 e, relacionados no documento nº 1, anexos à PI;

 

  • A questão prévia da exceção, invocada pela AT;

 

  • A questão prévia de exceção, invocada pela Requerente;

 

  • A errada interpretação e aplicação das normas de incidência subjetiva do imposto único de circulação liquidado e cobrado, o que constitui, a questão central a decidir no presente processo;

 

  • O valor jurídico do registo dos veículos automóveis.

 

  1. FUNDAMENTOS DE FACTO

 

  1. Em matéria de facto, relevante para a decisão a proferir, dá o presente Tribunal por assente, face aos elementos existentes nos autos, os seguintes factos:

 

  • A Requerente apresentou elementos probatórios constantes dos documentos nºs; 1, 2, 5, 6 e 7, junto à PI, que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais; 

 

4.1.1 FUNDAMENTAÇÃO DOS ATOS PROVADOS

  • Os factos dados como provados estão baseados nos documentos anexos ao pedido de pronúncia arbitral da supra referida PI, e, nas provas documentais apresentadas pela Requerida no âmbito da exceção da “ineptidão da causa de pedir” e nos documentos probatórios, ao longo de toda a tramitação processual e nas alegações finais, bem como, nas provas documentais apresentadas pela Requerente, quer consubstanciadas na já citada PI e na Réplica, que também consubstancia a exceção da “intempestividade”, bem como, nos correspondentes elementos probatórios consubstanciados nas respetivas faturas e contratos que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.

      3.1.2 FACTOS NÃO PROVADOS

  • Não existem factos dados como não provados, dado que todos os factos tidos como relevantes para a apreciação do pedido foram provados.

 

  1. FUNDAMENTOS DE DIREITO

 

  1. O Tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2º nº 1, alínea a), 5º nº 2, alínea a), 6º nº 1, 10º nº1, alínea a) e nº 2 do RJAT:

 

  • As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas, ex vi, artigos 4º e 10º, nº 2, do RJAT e artigo nº 1 da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março;

 

  • O processo não  enferma de nulidades;

 

  • Existindo duas questão prévias sobre a qual o Tribunal se deve pronunciar.

 

 

QUESTÃO PRÉVIA

 

  1. A Autoridade Tributária, Requerida no processo supra citado, vem, no âmbito da sua Resposta, apresentada, nos termos do disposto e para os efeitos previstos no nº 1 e 2 do artigo 17º do RJAT, invocar uma exceção dilatória que se consubstancia na “ineptidão da petição inicial”, por alegada insuficiência probatória dos factos invocados pela Requerente;

 

  1. Fundamenta a exceção dilatória no facto de existir elementos probatórios documentais que confundem “a causa de pedir”, nos termos do artigo 98º nº 1, alínea a) do CPPT, ex vi artigo 29º do RJAT, o que impede o conhecimento do mérito da causa, nos termos do artigo 576º, nºs 1 e 2 do CPC, ex vi, artigo 29º nº1, alínea e, do RJAT;

 

  1. Pede, por isso, a absolvição da instância da Requerida, nos termos dos artigos 576º, nº 2 e 577º, alínea b) do CPC, ex vi artigo 29º nº 1, alínea e do RJAT.

 

ATENTO OS FACTOS SUMARIAMENTE EXPOSTOS,

- Este Tribunal Considera:

 

  1. Que não se verifica na PI, in casu, a  falta de indicação “da causa de pedir”, até porque,  haveria sempre  a possibilidade, nos termos do nº 2 do artigo 98º do CPPT, ex vi, artigo 29º , nº 1, alínea e) do RJAT, e nos termos do nº 2 do artigo 6º do CPC, também, ex vi, artigo 29º nº 1, alínea e) do RJAT , que ao verificar-se a nulidade  recorrente da ineptidão da petição inicial, ser, oficiosamente, “deduzida a todo o tempo, até ao trânsito em julgado da decisão final”, determinando-se, assim, “a realização dos atos necessários à regularização da instância”, contudo, este Tribunal, não entendeu necessário recorrer a esse mecanismo legal, pois são percetíveis as faturas e contratos  apresentadas como: documentos nºs  2 , 5 e 7, que remetem para o documento nº 1,  todos, anexos à PI;

 

