Decisão Arbitral
Os árbitros Cons. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. José Nunes Barata e Augusto Vieira (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 12-01-2017, acordam no seguinte:
1. Relatório
A…, NIF …, residente Av. … nº … -…, …-…, …-Cacém (doravante designada por “Requerente”), veio, ao abrigo do disposto nos arts. 2º, n.º 1, alínea a), e 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária - RJAT), apresentar pedido de pronúncia arbitral, tendo em vista a apreciação da legalidade e anulação da liquidação de IRS n.º 2014…, relativa ao ano de 2013.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 11-11-2016.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 28-12-2016 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 12-01-2017.
A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu defendendo que o pedido deve ser julgado improcedente.
Por despacho de 15-02-2017 foi dispensada reunião e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas.
As Partes apresentaram alegações.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos arts. 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.
As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades e não há excepções nem há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Com base nos elementos que constam do processo e documento juntos com o pedido de pronúncia arbitral, consideram-se provados os seguintes factos:
a) A Requerente apresentou a declaração mod. 3 de rendimentos referente a 2013, sem que haja declarado as operações imobiliárias efectuadas no ano em causa;
b) Detectada pela Autoridade Tributária e Aduaneira a omissão, por cruzamento de dados com as declarações mod. 13, a Requerente foi notificada para proceder à entrega da mod. 3, acompanhada do anexo G (artigo 3.º da Resposta);
c) Em 23-12-2014, a Requerente apresentou a declaração mod. 3 acompanhada do anexo G (cf. fls. 9 e 10 do PA), e nela declarou os seguintes valores:
d) Em 23-06-2015, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação n.º 2014…, em que apurou o imposto a pagar no valor de €70.574,77, acrescido de juros compensatórios no montante de € 72.168,01;
e) Em 21-09-2015, a Requerente apresentou declaração mod. 3 de substituição referente ao mesmo ano de 2013 (documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido), alterando o anexo G e nele declarando:
f) A declaração de substituição foi pela Autoridade Tributária e Aduaneira convolada em reclamação graciosa (documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
g) Em data não determinada (por serem ilegíveis, nesse ponto os documentos que constam do processo administrativo), a Autoridade Tributária e Aduaneira, no âmbito do referido processo de reclamação graciosa, notificou a B… SA, para «apresentar a declaração modelo 13 - valores mobiliários, Warrants autónomos e instrumentos financeiros derivados, de substituição, prevista no art.º 124º do CIRS, respeitante ao ano de 2012», «pelo facto de ter apresentado a última declaração modelo 13, de substituição, respeitante ao ano de 2012, em 2015-03-05, e da mesma apenas constarem operações referentes ao mês de Janeiro, quando apresentou anteriormente outras, em 2014-07-21 e em 2013-08-23, com operações referentes à totalidade do ano de 2012» «e pelo facto da necessidade de aferir os rendimentos obtidos pela reclamante em referência» (fls. 59 do PA);
h) Em 24-03-2016, a Requerente foi notificada para justificar “as alterações efectuadas naquela declaração e ainda a identificação dos produtos/valores/datas dos movimentos, assim como os correspondentes comprovativos das despesas e encargos com aqueles” (fls. 61 e 62 do PA e documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
i) Em resposta, a Requerente apresentou o requerimento de 12-04-2016, que consta do de fls. 63 a 67 do PA e do documento n.º 12 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:
12.º
Do extracto integrado de conta resulta que no ano de 2013:
i) a 02.01.2013 o capital próprio da ora Reclamante era de € 149.464,26;
ii) foram efectuados diversos levantamentos totalizando € 97.740,00;
iii) foram cobrados juros no montante total de e 11.624,91;
iv) foram cobradas comissões no montante total de € 4.321,17;
v) foram cobrados encargos no montante total de € 514,33;
Cf. Doc n.° xx
13°
Acresce ainda que a B… declarou através da competente modelo 13 todas as transações financeiras pelo que a AT tem conhecimento das mesmas e estará em melhor posição que a ora Reclamante.
