Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 392/2016-T
Data da decisão: 2017-03-27  IRC  
Valor do pedido: € 765.651,12
Tema: IRC - Dedutibilidade de perdas por imparidade. Instituições sujeitas a supervisão do Banco de Portugal.
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Decisão Arbitral

 

 

            Os árbitros Cons. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Prof. Doutor Daniel Taborda e Prof. Doutor Vasco Valdez (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 10-11-2016, acordam no seguinte:

           

            1. Relatório

 

            A… SGPS, SA, com o número único de matrícula na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa e de identificação de pessoa colectiva…, com sede na Av…, n.º…, … - … Lisboa (doravante designada por “Requerente”), veio, ao abrigo do disposto nos arts. 2.º, n.º 1, al. a) e 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária - RJAT), apresentar pedido de pronúncia arbitral, tendo em vista a apreciação da legalidade e anulação da liquidação de IRC n.º 2016…, relativa ao exercício de 2010.

            É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 04-08-2016.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo a Senhora Cons. Fernanda Maçãs, o Senhor Prof. Doutor João Ricardo Catarino e o Senhor Prof. Doutor Daniel Taborda signatários.

Na sequência de decisões do Senhor Presidente do Conselho Deontológico, o Tribunal Arbitral passou a ser constituído pelos signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

As partes foram notificadas da designação dos Árbitros, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 10-11-2016.

A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu defendendo que o pedido deve ser julgado improcedente.

Por despacho de 17-01-2017 foi dispensada reunião e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas.

As Partes apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos arts. 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.

As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não há excepções nem há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

Com base nos elementos que constam do processo e documento juntos com o pedido de pronúncia arbitral, consideram-se provados os seguintes factos:

 

a)      A Requerente A… SGPS, SA foi constituída em 26-12-2008, tendo por objecto a gestão de participações sociais noutras sociedades, como forma indirecta do exercício de actividades económicas, sendo seus accionistas a B… com 51% e a C… com 49%;

b)      Em 31-12-2010, a Requerente detinha as seguintes participações financeiras:

–      D…, SA 100,00%

– E… (E…) 19,00%

– F…19,50%

– G… 0,68%

– H…0,44%;

c)      No exercício de 2010, a Requerente reconheceu um gasto relativo a imparidade em relação à participação de 19% detida na E… SGPS, no montante de € 7.638.493,00, que estava contabilisticamente classificada como activo disponível para venda e encontrava-se valorizada ao custo histórico na conta …;

d)      Na declaração Modelo 22, relativa a 2010, a Requerente não procedeu, no Campo 737 do Quadro 07, a qualquer acréscimo ao seu lucro tributável, por força da consideração em apenas 50% de outras perdas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, nos termos do art. 45.º, n.º 3 do Código do IRC;

e)      A Requerente foi objecto de uma acção inspectiva externa, de âmbito polivalente, ao ano de 2010 levada a cabo pela Direcção de Finanças de Lisboa, em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI2016…, de 11-01-2016;

f)       Nessa acção inspectiva foi efectuada uma correcção ao lucro tributável da Requerente relativo ao exercício de 2010, no montante de €3.819.246,50, mas, atendendo ao prazo para liquidar tributos relativamente ao ano de 2010, a correcção a matéria colectável de € 3.819.246,50 só produziu efeitos no valor de € 3.068.854,48, que corresponde ao montante de prejuízos fiscais inicialmente gerados no ano de 2010, que foram deduzidos pelo sujeito passivo no ano de 2011;

g)      No Relatório da Inspecção Tributária elaborado nessa acção inspectiva, cujo teor se dá como reproduzido, refere-se, além do mais o seguinte:

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL E IMPOSTO

III - 1. IRC

III. 1.1 - 50% de outras perdas relativas a partes de capital (parte final do n.º 3 do art.º 45º do CIRC) - 3.819.246,50 euros

Da análise efetuada à declaração de rendimentos Modelo 22 do ano de 2010, constatou-se que o sujeito passivo não procedeu a qualquer acréscimo ao lucro tributável, no campo 737 do quadro 07, respeitante a 50% de outras perdas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, nos termos da parte final do n.º 3 do art.º 45.º do CIRC.

De acordo com o relatório e contas de 2010 verificou-se que foi reconhecido um gasto relativo à imparidade em relação à participação de 19% detida na  E… SGPS (doravante designada E…), no montante de € 7.638.493,00 (anexo 1, páginas 1 e 2).

A participação financeira detida na E… está classificada como ativo disponível para venda e encontra-se valorizada ao custo histórico na conta 180011.

No Anexo às Demonstrações Financeiras em 31 de dezembro de 2010 a … menciona os princípios contabilísticos mais relevantes utilizados na preparação das demonstrações financeiras que se resumem de seguida:

" 2.1. Activos Financeiros

(...)

2.1.2 Activos financeiros detidos para Venda

Nesta categoria são registados títulos de rendimento variável não classificados no momento da sua aquisição como títulos de negociação, abrangendo essencialmente instrumentos de capital detidos com carácter de estabilidade, isto é, aqueles que em princípio permanecerão na carteira por mais de um ano.

Os activos financeiros disponíveis para venda são mensurados ao justo valor. Os ganhos ou perdas, resultantes de reavaliação, são relevados em capitais próprios na rubrica de "Reservas de reavaliação".

No que respeita aos activos financeiros registados ao custo, nomeadamente instrumentos de capital não cotados e cujo justo valor não possa ser apurado com fiabilidade, são efectuadas com caracter periódico análises de imparidade.

O valor da perda por imparidade apurado é reconhecido directamente em resultados do exercício. As perdas por imparidade nestes activos não podem ser revertidas.

Tendo presente o disposto no art.º 32.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, não são calculados impostos diferidos relativamente a esta categoria de títulos.

No momento da venda, ou caso seja determinada imparidade, as variações acumuladas do justo valor são transferidas para resultados do exercício.

Os dividendos de instrumentos de capital classificados nesta categoria são registados como proveitos no momento em que se estabelece o direito da Sociedade ao seu recebimento.

(...)

7. Activos Financeiros Disponíveis para Venda

Em 31 de Dezembro de 2010 e 31 de Dezembro de 2009, esta rubrica era composta por:

Instrumentos de Capital

- Valorizados ao Custo Histórico

De referir que a avaliação efectuada à participada E… originou um reconhecimento, em 2010, de uma imparidade de 7,6 milhões de euros que foi directamente a resultados do exercício.

 

Ainda de acordo com o relatório e contas constata-se que para o desenvolvimento da sua atividade, no exercício de 2010, a sociedade incorreu em vários gastos nomeadamente o pagamento ao I… de 50% do preço do relatório de avaliação da participada E… .