  1. De qualquer forma, entende-se que a formulação factual apresentada, tem algumas repetições documentais que podem, eventualmente, confundir alguns factos relacionais, expostos, mas, não deixa, contudo, de se verificar na PI que a Requerente pede a anulação dos atos de liquidação de IUC sindicados pela AT, nas quatro “Reclamações Graciosas”( cfr., documentos anexos aos autos), por considerar que, ao momento dos atos de liquidação tributária a Requerente não é sujeito passivo do IUC, logo, há que considerar que” a  causa de pedir” não é de forma alguma obscura, pois determina bem o seu sentido, e,  compreende-se bem, os efeitos jurídicos que a Requerente pretende obter:”  que são  as anulações dos atos das liquidações efectuadas pela AT, por não se considerar sujeito passivo do respectivo IUC ( fatos jurídicos que constituem a causa de pedir e as razões de direito que fundamentam a ação),  entendendo-se, neste contexto, que as vendas efectuadas pela Requerente, através dos concessionários aos consumidores finais, estão expressas nas faturas de venda (documento nº 2 e nº 5, anexos aos autos);

 

  1.  
  1. De qualquer forma, os factos contidos nos documentos juntos com os articulados (cfr., Ac., TRC, de 14-10-2008, processo nº 2377/07.8TBVIS.CI, p. 7), podem ser aproveitados para integrar a descrição da “causa de pedir”, quando para eles remetam expressa ou implicitamente, o que, in casu, a PI, controvertida, remete expressamente;

 

  1. Segundo o entendimento de J. Alberto dos Reis (in AC., TRC-prcº nº2377/07.8TBVIS.CI.p.7), o documento junto com a Petição deve considerar-se parte integrante desta e, por isso, susceptível de suprir lacunas de que a Petição enferma( quanto aos factos, obviamente);

 

  1. Sendo de acrescer que, também, J. Alberto dos Reis refere, in Comentário ao CPC, II, p. 371 (in AC., TRC-procº nº 2377/07.8TBVIS.CI.p.8), que há vício de ininteligibilidade da causa de pedir quando o autor expõe os factos fonte do pedido em termos de tal modo confusos, ambíguos ou ininteligíveis que não seja possível apreender com segurança a causa de pedir;
  2. Ora, a PI da Requerente, não é obscura, pois esta permite “determinar bem o seu sentido”, não enferma, portanto, de ininteligibilidade, pelo que este Tribunal não considerou necessário a correcção da peça processual (PI).

 

Face ao exposto, é julgada improcedente a alegada exceção da ineptidão do pedido de pronúncia arbitral, por não se verificar que a causa de pedir enferme de ininteligibilidade,  pois permite com segurança apreender “a causa de pedir”, pelo que se consideram afastados  os critérios da alínea a) do nº1  e, consequentemente, o disposto no nº 2 do artigo 98º do CPPT, ex vi, artigo 29º, nº 1, alínea c) do RJAT.

 

2ª QUESTÃO PRÉVIA

 

  1. No concernente à exceção da Intempestividade, alegada pela Requerente, no âmbito da alegada apresentação da Resposta fora de prazo, foi esta exceção dilatória legalmente bem defendida pela Requerida, atentos todos os prazos, incluindo as férias de Natal;

 

Pelo que este Tribunal, remete para o artigo 132º do CPC, ex vi, artigo 29º do RJAT,

E, julga tempestiva a Resposta, apresentada pela Requerida, considerando improcedente a referida exceção dilatória. 

 

 

  1. O pedido, objecto do presente processo é a declaração de anulação dos atos de liquidação do IUC relativo aos veículos automóveis melhor identificados nos autos;

 

  1. Condenação da AT ao reembolso do montante do imposto relativo a tais liquidações no valor de € 30 503, 79 (trinta mil, quinhentos e três euros e setenta e nove cêntimos);
  2. Condenação da AT ao pagamento de juros indemnizatórios sobre o mesmo montante.

 

  1. A matéria de facto está fixada, tal como consta do nº 3.1 supra, importando, agora, determinar o Direito aplicável aos factos subjacentes, de acordo com as questões decidendas, identificadas no nº 2.1 supra, sendo certo, que a questão central, em causa, nos presentes autos, relativamente à qual existem entendimentos absolutamente opostos entre a Requerente e a AT, consiste em saber se o nº 1 do artigo 3º do CIUC relativo à incidência subjetiva do imposto único de circulação consagra ou não uma presunção ilidível.