14°
Não obstante o supra exposto, a ora Reclamante encontra-se disponível para prestar quaisquer outros esclarecimentos que entendam por necessários.
j) Com o requerimento referido na alínea anterior, a Requerente apresentou os documentos n.ºs 6 e 7 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos;
k) Na sequência da apresentação do requerimento, a Autoridade Tributária e Aduaneira elaborou a informação que consta de fls. 125 e 126 do PA, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte;
4 – APRECIAÇÃO
A questão a analisar nos presentes autos é sobre os rendimentos da categoria G em sede de IRS, designadamente, as mais-valias mobiliarias obtidas respeitante a instrumentos financeiros derivados, tal como previsto no art.º 19º n.º 1 al. e) do CIRS.
Contudo, os ganhos de mais-valias mobiliárias previstas no art.º 10º n.º 1 al. e) do CIRS, é constituído pelos rendimentos líquidos, apurados em cada ano, conforme o n.º 4 al. c) do mesmo artigo.
Da consulta efectuada ao sistema tributário desta Autoridade Tributária não constam os modelo 13 completas, isto é, as mesmas não se encontram devidamente apresentadas pelas entidades respectivas nos termos do art.º 124º do CIRS.
Para efeitos de proceder à análise dos valores de forma clara e inequívoca, foi a reclamante notificada para justificar os valores alterados na sua declaração de rendimentos modelo 3, de substituição, a identificação dos produtos / valores / datas dos movimentos, assim como os comprativos das despesas.
Veio a reclamante apresentar fotocópias de documentos já constantes nos autos, juntos à sua petição inicial.
Por falta de informação necessária, designadamente a demonstração dos cálculos efectuados de forma evidenciada com os respectivos documentos de suporte, assim como a informação completa das declarações modelo 13, conforme acima referido não é possível aferir dos valores dos ganhos respeitante às mais-mobiliárias obtidas no ano de 2013.
Nos termos do art.º 74º da LGT o ónus da prova cabe ao contribuinte, ora reclamante.
l) Em 10-06-2016, foi notificado à Requerente o projecto de decisão que antecede, para exercício do direito de audição, no prazo de 15 dias (fls. 127 a 129 do PA);
m) Em 30-06-2016, a Requerente pediu prorrogação do prazo para exercício do direito de audição, nos termos que constam do documento n.º 14 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte
1.º
A Reclamante veio a 12.04.2016 justificar a declaração de rendimentos modelo 3 do substituição tendo inclusivamente junto todos os elementos que lhe foram facultados pela B…, SA. (adiante B…), entidade a quem foi confiada a gestão discricionário da carteira.
2.º
Tendo inclusivamente junto não só a cópia da declaração relativa ao Registo ou 'Depósito fornecido enviada pela B…, como também o extracto de conta onde constam todos os movimentos relativos aos investimentos financeiros subjacentes, quer a débito quer a crédito.
3.º
Conclui-se assim que a Reclamante, de uma forma totalmente transparente e colaborante remeteu todos os documentos de que dispunha e suportam a aludida declaração de rendimentos modelo 3 de substituição.
4.º
Compulsados os referidos documentos conclui-se facilmente qual o montante investido e quais as mais-valias geradas, tal como a Reclamante demonstrou no requerimento datado de 12.04.2016.
5.º
Confiava assim a Reclamante que a AT confrontando a Modelo 3 do IRS de substituição, com os elementos fornecidos e com a modelo 13 concluiria de forma equívoco que assistiria razão à ora Reclamante.
6.º
Apesar das explicações dadas pela Reclamante e pelos documentos juntos é com alguma surpresa que a Reclamante vê a proposta de decisão de indeferimento.
7.º
A proposta é ainda mais surpreendente quando a AT se baseia no facto de não constarem do sistema tributário da AT as modelo 13 completas (?).