No exercício em análise, a sociedade apurou um total de ganhos de 23,5 milhões de euros, sendo que 4,7 milhões de euros dizem respeito a dividendos recebidos da participada E… .

O resultado líquido apurado no exercício de 2010 foi de 5,8 milhões de euros, valor inferior em 8,3 milhões de euros, ao do exercício anterior. Fundamentalmente esta quebra deve-se ao registo de imparidade na participação na E… .

 

a) Ativos financeiros disponíveis para venda

De acordo com o descrito no Relatório e contas do exercício de 2010, e conforme acima referido, a rubrica “ativos financeiros disponíveis para venda" no que respeita aos ativos financeiros registados ao custo, nomeadamente instrumentos de capital não cotados e cujo justo valor não possa ser apurado com fiabilidade, são efetuadas com caráter periódico análises de imparidade, sendo que o valor da perda por imparidade apurado é reconhecido diretamente em resultados do exercício.

A I… procedeu a uma avaliação da empresa E… (anexo 1, páginas 3 e 4) e apresentou o respetivo “...Relatório de avaliação económica e financeira que sustenta um referencial de valorização para os capitais próprios da E… [...] com um valor base de €901,6 milhões.”

Da análise ao extrato da conta de gastos 76301 - “Perdas imparidade (Nic)lprov. imp. (Nca) – act financeiros disponíveis para venda - Títulos - lnstr de capital emitidos por residentes” (anexo 1, página 5), verifica-se que o sujeito passivo registou no exercício de 2010, a imparidade detetada na participação de 19% detida nas E…, com base no referido relatório de avaliação elaborado pelo I… (anexo 1), inscritas na rubrica “ativos financeiros disponíveis para venda”, que no exercício de 2010 ascendeu a € 7.638.493,00 e cujo apuramento se discrimina no quadro seguinte:

 

Assim, uma vez que as perdas por imparidade em participações estão incluídas nas outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital referidas no já citado n.º 3 do art.º 45.º do CIRC, a importância de € 7.638.493,00, incluída em resultados do exercício de 2010, apenas poderá ser aceite para efeitos fiscais em 50%, pelo que deverá ser corrigido ao prejuízo fiscal o montante de €3.819.246,50, com base nos argumentos que a seguir se explanam.

a.1) Tratamento contabilístico

A IAS 39 - “Instrumentos Financeiros: Reconhecimento e Mensuração” tem como objetivo estabelecer princípios para reconhecer e mensurar ativos financeiros, passivos financeiros e alguns contratos de compra e venda de itens não financeiros.

Refere o § 58 da IAS 39, que “Uma entidade deve avaliar à data de cada balanço se existe ou não qualquer prova objetiva de que um ativo financeiro ou um grupo de ativos financeiros esteja com imparidade. Se tal prova existir, a entidade deve aplicar (...) o § 67 (para ativos financeiros disponíveis para venda) para determinar a quantia de qualquer perda por imparidade.”

Assim, de acordo com o § 59 da mesma IAS, "um ativo financeiro ou um grupo de ativos financeiros está com imparidade e são incorridas perdas por imparidade se, e apenas se, existir prova objetiva de imparidade como resultado de um ou mais acontecimentos que ocorreram após o reconhecimento inicial do ativo (um «acontecimento de perda››) e se esse acontecimento (ou acontecimentos) de perda tiver um impacte nos fluxos de caixa futuros estimados do ativo financeiro ou do grupo de ativos financeiros que possa ser fiavelmente estimado. (...)"

Acresce ainda que no § 67 da aludida IAS, que quando existe um declínio no justo valor de um ativo financeiro disponível para venda que tenha sido reconhecido diretamente no capital próprio e houver prova objetiva de que o ativo está com imparidade (vide § 59), a perda cumulativa que tinha sido reconhecida diretamente no capital próprio deve ser removida do capital próprio e reconhecida nos resultados ainda que o ativo financeiro não tenha sido desreconhecido.

O §68 refere ainda que "A quantia da perda cumulativa que seja removida do capital próprio e reconhecida nos resultados segundo o parágrafo 67 deve ser a diferença entre o custo de aquisição (líquido de qualquer reembolso e amortização de capital) e o justo valor corrente, menos qualquer perda por imparidade resultante desse ativo financeiro anteriormente reconhecido nos resultados. "

Por outro lado, define o Banco de Portugal na sua instrução n.º 7/2005, que:

"Nos termos do disposto na alínea b) do número 1 do nº 1.º do Aviso nº 3/95, o Banco de Portugal determina, para cumprimento por todas as instituições referidas no número 4º do Aviso nº 1/2005, o seguinte:

1. As provisões a que se refere a alínea b) do número 1 do nº 1.º do Aviso nº 3/95 correspondem à imparidade determinada de acordo com as disposições relevantes que constam das Normas internacionais de Contabilidade (NIC) aplicáveis tal como adoptadas, em cada momento, por Regulamento da Comissão Europeia.

2. No que respeita aos ativos financeiros, e de acordo com as disposições relevantes da Norma internacional de Contabilidade 39, existe imparidade ou são incorridas perdas por imparidade num ativo financeiro ou num grupo de activos financeiros se, e apenas se, existir prova objetiva de imparidade como resultado de um ou mais acontecimentos que ocorreram após o reconhecimento inicial do activo (um 'acontecimento de perda') e se esse acontecimento (ou acontecimentos) de perda tiver um impacto nos fluxos de caixa futuros estimados do activo financeiro ou do grupo de activos financeiros que possa ser fiavelmente estimado.

Pode não ser possível identificar um único acontecimento, discreto, que tenha causado a imparidade. Pelo contrário, o efeito combinado de vários acontecimentos pode ter causado a imparidade.

A prova objectiva, de que um ativo financeiro ou um grupo de ativos, está com imparidade inclui dados observáveis que chamam a atenção do detentor do activo acerca, designadamente, dos seguintes acontecimentos de perda:

a) evidente dificuldade financeira do emitente ou do devedor;

b) quebra de algum contrato, tal como incumprimento ou atraso nos pagamentos de juro ou de capital;

c) probabilidade significativa de o mutuário entrar em falência ou noutra reorganização

financeira;

d) desaparecimento, para esse activo financeiro, de um mercado líquido e com suficiente profundidade, se devido a dificuldades financeiras do emitente. "

Também, de acordo com o Aviso n.º 3/2005, de 21 de fevereiro, do Banco de Portugal, as instituições de crédito são obrigadas a constituir provisões, designadamente para imparidade em títulos e participações financeiras.

Do exposto, resulta evidente que o registo de uma imparidade constitui uma perda, aliás, reconhecida em contas de resultados, no caso em questão na já referida conta 76301 - “Perdas imparidade (Nic)lprov. imp. (Nca) - act financeiros disponíveis para venda - Títulos - lnstr de capital emitidos por residentes.”