 

  1. Tudo analisado e, tendo em conta, por um lado, as posições das partes em confronto, mencionadas nos pontos 1.3 e 1.4 supra e, considerando, por outro lado, que a questão central a decidir é a de saber se o nº 1 do artigo 3º do CIUC consagra ou não uma presunção legal de incidência tributária, cumpre, neste contexto, apreciar e proferir decisão.

 

  1. QUESTÃO DA ERRADA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA NORMA DE INCIDÊNCIA SUBJETIVA DO IUC

 

  1. Considerando ser pacífico o entendimento, na doutrina, de que na interpretação das leis fiscais valem plenamente os princípios gerais de interpretação os quais serão, apenas e naturalmente, limitados pelas exceções e particularidades ditadas pela própria lei objeto de interpretação. Trata-se de um entendimento que tem vindo a merecer acolhimento nas Leis Gerais Tributárias de outros países e que veio também a ter assento no artigo 11º da nossa Lei Geral Tributária, o que vem, aliás, sendo frequentemente sublinhado pela jurisprudência.

 

É consensualmente aceite que tendo em vista a apreensão do sentido da lei, a interpretação socorre-se, a priori, em reconstruir o pensamento legislativo através das palavras da lei, o que significa, procurar o seu sentido literal, valorando-o e aferindo-o à luz de outros critérios, intervindo, os designados elementos de natureza lógica, racional ou teleológicos e de ordem sistemática:

 

  • A propósito da interpretação da lei fiscal, há a considerar a jurisprudência, nomeadamente, os Acórdãos do STA de 05-09-2012, processo nº 0314/12 e de 06-02-2013, processo 01000/12, disponíveis em www.dgsi.pt, a importância do disposto no artigo 9º do Código Civil (CC), enquanto elemento fundamental da hermenêutica jurídica;

 

  • Dispõe o nº 1 do artigo 3º do CIUC que “São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou coletivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados”;

 

  • A formulação usada no referido, artigo, socorre-se da expressão “considerando-se” o que suscita a questão de saber se, a tal expressão pode ser atribuído um sentido presuntivo, equiparando-se à expressão “presumindo-se”, trata-se de expressões frequentemente utilizadas, com sentidos equivalentes;

 

  • Como ensina Jorge Lopes de Sousa, in Código do Procedimento e do Processo Tributário, Anotado e Comentado, volume I , 6ª Edição, Área Editora, SA, Lisboa 2011, p. 589, que em matéria de incidência tributária, as presunções podem ser reveladas pela  expressão “presume-se” ou por expressão semelhante, aí se mencionando diversos exemplos  dessas presunções, referindo-se a constante no artigo 40º, nº 1 do CIRS, em que se usa a expressão “ presume-se” e a constante no artigo 46º nº 2, do mesmo Código, em que se faz uso da  expressão “considera-se”, enquanto expressão com um efeito semelhante àquela e, consubstanciando, igualmente, uma presunção;

 

  • Na formulação legal exarada no nº 1 do artigo 3º do CIUC, em que se consagrou uma presunção, revelada pela expressão “considerando-se”, de significado semelhante e de valor equivalente à expressão “presumindo-se”, em uso desde a criação do imposto em questão (não sendo, no entanto, de considerar as atuais alterações interpretativas, do referido artigo nº 3º do CIUC, uma vez que os factos, em causa não são abrangidos pelas disposições legais em vigor);

 

  • O uso da expressão “considerando-se” mais não visou do que o estabelecimento de uma aproximação mais vincada e nítida entre o sujeito passivo do IUC e o efectivo proprietário do veículo, o que está em sintonia com o reforço conferido `a propriedade do veículo, que passou a constituir o facto gerador do imposto, nos termos do artigo 6º do CIUC;

 

  • A relevância e o interesse da presunção, em causa, que historicamente foi revelado por intermédio da expressão “presumindo-se” e que agora, se serve da expressão “considerando-se”, reside na verdade e na justiça que, por essa via, se confere às relações fiscais e, que corporizam valores fiscais fundamentais, permitindo tributar o real e efectivo proprietário e não aquele que, por circunstâncias de diversa natureza, não passa, por vezes, de um aparente e falso proprietário. Se o caso, assim não fosse considerado, não se admitindo e relevando a apresentação de elementos probatórios destinados à demonstração de que o efectivo proprietário é, afinal, pessoa diferente da que consta do registo e, que inicialmente, e, em principio, se supunha ser o verdadeiro proprietário, aqueles valores seriam objectivamente postergados.

