DECISÃO ARBITRAL
I – RELATÓRIO
1. A…, S.A., (doravante designada por “Requerente”), número de pessoa coletiva …, com sede na …, nº…, … -…, Lisboa, veio requerer, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do chamado Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), que integra o Decreto-lei nº 10/2011, de 20 de janeiro, a declaração da ilegalidade da liquidação do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), no valor global de € 18.876,00, acrescidos de € 2.668,50 referente a juros compensatórios, tudo num total de € 21.544,50 (vinte e um mil quinhentos e quarenta e quatro euros e cinquenta cêntimos), referentes à aquisição no processo de insolvência nº .../10.0TBMLGL, instaurado no 2.º Juízo do Tribunal Judicial do concelho de ..., à massa insolvente B…, Ld.ª, sediada igualmente no concelho de …, Pessoa Coletiva nº. …, de um conjunto de prédios urbanos com as características de terrenos para construção, melhor identificados infra, e consequente anulação do indeferimento das reclamações graciosas dessas liquidações.
2. É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada somente por “Requerida”).
3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerida em 02-08-2016.
4. Dado que a Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT, foi o signatário designado como árbitro, pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.
5. Em 20-09-2016 foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos do disposto no artigo 11.º, nº 1, alíneas a) e b) do RJAT, conjugado com os artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
6. Em conformidade com o preceituado na alínea c), do n.º 1, do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 06-10-2016.
7. Alega a Requerente, em síntese, que:
a) A “ratio” da isenção do artigo 270.º, n.º 2, do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas (CIRE) é fomentar e apoiar a venda rápida dos bens que integram a massa insolvente por óbvias razões de interesse dos credores, mas também do interesse público do normal funcionamento do mundo empresarial, em que cada processo de insolvência se apresenta como elemento perturbador do mercado;
b) Apenas uma interpretação restritiva dessa norma legal poderia fundamentar a liquidação da sua aplicação à transmissão da universalidade do estabelecimento ou empresa e não de quaisquer bens que integrem essa universalidade;
c) Tal limitação, no entanto, restringiria arbitrariamente o teor da autorização legislativa do artigo 9.º, n.º 2, da Lei n.º 39/2003, não podendo ser considerada conforme à Constituição;
d) Nessa medida, as liquidações impugnadas, por ilegais, devem ser anuladas, com o consequente reconhecimento do direito a juros indemnizatórios, contados a partir de 5 de Novembro de 2015, data de pagamento da dívida.
8. A Requerida apresentou Resposta, na qual se defende por impugnação, alegando, no sentido da improcedência do pedido de pronúncia arbitral, em síntese, o seguinte:
a) A isenção prevista no n.º 2 do artigo 270.º do CIRE abrange todos os atos integrados no âmbito de planos de insolvência, ou de pagamentos, ou de liquidação da massa insolvente, com a reserva, no entanto, de, caso o objeto da transmissão isenta ser a empresa ou o estabelecimento e não, um ou dois bens do seu ativo;
b) Apesar da autorização legislativa ter sido mais permissiva, o legislador, quanto à situação em causa, apenas pretendeu manter a isenção no caso da transmissão da universalidade de bens associados ao exercício da atividade económica da empresa;
c) Se o legislador tivesse pretendido alterar o sentido da lei poderia tê-lo expressamente concretizado no artigo 234.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, que alterou a referida norma;
d) Se não o fez, é porque não pretendeu atribuir mais isenções do que a que foi incluída na atual redação;
e) Ao autorizar o Governo apenas a aprovar um conjunto de benefícios fiscais no âmbito dos processos de insolvência e recuperação de empresas, a Assembleia da República concedeu-lhe a possibilidade de aprovar em bloco todos esses benefícios fiscais, aprovar apenas uma parte ou então pura e simplesmente não utilizar a autorização legislativa;
f) A utilização da autorização legislativa pode ser integral ou parcial, desde que a autorização parcial não colida com o sentido da lei de autorização;
g) Na situação em apreço, a Assembleia da República limitar-se-ia a enunciar os benefícios fiscais que o Governo pode conceder no âmbito dos planos de insolvência ou pagamentos ou da liquidação da empresa insolvente, sem impor ao Governo a obrigação de aprovação da totalidade desses benefícios, alternativamente à pura e simples não utilização da autorização legislativa;
h) No presente caso, no entanto, os Acórdãos citados pela Requerente ultrapassaram largamente o teor literal do artigo 270º, nº 2, do C.I.R.E., invadindo a área de exercício da função legislativa;
i) As aquisições não tiveram como finalidade prosseguir a mesma atividade, nem a aquisição envolveu a compra da universalidade de todos os bens afetos à atividade da empresa insolvente;
j) Ou seja, a venda de imóveis da empresa, isoladamente, não está, assim, abrangida pela isenção disposta no n.º 2 do art.º 270.º do CIRE, estando por consequência, sujeita a IMT nos termos gerais;
k) Em suma, os atos em crise não padecem de qualquer ilegalidade pelo que se impugna, por infundado, todo o alegado no Pedido de Pronúncia Arbitral que contrarie o supra exposto, devendo ser considerada como improcedente a pretensão da Requerente e a Requerida absolvida de todos os pedidos;
l) Uma vez que não se verifica qualquer ilegalidade dos atos de liquidação nem fundamento legal que sustente a pretensão da Requerente improcede em consequência o pedido de reembolso das quantias pagas pela Requerente e o pedido de juros indemnizatórios;
9. Por despacho de 14/11/2016, o Tribunal decidiu dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, determinando que o processo prosseguisse com alegações escritas facultativas, a apresentar pelas Partes no prazo simultâneo de 20 dias, conforme previsto no artigo 91.º, n.º 5, do CPTA, aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT;
10. A Requerente e a Requerida apresentaram alegações escritas, mantendo, ambas, o teor do pedido de pronúncias arbitral e da resposta, respetivamente.