 

a.2) Tratamento fiscal

Em termos fiscais, o setor bancário apresenta um regime próprio no Código do IRC, no seu n.º 2 do art.º 35.º e no art.º 37.º, para as perdas por imparidade, destinadas à cobertura de risco específico de crédito e de risco-pais e para menos-valias de títulos e de outras aplicações. De acordo com este regime, as perdas por imparidade quando constituídas obrigatoriamente, por força das normas emanadas pelo Banco de Portugal, de caráter genérico e abstrato, pelas entidades sujeitas à sua supervisão e pelas sucursais em Portugal de instituições de crédito e outras instituições financeiras com sede em outro Estado membro da União Europeia, destinadas à cobertura de risco específico de crédito e de risco-pais e para menos-valias de títulos e de outras aplicações, podem ser deduzidas para efeitos fiscais. O art.º 37.º do CIRC estabelece em que condições podem estas perdas por imparidade ser aceites.

Dispõe o n.º 4 do art.º 37.º do CIRC, que os “...montantes anuais acumulados das perdas por imparidade e outras correções de valor, referidas no n.º 2 do artigo 35.º, não devem ultrapassar os valores mínimos que resultem da aplicação das normas emanadas da entidade de supervisão."

Porém, o n.º 3 do art.º 45.º do CIRC prevê uma restrição quanto à dedutibilidade das perdas relativas a partes de capital, as quais concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor, estando aqui incluídas quer a diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, quer outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares.

Estão, desta forma incluídas nesta norma todas as perdas relativas a partes de capital, ou seja, quer a diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas quer outras perdas potenciais, como, por exemplo, os gastos resultantes da aplicação de justo valor em instrumentos de capital próprio.

Este regime não exceciona as perdas relativas a partes de capital das instituições de crédito.

Deste modo, no caso de existir prova objetiva de que os ativos financeiros atrás descritos estejam com imparidade, esta deve ser relevada contabilisticamente, no entanto, estas perdas estão sujeitas á limitação disposta no n.º 3 do artigo 45.º do CIRC e concorrem para a formação do lucro tributável apenas por metade do seu valor.

Face ao exposto o sujeito passivo deveria ter acrescido ao lucro tributável € 3.819.246,50 (€7.638.493,00 x 50%) no campo 737 do quadro 07 da declaração modelo 22 de IRC do exercício de 2010.

III.1.2. - Prazo de Caducidade (artigo 45º da LGT) e Reporte de Prejuízos (artigo 52º do CIRC)

Nos termos do n.º 3 do artigo 45.º da LGT e no caso de ter sido efetuado reporte de prejuízos, o prazo de caducidade do direito ã liquidação é o do exercício desse direito.

De acordo com o artigo 52.º do CIRC, os prejuízos fiscais apurados em determinado exercício, são deduzidos aos lucros tributáveis, havendo-os, de um ou mais dos quatro exercícios posteriores (redacção dada pela Lei n.º 3-B/2010 de 28 de abril, legislação ã data dos factos).

Dispõe o n.º 4 do referido preceito legal que “quando se efetuarem correções aos prejuízos fiscais declarados pelo sujeito passivo, devem alterar-se, em conformidade, as deduções efetuadas, não se procedendo, porém, a qualquer anulação ou liquidação, ainda que adicional, de IRC, se forem decorridos mais de seis anos relativamente àquele a que o lucro tributável respeite.”

Nestes termos propõe-se que o prejuízo para efeitos fiscais do ano de 2010, no montante de €3.068.854,48, seja corrigido uma vez que se verifica o seu reporte para o exercício de 2011. Atendendo a que já se encontra decorrido o prazo de caducidade, face ao disposto no nº 1 do artº 45º da LGT, para liquidar tributos para o ano de 2010, a correção à matéria coletável de € 3.819.246,50 só produzirá efeitos no valor de € 3.068.854,48 relativamente aos prejuízos fiscais que foram deduzidos pelo sujeito passivo no ano de 2011 e relativamente aos quais se pretende efetuar o correspondente ajustamento de prejuízos.

 

 

h)      Na sequência da acção inspectiva, foi emitida a liquidação de IRC n.º 2016 … que fixou em € 4.110.840,04 o valor a reembolsar, relativamente ao exercício de 2010 (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

i)       Em 13-07-2016, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

2.2. Factos não provados

 

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

 

2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pela Requerente com o pedido de pronúncia arbitral e, posteriormente, pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

3. Matéria de direito

 

3.1. A questão controvertida e posições das Partes

 

A Requerente é uma sociedade gestora de participações sociais que detém a 100% uma instituição de crédito (a sociedade de locação financeira e factoring D…, SA), pelo que é uma entidade sujeita à supervisão do Banco de Portugal, como decorre dos artigos 3.º, alínea g), 11.º e 117.º, n.º 1, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, na redacção decorrente da republicação operada pelo Decreto-Lei n.º 1/2008, de 3 de Janeiro), vigente em 2010.

Numa acção inspectiva a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção ao lucro tributável da Requerente relativo ao exercício de 2010, no montante de € 3.819.246,50, relativo a 50% das perdas por imparidade reconhecidas em resultados pela Requerente relativas a “Activos Financeiros Disponíveis para Venda” (“AFDV”). Deste valor a Autoridade Tributária e Aduaneira apenas considerou efectuar correcção no valor de € 3.068.854,48, por ser este o montante dos prejuízos fiscais que foram deduzidos pelo sujeito passivo no ano de 2011 e não estar em tempo para efectuar liquidação adicional relativa ao exercício de 2010.

A Requerente considerou dedutíveis ao lucro tributável essas perdas na sua totalidade, enquanto a Autoridade Tributária e Aduaneira apenas as considerou dedutíveis em 50% do respectivo valor, por aplicação do regime previsto no n.º 3 do artigo 45.º do Código do IRC, vigente no ano de 2010.

Apenas é questionada no presente processo a legalidade desta correcção.

O Decreto-Lei n.º 35/2005, de 17 de Fevereiro, transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2003/51/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Junho, que altera as Directivas n.ºs 78/660/CEE, 83/349/CEE, 86/635/CEE e 91/674/CEE, do Conselho, relativas às contas anuais e às contas consolidadas de certas formas de sociedades, bancos e outras instituições financeiras e empresas de seguros, prevendo a possibilidade de as entidades às quais não se apliquem as Normas Internacionais de Contabilidade (NIC) optarem pela sua aplicação nos termos do Regulamento (CE) n.º 1606/2002, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de Julho.