 

  1. Há a considerar, também, o princípio da equivalência, inscrito no artigo 1º do CIUC, que tem subjacente o princípio do poluidor-pagador e, concretiza a ideia nele inscrita de que quem polui deve, por isso, pagar. O referido principio tem assento constitucional, na medida em que representa um corolário do disposto na alínea h) do nº 2 do artigo 66º da constituição, tendo, também, assento no direito comunitário, seja ao nível do direito originário, artigo 130º-R, do Tratado de Maastrich (Tratado da União Europeia, de 07-02-1992), onde o aludido principio passou a constar como suporte da Politica Comunitária, no domínio ambiental e que visa responsabilizar quem contribui com os prejuízos que advêm para a comunidade, decorrentes da utilização dos veículos automóveis, sejam assumidos pelos seus proprietários-utilizadores, como custos que só eles devem suportar.

 

  1. Atentos os factos supra descritos, importa salientar que os já referidos elementos de interpretação, sejam os relacionados com a interpretação literal, apoiada nas palavras legalmente utilizadas, sejam as respeitantes aos elementos lógicos de interpretação, de natureza histórica ou de ordem racional, apontam, todos eles, no sentido de que a expressão “considerando-se” tem um sentido equivalente à expressão “presumindo-se”, devendo, assim entender-se que o disposto no nº 1 do artigo 3º do CIUC consagra uma presunção legal que, face ao artigo 73º da LGT, onde se estabelece que “As presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário”, será necessariamente ilidível, o que significa que os sujeitos passivos são, em princípio, as pessoas em nome de quem tais veículos estejam registados. Serão, pois, essas pessoas, identificadas nessas condições a quem a AT se deve, necessariamente, dirigir;

 

 

  • Mas será, em princípio, dado que no quadro de audição prévia, de carácter obrigatório, face ao disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 60º da LGT, a relação tributária poderá ser reconfigurada, validando-se o sujeito passivo inicialmente identificado ou redirecionando-se o procedimento no sentido daquele que for, afinal, o verdadeiro e efectivo, sujeito passivo do imposto em causa;

 

  • O contribuinte tem o direito de ser ouvido, mediante audição prévia (José Manuel Santos Botelho, Américo Pires Esteves e José Cândido de Pinho, in Código do Procedimento Administrativo, Anotado e Comentado, 4ª edição, Almedina, 2000, anotação 8 do artigo 100º);

 

  • A audição prévia que, naturalmente, se terá de concretizar em momento imediatamente anterior ao procedimento da liquidação, corresponde à sede e altura própria para, com certeza e segurança se identificar o sujeito passivo do IUC;

 

  • Que nos autos em apreço, a Requerente, demonstrou, à AT, em sede de audição prévia, que os factos incidiam no âmbito de vendas e contratos a concessionários, pelo que, através de documentos, anexos aos autos nunca a Requerente pode ser responsável pelo pagamento do IUC.

 

  1. SOBRE O VALOR JURIDICO DO REGISTO

 

  1. Relativamente ao valor jurídico do registo, importa notar o que estabelece o nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro (diversas vezes alterado, sendo a última por via da Lei nº 39/2008, de 11 de Agosto), quando estatui que “o registo de veículos tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos a motor e respectivos reboques, tendo em vista a segurança do comércio jurídico”:

 

  • O artigo 7º do Código do Registo Predial (CRP), aplicável, supletivamente, ao registo de automóveis, por força do artigo 29º do CRA, dispõe que” O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define”;

 

  • O registo definitivo não constitui mais do que uma presunção ilidível, admitindo, por isso, contraprova, como decorre da lei e a jurisprudência vem assinalando, podendo ver-se, entre outros os Acórdãos do STJ nº 03B4369 de 19-02-2004 e nº 07B4528, de 29-01-2008, disponíveis em: www.dgsi.pt;

 