II – SANEADOR
11. Não foram invocadas exceções.
12. As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.
13. Não se verificam nulidades, pelo que se impõe conhecer do mérito.
III. MÉRITO
III. 1. MATÉRIA DE FACTO
§1. Factos provados
14. O Tribunal considera provados os seguintes factos:
a) A Requerente adquiriu, no âmbito do processo de insolvência nº .../10.0TBMLGL, instaurado no 2.º Juízo do Tribunal Judicial do concelho de ..., à massa insolvente de “B…, Ld.ª”, sediada no Concelho de…, Pessoa Coletiva nº…, um conjunto de prédios urbanos com as características de terrenos para construção, integrantes da respetiva massa insolvente, sitos na freguesia de …, concelho de … e distrito de Viseu, melhor descritos no seguinte quadro:
b) A aquisição foi feita pelo valor global de €290.400;
c) Na sequência de uma ação de controlo e fiscalização internas promovida pela Direção de Finanças do Distrito de…, visando a confirmação dos pressupostos das isenções previstas nos artigos 269.º, alínea e), e 270.º, nº 2, do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas (CIRE), a Requerida procedeu à liquidação adicional de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), no valor global de € 18.876,00, acrescidos de € 2.668,50 referente a juros compensatórios, tudo num total de € 21.544,50 (vinte e um mil quinhentos e quarenta e quatro euros e cinquenta cêntimos), que incidiram sobre a referida aquisição – Liquidação nº … de 2015 (Autoridade Tributária e Aduaneira);
d) A Requerente apresentou Reclamação Graciosa dessa liquidação (Reclamação Graciosa n.º …2016…), a qual foi objeto de despacho de indeferimento, da autoria, por delegação, da Chefe de Divisão de Gestão e Assistência Tributária da Unidade dos Grandes Contribuintes (UGC), de 28 de Abril de 2016;
e) A Requerente procedeu ao pagamento da importância de € 21.544,50, referente ao imposto liquidado, em 05/11/2015.
§2. Factos não provados
15. Com relevo para a decisão, não existem factos essenciais não provados.
§3. Motivação quanto à matéria de facto
16. No tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal fundou-se na livre apreciação das posições assumidas pelas Partes em sede de facto e no teor dos documentos juntos aos autos, não contestados pelas Partes.
III.2. MATÉRIA DE DIREITO
§1. Questão decidenda
17. No presente processo, está em causa a interpretação e aplicação do preceito contido no artigo 270.º, n.º 2, do CIRE (Código de Insolvência e Recuperação de Empresa, aprovado pelo Dec. Lei nº 53/2004 e sucessivas alterações), importando saber se a isenção aí prevista apenas beneficia a transmissão da universalidade de bens associados ao exercício da atividade económica da empresa, como sustenta a Requerida, ou se é também aplicável à transmissão, de forma isolada, de imóveis da empresa ou de estabelecimentos desta, como defende a Requerente.
§2. Aplicação do direito ao caso sub judice
18. O artigo 270.º, n.º 2, do CIRE dispõe o seguinte:
«Estão igualmente isentas de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis os actos de venda, permuta ou cessão de empresa ou de estabelecimentos desta integrados no âmbito de plano de insolvência ou de pagamentos ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente».
19. O elemento literal do artigo 270.º, n.º 2 do CIRE determina que a isenção de IMT é aplicável quer à venda, quer à permuta, quer à cessão, sendo que apenas quanto a esta última se exige a transmissão de empresa ou universalidade.