No seu artigo 13.º, n.º 1, alínea a), o Decreto-Lei n.º 35/2005 atribuiu competência ao Banco de Portugal para a definição do âmbito subjectivo de aplicação das Normas Internacionais de Contabilidade, bem como a definição das normas contabilísticas aplicáveis às contas consolidadas, relativamente às entidades sujeitas à respectiva supervisão, regime este que foi mantido pelo artigo 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 158/2009, de 13 de Julho, que aprovou o Sistema de Normalização Contabilística (SNC).

Por força do Aviso do Banco de Portugal n.º 1/2005, publicado no Diário da República n.º 41/2005, Série I-B de 28 de Fevereiro, foi definido o âmbito de aplicação das Normas Internacionais de Contabilidade (NIC) - International Accounting Standards/International Financial Reporting Standards (IAS/IFRS), bem como as normas contabilísticas aplicáveis às contas consolidadas e individuais das entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal.

No n.º 2 deste Aviso n.º 1/2005 refere-se que «sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as instituições a que este aviso se aplica devem elaborar as demonstrações financeiras em base individual e em base consolidada de acordo com as normas internacionais de contabilidade (NIC), tal como adoptadas, em cada momento, por regulamento da União Europeia e, bem assim, com a estrutura conceptual para a apresentação e preparação de demonstrações financeiras que enquadra aquelas normas».

Para além do regime que consta dos números seguintes, o Banco de Portugal, no exercício do seu poder de regulamentar, tem emitido avisos e instruções que impõem às entidades sujeitas à sua supervisão a aplicação das Normas de Contabilidade Ajustadas (NCA), correspondem genericamente às Normas Internacionais de Contabilidade (NIC) e de Relato Financeiro (IAS/IFRS), com as excepções especialmente previstas.

A divergência essencial entre as Partes restringe-se à aplicação do artigo 45.º, n.º 3, do CIRC (vigente em 2010), resumindo-se nestes termos:

– a Requerente entende que este n.º 3 do artigo 45.º não se aplica às perdas por imparidade constituídas pelas entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal enquadráveis no n.º 2 do artigo 35.º e no artigo 37.º do CIRC, pelo que elas relevam na totalidade como componente negativa do lucro tributável;

– a Autoridade Tributária e Aduaneira entende que o n.º 3 do art. 45° do Código do IRC é aplicável às perdas por imparidade relativas a partes de capital, incluindo-se na sua última parte, pelo que eles concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor.

 

A Requerente formulou as seguintes conclusões no pedido de pronúncia arbitral:

 

a) A AT determinou que fosse acrescido à matéria colectável da Requerente o valor de € 3.819.246,50, relativo a 50% das perdas por imparidade reconhecidas em resultados pela A… SGPS, relativas à sua participação social na empresa E…, participação essa registada em "Ativos Financeiros Disponíveis para Venda" «"APDv"››

b) Os fundamentos jurídicos que subjazem a tal correção reconduzem-nos, no essencial, à aplicação das limitações constante do n.º 3 do art. 45.º do Código do IRC às perdas por imparidade em títulos registados nas carteiras de AFDV;

c) Por seu turno, os argumentos que fundamentam tal aplicabilidade reconduzir-se-ão também, na prática, a um único e só argumento, a saber, o elemento literal de interpretação das normas jurídicas;

d) Ora, uma boa interpretação da lei não pode dispensar o elemento histórico de interpretação, o elemento sistemático e o seu elemento racional ou finalístico;

e) Com efeito, a intenção do legislador, ao alargar, em 2006, o âmbito de aplicação do n.º 3 do art. 45.º do Código do IRC, não era manifestamente a de nele incluir as provisões para imparidade constituídas obrigatoriamente pelas instituições de crédito relativas a partes de capital registadas como "AFDV";

f) Acresce que, no plano dos princípios, nunca se poderá aplicar uma norma excepcional e restritiva, que limita a dedutibilidade de encargos com base em propósitos "moralizadores”, a custos, cujo reconhecimento contabilístico pelo sujeitos passivo, não só não se encontra na sua livre disposição, como lhe é, para além disso, imposto por uma entidade supervisora;

g) Assim, se aplicarmos às perdas por imparidade em partes de capital, reconhecidas obrigatoriamente pelas instituições de créditos em resultados, simultaneamente 0 disposto no art. 37.º do Código do IRC e o disposto no 45.º, n.º 3 do mesmo diploma (partindo do pressuposto - quanto a nós errado - de que esta última disposição abrange tais encargos) estaremos, afinal, a anular, através da aplicação de uma norma comum, os objectivos prosseguidos por uma norma particular e especial;

h) Não devendo as normas comuns prevalecer sobre as particulares, nem as normas gerais sobre as especiais, aplicar os limites previstos no n.º 3 do art. 45.º do Código do IRC às perdas por imparidade em partes de capital reconhecidas por instituições, sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, mais do que desrespeitar regras básicas de hierarquia de normas, é esquecer o essencial da tarefa da interpretação, a saber, reconstituir, a partir dos textos, o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada;

i) Em suma, aplicar o n.º 3 do art. 45.º do Código do IRC às provisões para imparidade constituídas/deduzidas pela Impugnante, em 2010, relativas a partes de capital qualificadas como “AFDV", mais não é do que aplicar uma norma jurídica, sem antes se curar de perceber de que norma se trata, qual a sua ratio, qual a sua história e qual a sua relação com as demais normas do ordenamento jurídico-fiscal em que aquela se insere; é aplicá-la, sem a interpretar primeiro;

j) A manter-se esta correcção, manter-se-á, portanto, um acto manifestamente ilegal, por violação do disposto no art. 45º, n.º 3 do Código do IRC.

 

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira defende, em suma, o seguinte:

 

– o artigo 45.º, n.º 3, do CIRC tem subjacente o propósito de
atenuar os efeitos de práticas de erosão na base tributável e o legislador, ao ter-lhe dado uma redacção abrangente e genérica, optou por não incluir, na sua previsão, qualquer ponderação de circunstâncias particulares das operações concretas que originam as menos-valias, bem como outras perdas e variações patrimoniais negativas;

– é inegável que subjacente à redacção dada ao art.º 45.º, n.º 3 estiveram considerações e preocupações relacionadas com a prevenção de práticas evasivas, cujo âmbito foi evoluindo no sentido da sua ampliação, por forma a não excluir, inclusivamente, operações e situações que, envolvendo igualmente partes de capital ou outras componentes do capital próprio, pudessem produzir os mesmos efeitos das inicialmente contempladas;

– o conceito “perdas” ínsito no artigo 45º, nº 3 do CIRC reveste uma formulação aberta, no âmbito da qual se enquadram todo o tipo de perdas relativas a partes de capital, incluindo as perdas potenciais;