8.º
Por um lado, a Reclamante não pode ficar prejudicada pela falta de cumprimento de obrigações declarativas por parte de terceiros, ainda para mais tratando-se de entidades financeiras que têm um dever acrescido de compliance.
9.º
Tanto mais que a AT pode sempre suscitar junto da entidade em causa todos os esclarecimentos que entender por necessários e mormente exortar ao cumprimento das respectivas obrigações declarativas pela aplicação do princípio do inquisitório consagrado no artigo 58.º da LGT.
10º
E por outro lado, esclarecendo agora a AT que não pôde confrontar a declaração modelo 3 do IRS convolada em reclamação com a modelo 13 questiona-se como pode pura e simplesmente aceitar como válida a 1º declaração modelo 3 do IRS na qual a Reclamante incorreu em manifesto lapso, em detrimento da declaração de substituição sustentada com a documentação que se remeteu para a AT e complementada pelas justificações constantes no requerimento datado de 12.04.2016.
11º
A Reclamante estava assim convicta que tinha prestado todos os esclarecimentos, tendo inclusivamente referido que caso a AT necessitasse de mais esclarecimentos que a Reclamante estava disponível para prestá-los, sendo certo que o dever de colaboração consagrado no artigo 59.º da LGT também é aplicável à própria AT.
12º
Assim, atenta a multiplicidade dos movimentos financeiros requer-se a V. Exa. se digne prorrogar o prazo para o exercício do direito de audição por igual período para que a Reclamante possa prestar esclarecimentos de forma mais detalhada, a fim de que seja dado provimento à reclamação como é da mais elementar justiça.
n) Em 22-07-2016, foi proferido o despacho de indeferimento da reclamação graciosa, que consta de fls.135 do PA, em que se manifesta concordância com a informação que consta de fls. 136-137 do mesmo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte;
4 - APRECIAÇÃO
A questão a analisar nos presentes autos e sobre os rendimentos da categoria G em sede de IRS, designadamente, as mais-valias mobiliárias obtidas respeitante a instrumentos financeiros derivados, tal como previsto no art.º 10º n.º 1 al. e) do CIRS.
Contudo, os ganhos de mais-valias mobiliárias previstas no art.º 10º nº 1 al. e) do CIRS, e constituído pelos rendimentos líquidos, apurados em cada ano, conforme o n.º 4 al. c) do mesmo artigo.
Da consulta efectuada ao sistema tributário desta Autoridade Tributária não constam as modelo 13 completas, isto é, as mesmas não se encontram devidamente apresentadas pelas entidades respectivas nos termos do art.º 124º do CIRS.
Para efeitos de proceder à análise dos valores de forma clara e inequívoca, foi a reclamante notificada para justificar os valores alterados na sua declaração de rendimentos modelo 3, de substituição, a identificação dos produtos / valores / datas dos movimentos, assim como os comprativos das despesas.
Veio a reclamante apresentar fotocópias de documentos já constantes nos autos, juntos à sua petição inicial.
Por falta de informação necessária, designadamente a demonstração dos cálculos efectuados de forma evidenciada com os respectivos documentos de suporte, assim como a informação completa das declarações modelo 13, conforme acima referido não é possível aferir dos valores dos ganhos respeitante às mais-mobiliárias obtidas no ano de 2013.
Nos termos do art.º 74º da LGT o ónus da prova cabe ao contribuinte, ora reclamante.
DOS JUROS INDEMNIZATÓRIOS
Cumpre ainda referir que por não se verificarem in casu os pressupostos do n.º 1 do artigo 43º da LGT, fica prejudicada a apreciação do direito a juros indemnizatórios.