20. De acordo com o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 53/04, de 18 de março, que aprovou o CIRE, “mantêm-se, no essencial, os regimes existentes no CPEREF quanto à isenção de emolumentos e benefícios fiscais, bem como à indiciação de infracção penal” (§49).
21. Nos termos do diploma que aprovou o CPEREF (DL nº 123/93, de 23 de abril), “além de um tratamento bastante favorecido dos dois processos abrangidos pelo diploma no domínio das custas judiciais, adopta-se ainda neste decreto-lei um conjunto de incentivos de natureza fiscal, através dos quais se procura especialmente evitar penalizações indevidas ou graves inconvenientes para as operações jurídicas, económicas ou financeiras em que pode desdobrar-se o processo de recuperação”.
22. Ainda segundo este diploma,“[a]fastaram-se com essa intenção alguns encargos de carácter fiscal ou parafiscal relacionados com os negócios jurídicos susceptíveis de constituírem o meio de recuperação aprovado pelos credores, tendo nomeadamente em vista o imposto do selo, a contribuição autárquica, o imposto municipal de sisa e os próprios emolumentos devidos pelos actos”.
23. Assim sendo, revela-se contrário ao fim pretendido pelo legislador – manutenção no essencial dos regimes existentes no CPEREF quanto à isenção de emolumentos e benefícios fiscais – o entendimento de que estariam excluídas de isenção do IMT as vendas de elementos do ativo da empresa, ainda que integradas no âmbito do plano de insolvência ou de pagamentos ou praticadas no âmbito da liquidação da massa insolvente.
24. Nas palavras do Supremo Tribunal Administrativo, em Acórdão emitido em 30 de maio de 2012 (Processo n.º 0949/11):
«Esta interpretação [seguida pela Autoridade Tributária in casu] choca, contudo - como bem observado na sentença recorrida -, com aquilo que o legislador consignou no n.º 49 do preâmbulo do CIRE no que respeita aos benefícios fiscais, onde se afirma que: “mantêm-se, no essencial, os regimes existentes no CPEREF quanto à isenção de emolumentos e benefícios fiscais” sendo certo que a alínea c) do n.º 2 do artigo 121.º do CPEREF isentava de imposto municipal de sisa as transmissões de bens imóveis».
25. Subscreve-se ainda o entendimento expresso pelo Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão de 17 de dezembro de 2014 (Processo n.º 01085/14), segundo o qual:
«Tendo em conta o fim que o legislador pretende alcançar com a concessão de tal isenção, - fomentar e apoiar a venda rápida dos bens que integram a massa insolvente por óbvias razões de interesse dos credores, mas, também do interesse público de retoma do normal funcionamento do mundo empresarial em que cada processo de insolvência se apresenta como elemento perturbador, dando «um bónus» a quem adquirir os bens imóveis que integram a massa insolvente – compre estes bens que compra mais barato porque não tem de pagar o IMT que seria devido na aquisição de um imóvel similar fora do processo de insolvência – e que serão vendidos em fase de liquidação, o ambíguo texto do n.º 2 do artº 270º pode ser objecto de uma leitura mais clara e inequívoca sem recurso a qualquer interpretação extensiva. Basta que nos interroguemos se para alcançar o fim antes definido faz qualquer diferença que se esteja a vender globalmente a empresa com todo o seu activo e o seu passivo, que se esteja a vender um ou mais dos estabelecimentos comerciais que a integravam, que se esteja a vender bens que integravam o seu património mas não eram utilizados no seu giro comercial – por exemplo um imóvel recebido em pagamento de uma dívida de que a empresa insolvente era credora – para que se esteja perante uma venda que é praticada no âmbito da liquidação da massa insolvente? E, se nas mesmas situações se tratar não de vendas mas de permutas ou cessões – sendo que esta palavra há-de ter sido utilizada em sentido impróprio na medida em que associada ao mundo empresarial se costuma reportar a cessão de exploração, cessão do estabelecimento comercial, próximos da locação e não da alienação, e no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas se mostra utilizada também quanto à aquisição de bens pelos credores? Cremos que a resposta não pode deixar de ser negativa».
26. Uma interpretação do disposto no artigo 270.º, n.º 2 do CIRE em conformidade com a Constituição da República Portuguesa, aponta no mesmo sentido.
27. Com efeito, tal como é afirmado no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 30 de maio de 2012 (Processo n.º 0949/11):
«O n.º 2 do artigo 270.º do CIRE, cuja redacção não é clara no que respeita ao âmbito da isenção de IMT aí consignada, deve ser interpretado em conformidade com a alínea c) do n.º 3 do artigo 9.º da Lei n.º 39/2003, de 22 de Agosto, pois que entre dois sentidos da lei, ambos com apoio - pelo menos mínimo - na respectiva letra, deve o intérprete optar por aquele que o compatibilize com o texto constitucional (interpretação conforme à constituição) [assim] deve entender-se estarem isentas de IMT não apenas as vendas da empresa ou estabelecimentos desta, enquanto universalidades de bens, mas também as vendas de elementos do seu activo, desde que integradas no âmbito do plano de insolvência ou de pagamentos praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente».