– o que se pode extrair dos artigos 35.º, 23.º, n.º 1, alínea h) e 37.º, n.º 4, do CIRC é que as disposições legais acima citadas é que as entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal e sucursais em Portugal de instituições de crédito e outras instituições financeiras com sede em outro Estado membro da União Europeia: (1) podem deduzir, para efeitos fiscais, as perdas por imparidade destinadas à cobertura de menos-valias de títulos; e (2) que o limite máximo da dedução, a efectuar em cada exercício, não pode ultrapassar os valores mínimos resultantes da aplicação das normas do Banco de Portugal;

– não se conclui dessas normas que a dedução das perdas por imparidade em títulos tenha de corresponder ao valor mínimo resultante da aplicação das normas do Banco de Portugal, mas, antes, que é esse o limite máximo aceite como dedutível;

– inexiste apoio na letra e na ratio do n.º 3 do art.º 45.º do Código do IRC que suporte a tese da Requerente segundo a qual as perdas por imparidade em títulos, a que se referem o n.º 2 do art.º 35.º e o n.º 4 do art.º 37.º não são abrangidas pela limitação da dedução em 50% do seu valor;

– o Relatório da Proposta do Orçamento do Estado para 2003 apresenta uma lista de seis alterações legislativas de natureza variada, sob a epígrafe «Alargamento da base tributável e medidas de moralização e neutralidade» pelo que não se pode concluir que se esteja perante uma norma com  vocação antiabuso;

– no que em particular concerne à medida em causa (inserida no n.º 3 do art.º 42.º do Código do IRC), os objectivos em vista eram, indubitavelmente, o alargamento da base tributável e a introdução de um factor de neutralidade e de balanceamento entre o regime aplicável à diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias realizadas na alienação de partes sociais, em caso de reinvestimentos;

– quanto à alteração subsequente, feita por aditamento àquele normativo, pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro, com o intuito de também incluir no respectivo âmbito “outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares” o mesmo teve como propósito abranger todos as perdas associadas ao investimento em partes sociais, por forma a evitar tratamento discriminatório entre realidades com natureza similar;

– esta medida legislativa surgiu integrada (cfr. Projecto de Relatório ao Orçamento de Estado para 2006 - Quadro Resumo 9) num conjunto de oito medidas relativas a diferentes impostos, apresentadas sob a epígrafe «Combate à Evasão e Fraude Fiscais e Outras Medidas Direccionadas à Consolidação Orçamental», pelo que, tendo em conta a especial natureza e recorte das restantes sete medidas, só pode concluir-se que o aditamento ao n.º 3 do art.º 42.º (actual 45.º) se inseria na última categoria (Outras Medidas Direccionadas à Consolidação Orçamental);

– o termo “perda” era (e é ainda), por vezes, utilizado como um tipo de “custo” ou de gasto;

– não sendo as provisões para títulos de investimento dedutíveis para efeitos fiscais, até à alteração do n.º 2 do art.º 35.º do Código do IRC pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, também as provisões para menos-valias em títulos de investimento não poderiam de todo ser incluídas no n.º 3 do art.º 42.º (actual art.º 45.º) nem, aliás, eram tidas em conta pelo n.º 2 do art.º 43.º (actual 46.º) do Código do IRC, para efeitos do cálculo das mais-valias ou menos-valias realizadas aquando da alienação;

– até ao exercício de 2010, as provisões para depreciação de títulos de investimento não eram aceites fiscalmente como dedutíveis na sua totalidade, portanto, teria sido inútil o legislador tentar incluí-las no âmbito do n.º 3 do art.º 42.º;

– a alteração introduzida ao n.º 2 do art.º 35.º e ao n.º 4 do art.º 37.º, do Código do IRC (pelo Decreto-Lei n. 159/2009) ao determinar que as perdas por imparidade em títulos (de negociação e de investimento) pudessem ser dedutíveis para efeitos fiscais dentro dos limites mínimos estabelecidos pelas normas emanadas da entidade de supervisão, essa decisão repercutiu-se na definição do âmbito da norma do n.º 3 do art.º 45.º e igualmente no n.º 2 do art.º 46.º, no respeitante ao cálculo das mais-valias e das menos-valias;

– sendo a Requerente uma SGPS, sujeita ao regime fiscal previsto no n.º 2 do art.º 32.º do EBF, as mais-valias ou menos-valias a apurar na alienação das partes de capital detidas na sociedade E…, SGPS não concorrem para a formação do lucro tributável e, deste modo, as perdas por imparidade registadas nos anos anteriores teriam de ser objecto dos necessários ajustamentos, deduzindo ou acrescendo ao lucro tributável, a parte das perdas por imparidade que, nos exercícios anteriores ao da alienação, tivessem influenciado o cálculo do lucro tributável, de modo a alcançar, na sua plenitude, o efeito pretendido com a referida norma do EBF;

– mesmo quando o Banco de Portugal impõe a algumas instituições o reconhecimento contabilístico de perdas por imparidade dos créditos resultantes da actividade normal por montante superior ao do limite mínimo constante do Aviso do Banco de Portugal n.º 3/95, daí não decorre a dedução integral das perdas registadas, para efeitos fiscais, porquanto, também, nesses casos, se mantém aplicável o limite mínimo que resulta das normas emanadas daquela entidade de supervisão, de carácter geral e abstracto;

– o acto tributário impugnado não afronta o princípio constitucionalmente consagrado, segundo o qual a tributação deve incidir sobre o rendimento real, porquanto tal princípio consagrado no n.º 2, do art. 104.º da CRP, é o regime regra, que admite excepções, quais sejam, entre muitas outras, as limitações à dedutibilidade dos encargos, para efeitos fiscais, preceituadas no artigo 45.º do CIRC a interpretação da Requerente é manifestamente desconforme com o princípio constitucional da igualdade;

– a interpretação da Requerente afronta o princípio da igualdade, para além dos princípios da capacidade contributiva e da justiça;

– O n.º 3 do art.º 45.º foi introduzido no CIRC com a Lei do Orçamento de Estado para 2003, aplicando-se às menos-valias efectivas resultantes da transmissão onerosa de partes de capital fazendo parte, segundo o Relatório da Proposta do Orçamento que o introduziu, de um conjunto de medidas com o objectivo de facto de combate à evasão fiscal, face á quebra de receita de IRC, das grandes empresas, com intenção de alargamento da base tributável e de introdução de medidas de moralização e de neutralidade do imposto;

– não atender aqui à directrizes que levaram à criação do preceito em apreço, distorcendo a sua interpretação como no sentido defendido pela Requerente, viola frontalmente o princípio da igualdade, descurando aquilo que é o primado do discurso do legislador;

– violará o princípio da igualdade, quer na sua vertente da capacidade contributiva, quer na sua vertente jurídica, deixar de fora do âmbito do artigo 45.º, n.º 3, as entidades financeiras sobre supervisão do Banco de Portugal.