AUDIÇÃO PRÉVIA. CONCLUSÃO E PROPOSTA DE DECISÃO
Notificado o mandatário da reclamante para o exercício de direito de audição previamente à decisão do procedimento, nos termos dos artigos 60º n.º 1 al b) da LGT e art.º 45º do CPPT, através do oficio n.º…, de 09-06-2016, sob o registo dos CTT n.º RD …PT, o mesmo veio apresentar requerimento a solicitar a prorrogação do prazo para efeitos de exercer o referido direito de audição.
Não obstante, o mandatário não ter sido expressamente notificado do deferimento do pedido, o mesmo nos termos do art.º 60º n.º 6 da LGT apenas poderia ter sido deferido até ao máximo de 25 dias, isto é, até à data de 11/07/2016, verificando-se a mesma ultrapassada.
Até à presente data, não veio o mesmo apresentar quaisquer elementos ou documentos.
Nestes termos, tendo presente os factos e fundamentos invocados no projecto de decisão constante de fls. 124 a 126, somos de parecer que, o mesmo se converta em definitivo, no sentido do seu INDEFERIMENTO.
o) Relativamente ao ano de 2012, foi emitida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, em 14-08-2015, a liquidação n.º 2015…, cuja cópia consta do documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que, além do mais, se referem «PERDAS A REPORTAR 419.313,37»;
p) Do sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira consta uma parte da relação das operações efectuadas sobre valores mobiliários no ano de 2013, referindo-se que foram «encontrados 245 resultados» e que «são apresentado os primeiros 90» (página 15 do processo administrativo);
q) Em 25-10-2016, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados
Não se provou que a B… SA tivesse dado qualquer resposta à notificação que lhe foi efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto
Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pela Requerente com o pedido de pronúncia arbitral e n o processo administrativo.
3. Matéria de direito
Na sequência de notificação da Autoridade Tributária e Aduaneira, a Requerente apresentou uma declaração de IRS relativa ao ano de 2013, com um anexo G em que se referem vários movimentos de valores mobiliários.
Com base nessa declaração a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação impugnada.
Posteriormente, a Requerente apresentou uma declaração de substituição, tendo sido notificada para justificar as alterações e identificar os produtos/valores/datas dos movimentos, assim como os correspondentes comprovativos das despesas e encargos com aqueles.
A Requerente apresentou os documentos n.ºs 6 e 7 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, que já tinha juntado e a Autoridade Tributária e Aduaneira notificou a entidade que tinha efectuado as transacções financeiras, B… SA, para «apresentar a declaração modelo 13 - valores mobiliários, Warrants autónomos e instrumentos financeiros derivados, de substituição, prevista no art.º 124º do CIRS, respeitante ao ano de 2012», «pelo facto de ter apresentado a última declaração modelo 13, de substituição, respeitante ao ano de 2012, em 2015-03-05, e da mesma apenas constarem operações referentes ao mês de Janeiro, quando apresentou anteriormente outras, em 2014-07-21 e em 2013-08-23, com operações referentes à totalidade do ano de 2012».
Não consta do processo qualquer resposta da B… SA, à notificação efectuada.
Por outro lado, constata-se que a informação pedida pela Autoridade Tributária e Aduaneira à B… SA foi relativa aos movimentos efectuados no ano de 2012 e não de 2013, sendo estes que estão em causa no presente processo.
3.1. Questão das perdas a reportar apuradas na liquidação referente ao ano de 2012
No presente processo, a Requerente junta uma cópia da liquidação relativa ao ano de 2012, em que se referem perdas a reportar que não foram consideradas na liquidação impugnada.
Mas, como refere a Autoridade Tributária e Aduaneira na sua Reposta, esta liquidação é posterior à liquidação impugnada e não foi invocado este fundamento na reclamação graciosa.
Não se demonstrando que as perdas em causa estivessem apuradas em liquidação anterior à liquidação impugnada, não se pode também considerar demonstrado que a liquidação impugnada enferme de vício por elas não terem sido consideradas, nem que a decisão da reclamação graciosa enferme de vício, já que a questão não foi colocada nem apreciada.