  • Portanto, a função legalmente reservada ao registo é por um lado a de publicitar a situação jurídica dos bens, no caso em apreço, dos veículos e, por outro lado, permite-nos presumir que existe o direito sobre esses veículos e que o mesmo pertence ao titular, como tal inscrito no registo, não tem uma natureza constitutiva do direito de propriedade, mas apenas declarativa, daí que o registo não constitua condição de validade da transmissão do veículo do vendedor para o comprador;

 

  • Os adquirentes dos veículos tornam-se proprietários desses mesmos veículos por via da celebração dos correspondentes contratos de compra e venda, com registo ou sem ele;

 

  • Neste contexto cabe lembrar que, face ao disposto no nº 1 do artigo 408º do CC, a transferência de direitos reais sobre as coisas, no caso sub judice, veículos automóveis, é determinado por mero efeito do contrato, sendo que nos termos do disposto na alínea a) do artigo 879º do CC, entre os efeitos essenciais do contrato de compra e venda, avulta a transmissão da coisa;

 

  • Face ao exposto, torna-se claro que o pensamento legislativo aponta no sentido de que o disposto no nº 1 do artigo 3º do CIUC, consagra uma presunção “juris tantum, consequentemente ilidível, permitindo, assim, que a pessoa, que, no registo, está inscrita como proprietária do veículo, possa apresentar elementos de prova destinados a demonstrar que tal propriedade está inserida na esfera jurídica de outra pessoa, para quem a propriedade foi transferida;

 

  • O que no referente aos factos controvertidos, existem, junto aos autos documentos, que foram provados pela Requerente, tanto em sede de audição prévia, como no pedido de pronúncia arbitral, configurando, por isso a certeza de que pertence aos respectivos proprietários/utilizadores, dos veículos, a responsabilidade subjectiva dos IUCs, nos termos do nº 1 e 2 do artigo 3º do CIUC.

 

 

  1. A PRESUNÇÃO DO ARTIGO 3º DO CIUC E A DATA EM QUE O IUC É EXIGÍVEL

 

  1. DATA EM QUE O IUC É EXIGÍVEL

 

  • O IUC é um imposto de tributação periódica, cuja periodicidade corresponde ao ano que se inicia no ato da matrícula ou em cada um dos seus aniversários, conforme o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 4º do CIUC;

 

  • É exigível nos termos do nº 3 do artigo 6º do referido Código;

 

  • Sendo de referir que, quanto à liquidação do IUC tributado à Requerente sobre os veículos supra referenciados, no ano de 2011 e 2012 há que considerar, que ao momento dos factos tributários, as viaturas em causa estavam na esfera jurídica dos proprietários/utilizadores dos referidos automóveis, porque estes detêm o uso e o gozo dos referidos veículos, pelo que nos termos do nº1 e 2 do art. 3º do CIUC, têm que ser responsabilizados, pelo pagamento da obrigação do referido imposto.

 

  1. Em relevância sobre o ónus da prova, estipula o artigo 342º nº 1 do CC “àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado”;
  2. Também o artigo 346º do CC (contra prova) determina, que “à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contra prova a respeito dos mesmos factos, destinados a torná-los duvidosos; se o conseguir, é a questão decidida contra a parte onerada com a prova.” (Como afirma Anselmo de Castro, A., 1982, ED. Almedina Coimbra, “Direito Processual Civil Declaratório”, III, p. 163, “recaindo sobre uma das partes ónus probatório, à parte contrária basta opor contra prova, sendo esta uma prova destinada a tornar duvidosa os factos alegados pela primeira”.

 

Assim, no caso dos autos, o que a Requerente tem que provar, afim de ilidir a presunção que decorre quer do artigo 3º do CIUC quer do próprio Registo Automóvel, é que ela Requerente não era proprietária dos veículos em causa no período a que dizem respeito as liquidações impugnadas. Propõe provar, segundo resulta dos autos, é que a propriedade dos veículos, não lhe pertenciam nos períodos a que as liquidações dizem respeito. Apresentando, assim, as faturas de venda, constantes dos documentos nºs 1, 2, 5 e 7, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidas, para todos os efeitos legais.