 

 

3.2. Decisão da questão controvertida

 

Não é questionado nos autos, nem na inspecção tributária, que a Requerente estava obrigada pelas regulamentação emitida pelo Banco de Portugal a constituir a perda por imparidade em causa, pelo que ela pode ser deduzida para efeitos fiscais, nos termos do n.º 2 do artigo 35.º do CIRC, na redacção aplicável em 2010 (resultante da republicação operada pelo DL n.º 159/2009, de 13 de Julho).

 

3.2.1. Elementos literal e sistemático

 

Os artigos 35.º, n.º 2, 37.º e 45.º, n.º 3, do CIRC estabelecem o seguinte:

 

 

Artigo 35.º

Perdas por imparidade fiscalmente dedutíveis

 

2 - Podem também ser deduzidas para efeitos fiscais as perdas por imparidade e outras correcções de valor contabilizadas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores, quando constituídas obrigatoriamente, por força de normas emanadas pelo Banco de Portugal, de carácter genérico e abstracto, pelas entidades sujeitas à sua supervisão e pelas sucursais em Portugal de instituições de crédito e outras instituições financeiras com sede em outro Estado membro da União Europeia, destinadas à cobertura de risco específico de crédito de risco-país e para menos-valias de títulos e de outras aplicações.

 

Artigo 37.º

 

Empresas do sector bancário

 

1 – O montante anual acumulado das perdas por imparidade e outras correcções de valor para risco específico de crédito e para risco-país a que se refere o n.º 2 do artigo 35.º não pode ultrapassar o que corresponder à aplicação dos limites mínimos obrigatórios por força dos avisos e instruções emanados da entidade de supervisão.

2 – As perdas por imparidade e outras correcções de valor referidas no número anterior só são aceites quando relativas a créditos resultantes da actividade normal, não abrangendo os créditos excluídos pelas normas emanadas da entidade de supervisão e ainda os seguintes:

a) Os créditos em que Estado, Regiões Autónomas, autarquias e outras entidades públicas tenham prestado aval;

b) Os créditos cobertos por direitos reais sobre bens imóveis;

c) Os créditos garantidos por contratos de seguro de crédito ou caução, com excepção da importância correspondente à percentagem do descoberto obrigatório;

d) Créditos nas condições previstas nas alíneas c) e d) do n.º 3 do artigo 36.º

 

            3 – As menos-valias de aplicações referidas no n.º 2 do artigo 35.º devem corresponder ao total das diferenças entre o custo das aplicações decorrentes da recuperação de créditos resultantes da actividade normal e o respectivo valor de mercado, quando este for inferior àquele.

4 – Os montantes anuais acumulados das perdas por imparidade e outras correcções de valor, referidas no n.º 2 do artigo 35.º, não devem ultrapassar os valores mínimos que resultem da aplicação das normas emanadas da entidade de supervisão.

5 – O regime constante do presente artigo, em tudo o que não estiver aqui especialmente previsto, obedece à regulamentação específica aplicável.

6 – Quando se verifique a anulação de provisões para riscos gerais de crédito, bem como de perdas por imparidade e outras correcções de valor não previstas no n.º 2 do artigo 35.º, são consideradas rendimentos do período de tributação, em primeiro lugar, aquelas que tenham sido aceites como gasto fiscal no período de tributação da respectiva constituição.

 

Artigo 45.º

 

Encargos não dedutíveis para efeitos fiscais

 

3 – A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor.

 

Do teor literal do artigo 35.º, n.º 2, e do artigo 37.º do CIRC resulta a dedutibilidade das perdas por imparidade constituídas obrigatoriamente por força de normas emanadas pelo Banco de Portugal, de carácter genérico e abstracto, pelas entidades sujeitas à sua supervisão, com as limitações indicadas neste último.

A tese da Autoridade Tributária e Aduaneira assenta primacialmente na letra do artigo 45.º, n.º 3, do CIRC ao fazer referência a «outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio», que literalmente poderá abranger todas as perdas para além da «diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital».

Para determinar o alcance da lei, como de qualquer texto, não basta considerar isoladamente o teor literal de cada norma, pois é de primordial importância o contexto em que está inserida, bem como a regulamentação global conexionada com a matéria, designadamente nos casos em que os teores literais conduzem a resultados duvidosos ou conflituantes.

Desta perspectiva, há que notar que o artigo 45.º, n.º 3, do CIRC, não é uma norma especial para a determinação da matéria tributável das entidades sujeitas a supervisão do Banco de Portugal (ao contrário do que sucede com os artigos 35.º, n.º 2 e 37.º). O seu âmbito de aplicação estará naturalmente limitado pelo enquadramento sistemático que lhe foi dado, no pressuposto de que o legislador soube exprimir adequadamente o seu pensamento, como se tem de presumir (artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil).

Na verdade, o CIRC inclui na Subsecção I da Secção II do seu Capítulo III as «Regras gerais» de determinação da matéria tributável de IRC, em que se inclui o artigo 23.º, n.º 1, alínea h), que estabelece que são considerados gastos as perdas por imparidade.

Na Subsecção IV daquela Secção II estabelece-se o regime específico das «Imparidades e provisões» em que se incluem os artigos 35.º, n.º 2 e 37.º, que são normas específicas para a relevância fiscal das perdas por imparidade relativas a entidades sujeitas a supervisão do Banco de Portugal

O artigo 45.º do CIRC, não foi inserido entre as «Regras gerais» (Subsecção I), nem na Subsecção IV («Imparidades e provisões»), mas na Subsecção V relativa ao «Regime de outro encargos», o que, desde logo, sugere que o campo de aplicação do artigo 45.º não abrangerá os encargos cujo regime esteja previsto noutras subsecções, inclusivamente na Subsecção IV.

Assim, é manifesto que o enquadramento sistemático dos artigos 35.º, n.º 2, 37.º e 45.º, n.º 3, do CIRC conduz à conclusão de que este último não será aplicável à relevância fiscal das perdas por imparidade cujo regime é especialmente regulado previstas naqueles artigos 25.º, n.º 2, e 37.º.

Este enquadramento sistemático do artigo 45.º do CIRC, na redacção do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho, é essencialmente o mesmo que já existia na versão anterior, resultante da republicação operada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho.

Na verdade, com diferenças terminológicas derivadas da adopção do Sistema de Normalização Contabilística:

– já antes do Decreto-Lei n.º 159/2009, a mesma Subsecção I da Secção II do Capítulo III do CIRC continha as «Regras Gerais», em que se incluía o artigo 23.º com a indicação genérica dos «Custos ou perdas», entre os quais se referiam na alínea h) do n.º 1 as «provisões»;

– já então a Subsecção IV estabelecia o «Regime das provisões» em que se incluíam, na alínea d) do n.º 1 do artigo 34.º, «as constituídas obrigatoriamente, por força de uma imposição de carácter genérico e abstracto, pelas empresas sujeitas à supervisão do Banco de Portugal»;

– a Lei n.º Lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro, que aditou o artigo 35.º-A relativo às «Provisões específicas das empresas do sector bancário e do sector segurador» foi incluído na referida Subsecção IV;

– o artigo 42.º (correspondente ao artigo 45.º) estava incluído na Subsecção V, relativa ao «Regime de outros encargos».