Por outro lado, num contencioso de mera legalidade, como é o previsto no RJAT para os tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, em que se visa apenas a declaração de ilegalidade de actos dos tipos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do seu artigo 2.º, tem de se aferir da legalidade do acto impugnado tal como ocorreu, pelo que não pode este Tribunal Arbitral apreciar a eventual relevância das referidas perdas sem que, previamente, a questão tenha sido submetida à apreciação da Autoridade Tributária e Aduaneira, no âmbito de num procedimento tributário.
Assim, sem prejuízo dos deveres que impedem sobre a Autoridade Tributária e Aduaneira em sede de execução de julgado, não se toma conhecimento da questão das perdas a reportar.
3.2. Questão da violação do princípio da colaboração e da regra do ónus da prova
A Requerente imputa à decisão da reclamação graciosa violação do princípio da colaboração enunciado no artigo 59.º da LGT e violação da regra dos ónus da prova que consta do artigo 74.º, n.º 2, da mesma Lei, nos termos do qual «quando os elementos de prova dos factos estiverem em poder da administração tributária, o ónus previsto no número anterior considera-se satisfeito caso o interessado tenha procedido à sua correcta identificação junto da administração tributária».
No caso em apreço, a Requerente, para além de enviar documentos em que se referem os movimentos financeiros relativos ao ano de 2013 realizados através da B… SA, fez referência à declaração modelo 13, que «as instituições de crédito e sociedades financeiras devem comunicar à Autoridade Tributária e Aduaneira, até ao final do mês de março de cada ano, relativamente a cada sujeito passivo» (artigo 124.º do CIRS).
No caso em apreço, constata-se que esta declaração modelo 13 foi apresentada, pois a própria Autoridade Tributária e Aduaneira refere no artigo 3.º da Resposta que foi através de cruzamento de dados com ela que a Requerente foi notificada para proceder à entrega da declaração modelo 3 acompanhada do anexo G.
No entanto, a declaração modelo 3 estaria incompleta, segundo se depreende da notificação que foi efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira à B… SA, que consta da página 59 do processo administrativo, ou o sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentava todos os dados nela contidos, segundo de percebe da página 15 do processo administrativo, em que o sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira refere apresentar apenas 90 de 245 resultados que encontrou.
Na diligência que efectuou em relação à B… SA, a Autoridade Tributária e Aduaneira, eventualmente por lapso, determinou a a apresentação da declaração modelo 13 relativa ao ano de 2012 e não ao de 2013.
Mas, o certo é que a decisão da reclamação graciosa foi proferida sem que tivesse sido junta ao procedimento de reclamação graciosa a referida a referida declaração modelo 13 nem qualquer resposta da B… SA.
O artigo 74.º, n.º 2, da LGT, numa interpretação compaginável com o princípio constitucional da proporcionalidade, ao referir que o ónus da prova fica satisfeito «quando os elementos de prova dos factos estiverem em poder da administração tributária», tem de ser entendido como reportando-se àqueles que devam estar na posse desta, quando devam ser fornecidos por terceiros.
Na verdade, o sujeito passivo não tem a possibilidade legal de emitir ele próprio a declaração modelo 13 prevista no artigo 124.º e a imposição do ónus da prova não se pode traduzir, por força do princípio constitucional da proibição da indefesa, que emana do princípio do direito à tutela judicial efectiva (artigo 20.º, n.º 1, da CRP), em ser exigida ao sujeito passivo a apresentação de um meio de prova que não está na sua disponibilidade.
Por isso, é de considerar satisfeito o ónus da prova, ao abrigo do referido n.º 2 do artigo 74.º, quando o contribuinte indicar como meio de prova documentos que, por força da lei, devem ser fornecidos à Autoridade Tributária e Aduaneira por terceiros e que não esteja na disponibilidade do contribuinte apresentar.