 

  1. ILISÃO DA PRESUNÇÃO

 

  • A Requerente, como se refere em 3.1., relativamente aos factos provados, alegou, com o propósito de afastar a presunção, não ser sujeito passivo do imposto, aquando da ocorrência dos factos tributários, oferecendo para o efeito os seguintes documentos;

 

  • Faturas de venda aos concessionários e aos consumidores finais, documentos junto aos autos com os nºs 1,2, 4, 5 e 7;

 

  • Ora, esses documentos, gozam, da presunção da veracidade prevista no nº 1 do artigo 75º da LGT. Decorrendo daqui, que à data em que o IUC era exigível quem detinha a propriedade dos veículos automóvel eram os legítimos proprietários e não a Requerente.

 

  1. OUTRAS QUESTÕES RELATIVAS À LEGALIDADE DOS ATOS DE LIQUIDAÇÃO

 

  • Relativamente à existência de outras questões atinentes à legalidade dos atos de liquidação, tendo em conta que está ínsito no estabelecimento de uma ordem de conhecimentos dos vícios, tal como o previsto no artigo 124º do CPPT, que procedendo o pedido de pronúncia arbitral baseado em vícios que impedem a renovação das liquidações impugnadas, fica prejudicado, porque inútil, o conhecimento de outros vícios, pelo que, não se afigura necessário conhecer das demais questões suscitadas.

 

  1. REEMBOLSO DO MONTANTE TOTAL PAGO

 

  • Nos termos do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 24º do RJAT e, em conformidade com o aí estabelecido, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação, vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos de procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários ”Restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”;

 

  • Trata-se de comandos legais que se encontram em total sintonia com o disposto no artigo 100º da LGT, aplicável ao caso, ex vi, do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 29º do RJAT, no qual se estabelece que “ A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, correspondendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei”;

 

  • O caso constante nos presentes autos, suscita a manifesta aplicação das mencionadas normas, posto que na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação, referenciados, neste processo, terá, por força dessas normas, de haver lugar ao reembolso dos montantes pagos, seja a título do imposto pago, seja dos correspondentes juros compensatórios, como forma de alcançar a reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade.

 

  1. DO DIREITO A JUROS INDEMNIZATÓRIOS

 

  • A declaração da ilegalidade e consequente anulação de um ato administrativo confere ao destinatário do ato o direito à reintegração da situação em que o mesmo se encontraria antes da execução do ato anulado.
  • No âmbito da liquidação do imposto, a sua anulação confere ao sujeito passivo o direito à restituição do imposto pago e, em regra, o direito a juros indemnizatórios, nos termos do nº 1 do artigo 43º da LGT e, artigo 61º do CPPT.
  • Pelo que tem a Requerente direito a juros indemnizatórios sobre o montante de imposto pago referente às liquidações anuladas.

 

  1. DECISÃO

Face ao exposto, este Tribunal Arbitral Singular decide:

  • Julgar procedente o pedido de declaração da ilegalidade da liquidação do IUC, respeitante aos anos de: 2011 e 2012 relativamente aos veículos automóvel identificados no presente processo, anulando-se, consequentemente, os correspondentes atos tributários;
  • Julgar procedente o pedido de condenação da Administração Tributária no reembolso da quantia indevidamente paga, no montante de € 30 503, 79 (trinta mil, quinhentos e três euros e setenta e nove cêntimos), condenando a Autoridade Tributária e Aduaneira a efetuar estes pagamentos;

 

  • Deve, também, a AT efectuar o pagamento correspondente ao montante devido aos juros indemnizatórios, sobre o imposto pago, referente às liquidações anuladas, nos termos do nº 1 do artigo 43º da LGT, ex vi, do nº 2 do artigo 61º, do CPPT (Redação da Lei nº 55-A/2010, de 31-12, entrada em vigor, em 2011-01-01.

 

VALOR DO PROCESSO: Em conformidade com o disposto nos artigos 306º nº 2 do CPC e 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 30 503,79.

CUSTAS: De harmonia com o nº 4 do artigo 22º do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 1 836,00, nos termos da Tabela I, anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Notifique-se, as partes.

Lisboa, 11-05-2017

O Árbitro

Maria Alves

 

 (o texto da presente decisão foi elaborado em computador, nos termos do artigo 131, nº 5 do Código do Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29º, nº 1 alínea e) do Decreto-Lei 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT), regendo-se a sua redação pela ortografia atual)