 

Foi esta mesma Lei n.º 53-A/2006 que aditou ao artigo 42.º, n.º 3, (depois artigo 45.º) a expressão «bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares» em que a Autoridade Tributária e Aduaneira pretende enquadrar as imparidades em causa.

Em face do referido enquadramento sistemático, tendo o legislador da Lei n.º 53-A/2006 expressamente regulado de forma inovadora, com o aditamento do artigo 35.º-A, o regime das «provisões específicas das empresas do sector bancário» e não havendo neste qualquer referência à aplicação do regime do artigo 42.º, n.º 3, enquadrado no «regime de outros encargos», justifica-se a conclusão de que esta norma terá o seu campo de aplicação limitado a «outros encargos» qualificáveis como «perdas», diferentes dos encargos cuja relevância fiscal foi especialmente prevista noutras subsecções.

 

 

3.2.2. Elemento teleológico

 

Como tem vindo a ser afirmado em várias decisões arbitrais ( [1] ), a propósito da questão da aplicabilidade do artigo 45.º, n.º 3, do CIRC aos ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor a instrumentos financeiros, a restrição à dedutibilidade de perdas e variações patrimoniais negativas aceites apenas pode justificar-se como visando obstar a práticas dos sujeitos passivos tendentes a manipularem os prejuízos e prejudicarem as receitas fiscais, desencadeando a relevância tributária no momento e termos em que tal lhe fosse fiscalmente mais vantajoso.

Tal norma, quer na sua redacção primitiva, resultante da Lei 32-B/2002, de 30 de Dezembro, quer na que lhe foi dada pela Lei 60-A/2005 de 30 de Dezembro, explica-se objectiva e subjectivamente (ou seja, face à motivação expressa pelo legislador) por necessidades ligadas ao combate à fraude e evasão fiscais e ao alargamento da base tributável, dirigidas à almejada consolidação orçamental das contas públicas.

Na verdade, de acordo com o Relatório do Ministério das Finanças para o Orçamento de Estado de 2003 ( [2] ), a intervenção legislativa na área em causa (IRC) guiou-se por “duas prioridades, a saber, o combate à fraude e evasão fiscais e o alargamento da base tributável” (página 33), enquadrando-se a alteração que aqui interessa no âmbito do “Alargamento da base tributável e medidas de moralização e neutralidade” (página 53).

No Relatório do referido Orçamento para 2006 ( [3] ) refere-se que a medida em causa se enquadrou no âmbito do “COMBATE À EVASÃO E FRAUDE FISCAIS E OUTRAS MEDIDAS DIRECCIONADAS À CONSOLIDAÇÃO ORÇAMENTAL” (página 31).

É, assim, de entender que esta norma, na parte que foi aditada pela redacção da Lei n.º 53-A/2006, só tem aplicação quando se estiver perante situações em que seja possível a gestão fiscal das componentes negativas do lucro tributável, na linha do que concluiu o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17-02-2016, processo n.º 01401/14, em que entendeu que «a norma, em qualquer das suas versões, integra uma medida anti-abuso, na medida em que o legislador terá pretendido (para além do alargamento da base tributável) evitar a manipulação do resultado fiscal».

Na situação em apreço, estando-se perante perdas por imparidade constituídas impostas pela regulamentação do Banco de Portugal ( [4] ), não vale qualquer fundamento de moralização nem se verificam quaisquer necessidades relativas ao combate da fraude e evasão fiscais, porque a relevância tributária das perdas não depende de um acto de vontade do sujeito passivo e a valorimetria é objectivamente fixada.

Por outro lado, e pelas mesmas razões, carece igualmente de sentido qualquer medida de condicionamento da vontade do sujeito passivo, no sentido de favorecer comportamentos economicamente mais “desejáveis” e, como tal, conformes aos interesses do alargamento da base tributável e consolidação orçamental, pois esses hipotéticos comportamentos em dissonância com as regras emitidas pelo Banco de Portugal seriam ilegais. ( [5] )

Pelo exposto, é de concluir que a correcção efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira enferma de vício de violação de lei, por errada interpretação e aplicação do artigo 45.º, n.º 3, do CIRC, o que justifica a anulação da liquidação que nela de baseou, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

 

 

3.3. Princípios da igualdade da capacidade contributiva e da justiça

 

A Requerente defende que a interpretação da Autoridade Tributária e Aduaneira viola os princípios constitucionais da igualdade e da tributação das empresas pelo lucro real.

A Autoridade Tributária e Aduaneira defende que a interpretação da Requerente afronta o princípio da igualdade, para além dos princípios da capacidade contributiva e da justiça.

O princípio da igualdade não proíbe que se estabeleçam distinções no tratamento fiscal, mas apenas distinções desprovidas de justificação objectiva e racional.

Tendo a norma do artigo 42.º, n.º 3, do CIRC (depois artigo 45.º), na parte que foi aditada pela Lei n.º 53-A/2006, o objectivo de compensar os efeitos fiscais negativos de previsíveis práticas dos sujeitos passivos no sentido de escolha dos momentos que lhes sejam fiscalmente mais vantajosos para reconhecerem perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, há razão para distinguir entre as situações em que esse reconhecimento resulta de uma opção do sujeito passivo, em que vale a razão de ser da norma, daquelas que em que ele consubstancia o cumprimento de uma obrigação legal e em que, por isso, não ocorre uma prática fiscalmente indesejável.

Por outro lado, este regime, com esta interpretação, é aplicável a todas as entidades que estejam perante a obrigatoriedade de reconhecimento de perdas ou variações patrimoniais negativas, designadamente todas aquelas que, por imposição legal estão sujeitas à supervisão do Banco de Portugal.

No que concerne aos princípios da capacidade contributiva e da justiça, não se vê como sejam violados pela não aplicação de uma norma do tipo da que está em causa, que prevê uma restrição parcial à dedutibilidade de perdas e variações patrimoniais negativas em situações em que, paralelamente, não há qualquer restrição à relevância fiscal dos correspondentes ganhos e variações patrimoniais positivas.

O que é justo e está em sintonia com o princípio da tributação das empresas incidindo fundamentalmente sobre o seu rendimento real, enunciado no artigo 104.º, n.º 2, da CRP, é a relevância total para a determinação da matéria tributável de todos os rendimentos e gastos, assim como de todas as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, como, aliás, é regra geral consagrada nos artigos 17.º e 18.º, n.º 1, do CIRC e concretizada quanto às perdas por imparidade, na regra da dedutibilidade total, que consta da alínea h) do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, na redacção vigente em 2010.