A isto acresce que, no caso em apreço, confirma-se que foi apresentada a declaração modelo 13 relativa ao ano de 2013, pois, como se vê a fls. 15 do processo administrativo, do sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira consta uma parte da relação das operações efectuadas sobre valores mobiliários no ano de 2013, referindo-se que foram «encontrados 245 resultados» e que «são apresentado os primeiros 90». Por isso, conclui-se que a informação prestada pelo Sujeito Passivo, referindo a declaração modelo 13, constitui a «correcta identificação junto da administração tributária», para efeito do artigo 74.º, n.º 2, da LGT.
Assim, conclui-se que a Requerente satisfez plenamente o ónus da prova das operações, não podendo considerar-se esse ónus não cumprido pelo facto, se, como se infere do «print» que consta da página 15 do processo administrativo, de o sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentar os outros 155 resultados que se refere terem sido «encontrados», mas não apresentados.
De qualquer modo, mesmo que a declaração modelo 13 tivesse sido apresentada incompleta (o que não é crível em face do que se refere na referida página 15 do processo administrativo, pois os tais outros 155 resultados foram encontrados), sempre caberia à Autoridade Tributária e Aduaneira, no cumprimento dos deveres de obtenção de prova que lhe impõe o artigo 58.º da LGT, notificar a B… SA para apresentar a declaração completa relativa ao ano de 2013 ou realizar qualquer outra diligência que se afigurasse adequada para o efeito (o que não fez, pois notificou-a para apresentar elementos relativamente ao ano de 2012 e não de 2013).
Por outro lado, como defende a Requerente, se a declaração modelo 13 estava incompleta, a Autoridade Tributária e Aduaneira, em observância do princípio da colaboração enunciado no n.º 1 do artigo 59.º da LGT, deveria ter informado a Requerente dos «elementos existentes para permitir à Reclamante aferir se conseguiria, pelo menos parcialmente, ter suporte documental dos movimentos financeiros».
Assim, não dando conhecimento à Requerente o teor da referida declaração modelo 13 que foi apresentada pela B… SA, e não tendo sequer diligenciado para ela ser completada (a diligência efectuada reporta-se à do ano de 2012 e não 2013), é de concluir que a Autoridade Tributária e Aduaneira violou o princípio da colaboração imposto no referido artigo 59.º, n.º 1, da LGT que exige que a Autoridade Tributária e Aduaneira dê conhecimento ao contribuinte de toda a informação a ele respeitante que seja relevante para o procedimento tributário.
Pelo exposto, conclui-se que a Requerente deu satisfação ao ónus da prova ao apresentar os documentos que tinha em seu poder e ao indicar como meio de prova a declaração modelo 13 que a Autoridade Tributária e Aduaneira deveria ter em seu poder.
Consequentemente, é ilegal da decisão da reclamação graciosa no juízo que efectuou sobre o ónus da prova.
Por outro lado, recaindo sobre a Autoridade Tributária e Aduaneira o ónus da prova dos movimentos financeiros efectuados pela Requerente no ano de 2013, a dúvida sobre a totalidade dos movimentos efectuados, deve ser valorada procedimental e processualmente a favor da Requerente, o que se reconduz a considerar provado que os movimentos financeiros efectuados no ano de 2013 são os referidos na declaração de substituição que apresentou.
Por isso, a liquidação impugnada, que teve como pressuposto outros valores, enferma de vício de erro sobre os pressupostos de facto, que justifica a sua anulação.
4. Decisão
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Não tomar conhecimento da questão das perdas de 2012 a eventualmente reportar em 2013;
b) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à questão da ilegalidade da liquidação de IRS n.º 2014…;
c) Anular a referida liquidação.
5. Valor do processo
De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 70.574,77.
6. Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.448,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 10-04-2017
Os Árbitros
(Jorge Manuel Lopes de Sousa)
(José Nunes Barata)
(Augusto Vieira)