28. No mesmo sentido pronunciou-se, ainda, o Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão de 3 de julho de 2013 (Processo n.º 0765/13) no qual foi decidido que:
«O n.º 2 do artigo 270.º do CIRE, cuja redacção não é clara no que respeita ao âmbito da isenção de IMT aí consignada, poderá, quando muito, interpretar-se como abrangendo não apenas as vendas da empresa ou estabelecimentos desta, enquanto universalidade de bens, mas também as vendas de elementos do seu activo, desde que integradas no âmbito de plano de insolvência ou de pagamentos ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente».
29. Entretanto, através da Circular n.º 4/2017 da Direção de Serviços do IMT, do IS, do IUC e das Contribuições Especiais (DSIMT), que veio alterar o ponto III, do anexo à Circular n.º 10/2015, a Autoridade Tributária e Aduaneira veio adequar a sua interpretação do artigo 270.º, n.º 2, do CIRE, à jurisprudência constante nesta matéria, passando a prever que «[a] aplicação dos benefícios fiscais previstos no n.º 2 do artigo 270.º do CIRE não depende da coisa vendida, permutada ou cedida abranger a universalidade da empresa insolvente ou um seu estabelecimento», concluindo que «[a]ssim, os atos de venda, permuta ou cessão, de forma isolada, de imóveis da empresa ou de estabelecimentos desta estão isentos de IMT, desde que integrados no âmbito de planos de insolvência, de pagamentos ou de recuperação ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente».
30. Conclui-se, assim, pela procedência do pedido de anulação do ato de liquidação de IMT contestado e, consequentemente, da procedência do pedido de anulação do ato de indeferimento da Reclamação Graciosa em causa.
31. Da ilegalidade do ato de liquidação em crise, e da consequente anulação do mesmo, resulta o direito da Requerente a ser reembolsada do montante de imposto indevidamente pago.
32. A Requerente pede ainda o pagamento de juros indemnizatórios. Quanto a estes, o n.º 1 do art. 43.º da Lei Geral Tributária prevê o seguinte: «[s]ão devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido».
33. Considera-se que «[o] erro imputável aos serviços que operaram a liquidação fica demonstrado quando procederem a reclamação graciosa ou a impugnação dessa mesma liquidação e o erro não for imputável ao contribuinte» (DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES, JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária. Anotada e comentada, 4.ª ed., Lisboa, 2012, p. 342).
34. A lei determina, ainda, no artigo 100.º da Lei Geral Tributária, que: «[a] administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei.»
35. Conforme é afirmado no Acórdão do STA de 11/02/2009, recurso n.º 1003/08, «[t]endo o legislador adoptado a indemnização sobre a forma de juros indemnizatórios, na sequência de decisão anulatória de acto de liquidação, presumindo o prejuízo patrimonial derivado da privação da quantia paga na sequência de um acto de liquidação ilegal, a interpretação do art. 100.º da LGT conforme à Constituição é a de que nele se reconhece o direito a juros indemnizatórios desde a data em que ocorreu a privação da quantia ilegalmente liquidada e não apenas a contar do termo do prazo de execução da decisão anulatória.»
36. No presente processo estamos perante liquidação adicional de IMT fundada em erro imputável aos serviços, donde resultou o pagamento indevido da prestação tributária pela Requerente, pelo que se reconhece a esta o direito a juros indemnizatórios sobre o montante de imposto indevidamente pago.
37. De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 61.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), «[o]s juros são contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito, em que são incluídos».
V – DECISÃO
Nestes termos, e com os fundamentos expostos, este Tribunal Arbitral decide:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
b) Anular, com todos os efeitos legais, o ato de liquidação de IMT em crise no presente processo;
c) Anular, com todos os efeitos legais, o ato de indeferimento da Reclamação Graciosa n.º …2016…;
d) Julgar procedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios, que acresce ao reembolso do imposto indevidamente pago, aplicando-se a taxa legal e contando-se aqueles desde a data do pagamento do imposto até à emissão da nota de crédito, tudo nos termos que vier a ser apurado em execução de sentença.
VI- VALOR DO PROCESSO
De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 21.544,50.
VII – CUSTAS
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 1.224,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.
Lisboa, 01/03/2017
O Árbitro
(Paulo Nogueira da Costa)