Mas, aquele princípio do artigo 104.º, n.º 2, da CRP comporta a possibilidade de excepções, como resulta do uso da expressão «fundamentalmente», que terão de ter uma explicação aceitável. 

A norma do artigo 42.º, n.º 3, do CIRC (depois artigo 45.º), na parte que foi aditada pela redacção da Lei n.º 53-A/2006, constitui um desvio a essa regra, explicado por razões atinentes a desincentivar comportamentos que provocam erosão da base tributária e diminuição das receitas fiscais, que não têm a ver com a dimensão da capacidade contributiva nem com a concretização da justiça na tributação do rendimento, pois as perdas e as variações patrimoniais negativas não são indicadores da existência de rendimento tributável, mas antes da sua ausência.

Por outro lado, não se está, no caso das entidades sujeitas a supervisão do Banco de Portugal, perante uma relevância total das perdas por imparidade para a formação do lucro tributável, pois ela é limitada, nos termos do artigo 37.º, n.º 4, do CIRC.

Para além disso, ao contrário do que refere a Autoridade Tributária e Aduaneira, nem se está perante a inaplicabilidade global do artigo 45.º, n.º 3, a entidades sujeitas a supervisão do Banco de Portugal, pois o regime previsto nos artigos 35.º, n.º 2 e 37.º aplica-se apenas às perdas por imparidade que são constituídas obrigatoriamente, como se prevê no primeiro, aplicando-se aquele artigo 45.º, n.º 3, a todas as restantes perdas e variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio detidas por entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal.

Pelo exposto, não ocorre violação destes princípios constitucionais, pois há justificação para a norma do artigo 45.º, n.º 3, do CIRC na parte aditada pela Lei n. 53-A/2006, na interpretação aqui adoptada.

 

3.4. Questões de conhecimento prejudicado

 

Sendo de julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral por vício de violação do artigo 45.º, n.º 3, do CIRC, fica prejudicado, por ser inútil o conhecimento das restantes questões suscitadas, designadamente o vício de caducidade do direito de liquidação, suscitado pela Requerente na sua alegação.

 

4. Decisão

 

Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

·         Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;

·         Anular a liquidação de IRC 2016…, relativa ao exercício de 2010.

 

 

 

5. Valor do processo

 

 

O artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária estabelece que «o valor da causa é determinado nos termos do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário».

            O artigo 97.º-A do CPPT estabelece, no que aqui interessa, o seguinte

 

1 – Os valores atendíveis, para efeitos de custas ou outros previstos na lei, para as acções que decorram nos tribunais tributários, são os seguintes:

a) Quando seja impugnada a liquidação, o da importância cuja anulação se pretende;

b) Quando se impugne o acto de fixação da matéria colectável, o valor contestado;

 

            Destas normas conclui-se que, quando o Sujeito Passivo pretende a anulação de uma importância liquidada, o valor da causa é o dessa importância.

No caso dos autos, não se está perante uma situação enquadrável na alínea a), pois na liquidação impugnada não se determina o pagamento de qualquer importância, antes se fixa um valor a reembolsar.

Por outro lado, a Requerente refere, no artigo 98.º, ao terminar o seu pedido de pronúncia arbitral, que entende que «a correção ao seu lucro tributável, no montante de € 3.819.246,50, correspondente a 50% das provisões para imparidade, constituídas de acordo com a disciplina do Banco de Portugal, com base na aplicação indevida do disposto no art. 45.º, n.º 3 do Código do IRC, não pode deixar de ser anulada, por manifestamente ilegal» e formula, a final, a conclusão j) de que «a manter-se esta correção, manter-se-á, portanto, um ato manifestamente ilegal, por violação do disposto no art. 45º, n.º 3 do Código do IRC».

Neste contexto, o que releva para efeito de determinação do valor da causa é, em princípio, o valor contestado do acto de fixação da matéria colectável, que, interpretando o pedido de pronúncia arbitral, será de considerar o acto impugnado.

            O valor da correcção à matéria tributável é de fixação da matéria colectável é de € 3.819.246,50, mas, no caso em apreço, por a Autoridade Tributária e Aduaneira ter entendido que tinha ocorrido a caducidade do direito de liquidação relativamente ao exercício de 2010, apenas considerou relevante o valor do prejuízo fiscal que foi utilizado na liquidação do exercício de 2011, que foi de 3.068.854,48.

            Tendo sido utilizado este prejuízo de € 3.068.854,48 para efeito da liquidação de IRC relativa ao exercício de 2011, entende-se que deve ser o valor desse efeito o valor da causa por ser essa, afinal a «importância cuja anulação se pretende», a que se deve atender prioritariamente nos termos daquele artigo 97.º-A do CPPT.

            O efeito de uma alteração de € 3.068.854,48 na matéria tributável de IRC no exercício de 2011, em que vigorava a taxa de 12,5% até € 12.500) e de 25% quanto ao valor superior, é de € 1.562,50 (12.500 x 0,125= 1.562,50), quanto à 1.ª parte, e de € 764.088,62, quanto à 2.ª parte (3.068.854,48 – 12.500 = 3.056.354,48 x 0,25= 764.088,62).

            Assim, fixa-se em € 765.651,12 o valor da causa.

 

6. Custas

 

Tendo em conta o valor da causa indicado fixado, nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 11.016,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.

 

 

Lisboa, 27-03-2017

 

Os Árbitros

 

 

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

 

 

 

(Daniel Taborda)

 

 

 

 

 

 

(Vasco Valdez)

 

 



[1]Designadamente o acórdão de 25-11-2013, proferido no processo n.º 108/2013-T, cuja jurisprudência foi seguida, no essencial, nos acórdãos arbitrais de 09-06-2015 (processo n.º 58/2015-T), de 18-06-2015 (processo n.º 776/2014-T), de 25-09-2015 (processo n.º 208/2015-T), de 14-12-2015 (processo n.º 473/2015-T), de 17-06-2016 (processo n.º 738/2015-T) e de 14-12-2016 (processo n.º 393/2016-T).

[4]Como se aceita no Relatório da Inspecção Tributária (páginas 11 e 12), ao referir-se que o tratamento contabilístico da perda por imparidade decorre da IAS 39, §§ 58, 59, 67 e 68, cuja aplicação é determinada pela Instrução n.º 7/2005 do Banco de Portugal, emitida nos termos do da alínea b) do n.º 1 do artigo 1.º do Aviso n.º 3/95, de 30 de Junho.

[5]Segue-se de perto a fundamentação do acórdão de 25-11-2013, proferido no processo n.º 108/2013-T.